Bruno Wilhelm Speck, Elisabeth Balbachevsky: Quando o partidarismo pesa na decisão eleitoral?

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Quando o partidarismo pesa na decisão eleitoral? Bruno Wilhelm Speck (USP) Elizabeth Balbachevsky (USP) São Paulo, 30 de março 2016

Breve recapitulação do debate sobre a identificação partidária A identificação partidária é um indicador central usado pela ciência política para diagnosticar se as organizações partidárias são capazes de orientar as opiniões e comportamentos políticos dos cidadãos. Afinal, para o cidadão comum os partidos são agentes potencialmente importantes que podem ajudar a compreender a política e fornecer orientações em um mundo de decisões complexas e distantes do seu dia-a-dia. A identificação partidária é uma construção abstrata, que descreve uma predisposição dos cidadãos para criar um senso de identidade com algum partido, e, em função disso, seguir as posições sustentadas por esse partido em diferentes questões e valores. Nos primeiros trabalhos sobre identificação partidária supunha-se que essa identidade estava associada a um conjunto mais ou menos coerente de opiniões e valores próximos à posições sustentadas pelo partido no cenário político. Entretanto, já em 1964 Converse adverte que "political belief systems fades out very rapidly, almost before one has passed beyond the 10 percent of the American population that in the 1950s had completed standard college training. Increasingly, simpler forms of information about "what goes with what" (or even information about the simple identity of objects) turn up missing" (Converse, 1964, p. 10). Assim, já naquela época, os estudos mostraram que, para a grande maioria da população, a identidade partidária teria pouco impacto na organização da percepção dos grandes debates políticos para a massa do eleitorado. Em que pese essas limitações, as primeiras gerações que se debruçaram sobre o conceito de identificação partidária tenderam a ver nessa relação a expressão do laço estável que une diferentes partidos políticos com diversos setores da população, e que é mobilizado nos períodos de competição eleitoral, tornando a escolha eleitoral mais previsível. Desde a inclusão de perguntas sobre a identificação partidária nas pesquisas de opinião por pesquisadores da Escola de Michigan (Campbell, Converse, Miller, & Stokes, 1960) nos anos 1960, legiões de cientistas políticos se dedicaram a analisar o partidarismo sob esta perspectiva. Para muitos o partidarismo serviu para entender melhor as posições políticas do eleitor comum e, principalmente, aumentando a previsibilidade de suas opções em futuras eleições. Desde os anos 1980 surgiu um outro debate, a partir dos diagnósticos sobre o declínio do partidarismo, as suas causas e o seu significado para a democracia (Dalton, 2000). Uma série de fatores seria responsável pela desvinculação gradual dos corações e mentes dos eleitores dos partidos políticos. Nas sociedades industrializadas as grandes clivagens sociais que marcaram a origem aos partidos políticos (Rokkan 2009 (1969)) tinham sido superadas. Os partidos teriam perdido a função de dar voz e acesso a recursos aos grupos sociais, especialmente os excluídos, e estes teriam ganhado mais autonomia no âmbito intelectual e material. No campo das ideias os dois fatores importantes para esse processo seriam o acesso

à educação e a mídia independente. No âmbito material o Estado do bem estar social garantiu acesso aos bens da sociedade e segurança que antes o partido providenciava (Manin, 1995). A análise da identidade partidária também foi usada para se entender as dinâmicas de competição eleitoral nas novas democracias que se formaram e consolidaram desde os anos 1980. No caso do Brasil as pesquisas eleitorais nos anos 1970 identificaram altas taxas de identificação dos eleitores com as duas opções partidárias permitidas pela ditadura militar. A identificação dos eleitores com a ARENA ou o MDB permitiu identificar a predisposição dos eleitores de apoiar o regime ou o partido de oposição (Lamounier, 1980). O bipartidarismo forçado ajudaria a criar uma imagem do MDB como partido em defesa do homem comum, das liberdades políticas e da volta à democracia, mesmo que este partidarismo estivesse em larga medida desprovido de um ideário político (Reis, 1988). Após a volta ao multipartidarismo os cientistas políticos continuaram observando o fenômeno da identificação partidária no Brasil como um termômetro para avaliar o sistema partidário. Em parte a agenda de pesquisa no Brasil é a mesma das outras democracias, respondendo a perguntas sobre a) a evolução do partidarismo (se aumenta ou diminui) e o perfil dos partidários (de diferentes partidos), b) as causas ou origens da identificação partidária em um país com um sistema partidário jovem e em constante mudança e c) das consequências do partidarismo para a democracia (se partidos com poucos simpatizantes fieis podem cumprir o seu papel na democracia representativa). Recapitularemos brevemente as respostas a estas questões na literatura sobre o caso brasileiro. Qual é evolução do partidarismo no decorrer do tempo? A taxa de partidarismo no Brasil alcança aproximadamente a metade do eleitorado e está comparativamente mais baixa que em outras democracias (Plasser & Plasser, 2002, p. 304). Parte dos trabalhos mostra uma preocupação com esta baixa conexão entre os eleitores e os partidos políticos (Kinzo, 2004, 2005). Partidos que não conseguem se consolidar como referencia para a orientação política dos cidadãos não cumprem o seu papel no governo representativo. Esses trabalhos sobre a taxa global do partidarismo foram complementados por outros que analisam o perfil dos simpatizantes partidários, bem como as mudanças desses perfis no decorrer do tempo. Em relação às tendências temporais vários autores apontaram para o declínio do PMDB e a ascensão do PT nas últimas três décadas de pesquisas sobre identificação partidária (Carreirão & Kinzo, 2004; Venturi, 2010). Uma característica apontada pelas pesquisas sobre o partidarismo no Brasil é a assimetria no perfil dos simpatizantes. Tomando como referencia a força eleitoral, os PTistas são claramente sobrerrepresentados entre os partidários enquanto outros partidos praticamente não contam com simpatizantes (Samuels, 2004). Mais recentemente Veiga analisou o perfil social dos simpatizantes dos maiores partidos (Veiga, 2007, 2011) apontando como a preferência para diferentes partidos mudou em eleitores de diferentes regiões, com diferentes graus de escolaridade e com diferentes perfis ideológicos. Esta questão é especialmente debatida quando o tema é o perfil dos partidários do Partido dos Trabalhadores (PT), com contribuições de Singer (2010), Venturi (2010) e Samuels e Zucco (2014a) que divergem sobre o momento e a direção da mudança do perfil dos seus simpatizantes.

Em relação segunda questão, sobre as origens do partidarismo no Brasil, há poucas respostas na literatura acadêmica sobre o caso brasileiro o que surpreende dadas as condições peculiares da origem do sistema partidário atual. Com poucas exceções o sistema partidário pós-ditadura é composto por legendas recém-criadas. Somente quatro partidos poderiam reivindicar uma tradição de continuidade com o sistema partidário anterior e destes somente dois o fizeram com sucesso. O PMDB se posicionou claramente como herdeiro do MDB, partido opositor do regime militar, inclusive mantendo o nome da nova sigla próxima à anterior. Os eleitores socializados durante os anos 1970 não teriam dificuldade de associar a nova sigla à herança do partido que se tornou símbolo da oposição ao regime e das conquistas democráticas. Por outro lado os partidos herdeiros da ARENA fizeram de tudo para justamente apagar os traços de continuidade. O atual PP, anterior PPR, anterior PDS, herdeiro da ARENA o fez por meio da estratégia de mudar repetidamente o nome da sigla. O atual DEM, anterior PFL, cisão da antiga ARENA, igualmente negou a tradição histórica, criando nova identidade. Em ambos os casos a continuidade da sigla, elemento essencial para a identificação partidária, foi intencionalmente apagada pelas lideranças políticas. Dois partidos, PTB e PDT, tentaram recorrer a raízes mais longínquas, com o partido populista antes do golpe. Aqui o conflito e a cisão dificultaram a continuidade, mas sob a liderança política de Leonel Brizola o PDT investiu no reestabelecimento do vínculo com a tradição trabalhista e a figura de Getúlio Vargas. Finalmente a legalização do PCB, que teoricamente poderia reatar os vínculos com a traição desde os anos 1930 e contou com sucesso nos anos 1950, primeiro na legalidade e depois na ilegalidade, teve a sua coesão abalada pelas cisões na esquerda durante a ditadura militar. Adicionalmente o partido sofreu os efeitos do colapso da União Soviética, passando por mudança simbólica de nome para PPS, rompendo com o passado. Vale lembrar ainda o caso do PT, partido que explicitamente enfatizava o rompimento com as tradições do trabalhismo do passado e apostou na novidade do modelo partidário proposto. No balanço, somente o PMDB e o PDT vincularam a sua imagem a tradições políticas herdadas do passado recente, deixando margem para que cidadãos socializados antes ou durante a ditadura transferissem a sua identificação política às novas siglas. Todos os outros partidos criados ou recriados desde a volta ao multipartidarismo, seja por negar a própria tradição, seja por não contar com antecedentes históricos, não poderiam contar com eleitores fidelizados durante o processo de socialização no sentido dos partidos políticos em países (mesmo que não democráticos) que contam com uma longa tradição partidária não interrompida. Nesta circunstancia taxa reduzida de fidelidade partidária no período democrático pode ser explicada como consequência deste processo de emergência do novo sistema partidário. Adicionalmente a segunda peculiaridade do sistema partidário brasileiro, a fragmentação, igualmente diferencia o país de outros casos. Em um ambiente fragmentado talvez a fidelização com um partido específico seja mais difícil, ou diluído, mas o posicionamento dentro de um campo político seja mais estável. O significado da identificação partidária neste contexto é diferente para os partidos brasileiros. A noção da consolidação do vinculo com o eleitor na fase da sua socialização e do seu contexto social teria peso reduzido no Brasil. No entanto a literatura não leva isto em conta. Há pouca discussão sobre a aplicabilidade do

conceito da identificação partidária no caso brasileiro ou a necessidade de reformular este par o caso nacional. Adicionalmente a esta falta do debate sobre a identificação partidária no contexto adverso ao modelo originalmente concebido, outro debate sobre a utilidade do conceito para os modelos explicativos da ciência política emerge. A pesquisa sobre o partidarismo no Brasil é permeada por uma dúvida mais fundamental sobre a aplicabilidade do conceito da identificação partidária no Brasil. As dúvidas se referem á possibilidade de criação de identidades partidárias em um sistema partidário com um grande número de partidos, muitos deles com vida muito curta e com um eleitorado em geral com baixo nível de escolaridade e baixa capacidade de compreensão do processo político. Em última instância estas dúvidas se cristalizam em pesquisas que questionam o alcance, a coerência e o impacto da identificação partidária no Brasil. Poucos eleitores simpatizariam com partidos, a simpatia com um partido não implica necessariamente a rejeição de outro e os simpatizantes não orientariam os seu comportamento e suas atitudes pela posição dos partidos de sua preferência. Em última instancia se questiona se a identificação partidária é um instrumento heurístico relevante para as ciências sociais no Brasil. Vários trabalhos questionam e testam a coerência das várias facetas da identificação partidária, ora comparando várias medições da identificação (Paiva, Braga, & Pimentel Jr, 2007; Pimentel Jr., 2007), ora comparando a identificação partidária com outros indicadores como a filiação partidária (Speck, Braga, & Costa, 2015). Em um trabalho recente Samuels e Zucco (2014b) tentaram dirimir as dúvidas sobre o significa do partidarismo no Brasil por meio de um experimento no qual confirmaram a importância da identificação partidário para a formação das opiniões políticas dos simpatizantes do PT e do PSDB. Em última instancia a questão importante é se o partidarismo ajuda a entender atitudes e comportamentos dos cidadãos. É importante lembrar que a identificação partidária foi criada como ferramenta para ajudar a prever a decisão eleitoral nos Estados Unidos. Poucos estudos se dedicaram a analisar o impacto do partidarismo sobre o voto dos eleitores brasileiros. Entre estes estão Carreirão e Kinzo (2004) que analisam o impacto do partidarismo sobre o voto presidencial em 1989, Speck, Braga e Costa (2015) que analisam o impacto da identificação partidária sobre o voto para presidente em 2014, Pimentel (2007) e Nicolau (2007) que analisam as eleições presidenciais. Somente dois estudos analisam a relevância da identificação partidária para explicar as eleições para governador em 2002 (Pimentel Jr., 2007) e Deputado Federal em 2010 (Paiva & Tarouco, 2011). O presente texto explora o tema da identificação partidária no Brasil nesta mesma direção. Avaliamos se a identificação partidária ajuda a entender o processo eleitoral no Brasil a partir de duas perspectivas. Em primeiro lugar, em que medida essa informação permite entender o voto, e, em segundo lugar, qual a relação entre a identidade partidária e atitudes e opiniões expressas pelos eleitores. No ESEB 2014 um em cada três entrevistados manifestou que gosta de um partido político. Qual é o significado e quais as consequências da identificação partidária no Brasil em relação à escolha do voto nestas eleições? Para responder esta questão analisamos a extensão do partidarismo no Brasil, o seu impacto sobre a participação política e finalmente suas consequências para a escolha eleitoral no pleito de 2014. Diferentemente de

outros estudos anteriores analisaremos o impacto do partidarismo sobre todas as eleições para os cinco cargos diferentes.

Identificação partidária e participação eleitoral A primeira questão que se coloca é se a identificação partidária aumenta a chance de participação eleitoral. Nossa expectativa é que a identificação partidária, como um sinal de maior inserção no debate político nacional, influencie positivamente sobre o comparecimento eleitoral. A identificação partidária, uma construção teórica, concorre com outros fatores para explicar o engajamento político. Esses outros fatores compreendem as características demográficas adscritas (idade, sexo, cor) ou adquiridas (escolaridade, religião, estado civil), o contexto local (região, capital), o status socioeconômico (renda, ascensão, bolsa família), as disposições cognitivas individuais (informação sobre política, confiança na democracia) ou o contato durante a campanha (contatado por políticos, amigos). Para avaliar o significado específico da identificação partidária, todas estas outras possíveis causas do comparecimento eleitoral serão incluídas no modelo de regressão multivariada para explicar o comparecimento eleitoral nas eleições de 2014. Em primeiro lugar cabe saber se a identificação partidária sobrevive como fator autônomo em relação a estas outras categorias. Somente na medida em que a importância da identificação partidária se sobrepõe sobre os outros fatores pode-se dizer que ela captura de fato uma dimensão significativa para compreender a participação política. Em nossa amostra, aproximadamente 90% dos entrevistados compareceram no primeiro turno. A tabela 1 analisa o impacto da identificação partidária sobre esta taxa de comparecimento nas eleições. Verificamos que o grupo dos cidadãos que se identificam com algum dos partidos não apresenta um padrão de comportamento diferente do restante. Por outro lado há diferenças significativas nas taxas de comparecimento em função de vários outros fatores. A surpresa está na importância de fatores como morar fora da capital, ser mulher, escolaridade alta, alto grau de informação, ter sido contatado por alguém ligado à campanha. Todos esses fatores tendem a aumentar a probabilidade do comparecimento. Por outro lado, a ascensão social subjetiva diminui significativamente a probabilidade de comparecer nas urnas, o que confirma a imagem que os novos estratos da classe média são menos mobilizados politicamente.

Tabela 1: Regressão logística para explicar o comparecimento eleitoral em 2014 Identidade partidária Região Norte Região Nordeste Região Sul Região Centrooeste Contexto (capital=1) Genero (mulher=1) Cor (Branco=1) Idade (acima 40=1) Escolaridade (2grau ou mais=1) Estado civil (casado=1) Religião (evangélico=1) Renda (acima 2 sm=1) Classe subjetiva (subiu=1) Recebe bolsa família (sim=1) Informação política (alta=1) Contatado por político (sim=1) Engajamento político (alto=1) Constant

B -,019

S.E. ,181

Wald ,011

-,249

,291

,143

df 1

Sig. ,916

Exp(B) ,981

,736

1

,391

,779

,223

,412

1

,521

1,154

,298

,281

1,126

1

,289

1,347

-,428

,311

1,901

1

,168

,652

-,357

,184

3,753

1

,053

,700

,322

,168

3,690

1

,055

1,380

-,027

,183

,021

1

,884

,974

,080

,183

,193

1

,660

1,084

,375

,190

3,890

1

,049

1,455

,255

,170

2,262

1

,133

1,291

-,167

,190

,772

1

,380

,846

,138

,178

,604

1

,437

1,148

-,488

,177

7,590

1

,006

,614

,120

,192

,390

1

,533

1,127

,334

,171

3,811

1

,051

1,396

,353

,191

3,429

1

,064

1,423

-,179

,193

,859

1

,354

,836

1,717

,289

35,382

1

,000

5,570

Identificação partidária e opção de voto em diferentes eleições Até que ponto a identificação partidária ajuda a explicar o voto dos cidadãos em eleições para diferentes cargos? Esperamos que os cidadãos que se identificam com determinado partido também tenham votado nos candidatos ou nas siglas partidárias destes partidos nas eleições 2014. Até que ponto isto ocorreu? Para responder a questão precisamos reduzir a base para análise em três sentidos. Primeiro, a questão da congruência entre identificação e voto só faz sentido para o grupo que se identifica com algum partido (aproximadamente um terço dos entrevistados). Segundo, somente uma parte dos entrevistados se lembra da sua escolha eleitoral para os diferentes cargos. A tabela 2 mostra que esta taxa é alta para os cargos de maior visibilidade (presidente, governador e senador), mas bastante baixo para os cargos de deputado federal e estadual. No caso das eleições para estes últimos, somente um quarto dos entrevistados identifica o partido em qual votou. Assim, a comparação entre identificação e escolha eleitoral automaticamente se reduz ao grupo que recorda o voto.

Tabela 2: Apresentação de candidaturas para os diferentes cargos nas eleições 2014

Não compareceu Informa voto válido Não informa voto válido Total

Pres. (1 turno)

Gove. (1 turno)

Senador

Dep. Fed.

Dep. Est.

9,1 84,4 6,5 100,0

9,1 76,8 14,1 100,0

9,1 66,3 24,6 100,0

9,1 29,2 61,7 100,0

9,1 25,4 65,5 100,0

A terceira limitação diz respeito à estrutura de oportunidades na escolha eleitoral. Nem todos os partidos apresentam candidatos a todos os cargos nos diferentes estados e consequentemente muitos dos eleitores não puderam votar em candidatos dos partidos de sua preferência nas eleições. Na eleição para presidente somente 11 partidos apresentaram candidatos. Nas eleições para os outros cargos a estrutura de oportunidade para a escolha do partido preferido é mais complexa. Na tabela 3 reproduzimos de forma reduzida quais partidos apresentam candidatos para Governador, Senador, Deputado Federal e Estadual nos respectivos estados. Destacamos separadamente as candidaturas dos partidos PT, PMDB e PSDB para os quatro cargos.

Tabela 3: Apresentação de candidaturas para os diferentes cargos nas eleições 2014 GOVERNADOR UF

AC AL AM AP BA CE DF ES GO MA MG MS MT PA PB PE PI PR RJ RN RO RR RS SC SE SP TO

PT

PMDB

SENADOR

PSDB OUTR

1

PT

PMDB PSDB OUTR

3 1

1

DEPUTADO FEDERAL

1

8

5 1

1

1 1

1

1

1

1

6 5

1

6

1

1

27

5

1

1

1

27

1

1

1

27

10

1

1

1

25

1

1

1

24

4

1

1

1

26

1

1

1

26

3

1

1

1

27

1

1

1

27

6

1

1

1

28

1

1

1

28

5

1

1

1

28

1

1

1

28

6

1

1

1

27

1

1

21

5

1

1

1

27

1

1

1

27

1

6

1

1

1

28

1

1

1

28

1

4

1

4

1

5

1

1

1

26

1

1

1

26

1

24

1

1

25

1

1

26

1

1

27

1

1 1 1

25

1

1 1

1

24

1 1

1

1

1 1

25

1

1

5

1 1

4

1

PMDB PSDB OUTR

1

1

3

1

PT

8

7 1

PMDB PSDB OUTR

3 1

6

PT

DEPUTADO ESTADUAL

1

4

1

1

4

1

1

9

1

1

1

27

1

1

4

1

1

6

1

1

1

27

1

5

1

4

1

1

1

27

1

1

1

27

1

1

5

1

1

4

1

1

1

27

1

1

1

27

1

1

5

1

1

5

1

1

1

27

1

1

1

27

1

1

5

1

1

6

1

1

1

27

1

1

1

28

1

4

1

4

1

1

1

25

1

1

1

25

3

1

1

4

1

1

1

25

1

1

1

25

1

4

1

1

1

26

1

1

1

26

5

1

1

1

26

1

1

1

26

1

1

1

1

1

1

1

3

1

6

1

1

7

1

6

1

1

1

26

1

1

1

27

1

4

1

4

1

1

1

25

1

1

1

27

6

1

7

1

1

1

27

1

1

1

28

1

1

27

1

1

27

1

1

1

1 1

1

5

1

1 1

1

5

As análises nesta secção levam em conta estas três limitações. A base de dados é reduzida aos entrevistados que tem preferência partidária, que recordam da sua escolha eleitoral e cujos partidos apresentaram candidatos. Podemos agora voltar à questão do impacto da identificação partidária sobre a escolha eleitoral. Para os simpatizantes que votaram em determinado candidato e que tiveram a chance de votar em um candidato do seu partido há duas possibilidades: ou votaram neste candidato ou o preteriram em função de um candidato de outro partido. No primeiro caso podemos falar de um voto congruente. A tabela 4 identifica quantos dos simpatizantes votam no partido de sua preferência para os cinco cargos disputados. A taxa de adesão é grande para as eleições presidenciais (83%), mas apresenta um índice bem menor para as eleições dos outros cargos. Somente metades dos simpatizantes orientam seu voto a governador em

função da preferência partidária. Nas eleições para o Senado esta taxa cai para um terço e para deputado federal e estadual para um quarto. Isto mostra que a identificação partidária tem significado parcial sobre as escolhas eleitorais no Brasil. Enquanto ela influencia fortemente as eleições presidenciais o seu impacto sobre a escolha dos outros cargos é reduzido.

Tabela 4: Taxa de congruência entre identificação partidária e voto nas eleições 2014 Simpatizantes votam no ... Presidente? ... Governador? ... Senador? ... Deputado ... Deputado candidato do partido a ... Federal? Estadual? não sim

17% 83%

43% 57%

66% 34%

75% 25%

No próximo passo aprofundamos as análises sobre a congruência entre identificação partidária e escolha eleitoral em duas dimensões. Primeiro queremos saber se esta congruência depende de outros fatores. Há diferenças entre as regiões, entre capital e interior, a situação socioeconômica dos entrevistados ou as suas características demográficas importam? A segunda questão diz respeito a diferenças entre os simpatizantes de diferentes partidos políticos. Analisamos se os simpatizantes dos três partidos PT, PSDB e PMDB apresentam taxas de congruência diferente em relação aos simpatizantes de todos os outros partidos. Para isto criamos variáveis dummy para estes três partidos, mantendo os partidos restantes como categoria de referencia. A tabela 5 compila os resultados das cinco regressões logísticas separadas para explicar a congruência do voto. As primeiras três variáveis explicativas dizem respeito aos simpatizantes dos partidos PT, PMDB e PSDB. As variáveis restantes testam o impacto de fatores como região, status socioeconômico e pefil demográfico dos entrevistados. Nas eleições para a Presidência da República os simpatizantes do PT tiveram 38,3 mais chance de votar na candidata do seu partido em comparação com os outros partidos. Os simpatizantes do PSDB tiveram apenas 10,7 vezes chance de votar no seu candidato. Como os simpatizantes do PMDB não puderam votar no seu candidato, não incluídos na avaliação.1 Também é interessante ressaltar que o fator religião (neste caso: pertencer a uma igreja evangélica) influencia negativamente a propensão de seguir a identificação partidária, reduzindo a probabilidade para a metade (0,5). Nenhum outro fator (incluindo a região) teve um impacto significativo sobre a congruência entre identificação partidária e escolha eleitoral lãs eleições presidenciais. No caso das eleições para governador e para senador os resultados são parecidos para o PSDB cujos simpatizantes votam mais do que simpatizantes dos outros partidos no respectivo 1

Uma possibilidade seria incluir os candidatos a vice (na eleição para presidente e governador) e os suplentes (na eleição para senador) nas opções válidas para os simpatizantes dos partidos. Mas nem sempre os vices tem visibilidade na eleição e os suplentes para o senado são desconhecidos para o eleitor comum. Optamos por incluir somente os candidatos principais.

76% 24%

candidato do seu partido a governador (19,4 vezes) e a senador (31,1 vezes). A situação dos simpatizantes do PT é radicalmente diferente. Entretanto, para as eleições de governadores, o fato do eleitor ser PTistas não o diferencia do comportamento observado para o restante dos partidos. Para as eleições a senador não há diferenças estatisticamente significativas em relação ao voto congruente quando comparamos eleitores simpatizantes do PSDB e do PT com os simpatizantes dos outros partidos. No caso dos simpatizantes do PMDB não houve nenhuma diferença significativa em relação à eleição de políticos do mesmo partido para nenhum dos cargos. Este resultado confirma as análise de Melo e Camara (2012) que identificam estratégias diferentes dos partidos brasileiros para a disputa eleitoral nos diferentes âmbitos federativos. Para o caso do PT os autores identificam uma estratégia histórica de priorização das eleições presidenciais na mobilização política do eleitorado. As eleições subnacionais são mais importantes para outros partidos. A análise da importância do partidarismo para as eleições nacionais e estaduais confirma estes resultados. Nas eleições para deputado estadual o partidarismo tem impacto reduzido e no caso do PT até negativo sobre o voto. Os simpatizantes do PT têm menos probabilidade de votar em um candidato do partido em comparação com os partidários de outros partidos. Para os simpatizantes dos outros partidos não há impacto significativo do partidarismo sobre a escolha do voto. Para os simpatizantes do PSDB e PMDB a força do partidarismo nas eleições legislativas não é diferente do restante dos partidos. Outro resultado interessante é que o impacto do partidarismo sobre o comportamento eleitoral nestas eleições subnacionais tende a ser mais forte no Sudeste, a categoria de referencia. Em todas as outras regiões há uma menor probabilidade de orientar o voto pela identidade partidária. A exceção é o Nordeste onde o partidarismo orienta o voto a governador cinco vezes mais do que no Sudeste. Finalmente cabe ressaltar que o fator religião perde a sua importância nas eleições aos outros cargos, exceto nas eleições para presidente. Isto sugere que o impacto sobre as eleições para presidente em parte são resultado direto da candidatura de duas figuras ligadas às igrejas evangélicas (Marina da Silva e Pastor Everaldo).

Tabela 5: Regressão logística para explicar o voto congruente dos simpatizantes para vários cargos Voto Presidente

Simpatizantes PT Simpatizantes PMDB Simpatizantes PSDB Região Norte Região Nordeste Região Sul Região Centrooeste Contexto (capital=1) Genero (mulher=1) Cor (Branco=1) Idade (acima 40=1) Escolaridade (2grau ou mais=1) Estado civil (casado=1) Religião (evangélico=1) Renda (acima 2 sm=1) Classe subjetiva (subiu=1) Recebe bolsa família (sim=1) Informação política (alta=1) Contatado por político (sim=1) Engajamento político (alto=1) Constante

38,3 *** 10,7 0,5 0,5 0,9 2,4 1,1 0,6 1,3 1,2 1,3 0,8 0,5 0,9 0,8 1,4 1,2 0,6 1,0 0,6

*** *

*

**

*

Voto Governador

2,9 1,9 19,4 0,6 5,5 0,3 0,2 1,0 1,0 1,2 1,2 0,7 0,6 0,8 1,4 0,7 0,8 1,3 0,8 1,5 0,4

** *** *** *** **

Voto Senador

2,4 4,8 31,1 0,1 0,2 0,3 0,1 1,5 1,1 1,3 1,2 1,3 0,8 0,8 1,5 0,7 0,7 1,4 0,6 1,4 0,1

* *** ** *** ** ***

* **

Voto Dep.Fed.

2,3 3,0 1,3 0,5 0,5 0,5 0,5 1,2 1,0 1,2 1,0 0,8 0,8 1,1 0,8 1,0 0,8 2,2 1,4 0,9 0,2

* *

**

**

**

Voto Dep.Est.

0,3 ** 0,9 0,4 1,4 0,7 0,4 2,5 2,6 ** 0,6 0,7 1,7 0,7 0,8 1,5 2,1 * 1,7 0,7 1,3 1,1 0,6 0,5

A mediação do impacto da identidade partidária sobre o voto A segunda forma de relacionar a identificação partidária com outros fatores explicativos é tratando-os como mediadores para a identificação. Aqui a ideia é que a identificação não atua da mesma forma para os diferentes grupos. Enquanto para alguns estratos sociais a identificação é um atalho informacional importante para o voto, para outros ela é apenas uma entre várias fontes alternativas de informação e avaliação das opções políticas atuais. Esta ideia já estava presente na concepção de Lazarsfeld, um dos pais do conceito da identificação partidária. Segundo ele a identificação poderia ter origem tanto em um conjunto de convicções políticas, expressas também no partido, como também na rotinização pouco refletida de padrões de votação que depois ganha a etiqueta de afinidade partidária. A hipótese do impacto mediado da identificação tinha sido proposta por Balbachevsky (1992) que argumentou que eleitores pobres e menos instruídos provavelmente levariam mais em conta as orientações políticas dos seus partidos. Não se trata de identificar o perfil dos simpatizantes ou analisar as causas da identificação partidária, mas de analisar se o atalho informacional é mais importante para alguns grupos em comparação com outros. Com o intuito de testar esta hipótese incluímos variáveis na nossa análise que podem servir como

proxies para este conceito da escassez de recursos intelectuais e materiais que aumentariam a importância da identificação partidária. Dessa forma, no primeiro grupo - aqueles que detém maiores recursos alternativos de informação - esperamos que sejam cidadãos mais informados e dotados de mais recursos. No segundo caso seriam cidadãos com atributos contrários. Estes simpatizantes pragmáticos seguem a orientação do seu partido sem pode recorrer a outras fontes de informação. Eles também podem se sentir na dependência do partido político que protege os benefícios dos programas de acesso a recursos públicos. A variável escolaridade capta a primeira dimensão da autonomia intelectual, as variáveis renda e bolsa família captam a autonomia financeira. A tabela 6 mostra vários modelos para avaliar o impacto da identidade partidária sobre o voto para presidente em 2014. No primeiro modelo são incluídas as variáveis da identificação partidária e outras variáveis de controle que dizem respeito ao perfil sócio-demográfico do entrevistado ou ao contexto da eleição. Nos próximos três modelos incluímos uma variável de interação entre partidarismo pró-PT e escolaridade, bolsa família e renda, sucessivamente. Nos últimos três modelos o partidarismo analisado se refere ao PSDB, com interações sucessivas desta variável com escolaridade, bolsa família e renda. Os resultados apontam interações significativas entre a identificação partidária e as variáveis indicando dependência econômica. Os beneficiários do programa bolsa família simpatizantes do PT tem cinco vezes mais probabilidade de votar no candidato do seu partido do que outros beneficiários nos candidatos dos seus respectivos partidos. No caso dos simpatizantes do PSDB o efeito da mediação é inverso. Estes tem menos chance de seguir seu partido em comparação com os simpatizantes beneficiários restantes. No caso da renda o efeito é inverso. No grupo dos entrevistados ganhando acima de 2 salários mínimos o partidarismo tem um efeito catalisador no caso dos PSDBistas. Na situação contrária os PTistas mais abastados tem menos propensão de votar no candidato do seu partido. As interações com a variável que capta os recursos intelectuais, a instrução, não rendeu resultados significativos. Isto significa que os partidários do PT que completaram o ensino médio não apresentaram um impacto diferente da identificação partidária sobre o voto em comparação com os menos instruídos. Em comparação os partidários do PSDB mais instruídos foram mais consequentes na escolha do voto para presidente em comparação com os menos instruídos.

Tabela 6: Regressão logística com interação para explicar o voto congruente dos simpatizantes para presidente

Simpatizantes PT

Exp(B ) 36,62

Exp(B) 24,74 ** *

Simpatizantes PSDB

11,16

11,77 ** *

Contexto (capital=1) Genero (mulher=1) Cor (Branco=1) Idade (acima 40=1) Escolaridade (2grau ou mais=1) Estado civil (casado=1) Religião (evangélico=1) Renda (acima 2 sm=1) Classe subjetiva (subiu=1) Recebe bolsa família (sim=1) Informação política (alta=1) Contatado por político (sim=1) Engajamento político (alto=1) Bolsa família by Simpatizantes PT Renda by Simpatizantes PT

1,03 0,61 * 1,53 1,22 1,36 0,81 0,48 **

1,12 0,62 1,50 1,23 1,30 0,77 0,47

1,04 0,72 1,22 1,18 0,61 * 1,00

1,02 0,69 0,47 1,12 0,63 1,09

Exp(B)

Exp(B) 34,70

** 129,99 ** ** ** * * * * 13,81 12,11 17,53 ** ** ** ** * * * * 1,09 1,04 1,08 * 0,64 0,61 * 0,65 1,44 1,51 1,45 1,13 1,25 1,25 1,29 2,44 1,35 0,80 0,81 0,77 ** 0,44 ** 0,47 ** 0,45 ** 2,89 ** 0,70 1,22 1,20 0,62 * 0,96

1,03 0,74 1,25 1,15 0,59 * 1,05

1,03 0,73 2,13 * 1,11 0,63 1,10

Exp(B) 30,90 ***

3,10

32,45 ** * * 4,26 **

1,05 0,63 1,38 1,16 1,32 0,79 0,44 *** 0,56 0,73 1,21 1,22 0,62 0,96

1,02 0,61 * 1,53 1,28 0,96 0,79 0,46 ** 1,02 0,75 1,25 1,15 * 0,59 * 1,08

4,97 ** ** 0,18 *

Escolaridade by Simpatizantes PT Bolsa família by Simpatizantes PSDB Renda by Simpatizantes PSDB Escolaridade by Simpatizantes PSDB Constante

Exp(B) 72,52

Exp(B )

0,42 ** 0,17 * 6,27 ***

0,38

0,48

0,18 **

0,23 *

0,33

0,70

Dinâmicas cognitivas: identidade partidária e clivagens políticas Finamente, uma outra dimensão onde a identificação partidária mostrou-se significativa diz respeito à compreensão que os eleitores têm da clivagem central que organiza a competição

3,33 * 0,53

eleitoral no Brasil. Ao longo da primeira década da Nova República a competição eleitoral no Brasil avançou de uma dinâmica policêntrica - que caracterizou as primeiras eleições presidenciais, quando os grandes partidos se enfrentavam com candidaturas próprias relativamente competitivas, para uma dinâmica bipolar (Lamounier & Meneguello 1986; Carreirão e Kinzo, 2004; Melo, 2010). Desde pelo menos as eleições presidenciais de 1994, a competição eleitoral para a Presidência da República convergiu para opor duas alianças partidárias relativamente estáveis: aquela organizada em torno das candidaturas apresentadas pelo PSDB e outra organizada em torno das candidaturas apresentadas pelo PT2. O questionário utilizado pelo ESEB para as eleições de 2014 incorpora uma questão que, indiretamente, permite mensurar em que medida essa polarização organiza a percepção que o eleitorado tem sobre a competição eleitoral. Nessa questão solicita-se ao eleitor que avaliasse, atribuindo uma nota de 0 a 10, o quanto ele - eleitor - gostava ou não de algumas lideranças expressivas da política nacional, entre eles, os principais candidatos presentes disputa eleitoral para presidente em 2014. Como se pode observar na tabela 7, abaixo, essa questão capta a visibilidade da disputa eleitoral. Não apenas as três candidaturas mais relevantes no primeiro turno - Marina, Dilma e Aécio - tiveram uma proporção muito maior de eleitores que souberam reconhecer e se dispuseram a avaliar, como também a dispersão dessas avaliações, medida pelo desvio padrão ajustado pela média, é significativamente menor para essas três candidaturas, quando comparado com os resultados para os outros nomes.

Tabela 7: Distribuição da avaliação dos candidatos à Presidência da República

Casos

Válidos Perdas

Média Desvio padrão Desvio Padrão/Média Fonte: Eseb 2014

Gosta/Não Gosta/Não Gosta/Não Gosta/Não Gosta Gosta/Não Gosta Gosta Gosta Eduardo Jorge Gosta Aécio Neves Marina Silva Dilma Roussef Luciana Genro 2304 2258 2378 1343 1519 202 248 128 1163 987 5,08 4,77 5,80 2,96 3,25 3,321 2,908 3,487 2,607 2,717 0,64

0,60

0,60

0,90

0,84

Dessa forma, é possível tomar como referência as respostas dadas pelos entrevistados a essa questão para mensurar indiretamente em que medida a polarização PSDB-PT é reconhecida pelo eleitor, considerando simultaneamente a avaliação que ele dá para os candidatos desses dois partidos. A nova variável criada, que mensura a distância percebida pelo eleitor entre as duas candidaturas, é resultado da subtração da "nota" que o eleitor atribui a Dilma Roussef (candidata do PT) da nota que o mesmo eleitor atribuiu a Aécio Neves (candidato do PSDB) No quadro 8, abaixo, comparamos a distância que o eleitor percebe entre essas duas candidaturas, quando se controla a identidade partidária do eleitor.

2

Ainda que, como bem alerta Carreirão (2014), essa estabilidade não se reproduz nas disputas eleitorais para outros níveis, notadamente para outros cargos majoritários, isto é, para os governos de estados e para as prefeituras.

Tabela 8: Distância percebida entre as candidaturas de Aécio Neves (PSDB) e Dilma Roussef (PT), controlada pela identidade partidária Identidade partidária

Mean

N Std. Deviation

PMDB 1,8343 77 5,62109 PSDB 5,6731 163 3,84561 PT -5,3638 421 3,64749 Outros partidos -,0718 167 5,72592 sem preferência -,1751 1455 4,87320 Total -,6394 2283 5,42213 Intervalo da distância: +10 a - 10,onde valores próximos a Zero indicam que o eleitor atribuiu notas semelhantes às duas candidaturas. Valores positivos indicam que a avaliação dada à candidatura de Aécio Neves é maior do que a dada a Dilma e vice-versa, valores negativos indicam que a avaliação de Dilma foi maior do a dada para Aécio Neves. Análise de Variância: F=189,251, sig. 0,000, eta2= 0,249 Fonte:ESEB, 2014 Como se vê na tabela 8, eleitores identificados com os dois partidos que estruturam a polarização da competição eleitoral no nível presidencial, reproduzem essa polarização na sua percepção da distância relativa das duas candidaturas: Os eleitores identificados com o PSDB avaliam positivamente o candidato de seu partido e, simultaneamente, avaliam negativamente a candidata do PT. Da mesma forma, eleitores identificados com o PT avaliam positivamente a candidata do seu partido e negativamente a candidatura do PSDB. Entretanto, essa distância é significativamente menor entre os eleitores identificados com o PMDB, como outros partidos e entre aqueles que não tem identificação partidária. Eleitores com esses perfis tenderam a atribuir notas semelhantes para as duas candidaturas, e portanto, revelam menor sensibilidade para a principal polarização que vem organizando a competição eleitoral para a presidência da república no Brasil desde 1994. Poder-se-ia, entretanto, objetar que o reconhecimento dessa polaridade tem escasso significado em termos da decisão de voto do eleitor. Entretanto, quando essa polarização é reproduzida na retrospectiva das escolhas para as eleições de 2010 e 2014, para as quais o questionário reúne informação, verificamos que a percepção dessa polarização é central para sustentar essas escolhas entre os dois turnos das eleições e mesmo entre anos eleitorais (Tabela 9, abaixo). Para reconstituir a retrospectiva do voto, consideramos as informações que o entrevistado deu para o seu voto nos dois turnos das eleições de 2014 e de 2010. Essas informações foram recodificadas para identificar se, em cada eleição, o entrevistado votou no candidato do PT, no candidato do PSDB ou em candidatos de outros partidos (primeiro turno), ou ainda votou em branco ou anulou o voto. As informações dadas por cada eleitor para as duas eleições foram pareadas e os resultados nos permitem identificar 5 diferentes perfis: eleitores que nas quatro chances de exprimir seu voto, o fizeram votando sempre em candidaturas do PSDB ou sempre em candidaturas do PT; eleitores que em uma dessas eleições votaram no PSDB e em outras num outro partido (ou deram voto nulo ou em branco), mas nunca cruzaram a linha da

polarização PT X PSDB; eleitores que em uma das eleições votaram no PT, e em outras votaram em outros partidos (ou deram voto nulo ou em branco), mas que, ainda assim, também não cruzaram a linha que distingue PT do PSDB e, finalmente, eleitores cujas opções eleitorais, seja entre turnos da mesma eleição ou entre diferentes eleições, cruzaram a linha da polarização: isto é, declararam que em alguma(s) oportunidade(s) votaram no PT, e em outra(s), no PSDB. Tabela 9: Distância entre as candidaturas PSDB-PT e retrospectiva do voto Distância entre a nota dada ao candidato do PSDB e a nota dada à candidata do PT, 2014 (positivo: nota maior para o PSDB, negativo, nota maior para o PT) Retrospectiva de voto Mean N Std. Deviation para a presidência, 2014 e 2010 (dois turnos) Só votou PSDB 5,8399 213 3,35869 PSDB e outros, exceto PT 4,8035 126 3,62158 PSDB e PT ,5978 450 4,48065 PT e outros, exceto PSDB -2,5305 63 3,35920 Só votou PT -4,8437 659 3,46259 Total -,8180 1510 5,56857 2 Teste ANOVA: f=438,03, sig. 0,000, eta =0,538 Fonte: ESEB, 2014 A tabela 9, acima, mostra que a associação entre essas duas dimensões é impressionante. O reconhecimento da polarização - expresso na forma como o eleitor avalia simultaneamente as candidaturas do PSDB e PT em 2014 - está forte e significativamente associado à perfis de escolhas eleitorais que se sustentam ao longo do tempo. A análise de variância (ANOVA) mostra que nada menos que 54% da variância observada para a variável "distância da avaliação" está associada ao padrão de escolha expresso por esses eleitores. Dessa forma, eleitores que distinguiram e favoreceram em sua avaliação o candidato do PSDB são também aqueles que sustentam o voto nesse partido ao longo do tempo ou então, mesmo quando votam em outros partidos, não cruzam a linha de polarização que distingue PT e PSDB em nosso sistema político. De outro lado, eleitores que avaliaram melhor a candidata do PT, tenderam a reproduzir o voto no PT todas as vezes que compareceram à sua seção eleitoral ou, quando votam em candidatos de outros partidos, ainda sim nunca cruzam a distância que separa PSDB e PT. Finalmente, os eleitores que tenderam a dar avaliações próximas aos dois candidatos são também aqueles que cruzam a linha de polarização, ora votando na candidata do PT, ora votando em candidatos do PSDB. Considerando a hipótese do impacto mediado da identificação tinha sido proposta por Balbachevsky (1992) que supõe que a identificação partidária, como um atalho informacional, é mais relevante para eleitores com menores recursos cognitivos do que para eleitores com acesso a um maior número de canais de informação, produzimos a análise de regressão logística binária abaixo, que avalia o quanto a identificação partidária aumenta a probabilidade da fidelização do voto do eleitor (escolha de candidatos do mesmo partido em todas as

oportunidades), para eleitores de alta e baixa escolaridade, controlando algumas das dimensões que a literatura reconhece como sendo mais relevantes para se entender a opção do eleitor.

Tabela 10: Regressão Logística para analisar o impacto da identidade partidária e a fidelidade no PT e no PSDB nas eleições de 2010 e 2014, controlado por outras variáveis relevantes e estratificada por nível de escolaridade Identidade com o PT e voto fiel ao PT, eleições de 2010 e 2014, 1º e 2º turnos Educação menor do que ensino B S.E. Wald df Sig. Exp(B) médio Identidade com o PT 1,919 ,264 52,890 1 ,000 6,811 Região de Moradia: SUL e -,406 ,214 3,586 1 ,058 ,667 SUDESTE (sim) Faixa de Renda (acima de -,565 ,206 7,538 1 ,006 ,568 2 SM) a Step 1 Idade (acima de 40)) -,004 ,233 ,000 1 ,987 ,996 Classe subjetiva (subiu) ,013 ,229 ,003 1 ,954 1,013 Bolsa Família (sim) ,445 ,209 4,538 1 ,033 1,560 Informação política (sim) -,154 ,200 ,593 1 ,441 ,857 Constant ,152 ,278 ,298 1 ,585 1,164 Educação: ensino médio e mais B S.E. Wald df Sig. Exp(B) Identidade com o PT 2,943 ,280 110,520 1 ,000 18,978 Região de Moradia: SUL e -,656 ,168 15,151 1 ,000 ,519 SUDESTE (sim) Faixa de Renda (acima de -,437 ,180 5,874 1 ,015 ,646 2 SM) a Step 1 Idade (acima de 40)) ,167 ,169 ,978 1 ,323 1,182 Classe subjetiva ( subiu) ,053 ,177 ,089 1 ,766 1,054 Bolsa Família (sim) ,190 ,193 ,973 1 ,324 1,209 Informação política (sim) -,389 ,167 5,403 1 ,020 ,678 Constant -,054 ,221 ,059 1 ,808 ,948 Identidade com o PSDB e voto fiel ao PSDB, eleições de 2010 e 2014, 1º e 2º turnos Escolaridade abaixo do ensino B S.E. Wald df Sig. Exp(B) médio Identidade com o PSDB 2,392 ,532 20,192 1 ,000 10,930 Região de Moradia: SUL e 1,165 ,399 8,521 1 ,004 3,204 SUDESTE (sim) Faixa de Renda (acima de ,824 ,339 5,929 1 ,015 2,280 2 SM) a Step 1 Idade (acima de 40)) ,547 ,453 1,463 1 ,227 1,729 Classe subjetiva ( subiu) -,330 ,385 ,735 1 ,391 ,719 Bolsa Família (sim) -,211 ,347 ,370 1 ,543 ,810 Informação política (sim) -,328 ,310 1,120 1 ,290 ,721 Constant -3,682 ,562 42,945 1 ,000 ,025

Escolaridade: ensino médio e mais Identidade com o PSDB Região de Moradia: SUL e SUDESTE (sim) Faixa de Renda (acima de 2 SM) Step 1a Idade (acima de 40)) Classe subjetiva ( subiu) Bolsa Família (sim) Informação política (sim) Constant

B 1,607

S.E. ,274

Wald 34,506

1,286

,268

,588 -,332 -,893 -,490 ,384 -3,151

df 1

Sig. ,000

Exp(B) 4,987

22,997

1

,000

3,617

,278

4,486

1

,034

1,800

,216 ,256 ,284 ,231 ,365

2,362 12,200 2,982 2,764 74,375

1 1 1 1 1

,124 ,000 ,084 ,096 ,000

,717 ,409 ,613 1,468 ,043

Fonte:ESEB, 2014

Essa tabela foi construída em duas etapas: primeiramente avaliamos o impacto da identidade partidária com o PT na fidelização do voto nesse partido, para eleitores de baixa e alta escolaridade; e, em segunda, consideramos o efeito da identidade partidária com o PSDB na fidelização do voto a esse partido. Como é possível observar, quando controlamos outras variáveis relevantes, a identidade partidária do eleitor é um fator significativo para explicar a emergência de um padrão fiel de votação. Entre os eleitores com baixa escolaridade, um eleitor identificado com o PT tem 7 vezes mais chances de manter-se votando em candidatos do seu partido em diferentes votações do que escolher um candidato de outro partido ou votar em branco ou anular o voto. Nesse grupo, as outras variáveis significativas que aumentam as chances de uma escolha fiel ao PT são faixa de renda (renda mais alta diminui as chances de uma sequência de votos no PT) e bolsa família. Como indica a literatura, o acesso à bolsa-família aumenta um pouco as chances desse padrão de votação, embora muito menos do que a identidade partidária. Entre os eleitores de mais alta escolaridade, os eleitores que expressaram uma identidade com o PT tem 19 vezes mais chances de manter esse padrão de votação do que desertar seu partido em alguma votação. Como se vê, no caso dos eleitores de maior renda, a identidade com o PT tem um impacto maior nas chances de um padrão de votação fiel ao partido do que entre os eleitores de baixa renda. Por outro lado, entre os eleitores de nível educacional mais alto, morar nas regiões sul e sudeste, renda mais alta e maior informação são variáveis que contribuem para diminuir as chances de que o eleitor apresente um padrão de votação fiel ao PT. Da mesma forma, entre eleitores de baixa escolaridade, eleitores identificados com o PSDB tem 11 vezes mais chances de manter um padrão estável, votando sempre em candidatos do seu partido do que romper esse padrão, escolhendo um candidato de outro partido ou votando branco ou nulo em uma eleição. As chances de que esse padrão de votação se verifique também são reforçadas pela condição de moradia nas regiões sul e sudeste, e renda maior do que dois salários mínimos Finalmente, entre os eleitores de maior escolaridade, as chances de que o eleitor se mantenha fiel ao seu partido é quase 5 vezes maior do que as chances de que ele apresente um histórico de votação heterogêneo. Entre esses eleitores, morar nas regiões sul e sudeste e ter uma

renda acima de dois salários mínimos também aumentam as chances de que o eleitor escolha sempre candidatos de seu partido. Por outro lado, nessa parcela da população, a percepção subjetiva de ter experimentado um processo de ascensão social diminui as chances desse padrão de votação, embora não aumente as chances de um voto fiel ao PT. Finalmente, os resultados conjuntos da tabela 10 confirmam a hipótese de Balbachevsky (1992), com uma modulação importante para os dois partidos. A identidade do PSDB tem, de fato, um impacto maior na sustentação da fidelidade dos eleitores menos escolarizados com os candidatos do PSDB. Neste caso ela é mais alta entre os eleitores de menor escolaridade, como previsto. Já para explicar a fidelidade para com o PT, ocorre o inverso. A identidade partidária tem um impacto mais forte entre os eleitores com alta escolaridade. Para os PTistas de menor escolaridade a identificação partidária não funcionar como atalho informacional. Mas a descoberta que o impacto da identidade partidária sobre o comportamento eleitoral depende não somente da escolaridade dos cidadãos, mas apresenta dinâmica diferente para PTistas e PSDBistas indica um campo rico para futuras pesquisas sobre o fenômenos do partidarismo no Brasil.

Conclusão Esse estudo analisou os impactos da identificação partidária nas eleições de 2014, buscando identificar seu impacto nas atitudes e valores sustentados pelos eleitores e quais seus reflexos sobre a decisão de voto desses eleitores . Embora a proporção de eleitores simpatizantes de partidos venha experimentando quedas sucessivas desde pelo menos o final dos anos noventa, ainda assim consideramos relevante entender o que está por trás da decisão de um entrevistado de responder positivamente quando indagado se ele gosta de algum partido. Sendo assim, avaliamos se a identificação partidária ajuda a entender o processo eleitoral no Brasil a partir de duas perspectivas. Em primeiro lugar, em que medida essa informação permite entender o voto, e, em segundo lugar, qual a relação entre a identidade partidária e atitudes e opiniões expressas pelos eleitores. Para responder à primeira das duas questões, analisamos a extensão do partidarismo no Brasil e suas consequências para a escolha eleitoral no pleito de 2014. Diferentemente de outros estudos anteriores analisaremos o impacto do partidarismo sobre todas as eleições para os cinco cargos diferentes. Nessa perspectiva, os resultados desse estudo mostram que, tal como em outros países, também aqui a identificação partidária tem um impacto positivo e significativo na probabilidade de que o eleitor compareça para a votação. Por outro lado, considerando o impacto da identificação partidária sobre a escolha eleitoral, constatamos que a identidade partidária foi mais importante nas eleições para a Presidência da República, onde os simpatizantes do PT tiveram 38,3 mais chance de votar na candidata do seu partido em comparação com os outros partidos. Os simpatizantes do PSDB tiveram 10,7 vezes chance de votar no seu candidato. No caso das eleições para governador e para senador os eleitores simpatizantes do PSDB apresentam um perfil similar: aqui, outros partidos no respectivo candidato do seu partido a governador (19,4 vezes) e a senador (31,1 vezes). A situação dos simpatizantes do PT é radicalmente diferente. Para as eleições de governadores, o fato do eleitor ser PTistas não o diferencia do comportamento observado para o restante dos partidos. Para as eleições a

senador não há diferenças estatisticamente significativa em relação ao voto congruente quando comparamos eleitores simpatizantes do PSDB e do PT com os simpatizantes dos outros partidos. No caso dos simpatizantes do PMDB não houve nenhuma diferença significativa em relação à eleição de políticos do mesmo partido para nenhum dos cargos. Outro resultado interessante é que o impacto do partidarismo sobre o comportamento eleitoral nestas eleições subnacionais tende a ser mais forte no Sudeste. Nas eleições para deputado estadual o partidarismo tem impacto reduzido e no caso do PT até negativo sobre o voto. Os simpatizantes do PT têm menos probabilidade de votar em um candidato do partido em comparação com os partidários de outros partidos. Para os simpatizantes do PSDB e PMDB a força dessa identidade nas eleições legislativas não é diferente dos outros partidos. A segunda forma de relacionar a identificação partidária com outros fatores explicativos é tratando-os como mediadores para a identificação. Aqui a ideia é que a identificação não atua da mesma forma para os diferentes grupos. Enquanto para alguns estratos sociais a identificação é um atalho informacional importante para o voto, para outros ela é apenas uma entre várias fontes alternativas de informação e avaliação das opções políticas atuais. Essa perspectiva busca analisar se o atalho informacional representado pela identificação partidária é mais importante para alguns grupos em comparação com outros, e, portanto, com mais consequências para o comportamento eleitoral. Em nosso estudo, A variável escolaridade capta a dimensão da autonomia intelectual, enquanto que as variáveis renda e bolsa família captam a autonomia financeira. Os resultados de nossas análises apontam interações significativas entre a identificação partidária e condições de dependência econômica. Os beneficiários do programa bolsa família simpatizantes do PT tem cinco vezes mais probabilidade de votar no candidato do seu partido do que outros beneficiários, de votar nos candidatos dos seus respectivos partidos. No caso dos simpatizantes do PSDB o efeito da mediação é inverso. Eleitores identificados com esse partido e em condição de dependência econômica têm menos chance de seguir seu partido em comparação com os simpatizantes beneficiários restantes. No caso da renda o efeito é inverso. No grupo dos entrevistados ganhando acima de 2 salários mínimos o partidarismo tem um efeito catalisador no caso dos PSDBistas. Na situação contrária os PTistas mais abastados tem menos propensão para votar no candidato do seu partido. As interações com a variável que capta os recursos intelectuais, a instrução, apontam na mesma direção. Entre os PSDBistas o partidarismo tem mais influencia sobre o comportamento eleitoral para os menos instruídos. Entre os PTistas o partidarismo impacta mais entre os mais escolarizados. As interações nas duas tabelas 6 e 10 apontam na mesma direção, mas apenas na última tabela ambas as interações são significativas. A última dimensão analisada nesse estudo é o impacto da identificação partidária na compreensão que os eleitores têm da clivagem central que organiza a competição eleitoral no Brasil. Como se sabe, ao longo da primeira década da Nova República a competição eleitoral no Brasil avançou de uma dinâmica policêntrica - que caracterizou as primeiras eleições presidenciais, quando os grandes partidos se enfrentavam com candidaturas próprias relativamente competitivas, para uma dinâmica bipolar. Desde pelo menos as eleições presidenciais de 1994, a competição eleitoral para a Presidência da República convergiu para

opor duas alianças partidárias relativamente estáveis: aquela organizada em torno das candidaturas apresentadas pelo PSDB e outra organizada em torno das candidaturas apresentadas pelo PT. Nosso estudo buscou explorar em que medida a identificação partidária importa para a compreensão que o eleitor têm dessa clivagem e em que medida a percepção dessa clivagem importa para a decisão de voto do eleitor. Os resultados de nosso estudos mostram que os eleitores identificados com os dois partidos que estruturam a polarização da competição eleitoral no nível presidencial, reproduzem essa polarização na sua percepção da distância relativa das candidaturas apresentadas por esses partidos na eleição presidencial de 2014. Já entre os identificados com o PMDB, com outros partidos e entre aqueles que não tem identificação partidária, a distância relativa entre as duas candidaturas é menor. Eleitores com esses perfis tenderam a atribuir notas semelhantes para as duas candidaturas, e portanto, revelam menor sensibilidade para a principal polarização que vem organizando a competição eleitoral para a presidência da república no Brasil desde 1994. Por outro lado, essa dimensão - distância relativa entre as candidaturas - mostrou-se fortemente relacionada com o padrão de votação expresso pelos eleitores, quando consideram simultaneamente os votos dados nos dois turnos das eleições presidenciais de2010 e 2014. Para essa análise, identificamos 5 perfis de comportamento retrospectivo: eleitores que nas quatro chances de exprimir seu voto, o fizeram votando sempre em candidaturas do PSDB ou sempre em candidaturas do PT; eleitores que em uma dessas eleições votaram no PSDB e em outras num outro partido (ou optaram pelo voto nulo ou em branco), mas ainda assim nunca cruzaram a linha da polarização PT X PSDB; eleitores que em uma das eleições votaram no PT, e em outras votaram em outros partidos (ou deram voto nulo ou em branco), mas que também não cruzaram a linha que separa o PT do PSDB e, finalmente, eleitores cujas opções eleitorais, seja entre turnos da mesma eleição ou entre diferentes eleições, cruzaram a linha da polarização: isto é, declararam que em alguma(s) oportunidade(s) votaram no PT, e em outra(s), no PSDB. Um resultado significativo que obtivemos é que essas diferentes estratégias de voto estão fortemente associadas à percepção que o eleitor tem da clivagem político-partidária. Assim, eleitores que distinguiram e favoreceram em sua avaliação o candidato do PSDB são também aqueles que sustentam o voto nesse partido ao longo do tempo ou, mesmo quando votam em outros partidos, não cruzam a linha de polarização que distingue PT e PSDB Da mesma forma, eleitores que avaliaram melhor a candidata do PT, tenderam a reproduzir o voto no PT todas as vezes que compareceram à sua seção eleitoral ou, quando votam em candidatos de outros partidos, ainda sim também não cruzam a distância que separa PSDB e PT. Já os eleitores que tenderam a dar avaliações próximas para os dois candidatos são também aqueles que cruzam a linha de polarização, ora votando na candidata do PT, ora votando em candidatos do PSDB. Por fim, quando controlamos outras variáveis relevantes, a identidade partidária do eleitor é um fator significativo para explicar a emergência de um padrão fiel de votação. Entre os eleitores com baixa escolaridade, um eleitor identificado com o PT tem 7 vezes mais chances de manter-se votando em candidatos do seu partido em diferentes votações do que escolher um candidato de outro partido ou votar em branco ou anular o voto. Entre os eleitores de mais

alta escolaridade, aqueles que expressaram identidade com o PT tem 19 vezes mais chances de manter esse padrão de votação do que desertar seu partido em alguma votação. Da mesma forma, entre eleitores de baixa escolaridade, aqueles identificados com o PSDB têm 11 vezes mais chances de manter um padrão estável, votando sempre em candidatos do seu partido do que romper esse padrão, escolhendo um candidato de outro partido ou votando branco ou nulo em uma eleição. Entre os eleitores de alta escolaridade, entre, as chances de que o eleitor identificado com o PSDB se mantenha fiel ao seu partido é quase 5 vezes maior do que as chances de que ele apresente um histórico de votação heterogêneo. Portanto, os resultados de nosso estudo mostram que a identificação partidária é relevante no contexto brasileiro em diversas dimensões. Ela continua tendo um impacto diferenciado para a decisão de voto e está fortemente associada à compreensão que esse eleito tem das dinâmicas de competição política e eleitoral. Em que pese o declínio da identidade partidária no eleitorado brasileiro, a simpatia expressa por um dos partidos tem impacto relevante e significativo na percepção que o eleitor tem das dinâmicas da competição partidária e na sua decisão eleitoral.

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