Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! e o País da Piada Pronta: a importância da organização e estrutura na progressão textual

July 25, 2017 | Autor: Samira Spolidorio | Categoria: Humor, Gêneros Textuais, Linguística Textual
Share Embed


Descrição do Produto

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! e o País da Piada Pronta: a importância da organização e estrutura na progressão textual1 Samira Spolidório Resumo: Este artigo, situado dentro da visão sócio-cognitivista interacionista de linguagem, tem por objetivo investigar as estratégias de processamento textual, presentes nas colunas de variedades escritas por José Simão, o Macaco Simão, com ênfase na topicidade. Assim, a pergunta-problema que nos norteia é: Os escritos de José Simão podem ser considerados textos coesos e efetivos, ou são apenas listas de tópicos sobrepostos? Contrariando a suposição inicial, que tendia para a definição “lista de tópicos”, depois de análises de diferentes textos, chegou-se a conclusão que, devido a diversas outras estratégias que permeiam as colunas de José Simão, juntamente com o conceito de gênero textual, tais escritos são, sim, aceitos pelos leitores como sendo um texto efetivo e coeso, ou seja, uma unidade de sentido. Introdução Este trabalho tem por objetivo estudar aspectos dos processos de progressão textual, com enfoque na topicidade (JUBRAN, 2006) e a contribuição deste para a construção geral do sentido, ao fazer de uma seqüência lingüística, um texto de uso efetivo e interativo. Para isso, o corpus da pesquisa foi composto de colunas humorísticas de José Simão, o Macaco Simão, escritas entre 1989 e 1991, reunidas no livro “Macaco Simão no Cipó das Onze” (ILUMINURAS,1991) e também colunas coletadas do Jornal Folha de S. Paulo, entre 1º de fevereiro e 31 de março de 2007. Dentre elas, para este artigo, foram selecionadas apenas duas colunas retiradas do livro e uma coluna do jornal, nas quais serão, por meio de uma comparação entre as características mais relevantes, investigados os processos acima mencionados e como eles auxiliam na construção de sentido.

Pressupostos Teóricos A concepção de linguagem adotada por este estudo é perspectiva a sócio-cognitivista interacionista apresentada primeiramente por Bakhtin (1991) e, aqui, retratada por Marcuschi (2001) na qual a linguagem é vista como a ação que cria a interação social, e não apenas como um instrumento de comunicação ou representação do mundo. Dessa forma, também o léxico não pode ser entendido como apenas uma palavra que nomeia um objeto efetivamente presente no mundo, como se cada item lexical se limitasse a ser apenas uma etiqueta para os seres existentes (MARCUSCHI, 2004). Na verdade, o uso

1

O presente artigo foi produzido a partir de um estudo maior, realizado como requisito parcial para a conclusão do curso de licenciatura em Letras – Língua Portuguesa (UNIMEP, 2007), sob a orientação da professora doutora Elizabeth Maria Alcântara.

1

efetivo de um item lexical tem seu sentido construído pelos interlocutores durante o processo interativo, criando os chamados objetos-de-discurso (KOCH & ELIAS, 2006). Já o sociocognitivismo (KOCH, 2004) e a construção social da realidade (MARCUSCHI, 2006), trazem como contribuição a idéia de que a língua e os conhecimentos lingüísticos a ela relacionados são necessários para a interação/comunicação, mas não são suficientemente autônomos para garantir isso, assim como os outros fatores se considerados isoladamente também não o são. É o conjunto e a dinâmica desses vários fatores que importa, pois apenas conhecimento da língua, contexto e conhecimentos prévios não realizam o processo sozinhos. Quanto à topicidade, Jubran (2006) define o conceito de tópico discursivo como uma seqüência de referentes construídos durante a interação entre os sujeitos, numa organização linear e hierárquica dos tópicos desenvolvidos. A delimitação de um tópico discursivo gira em torno de um ponto em comum, um assunto a ser tratado e desenvolvido durante um trecho do texto, em especial com base nos conceitos de centração e organicidade. A centração depende, essencialmente, dos conceitos de “concernência, relevância e pontualização”. A concernência e a relevância trabalham na construção da unidade textual, a pontualização é responsável pela delimitação tópica, focalizando o final de um tópico e o início de outro, a partir da marcação desses conjuntos de referente ligados ao assunto desenvolvido no tópico em questão. A organicidade trata da relação entre os vários tópicos de um mesmo texto, de acordo com os critérios “hierarquia e linearidade”. A hierarquia é a passagem de tópicos com abordagens mais amplas e abrangentes para tópicos mais particulares. Já a linearidade é a seqüência direta dos tópicos que, dependendo da relação entre eles, pode apresentar “continuidade ou descontinuidade”. A continuidade é progressão tópica esperada, com o final de um tópico seguido pelo início de outro e a descontinuidade é uma interferência na progressão tópica, quando outro tópico é iniciado sem que o anterior tenha sido totalmente finalizado. A distribuição linear dos tópicos também pode ocorrer por transição, uma mudança gradual que se localiza entre a continuidade e a descontinuidade, evitando uma mudança tópica muito rápida que poderia prejudicar a coesão e a coerência do texto, e movimentação, é caracterizada por um “deslizamento” da centração do tópico para um dos aspectos do tópico. Outra característica do tópico discursivo apontada por Jubran (idem) são as marcas lingüístico-discursivas de delimitação tópica. Embora estas marcas apresentem uma 2

dificuldade para sistematização, elas, em geral, ajudam na delimitação do segmento tópico. Os marcadores discursivos funcionam como conectores e articuladores textuais, ajudando na construção de um texto mais coeso e coerente ao atuar na progressão textual.

Análise e Discussão Antes de partirmos efetivamente para a análise, é interessante apresentar, ainda que brevemente, o gênero aqui estudado. Baseado na concepção de gênero textual de Bakhtin (1991), podemos afirmar que as colunas de variedade, não só as escritas por Simão, mas também por outros autores como Tutty Vasquez e Millôr Fernandes, trazem como conteúdo temático as atualidades do país e, às vezes, também do mundo, englobando uma gama extremamente variada de assuntos. Quanto ao estilo, as colunas de variedades, em geral, apresentam forte marca da ironia e do sarcasmo para criticar ou satirizar os acontecimentos relatados. Já Simão, além dessa linha irônico-sarcástica, também apresenta uma forte influência da oralidade, presente em várias formas, como risadas, interjeições, citações diretas, construções em forma de diálogo e etc. A diferença de José Simão para os outros autores de colunas de variedades encontra-se na construção composicional, na qual, enquanto Tutty e Millôr, por exemplo, separam graficamente cada um dos vários temas tratados em suas colunas como sinais gráficos ou espaços em branco entre os diferentes assuntos tratados, nas colunas do Macaco Simão, podemos observar uma continuidade gráfica, na qual os diversos assuntos são reunidos em períodos que seguem períodos, formando parágrafos. E é sobre essa forma diferenciada de construção textual que esta análise pretende debruçarse, tentando averiguar como tantos tópicos diferentes podem ser sobrepostos, sendo ou não desenvolvidos no decorrer da coluna, e ainda sim, o produto final ser considerado um texto, entendido aqui como uma “unidade de sentido”. Para isso, é importante também salientar que a análise aqui desenvolvida foi dividida em partes, possibilitando a comparação entre as formas de “Introdução”, “Organização Tópica” e “Encerramento” das colunas antigas e das atuais, a fim de facilitar a visualização e compreensão.

-Introdução Embora atualmente José Simão tenha encontrado partes formulares para suas colunas, que hipoteticamente influenciam na leitura diária, uma vez que os textos apresentam vários elementos composicionais idênticos ou muito semelhantes, no início de sua carreira tal organização não estava presente. 3

Nas colunas antigas, podemos encontrar duas situações, a total ausência desta estrutura fixa inicial e a tentativa próxima de tal fórmula: “Eu quero meu dinheiro de volta!” (SIMÃO, 1991:19) “Gente, do mundo nada se leva! Chega de bode!” (SIMÃO, 1991:20) “Cabritas, do mundo nada se leva! Matei a coluna e fui ao show do Caetano” (SIMÃO, 1991:23) “Bom dia flor do dia!” (SIMÃO, 1991:24) e (SIMÃO, 1991:25) “Bomba! Bomba!” (SIMÃO, 1991:26)

Atualmente, esta variação não existe mais, uma vez que todas as colunas começam com a mesma introdução que o “chama” o leitor como a mesma fórmula fixa inicial: “BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta!”

- Organização Tópica Dentre as muitas características analisadas, o estilo e a temática foram os elementos que menos apresentaram variações nos mais de dezessete anos que separam cronologicamente os textos que compõem o corpus. Tanto a temática como o estilo irônico-sarcástico acompanham a tendência de outros escritores humorísticos como Millôr Fernandes e Tutty Vasquez que falam, basicamente, sobre atualidades, englobando assim um grande número de assuntos possíveis, como é próprio do gênero colunas de variedades. Mas diferentemente de José Simão, outros autores separam graficamente cada um dos vários temas tratados em suas colunas, utilizando para isso boxes gráficos, espaços em branco separando os diferentes assuntos, ou até mesmo enumerando os comentários como numa lista. Já nos textos do Macaco Simão, o que podemos observar é uma continuidade do texto, na qual os diversos assuntos são reunidos em períodos que seguem períodos, formando assim parágrafos que, por sua vez, criam um texto integral. Podemos perceber também a forte influência da oralidade presente quando o autor ri de suas próprias piadas, utilizando a expressão “Rarará”, ou quando acrescenta um comentário pessoal a uma citação ou a um acontecimento, ou na grafia de algumas palavras, na utilização de citações, expressões e marcadores lingüísticos mais comuns a língua oral, buscando o efeito de aproximação com o leitor, simulando um diálogo oral. Dessa forma, as marcas de oralidade também integram o processamento textual que auxilia o leitor da coluna e ler e compreender o texto de José Simão como “um todo de sentido”, uma vez que esta busca pelo efeito de aproximação do leitor faz com que o texto

4

seja lido de uma maneira contínua, apesar da rápida mudança tópica, como mostrado nos exemplos acima. Devido à grande variedade dos temas tratados, nenhuma das colunas se prende a um único tópico. As colunas apresentam um rápido desenvolvimento tópico, passando, por exemplo, de assunto político a um assunto esportivo ou televisivo, entre outros, sem que os tópicos sejam amplamente abordados, mas ao contrário, se sucediam rapidamente. Nas colunas aqui analisadas, tantos as reunidas no livro quando as publicadas diariamente no jornal, a centração dos tópicos nem sempre obedece à “relação de interdependência semântica entre os enunciados” exigida pela concernência, que na maioria das vezes aborda assuntos e temas diferenciados num mesmo parágrafo, como é próprio do gênero “colunas de variedades”. Devido a este “abalo“ nas propriedades de concernência e relevância, muitas vezes a mudança tópica ocorre sem que se estabeleça uma relação ou associação entre eles, baseandose apenas nos comentários, trocadilhos e as mais variadas espécies de associação que promovem a progressão textual, mas o deslizamento tópico, ou movimento de transição tópica, que é a mudança da centração tópica acontecendo de maneira menos brusca, é mais visível nestas colunas do que nas atuais: “(1)Eu quero o meu dinheiro de volta! Dinheiro, dinheiro! D-I-N-H-E-I-R-O! Grana, grana viva. (2) Bem que o velho guerreiro Chacrinha já balançava as massas e buzinava a pança aos gritos de “Olha o pacotão! Olha o pacotão!”. (3) E não era o pacotão do Zé Meyer, não. (4.1) É o pacotão da Zélia. (4.2) A Primeira mulher a mostrar o pacotão no Congresso.(...) (4.3) Engraçado, eu ouvi a Zélia afirmar para todas as câmeras do Brasil que ela ia continuar aplicando no over. Das duas uma. Ou ela só tinha aplicado Cz$49.999,99. Ou gosta de perder dinheiro mesmo. É masoquista!” (SIMÃO, 1991:19)

Neste trecho podemos observar a existência de 4 tópicos: 3 não-desenvolvidos; e apenas 1 desenvolvido, que apresenta 3 sutópicos. Os 4 tópicos, apesar de não desenvolvidos, observam a propriedade de concernência da centração pois respondem a um suposto supertópico anunciado pelo título da coluna, “Pacotão, não! Quero o meu dinheiro de volta!”, trabalhando a significação do substantivo “pacotão” em suas diversas possibilidades semânticas. A respeito da propriedade de “relevância” da centração, vemos que o exemplo acima não apresenta mostras explícitas das relações de “importância ou proeminência” entres os tópicos que, não necessariamente, dependem uns dos outros do ponto de vista lógicosemântico para serem compreendidos. Enquanto a concernência e a relevância procuram

5

trabalhar a “unidade” dos tópicos, a “pontualização” tem com função a delimitação deles. Nela, os tópicos são delimitados pelo conjunto de subtúpicos a eles pertencentes. Assim, vemos que, no exemplo acima, embora os 4 tópicos apresentem as características da concernência, pois associam-se por meio da polissemia da palavra “pacotão”, a relevância não se assenta em relações lógico-semânticas, uma vez que os tópicos se sucedem sem uma real necessidade de dependência entre eles. Já quanto a pontualização, vemos a delimitação do tópico (4), centrado em “Zélia”, ser delimitado pelos 3 subtópicos a ele relacionados, (4.1), (4.2) e (4.3). Na seqüência, temos a ocorrência de mais uma estratégia de processamento textual que auxilia a visualização da coluna do Macaco Simão como uma unidade de sentido: (4.3) Engraçado, eu ouvi a Zélia afirmar para todas as câmeras do Brasil que ela ia continuar aplicando no over. Das duas uma. Ou ela só tinha aplicado Cz$49.999,99. Ou gosta de perder dinheiro mesmo. É masoquista!” (5) Mais masoquista que aquela famosa tarada dos estádios. Que quando entrou no Maracanã em plena Explosão Fla-Flu e viu a bola sendo chutada pra lá e pra cá, ela não se conteve e gritou roxa de inveja: “Sortuda! Sortuda! Leva chute não de um bofe, mas de vinte. De vinte, não. De vinte e dois bofes. E durante duas horas. Sortuda.” E a coitada foi retirada em camisa-de-força. Por motivos de força maior. (6) E por motivos de força maior acabo de receber um telefonema me desconvidando para jantar fora: “O que é que a gente vai pedir? Água?!” (4.4) Não, a gente reúne a macacada toda e vai lá na casa da Zélia. E ela prepara rapidinho coelho na mostarda, seu famoso prato predileto. E ainda bota na conta dela mesma. (7) E o comandante Dário é mergulhador em Mangue Seco. Eu nunca vi mergulhar em Mangue Seco. Só desenho animado. (8) Xi, aqui na sala ninguém está achando a menor graça das minhas piadas. Só tão rindo para não perder o amigo. (9) E a Erandy tadinha não tem mais dinheiro pra pagar a segunda prestação da cortina” (SIMÃO, 1991:19)

Ao começar o parágrafo, e um novo tópico (5), como uma expressão idêntica a que encerrou o parágrafo, e também o tópico, anterior, “É masoquista! – Mais masoquista que aquela famosa (...)”, o autor cria um gancho de “deslizamento”, ou transição, entre os dois tópicos, supostamente tornando a mudança entre eles, (4) e (5) menos brusca. Após desenvolver o assunto do tópico (5), o autor utiliza novamente a mesma estratégia de deslizamento tópico, trabalhando o final desse parágrafo, “Por motivos de força maior.”, e fazendo-o atuar como um gancho para o próximo parágrafo, “E por motivos de força maior (...)”, que dá início a um novo tópico (6). Vemos, então, a organicidade linear sendo estabelecida, basicamente, por meio da continuidade, na qual os tópicos a partir do (1) vão sucedendo-se até chegar ao tópico (6) quando, antes de seguir para o tópico (7) retoma um tópico anteriormente exposto e desenvolve mais um de seus subtópicos – (4.4).

6

Neste ponto, vemos a descontinuidade da organicidade dos tópicos, uma vez que a seqüência dos tópicos é interrompida, retrocedendo ao tópico (4), fazendo em seguida uma digressão, no tópico (8), e depois seguindo para o tópico (9).

Se nas colunas publicadas no livro apresentavam maior presença da centração e da concernência, além de mecanismos como o deslizamento tópico como estratégia para atenuar a rápida mudança tópica, atualmente tais estratégias são muito pouco usadas. Podemos observar que atualmente o desenvolvimento tópico é ainda mais “acelerado”, sem que se estabeleça uma relação lógico-semântica ou uma associação necessária entre eles. Hoje, muito mais do que antigamente, as colunas baseiam-se nos comentários e trocadilhos e são, em sua maioria, apenas articulados pelo conector “E”, no papel de conjunção aditiva, iniciando a maioria dos períodos para estabelecer (ou, ao menos, indicar) a relação sintático-semântica entre eles, no encadeamento aparentemente desconexos dos tópicos abordados pelo autor, numa estratégia de “amarramento de seqüências textuais”, sem dúvida é um mecanismo que confere às colunas de José Simão o status de “texto”: (1)E avisa pro Lula que o Ponto G da mulher fica no shopping.(2) E avisa pro Lula que o Ponto G do Bush fica no fiofó do Bin Laden!(3) E a Martox tem tanto botox que vai ser a única ministra IMEXÍVEL! Rarará! (4.1) E a declaração do papa Chico Bento 16: "O segundo casamento é uma praga". Tudo errado! (4.2)O primeiro casamento que é uma praga, o segundo é reincidência! E se casamento fosse bom, não tinha testemunha. Rarará! (4.3)Casamento é sempre assim: começa em motel e termina em pensão. (4.4)E sabe qual a diferença entre casamento e prisão? Na prisão, te deixam jogar bola! Rarará! (5)E esse papa é um inferno: contra transar antes do casamento, contra camisinha, contra os gays, contra o rock. Eu quero ser católico, mas o papa não deixa. Rarará! (FOLHA DE S.PAULO, 18-03-2007) [grifos meus]

No exemplo acima, num único parágrafo, o autor introduz 5 tópicos diferentes. Mas, se nos dois primeiros tópicos, podemos ver a concernência da centração baseada na expressão “ponto G”, presente em ambos e relacionando “mulher-shopping” e “Bush-Bin Laden”, ao mesmo tempo em que a pontualização limita-os a apenas um período cada, a passagem deles para o terceiro tópico é totalmente diferente, sem que exista qualquer tipo de relação entre os dois primeiros tópicos e o terceiro. Saindo da política, o autor passa a falar de atualidades, aproveitando a proximidade da visita do papa ao Brasil e usando uma (4.1) declaração polêmica sobre o segundo casamento, dando início a um novo tópico, (4) “casamento”. Este tópico é o que apresenta o maior desenvolvimento, dividindo-se em outros 4 subtópicos nos quais o autor comenta a declaração, utilizando, piadas da cultura popular, (4.2); (4.3) e (4.4). 7

Na seqüência, ele introduz um novo tópico (5), que volta a relacionar-se com o subtópico (4.1) a respeito da “declaração do papa”. A partir dessa retomada entre o tópico (5) e o subtópico (4.1), cria-se uma certa coesão, que contribui para a progressão textual. Como o exemplo acima demonstra, dentre os 5 tópicos apresentados, somente o tópico (4) da declaração do papa e o subtópicos, (4.1), (4.2), (4.3), (4.4), a respeito do casamento são os tópicos mais desenvolvidos da coluna, uma vez que todos os outros são apenas introduzidos, um após o outro ,e praticamente não-desenvolvidos. Em seguida, o autor promove uma nova mudança de tópico passando a tratar de uma série de assuntos televisivos sem nenhuma relação com os tópicos já abordados anteriormente: (6)“E aí uma repórter perguntou para uma drag: "O movimento drag queen começou em Londres ou Nova York?". "Acho que começou aqui em casa mesmo". Rarará! (7.1) E adorei a Claudete Troiano na Band: "Como é mesmo o nome daquelas que ficam chorando em velório? Ah, CARPINTEIRAS". Rarará!(7.2) Vai virar assessora intelectual da Lucianta Gimenez. (8.1)E aí o Bial perguntou pra uma anta do Big Bagaça Brasil: "Qual um dos sete pecados capitais?". "Grand Cannyon". Rarará! (8.2)Essa devia ir pra Cultura do novo Sinistério do Lula. (9)Pro Transportes eu sugiro o Rubinho. Para acelerar a indústria das multas. Passou de cinqüenta quilômetros, multa. Fez ultrapassagem, multa. Ultrapassou gringo, perde a carteira. Rarará! (10)E eu queria criar o Ministério das Perguntas Cretinas.” (FOLHA DE S.PAULO, 18-03-2007)

No trecho acima, o autor faz três citações de falas retiradas de programas conhecidos por serem considerados pouco intelectuais da televisão, tendo como única conexão entre si serem respostas absurdas, as chamadas “pérolas da televisão”. Para amarrar tantos tópicos aparentemente desconexos, o subtópico (8.2), volta ao campo político: a briga pelos ministérios do segundo mandado do governo Lula. Dando seqüência a questão de indicações para as pastas governamentais, e utilizando a estratégia de deslizamento para passar de um tópico sobre “política” para um sobre “esportes”, tópico (9) e, para sintetizar as três citações, e associando ao assunto das pastas ministeriais, o autor propõe agrupá-las no “Ministério Perguntas Cretinas”, tópico (10), vindo “amarrar” as perguntas apresentadas nos tópicos (6), (7), (8) e (9).

- Encerramento Sendo a sequenciação das colunas, um fator de grande importância para o processamento textual e, portanto, para a compreensão do conteúdo lido como sendo parte integrante de um todo, vale também ressaltar que outra característica marcante das atuais colunas de José Simão é a existência de uma expressão que indica o encerramento da coluna. 8

Porém, das colunas pertencentes ao livro de 1991, aqui analisadas, somente 5 delas apresentam tal fórmula: “E quem fica parado é poste. Eu quero é tietá. Num sabe?” (SIMÃO, 1991:19), (SIMÃO, 1991:20), (SIMÃO, 1991:21), (SIMÃO, 1991:24) e (SIMÃO, 1991:25)

Já nas colunas atuais, podemos encontrar uma estrutura que funciona com uma “moldura praticamente pronta” para o texto, na qual o autor insere seus tópicos e subtópicos. Além da fórmula introdutória “Buemba! Buemba!” temos também uma fórmula fixa, ainda que com algumas pequenas variações, que encaminha a coluna para o final: “É mole? É mole, mas sobe! Ou como diz o outro: é mole, mas sobe pra agradar a vizinha!” (FOLHA DE S.PAULO, 01-02-2007) “É mole? É mole, mas sobe! Ou como diz o outro: é mole, mas, se provocar, ressucita!” (FOLHA DE S.PAULO, 04-02-2007)

Essas fórmulas usadas para sumarizar os tópicos apresentados anteriormente e sinalizar a proximidade do enceramento da coluna, atuando também como um gancho de ligação para a introdução dos dois últimos parágrafos que trazem também uma série de fórmulas que introduzem dois novos “verbetes” para as sessões denominadas “Anti-tucanês” e “Cartilha do Lula”: “Antitucanês Reloaded, a Missão. Continuo com a minha heróica e mesopotâmica campanha "Morte ao Tucanês". Acabo de receber mais um exemplo irado de antitucanês. É que em Belo Horizonte tem um bar e restaurante chamado O Recanto da Perereca! O Melhor Salgado da Região! Ueba! Mais direto, impossível. Viva o antitucanês. Viva o Brasil! E atenção! Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante. "Empapado": companheiro que não agüenta mais declaração do papa. Rarará! O lulês é mais fácil que o inglês.” (FOLHA DE S.PAULO, 18-03-2007) [grifos meus]

Vale ressaltar aqui que chamamos de “sessões fixas” uma série de fórmulas, desconectadas dos tópicos expostos no decorrer do texto, que aparecem todos os dias ao final das colunas atuais. Na “Antitucanês Reloaded”, o trecho sublinhado no exemplo acima é preenchido sempre por tópicos que trazem nomes de lugares e estabelecimentos com alta conotação sexual, supostamente enviados por leitores do Brasil todo. Já a sessão fixa “Cartilha do Lula” na qual o trecho sublinhado da fórmula apresenta uma palavra já existente que ganha uma nova resignificação dentro a atual conjuntura política do governo Lula, ou relacionado a fatos do cotidiano ou da atualidade, geralmente

9

apresentando um caráter crítico em relação ao presidente Lula ou a um de seus companheiros de partido e governo. Em seguida, a finalização da coluna também fica por conta dessas fórmulas que se repetem, ou variam dentro de um pequeno grupo dependendo do contexto, fechando assim, a outra ponta da “moldura” que o autor estabelece para seu texto: “Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno. No Ponto G!” (FOLHA DE S.PAULO, 18-02-2007) “Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno. E vai indo que eu não vou!” (FOLHA DE S.PAULO, 01-02-2007) “Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno. No pingolim. Pra ver se bate no teto! (FOLHA DE S.PAULO, 06-02-2007)

Considerações Finais É interessante salientar neste momento que a hipótese inicial deste estudo pretendia encontrar uma quantidade muito maior de tópicos não-desenvolvidos nos textos de José Simão, que aproximariam suas colunas de “listagem de tópicos”. Porém, no decorrer do estudo, pudemos ver que existe sim uma organização tópica que responde pela coesão textual das colunas de José Simão e que esta organização tópica, embora diluída e até mesmo mascarada, está mais presente nos textos aqui analisados do que supúnhamos inicialmente. Feita esta ressalta, é pertinente lembrar que o objetivo deste estudo é observar e averiguar como se estabelece a leitura de tantos tópicos seguidos e não-desenvolvidos como pertencentes a “um todo de sentido”, aparentemente contrariando as propriedades apresentadas pelos estudos de Jubran (2006) a respeito da topicidade, que indicavam a obediência dos tópicos apresentados a um suposto supertópico. Das principais características encontradas nas colunas antigas analisadas aqui, merecem especial atenção as estratégias de processamento textual que são os aspectos mais importantes para a coesão textual, como deslizamento tópico e marcadores textuais que promovem o “amarramento” das seqüências textuais, efetuado pelo articulador textual “E”, que inicia a maioria dos períodos e parágrafos conectando-os por meio do processo de coordenação, buscando tornar a mudança tópica menos brusca. Quando partimos para as colunas atuais aqui analisadas e as comparamos com as antigas, vemos que muitas destas características se mantêm presentes, ainda que apareçam

10

com menor freqüência. Porém, esta aparente diminuição de estratégias de processamento textual não significa, contudo, que os textos atuais sejam menos coesos e coerentes. Ao contrário, no decorrer dos anos José Simão aperfeiçoou tais estratégias e substituiu o uso de algumas delas por outras que também contribuem fortemente para a idéia de um texto integro e coerente. Das características encontradas nas colunas atuais estudadas aqui, destacamos como principais características uma variedade ainda maior de assuntos abordados numa mesma coluna; a manutenção do agrupamento gráfico dos tópicos; a continuidade das marcas de oralidade em seu estilo; uma progressão tópica ainda mais acelerada; ocorrência bem menor da estratégia de processamento textual de deslizamento tópico; aumento considerável na utilização dos articuladores textuais “E”; Além das características acima listadas, outra importante característica desenvolvida por José Simão no decorrer de mais de dezessete anos são as fórmulas fixas que enquadram seu texto no início e no fim. Tais partes formulares são responsáveis por criar para o leitor uma “moldura fixa” a ser encontrada diariamente nas colunas publicadas no jornal, a qual o autor apenas completa com períodos e parágrafos intermediários. Vista esta diferença crucial entre as colunas antigas e as atuais, podemos afirmar também que, além da idéia de “moldura” criada pela existência de tais partes formulares, é fundamental para a coesão do texto de José Simão a concepção de “gênero textual” apresentada. Os leitores sabem e entendem, ainda que não conheçam a terminologia, que o texto do autor é uma “coluna de variedades” e como tal tem a liberdade de tratar diversos assuntos desconectados entre si, sem que isso impeça ou prejudique a compreensão geral do texto. Dessa forma, retomando a pergunta-problema deste estudo, pode-se dizer que não existe apenas um fator responsável pela coesão textual das colunas do Macaco Simão, mas sim uma série de aspectos dentre os quais se destacam a consolidação de características próprias do autor como suas fórmulas fixas e seu estilo irônico-sarcástico e, principalmente, o gênero textual “coluna de variedades”.

11

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.