Caixa Infernal: cartografias entre o visual e para além do representacional ou dispositivo para a organização da experiência de paisagem

August 8, 2017 | Autor: R. Nogueira Martins | Categoria: Cultural Geography, Dance Studies, Performance Studies, Critical Geography, Landscape
Share Embed


Descrição do Produto

Geografias Ibero-Afro-Americanas Atas do Colóquio Ibérico de Geografia

11 a 14 de Novembro Departamento de Geografia, Universidade do Minho Campus de Azurém Guimarães, Portugal

Guimarães, 2014

s Ibero-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

ii

s Ibero-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

TÍTULO: Geografia

Geografias Ibero-Afro-Americanas. Atas do Colóquio Ibérico de

COORDENADORES: António Vieira e Rui Pedro Julião EDITORES: Associação Portuguesa de Geógrafos e Departamento de Geografia da Universidade do Minho ISBN: 978-972-99436-8-3 / 978-989-97394-6-8 ANO DE EDIÇÃO: 2014 GRAFISMO DA CAPA: Instituto Nacional de Estatísticas COMPOSIÇÃO/EXECUÇÃO GRÁFICA: Flávio Nunes, Manuela Laranjeira, Maria José Vieira, Ricardo Martins

INSTITUIÇÕES ORGANIZADORAS:

Departamento de Geografia da Universidade do Minho

Associação Portuguesa de Geógrafos

Associación de Geógrafos Españoles

Centro de Estudos em Geografia e Ordenamento do Território

iii

s Ibero-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

COMISSÃO ORGANIZADORA: Coordenadores:

António Vieira (DGEO-UMinho) Miguel Bandeira (DGEO-UMinho)

Membros:

Ana Francisca Azevedo (DGEO-UMinho) António Bento Gonçalves (DGEO-UMinho) Flávio Nunes (DGEO-UMinho) Francisco Costa (DGEO-UMinho) João Sarmento (DGEO-UMinho) Manuela Laranjeira (DGEO-UMinho) Maria José Caldeira (DGEO-UMinho) Paula Remoaldo (DGEO-UMinho) Virgínia Teles (DGEO-UMinho) Luis Moreira (DGEO-UMinho) Vitor Ribeiro (DGEO-UMinho) Rui Pedro Julião (APG) Eduardo Gomes (APG)

Secretariado:

Miguel Jorge (APG) Clara Guedes (APG) Isabel Salgado (DGEO-UMinho) Carlos Eiras (DGEO-UMinho) Ricardo Martins (DGEO-UMinho) Sara Catarina Silva (DGEO-UMinho) Ana Catarina Alves (GeoPlanUM) GeoPlanUM

COMISSÃO CIENTÍFICA Presidente: Membros:

Paula Remoaldo (Universidade do Minho, Portugal) Adriano Figueiró (Universidade Federal de Santa Maria, Brasil) Ana Francisca Azevedo (Universidade do Minho, Portugal) Ana Paula Santana (Universidade de Coimbra, Portugal) António Bento Gonçalves (Universidade do Minho, Portugal) António Campar de Almeida (Universidade de Coimbra, Portugal) António Saraiva Lopes (Universidade de Lisboa, Portugal) António Sampaio (Universidade Federal do Paraná, Brasil) António Vieira (Universidade do Minho, Portugal) Artemio Cerda (Universidad de Valencia, Espanha) Carmen Delgado Viñas (Universidad de Cantabria, Espanha) Diogo José Abreu (Universidade de Lisboa, Portugal) Eduardo Brito-Henriques (Universidade de Lisboa, Portugal) Eusébio Reis (Universidade de Lisboa, Portugal) Fermina Rojo Pérez (Consejo Superior de Investigaciones Científicas de España) Felipe Fernández García (Universidade Autónoma de Madrid, España) Flávio Nunes (Universidade do Minho, Portugal) iv

s Ibero-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

Francisco Costa (Universidade do Minho, Portugal) Herculano Cachinho (Universidade de Lisboa, Portugal) Jacobo García-Álvarez (Universidad Carlos III de Madrid, Espanha) João Ferrão (Universidade de Lisboa, Portugal) João Sarmento (Universidade do Minho, Portugal) Jordi Bayona Carrasco (Universidad de Barcelona, Espanha) Jorge Malheiros (Universidade de Lisboa, Portugal) José Alberto Rio Fernandes (Universidade do Porto, Portugal) José António Tenedório (Universidade Nova de Lisboa, Portugal) José Borzacchiello da Silva (Universidade Federal do Ceará, Brasil) José Ramiro Pimenta (Universidade do Porto, Portugal) Juan Carlos García Palomares (Universidad Complutense de Madrid, Espanha) Juan F. Martínez-Murillo (Universidad de Málaga, Espanha) Lorenzo López Trigal (Universidad de León, Espanha) Luciano Lourenço (Universidade de Coimbra, Portugal) Lúcio Cunha (Universidade de Coimbra, Portugal) Luis Moreira (Universidade do Minho, Portugal) Margarete Amorim (Universidade Estadual Paulista, Brasil) Margarida Pereira (Universidade Nova de Lisboa, Portugal) Maria José Caldeira (Universidade do Minho, Portugal) Maria José Roxo (Universidade Nova de Lisboa, Portugal) Maria Regina Salvador (Universidade Nova de Lisboa, Portugal) Mário Gonçalves Fernandes (Universidade do Porto, Portugal) Manuela Laranjeira (Universidade do Minho, Portugal) Miguel Bandeira (Universidade do Minho, Portugal) Paloma Ibarra Benlloch (Universidad de Zaragoza, Espanha) Pilar Paneque Salgado (Universidad Pablo Olavide, Espanha) Rosa Cerarols Ramirez (Universidad Pompeu Fabra, Espanha) Rui Pedro Julião (Universidade Nova de Lisboa, Portugal) Teresa Pinto Correia (Universidade de Évora, Portugal) Valentin Cabero Dieguez (Universidad de Salamanca, Espanha) Virgínia Teles (Universidade do Minho, Portugal) Vítor Ribeiro (Universidade do Minho, Portugal) Xosé Santos Solla (Universidad de Santiago, Espanha) Xavier Úbeda (Universidad de Barcelona, Espanha)

v

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

Caixa Infernal: cartografias entre o visual e para além do representacional ou dispositivo para a organização da experiência de paisagem Ana Francisca Azevedo (a), Ricardo Nogueira Martins(b), Pedro Carneiro(c), Ricardo Acosta(d), Pedro Pereira(e), Miguel Pinto(f) Departamento de Geografia/Universidade do Minho, [email protected] Pós-graduação em Geografia pelo Departamento de Geografia da Universidade do Minho, [email protected] Mestre em Arquitectura pela Escola de Arquitectura da Universidade do Minho, [email protected] Mestre em Arquitectura pela Escola de Arquitectura da Universidade do Minho, [email protected] Geógrafo e Mestre em Educação pelo Instituto de Educação da Universidade do Minho, [email protected] Mestre em Arquitectura pela Escola de Arquitectura da Universidade do Minho, [email protected] (a)

(b)

(c)

(d) (e) (f)

Resumo Uma caixa que se abre e desdobra em múltiplas caixas e objectos, um dispositivo pensado para armazenar a memória de um processo de construção de uma obra de arte, para ser partilhado e reutilizado. Através dela organiza-se uma metodologia de pesquisa para o estudo da paisagem e cada compartimento exprime o conjunto de relações que foi sendo posto em jogo ao longo do processo de afectação dos diferentes corpos, dos actores e actuantes envolvidos. De que geografia se fala ao longo deste projecto? Dos itinerários cerzidos por entidades várias, dos mapas afectivos que resultaram das discussões em torno das representações do mundo enunciadas, das geografias pós-humanas vertidas em textos de ordem diversa, da problemática do encontro não representacional, da falha dos métodos convencionais no equacionar do fluido e da errância como fundações do espaço. Palavras chave: paisagem, arte, ciência, geografias pós-humanas, dança

1. Introdução A presente comunicação apresenta sumariamente os resultados de um estudo debruçado sobre as relações entre geografia e dança, como modo de interpelar a complexidade dos fluxos contínuos entre materialidade e representação. Partindo da análise da especificidade dos encontros que ocorrem em palco e para além dele, antes e no decorrer do processo de produção de uma obra de arte, este estudo analisa a produção do espaço através da experiência de paisagem, tendo em conta cada lugar generativo que se organiza através das expressões corporais que concretizam emoções e afectos, que mobilizam a tensão natureza-cultura, ora gerando sentidos de estabilidade e pertença ora fracturando sentidos de lugar. Como referem Derek Gregory e Noel Castree enfatizando os movimentos humana criativa é praticada dentro e fora da Geografia, grande parte dela reunindo académicos de outras campos uturais que propiciam um sentido de pesquisa mais fluido e -se um desenho de investigação colaborativa desenvolvido por um grupo de investigadores voluntários, cruzando as complexas veredas das geografias de co-produção e dos processos de co-produção em arte (Parr, 2006), (Sjoholm, 2011), (Askins e Pain, 2011) e (Hawkins, 2011). Assim, a pesquisa de que aqui se dá conta analisa o poder do movimento sobre a ausência, a capacidade inalienável de produzir sentido de lugar para além dos sistemas convencionais de representação geográfica, tomando-se o 358

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

próprio sentido de arbitrariedade de contextos e acções o motor de busca de métodos de resolução de problemas espaciais. Um método de pesquisa em

, em que o sentido de mundo virado ao contrário produziu o efeito

de acção-reacção gerando movimentos de organização colectiva do grupo de trabalho na gestão do caos, materiais e emoções e, tornando-se, o sentido de ausência, perda, falta de sentido, errância de enunciados, contextos e mesmo deriva corpórea e da memória de contacto, o veículo central de busca das sinapses a operar agora em qualquer circunstância e tempo desde que accionadas as hiperligações que comandam os territórios postos em correlação pela acção-reacção do método de pesquisa. Este circuito de interferências e conflitualidades, percebido como instância generativa da acção, opera desde o momento em que a ruptura da definição ontológica do objecto pelo realinhamento dos planos de equivalência no seio do grupo de pesquisa produz a afirmação dos sujeitos enquanto localidades processuais. Mas a violação da intimidade estabelecida entre sujeito e objecto, que normalmente se concretiza pela construção de uma região inviolável - a região suma do conhecimento científico, (re) acciona uma poderosa instância de afectação de corpos realizados na mais íntima esfera de coabitação. Da intimidade da relação que desde este ponto se estabelece acreditamos estar em posição de deixar accionar a vida infernal de materiais plausíveis que facilitam a organização dos processos de autoconsciência e que validam outras geografias, mais-do-que-humanas.

2. Geografia e Dança A análise dos processos envolvidos na produção artística tem assumido importância crescente na compreensão dos mecanismos de produção de conhecimento geográfico sendo historicamente reconhecido o papel central da paisagem na organização daqueles processos. Paralelamente, o período contemporâneo tem sido marcado por movimentos artísticos que re-equacionam os modernos conceitos geográficos verificando-se na actualidade e nas mais diversas partes do globo expressões vigorosas desta tendência.

Abordagens ocupadas com as

representações do mundo nos mais diversos médiuns interceptam abordagens centradas na compreensão dos encontros que excedem o representacional, que valorizam os processos subjacentes ao pensamento reflexivo e auto-consciente, procurando uma espécie de materialismo corporizado que coloca maior ênfase nas questões da acção, da prática e dos diferentes tipos de performance. Neste sentido, a geografia é percebida como médium e a performance como estilo específico de pesquisa. Dentro do vasto leque de actividades performativas, e para além delas, a dança transporta-nos para uma experiência significativa do fazer pré-reflexivo através da qual conseguimos unir formas de acção aparentemente desconectadas. Autores como J.D. Dewsbury (2002), Derek McCormack (2003), Somdahl-Sands (2006) e Jeff Popke (2009), tem-se debruçado sobre o modo como a dança e os movimentos corporais produzem espaço, como tomam lugar, salientando o seu potencial para activar capacidades afectivas e gerar formas de envolvimento e responsabilidade necessárias à construção do evento, do fazer-mundo. Com a tarefa de compreender o significado cultural de paisagem, espaço e lugar numa forma de arte contemporânea em que o corpo assume papel crucial, este estudo acompanhou o trabalho de um encenador e director de teatro - dança moçambicano, Miguel Moreira, começando por analisar a sua aproximação à produção 359

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

do conhecimento geográfico numa das suas mais recentes criações

(2011). Nesta obra o bailarino

português Romeu Runa trabalhou a fotografia de Daniel Blaufuks como ponto de partida para um salto no vazio, um homem solitário no meio de quase nada que pensa sobre o mundo e fala ao mundo interpelando a sua relação com a sociedade, tal como é a apresentada a peça pelos seus co-criadores, pela companhia Útero e pela companhia de dança Les Ballets C de la B, criada por Alain Platel. A potência criativa do artista mobilizando uma miríade de fontes inspiradoras, entre as quais o livro

(1990) de Camille Paglia, um trabalho sobre

a decadência sexual na literatura ocidental que põe a descoberto os elementos reprimidos da cultura contemporânea e evidencia o conteúdo repressivo e puritano da história da arte, provocou a colocação da ideia de paisagem como central para a discussão da ideia de corpos distorcidos e para a intervenção de comportamentos individuais e colectivos. Accionando mecanismos de intertextualidade, o artista convoca paralelamente um texto geográfico, o livro

(Azevedo, A.F, 2008), como coadjuvante de um

processo de criação e reflexão que questiona e subverte os sistemas de signos em que assenta o imaginário geográfico dominante que aprisiona os sujeitos em categorias cristalizadas de espaço-tempo. A convergência entre um livro e uma peça aconteceu num novo ciclo, revelando circuitos subterrâneos de comunicação que podem ser percebidos como sintomas de movimentos culturais mais vastos, movimentos que através de diferentes produtos culturais exprimem falhas e rupturas persistentes no processo dialógico de comunicação e que reclamam a urgência de co-produção de formas simbólicas coniventes com novos processos de reorganização da experiência

matérias fáceis de descortinar. São feitos em geral por historiadores que analisam uma obra na sua relação com o lugar e o tempo em que foram criadas. Muitas vezes são os artistas que reclamam essa condição, percebendo por intuição e pela receptividade que uma obra tem que estão perante um ciclo que querem descobrir o porquê e se possível aprofundar elementos trabalhados. Querem que essa obra seja revelada no seu interior e consequentemente no público. nesta peça, o modo de ver em paisagem é violentamente implodido pela acção de um espaço performativo que se torna vivenciado colectiva e subjectivamente pela mobilização do público convocado enquanto matéria tencionada e lugar de emoções, arrancado cada sujeito da sua região de conforto enquanto espectador passivo. Materialidade e representação tornam-se zonas difusas neste espaço pós-humano marcado pela clara disrupção da dicotomia natureza e cultura e pela fractura contundente dos códigos convencionais de comunicação que estruturam os circuitos rotineiros da vida quotidiana. A dança, um médium através do qual outras geografias imaginativas são criadas e que modela o nosso sentido de lugar.

3. Pele e a Caixa Infernal Um dispositivo material, um livro, provocou um encontro e a discussão em torno de uma obra de arte dando origem à criação de um grupo de pesquisa - Paisagem.Húmus, constituído por um grupo de voluntários devotados à tarefa de perceber e re-equacionar as diferentes linguagens da paisagem e o circuito ininterrupto entre 360

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

materialidade e representação que comanda as nossas vidas. Partindo do pressuposto de que todos somos produtores e consumidores de conhecimentos geográficos, de que o processo de pesquisa é um produto contínuo de redes mutantes de práticas sociais e de que todo o conhecimento é situado, produzido ou retrabalhado por alguém em algum lugar, o grupo tentou compreender o papel da paisagem na expressão artística examinando diferentes superfícies (como o palco) através das quais se produz conhecimento geográfico, bem como as relações recíprocas entre estes espaços e as práticas sociais de produção de conhecimento que aí tomam lugar. Ao longo do processo efectuamos reuniões de mesa e trabalho de campo, discussões de grupo, entrevistas, análise de textos e cenografia, verificamos o comportamento de dispositivos como som e luz, topografia, mudanças de palco e atmosfera, o papel dos diferentes estados da matéria, doença e performance, relações de poder sobre e dos corpos, efectuamos registos de observação de pessoas e materiais e fomos observados, realizamos observação participante, analisamos a relação entre diferentes modalidades de comunicação no palco e fora dele, desenvolvemos análise iconográfica e no âmbito da semiótica material do espaço. Construímos um arquivo com diferentes tipos de materiais, textos escritos, pictóricos, musicais, digitais, entre outros, que se tornaram cruciais para a compreensão do papel do humano e do não humano na co-produção da experiência. Lidamos com a tensão do encontro e do estarmos juntos procurando planos de equivalência, lutando contra modelos culturais hierárquicos e estabelecidos de práticas e conhecimento. O processo foi violento para os membros do grupo de pesquisa tantas vezes desmembrados nas suas crenças e e rotinas. O grupo começou por ser constituído por dezassete voluntários tendo terminado e estabilizado com seis membros. Sentimentos de rejeição, de deriva e de perda que advinham do contacto com a construção da obra sobretudo quando passamos à fase mais violenta do processo, o pôr em cena e o desenvolvimento dos trabalhos em palco, levaram várias pessoas ao abandono do projecto. Esta fase de trabalho de campo foi-se tornando imensamente exaustiva, o espaço era desconhecido e agreste e havia todo um mapa em branco a cartografar. O medo e a desconfiança foram-se instalando à medida que aumentava a consciência da ausência de fronteiras. Não foi fácil arriscar a geografia de territórios-outros pois o trabalho de levantamento foi tomado pela emoção e o jogo entre o desejo e a rejeição frequentemente paralisaram a tarefa de investigação. Lidar com o sentido de imprevisibilidade radical relativamente àquilo que está para vir (condição da própria vida), colocou o grupo numa zona de conflito marcada por momentos recorrentes de impasse e indecisão que impediam o avanço no percurso. O clima instalado, oscilando entre rupturas emocionais e estados de entusiasmo febril, a vertigem do movimento entre a ausência e o silêncio e a presença e entrega de cada membro do grupo, o protagonismo ou inexistência de materiais recolhidos em cada sessão, foise um acumular de Eus que obrigam a um renascimento em cada fase de adaptação e transformação ao longo

I., 2013). O desenrolar do processo foi uma prova da potência geopsíquica dos sujeitos envolvidos, inclusivamente

molhado no qual elas expressam fantasias e loucuras. É na superfície limítrofe que os seus corpos, expostos à 361

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

subsequente à estreia da peça, partimos para a criação de um dispositivo que condensa e é expressão do processo desenvolvido pelo grupo de pesquisa que acompanhou durante cerca de um ano a produção da peça

(2013),

de Miguel Moreira. Este dispositivo, que designamos de Caixa Infernal, concretizou uma metodologia de pesquisa em que a paisagem funcionou como tecnologia para a organização da experiência. Através dele efectuamos a revisão do processo, procedemos à organização dos materiais produzidos no decurso da pesquisa, acomodamos os resultados e tentamos encontrar um sentido de lugar para os nossos próprios corpos que foram sendo deslocados, distorcidos, pela vivência do processo de acompanhamento de construção da obra. Este objecto é a expressão material de um processo de co-produção de mundos de experiência, que possibilitou a apresentação dos resultados preliminares do estudo e a sua discussão que gostaríamos de ver alargada. Perspectivado como documento cartográfico, ainda que distante do clássico atlas ou globo, permite navegar num espaço agora mais conhecido, povoado de emoções, interferências e subjectividades.

4. Conclusão Aquilo que uniu as formas de prática díspares que permearam o processo de pesquisa de que aqui se dá conta foi a experiência significativa do fazer pré-reflexivo, a imersão corporal na imediatez do agora, a fidelidade ao evento através do qual novos espaços de pensamento e acção puderam emergir. Tratou-se de dar espaço ao evento do mundo, respondendo a cada passo às solicitações de cada encontro e expondo o possibilidade de ser de outro modo, focando a atenção nos espaços materiais através dos quais o investimento afectivo e ético pode tornar-se manifesto. Na linha deleuziana de que não pode prever-se aquilo de que um corpo é capaz num dado encontro, arranjo ou combinação, arriscamos a afectação de corpos, a sua alteração, como modo de potenciar a capacidade de intervenção e actividade, como modo de ampliar a compreensão das regiões como nódulos de movimento e resistência. Isto expandiu o nosso sentido do colectivo o que nos parece central para o acto de fazer espaço. Este tipo de trabalho, e de acordo com o avançado por Jeff Popke (2009), demonstra que os espaços-evento são uma realização colectiva para os quais devemos orientar a nossa atenção na medida em que a coexistência é a natureza do território donde deriva uma cultura de co-habitação. Partindo do pressuposto de John Roberts (2004, pp. 557),

para a produção de arte como processo auto-consciente. Este posicionamento permitiu alargar a nossa compreensão relativamente aos processos postos em jogo no decorrer da pesquisa, não somente relativamente ao trabalho humano de criação de um espectáculo de dança, mas atendendo às geografias mais-do-que-humanas, públicos e tecnologias, bem como ao papel do não humano (Braun e Whatmore, 2010; Dixon et al 2012, McNally, 2013) na produção do espaço vivenciado e dos vínculos afectivos que sustentam a construção de sentidos de lugar e respectivas expressões simbólicas. Reforçando o interesse geográfico nos processos e significados da arte, este estudo permitiu estabelecer inúmeras conexões com questões geográficas mais amplas, nomeadamente, 362

-Afro-Americanas. Atas do XIV Colóquio Ibérico de Geografia

questões de produção do espaço público e privado, questões de propriedade da pesquisa (e da paisagem), questões éticas a operar através dos diferentes papéis desempenhados e dos diferentes graus de poder e os actores pertencem a uma comunidade de prática do espaço e, finalmente, permitiu questionar o papel das representações como veículo epistemológico prioritário para o conhecimento do mundo.

5. Bibliografia Askins, K.; Pain. R. (2011). Contact zones: participation, materiality, and the messiness of interaction. Environment and Planning D: Society and Space 29(5). 803 821. Azevedo, A.F. (2012).

. Lisboa:CEG/Figueirinhas.

Braun, B. & Whatmore, S. (Eds.) (2010). Political Matter. of Minnesota Press.

Minneapolis: University

Dewsbury, JDC; Harrison, P; Rose, M; Wylie, J. (2002). Enacting Geographies. Greogry, D. & Castree, N. (Eds.) (2012).

33, 437- 440.

. London: SAGE Publications.

Hawkins, H. (2011). Dialogues and Doings: Sketching the Relationships Between Geography and Art. 5, 464 478.

,

McCormack, D.P. (2003). An event of geographical ethics in spaces of affect. , 28(4), 488-507. Mcnally, D. (2013). Comforting Others: Sociality and the ethical aesthetics of being-together. In a Hawkins, H. & Straughan, E. (Eds.). Reino Unido: Ashgate Moreira,M (2013). Pele. Centro Nacional de Cultura [online]. Disponível: cultura.sapo.pt/AgendaCulturalDisplay.aspx?ID=38077&print=1 [Acessado a 25 Agosto 2014] Parr, H. (2006), Mental health, the arts and belongings.

em

http://e-

, 31, 150 166.

Popke, J. (2009). Geography and ethics: non-representational encounters, collective responsibility and economic difference. , 33(1), 81-90. Sjöholm , J. (2011). The Dissertação de Doutoramento. Uppsala: Uppsala University. Somdahl-Sands,K. (2006).Triptych: dancing in Thirdspace.

. 13(4), 610-616.

363

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.