Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas

June 19, 2017 | Autor: Joao Silveira | Categoria: Filosofía, Artes, Ciencia
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ISSN 2176-1248  

 

CAMEROSCÓPIO: UM OLHAR MODIFICADO PARA O MUNDO E SUAS FORMAS Maria Gabriela G. P. De Moura - Graduanda do Curso de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis – Escola de Belas Artes - Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: [email protected] João R. Silveira – Mestre em Educação, Gestão e Difusão de Biociências. Bolsista de Doutorado - CNPq - Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, Universidade Federal do Rio de Janeiro. E-mail: [email protected] Denise Lannes - Professora Adjunto - Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Química Biológica – Mestrado Profissional E-mail: [email protected]

Resumo O Projeto Arte, Ciência e Educação (PACE) é um grupo de estudos da Universidade Federal do Rio de Janeiro que tem o objetivo de promover pesquisa acerca da conexão entre as áreas de arte, ciência e educação. Este trabalho relata o processo de criação de uma obra decorrente das atividades deste projeto, o Cameroscópio. Este objeto foi desenvolvido a partir da interação entre os princípios de funcionamento do Caleidoscópio e da Câmara Escura. A realização desse trabalho extrapolou a esfera filosófica e teórica e se materializou na criação de um produto. Mais importante do que as possíveis utilizações do item produzido para fins educativos ou artísticos, consideramos a experiência de desenvolvimento da obra uma rica experiência transdisciplinar. Palavras-Chave: arte, ciência, caleidoscópio, câmara escura, cameroscópio.

MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

 

ISSN 2176-1248  

Introdução O Projeto Arte, Ciência e Educação (PACE) é um grupo de estudos que reúne estudantes de graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado da Universidade Federal do Rio de Janeiro o qual iniciou suas atividades no ano de 2015. Os acadêmicos de graduação são oriundos dos cursos de graduação em

Ciências

Biológicas,

Artes

Cênicas

-

Indumentária,

Composição

Paisagística, Gravura, Conservação e Restauro, Biomedicina e Desenho Industrial - Projeto de Produto. Os acadêmicos pós-graduação são do Programa de Educação, Gestão e Difusão em Biociências do Departamento de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis (IBqM). O PACE foi criado inicialmente como objetivo de promover pesquisa acerca da conexão entre as áreas de arte, ciência e educação. Estas atividades estão inseridas nas linhas de pesquisa desenvolvidas pelo Laboratório Em Formação - IBqM. A equipe de pesquisadores do Laboratório Em Formação possui uma importante atuação acadêmica na área de educação, formação de professores e práxis pedagógica. Entre os trabalhos desenvolvidos pelo Laboratório, ao longo dos últimos 12 anos, dois podem ser destacados: O Currículo Mínimo1, o Polo Cine (em parceria com CEDERJ)2 e o Ciência Envolvida em Arte3. As primeiras atividades do PACE foram feitas no sentido haver um compartilhamento de conhecimentos básicos sobre a temática aos integrantes do grupo. Os encontros do grupo são presencias e on-line com atividades semanais. Uma das atividades propostas em um desses encontros presenciais                                                                                                                 1

Disponível em http://www.conexaoprofessor.rj.gov.br/curriculo_aberto.asp Fundação CECIERJ/Consórcio CEDERJ - Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro, órgão vinculado à Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia – (SECT), desenvolve projetos nas áreas de Graduação a Distância (Consórcio Cederj); Divulgação Científica; 3 Fotos, vídeos e mais informações sobre o projeto em http://www.avidaem6x8.com MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o 2

mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

 

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foi a livre criação de uma obra de arte que envolvesse arte e ciência. Cada participante foi instigado a realizar a sua obra a partir do que havia sido estudado até o momento. O grupo teve o período de um mês para idealização e execução do seu trabalho. Um processo de criação artística livre, com linguagem livre, de qualquer obra que o autor escolhesse. O Processo Criativo Este trabalho relata o processo de criação de uma das obras realizadas nesta atividade, um objeto denominado Cameroscópio. Inicialmente, devido ao amplo leque de opções, era incerto que linguagem artística seria desenvolvida: pintura, desenho, escultura, poesia… Foram necessários diversos ensaios para que se chegasse a ideia final. Até que foi analisado o conceito do Caleidoscópio, um objeto interativo e que proporciona visões diferentes sobre os mesmos objetos presentes em seu interior. Paralelamente a isso, pensou-se sobre a Câmara Escura e nas semelhanças que esses dois instrumentos apresentam quanto aos fenômenos luminosos que ocorrem em suas dinâmicas. Logo surgiu-se a questão: “Por que não juntar os dois? Por que não ter diferentes visões e projeções do ambiente à volta? ”. Esse foi o insight do processo criativo: algo que tornasse possível o olhar do diferente para o que já se conhece. Em O Mundo de Sofia, clássico romance

que

conta

a

história

da

filosofia,

Jostein

Gaarder

(1952)

pertinentemente faz a seguinte reflexão: “Para as crianças, o mundo - e tudo o mais que existe aqui - é algo novo, que causa estranhamento [...] Um filósofo jamais se acostuma com o mundo. Para ele, ou para ela, o mundo continua a ser surpreendente - sim, um lugar repleto de enigmas e mistérios. Filósofos e crianças têm esse ponto em comum.” (GAARDER, 2012, p. 30)

MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

 

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O como

trecho inspiração

acima citado serviu filosófica

deste

trabalho, de modo a

mostrar a importância

do

a

questionamento,

surpresa

sobre

cada acontecimento,

por mais habitual que

este

Parafraseando

pareça.

filósofo pré-socrático

Heráclito

de

o Éfeso

(535 a.C. - 475 a.C.), um segundo, um movimento que se passe, já transforma o homem, já transforma o rio. Um piscar de olhos pode separar o homem de quem ele foi e de quem ele é. O Cameroscópio, como o rio de Heráclito, pode mudar a todo instante as imagens vistas ao redor.

Figura 1- Árvore com céu ao fundo vista através do Cameroscópio. CAMEROSCÓPIO: União do Caleidoscópio com a Câmara Escura O Caleidoscópio foi Inventado por David Brewster (1781-1868) no século XIX com o intuito de estudar os fenômenos luminosos (reflexão, refração, difração, polarização). Mais tarde assumiu caráter lúdico devido às múltiplas reflexões das gemas preciosas que levavam a formação de belas imagens em seu interior. Constituído pela articulação de dois ou mais espelhos ajustados, fornece imagens repetidas e perfeitas. Este efeito de multiplicidade das imagens é causado pelo modo de disposição dos espelhos, uma vez que a MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

 

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angulação está diretamente relacionada ao número de imagens que serão formadas (BUSKE, 2007, p.43). Atualmente, além de instrumento científico e artefato lúdico, o caleidoscópio também pode ser usado na educação. Como afirma Buske (2007), exercendo papel auxiliar na resolução de problemas aplicados às ciências matemáticas através do estímulo do pensar produtivo e do desenvolvimento do raciocínio. Por definição técnica compreende-se como Câmara Escura: “(...) uma caixa preta totalmente vedada da luz com um pequeno orifício ou uma objetiva em um dos seus lados. Apontada para algum objeto, a luz refletida deste projeta-se para dentro da caixa e a imagem dele se forma na parede oposta à do orifício [...]” (SALLES, 2004, p. 01)

Não se sabe precisar ao certo a origem da Câmara Escura. Vestígios descritivos de salas fechadas funcionando como câmara existem desde a Renascença, e suas referências indicam desde a Grécia Antiga. Ilustrações de estudos

renascentistas

fazem

alusão

a

este

tipo

de

câmara

que,

diferentemente do que conhecemos, era em grande proporção e chegava a acomodar uma pessoa. Tais registros indicam que os artistas se posicionavam dentro da sala para a obtenção da própria imagem e conseguinte estudo e reprodução (SALLES, 2004, p. 01). O conceito de Câmara Escura na educação pode ser aplicado na compreensão das câmeras fotográficas e na explicação de como funciona o sistema de visão humano na captação de luz e transformação de mensagens. O CAMEROSCÓPIO O Cameroscópio foi criado a partir da união das ideias do caleidoscópio de da Câmara Escura. Foram utilizados na montagem do trabalho os seguintes materiais: cano PVC de 50mm de diâmetro e 33cm de comprimento, nove MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

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placas de espelho medindo 8x4x0,4cm cada, cartolina preta de 9x17,5cm, lente convergente plástica de 4,8cm, fita crepe, cola branca PVA e cola quente. Na área externa foi usada cartolina preta de mesma medida do cano PVC para revestimento, barbante e lápis de colorir metalizado para trabalhar a estética do instrumento. Os espelhos foram dispostos sobre uma superfície plana com a face refletora voltada para baixo, um ao lado do outro, de modo a formar três fileiras de três espelhos (passo 1, figura 2). Em seguida, utilizando faixas de fita crepe, uniu-se os trios constituindo uma malha articulada de espelhos (passo 2, figura 2). Posteriormente, esta malha foi dobrada resultando num tubo triangular de 24cm de comprimento. Mais uma camada de fita crepe foi colocada envolvendo o tubo triangular para reforçar e evitar que as outras faixas previamente postas se desfizessem (passo 3, figura 2). Após introduzido o tubo de espelhos no cilindro de cano PVC (passo 4, figura 2), e restando 9 centímetros de espaço livre, foi colada usando cola branca PVA a cartolina preta como forro, de modo a diminuir a luminosidade no interior (passo 5, figura 2). Um disco de cartolina preta medindo 7cm de diâmetro foi recortado e neste foi feita uma circunferência interna de 5cm de diâmetro (passo 6, figura 2). Usando como limite a circunferência interna, as bordas dos 2cm restantes foram dobradas. Acomodando de maneira a formar uma tampa, o disco de cartolina foi colado na terminação dos espelhos e nele feito um orifício de aproximadamente 0,5cm de diâmetro (passo 7, figura 2).

MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

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Figura 2 – Etapas 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 de criação. Separadamente foi preparada uma base de emborrachado EVA servindo de encaixe para a lente no cilindro de cano PVC. Para isso, foram recortadas três faixas de emborrachado (passo 8, figura 3): uma medindo 4x17,5cm e outras duas de 1x17,5cm. Na extremidade de 17,5cm da faixa maior foi disposta e em seguida colada, com cola quente, uma das faixas menores. Deixando um pequeno espaço de no máximo 2mm, foi colada a outra faixa menor de emborrachado, rente ao filete anterior (passo 9, figura 3). Após montada a base de emborrachado, as menores extremidades desta foram unidas, e coladas com cola quente, de maneira a formar um cilindro (passo 10, figura 3). Seguidamente, na lacuna reservada em tal base, foi inserida e fixada a lente (passo 11, figura 3).

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Figura 3 – Etapas 8,9, 10 e 11 de criação Conseguinte a esta etapa, introduziu-se a base emborrachada, com a lente, na terminação oposta à dos espelhos, ou seja, na divisão de 9cm previamente designada para este passo.

Figura 4 - fotografias do Cameroscópio pronto Considerações finais Além da inspiração filosófica, pretendia-se que esta obra fosse interativa, uma arte que não apenas contemplativa, mas capaz de tirar o observador do posto de quem só a assiste, pois se tornou parte da obra, essencial para que esta exista. O processo de realização do trabalho proporcionou descobertas e reflexões uma vez que foram necessárias diversas etapas de experimentação através do método artístico e do método científico. Toda a preparação previamente feita ao ser posta em prática retornou ao novo olhar proposto. A observação sob diferentes perspectivas esteve presente na escolha de cada materialidade, desde a estética, passando pela densidade, até a comodidade anatômica.

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Foi descoberto, após o término do trabalho, a obra de um artista contemporâneo4 apresentando similaridades com o projeto exposto. Ambos trabalhos são formas inspiradas no caleidoscópio, porém, o Cameroscópio, além de possuir diferentes dimensões, conceitua-se como junção do caleidoscópio e da câmara escura, apresentando caráter filosófico distinto e possível uso prático na educação. A realização desse trabalho extrapolou a esfera filosófica e teórica e se materializou na criação de um objeto. Mais importante do que as possíveis utilizações do item produzido para fins educativos ou artísticos, consideramos a experiência de desenvolvimento da obra uma rica experiência transdisciplinar. Esta forma de reflexão acadêmica e produção de trabalhos parece estar alinhada com um pensamento contemporâneo no qual as fronteiras entre arte, ciência e educação fazem cada vez menos sentido. Referências Bibliográficas JOSTEIN, G. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. 1 ed. 2 reimpr. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. BREWSTER, D. Kaleidoscope: Its history, theory, and construction with aplication to the fine and useful arts. 2 ed. London, 1858. BUSKE, N. Uma contribuição para o ensino de geometria utilizando origami e caleidoscópio. 2007. 200 f. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, 2007. Disponível em: http://hdl.handle.net/11449/91082. Acesso em: 31 ago. 2015. SALLES,

F.

Breve

História

da

Fotografia.

2004.

Disponível

em:

http://www.miniweb.com.br/Artes/artigos/Hist%C3%B3ria_fotografia.pdf Acesso em: 31 ago. 2015.

                                                                                                                4  Viewing  Machine,  Olafur  Elliasson.  Mais  informações  em  http://www.olafureliasson.net   MOURA, Maria G. G. P; SILVEIRA, João R; LANNES, Denise. Cameroscópio: um olhar modificado para o mundo e suas formas In: CONGRESSO SCIENTIARUM HISTORIA VIII, 2015, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2015. 1 CD ISSN 2176-1248

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