Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional | ensaio integral

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Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional

“O progresso é a concretização de Utopias” Oscar Wilde

Nas sociedades contemporâneas, europeias continentais, mediterrânicas e respectivos espaços de influência cultural, nomeadamente lusófonos, hispânicos e francófonos, na chamada Mundialização do início século XXI, importa reflectir e discutir os, tendencialmente, dois grandes caminhos que se apresentam como possíveis, para o desenvolvimento futuro do Campo Cultural: - o Humanista, convenientemente estruturado politicamente, mais no âmbito de um Sector Cultural, - o Tecnocrata, deliberadamente desestruturado e diluído, mais no âmbito do Sector Económico. Esta reflexão irá, implicitamente, contribuir para avaliar qual o papel da Gestão Cultural Profissional, quinze anos depois do seu aparecimento em Portugal e cujo projecto tem sido, desde sempre, orientado por uma visão: ”Portugal, a Europa e o Mundo, com um Sector Cultural Sustentável, gerido por profissionais competentes em Gestão Cultural”. A todos os que, ao longo do tempo e das mais variadas formas, têm contribuído para o desenvolvimento da Gestão Cultural Profissional, em Portugal e no estrangeiro, um particular agradecimento.

António Jorge Monteiro* Porto, Dezembro 2015 | v1.1 gestaoculturalpt.blogspot.com

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Palavras-chave cultura erudita, campo cultural, património cultural, artes, actividades artísticas, indústrias culturais, indústrias criativas, união europeia e cultura, programas comunitários e cultura, políticas culturais, sector cultural europeu, estatísticas culturais, gestão cultural profissional, formação em gestão cultural, pós-graduação em gestão cultural, associação portuguesa de gestão cultural.

Índice Introdução ……………........................…………………………………………………………………. 3 1. Campo Cultural 1.1. Cultura: uma perspectiva histórico-geográfica .……...……….…………...………...…………..… 5 1.2. Cultura: algumas definições e conceitos …………………….…...………..……...…..…….….….. 7 1.3. Campo Cultural ..…………………………………………………………….………….…,…...…… 11 2. Europa e Cultura 2.1. Europa, União Europeia e Cultura………………..………...………..…………….…….….…...... 14 2.2. União Europeia e Sector Cultural Comunitário……..…..…………………………........…….….. 18 2.3. Programas Comunitários e Sector Cultural ……………...….…………………………..…..….… 21 3. Políticas Culturais 3.1. Políticas Culturais na Europa e no Mundo ……………………..…………..….....…….……...… 24 3.2. Cultura e Tecnocracia ……………………………………....……..…………...…..….…..……….. 27 4. Sector Cultural 4.1. Sector Cultural e “disputa de campo” …………………………….….…………………...……….. 30 4.2. Sector Cultural em Portugal: uma perspectiva organizacional …….......…………........……… 34 5. Gestão Cultural 5.1. Gestão Cultural Profissional …………….…………………………..…………..,…………..…….. 38 5.2. Gestão Cultural e Formação Especializada ………………………………...………..……..……. 41 5.3. Gestão Cultural e Associativismo Profissional: a APGC ……..………..……..….………..……. 46 Conclusão …………………………………………………………………………………………...……. 48 Referências bibliográficas - nos respectivos artigos

Notas - No âmbito deste trabalho, entendeu-se criar um blogue - gestaoculturalpt.blogspot.com - como espaço orientado para a reflexão e discussão participativa, quer académica quer profissional, destes e de outros desejáveis contributos para a Gestão Cultural Profissional contemporânea. - Atendendo a que as várias abordagens deste ensaio também se procuraram desenvolver, em vários artigos, de forma autónoma, facilitadores de consulta e leitura dos conteúdos, acabaram por ser produzidas algumas naturais e ocasionais redundâncias.

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Introdução Este ensaio decorre da necessidade sentida de serem introduzidas, exploradas, reflectidas e discutidas um conjunto de questões sobre o que se entende por Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional e qual o seu papel na sociedade contemporânea, que se julgam ainda não abordadas de forma correlacionada, quer na perspectiva académica, quer na perspectiva profissional ou da sociedade civil. Numa perspectiva académica este trabalho pode ser caracterizado como integrando aspectos de investigação e de compilação, ser de amplitude panorâmica, ter como objecto uma análise histórica e teórica, bem como procurar introduzir e contribuir para uma reflexão contemporânea. Pensa-se que esta reflexão deve passar por ter em conta a origem, natureza e importância específica da Cultura e do Campo Cultural, nomeadamente numa perspectiva da relação dos povos da Europa e dos países da União Europeia com a Cultura, nomeadamente Erudita, bem como das suas Políticas Culturais para os Sectores Culturais comunitário e nacionais e, ainda, qual o lugar desta recente actividade profissional a que se chamou de Gestão Cultural, consagrando estes cinco temas como centrais. No âmbito destes temas cartografaram-se um conjunto de questões diversificadas, consideradas como mais relevantes e significantes, que se estruturaram num primeiro grupo de conteúdos, em forma de artigos: - “Cultura: uma perspectiva histórico-geográfica”, “Cultura: algumas definições e conceitos” e “Campo Cultural”, abordando questões como: cultura versus civilização, erudito versus popular e fruição versus consumo. - “Europa, União Europeia e Cultura”, “União Europeia e Sector Cultural Comunitário” e “Programas Comunitários e Sector Cultural”, abordando questões como: Europa continental versus anglo-saxónica, Sector Cultural comunitário e a sua organização, a “excepção cultural” europeia e o GATT e política versus “acção” cultural europeia. - “Políticas Culturais na Europa e no Mundo” e “Cultura e Tecnocracia”, abordando questões como: génese, objectivos e âmbito das Políticas Culturais, criação versus criatividade e modernidade versus pós-modernidade. - “Sector Cultural e “disputa de campo”” e “Sector Cultural em Portugal: uma perspectiva organizacional”, abordando questões como: Sector Cultural versus sector económico, as estatísticas e o Sector Cultural, Indústrias Culturais versus criativas. - “Gestão Cultural Profissional”, “Gestão Cultural e Formação Especializada” e “Gestão Cultural e Associativismo Profissional: a APGC” abordando questões como: caracterização da actividade, conduta profissional, modelo científico e pedagógico, actividade associativa. Todas estas questões estão, de uma forma geral, correlacionadas com a meta-questão de “disputa de campo” - no sentido do conceito consagrado por Pierre Bourdieu - que se entende ter vindo a manifestar-se, protagonizada pela tendência tecnocrática e pós-moderna de tentativa de captura do Sector Cultural pelo Sector Económico, como se poderá verificar, pela leitura deste breve ensaio. A Cultura assenta na necessidade do Homem desenvolver actividades de criação artística e intelectual o que tem acontecido ao longo de toda a Humanidade, sendo que para os povos da Europa ela tem como principal referência a cultura Greco-Romana. O desenvolvimento destas actividades, nomeadamente desde o século XVIII, na Europa, deu origem ao aparecimento de um “campo” com características e identidade próprias, o Campo

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Cultural, que determinou o seu enquadramento, em meados do século XX, no âmbito das políticas públicas, a que passou a chamar-se Políticas Culturais. Entretanto e naturalmente, foi-se estruturando e profissionalizando um sector de actividade com características específicas, o Sector Cultural, constituído pelos subsectores do Património Cultural, das Actividades Artísticas e das Indústrias Culturais. Com o processo de integração europeia as questões de política cultural, pela sua natureza e carácter nacional, foram sendo abordadas, não no quadro de uma Política Cultural Europeia pois formalmente a União Europeia não assume a sua existência mas, através de opções da sua “acção cultural” que intervém em vários domínios culturais. Tendo em conta as características específicas do Sector Cultural, nomeadamente dos seus subsectores do Património Cultural e das Actividades Artísticas, derivado do seu posicionamento na “Pirâmide Maslow” e pelas condicionantes evidenciadas pela “Lei de Baumol”, os apoios provenientes das Políticas Públicas da Administração do Estado ou da Sociedade Civil são e serão sempre necessários à sua sustentabilidade financeira. Com os actores sociais do “campo” mercantil/económico a entrarem no Sector Cultural, coloca-se claramente uma questão, também, política e ideológica relacionada com a criação de uma situação de “disputa de campo”, no sentido de Pierre Bourdieu, onde o Económico procura tentar disputar o poder e a autoridade do “Cultural”, com as respectivas consequências do “posicionamento estratégico” do “Cultural” nas estruturas político-administrativas dos países, nomeadamente da Europa Continental, através da sua menorização em Secretarias de Estado ou mesmo determinando o desaparecimento dos Ministérios da Cultura. A perspectiva tecnocrática de abastardar o conceito europeu de Cultura Erudita serve uma estratégia geral para justificar a não necessidade do Sector Cultural ser constituído como um dos pilares politico-administrativos dos Estado e a “demonstração” da sua “rentabilidade económica” reforça esta ideia e justifica a declinação de responsabilidade do Estado, em financiar as actividades culturais eruditas, deixando essa responsabilidade por conta dos humores discricionários do Mercado ou da consciência social da Sociedade Civil. Nas sociedades contemporâneas que adoptaram a abordagem da Europa Continental ao Sector Cultural, a Gestão Cultural é a actividade que integra de forma coerente todas as vertentes das organizações culturais, permitindo uma abordagem sistémica na procura sustentável da satisfação das necessidades e desejos de todos os Stakeholders, nomeadamente os Criadores e os Públicos Culturais. Para terminar, acontece que quer numa perspectiva antropológica e sociocultural, quer numa perspectiva tecnocrática e pós-moderna, naturalmente por razões de natureza complectamente distintas, o desenvolvimento de um domínio do conhecimento e de uma actividade profissional, orientada para a Gestão Cultural, poderá ser considerado como não fazendo sentido e sem grande utilidade para as sociedades futuras.

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1. Campo Cultural 1.1 Cultura: uma perspectiva histórico-geográfica A Humanidade desde há mais 30.000 anos, de acordo com o conhecimento disponível na actualidade, que manifesta as suas actividades e necessidades intelectuais, simbólicas e artísticas como fica demonstrado pela Arte Rupestre espalhada por todos os Continentes, nomeadamente na Europa Continental.

Figura 1 - Cavalos, Caverna de Chauvet, Ardèche, França (autor desconhecido, imagem do domínio púbico)

Entretanto, cerca de 26.500 anos depois, começaram a ser produzidas mais informações que vieram a permitir desenvolver esta abordagem sintética, numa perspectiva histórico-geográfica da Humanidade, nomeadamente Ocidental, de há cerca de 3.500 anos, 35 séculos, até aos nossos dias, o que permite ter, desde logo, uma ideia da complexidade deste tema. O início desta perspectiva remonta ao legado Moral Judaico de Moisés, século XVI a.C., no Antigo Egipto; decorre da herança Cultural e Civilizacional Greco-Romana desde Homero, no século VIII a.C., na Grécia Antiga; passa pelo Renascimento de Leonardo da Vinci, séculos XV e XVI, na República de Florença e Reino da França; contempla os resultados do pós-Primeira Guerra Mundial 1914-1918, na Europa e a criação da União Soviética em 1922-1991; tomando forma no pós-Segunda Guerra Mundial 1939-1945, nomeadamente, com o Tratado de Bruxelas, em 1948, que dá início ao que é hoje a União Europeia. Como é referido por Frédéric Delouche em “História da Europa (1), com desmembramento do Império Romano, no século V, três grandes domínios culturais, sob o ponto de vista sociocultural, desenvolvem-se no continente europeu: a sudoeste, o domínio balcânico, herdeiro do Império Romano do Oriente, com Bizâncio e posteriores influências muçulmanas; a leste, o domínio eslavo, com influências bizantinas, muçulmanas e ocidentais; a oeste, o domínio ocidental, agregando, desde então, as heranças culturais nórdicas e anglo-saxónicas à greco-romana. Em termos Ocidentais, pela sua gênese, os europeus são os herdeiros de uma cultura que se tornou universal com base em múltiplas tradições: as judaico-cristãs (valores morais); as gregas (filosofia, artes visuais, teatro, literatura e ciência); as romanas (língua, direito, organização militar, vias de comunicação e circo); as do humanismo renascentista (séculos XIV e XVI); as do iluminismo (segunda metade do século XVIII), as da liberdade democrática (Revolução Francesa, finais do século XVIII) e as da ciência europeia (século XIX). Com a mundialização, do seculo XVI, provocada pelos descobrimentos empreendidos por vários países europeus, sobretudo portugueses e espanhóis, a cultura europeia, judaico-cristã e grecoromana, espalhou-se pelo Mundo e acabou por influenciar o pensamento e as artes dos povos

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contactados passando a constituir-se, também, como seu referencial intelectual e, contribuindo, assim para a sua ocidentalização. De salientar, igualmente, as múltiplas e infindáveis influências provocadas por esses povos diversos, nos povos europeus, contribuindo assim, em muito, para o seu enriquecimento cultural. Edgar Morin em “Penser L’Europe”, sobre a questão da identidade cultural europeia (judaico-cristã e greco-latina), considera que a partir da Renascença ela evoluiu, em todos os seus domínios, de acordo com o que caracterizou como um “bouillonnement dialogique permanent” (caldo dialógico permanente), baseado nas suas reflexões orientadas pelos conceitos “dialógico” (união de duas noções contraditórias mas indissociáveis para compreender uma mesma realidade) e de “recursão” (circuito gerador onde cada elemento o processo é ao mesmo tempo o produto e o produtor) (2). Esta questão da Cultura, pela sua natureza, predomina numa contextualização parcial e específica a que, em termos Mundiais, se poderá chamar de Ocidente - Europa; América do Norte (Canadá e Estados Unidos da América - EUA); América Central e do Sul (países Hispânicos e Brasil); Oceânia (Austrália e Nova Zelândia) e África (de influência ocidental: Lusófona, Francófona, Anglo-saxónica e Holandesa). Relativamente à Europa, em termos gerais, ela poderá ser tida em consideração no espaço da União Europeia, em 2013, e ter como orientação o chamado Modelo Social Europeu que, em linha com a classificação tradicional da sociologia, é constituído por vários submodelos: Nórdico: Dinamarca, Finlândia, Holanda e Suécia (4, sem Noruega); Anglo-Saxónico: Irlanda e Reino Unido (2); Continental: Alemanha, Áustria, Bélgica, França e Luxemburgo (5, sem Suíça); Mediterrânico: Chipre, Espanha, Grécia, Itália, Malta e Portugal (6); aos que nós acrescentamos o Oriental ou de Leste: Bulgária, Croácia, Estónia, Eslováquia, Eslovénia, Hungria, Letónia, Lituânia, Polónia, República Checa e Roménia (11, sem os restantes países de Leste). Em termos específicos da Gestão Cultural, uma abordagem à Cultura apresenta-se como especialmente relevante, principalmente, para as sociedades associadas aos submodelos Europeu Continental e Mediterrânico, bem como aos espaços Lusófono, Hispânico e Francófono. Numa perspectiva portuguesa, não poderá deixar de ser considerado, ainda, o espaço Lusófono Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste. Como síntese, no âmbito duma reflexão alargada sobre a questão do Campo Cultural e da Gestão Cultural Profissional, entende-se que deverá ser privilegiado o desenvolvimento de uma abordagem orientada por uma perspectiva: Ocidental; Europeia Continental/Mediterrânica; Lusófona e Portuguesa.

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Referências bibliográficas (1)

Delouche, Frédéric - “História da Europa”, Edições Minerva, Coimbra, 1992.

(2)

Morin, Edgar - “Penser l’Europe”, Éditions Gallimard, Paris, 1987.

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1.2 Cultura: algumas definições e conceitos Abordar a questão das definições e conceitos de “Cultura” implica, desde logo, aceitar um desafio de grande complexidade, atendendo a que este conceito tem múltiplos significados e significâncias, e tem, também, variadas designações, conforme os campos dos seus utilizadores. Como é referido por Livio Missir di Lusignano, em “Communauté et Culture”, só a nível europeu, existem várias asserções e aquilo a que “alguns chamam simplesmente “cultura”, (como por exemplo a França, a Espanha e Portugal), outros chamam “artes” (como no caso do Reino Unido), outros “Bens culturais” (como em Itália), outros “Kultus” (em lugar de “kultur”, como a Alemanha) e (1) outros, ainda, “civilização” (“Politismós” como na Grécia) . A nível Mundial, o último texto da “Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural” da UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, assinada por praticamente todos os países, mais de 190, considera a “cultura”, no seu sentido mais lato, como não poderia deixar de ser, referindo que “a cultura deve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que abrange, além (do campo) das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças” (2). A União Europeia, para efeitos estatísticos, começa por seguir a definição de “Cultura”, no seu sentido mais estrito, adoptada pelo Leadership Group on Cultural Statistics - LEG-Culture, do Eurostat, em 2000, que tem uma abordagem delimitadora do campo cultural em 8 domínios (Património artístico e monumental, Arquivos, Bibliotecas, Livros e imprensa, Artes visuais e Arquitectura, Artes performativas, Áudio e audiovisual media/multimédia) e 6 funções destinadas a situar as actividades económicas culturais (Preservação, Criação, Produção, Divulgação, Comércio e vendas e Educação) (3). Mais recentemente, em 2012, o European Statistical System Network on Culture - ESSnet-Culture, do Eurostat, da Comissão Europeia, no seu relatório final, passa a considerar 10 domínios (Património artístico e monumental, Arquivos, Bibliotecas, Livros e imprensa, Artes visuais, Artes Cênicas, Audiovisual e Multimédia, Arquitetura, Publicidade e Artes Ofícios) e reformula as 6 funções Criação, Produção / Publicação, Divulgação / Comércio, Conservação, Educação e (4) Gestão / Regulação . Em Portugal, o OAC - Observatório das Actividades Culturais (entretanto extinto, inesperadamente) na sua publicação ”As Políticas Culturais em Portugal”, de 1998, considera a Cultura como as actividades relativas às: Artes Plásticas; Música; Dança; Teatro; Cinema, Televisão e Rádio; Livro, publicações e bibliotecas; Património, museus e arquivos; Actividades (5) sócio-culturais . No âmbito das Pós-graduações em Gestão Cultural foi adoptada uma outra abordagem, também, em sentido restrito, não muito distante da utilizada pelo OAC, que considera como parte integrante do Sector Cultural: o Património Cultural (bens materiais e imateriais simbólicos eruditos, do passado); as Actividades Artísticas - Artes do Espectáculo, Artes Visuais, Artes Electrónicas e Humanidades (bens e serviços simbólicos eruditos, não facilmente reprodutíveis, do presente); Indústrias Culturais (reprodução e difusão em massa de bens e serviços simbólicos eruditos, do presente) e, ainda, a Arquitectura, simbólica erudita (de autor), do presente. A expressão “Industrias Culturais”, reapareceu, na década de 80 do século XX, na área metropolitana de Londres e espalhou-se rapidamente em Portugal - num contexto social em que a “moda” ditava a reverência pelo pensamento tecnocrático e pelo “pós-modernismo” superficial e folclórico dos seus seguidores - passando a ser usada, quer pelo Sector Cultural quer pela

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Comunicação Social, indiscriminadamente, relativamente a todas as actividades culturais e numa lógica mercantil, mas já sem o sentido crítico, pelo modo alienante, que Theodor Adorno e Max (6) Horkheimer , em 1947, atribuíam à sua exploração comercial. Neste contexto começou-se a procurar contribuir para consagrar uma outra nova acepção, atribuindo-lhe ainda um outro sentido, que passou a ter em conta não o fim, a sua exploração comercial, mas o meio, o processo de produção industrial, definindo então as Indústrias Culturais como: “actividades do campo cultural predominantemente assentes em processos de produção industrial”, tais como Cinema (chamado de “autor”), Televisão (como a RTP2, em Portugal), Rádio (como a Antena2, em Portugal) e publicações (edições de livros e música de “referência”). Vasco Graça Moura, no seu recente ensaio, “A Identidade Cultural Europeia”, de leitura recomendável, falando de “Identidade europeia, auto-reflexão e autoquestionamento” refere: “a oposição crescente - que provavelmente não foi partilhada pelas outras áreas do mundo ou, se foi, veio a sê-lo por influência europeia - entre humanismo e ciência que se esboçou a partir do séc. XVIII, com o primado da razão a sobrepor-se à importância das Humanidades, ou, dizendo de outra maneira, com as Humanidades a entrarem em decadência” (7). Esta oposição cruza-se com outras oposições, surgidas no mesmo século, como a que dividiu a antropologia europeia, sobre a questão dos conceitos de “Cultura” e “Civilização”. Cultura, durante o século XVIII, passa a ser utilizada com um complemento: Cultura das Ciências, Cultura das Letras, Cultura das Artes, etc. e começa a ser utilizada no sentido de espírito cultivado - erudito - por oposição a um espírito natural - inculto, rústico. No século XIX, as escolas de pensamento antropológico começam a associar ao conceito de Cultura diferentes produções de Conhecimento. A antropologia anglo-saxónica considera “Cultura” como o conjunto da produção de Conhecimento espacial, colectivo e material - político, legal, económico, sociocultural e tecnológico - e individual e imaterial - artístico, literário, filosófico, moral e científico. A antropologia europeia continental, nomeadamente, francesa e germânica, considera como “Civilização” a produção de Conhecimento, mais espacial, colectivo, material e objectivo - político, legal, económico, sociocultural e tecnológico - e como “Cultura” a produção de Conhecimento, mais individual, imaterial e subjectivo - artístico, literário, filosófico, moral e científico o que está em linha com o que é referido, também, por Frédéric Delouche em "História da Europa" (8). A Europa construiu-se com base na Cultura e Civilização Greco-Romana sendo que, ao distinguirse Cultura e Civilização, “Cultura”, pela sua natureza sociocultural, poderá encontrar a sua raiz mais na Grécia Antiga e “Civilização”, pela sua natureza socioeconómica e tecnológica, poderá encontrar a sua raiz mais na Roma Antiga. Em linha com a abordagem antropológica europeia continental, considera-se Cultura, em sentido restrito, como produção de Conhecimento mais individual, imaterial e subjectivo - artístico, literário e filosófico - não tendo em consideração o conhecimento moral e científico. Entretanto, esta questão não pode deixar de nos remeter para a Gestão Estratégica das organizações, onde a produção de conhecimento, com base nos factores da envolvente externa macroambientais, foi consagrada pela tradicional “Análise PEST Político-legal, Económica, Sociocultural e Tecnológica”, incorporando a componente cultural em sentido alargado como um dos recursos e elemento diferenciador de natureza contextual, imaterial, conceptuais e simbólica da sociedade contemporânea.

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Outra oposição, no âmbito da Cultura, que importa ainda referir é entre “alta e baixa” ou “erudita e popular”, sendo que se considera preferível esta última designação, pelo seu carácter mais qualitativo. Neste sentido considera-se a Cultura Erudita orientada pelas questões do Pensamento e das Artes, mais do domínio da Filosofia: Epistemologia e da Estética e a Cultura Popular, orientada pelas questões da Utilidade e das Tecnologias, mais do domínio da Antropologia e da Etnografia. O termo “erudito” no sentido etimológico provém de “ex-rude”, no sentido de algo natural que, depois de ter sido cultivado no sentido material/espacial, passou a ser cultivado no sentido imaterial/espiritual, através de um processo de elaboração e de aperfeiçoamento contínuo do conhecimento adquirido. Assim, sempre que se fala em Cultura, entende-se ser no sentido estrito, de Cultura Erudita, entendida como um valor, um bem público, algo que se usufruiu e se assimila, nomeadamente para os povos da Europa Continental, contrariamente ao entendimento norte-americano que a considera como um produto que se comercializa e consome. Entendendo-se como “bens públicos” todos os que produzem benefícios sociais a todos os cidadãos e que o mercado não consegue remunerar e, neste sentido, os bens e valores culturais, imateriais e materiais, têm um valor qualitativo intrínseco sendo factor de enriquecimento da pessoa humana, do seu relacionamento com o “outro” e, consequentemente, determinante para o exercício de uma ética de cidadania. Este entendimento oposto, do valor da Cultura, está na base das questões levantadas no âmbito da Diversidade Cultural, pela França e pelo Canadá, nas negociações comerciais multilaterais do GATT - General Agreement on Tarifs and Trade, em 1994 (9), e que ficou reconhecida como a “excepção cultural” europeia, sendo que só é aplicável no âmbito das Indústrias Culturais. No Modelo Social Europeu, o acesso à Cultura é um direito social - não caridade pública - e sendo os direitos sociais obrigações da responsabilidade dos Estados de Direito Democrático exigem, também, às organizações Culturais, grande responsabilidade e total transparência na utilização dos financiamentos públicos - dinheiro dos contribuintes -, para a criação de Valor Social. No âmbito da Gestão Cultural, esta questão ganha especial relevância pois conduz para a necessária reflexão sobre o conceito de "marketing", quando aplicado no campo cultural, que Philip Kotler introduz em 1976 e que passou a constituir-se como uma componente da Gestão tendo por objectivo adequar os “produtos” à "satisfação das necessidades e desejos dos consumidores” (10). A Arte ocupa o lugar central da Cultura, em sentido restrito e Erudito, actividade estruturante do Sector Cultural, uma das vertentes organizacionais dos Estados de Direito Democrático, orientados pelo chamado Modelo Social Europeu, nomeadamente Continental e Mediterrânico. Sobre a Arte refere-se o pensamento de três grandes vultos da Cultura do século XX: - Rainer Maria Rilke, que em “Cartas a um jovem poeta”, Paris, 1903, refere: “Uma obra de arte é boa quando surge de uma necessidade. É no modo como ela se origina que se encontra o seu valor” (11). - Fernando Pessoa, que em ATHENA 1924, refere: “O fim da arte inferior é agradar, o fim da arte média é elevar, o fim da arte superior é libertar. Mas a arte média, se tem por fim principal o elevar, tem também que agradar tanto quanto possa; e a arte superior, se tem por fim libertar, tem também que agradar e que elevar, tanto quanto possa ser [...]. Elevar e libertar não são a

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mesma coisa. Elevando-nos, sentimo-nos superiores a nós mesmos, porém por afastamento de nós. Libertando-nos, sentimo-nos superiores em nós mesmos, senhores, e não emigrados, de nós. A libertação é uma elevação para dentro, como se crescêssemos em vez de nos alçarmos (12). - Vasco Graça Moura, que no ensaio já citado refere: “Mas, fosse qual fosse a sua controversa utilidade, a arte sempre acabou por espelhar e também transformar o mundo”. ______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a] [b]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação sítio disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.c om / Informações

(1) [a]

Lusignano, Livio Missir - “Communauté et Culture”, Revue du Marché commun et de l’Union européenne, nº 376, March 1994. (2) [a]

UNESCO - “Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural”, Paris, 2002.

(3) [b]

Eurostat - Office Statistique de l'Union Européenne, Internet, Janeiro 2015.

(4) [a]

Eurostat - “ESSnet on Culture Statistics - Final report”, European Commission, Luxembourg, March 2012. (5)

Santos, Maria de Lourdes Lima dos (coordenação) - ”As Políticas Culturais em Portugal”, Observatório das Actividades Culturais, Lisboa, Novembro 1998. (6) [a]

Adorno, Theodor W.; Horkheimer, Max - “Dialéctica del Iluminismo”, www.philosophia.cl / Escuela de Filosofía Universidad ARCIS, Amesterdão, 1947. (7)

Moura, Vasco Graça - "A identidade Cultural Europeia", Ensaios da Fundação / Fundação Francisco Manuel dos Santos, Relógio D'Água Editores, Lisboa, Novembro 2013. (8)

Delouche, Frédéric (coordenação) - “História da Europa”, Edições Minerva, Coimbra, 1992.

(9) [a]

Conselho da União Europeia - “Decisão do conselho (94/800/CE) - relativa aos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994), Jornal Oficial das Comunidades Europeias, Luxemburgo, 22 Dezembro 1994. (10)

Kotler, Philip - “Marketing”, Editora Atlas S.A., São Paulo, 1987.

(11) [a]

Rilke, Rainer Maria - “Cartas a um jovem poeta”, L&PM Editores, Porto Alegre, 2006.

(12) [a]

Pessoa, Fernando - “Páginas de Estética e de Teoria Literária” (Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho), Ática, Lisboa, 1966.

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1.3 Campo Cultural O termo “campo” é utilizado no sentido consagrado por Pierre Bourdieu devendo ser entendido como um “espaço estruturado de posições”, onde os actores sociais estão em confronto pelo acesso ao controlo dos seus campos específicos, no âmbito de regras estabelecidas (1) e “Campo Cultural” como o campo intelectual, espaço de produção de bens simbólicos, em particular, eruditos. A propósito de Identidade Cultural Europeia, em “European Identity and Nacional Identities” Tony Judt refere que ” A Europa sempre foi uma ideia intimamente associada a um grupo social particular - a elite educada. (...) Essa noção de que a Europa se identifica com a alta cultura e que, portanto, é o local de pessoas cultas, corresponde profundamente à nossa noção do que significa (2) ser europeu, ter identidade europeia, ter uma cultura europeia.” Esta “elite educada” que se subentende como “elite culta”, tem como principal referencia a Cultura Erudita e, por isso, a importância que sempre se tem atribuído à sua defesa e democratização. A aposta na construção, permanente e democrática, desta “elite culta” deveria ser o desígnio de todos os responsáveis políticos do Mundo, nomeadamente, através dos objectivos a alcançar no âmbito das Políticas Culturais. O conhecimento “erudito” na Cultura será tão elitista como nos outros campos do conhecimento, nomeadamente, Político, Jurídico, Económico, Financeiro, Sociológico, Ambiental, Científico e Tecnológico. O Campo Cultural, quer em sentido lato, quer em sentido estrito tem, naturalmente, uma dimensão económica e social e, sendo a perspectiva da "economia de mercado" dominante em todas as sociedades contemporâneas, o campo cultural, apesar das suas particularidades, não pode deixar de contribuir, também, para esta economia estando por isso, implicitamente, também, sujeito a uma valorização quantitativa. Esta contingência natural não deveria fazer esquecer nunca que, este campo, pela sua natureza intrínseca “qualitativa”, não pode ser avaliado, em primeira instância, de uma forma “quantitativa”, através de uma qualquer “cadeia de valor”, pelo que procurar justificar a sua importância para a Humanidade e para o Homem pelo lado quantitativo será um caminho demagógico e absurdo que, podendo ser fácil e lucrativo a curto prazo, não deixará de ser perigoso a médio-longo prazo. Em linha com a desmaterialização dos padrões de consumo contemporâneos, pelo facto de a Cultura (criador/produtor/fruidor) ser, também, de natureza imaterial, não se deveria permitir que a pretendam considerar como um produto de consumo (criativo/produtor/consumidor). A criação Cultural Erudita, pela sua natureza, não está orientada para a sociedade de consumo característica, na actualidade, do “campo económico”, sendo as actividades que frequentemente lhe procuram associar como: lazer, diversão, passatempo, tempos livres, turismo, comunicação social, entre outras, que conduzem a este tipo de confusão que se acredita não ser por ignorância ou ingenuidade. Uma coisa será estar orientado para, em primeiro lugar, procurar satisfazer uma necessidade existencial de fruição intelectual, outra é procurar satisfazer uma necessidade lúdica, recreativa, social ou económica, nomeadamente da sociedade de consumo. A preocupação em procurar justificar a importância do Sector Cultural, junto dos cidadãos ou súbditos, em primeiro lugar, pela definição de “cadeias de valor” acrescentado, económico e

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financeiro, como é feito em alguns “estudos” - KEA (3) e Augusto Mateus (4) - e não por “cadeias de valor” acrescentado artístico, intelectual e cultural” poderá ser entendida como uma forma dissimulada de tentativa de captura do “campo cultural” pelo “campo económico” e a sua implícita subordinação. Seria pouco compreensível que os “criadores” - que aqui não serão confundidos com os “criativos” -, depois de terem concluído, no século XIX, a sua relativa emancipação económica, social, moral, ética e estética, tutelada historicamente pela aristocracia, pela igreja e pela academia, venham agora, por via das “indústrias”, aceitar ficar subordinados exclusivamente ao “campo económico”. Neste caso, voltaria a ser retomado o sentido pejorativo atribuído por Theodor Adorno e Max Horkheimer, em 1947, às “indústrias culturais” (5), que se entende já não possuírem por se ter passado a considera-las, contemporaneamente, com uma outra acepção (6), o mesmo não se podendo dizer das pós-modernas “indústrias criativas” assumidamente do “campo económico”. Como vai sendo costume, os governantes, quer a nível nacional quer europeu, continuam empenhados a encomendar “estudos”, uns atrás dos outros, para justificarem as suas políticas e, obviamente, as organizações de consultoria interessadas em realizá-los (ou, em alguns casos, podendo mesmo acontecer o contrário, fruto das proverbiais “economias de favor”) mas, depois, nomeadamente, os responsáveis políticos, não se preocupam em reflecti-los e discuti-los, de forma transparente e responsável com os actores sociais, transformando aquilo que deveria ser um investimento para o desenvolvimento do Sector Cultural, quer em Portugal quer na União Europeia, num custo para os contribuintes, quer nacionais quer europeus. No âmbito da Gestão Cultural, a questão da “disputa de campo”, não pode deixar de ser associada, também, com a “Análise das 5 Forças", que Montgomery e Porter introduzem em 1979 e que passou a constituir-se como uma ferramenta do domínio da Estratégia, tendo por objectivo a definição do Posicionamento organizacional (7). O Campo Cultural, como qualquer outro “campo”, estruturante das sociedades contemporâneas desenvolvidas, para o seu melhor desenvolvimento e conhecimento, necessita de ser analisado e perspectivado em múltiplas vertentes, nomeadamente política, económica e social, pelo que surgiram, naturalmente e com todo o sentido, novas áreas de investigação e disciplinares como as Políticas Culturais, a Economia da Cultura, a Sociologia da Cultura e, este facto, deveria contribui para um melhor conhecimento e estruturação desde “campo”, como base em informação fundamentada e tratada objectivamente e não para a sua descaracterização e captura pelo Sector Económico. A criação e a criatividade em geral decorre da necessidade e/ou capacidade de conceber algo novo, complectamente distinguível, pela introdução de um novo paradigma, um novo padrão conceptual mas, inexoravelmente, com referência e/ou baseada em conhecimento já estabelecido e/ou adquirido o que, no sentido de Benoit B. Mandelbrot, poderá ser considerada, na maioria dos (8) casos, como “fractal” . Qualquer medição das Actividades do Campo Cultural pressupõe uma contextualização e especificação com rigor metodológico e, pela natureza complexa do sector, isso só será possível quando for aceite a necessidade de se avançar, nomeadamente a nível dos Estados-Membros continentais da União Europeia, com uma iniciativa em linha com o “Manual de Frascati” (9), uma iniciativa da OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, da UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, da União Europeia e de outras organizações regionais, transnacionais para que se desenvolvessem manuais metodológicos sobre o conceito e os princípios básicos relativos à medição das actividades de Ciência e Tecnologia. ______________________________________________________________________________

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Referências bibliográficas [a]

(1)

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

Bourdieu, Pierre - “A economia das trocas simbólicas”, Perspectiva, São Paulo, 2005.

(2) [a]

Judt, Tony - “European Identity and National Identities”, in Barreto, António (coordenação), Europa e Cultura/Seminário Internacional, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1998. (3) [a]

KEA European Affairs - “The Economy of Culture in Europe, European Commission”, Directorate-General for Education and Culture, Brussels, October 2006. (4) [a]

Mateus, Augusto (coordenação) - “O Sector Cultural e Criativo em Portugal”, GPEARI Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais do Ministério da Cultura, Lisboa, Janeiro 2010. (5) [a]

Adorno, Theodor W.; Horkheimer, Max - “Dialéctica del Iluminismo”, www.philosophia.cl / Escuela de Filosofía Universidad ARCIS, Amesterdão, 1947. (6) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (7)

Porter, Michael; Montgomery, Cynthia, - “Estratégia: A busca da vantagem competitiva”, Campus, Rio de Janeiro, 1998. (8)

Gleick, James - “Caos: A construção de uma nova ciência”, Gradiva, Lisboa, 1989.

(9) [a]

OECD Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico - “Manual de Frascati: Proposta de Práticas Exemplares para Inquéritos sobre Investigação e Desenvolvimento Experimental”, F-Iniciativas, Coimbra, 2007.

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2. Europa e Cultura 2.1 Europa, União Europeia e Cultura Quando se fala em Europa, na actualidade, importa ter presente as suas várias asserções: o Continente Europeu (50 países), a UE - União Europeia (28 países) e a UEM - União Económica e Monetária europeia (18 países).

Figura 1 - União Europeia (ec.europa.eu, 2013)

Na segunda metade do séc. XX, após os confrontos politico-militares das duas grandes guerras mundiais, a Europa deu início à sua reconstrução, como refere Fernando Amorim em “Áreas e fronteiras culturais da Europa”, citando Robert Picht, “começando pelo que parecia mais fácil, (…) uma Comunidade Económica Europeia de que resultou uma União Europeia de construção política (a 25 Estados) que repousa, como no passado, numa forte base continental olhada com cepticismo ou suspeita por Estados-Nação de tradição talassocrática (dos Gregos aos Ingleses, passando por Portugueses e Holandeses)” (1).

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Destas potências marítimas o Reino Unido acabou se constituindo, até ao final do século XX, como um importante império do Mundo Ocidental, com uma ímpar e fortíssima identidade cultural, facilitada pela sua simplicidade linguística, no sentido a que Martin Heidegger chamou de “língua técnica” (2) e que tem vindo a conseguir manter e fortalecer até aos nossos dias. As sondagens do Eurobarómetro da Comissão Europeia, “Como os Europeus se Vêm a Si Próprios”, com Trabalho de Campo até Dezembro de 1998, revelavam que o Reino Unido era o país da União Europeia onde só 37% das pessoas, a ela se sentem ligadas e, concomitantemente, onde 67% das pessoas mais se identificam com a sua própria nacionalidade (3). Apesar de, formalmente, a União Europeia não assumir a existência de uma Política Cultural Europeia ela acaba por existir, de facto, através de opções da sua “acção cultural” que intervém em vários domínios como os Direitos de autor, a Fixação do preço dos livros, o Financiamento do Cinema, a Liberalização do mercado das telecomunicações e das suas opções relativamente ao tipo de Programas de Apoio que tem vindo a criar. Ao contrário do que se possa pensar, a construção europeia, nomeadamente, até ao Tratado de Lisboa, tem sido um processo não muito democrático e transparente e, por vezes, em linha com os famigerados comportamentos - de pouco rigor e transparência - tão criticados aos designados “países do Sul”. Uma assumida e transparente Política Cultural Europeia poderia melhor contribuir como factor de Coesão, Identidade e Democratização da Europa Comum que, o seu discurso formal, se propõe construir. A característica distintiva da Cultura Europeia, no Mundo contemporâneo, é ser uma cultura de liberdade independente, directamente, dos poderes políticos, aberta, de vocação universal e de matriz greco-romana, que se afirma pela diversidade de culturas que a compõem e, qualquer possível Política Cultural Europeia terá que assentar nesta realidade, de unidade na diversidade e na cooperação transnacional entre os actores culturais: intelectuais, artistas, instituições governamentais e não-governamentais, governantes e todos os outros cidadãos. O processo de construção-integração da Europa (União Europeia), acabou introduzindo a dimensão Cultural, pela admissão generalizada da sua importância para duas questões: a autorepresentação que os europeus tendem a ter sobre si próprios e a necessidade de procurar consolidar uma especificidade europeia no processo da mundialização.

Tratado de Lisboa e Cultura A questão Cultural, tendo começado pela ideia de uma “Cultura Europeia”, passou a uma “Europa das Culturas”, baseada na já existente cooperação cultural, tendo vindo a ter a sua consagração no artigo 128.º do Tratado de Mastricht, de 1992-93, renumerado para 151.º no Tratado de Amesterdão, de 1997-99, e para 167.º no Tratado de Lisboa, de 2007-09 (Parte III - As Políticas e Acções Internas da União; Título XIII - A Cultura) (4), que passou a instituir um quadro de referência regulamentar, nomeadamente, para as questões económicas e políticas da Cultura, nos seus aspectos imateriais e materiais. Logo no primeiro ponto do Preâmbulo, o Tratado de Lisboa, refere: “Inspirando-se no património cultural, religioso e humanista da Europa, de que emanaram os valores universais que são os direitos invioláveis e inalienáveis da pessoa humana, bem como a liberdade, a democracia, a igualdade e o Estado de direito,”

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No seu ponto 1, refere: “A Comunidade contribuirá para o desenvolvimento das culturas dos Estados-membros, respeitando a sua diversidade nacional e regional, e pondo simultaneamente em evidência o património cultural comum.” Nesta matéria, a Comunidade não tem portanto nenhumas competências consignadas, e só “contribuirá para o desenvolvimento das culturas dos Estados-membros”, pelo que as competências em matéria Cultural são da exclusiva responsabilidade dos Estados-membros, ao abrigo do consagrado “princípio da subsidiariedade”. Acontece que a Comunidade, nomeadamente desde o Tratado de Amesterdão, em 1997-99 (5), vem abordando com frequência várias questões do domínio Cultural mas, principalmente as relacionadas com a Indústrias Culturais, por vezes as relacionadas com o Património Cultural e raramente são feitas referências às Actividades Artísticas (Artes do Espectáculo, Artes Visuais, Artes Electrónicas e Humanidades). No seu ponto 2, refere: “A acção da União tem por objectivo incentivar a cooperação entre Estados-membros e, se necessário, apoiar e completar a sua acção nos seguintes domínios: - Melhoria do conhecimento e da divulgação da cultura e da história dos povos europeus; - Conservação e salvaguarda do património cultural de importância europeia; - Intercâmbios culturais não comerciais; - Criação artística e literária, incluindo o audiovisual.” Poderemos constatar, igualmente, por leitura dos múltiplos documentos da Comissão Europeia, do Conselho e do Parlamento Europeu, que as abordagens da União Europeia às questões do domínio Cultural são feitas numa perspectiva Social e Económica, não numa perspectiva Cultural. Quando as referências são numa perspectiva Cultural poderemos constatar também, na maior parte das vezes, que está a referir-se principalmente às Indústrias Culturais devido à sua importância política, económica e social, não pela sua importância Cultural. No seu ponto 3, refere: “A União e os Estados-membros incentivarão a cooperação com os países terceiros e as organizações internacionais competentes no domínio da cultura, em especial com o Conselho da Europa.” (instituição não Comunitária, por vezes confundida com o Conselho Europeu, instituição Comunitária). No início do ponto 4, quando refere “Na sua acção ao abrigo de outras disposições dos Tratados, a União terá em conta os aspectos culturais, afim de, nomeadamente, respeitar e promover a diversidade das suas culturas” permite-nos, também interpretar que, se por um lado, se está a reforçar a consagração dos “aspectos culturais”, por outro, se está a consagrar, também, o seu papel complementar, suplectivo e por isso subalterno. Os assuntos políticos, económicos e sociais, consagrados nos Tratados que culminaram no da União Europeia, pela sua natureza, sempre tiveram primazia sobre os assuntos culturais e, como sempre, os interesses económicos logo se procuraram fazer sentir, naturalmente, no sentido de conseguirem uma possível exploração do conceito de Cultura para introduzir e capturar os aspectos que se possam revelar, financeiramente, lucrativos. ______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a] [b]

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(1) [a] [b]

Amorim, Fernando - “Áreas e fronteiras culturais da Europa”, Janus 2005 - Anuário de Relações Exteriores, Público e Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa, Dezembro 2004. (2)

Heidegger, Martin - “Língua de tradição e língua técnica”, tradução Mário Botas, Veja, Lisboa, 1995. (3) [a]

Comissão Europeia (Eurobarómetro) - “Como os Europeus se Vêm a Si Próprios, Sondagens de opinião - Um espelho da realidade”, Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Luxemburgo, 2001. (4) [a]

União Europeia - “Tratado de Lisboa”, Serviço das Publicações da União Europeia, Luxemburgo, 2010. (5) [a]

União Europeia - “Tratado de Amesterdão”, Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Luxemburgo, 1997. ______________________________________________________________________________

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2.2 União Europeia e Sector Cultural Comunitário Ao nível da União Europeia os “aspectos culturais”, não assumidos como Política Cultural, passam por todas as suas grandes instituições: Parlamento Europeu, Conselho Europeu, Conselho da União Europeia e Comissão Europeia, bem como por outras mais específicas como: Comité das Regiões, Comité Económico e Social Europeu; Agências da União Europeia: - Parlamento Europeu - através das competências da Comissão Cultura e Educação sobre as (1) questões da Educação, Juventude, Audiovisual, Informação e Media . - Conselho Europeu - composto pelos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados-Membros, bem como pelo seu Presidente e pelo Presidente da Comissão (2). - Conselho da União Europeia - através das reuniões do Conselho de Ministros dos EstadosMembros relacionados com a Educação, Juventude, Cultura e Desporto (a Cultura inclui a Comunicação), onde todas as suas decisões, em matéria Cultural, têm que ser tomadas por unanimidade, tendo o apoio do Comité dos Assuntos Culturais e do Grupo Audiovisual na (3) preparação dos Conselhos . - Comissão Europeia - através de várias Direcções-Gerais (DG): a DG Educação e Cultura; a DG da Sociedade de Informação e Media; a AEEAC - Agência Executiva para a Educação, os Audiovisuais e a Cultura e, ainda, por outras, nomeadamente a DG da Concorrência, pelas questões das ajudas dos Estados-membros às Indústrias Culturais; a DG do Mercado Interno, dos Impostos e União Aduaneira, pelas questões fiscais do IVA e dos direitos de autor sobre os bens e serviços culturais; a DG da Justiça e Assuntos Internos, pelas questões e relacionadas com roubos e tráfico de obras de arte. É a instituição responsável pelos Programas de Iniciativa Europeia (4). - Comité das Regiões - através das suas comissões especializadas, nomeadamente, da (5) Comissão de Educação, Juventude, Cultura e Investigação (EDUC) . - Comité Económico e Social Europeu - através desta assembleia consultiva, a sociedade civil europeia, representativas de grupos de interesses, nomeadamente, Organizações Culturais, podem exprimir as suas opiniões sobre as políticas comunitárias (6). - Agências da União Europeia - são entidades jurídicas distintas, das instituições da União Europeia, criadas para realizar tarefas específicas ao abrigo do direito europeu, como por exemplo a Agência de Execução relativa à Educação, ao Audiovisual e à Cultura (EACEA) (7). As abordagens políticas, dos “aspectos culturais”, no âmbito da União Europeia, têm sido e continuarão a ser, naturalmente, o reflexo das políticas culturais dos Estados-membros - quando existem - e, nesse sentido, a atenção à sua discussão e definição torna-se imprescindível e fundamental, a nível nacional. Acontece que se, de uma forma simplista, se poderá afirmar que a União Europeia em questões industriais e financeiras tem sido orientada pelos interesses particulares da Alemanha, e em questões de agricultura pelos interesses particulares da França pensa-se poder dizer, também, que em matéria de assuntos culturais ela tem sido orientada pelos interesses particulares do Reino Unido, nomeadamente, através da estratégia de influência cultural e imperial da Coroa Britânica na Commonwealth e, através dela, no Mundo, bem como pela vantagem comparativa da grande facilidade de penetração da sua língua “técnica”, no sentido introduzido por Martin Heidegger (8), e que é, também, a oficial dos Estados Unidos da América - EUA, a potência Mundial mais influente na actualidade. Resta saber onde se quer e se pode situar Portugal e a Lusofonia, no âmbito da Europa Continental e Mediterrânica.

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Simultaneamente e de uma forma geral, tem-se verificado que a atenção política que tem vindo a ser atribuída à Cultura, pela União Europeia, tem sido mais em função da importância do seu valor económico (material), nomeadamente para o sector privado, do que pela importância do seu valor cultural (imaterial e simbólico), o único que se deveria entender como podendo e devendo contribuir para a continuada construção da ancestral Cultura de matriz Europeia. Entretanto, a Comissão Europeia 2015-2019, presidida por Jean-Claude Juncker, começou por dar sinais de novas preocupações para o Sector Cultural Europeu, com a mistura da Cultura com o Digital, esperando-se que o Comissário Tibor Navracsics - apesar da sua formação jurídica e referências culturais de “país de Leste” (Hungria) - demonstre a sensibilidade necessária para as suas funções na pasta da Direcção-Geral Educação, Cultura, Juventude, Línguas e Desporto, da União Europeia.

Sector Cultural Comunitário A União Europeia, no que se refere ao Mercado Interno e ao Mercado Externo, relativamente ao Sector Cultural, tem vindo a tratar sobretudo as questões relacionadas com Fiscalidade, Concorrência e Propriedade Intelectual: - Fiscalidade: Liberalização da aplicação das taxas reduzidas de IVA (5% ou 0%): a obras de arte; a livros, jornais e publicações periódicas; às diversas actividades culturais; à recepção de rádio e televisão; às prestações de serviços efectuadas por criadores culturais (9). Dupla tributação: à revenda de bens culturais, antiguidades e objectos de coleções artísticas (10); - Concorrência: “a fim de respeitar e de promover a diversidade das suas culturas” - Preço Fixo do Livro (11); Subsídio para Cinema e Indústria Audiovisual (12); - Propriedade Intelectual: Harmonização (13); Acordo TRIPS/ADPIC (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights/Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados com o Comércio), no âmbito do GATT - General Agreement on Tarifs and Trade, que contempla a questão da “excepção cultural” (14). Importa ter presente que, ao contrário das dimensões Política, Social, Económica e Monetária em que o projecto da União Europeia se orienta por uma lógica de integração, a dimensão Cultural, excepcionalmente e necessariamente, orienta-se por uma lógica de cooperação, procurando respeitar sempre o princípio da subsidiariedade, sendo esta questão da maior relevância para a afirmação, manutenção e desenvolvimento das Culturas nacionais, dos Estados-membros.

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Referências bibliográficas [a] [b]

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(1) [b]

Parlamento Europeu - Comissão Cultura e Educação - Internet, Janeiro 2015.

(2) [b]

Conselho Europeu - Internet, Janeiro 2015.

(3) [b]

Conselho da União Europeia - Educação, Juventude, Cultura e Desporto - Internet, Janeiro 2015.

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(4) [b]

Comissão Europeia - DG Direcção-Geral Educação & Cultura, Juventude, Línguas e Desporto - Internet, Janeiro 2015. (5) [b]

Comité das Regiões - Internet, Janeiro 2015.

(6) [b]

Comité Económico e Social Europeu - Internet, Janeiro 2015.

(7) [b]

Agências da União Europeia - Internet, Janeiro 2015.

(8)

Heidegger, Martin - “Língua de tradição e língua técnica”, tradução Mário Botas, Veja, Lisboa, 1995. (9) [a]

Conselho da União Europeia - “Directiva do Conselho (2006/112/CE) - relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado”, Jornal Oficial da União Europeia, Luxemburgo, 28 Novembro 2006. (10) [a]

Conselho da União Europeia - “Directiva do Conselho (94/5/CE) - regime especial aplicável aos bens em segunda mão, aos objectos de arte e de colecção e às antiguidades” (completa o sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado e altera a Directiva 77/388/CEE), Jornal Oficial da União Europeia, Luxemburgo, 14 Fevereiro 1994. (11) [a]

Conselho da União Europeia - “Resolução do Conselho (2001/C-73/03) - relativa à aplicação dos sistemas nacionais de fixação do preço dos livros”, Jornal Oficial da União Europeia, Luxemburgo, 12 Fevereiro 2001. (12) [a]

Conselho da União Europeia - “Resolução do Conselho (2001/C-73/02) - relativa aos auxílios nacionais aos sectores cinematográfico e audiovisual”, Jornal Oficial da União Europeia, Luxemburgo, 12 Fevereiro 2001. (13) [a]

European Communities / Commission - “Community action in the cultural sector”, Bulletin of the European Communities Supplement 6I77, Office for Official Publications of the European Communities, Luxembourg, 1977. (14) [a]

Conselho da União Europeia - “Decisão do conselho (94/800/CE) - relativa aos acordos resultantes das negociações multilaterais do Uruguay Round (1986/1994), Jornal Oficial das Comunidades Europeias, Luxemburgo, 22 Dezembro 1994. ______________________________________________________________________________

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2.3 Programas Comunitários e Sector Cultural O primeiro programa comunitário de apoio ao sector cultural, criado pela Comissão Europeia em 1977, intitulava-se Acção Cultural e fazia questão de sublinhar que “da mesma forma que o sector (1) cultural não é a cultura, a acção comunitária no sector cultural não é uma política cultural” . Posteriormente, a Comissão Europeia tem vindo a desenvolver um conjunto de apoios financeiros através dos vários Quadros Comunitários de Apoio - QCA: o primeiro (I) 1989-1993, 5 anos; o segundo (II) 1994-1999, 6 anos; o terceiro (III) 2000-2006, 7 anos; o quarto (IV) 2007-2013, 7 anos e o quinto (V) 2014-2020, 7 anos. A partir do II Quadro Comunitário de Apoio, 1994-1999, a Comissão Europeia iniciou os seus apoios financeiros, directamente orientados para o Sector Cultural, através de várias gerações de programas. O objectivo-geral destes programas foi, sempre, em primeiro lugar, apoiar a Cooperação Cultural entre os actores culturais do espaço europeu e entre estes e os de países terceiros, bem como, adicionalmente, fazer a Cultura contribuir para o desenvolvimento económico e social. Para além destes programas o Sector Cultural, pela sua transversalidade, tem vindo a obter apoio através, nomeadamente, do FEDER Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, do FSE Fundo Social Europeu e de outros programas transnacionais. A primeira geração de Programas foram sectoriais, o Caleidoscópio para as Artes do Espectáculo, Artes Visuais e Artes Aplicadas, 1996-1999; o Ariadna para a Tradução, os Livros e a Leitura de literatura de referência, 1997-1999; e o Rafael para a conservação, salvaguarda e valorização do Património Cultural, 1997-2000. A segunda geração foi constituída pelo primeiro programa-quadro cultural, o Programa Cultura 2000, com um leque alargado de objectivos, destinado a todos os domínios artísticos, para o período de 2000-2006, 7 anos, com um orçamento de 236,5M€ (milhões de euros), 34M€/ano, numa União Europeia a 27 (2). Para se ter uma ideia do significado financeiro deste apoio, o Teatro Real de Madrid, gerido pela (3) Fundación Teatro Lírico, teve em 2002, um orçamento, de 42M€ . A partir desta geração começam a estar presentes nos programas, explicitamente, dois novos critérios de atribuição de financiamento: o “valor europeu acrescentado” e a “visibilidade”, o que, implicitamente, passou a favorecer os projectos de grande dimensão, relativamente à dos projectos de média e pequena dimensão, independentemente da sua qualidade (4). O que se espera de um Programa orientado especificamente para o Sector Cultural Europeu é que tenha em conta o caracter específico deste sector nas suas vertentes de criação, programação, produção e distribuição - de Cultura de referência para a Humanidade -, a dimensão das suas organizações, bem como, dos seus aspectos políticos, económicos, sociais e tecnológicos. A terceira geração foi constituída pelo segundo programa-quadro cultural, o Programa Cultura 2007, com um leque reduzido de objectivos, destinado a todos os domínios artísticos, período de (2) 2007-2013, 7 anos, 408M€, 58M€/ano, numa União Europeia a 28 . Continuando com o mesmo referencial financeiro, o Teatro Real de Madrid/Fundación Teatro Lírico, teve um orçamento, em 2010, de 53M€ (5) e, em 2013, 46M€ (6).

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O perfil deste Programa e este significativo aumento de 72% ficou a dever-se, em muito, à determinação e empenho do Deputado Parlamentar Europeu, Vasco Graça Moura e destaca-se, dos seus objectivos gerais, a contribuição para “a construção de uma identidade europeia a partir da base”, bem como, o seu enfoque nas “artes performativas, nas artes visuais, no património cultural, nos livros e na leitura, com ênfase para a tradução” (2). Entretanto, o pensamento e sentimento de Vasco Graça Moura (**), era de que o Conselho Europeu não tinha nem vontade política nem consciência de que um projecto Europeu de sucesso, teria que passar pela Cultura e a tendência no futuro seria para o orçamento vir a diminuir, nomeadamente, por influência do Reino Unido, dos Países Baixos e dos países Nórdicos. A Gestão Cultural, a quem Vasco Graça Moura sempre manifestou o seu total apoio, mesmo material, deveria procurar honrar a sua memória, seguindo o seu exemplo, procurando lutar, no que estiver ao seu alcance para que, também, a nível da União Europeia seja reconhecida a importância da Cultura Erudita, ou se preferirem “de referência”, passada e presente, para o futuro da Humanidade. Paralelamente, no Sector Audiovisual que contempla “filmes e programas de televisão”, foram lançados os Programas: MEDIA 1991-1995; MEDIA II e MEDIA II Formação 1996-2000; MEDIA Plus para desenvolvimento, distribuição e promoção de obras audiovisuais europeias e MEDIA Formação 2001-2006; MEDIA 2007-13 para o sector Audiovisual; MEDIA Mundus para cooperação com profissionais de países terceiros no domínio Audiovisual 2011-13. Entretanto, importa ter presente o facto de que são os Estados-Membros a fazer as escolhas da utilização dos Fundos Estruturais permitindo, no caso específico do Sector Cultural, que tivesse sido criado o POC - Programa Operacional da Cultura 2000-2006 (7), como instrumento de uma Política Cultural, para Portugal. Foi no âmbito da preparação do Programa Quadro 2007-2013 que foi anunciada oficialmente no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no início de 2005, a campanha “70 Cents for Culture”(8) e, posteriormente, em Lisboa, em Maio, “70 Cêntimos para Cultura”(9), com o objectivo de aumentar a comparticipação orçamental europeia para a Cultura. Resumidamente, tratava-se de procurar estabelecer um contributo de 70 cêntimos, por cidadão europeu, por ano, para o Orçamento global da UE. Com base na população da UE a 25, estimada em 450M de pessoas, 0,7€ por pessoa contribuiriam para atingir 315M€ que, somados ao orçamento da Cultura de 34M€, permitiria dotar o Sector Cultural da UE com um orçamento na ordem dos 350M€. Em 2005 o orçamento da UE para a Educação e Cultura era de 896,6M€, representando 0,77% do orçamento total da UE 116.500M€, sendo que o orçamento só para a Cultura - 34M€ representava, em termos percentuais, 3,79%. Na UE a Cultura recebia aproximadamente 0,03% do total do orçamento. Uma vez mais e para melhor se ter uma noção destes valores o Instituto Goethe, em 2004, tinha um orçamento de 270M€. Esta iniciativa da ECF European Cultural Foundation e do EFAH European Forum for the Arts and Heritage, teve a participação portuguesa da APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural, do CIEJD Centro de Informação Europeia Jacques Delors, do CNC Centro Nacional de Cultura e do GPE Gabinete do Parlamento Europeu, em Portugal, bem como, os apoios da revista CultDigest e do Teatro Municipal São Luiz. No seu “Relatório Final sobre o estado da cooperação cultural na Europa”, de 2003, o EFAH European Forum for the Arts and Heritage (4), a propósito das Capitais Europeias da Cultura,

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coloca a questão de não sabermos se o crescimento das dotações orçamentais dos programas europeus para a Cultura se devem a razões de natureza Cultural ou se estão relacionados com o interesse (politicamente legítimo) da União Europeia assegurar duas questões, para si, fundamentais: “visibilidade” e “valor acrescentado europeu”. Apesar da sua consagração nos Tratados, a inclusão da dimensão cultural, nos tradicionais e quotidianos Assuntos Europeus, só vai acontecendo, pela compreensão dos políticos e eurocratas que esta complexa dimensão se torna indispensável para aumentar a limitada adesão dos cidadãos às causas do grande e importante projecto da União Europeia.

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Referências bibliográficas [a] [b]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação sítio disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.c om / Informações

(**)

Transmitido em conversa pessoal em Bruxelas, no âmbito do programa de “Gestão de Projectos Culturais Europeus - 2006”, em Junho 2006. (1) [a]

European Communities / Commission - “Community action in the cultural sector”, Bulletin of the European Communities Supplement 6I77, Office for Official Publications of the European Communities, Luxembourg, 1977. (2) [a]

Moura, Vasco Graça (Relator) - “Relatório sobre a proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que institui o programa «Cultura 2007» (2007-2013)”, Parlamento Europeu / Comissão da Cultura e da Educação, Bruxelas, Setembro 2005. (3) [a]

El País/EFE - “El Teatro Real acumula un déficit de dos millones de euros”, Ediciones El País, S.L., Madrid, 12 Junio 2003. (4) [a] [b]

EFAH European Forum for the Arts and Heritage; Interarts - “Report on the state of cultural cooperation in Europe - Final report”, European Commission Directorate-General for Education and Culture, Brussels, Outubro 2003. (5) [a]

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EL País/Verdú, Daniel - “El Teatro Real reduce presupuesto y apuesta por el repertorio”, Ediciones El País S.L., Madrid, 13 Deciembre 2011. (7) [a]

Ministério da Cultura de Portugal, “Programa Operacional da Cultura (POC) 2000-2006”, Comissão Europeia, Bruxelas, Julho 2000. (8) [a] [b]

ECF European Culture Foundation; EFAH European Forum for the Arts and Heritage “70 Cents for Culture”, Amsterdam / Brussels, 2005. (9) [a] [b]

GPE Gabinete do Parlamento Europeu (Portugal) e Outros - “70 Cêntimos para Cultura”, Lisboa, Maio 2005. ______________________________________________________________________________

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3. Políticas Culturais 3.1 Políticas Culturais na Europa e no Mundo A institucionalização de uma Política para o Sector Cultural acontece na Europa Continental, em França em 1959, logo após a Segunda Guerra Mundial, por iniciativa do Presidente e General Charles de Gaulle, com a criação de um Ministério de Assuntos Culturais dirigido por André Malraux, sendo baseada no conceito de “acção cultural” enquadrando três propósitos: apoio à salvaguarda do Património, apoio à Criação Contemporânea e apoio ao processo de (1) Democratização e Descentralização da Cultura . Genericamente, em todos os Modelos Sociais Europeus se pode constatar que, durante o século XIX, com a crescente autonomia do Campo Cultural relativamente ao Campo Académico, de forte influência sobretudo religiosa, a intervenção e apoio das autoridades públicas ao Sector Cultural começa a tornar-se uma necessidade, que se vai consagrando historicamente e acaba por começar a ser exigida, continuadamente, pelos cidadãos ou súbditos dos diversos países. Vasco Graça Moura, no seu último ensaio, refere: “na actual configuração política e institucional da União Europeia, deveria a cultura ser pensada como um dos pilares dessa construção” (2) e é isto, também, que desde sempre se tem vindo a defender. Quando se fala em Políticas Culturais em termos Mundiais está-se a fazer referência, de uma forma geral, às que poderão ser encontradas, eventualmente, na Europa e nos países sujeitos à colonização europeia do século XVI, nomeadamente, a portuguesa (países Lusófonos), a espanhola (países Hispânicos) e a britânica (Commonwelth). A Política Cultural é parte das Políticas Públicas e, nomeadamente em democracia, as políticas públicas acabam por assentar, sempre e naturalmente, em questões de natureza ideológica. Entretanto, o peso político atribuído ao Sector Cultural, relativamente aos outros sectores de actividade na estrutura administrativa do Estado, constitui desde logo um indicador da, maior ou menor, importância e prioridade concedida à Política Cultural. Estas políticas culturais assentam no princípio que a dimensão Cultural é essencial à formação das identidades nacionais, através da educação e formação cultural dos cidadãos e, portanto, indispensáveis para o reforço das suas dinâmicas de desenvolvimento futuro e sobrevivência das suas soberanias, correspondendo assim a um determinado estádio de desenvolvimento Civilizacional. Tendo em conta as características específicas do Sector Cultural, nomeadamente dos seus subsectores do Património Cultural e das Actividades Artísticas, derivado do seu posicionamento na Teoria da Hierarquia das Necessidades (Pirâmide) de Abraham Maslow (3) e pelas condicionantes evidenciadas por William Baumol e William Bowen, na chamada Lei de Baumol (4), os apoios provenientes das Políticas Públicas da Administração do Estado ou da Sociedade Civil são e serão sempre necessários à sua sustentabilidade financeira. A chamada “subsídio-dependência” da Cultura pode ser igualmente aplicada a países, como Portugal, relativamente aos considerados imprescindíveis fundos europeus, do FEDER Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional e do FSE Fundo Social Europeu, para o seu desenvolvimento económico e social - agricultura, pescas, indústria, comércio e serviços - e, esta situação, não produz qualquer tipo de indignação a alguns dos nossos governantes, mas a

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inevitável dependência da Cultura, pela sua natureza, de apoios públicos e privados sugere recorrentemente, por ignorância ou má-fé, os mais inusitados e depreciativos comentários. Dentro do espaço europeu, as Políticas Culturais têm tido uma evolução não linear e de geometria variável, atendendo a múltiplos factores de ordem cultural e política, sendo que se poderá considerar a França como o país que mais se tem diferenciado, continuadamente, na sua defesa e desenvolvimento. Implicitamente, conforme as prioridades são dadas mais ao Património Cultural (defesa, manutenção), mais às Actividades Artísticas (criação e promoção) ou mais às Industrias Culturais (criação, reprodução, divulgação e difusão) se está perante uma “Política Cultural”, mais orientada para o passado, no caso do Património Cultural, ou para o presente nos casos das Actividades Artísticas e das Indústrias Culturais. As Indústrias Culturais (5) devem ser entendidas enquanto um processo de suporte à Criação e possível factor de democratização da Cultura e não em linha com o conceito de “indústria da cultura”, que Theodor Adorno e Max Horkheimer utilizaram pela primeira vez em 1947, na obra (6) “Dialéctica del Iluminismo” , no sentido de “cultura de massas” e, de um ponto de vista ideológico, alienante. As políticas culturais contemporâneas, de uma forma geral, têm apresentado uma tendência em que os sectores ideológicos mais à Direita têm privilegiado a área do Património Cultural, os mais à Esquerda as Actividade Artísticas e, ambos, usarem as Indústrias Culturais de forma muito variada e circunstancial. A constatação frequentemente verificada entre os governos europeus de terem como objectivo a prosseguir nas suas Políticas Culturais a “Democratização e Descentralização da Cultura”, justifica-se como forma de tornarem acessível a todos os Cidadãos, principalmente, a Cultura Erudita da Humanidade, não só Ocidental como Oriental, não a cultura popular e de consumo mundializada pois essa, por natureza e naturalmente, está democratizada e descentralizada. No âmbito das Políticas Culturais não se compreende porque misturar, aleatoriamente, a cultura popular com a Cultura Erudita procurando atribuir, às diversas formas de cultura popular, o mesmo valor imaterial (epistemológico, conceptual e estético) que desde sempre foi atribuído à Cultura Erudita. Não se trata de entender que não é importante procurar promover, divulgar, preservar, valorizar e apoiar a cultura popular, nomeadamente em todas as suas expressões pouco comerciais e, normalmente, de caracter amador (Teatro Amador, Ranchos Folclóricos, Bandas de Música e outras), mas o mesmo não significa perder a noção das suas, naturais, diferenças. Entretanto, sobre a magna questão da Língua, nunca poderemos esquecer que ela é, simultaneamente, meio de comunicação e instrumento estruturante, individual e colectivo, do Mundo espiritual, intelectual, conceptual, emocional, material e artístico, bem como, consequentemente, factor identitário, de coesão nacional e expressão da Cultura erudita e popular. A este propósito recordamos Martin Heidegger e o seu contributo para esta questão continuadamente actual, quando introduz a oportuna reflexão sobre “Língua de tradição e língua técnica”, deixando o alerta para que “a agressão da língua técnica sobre o carácter próprio da língua é ao mesmo tempo uma ameaça contra a essência mais própria do homem.” (7). Questão igualmente a ter presente nas Políticas Culturais nacionais e europeia é a preponderância de vários centros de irradicação cultural existentes pelo Mundo, com base na

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Língua, nomeadamente, a Commonwealth e os EUA Estados Unidos da América e das consequências desse facto, pela sua dimensão, para a defesa e desenvolvimento das outras línguas, factores nucleares das identidades consagradas pela Diversidade Cultural. Como em todas as outras questões de natureza política, as Políticas Culturais, encontram-se num domínio do conhecimento que necessita e vive de uma análise comparativa, continuada, orientada por parâmetros de eficiência e eficácia contemplando, por isso, questões relacionadas com Objectivos, Recursos e Resultados que sendo alcançáveis através da Gestão e da Inovação permanente nos remetem, simultaneamente, não só para questões ideológicas como, também, para questões de ordem moral e ética.

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Referências bibliográficas [a]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

(1) [a]

Poirrier, Philippe - “Introdução” in Poirrier, Philippe; Gentil, Geneviève (introdução e organização); “Cultura e Estado: a política cultural na França, 1955-2005”, tradução Ana Goldberger, Iluminuras & Itaú Cultural, São Paulo, 2012. (2)

Moura, Vasco Graça - "A identidade Cultural Europeia", Ensaios da Fundação / Fundação Francisco Manuel dos Santos, Relógio D'Água Editores, Lisboa, Novembro 2013. (3)

Maslow, Abraham H. - “Motivation and Personality”, Harper & Row Publishers, New York, 1954. (4)

Baumol, William J.; Bowen, William G. - “Performing Arts - The Economic Dilemma”, The MIT Press, Massachusetts, September 1968. (5) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (6) [a]

Adorno, Theodor W.; Horkheimer, Max - “Dialéctica del Iluminismo“, in www.philosophia.cl / Escuela de Filosofía Universidad ARCIS & Editora Querido, Amesterdão, 1947. (7)

Heidegger, Martin - “Língua de tradição e língua técnica”, tradução Mário Botas, Veja, Lisboa, 1995. ______________________________________________________________________________

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3.2 Cultura e Tecnocracia Todo o processo de construção-integração e aprofundamento da União Europeia, nas suas dimensões política, económica e social, desde sempre tem sido desenvolvido e implementado de braço dado com o assumido “défice democrático” que potencia e protege uma continuada orientação tecnocrática, que sempre acaba adquirindo legitimidade formal no Parlamento Europeu. O estudo “La production de l’idéologie dominante” (1), coordenado por Pierre Bourdieu e Luc Boltanski, publicado em 1976, demonstra como uma ideia generalizada, proveniente de um “discurso dominante”, de origem não identificável, se transformou numa “ideologia dominante”, legitimadora da tecnocracia como instrumento político que procura estabelecer e consagrar que determinadas áreas do conhecimento, nomeadamente, no domínio da economia, só devem ser tratadas por determinados “peritos”, na medida em que só estes serão capazes de dominar as suas complexas leis. Posteriormente em 2013, Alessandro Pinzani in “Democracia Versus Tecnocracia: Apatia e (2) Participação em Sociedades Complexas” , com base neste trabalho coordenado por Bourdieu e Boltanski, volta a esta questão referindo que como ideologia, neste caso, se entende o sistema de “valores e de finalidades” sociais considerados inquestionáveis e que para poderem ser, facilmente, socialmente aceitáveis, devem demonstrar ser “neutros” e baseados em pressupostos “científicos”. Esta “ideologia dominante” é produzida em lugares que se apresentam como neutros universidades, institutos de pesquisa e comunicação social - procurando dar dela um aspecto científico e imparcial e tem como seus principais protagonistas os “peritos na matéria” ou tecnocratas. Os tecnocratas, por definição, confiam na eficiência e na eficácia do funcionamento dos “saberes” institucionais, independentemente dos contextos, não questionando nunca a validade do seu próprio conhecimento, nem e inevitabilidade dos “efeitos colaterais”, atendendo a considerarem o “conhecimento” baseado em leis naturais, imutáveis, fatalistas e inevitáveis. Pelo facto de a tecnologia ser neutra ficou mais fácil passar a ideia, à população em geral, que a tecnocracia também o é o que não passa de mais uma falácia. Supõe-se que é por se considerar esta “neutralidade” como meritória, que leva pessoas que ocupam lugares de gestão no Sector Cultural (3), há mais de vinte anos, a afirmarem publicamente com indisfarçável presunção, que são “tecnocratas na cultura” como aconteceu no caso da Directora-geral da Fundação de Serralves, Dra. Odete Patrício, no âmbito duma conferência pública, em 2013 (**). Estas questões continuam a ser permanentemente actuais, nomeadamente em relação às políticas culturais e ao Campo Cultural e se, pelo que ficou dito, as abordagens tecnocráticas em quaisquer dos domínios sociais são perniciosas e dispensáveis, no domínio da Cultura são totalmente incompreensíveis e indesejáveis. Se é comum afirmar-se que uma sociedade sem Estado é uma selva e que quando o Estado desaparece surge a barbárie, nomeadamente protagonizada pelos fundamentalista ou pelos mafiosos, no que concerne ao Sector Cultural pensa-se que o mesmo poderá acontecer pela substituição, pura e simples, do Serviço Público do Estado de Direito Democrático pelo Mercado e seus tecnocratas.

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As posições tecnocráticas não são neutras, como tudo relativo às ciências políticas e sociais, tendo sempre um determinado fundo ideológico, mesmo que disfarçadas e a coberto do tão conhecido e já referido “défice democrático”. Em matérias como as do domínio Cultural, sensíveis pela sua natureza simbólica e imaterial, que exigem uma valoração essencialmente qualitativa, de grande exigência intelectual históricofilosófica, difícil de formatar em modelos matemáticos ou “científicos”, as abordagens tecnocráticas socorrem-se, invariavelmente, da velha máxima do “torturam-se os números até eles confessarem” e os resultados acabam sendo uma forma de agradar e, sobretudo, desresponsabilizar e isentar politicamente e socialmente o “cliente-comprador” tradicionalmente governamental, relativamente às suas responsabilidades políticas e socias de patrocinar os indispensáveis apoios ao Sector Cultural de forma oportuna, isenta, transparente e responsabilizante. A isto se junta o impacto produzido e amplificado pela comunicação social sobre os “consumidores-pagadores”, maioritariamente afastados destas questões por alheamento ou alienação, com alguns “números” que fazem o deslumbramento de qualquer vulgar cidadão, tais como os referidos no estudo encomendado pela DG Educação e Cultura da Comissão Europeia, (4) “The Economy of Culture in Europe”, KEA European Affairs, 2006 : “O sector cultural e criativo, em 2003, contribuiu para 2,6% do PIB, da UE (superior aos sectores imobiliário e de produtos alimentares e bebidas, indústria têxtil e indústria de produtos químicos) e totalizou um volume de negócios superior a 654 mil milhões de euros (superior ao da indústria automóvel), “O crescimento do sector cultural e criativo na Europa 1999-2003 foi de 12,3% maior do que o crescimento da economia geral.” Com estes números cuja natureza, origem e grandeza ninguém parece querer questionar demonstra-se, subliminarmente, que o “sector cultural e criativo” no século XXI, já atingiu ou poderá vir a atingir uma confortável autonomia e sustentabilidade económico-financeira que, consequentemente, o dispensará da necessidade de quaisquer apoios institucionais. Mais recentemente, em 2010, surgiu um trabalho intitulado “O Sector Cultural e Criativo em Portugal, Estudo para o Ministério da Cultura - GPEARI” (5), encomendado pelo Ministério da Cultura de Portugal, dentro de uma orientação claramente tecnocrática, à empresa Augusto Mateus & Associados, Lda. - e não, como seria de esperar, ao OAC Observatório das Actividades Culturais prestigiada e competente instituição do Sector Cultural em Portugal. Esta empresa, com base e em linha com o estudo da KEA e outros, de orientação anglo-saxónica, desenvolveu o referido “estudo” para chegar, naturalmente, a um mesmo tipo de conclusões mas, agora, relativamente a Portugal, permitindo ao país ficar a saber que, de acordo com aquele estudo, o seu “sector cultural e criativo”, em termos tecnocráticos, estava em linha com a mundialização da economia. Quem se queira manter em linha com o objectivo estratégico da “Democratização e Descentralização da Cultura, não poderá acreditar que fugindo à realidade intrínseca do Sector Cultural - com abordagens orientadas cinicamente numa lógica de “ganso para foie gras” - se esteja a contribuir para o seu desenvolvimento sustentável nas suas vertentes, económica, social, tecnológica, organizacional e laboral, sobretudo para a satisfação das necessidades intelectuais, espirituais e emocionais de todos os cidadãos e súbditos que deveriam constituir-se, também, como desígnio de todas as Políticas Culturais.

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Entretanto, a sensibilidade que rodeia a questão do estabelecimento de uma Política Cultural Europeia, ao nível dos artigos consagrados nos Tratados, decorre do facto de no seu discurso estratégico a União Europeia, como não poderia deixar de ser, tende a considerar sempre “cultura” nas suas acepções mais abrangentes e não cultura no seu sentido mais estrito de Cultura Erudita. Porém, acontece que quando a União Europeia aborda as questões da Cultura numa perspectiva operacional, nomeadamente do ponto de vista Económico (Fiscalidade, Concorrência e Propriedade Intelectual), é no sentido estrito que o faz, acabando por implicitamente definir uma Política Cultural, relativamente a esses assuntos. As visões tecnocráticas, contrárias às sistémicas e humanistas, ao tratarem das partes sem olhar o todo com a sua contextualização, podendo satisfazer clientelas ou grupos de interesse circunstanciais, não contribuem para o desenvolvimento sustentável do que se entende por Sector Cultural. Como começou por ser introduzida e discutida no início do ante-projecto da Escola de Gestão das Artes (6), (7), em1992, que posteriormente veio a dar origem aos programas de PgGC Pósgraduação em Gestão Cultural, a orientação específica para uma Gestão Cultural profissional, numa perspectiva tecnocrática não fará sentido pois, qualquer tecnocrata, com alguma formação Gestão, se continuará a achar capaz de gerir uma organização Cultural em todas as suas múltiplas e idiossincráticas dimensões. ______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

(**)

Candidatura autárquica “O Nosso Partido é o Porto! / Rui Moreira”, “Conversas à Porto: a Cultura”, primeira sessão, Hotel Vila Galé, Porto, 20 Abril 2013. Citação de memória atendendo a não ter sido facultado o acesso ao registo audiovisual da conferência. (1) [a]

Bourdieu, Pierre; Boltanski, Luc - “La production de l'idéologie dominante”, in “Actes de la recherche en sciences sociales, Vol. 2”, nº 2-3, Juin 1976. (2) [a]

Pinzani, Alessandro - “Democracia Versus Tecnocracia: Apatia e Participação em Sociedades Complexas”, Lua Nova, São Paulo, 2013. (3) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (4) [a]

KEA European Affairs - “The Economy of Culture in Europe, European Commission”, Directorate-General for Education and Culture, Brussels, October 2006. (5) [a]

Mateus, Augusto (coordenação) - “O Sector Cultural e Criativo em Portugal”, GPEARI Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais do Ministério da Cultura, Lisboa, Janeiro 2010. (6) [a]

Monteiro, António Jorge - “Projecto de criação de uma escola de Gestão das Artes Algumas considerações estratégicas”, edição PDF, Porto, Abril 1992. (7) [a]

Monteiro, António Jorge - “Gestão das Artes: uma contribuição”, jornal Público, Porto, 10 Abril 1994. ______________________________________________________________________________

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4. Sector Cultural 4.1 Sector Cultural e “disputa de campo” O facto de a dimensão Cultural estar presente, de uma forma transversal, em vários sectores de actividade nomeadamente político, económico, social e tecnológico, bem como em múltiplos domínios das sociedades contemporâneas tais como o Turismo, o Lazer, o Entretenimento, a Comunicação Social, o Multimédia, o Design, a Publicidade, o Desenvolvimento Local e Regional, o Planeamento Urbano, o Ensino Superior, a Educação e Formação Profissional, entre outros, não faz com que estes sectores e domínios passem a integrar o Campo Cultural e muito menos o Sector Cultural. Como parte integrante do sector político-administrativo do Estado, o Sector Cultural contribui, naturalmente, para a consolidação da Coesão Social, para o aumento do Emprego, do crescimento do Produto Interno Bruto e para o Desenvolvimento Regional mas, o Sector Cultural, tal como sempre tem sido considerado, terá sempre uma importância secundária em termos de Economia e Emprego, por comparação com os outros sectores de actividade produtiva. Só a abordagem do conceito de Cultura e Campo Cultural no sentido de absorver outras actividades periféricas, pela sua natureza com real valor económico para o sector privado, o elevaram mais recentemente ao patamar de campeão do desempenho macroeconómico, como se apresenta no trabalho da KEA (1), numa continuada tentativa, a qualquer preço, de “economização” da Cultura. O Sector Cultural - Património Cultural e Actividades Artísticas - depois de, durante a segunda metade do século XX, se debater por vezes com a tentativa de associação ao Campo Social, como parte integrante do Terceiro Sector, esteve no último quartel sob a pressão de associação com as travestidas Industrias Culturais (2) e, está agora continuadamente, no início do século XXI, num processo de captura pelo Campo Económico, para o qual tem contribuído a procura de o associar com as chamadas “Indústrias Criativas” (1). De uma forma geral e recorrente, são os protagonistas das actividades periféricas ao Sector Cultural tradicional que tudo vêm fazendo para passar a integra-lo nos seus domínios procurando, naturalmente, dele tirar benefícios em função dos seus interesses económicos particulares, exclusivamente orientados para a sociedade de consumo, não tendo em vista procurar satisfazer quaisquer dos outros interesses nucleares do Sector Cultural. Com os actores sociais do “campo” mercantil/económico a entrarem no “campo” Cultural, colocase claramente uma questão, também, política e ideológica relacionada com a criação de numa situação de “disputa de campo”, no sentido consagrado por Pierre Bourdieu (3), onde o Sector Económico procura tentar disputar o poder e a autoridade do Sector Cultural, com as respectivas consequências do “posicionamento estratégico” (4) do “Cultural” nas estruturas políticoadministrativas dos países, nomeadamente da Europa Continental, através da sua menorização em Secretarias de Estado ou mesmo determinando o desaparecimento dos Ministérios da Cultura. O Sector Cultural, sendo um instrumento de Defesa, Desenvolvimento, Democratização e Descentralização (4 D) da Cultura Erudita, torna-se um factor essencial de Conhecimento para o futuro da Humanidade, que ao se constituir como uma realidade sobretudo Europeia, contribui indiscutivelmente para uma diferenciação positiva e uma vantagem comparativa e competitiva, nomeadamente da Europa Continental, relativamente ao Resto do Mundo.

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Desde sempre soubemos que uma sociedade com uma vida Cultural intensa atrai pessoas aos seus territórios e que essas pessoas podem protagonizar novos relacionamentos políticos, sociais, económicos e tecnológicos, potenciando novos negócios que, por sua vez, contribuem para a renovação, a inovação e crescimento das economias. A continuada pressão restritiva sobre as Finanças Públicas, ocasionadas pelas diversas crises financeiras, passadas, presentes e, inexoravelmente, futuras não pode impedir que se perca de vista a importância estratégica do Sector Cultural, procurando justificar a qualquer preço a sua importância e razão de existir com base em benefícios directos e imediatos para a Economia. Na actualidade, em sectores como a Defesa, a Justiça ou Educação, entre outros, não vemos ninguém preocupado em avaliar o seu valor económico para os países, pois admite-se, naturalmente, que são sectores indispensáveis à manutenção e desenvolvimento sustentável dos Estados de Direito democrático. Igualmente, seria importante medir e avaliar o “valor acrescentado” obtido dos enormes e continuados subsídios directos a fundo perdido ao Sector Económico orientados para a “criação do emprego” e “aumento da produtividade” das Empresas Privadas - sociedades comerciais com fins lucrativos - como tem acontecido com os múltiplos Quadros Comunitários de Apoio. Acontece também que, para a utilização destes apoios, sempre foram obrigatórias e imprescindíveis as comparticipações financeiras, na ordem dos 25%, dos Estados (todos os contribuintes) nacionais beneficiários, como Portugal, sendo que no caso do V Quadro Comunitário de Apoio Portugal, referente aos anos 2014 a 2020, designado por “Portugal 2020” (5), o montante disponibilizado foi de 25 mil milhões de euros, na sua esmagadora maioria orientados para o desenvolvimento da “Economia”. Esta recente e continuada preocupação em demonstrar o valor Económico da Cultura por parte de pessoas e/ou empresas - curiosamente na sua esmagadora maioria, exteriores e recém-chegadas ao Sector Cultural - deveria constituir motivo de reflexão para todos os interessados na manutenção e desenvolvimento sustentável do Sector Cultural. Permitir uma reorientação do Sector Cultural para uma valorização e avaliação em função do “valor económico da cultura” levará, a prazo não muito longo, a que os domínios Culturais que por natureza não têm e não terão qualquer capacidade para gerar esse tipo de “valor” nomeadamente as Actividades Artísticas e o Património Cultural - venham a ser ignorados e excluídos dos necessários apoios no contexto do chamado Estado-Social, quer entendido no sentido tradicional quer naquilo em que ele se venha a transformar de acordo com as suas naturais e sucessivas “crises”. Sendo o Sector Cultural constituído, por natureza, por dois tipos de valores, o Valor Simbólico/Cultural (as significações) e o Valor Mercantil/Económico (as obras), mantem permanentemente em aberto, consequentemente, as tradicionais questões, nomeadamente de carácter filosófico e antropológico, do “belo e do útil”, da “Língua de tradição e língua técnica” (6) e de “Cultura e Civilização”. Tendo em conta estas suas particularidades deveria ser importante que, em primeiro lugar, o Sector Cultural procurasse orientar a sua atenção e esforços para o desenvolvimento e defesa da Cultura Erudita, atendendo à sua indiscutível importância como vanguarda do desenvolvimento intelectual, emocional e espiritual do Homem e da Humanidade. Como exemplo de grande significado recorde-se que, ainda não há muitos anos, um dos critérios de escolha da empresa multinacional Ford-Volkswagen, para instalação de uma das suas fábricas,

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era e foi a existência de Ópera, nesse espaço territórial e não, seguramente, por questões mercantis/económicas. Numa perspectiva organizacional importa ter em conta que à Gestão Cultural competem, também, as questões da Defesa, Desenvolvimento, Democratização, Descentralização e Sustentabilidade (4 D+S) das diversas formas organizacionais de suporte à promoção, divulgação, valorização e preservação do Património Cultural, das Actividades Artísticas (criação colectiva e individual) bem como das Indústrias Culturais, nomeadamente nas suas fases de início de actividade e de desenvolvimento. Entende-se que sempre que se fala em “criação” no Sector Cultural se está a referir, obviamente, à Criação Artística, não a qualquer outro qualquer tipo de criação e que o conceito de “criatividade” não pode deliberadamente confundir “Criatividade Artística” com outros tipos de criatividade como a Criatividade Industrial e Tecnológica - onde se situa a origem do conceito de Design -, a Criatividade Organizacional, a Criatividade Metodológica desenvolvida por Genrich Altshuller em (7) TRIZ: The Theory of Inventive Problem Solving (Teoria da Solução Inventiva de Problemas) ou a Criatividade Científica. No que concerne ao Campo Cultural remete-nos, inexoravelmente, para a questão contemporânea das chamadas Industrias Criativas e para as Indústrias Culturais, no sentido estabelecido por Theodor Adorno e Max Horkheimer (8), pois, nas suas múltiplas vertentes, podem também originar “produtos simbólicos”, que poderão ser “culturais” em sentido sociocultural, destinados a serem “consumidos” mas, não são bens Culturais, em sentido estrito, para serem “usufruídos” intelectualmente, emocionalmente e espiritualmente pela Humanidade. A perspectiva tecnocrática de abastardar o conceito europeu de Cultura Erudita serve uma estratégia geral para justificar a não necessidade do Sector Cultural ser constituído como um dos pilares politico-administrativos dos Estado e a “demonstração” da sua “rentabilidade económica” reforça esta ideia e justifica a declinação de responsabilidade do Primeiro Sector - o Estado, em financiar as actividades culturais eruditas, deixando essa responsabilidade por conta dos humores discricionários do Segundo Sector - o Mercado ou da consciência social do Terceiro Sector - a Sociedade Civil. Simultaneamente, em tempos de propensão para uma “Modernidade Líquida” (9), tal como referida por Zygmunt Bauman, as orientações pós-modernas propõem um tempo e um espaço, não concretos e absolutos mas líquidos e relativos, que procuram transformar as relações de trabalho, da família e da comunidade num sentido individualista, sendo que a utilização do conceito “líquido” foi relacionado com o facto da matéria no estado líquido não ter forma e se adaptar aos espaços em que se encontra, ao contrário da matéria no estado sólido que só é moldável por tensão de forças externas. Esta voracidade pós-moderna de perscrutar “O Futuro do Futuro” (10) procurando “diluir” os sistemas e estruturas de valores - do que, por contraste, poderemos chamar de “Modernidade sólida” - com tudo o que isso implica, faz “tábua rasa” dos múltiplos esforços continuados de construção de estruturas de suporte ao desenvolvimento das sociedades modernas e contemporâneas, nomeadamente no Campo Cultural, o espaço estruturante do Sector Cultural e contexto natural e privilegiado da Cultura Erudita e da Criação. Quem desde sempre se vem orientado pela procura fractal da organização do caos (11) e partilha as preocupações de Bauman - referenciadas na sua obra de forma eloquente - não poderá defender que o desenvolvimento das sociedades do Futuro, em qualquer uma das suas múltiplas dimensões, se oriente para um estado “líquido”.

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Quando, em 1960, o General De Gaulle lança a ideia de uma “Europa das Nações” dava início a uma utopia pragmática de construção de um grande projecto de paz, democrático e humanista Europeu, assente na cooperação política, que a União Europeia pós Maastricht, ainda não democrática, ainda não conseguiu “solidificar”. Tendo sempre presente que, como referiu Heráclito de Éfeso (535 - 475 a.C.), “só a mudança é permanente”, saberemos que nunca nada estará definitivamente conquistado mas, também, nunca nada estará definitivamente perdido. Tal como sempre no passado, para os Humanistas contemporâneos e futuros, nomeadamente Europeus Continentais, esta “disputa de campo” será, inexoravelmente, permanente pois como referiu Oscar Wilde, no ensaio “A alma do Homem sob o socialismo”, “O progresso é a concretização de Utopias” (12).

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Referências bibliográficas [a]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

(1) [a]

KEA European Affairs - “The Economy of Culture in Europe, European Commission”, Directorate-General for Education and Culture, Brussels, October 2006. (2) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (3)

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(4)

Porter, Michael; Montgomery, Cynthia, “Estratégia: A busca da vantagem competitiva”, Campus, Rio de Janeiro, 1998. (5) [a]

AD&C Agência para o Desenvolvimento e Coesão, I.P., “Portugal 2020: Objetivos, Desafios e Internacionalização”, Dezembro 2014. (6)

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Ladewig, Gunter - “The PDMA ToolBook 3, for New Product Development”, Abbie Griffin & Stephen M. Somermeyer / J. Wiley & Sons, New Jersey, 2007. (8) [a]

Adorno, Theodor W.; Horkheimer, Max - “Dialéctica del Iluminismo”, www.philosophia.cl / Escuela de Filosofía Universidad ARCIS, Amesterdão, 1947. (9) [a]

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Silva, Paulo Cunha - Conferências “O Futuro do Futuro: da Matéria ao Pensamento”, Sociedade Porto 2001 - Capital Europeia da Cultura, Porto, Fevereiro/Dezembro 2001. (11)

Gleick, James - “Caos: A construção de uma nova ciência”, Gradiva, Lisboa, 1989.

(12) [a]

Wilde, Oscar - “A alma do homem sob o socialismo”, tradução Heitor Ferreira da Costa, L&PM Pocket, Porto Alegre, 2003. ______________________________________________________________________________

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4.2 Sector Cultural em Portugal: uma perspectiva organizacional Numa perspectiva organizacional a sociologia refere-se a três sectores: o Primeiro Sector - público e estatal, o Segundo Sector - privado de mercado e o Terceiro Sector - privado da sociedade civil; sendo que, numa perspectiva económica o Segundo Sector é subdividido, genericamente, em Primário - extracção mineira, silvicultura, agricultura, pecuária e pesca; Secundário - indústria, construção civil, produção de energia e artesanato; Terciário - comércio e os serviços: bancos, seguros, transportes, saúde, ensino, actividades culturais, ciêntificas e desportivas. Quando se fala em Sector Cultural supõe-se falar-se de um dos sectores de actividade consagrados na estrutura político-administrativa dos Estados, nomeadamente Europeus e de influência europeia e, este sector, como todos os outros sectores de actividade, está definido pela sua respectiva Classificação das Actividades Económicas, CAE Rev. 3 (1), nomeadamente no caso de Portugal, na “Secção R - Actividades Artísticas, de Espectáculos, Desportivas e Recreativas; Divisão 90 - Actividades de teatro, de música, de dança e outras actividades artísticas e literárias e 91 - Actividades das bibliotecas, arquivos, museus e outras actividades culturais.” O OAC Observatório das Actividades Culturais, prestigiada instituição que desde a sua criação sempre prestou um serviço de excelente qualidade ao Sector Cultual e para a qual foi decidida a extinção, no início de 2014, na sua publicação ”As Políticas Culturais em Portugal” (2), de 1998, considerava o Sector Cultural constituído pelas actividades de: Artes Plásticas; Música; Dança; Teatro; Cinema, Televisão e Rádio; Livro, publicações e bibliotecas; Património, museus e arquivos; Actividades sócio-culturais. As actividades de Cinema (chamado de “autor”), Televisão (como a RTP2, em Portugal), Rádio (como a Antena2, em Portugal) e publicações (edições de livros e música de “referência”), pelo seu processo de produção, passaram a se agrupar sob a designação de Indústrias Culturais (3). Em 1969, William Baumol e William Bowen, com a chamada Lei de Baumol (4) vieram introduzir um novo olhar na Economia clássica demonstrando, que não é possível rentabilizar, de um ponto de vista económico, o subsector das Actividades Artísticas, elemento nuclear do que se entende por Sector Cultural sendo que, embora por razões distintas e salvo eventuais casos excepcionais, esta questão é extensiva também, ao subsector do Património Cultural. Relativamente ao Cinema, nomeadamente o de “autor”, que se considerou enquadrado no subsector das Indústrias Culturais, área de grande desenvolvimento tecnológico, seria interessante que se procurasse perceber, através duma reflexão devidamente orientada, quais serão os resultados da aplicação desta relativamente nova teoria Económica. Se a esta realidade se juntar a questão do seu posicionamento na Teoria da Hierarquia das Necessidades (Pirâmide) de Abraham Maslow (5), poderão ser avaliadas as razões da total impossibilidade de ser alcançada uma total sustentabilidade económica das actividades relacionadas com a Cultura Erudita. Aqui se encontra uma das razões fundamentadas, por ventura das maiores, para a necessidade de uma especialização em Gestão Cultural, quer pela sua contribuição em valor acrescentado para o aumento da produtividade do sector - pelo lado da Gestão e respectiva inovação organizacional - quer atendendo à cada vez maior complexidade das sociedades contemporâneas, que exigem uma permanente procura dessa desejável, tanto quanto possível, sustentabilidade financeira do Sector Cultural.

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Estatísticas e Sector Cultural Actualmente, a questão da reflexão sobre a estruturação e âmbito do Sector Cultural, nomeadamente, no quadro da actual CAE Classificação das Actividades Económicas, reveste-se da maior importância, tendo em vista a necessária actualização e adaptação à realidade organizacional contemporânea, nacional e europeia pelo facto de, inexoravelmente, continuar a ser uma questão estratégica para o fornecimento de informação que possa contribuir para um Desenvolvimento Sustentável do Sector e a consolidação de uma Gestão Cultural eticamente responsável. Esta questão tem vindo a ser abordada, desde o início dos anos 2000, com o Dr. Pedro Campos, responsável pela área da Cultura na Delegação do Porto do INE Instituto Nacional de Estatística, Professor de Estatística na FEP Faculdade de Economia do Porto e na PgGC Pós-graduação em Gestão Cultural. Para se ilustrar a actual realidade, cita-se um caso concreto ocorrido em 2010, onde a solução possível para o enquadramento de um ACE Agrupamento Complementar de Empresas, para Internacionalização da Arte Contemporânea, por exclusão de partes, acabou por ter que ser classificado com a CAE (Rev.3) 91020 Actividades dos Museus (principal) e 94991 Associações Culturais e Recreativas (secundária). Em Dezembro de 2012, a questão da Informação Estatística através de uma Conta Satélite, esteve presente entre outras - igualmente relacionadas com a necessidade de produção de informação mais detalhada, para apoiar o melhor funcionamento do Sector Cultural - no decorrer de uma longa apresentação à Coordenadora da Comissão de Educação, Ciência e Cultura do Grupo Parlamentar do PSD Partido Social Democrata, Dra. Conceição Jardim Pereira, no seu Gabinete Parlamentar, a qual, atenciosamente, se disponibilizou para sensibilizar o Secretário de Estado da Cultura, Dr. Francisco José Viegas, para a importância e oportunidade de se procurar a necessária abordagem institucional a estas questões. Posteriormente, em Abril de 2013, numa entrevista ao Jornal de Negócios o, então, novo Secretário de Estado da Cultura, Dr. Jorge Barreto Xavier, referia: “desafiei o INE a criar a Conta Satélite da Cultura, um instrumento estatístico que nos vai permitir avaliar, com rigor, o papel da cultura no contexto da sociedade portuguesa.” A criação de uma Conta Satélite para a Cultura, atendendo a ser uma questão estratégica para o Sector Cultural em Portugal, deveria ser objecto de uma alargada reflexão, envolvendo todos os agentes culturais interessados, como oportunamente proposto - o que não veio a acontecer sendo que a configuração desta Conta não poderá deixar de revelar aquilo que se poderá considerar “a face visível do iceberg” e deixar implícito, desde logo, para onde o vão querer tentar encaminhar.

Sector Cultural: Visão e Modelo Visão organizacional (6)

Numa perspectiva de Ludwig von Bertalanffy e da Teoria Geral dos Sistemas , partindo de um sistema geral e aberto da Humanidade, poderão ser encontrados vários subsistemas culturais, de acordo com as possíveis perspectivas “realista” e “estruturalista”, igualmente abertos por natureza, podendo um deles ser o subsistema da cultural baseado na designação de “cultura”, em sentido mais antropológico.

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Dentro deste subsistema encontraremos outros subsistemas nomeadamente os da chamada Cultura “Erudita ou Alta” e da cultura “popular ou baixa”, os primeiros associados ao Sector Cultural e os segundos ao Sector Económico, sendo que se poderá, também, considerar um subsistema intermédio, que compreende as actividades ligadas aos dois sectores a que poderíamos chamar de cultura “intermédia” ou “mesocultura”. Este subsistema correlaciona-se com outros subsistemas, que tradicionalmente constituem os também chamados “sector” e “subsector” cujo posicionamento, numa perspectiva sociológica, aparecem considerados na figura seguinte. Sector

Cultural

subsector

fileira



Património Cultural



Actividades Artísticas

época passado

Artes do Espectáculo

presente

Artes Visuais Artes Electrónicas Humanidades

Cultural > Económico

3º>2º 2º

Económico

Indústrias Culturais Arquitectura



Indústrias Artesanais



Indústrias Criativas

Figura 1 - Sector Cultural, Visão organizacional (António Jorge Monteiro)

Modelo conceptual Dentro deste subsistema conceptual consideram-se outros dois subsistemas: um periférico (indústrias artesanais e criativas) e outro central (património cultural, actividades artísticas, indústrias culturais e arquitectura) a que se fez corresponder, respectivamente, as designações de “cultura popular” e “Cultura Erudita” referida e grafada, normalmente, como Cultura.

Indústrias Criativas

Actividades Artísticas

Indústrias Culturais

Arquitectura

Património Cultural

Indústrias Artesanais

Figura 2 - Sector Cultural, Modelo conceptual (António Jorge Monteiro)

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Em linha com a tradição e a evolução do Campo Cultural - nomeadamente após a institucionalização da democracia formal em 1974 - foi desenvolvida uma Visão organizacional e um Modelo conceptual, como eventuais e possíveis pontos de partida para uma discussão alargada sobre Cultura, Campo Cultural e Sector Cultural em Portugal.

______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a] [b]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação sítio disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.c om / Informações

(1) [a] [b]

INE Instituto Nacional de Estatística - “Classificação Portuguesa das Actividades Económicas Rev.3”, Instituto Nacional de Estatística, I.P., Lisboa, 2007. (2)

Santos, Maria de Lourdes Lima dos (coordenação) - ”As Políticas Culturais em Portugal”, Observatório das Actividades Culturais, Lisboa, Novembro 1998. (3) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (4)

Baumol, William J.; Bowen, William G. - “Performing Arts - The Economic Dilemma”, The MIT Press, Massachusetts, September 1968. (5)

Maslow, Abraham H. - “Motivation and Personality”, Harper & Row Publishers, New York, 1954.

(6)

Bertalanffy, Ludwig von - ”Teoria Geral dos Sistemas - Fundamentos, desenvolvimentos e aplicações”, Editora Vozes, Rio de Janeiro, 2008. ______________________________________________________________________________

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5. Gestão Cultural 5.1 Gestão Cultural Profissional Numa perspectiva da Gestão Cultural Profissional abordar a gestão das organizações Culturais tem obrigado, sempre, a não deixar de ter em conta outros domínios associados e indispensáveis para a sua contextualização bem como, de acordo com as necessidades, fazê-lo tendo em conta os diversos aspectos organizacionais e espaciais, nomeadamente, Mundial, Ocidental, Europeu e Nacional. Nos anos de 1980, depois do aparecimento e generalização, em Portugal, do novo conceito de “Gestão”, em termos profissionais, começou a sentir-se a necessidade de orientar, tanto quanto possível, esta nova área de conhecimento multidisciplinar e a sua estrutura académica, teóricoprática, para os sectores de actividade económica, tradicionais, como o industrial, o comercial e os serviços, começando a aparecer designações como: Gestão Industrial, Gestão Comercial, Gestão Bancária, Gestão de Turismo e muitas outras. De fora deste tipo de formação ficavam os sectores não predominantemente Económicos, nomeadamente, o Social e o Cultural, para os quais, no entanto, a necessidade de lhes procurar dar resposta, em termos de formação académica em Gestão, era maioritariamente e esmagadoramente consensual. Não muito consensual era se, para estes dois sectores, o Social e o Cultural, tradicionalmente e maioritariamente pertencentes ao chamado sector “sem fins lucrativos” ou “terceiro sector”, em muitos casos associados a fins caritativos, necessitavam de uma abordagem de Gestão distinta. Sobre esta questão entendia-se que a Gestão no Sector Cultural, nomeadamente nas instituições sem fins lucrativos, na esmagadora maioria dos casos, necessitava de uma atitude distintiva e proactiva de procura de financiamento baseada no Patrocínio Cultural, no Mecenato Cultural e nos apoios Públicos e Privados, tendo em conta a sua natureza particular e específica evidenciada por William Baumol e William Bowen, na chamada Lei de Baumol (1) e pelo seu posicionamento na Teoria da Hierarquia das Necessidades (Pirâmide) de Abraham Maslow (2). Em 1990, foi iniciado um projecto de criação de uma “Escola de Gestão das Artes” (3), (4), inspirada pela excelência do Colégio das Artes, criado em Coimbra, em 1547, por D. João III e dirigido por André de Gouveia. Entre 1990 e 1992, foram contactadas cerca de vinte personalidades, profundamente ligadas à Gestão e à Cultura, no Porto e em Lisboa, a quem foi apresentado um anteprojecto e com quem foi discutida a oportunidade e pertinência de se avançar com esta iniciativa. De todos os contactados, a única opinião de que não se justificava a criação de uma formação específica, em Gestão das Artes, foi do estimado e saudoso Professor Carlos Barral, Director do ISEE Instituto de Estudos Empresarias, da Universidade do Porto e responsável pelo criação na região do Norte, dos pioneiros programas de MBA Master Business Administration e CGG Curso Geral de Gestão, da Universidade Nova de Lisboa. Posteriormente, num período em que o conceito de “Terceiro Sector” estava de moda, o Professor Doutor Alberto Castro, outra respeitável e estimada personalidade, com vasta experiência académica, entendia também que uma formação académica em “Gestão de Instituições Sem Fins Lucrativos” seria a abordagem mais recomendável, para satisfazer as necessidades do Sector Cultural.

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Outra opinião curiosa sobre a Gestão Cultural Profissional, em Portugal, registou-se em 2004, durante o Encontro Internacional de Teatro “Portogofone”, proferida pelo Presidente do Conselho de Administração e Director Artístico do TNSJ Teatro Nacional de São João, Dr. Ricardo Pais que, em resposta a uma pergunta de uma participante, referiu: “não me falem em gestão cultural, porque é a nova profissão para as tias”, tendo ficado por entender qual o verdadeiro significado que se deveria atribuir à palavra ”tias”. Por razões diversas, também, já abordadas no texto “Gestão Cultural em Portugal - Uma visão, um projecto, uma história e vários protagonistas” (5), só em 1998 é retomado o que veio a ser o projecto da Gestão Cultural, cujo historial e resultados estão reflectidos, também, nesse texto. Foi nesta altura que se entendeu alterar o conceito de “Gestão das Artes”, relacionado directamente com o subsector das Actividades Artísticas, para “Gestão Cultural” por forma a integrar, também, os subsectores do Património Cultural e das Indústrias Culturais (6). No referido texto, também, se pode ler: “Entende-se por Gestão Cultural a actividade de Gestão orientada para as organizações do Sector Cultural, nas áreas do Património Cultural, das Actividades Artísticas e das Indústrias Culturais, no âmbito do Estado, da Sociedade Civil e do Mercado.”, bem como, “O projecto da Gestão Cultural tem sido, desde sempre, orientado por uma visão: ”Portugal, a Europa e o Mundo, com um Sector Cultural Sustentável, gerido por profissionais competentes em Gestão Cultural”. Neste contexto, para permitir uma adequada formação nesta área de conhecimento, em Portugal, surgiram os Programas de Formação Avançada e Pós-graduada em Gestão Cultural, com mais de trezentas horas lectivas, primeiro no Porto orientado para as Regiões do Norte e Centro e, posteriormente, em Lisboa, orientado para as Regiões de Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. Estes programas, quer cientificamente quer pedagogicamente, foram pensados em linha com o “estado da arte” internacional, de formação em Gestão, de matriz Europeia Continental, desenvolvidos a partir “da gestão para a cultura” e com uma orientação aplicada, que constituiu um modelo, absolutamente, distinto de todos os programas que, posteriormente e até hoje, têm vindo a aparecer, no mercado do ensino da Gestão Cultural, em Portugal. A Gestão Cultural Profissional procura articular os Objectivos (programação) e os Recursos (produção) das organizações Culturais, com eficácia e eficiência, no sentido de poder conseguir obter os melhores Resultados (gestão) possíveis.

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Nas sociedades contemporâneas que adoptaram a abordagem da Europa Continental ao Sector Cultural, a Gestão Cultural Profissional é a actividade que integra de forma coerente todas as vertentes das organizações culturais - Estratégica (Programação Cultural), Operacional (Produção Cultural) e Financeira (Captação de Recursos) -, permitindo uma abordagem sistémica na procura sustentável da satisfação das necessidades e desejos de todos os Stakeholders (partes interessadas), nomeadamente os Criadores e os Públicos Culturais. Pelo exposto, se poderá constatar a pertinência de se procurar dar satisfação à necessidade de competências específicas em Gestão Cultural, para as áreas do Património Cultural, das Actividades Artísticas e das Indústrias Culturais, independentemente da sua dimensão organizacional, micro, pequena ou média e da sua natureza pública ou privada. Acontece que a sociedade contemporânea de consumo é o motor das economias de mercado modernas e os seus gestores, naturalmente, são provenientes das formações tradicionais em Gestão empresarial, orientada para o Sector Económico, espaço de funcionamento da maioria da Indústrias Culturais, onde só, excepcionalmente, em algumas micro e, eventualmente, pequenas organizações, poderemos encontrar Gestores Culturais. Por outro lado, não poderemos deixar de ter em conta que, muito em particular no Sector Cultural, as posições ou lugares de gestão, têm sido ao longo do tempo capturadas pelos boys and girls, provenientes das conhecidas “economias de favor”, instrumento de poder e influência de diversas organizações sociais, umas visíveis como os Partidos, os Governos e as Presidências da República, outras ocultas, nomeadamente religiosas, esotéricas ou de orientação de gênero, que acabam quase sempre por “impor” nesses lugares, pessoas da sua confiança pessoal ou de grupo, seguramente com méritos “particulares” mas não com “mérito pessoal e profissional” reconhecido a um Gestor Cultural, com formação e competências comprovadas. Enquanto isto, será de tudo fazer para procurar que os Gestores Culturais Profissionais venham a continuar a desenvolver as suas competências profissionais específicas, acreditando que possam vir a ocupar o seu lugar, de direito próprio, nas organizações Culturais, principalmente nas áreas do Património Cultural e das Actividades Artísticas, combatendo-se o amadorismo, por via não tecnocrática, e o funcionamento socialmente e eticamente pouco responsável que tradicionalmente têm vindo a instalar-se, nomeadamente nas organizações do Sector Cultural. ______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação

(1)

Baumol, William J.; Bowen, William G. - “Performing Arts - The Economic Dilemma”, The MIT Press, Massachusetts, September 1968. (2)

Maslow, Abraham H. - “Motivation and Personality”, Harper & Row Publishers, New York, 1954.

(3) [a]

Monteiro, António Jorge - “Projecto de criação de uma escola de Gestão das Artes Algumas considerações estratégicas”, edição PDF, Porto, Abril 1992. (4) [a]

Monteiro, António Jorge - “Gestão das Artes: uma contribuição”, Público, Porto, Abril 1994.

(5) [a]

Monteiro, António Jorge - “Gestão Cultural em Portugal - Uma visão, um projecto, uma história e vários protagonistas”, edição PDF, Porto, Novembro 2011. (6) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. ______________________________________________________________________________

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5.2 Gestão Cultural e Formação Especializada A necessidade das organizações do sector cultural disporem de competências em Gestão Cultural começaram a ser sentidas, desde o início dos anos de 70 do século XX, quando foi aceite um convite profissional para Director de Produção do TUP Teatro Universitário do Porto e continuam a ser, ainda hoje, genericamente sentidas e consideradas de importância fundamental pelos agentes culturais dos países desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento. Foi tendo em consideração esta realidade que desde o início dos anos de 1990 se começou a pesquisar e a reflectir sobre a formação em Gestão Cultural em Portugal e no Noroeste Peninsular, por forma a criar condições para o desenvolvimento de competências de gestão profissional nas organizações culturais. Assim, em 1992, foi dado início ao projecto de criação de uma “Escola de Gestão das Artes” (1) (2), em Portugal, desde logo totalmente apoiado por prestigiadas instituições e personalidades, nomeadamente, o GETAP Gabinete de Educação Tecnológica, Artística e Profissional, nas pessoas do Professor Doutor Joaquim Azevedo e do Engenheiro Francisco Jacinto; a CCRN Comissão de Coordenação da região do Norte, na pessoa do seu Presidente, Engenheiro Luís Braga da Cruz e considerado “sem interesse estratégico” para a Cidade do Porto pela Vereação do Pelouro da Animação da Cidade, Dra. Manuela de Melo.

Formação Avançada, Pós-graduação e Mestrado Este projecto de formação em Gestão das Artes acaba por ser retomado em 1998, a convite do Director do IEP Instituto Empresarial Portuense, Professor Doutor Joaquim Azevedo e em parceria com a ESADE Escuela Superior de Administración Y Dirección de Empresas de Barcelona. Em 1998 e em 1999 foram realizadas as duas primeiras edições, de curta duração, do curso de Formação Avançada, que permitem confirmar a necessidade e oportunidade deste tipo de formação. No ano 2000, foi realizada a 1ª edição do curso de Pós-graduação em Gestão Cultural, conjuntamente com a 3ª edição do curso de Formação Avançada, no âmbito do IEP Instituto Empresarial Portuense, tal como se vinha procurando fazer desde há vários anos, com uma abordagem financeira orientada para a sua auto-sustentabilidade. Com a fusão do IEP Instituto Empresarial Portuense, da AEP Associação Empresarial Portuense, com o ISEE Instituto Superior de estudos Empresariais, da Universidade do Porto, dando origem à EGP Escola de Gestão do Porto, da Universidade do Porto, este modelo de formação avançada e pós-graduada passa, desde logo, no ano lectivo de 2000/01, a integrar esta nova escola a convite do seu Presidente da Direcção, Professor Doutor Daniel Bessa (3). Numa perspectiva de internacionalização e intercâmbio profissional e académico, em 2002, a convite da USC Universidade de Santiago de Compostela, através da Prof.ª Mar Lorenzo Moledo, Vicerrectora de Extensión Cultural e Servicios á Comunidade Universitária e do Prof. Marcelino Agís Villaverde, Vicerrector de Terceiro Ciclo e Extensión Docente, foi desenvolvido o projecto da Pós-Graduação em Gestão Cultural | Norte de Portugal / Galiza, co-promovido pelo IPP Instituto Politécnico do Porto, tendo como parceiros o CGAC Centro Galego de Arte Contemporánea, o Grupo Sargadelos, Santiago de Compostela, a AEP Associação Empresarial de Portugal e a APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural.

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Este projecto, envolvendo 6 prestigiadas instituições (3 galegas e 3 portuguesas), 20 docentes (10 galegos e 10 portugueses), 24 alunos, (12 galegos e 12 portugueses), com duração de 10 semanas, uma por mês, intercaladas (5 no Porto e 5 em Santiago de Compostela), tendo como responsáveis o Prof. Doutor Luís Soares, Presidente do IPP e o Prof. Marcelino Agís, Vicerrector da USC, apresentou uma candidatura ao Programa Interreg III A, Medida 3.2, coordenado pela CCRN Comissão de Coordenação da Região Norte que, tal como foi transmitido pela Dra. Júlia Abrantes, o considerou “não inovador” e, só por isso, não elegível. Nos anos de 2002 a 2005 realizaram-se a 3ª, 4ª e 5ª (4) edições da Pós-graduação em Gestão Cultural, no âmbito do IPP Instituto Politécnico do Porto / ESMAE Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo e da AEP Associação Empresarial de Portugal, com a participação da APOM Associação Portuguesa de Museologia e da APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural, a convite do Presidente do IPP, Professor Doutor Luís Soares. Esta 5ª edição foi realizada integrando, também, a EGE Escola de Gestão Empresarial, entretanto, criada pela iniciativa conjunta da AEP Associação Empresarial de Portugal, da UA Universidade de Aveiro e da UCP Universidade Católica Portuguesa, com a cooperação da ESADE Escuela Superior de Administración Y Dirección de Empresas de Barcelona e contando, ainda, com a cooperação do Grupo Sargadelos de Santiago de Compostela. No ano lectivo de 2004/05 e 2005/06, em Lisboa, foram realizadas a 1ª e 2ª (5) edições do programa de Pós-Graduação em Gestão Cultural, no âmbito da ULHT Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias e do IPP Instituto Politécnico do Porto / ESMAE Escola Superior de Música e Artes do Espectáculo, com a cooperação da APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural, a convite do Presidente da ULHT, Professor Doutor Manuel Damásio. Entretanto, no Porto, no ano lectivo 2005/06, foi lançada a 6ª edição deste mesmo programa, no âmbito da ULP Universidade Lusófona do Porto (não realizado), com a cooperação da APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural e do Grupo Sargadelos, de Santiago de Compostela (6) . No âmbito europeu, em 2006, desenvolveu-se um programa de “Gestão de Projectos Culturais Europeus”, uma parceria conjunta com o CIEJD Centro de Informação Europeia Jacques Delors, o CNC Centro Nacional de Cultura e a Revista Cultdigest, destinado a agentes culturais portugueses, combinando uma Formação em Lisboa com Reuniões de Trabalho nas diversas (7) instituições comunitárias em Bruxelas . Entre 2007-08, por convite do Presidente do INDEG/ISCTE Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, Lisboa, Professor Doutor Luís Reto e do Director do GESTIN, Professor Doutor Luís Martins, foi desenvolvido um Mestrado em Gestão Cultural, composto por dois semestres, um relativo a um Mestrado Executivo em Gestão Cultural e outro relativo ao Grau de Mestre. Este projecto tinha como exigência, do Presidente do INDEG/ISCTE, que fosse um programa de âmbito nacional e fosse ministrado, também, por docentes estrangeiros, o que foi devidamente considerado, com o envolvimento da EGP Escola de Gestão do Porto, da Universidade do Porto, Professor Doutor Daniel Bessa e dos Professores Convidados: Fátima Anllo, Madrid; Luís Bonet, Barcelona; Yves Evrard, HEC Paris e Stefano Baia Curioni, Itália. Atendendo à natureza deste projecto, entendeu-se apresenta-lo à Directora do GPEARI Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais, Dra. Patrícia Salvação Barreto.

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Posteriormente, por razões completamente estranhas à Coordenação do Projecto, este programa de mestrado não se realizou, aparecendo, entretanto, no âmbito do INDEG/ISCTE, a Pósgraduação em Gestão e Empreendedorismo Cultural e Criativo, com a Direcção dos Professores Luís Martins e Alexandra Fernandes, em cooperação o Ministério da Cultura / GPEARI Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais.

Modelo científico e pedagógico Quando no ano 2000 se deu o início ao programa “Pós-graduação em Gestão Cultural”, este projecto foi, desde logo, concebido com um modelo inovador, no Ensino Superior em Portugal, atendendo a que foi orientado para a formação das pessoas com responsabilidades de gestão nas organizações culturais, quer fossem ou não licenciados, sendo toda a formação e avaliação dos alunos realizada com o mesmo nível de exigência académica e fazendo a necessária distinção na certificação do aproveitamento final, positivo, através dos Diplomas atribuídos podendo ser de Pós-Graduação ou Formação Avançada, respectivamente, para licenciados e não licenciados. Com o início das pós-graduações, os cursos passaram a ter uma forte componente prática e profissional, aplicada no âmbito do desenvolvimento de um Projecto Cultural concreto de empreendedorismo ou reestruturação organizacional, nas áreas do Património Cultural, das Actividades Artísticas ou das Indústrias Culturais (8) e realizado, necessariamente, em equipa constituída no início do curso. A sua Estrutura Curricular foi concebida “da Gestão para a Cultura” e não “da cultura para a gestão” com uma orientação eminentemente teórico-prática contemplando: Políticas Culturais, Economia e Cultura, Sociologia e Cultura, Estatística e Cultura, Sistemas e Tecnologias de Informação, Gestão Estratégica, Inovação e Cultura, Marketing Cultural, Comunicação e Imagem, Direito nas Organizações Culturais, Estruturas Organizacionais, Gestão de Pessoas, Comportamento Organizacional, Qualidade e Cultura, Ética e Cultura, Programação Cultural, Produção Cultural, Contabilidade de Gestão, Gestão Financeira, Captação de Recursos e Gestão de Projectos Culturais. Esta disciplina de Gestão de Projectos Culturais, de natureza teórico-prática, foi concebida para acompanhar a produção e a aquisição do conhecimento em todas as outras disciplinas e orientar esse conhecimento adquirido para ser aplicado funcionalmente no desenvolvimento dos referidos projectos culturais, sendo que, tanto quanto se tem conhecimento, este modelo metodologico de formação avançada e especializada foi, e tem continuado a ser, único em Portugal. Relativamente ao conceito de “Captação de Recursos”, que se aplicou à disciplina com o mesmo nome, ele foi introduzido em Portugal depois dos contactos de trabalho estabelecidos em São Paulo, com o Dr. José Afonso Drumond, Director de Produção Teatral, no Rio de Janeiro. Pelas características do Sector Cultural e do seu respectivo mercado de trabalho, bem como do conhecimento relevante para a formação profissional de Gestores, para o Sector Cultural, entende-se que, na Gestão Cultural, tal como tem sido considerado - e ao contrário do entendimento de outros responsáveis académicos - a formação deveria ser orientada para programas de especialização, através de opções terminais de licenciaturas, pós-graduações, mestrados e doutoramentos, não para a formação total de base característica das licenciaturas tradicionais.

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Resultados atingidos ao longo dos anos Alguns dos resultados atingidos ao longo dos anos, referenciados em "Gestão Cultural em (9) Portugal - uma visão, um projecto, uma história e vários protagonistas" . · ·

Foram realizadas mais de 10 edições, destes vários programas; Participaram mais de 180 alunos provenientes de Portugal Continental, das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, bem como da Galiza e do Brasil ; Envolveram-se mais de 120 organizações do Sector Cultural; Foram orientados cerca de 60 Projectos Culturais Profissionais, dos quais 20 de Empreendedorismo; Estabeleceram-se vários Protocolos de Cooperação entre diversas instituições Culturais, Empresariais, de Ensino Universitário e Politécnico, nacionais e internacionais; Procedeu-se à promulgação de alguns dos Programas de Especialização, em Diário da Republica. Conceberam-se e desenvolveram-se alguns projectos orientados para o desenvolvimento e acreditação da Gestão Cultural Profissional a nível nacional e internacional; Produziu-se múltiplo pensamento sobre a Gestão Cultural Profissional em Intervenções, Comunicações, Entrevistas e Artigos publicados; Desenvolveram-se e apoiaram-se múltiplas iniciativas nacionais - em Portugal Continental e Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores - e europeias, no âmbito da Gestão Cultural Profissional; Estabeleceram-se múltiplas relações internacionais, quer na Europa quer no Brasil, no âmbito da Gestão Cultural Profissional; Constituiu-se uma Associação com mais de 50 participantes; Foi lançado, para discussão, um projecto de desenvolvimento de um Código de Ética do Gestor Cultural.

· · · · · · ·

· · ·

Sobre este documento “A Gestão Cultural em Portugal”, reproduz-se o comentário do Professor Doutor José Madureira Pinto (**): “Lendo a súmula de resultados apresentada na conclusão do texto, fica-se com a sensação de que eles são escassos face ao esforço desenvolvido ao longo de décadas na área da gestão cultural. Percebe-se que no terreno terão ficado algumas sementes de mudança, mas acredito que, ao olhar para trás, os protagonistas da saga sintam que tudo poderia ter sido bem melhor. Infelizmente, exercício ainda mais doloroso será seguramente o de "olhar para a frente". (…).Temo que a inexistência de plataformas institucionais consistentes e sustentadas para acolher e pôr em prática projectos deste tipo tenda a fazer-se notar ainda mais no futuro próximo.” Entretanto, relativamente a esta questão, verifica-se continuar actual uma Visão defendida desde sempre: ”Portugal, a Europa e o Mundo, com um Sector Cultural Sustentável, gerido por profissionais competentes em Gestão Cultural”. ______________________________________________________________________________

Referências bibliográficas [a] [b]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação sítio disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.c om / Informações

(**)

Sociólogo, Professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Comentário pessoal dirigido ao autor do texto, citação reproduzida com autorização.

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Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional

(1) [a]

Monteiro, António Jorge - “Projecto de criação de uma escola de Gestão das Artes Algumas considerações estratégicas”, edição PDF, Porto, Abril 1992. (2) [a]

Monteiro, António Jorge - “Gestão das Artes: uma contribuição”, jornal Público, Porto, 10 Abril 1994. (3) [a]

Monteiro, António Jorge - “Pós-Graduação em Gestão Cultural - Prt 2ª edição”, EGP Escola de Gestão do Porto, Porto 2001. (4) [a]

Monteiro, António Jorge - “Pós-Graduação em Gestão Cultural - Prt 5ª edição”, IPP Instituto Politécnico do Porto / EGE Escola de Gestão Empresarial, Porto 2004. (5) [a]

Monteiro, António Jorge - “Pós-Graduação em Gestão Cultural - Lx 2ª edição”, ULHT Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Lisboa 2006. (6) [a]

Monteiro, António Jorge - “Pós-Graduação em Gestão Cultural - Prt 6ª edição”, ULP Universidade Lusófona do Porto, 2006. (7) [a] [b]

CIEJD Centro de Informação Europeia Jacques Delors & Outros - “Gestão de Projectos Culturais Europeus - 1ª edição”, edição PDF, Lisboa e Bruxelas, Maio e Junho 2006. (8) [a]

Monteiro, Antonio Jorge - “Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional / Cultura: algumas definições e conceitos”, edição PDF, Porto, Abril 2015. (9) [a]

Monteiro, António Jorge - “Gestão Cultural em Portugal - Uma visão, um projecto, uma história e vários protagonistas”, edição PDF, Porto, Novembro 2011. ______________________________________________________________________________

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Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional

5.3 Gestão Cultural e Associativismo Profissional: a APGC A Gestão Cultural, em Portugal, a partir de 2001, começou a poder contar, também, com a APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural, fundada com a Missão de “apoiar o desenvolvimento, a promoção e a divulgação da Gestão Cultural nos seus múltiplos domínios, nomeadamente, em (1) Portugal e no espaço da Lusofonia” que, com uma CAE, Rev.2, 91120 - Organizações profissionais -, criou as condições de se poder vir a constituir como uma rede socioprofissional dos Gestores Culturais. Criada no âmbito dos Programas de Formação Avançada e Pós-graduada em Gestão Cultural, manteve o seu apoio a todos os programas seguintes, desenvolvidos em várias instituições do ensino superior Universitário e Politécnico, no Porto e em Lisboa, com quem estabeleceu e formalizou diversos Protocolos de Cooperação. Empenhou-se, também, no desenvolvimento deste tipo de programas na Região Autónoma da Madeira, com o Cine Fórum do Funchal / FACIC Fórum de Arte, Ciência e Cultura, e na Comunidade Autónoma da Galiza, com a USC Universidade de Santiago de Compostela e outras prestigiadas instituições. Para além destes programas de formação, tem apoiado a realização e participado em vários Seminários e Conferências, bem como, produzido algum pensamento em artigos de opinião, sobre diversos temas relevantes para a Gestão Cultural. A revista CultDigest, em Abril de 2004, publica o texto “Ética e Gestão Cultural: uma reflexão necessária” (2), onde se tecem algumas considerações sobre a importância da Ética na Responsabilidade Social das Organizações, nomeadamente, Culturais, assinado pelo seu Presidente do Conselho de Gestão. No âmbito europeu, em 2006, desenvolveu e apoiou a criação do programa de “Gestão de Projectos Culturais Europeus”, uma parceria conjunta com o CIEJD Centro de Informação Europeia Jacques Delors, o CNC Centro Nacional de Cultura e a Revista Cultdigest, destinado a agentes culturais portugueses, combinando uma Formação em Lisboa com Reuniões de Trabalho nas diversas instituições comunitárias em Bruxelas (3). Em Novembro de 2010, procurou organizar um Jantar-Conferência, subordinado ao tema "A Gestão Cultural Profissional", com o apoio da EGP-UPBS Escola de Gestão do Porto - University of Porto Business School, tendo como oradores - confirmados - a Senhora Ministra da Cultura, Dra. Gabriela Canavilhas e o Senhor Presidente do Conselho de Administração da Fundação de Serralves, Engenheiro Luís Braga da Cruz, mas que acaba por ser cancelado, à última hora, por não comparência da Ministra da Cultura, nem de qualquer outra personalidade em sua representação. Entretanto em Março de 2014, o Conselho de Gestão da APGC decide avançar com o projecto de desenvolvimento de um “Código de Conduta para a Gestão Cultural” e, em Julho deste ano, é criado um Grupo de Trabalho informal constituído pela sua Presidente, Dra. Rosa Gomes e pelos ex-professores das PgGC Pós-graduações em Gestão Cultural: - José Manuel Moreira - Doutorado em Economia e em Filosofia; Professor Catedrático de Ciências Sociais e Políticas, da Universidade de Aveiro; Professor de Ética Empresarial, da FEP Faculdade de Economia da Universidade do Porto; autor de diversas obras de referência sobre Ética; Professor de “Ética e Gestão Cultural” na PgGC (Coordenador do documento base).

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Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional

- José Maria Cabral Ferreira - Filósofo, Teólogo e Padre Jesuíta; Professor de Sociologia e Antropologia na FAUP Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto; Professor de “Agentes e Sector Cultural” na PgGC. - Rui Lourenço - Psicólogo do Trabalho; Professor da UCP Universidade Católica do Porto, Professor de “Comportamento Organizacional” na PgGC. - António Jorge Monteiro - Gestor, Consultor e Professor de Gestão; Coordenador de múltiplos Projectos e Programas de Formação Avançada, Pós-graduação e Mestrado em Gestão Cultural, em diversas Escolas Superiores e Universidades, nacionais e internacionais; Professor de “Gestão de Projectos Culturais” na PgGC. A Gestão Cultural, atendendo à necessidade de comparticipação pública e privada no financiamento do Sector Cultural, nomeadamente nos subsectores das Actividades Artísticas e do Património Cultural, exige dos seus protagonistas um comportamento exemplar e procedimentos de total transparência, com a disponibilização pública de informação tecnicamente tratada, detalhada, credível e verificável para todos os interessados, nomeadamente os Contribuintes, os Mecenas e os Patrocinadores. Em Espanha e atendendo ao esforço e empenho dos profissionais desta actividade, já desde 2011 que o SEPE Servicio Público de Empleo en España em articulação com o INE Instituto Nacional de Estadística, reconhece os “Gestores Culturais” como uma nova profissão na “Clasificación (4) Ocupacional SISPE 2011 (CO-SISPE 2011)" . Acontece que quer numa perspectiva antropológica e sociocultural, quer numa perspectiva tecnocrática e pós-moderna, naturalmente por razões de natureza complectamente distintas, o desenvolvimento de um domínio do conhecimento e de uma actividade profissional, orientada para a Gestão Cultural, poderá ser considerado como não fazendo sentido e sem qualquer utilidade para as sociedades contemporâneas do século XXI.

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Referências bibliográficas [a] [b]

documento disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.com / Documentação sítio disponível em Gestão Cultural Profissional / gestaoculturalpt.blogspot.c om / Informações

(1) [b]

APGC Associação Portuguesa de Gestão Cultural - Internet, Janeiro 2015.

(2) [a]

Monteiro, António Jorge - “Ética e Gestão Cultural: uma reflexão necessária”, revista CultDigest, Porto, Abril de 2004. (3) [a] [b]

CIEJD Centro de Informação Europeia Jacques Delors & Outros - “Gestão de Projectos Culturais Europeus - 1ª edição”, edição PDF, Lisboa e Bruxelas, Maio e Junho 2006. (4) [a]

Ministerio de Economía y Hacienda - “Clasificación Nacional de Ocupaciones 2011”, Real Decreto 1591/2010, de 26 de noviembre, Boletín Oficial del Estado Núm. 306, 17 de diciembre de 2010.

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Campo Cultural e Gestão Cultural Profissional

Conclusão Nas sociedades contemporâneas, europeias continentais, mediterrânicas e respectivos espaços de influência cultural, nomeadamente lusófonos, hispânicos e francófonos, na chamada Mundialização do início século XXI, importa reflectir e discutir os, tendencialmente, dois grandes caminhos que se apresentam como possíveis, para o desenvolvimento futuro do Campo Cultural: - o Humanista, no âmbito de um Sector Cultural, convenientemente mais estruturado politicamente, - o Tecnocrata, no âmbito do Sector Económico, deliberadamente mais desestruturado e diluído. Esta reflexão irá, implicitamente, contribuir para avaliar qual o papel da Gestão Cultural Profissional, quinze anos depois do seu aparecimento em Portugal e cujo projecto tem sido, desde sempre, orientado por uma visão: ”Portugal, a Europa e o Mundo, com um Sector Cultural Sustentável, gerido por profissionais competentes em Gestão Cultural”.

______________________________________________________________________________ * António Jorge Monteiro Professor convidado, Orientador e Investigador na área de Gestão de Projectos Culturais. Coordenador de múltiplos Projectos e Programas de Pós-graduação e Mestrado em Gestão Cultural, em diversas Escolas Superiores e Universidades, nacionais e internacionais. Escreve em Português-padrão consuetudinário. ______________________________________________________________________________ Versões - v | parâmetros adoptados v1.0, primeiro documento publicado; v1.1, v1.2, …, documento revisto com alterações de forma; v2.0, v3.0, …, documento revisto com alterações de conteúdo, forma e data.

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