CANDEIAS, Celso (2015) - Prospeçao arqueológica de superfície intra-sitio, o Cerro do Cavaco e a II Idade do Ferro em Tavira. Actas del VII Encuentro de Arqueología del Suroeste Peninsular (Aroche-Serpa, 29, 30 de noviembre y 1 de diciembre, 2013). Huelva: Ayuntamiento de Aroche, pp. 711-738.

May 27, 2017 | Autor: Celso Candeias | Categoria: Archaeological Prospection, Romanization, Iron Age
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35. Prospeção arqueológica intra-sítio: o Cerro do Cavaco e a II Idade do Ferro em Tavira, Portugal Celso Candeias Câmara Municipal de Tavira

Resumo O trabalho que se apresenta foi realizado no âmbito do seminário de investigação necessário à conclusão da licenciatura em Arqueologia da Universidade do Algarve. Dão-se a conhecer os trabalhos de prospecção de superfície realizados no Cerro do Cavaco, com vista à obtenção de dados acerca da cronologia de ocupação e organização interna do sítio. Além da identificação de cerâmicas pré-romanas e romanas, enquadráveis em produções que vão do séc. IV ao I a.C., também se registaram diversas estruturas conservadas e vestígios de fundição. Abstract The work presented here was undertaken in partial fulfillment of the bachelor’s degree in Archaeology, at the University of the Algarve, Portugal. In order to obtain data for the chronology of occupation and internal organization of the site, we undertook an archaeological survey at Cerro do Cavaco. Besides the identification of pre-Roman and Roman pottery, classifiable as productions dating between the IV and the I centuries BC, various features and the remains of smelting were also identified.

INTRODUÇÃO

O trabalho que se dá a conhecer foi realizado no âmbito do seminário de investigação necessário à conclusão da licenciatura em arqueologia, na Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade do Algarve, tendo sido apoiado financeiramente pela Associação Arqueológica do Algarve (AAA) e aprovado pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC). Realizou-se uma prospecção arqueológica de superfície intra-sítio, onde foram aplicadas duas metodologias distintas, a prospecção em quadrícula e em linha, tendo o tratamento dos dados sido feito através de SIG. O sítio arqueológico intervencionado denomina-se Cerro do Cavaco, situa-se próximo a Tavira, e nunca foi alvo de escavações arqueológicas. As cronologias avançadas para o local, baseadas na observação dos materiais à superfície, situam a ocupação do sítio entre os sécs. IV ou III e o séc. I a.C. (Fabião 2003: 79). Embora o conjunto de materiais publicados forneça uma balizagem cronológica relativamente circunscrita, desconhece-se a época da fundação e a funcionalidade do sítio arqueológico. 1. LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA EM ESTUDO

O sítio arqueológico designado de Cerro do Cavaco localiza-se na costa sul de Portugal, a cerca de 1 km para norte da cidade de Tavira. Trata-se de uma implantação em altura, sobre uma colina de topo aplanado, não muito alta (62 m.) mas destacada, sobranceira à margem direita do rio Séqua (nome dado ao Gilão a montante de Tavira), que outrora seria navegável até um pouco a montante do sítio (Maia 1987: 45). Esta localização confere ao sítio um excelente domínio visual sobre a cidade de Tavira, foz do rio, zona estuarina e acessos ao mar (Figs. 1 e 2). Os terrenos ocupados pelos vestígios arqueológicos inserem-se no Barrocal, uma das três sub-regiões geomorfológicas do Algarve, que se caracteriza pela presença de substrato rochoso calcário, de idade mesozóica, com solos argilosos, por vezes bastante pedregosos, implantando-se o sítio numa área onde afloram os chamados calcários de Tavira. A propriedade onde se insere o sítio encontra-se atualmente em pousio, sendo ocasionalmente pastoreada por ovinos e caprinos. 712

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Figura 1. Localização do Cerro do Cavaco. [Adaptado a partir de imagem de Jaques Descloitres MODIS Rapid Response Team, NASA/GSFC, disponível em: http//www.mapas-portugal.com/ Satellite_Image_Photo_Iberian_Peninsula_2.htm.

2. ESTADO DO CONHECIMENTO SOBRE O SÍTIO

O Cerro do Cavaco foi identificado pela primeira vez por Estácio da Veiga. Não lhe tendo sido possível, em vida, publicar os resultados das suas pesquisas relativas ao período romano, é em publicação póstuma que alguns destes dados são dados a conhecer (Veiga 1910). Infelizmente, nessa publicação a referência ao sítio é feita apenas no mapa geral dos sítios, sendo-lhe associada a presença de objetos isolados de época árabe e romana. Cerca de 60 anos mais tarde, Mª Luísa Estácio da Veiga A. dos Santos, descendente do próprio Estácio da Veiga, publica a sua tese de licenciatura onde, à semelhança do seu antepassado, apenas localiza o sítio no mapa geral (Santos 1972). Ainda na década de 70, num artigo dedicado às Ânforas neopúnicas do sul de Portugal, Manuel Maia publica um bocal de ânfora neopúnica (Mañá C2) datado do séc. II-I a.C. recolhido pelo próprio no decurso de uma visita ao sítio (Maia 1978). Da responsabilidade do mesmo investigador foi o estudo de um conjunto de 44 fragmentos cerâmicos provenientes do sítio, onde identifica vários fragmentos de ânforas Dressel 1 e 18 e púnicas ou de influência púnica, bem como de cerâmica campaniense dos tipos A e B. Além desta VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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Figura 2. Vista aérea, tomada de NO para SE, onde se vê o Cerro do Cavaco, (em 1º plano) o centro histórico da cidade de Tavira, a zona estuarina e os acessos ao mar. [Foto de Alan Silva]

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informação, inclui também o sítio no mapa geral dos oppida existentes em território nacional, referindo-se ao sítio como uma colina de topo aplanado com perímetro circular e de encostas ingremes, com presença de socalcos que poderão indiciar a presença de muralhas (Maia 1987). Cinco anos mais tarde, em publicação sobre o Porto Romano da Ilha do Pessegueiro, Sines, Carlos T. da Silva e Joaquina Soares, referem a existência de “fragmentos de ânforas da Classe 32 (Mañá C2), de ânforas «ibero-púnicas» e de cerâmica campaniense” (Silva & Soares 1993), informações que julgamos terem sido retiradas dos trabalhos de Manuel Maia, anteriormente referidos. No ano de 1999, Ana M. Arruda e Rui de Almeida, publicam um levantamento exaustivo das ânforas vinárias de origem itálica presentes em território nacional, datadas dos finais do séc. II a.C. e do séc. I d.C. Neste artigo incluem sete fragmentos de bocal de ânfora, das Classes 3 (Dressel 1A), 4 (Dressel 1B) e 8 (Lamboglia 2), provenientes de recolhas de superfície efetuadas no Cerro do Cavaco. Além destes, são ainda referidos mais de 40 fragmentos de cerâmica, entre bordos fundos e asas, pertencentes não só às referidas classes de ânforas, bem como à Classe 32, ânforas ibero-púnicas e cerâmica campaniense B-öide, que se encontram depositados nas instalações do Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ) (Arruda & Almeida 1999). Em 2003, a propósito da elaboração do catálogo da exposição Tavira Território e Poder, organizada pela Câmara Municipal de Tavira e pelo Museu Nacional de Arqueologia (MNA), Carlos Fabião escreve um pequeno artigo exclusivamente sobre o Cerro do Cavaco. À semelhança de Manuel Maia, o autor reconhece a existência de taludes na parte superior da colina que podem sugerir a presença de uma fortificação. Acrescenta também que é possível observar, num ponto em concreto, o que podem ser os restos de uma construção em grandes blocos de pedra calcária, sem no entanto se referir à sua localização. Não publicando nenhum tipo de materiais em concreto, atesta a presença de material pré-romano (ânforas, cerâmica com decorações pintadas em bandas e cerâmica fina de engobe vermelho, bem como, materiais de influência ibero-púnica) e romano republicano (ânforas, cerâmica campaniense e de paredes finas), sendo grande parte deles importados e datáveis do séc. IV ou III a.C. ao séc. I a.C.. Para o autor, por se tratarem de materiais de

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superfície, uma vez que muitas das cerâmicas pré-romanas detetadas continuam a ser fabricadas durante todo o séc. II e I a.C.), não é possível determinar a data da fundação do sítio. Desta forma, também não é possível compreender, por agora, se existe ou não alguma relação entre o Cerro do Cavaco e o topónimo pré-latino Balsa, adotado pela cidade romana que floresceu a escassos 6 quilómetros para oriente dali. O que para Carlos Fabião parece ser evidente é que a larga maioria do espólio é contemporânea “do processo da conquista e consolidação do poder de Roma no extremo ocidente peninsular” (Fabião 2003: 78). Seguindo esta última pista, o autor associa ao sítio os seis denários de prata, de época republicana, com datações entre 121 e 46 a.C. publicados no já referido trabalho de Mª Luísa dos Santos (Santos 1972), bem como uma outra moeda, também de época republicana, cunhada em Ossonoba (Faro), publicada por António de Carvalho Poiares (Poiares 1998). A última referência concreta ao Cerro do cavaco, até à realização do presente trabalho, é da autoria de Patrícia Bargão e insere-se na sua tese de mestrado, dedicada às importações anfóricas do Mediterrâneo durante a época romana republicana. Neste trabalho são dados a conhecer mais 12 fragmentos de cerâmica pertencentes a ânforas (Greco itálicas, Dressel 1 e 1 de transição, Tripolitanas Antigas e Mañá C2A). Além destes, são referidos mais 21 fragmentos que se encontram depositados na UNIARQ e no MNA, desconhecendo-se se coincidem com os referidos por Ana M. Arruda e Rui de Almeida (Arruda & Almeida 1999) ou se pertencem a um outro conjunto. Segundo P. Bargão a cronologia de ocupação do sítio poderá ser balizada entre a segunda metade/finais do século II a.C. e o terceiro quartel do séc. I a.C. (Bargão 2006). Além das referências anteriormente apresentadas, merecem menção alguns trabalhos como o de Jeanette Nolen (1994), sobre as cerâmicas e vidros recolhidos na cidade de Balsa, o de Catarina Viegas (2009), que estuda o povoamento e economia do Algarve central e oriental durante o período romano ou o de Luís Luís (2003), sobre um conjunto de ânforas de época republicana encontradas nas proximidades de Mértola. Embora não publicando dados novos, estes estudos fazem referências ao Cerro do Cavaco, devendo portando ser consultados. Por fim, refira-se que o arqueossítio do Cerro do Cavaco conheceu no ano de 2001, VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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impulsionada por Manuel Maia e Pedro Barros, a abertura de um processo de classificação que viria a caducar oito anos mais tarde, com a introdução da lei nº 309 de 2009. 3. A PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA DE SUPERFÍCIE

Os trabalhos de prospeção arqueológica de superfície possuem hoje em dia um importante papel no processo de investigação arqueológica, podendo situar-se a par da escavação ou da prospeção geofísica, de quem não são um substituto, mas sim um complemento. Apesar de já anteriormente praticada, é a partir da década de 70, com o desenvolvimento da Nova Arqueologia e dos estudos de Arqueologia Espacial, que a prospeção arqueológica de superfície ganha importância. A crescente tentativa de reconstrução de padrões ou modelos regionais de povoamento faz com que este tipo de trabalhos arqueológicos, não destrutivos, conheça um grande desenvolvimento metodológico, ao ponto de fazer deles o cerne de muitas investigações arqueológicas (Carvalho 2007). Muito resumidamente, pode definir-se como prospeção arqueológica de superfície, o ato de procurar no terreno, sem recurso a quaisquer instrumentos, evidências de atividade antrópica, de acordo com uma estratégia metodológica préestabelecida. Baseando-se no pressuposto da relação direta entre os vestígios à superfície e a existência de contextos arqueológicos soterrados, a prospeção permite uma caracterização, ainda que relativa, de determinados locais ou regiões (Silva 2002). Além deste fator os trabalhos desta natureza possibilitam o estudo de grandes áreas, de uma forma barata e rápida (Renfrew & Bahn 1993:68). A realização de uma boa prospeção arqueológica de superfície requer a execução de determinados trabalhos prévios e preparatórios. Inserem-se nesta fase: a escolha e delimitação da área e/ou período cronológico a estudar; a definição dos objetivos; a recolha de bibliografia, cartografia e informações orais; a análise toponímica; ou os trabalhos de preparação do terreno, entre outros. Só depois de concluído este trabalho se deve passar à escolha da metodologia de prospecção a adotar. 716

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Para a escolha da metodologia, depois de bem definido o conceito de sítio, deve ser ponderada a escala da prospeção. Conhecem-se a macro-escala, que estuda uma circunscrição administrativa ou um horizonte cultural, relacionando vários sítios entre si; a meso-escala, que se detém sobre um sítio arqueológico, relacionando-o com a sua área de influência; e a micro-escala (ou intra-sítio), que tenta reconstruir a estruturação interna de uma estação arqueológica, além do seu período de ocupação ou influência cultural. Depois de definida a escala, deve passar-se para a escolha do tipo de cobertura, que se refere às zonas que vão efetivamente ser prospetadas. A cobertura pode ser total ou parcial, sendo esta última também designada de prospeção por amostragem, podendo ser direcionada ou aleatória. O próximo passo é a definição do tipo de recolha de materiais que se vai fazer. A recolha pode ser seletiva, quando são recolhidos apenas alguns dos materiais arqueológicos visíveis à superfície, geralmente os passíveis de classificação, ou integral, quando se recolhem todos os materiais. A aplicação no terreno deste último tipo de recolha é indissociável de um bom sistema de localização dos materiais. Seguidamente, há que definir a intensidade da prospeção que, segundo a maior parte dos autores, é o fator que melhor distingue os diferentes tipos de prospeção. Entende-se por intensidade, a distância que separa os prospetores nas batidas do terreno, sendo mais elevada quanto mais próximos estes se encontrarem. Requisito comum a todas as variantes de prospeção é o uso de um bom método de registo dos vestígios, sendo geralmente usadas fichas, desenhos, fotografias e material de localização geográfica. Culminado o processo acima referido, cuja ponderação acerca dos vários aspetos estará, irremediavelmente, dependente dos recursos económicos e humanos disponíveis para o projeto, julgamos encontrarem-se reunidas as condições para que se proceda aos trabalhos de prospeção do terreno.

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4. METODOLOGIAS APLICADAS 4.1. TRABALHOS PRÉVIOS À PROSPEÇÃO 4.1.1. DELIMITAÇÃO DA ÁREA EM ESTUDO

A delimitação da área a intervencionar assumiu-se como a primeira tarefa da presente investigação. Embora, logo desde as primeiras ideias de projeto, tenha ficado definido que o sítio arqueológico do Cerro do Cavaco seria o objeto deste estudo, tornou-se necessária uma definição clara dos seus limites, para que, à luz dos recursos disponíveis, se pudessem definir os objetivos e a metodologia a aplicar nas prospeções de campo. Partindo de um conceito de sítio que não vai além da área ocupada pelos vestígios à superfície, efetuou-se uma primeira deslocação ao local com o intuito de o delimitar e de avaliar o estado da superfície do terreno. O processo de delimitação foi feito com base no método proposto por Gonzalo Ruiz Zapatero e Victor Fernández Martínez (1993: 94), tendo resultado na obtenção de um perímetro de cerca de 1080 m. (7,78 ha.). Dentro desta área foi delimitada a zona a integrar no levantamento topográfico (c. 2,22 ha). Relativamente ao estado da superfície do terreno, verificou-se que esta se encontrava limpa de vegetação, à exceção da metade inferior da encosta este, possuindo por essa razão ótimas condições de visibilidade. 4.1.2. DEFINIÇÃO DOS OBJETIVOS

Com plena consciência da relatividade dos dados fornecidos pelos materiais de superfície, pretendemos alargar o estado do conhecimento sobre as cronologias de ocupação e estruturação interna do sítio, usando técnicas não destrutivas. Além deste objectivo, é nossa intenção avaliar o grau de aplicabilidade da prospecção em quadrícula, em sítios com as características do cerro do Cavaco. Por último, pretendemos que o trabalho assuma um caráter preventivo, permitindo, através do registo, a salvaguarda dos vestígios observáveis à superfície. 4.1.3. RECOLHA BIBLIOGRÁFICA, CARTOGRÁFICA E DE INFORMAÇÕES ORAIS

A criação de um dossier onde esteja reunida toda a documentação existente sobre o sítio ou região, bem como, às problemáticas a eles associadas, torna-se numa 718

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base de trabalho indispensável à optimização dos recursos existentes. Para o caso do Cerro do Cavaco, além da reunião da bibliografia referente ao local, foram também compilados alguns trabalhos relacionados com as metodologias empregues na prospecção de superfície. Ao nível da cartografia, reuniram-se as Cartas Militares (1:25.000) e a Carta Geológica de Portugal (1:1.000.000), bem como, ortofotomapas e fotografias aéreas. Foi também dada atenção às informações orais, nomeadamente entre investigadores que conhecem o sítio, proprietários do terreno e pastores. 4.1.4. REUNIÃO DE MATERIAIS PROVENIENTES DE OUTRAS RECOLHAS DE SUPERFÍCIE

Durante a realização do presente trabalho, várias foram as notícias de que fomos tendo conta acerca de materiais provenientes do Cerro do Cavaco. Alguns publicados, outros por publicar, outros ainda cujo paradeiro se perdeu, partilham uma característica em comum – o facto de terem sido recolhidos sem metodologia, em meras visitas ao local. Numa tentativa de evitar a dispersão do espólio, surgiu a intenção de reunir o maior número de materiais, de modo a torná-los acessíveis num único espaço. Em relação aos materiais publicados, no caso dos numismas, por pertencerem a particulares (Poiares 1998; Santos 1972), e no caso das cerâmicas, por se encontrarem devidamente acondicionadas, no Museu Nacional de Arqueologia, na UNIARQ (Arruda & Almeida 1999; Bargão 2006) e no Museu da Lucerna, em Castro Verde (Maia 1978; 1987), não foram encetadas diligências no sentido de os reunir em Tavira. No que toca aos materiais não publicados, detetámos nas reservas do Museu Municipal de Tavira um saco com 6 fragmentos cerâmicos, ali depositado por Manuel Maia. Este, após solicitação, prontamente os colocou à nossa disposição. O segundo e mais numeroso conjunto de materiais que integrámos na colecção foi-nos cedido por um particular, o Sr. Florian Fuhrmann (21 fragmentos).

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4.1.5. LEVANTAMENTO TOPOGRÁFICO DE PORMENOR

Tal como em muitos outros aspetos, os recursos disponíveis e afetos ao projeto acabaram por condicionar a área coberta e o grau de pormenor empregues no levantamento, tendo sido coberta apenas a metade superior da colina, o que equivaleu a uma área de cerca de 2.22 ha. Os trabalhos de campo decorreram durante um só dia e foram realizados pelos doutorandos Célia Gonçalves e João Cascalheira, tendo sido coordenados pelo signatário. Os referidos técnicos são membros do Núcleo de Arqueologia e Paleoecologia (NAP) da Universidade do Algarve (UALG) e disponibilizaram-se voluntariamente para a realização do trabalho. Os equipamentos utilizados encontram-se afetos ao projeto de reequipamento do Laboratório de Arqueologia do NAP, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e liderado por Nuno Bicho. Mais concretamente, falamos de uma estação total (SOKKIA SET3-30R) e de um computador portátil (ASUS 1001-PXD), ligados entre si através do programa EDMWin©. Esta solução permite uma visualização primária e em tempo real dos dados do levantamento, permitindo a realização, ainda no terreno, dos ajustes necessários. Numa primeira fase dos trabalhos procedeu-se à identificação dos eixos norte-sul e este-oeste, de modo a apoiar a marcação da quadriculagem para as ações de prospeção. De seguida foi efetuado o levantamento micro-topográfico da área em estudo, dando particular atenção às linhas de talude e declives associados, tendo também sido georreferenciadas todas as Unidades Arqueológicas visíveis á superfície (muros e outros vestígios), previamente localizadas em ações de prospeção preparatórias. A georreferenciação dos pontos foi feita através do sistema de coordenadas Hayford Gauss Militar (Datum Lisboa) e o “z” corresponde à distância vertical entre o ponto e o nível do mar (datum vertical: Marégrafo de Cascais). Toda a informação recolhida no campo foi depois sujeita a tratamento informático, sendo disponibilizada ao signatário em formato SHP para Arcgis© (levantamento) e em formato XLS (coordenadas X, Y e Z dos pontos).

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4.1.6 SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA (SIG)

As metodologias e técnicas de obtenção, tratamento e análise de dados arqueológicos, sofreram nas últimas quatro décadas um avanço qualitativo, tendo os SIG um papel primordial nesse campo (Gaffney 2000: 29). A sua utilização teve uma rápida aceitação, muito derivado da existência de correntes teóricas como a Nova Arqueologia e a Arqueologia da Paisagem, que valorizam a relação entre homem e meio ambiente (Silva 2002). Muito resumidamente, pode definir-se um SIG como sendo uma ferramenta informática que possibilita o tratamento de dados geográficos (armazenamento, manipulação, análise e apresentação), com o objetivo de resolver questões de natureza espacial, colocando à disposição do utilizador grandes quantidades de informação, acessíveis de forma rápida e intuitiva. Os dados que constituem o universo de representação de um SIG dividem-se em duas classes: matricial (o espaço é representado por uma matriz) e vetorial (o espaço é representado por elementos gráficos) (Osório & Salgado 2007; Silva & Silva 2005). O SIG criado para a presente investigação foi elaborado pelo signatário, com orientação e revisão final da Dr.ª Célia Gonçalves, utilizando o programa Arcgis© (versão 10). Para a cobertura da área recorremos a uma ligação via web à base de dados do IgeoE que possibilitou o acesso às Cartas Geográficas 1:500 000, 1:50 000, 1:20 000 e 1:10 000, em formato matricial. Também em formato matricial, já em base de dados própria, inseriram-se as Cartas Militares de Portugal, folhas nº 599 e 608, à escala 1:25 000, bem como a sua informação altimétrica em formato vetorial. Ainda neste último formato introduziu-se a Rede Hidrográfica e a Carta Litológica. Além da cartografia acima referida, o SIG é complementado pelo levantamento topográfico de pormenor e pelos resultados da prospeção em quadrícula, que contém uma base de dados associada ao SIG (número e peso dos fragmentos recolhidos, tipos de recipientes, densidades e percentagens). 4.1.7. METODOLOGIA DA PROSPEÇÃO

Em relação à escala e ao tipo de cobertura usados, por se tratar de uma prospeção intra-sítio, foi utilizada a micro-escala com cobertura total, onde toda a área em VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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Figura 3. Planta geral do sítio com localização das quadrículas prospetadas, linhas de taludes e UA’s identificadas.

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estudo foi prospetada, ainda que por metodologias diferentes. No que à metodologia de prospeção diz respeito, utilizaram-se duas variantes. Uma mais clássica, designada de prospeção em linha, onde foi feita uma recolha selectiva dos materiais cerâmicos (apenas os fragmentos passíveis de classificação), e outra, menos usual em Portugal, designada de prospeção em quadrícula (prospection en carroyage) (Fasham 1986), onde foram recolhidos todos os materiais cerâmicos visíveis à superfície, com medidas superiores a 1x1 cm. Trata-se de um método que se serve de uma malha quadriculada para localizar os achados, “onde o comprimento do lado do quadrado de base define o seu grau de intensidade.” (Silva 2002: 12). Em paralelo registou-se a ocorrência de outros materiais, como as faunas ou os metais, recolhendo-se em alguns casos uma amostra exemplificativa. Para a concretização da prospeção em quadrícula foram criados transeptos, daqui em diante designados de sectores, com 2 m de largura e de comprimento variável, com uma implantação destinada a caracterizar as distintas realidades observadas à superfície. Os sectores, à semelhança do proposto por David Mattingly (2000: 6), partem de um ponto central, localizado sensivelmente ao centro da colina e seguem na direção dos pontos cardeais, recebendo a designação da direção que seguem (p. ex. Sector Norte, Sector Este). Cada sector é subdividido em secções de 4 m de comprimento, originando assim a malha quadriculada. Cada quadrícula (4x2 m) foi identificada através de um sistema alfanumérico que se refere ao sector e à posição da quadrícula dentro deste (p. ex. Sector Norte, quadrícula 1=SN1) (Fig. 3). Em termos da intensidade aplicada na prospeção, à semelhança do verificado para a metodologia, utilizaram-se duas intensidades diferentes. Na prospeção em quadrícula a intensidade é máxima, uma vez que, dado o reduzido comprimento da base do transepto (2 m), os prospetores caminham, literalmente, ombroa-ombro. Para a prospeção em linha a intensidade foi inferior, localizando-se os prospetores a 4 metros de distância uns dos outros. Por fim, no que respeita ao registo dos dados, foram utilizadas fichas para descrição do sítio e das UA’s, tabelas para identificação das quadrículas prospetadas, etiquetas identificativas das amostras, caderno de campo, e fotografias.

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4.2. TRABALHOS DE PROSPEÇÃO 4.2.1. PROSPEÇÃO EM QUADRÍCULA

A prospeção em quadrícula decorreu durante 3 dias e contou com a participação de voluntários. A marcação das quadrículas foi feita com base nos eixos implantados para o efeito, aquando dos trabalhos de topografia. Com base nestas linhas, através do uso de fios de nylon, fitas métricas e bitolas com 2 m de comprimento, procedeu-se à marcação das quadrículas, por sector e em secções de 20 m cada (Figs. 3 e 6). No total foram prospetadas 95 quadrículas, repartidas por 5 sectores (sector norte – 22 quadrículas; sul – 23; este – 19; oeste – 21; noroeste – 10), perfazendo um total de 760 m². Seguidamente procedeu-se à prospeção propriamente dita, onde se recolhem todos os materiais cerâmicos com medidas superiores a 1x1 cm. Cada quadrícula foi prospetada por um número mínimo de 2 prospetores e máximo de 4, sendo o conjunto dos materiais recolhidos designado de amostra. Muito esporadicamente, surgiram no registo alguns materiais de cronologia moderna, como pequenos fragmentos de cerâmicas com vidrado melado ou faianças. Dada a insignificância da sua representação nos totais, depois de registada a sua presença, foram descartados ainda no terreno.

Figura 7. Unidade Arqueológica 4 (possível estruturade aparelho ciclópico).

4.2.2. PROSPEÇÃO EM LINHA

Os trabalhos de prospeção em linha foram realizados pelo signatário e decorreram durante 3 dias, tendo sido prospetados cerca de 5.56 ha. A aplicação deste método consiste na batida do terreno por meio de linhas de prospetores, colocados em intervalos regulares, que no nosso caso foram de 4m. No que respeita ao percurso percorrido pelo prospetor, dadas as caraterísticas da área, foi feito em movimentos circulares, de acordo com o traçado das curvas de nível, processando-se da base para o topo da colina. 4.2.3. REGISTO DE UNIDADES ARQUEOLÓGICAS

O registo de Unidades Arqueológicas, aqui entendidas como vestígios arqueológicos passíveis de identificação e individualização (estruturas ou outros vestígios), VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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foi efetuado pelo signatário. Para além da georreferenciação, realizada aquando do levantamento topográfico, as Unidades Arqueológicas identificadas foram alvo de uma análise pormenorizada. Cada Unidade Arqueológica foi registada através do preenchimento de uma ficha descritiva, que compreende a identificação, descrição e dimensões visíveis, sendo acompanhada de registo fotográfico. 4.3. ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS

No que respeita aos materiais recolhidos na prospeção em quadrícula, ainda no terreno foi feita uma primeira avaliação ao seu estado de modo a tentar prever o tipo de informação que estes poderiam vir a fornecer, criando-se as bases para elaboração das tabelas e fichas para o registo dos dados. Dadas as características gerais dos fragmentos cerâmicos recolhidos (de forma indeterminada e de pequenas dimensões, quase sempre rolados), optou-se por levar a cabo uma primeira divisão tipológica, pautada pelos tamanhos dos recipientes. Desta divisão resultaram 4 tipologias: os recipientes grandes, com espessuras de parede superiores a 10 mm (ou diâmetro superior a 30 cm), que poderão corresponder a vasilhas de transporte, armazenamento ou uso múltiplo, como as ânforas, os dolia ou os alguidares; os recipientes médios, com espessuras entre 6 e 10 mm, podendo estes corresponder a pequenas vasilhas de armazenamento, cozinha ou uso múltiplo, como os potes, as panelas ou os almofarizes; os recipientes pequenos, com espessuras inferiores a 6 mm, que correspondem às cerâmicas finas; e, por fim, os materiais de construção. Seguidamente procedeu-se à contagem e pesagem dos fragmentos por tipologias, efetuada com recurso a uma balança de cozinha com pesagem mínima de 10 gr., sendo este o valor mínimo atribuído aos conjuntos de peso inferior a este. Dentro de cada tipologia de recipientes foi também feita a separação por cores de pastas, onde se definiram, segundo a tabela de Munsell, 4 colorações diferentes: pastas claras (folhas 10YR e 2.5Y); pastas avermelhadas (10R e 2.5YR); pastas acastanhadas (5YR;7.5YR) e pastas de cozedura redutora. Para cada tipo de pasta foi anotado o número total de fragmentos, de bordos e de fundos. 724

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Os materiais de construção, embora ausentes das análises à cor das pastas, foram igualmente contabilizados e pesados, verificando-se desde logo uma subrepresentação deste tipo de material. Por esta razão os valores alcançados apenas surgem nas percentagens totais, descartando-se a sua presença nas análises às densidades de cerâmica, tipos de recipientes e cores de pastas. Nesta fase, os materiais considerados relevantes foram isolados, sendo os restantes devolvidos às quadrículas de origem. Após a conclusão da análise aos materiais, seguiu-se a informatização dos registos, com recurso ao software Excel 2010 da Microsoft©, tendo em vista ao seu tratamento quantitativo. Os primeiros valores que pretendemos obter foram os relacionados com as densidades de cerâmica por quadrícula, questão que desde logo se revelou bastante problemática: devemos concentrar-nos no peso, na contagem ou numa combinação entre ambas, para avaliarmos as densidades de materiais à superfície? A opção pela contagem levanta problemas ao nível do grau de fragmentação dos materiais. Por exemplo, se duas peças iguais se localizarem em zonas diferentes do mesmo sítio (uma junto a um caminho e outra junto ao tronco de uma árvore), apresentarão certamente graus de fragmentação diferentes. Nestas condições os valores de densidade apurados apresentarão diferenças, embora em ambas se encontre o mesmo número de indivíduos. O tamanho original e a resistência ao choque das peças são outros dos fatores que também influenciam os resultados de uma análise por contagem. Dadas as diferenças de tamanhos existentes entre uma ânfora e um prato, e sendo díspar o número de fragmentos resultantes da sua degradação, os resultados proporcionados por este tipo de abordagem revelam igualmente distorções da realidade. De igual forma, a opção pela análise através da pesagem, apresenta condicionantes ligadas com o tamanho original das peças. Se, por exemplo, 10 kg de fragmentos de ânfora se podem reportar a apenas um indivíduo, o mesmo não se poderá dizer para igual peso de fragmentos de pratos. Desta forma, à semelhança das análises por contagem, os valores alcançados através do peso levantam problemas ao nível da representatividade real dos materiais. Assim, à semelhança do verificado no trabalho de António Silva, realizado em Terlamonte, Covilhã, optámos por calcular os índices de densidades totais a partir VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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da aplicação de uma fórmula que combina os dois tipos de registo, permitindo “assim atenuar as distorções de ambos os indicadores” (Silva 2002: 43): Densₓ =

Pₓ X Qₓ 100

Porém, a nosso ver, as problemáticas anteriormente descritas, associadas aos diferentes métodos de cálculo de densidades, apenas se verificam para as análises onde se combinam materiais de tipologias diferentes. Desta forma, além da fórmula de cálculo anteriormente referida, utilizaram-se mais dois métodos de análise, curiosamente os dois a que antes apontámos defeitos, ou seja, a contagem e a pesagem. O método de análise pela contagem, teve, inevitavelmente, que ser aplicado nas análises feitas às cores de pastas, uma vez que não foram registados os respetivos pesos. Tal operação revelou-se inviável, uma vez que, dada a baixa quantidade de fragmentos com a mesma cor de pasta e pertencentes à mesma tipologia de recipientes, o registo da sua massa se torna impossível de aferir com recurso ao equipamento disponível. Em relação ao método de análise baseado no peso, julgamos que, a partir do momento em que analisamos materiais da mesma tipologia, a problemática do tamanho deixa de fazer sentido, revelando-se ser esta, a nosso ver, a metodologia que melhor caracteriza o grau de atividade antrópica de um sítio arqueológico. Concluído o processo de tratamento quantitativo, passou-se ao tratamento estatístico dos dados, igualmente através do programa Excel da Microsoft©, sendo estes posteriormente inseridos no SIG. Os valores obtidos para os vários tipos de análises foram distribuídos por 5 classes, obtidas através da aplicação do utilitário de classificação automática do Arcgis©, utilizando o método de quebras naturais (natural breaks ou Jenk’s optimization) “que minimiza a variação dentro de cada classe, posicionando os limites entre cada intervalo de valores onde se verificam os maiores aumentos de frequência” (Silva 2002). Decorrente da aplicação desta metodologia obtiveram-se os seguintes valores: Dens entre 0,9 e 231 – densidade muito baixa 726

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Dens entre 232 e 540 – densidade baixa Dens entre 541 e 952 – densidade média Dens entre 953 e 1711 – densidade alta Dens entre 1712 e 3366 – densidade muito alta Em relação aos materiais recolhidos na prospeção em linha, depois de lavados, foram alvo de um estudo preliminar através de comparações tipológicas, procurando-se nesta fase a obtenção de cronologias, remetendo-se para estudos futuros uma análise mais aprofundada. 5. RESULTADOS OBTIDOS 5.1. TOPOGRAFIA

A perceção que se tem no terreno, acerca da existência de alguns alinhamentos de taludes que circundam o topo da colina, veio a confirmar-se, conseguindo distinguir-se, através da observação do levantamento topográfico, 2 linhas de taludes com perímetros ovalados e concêntricos (Fig. 3). Com base nas características físicas das áreas que preenchem os perímetros das linhas de talude, e tendo em conta as evidências anteriormente referidas, foram definidas 3 áreas distintas, que designamos de superior, intermédia e inferior. A área superior é delimitada pela primeira linha de taludes e ocupa o topo da colina, possuindo superfície de tendência aplanada e solo bastante pedregoso. A linha que a define é clara em quase toda a sua extensão embora se encontre parcialmente truncada no extremo sudoeste pela construção de um caminho rural. Esta, dadas as suas caraterísticas topográficas, revela ser a posição com melhores características para implantação de construções, sendo ao mesmo tempo a área com melhores condições de defesa. Refira-se que esta, dada a grande quantidade de pedras à superfície, algumas delas facetadas ou lajeadas denotando a destruição de muros e pavimentos, parece-nos ser a área com menor potencial estratigráfico conservado. A área intermédia envolve a superior e é definida pela segunda linha de taludes. A norte e a noroeste é percetível uma área com superfície aplanada, encontrandose bem definida pela linha de taludes. Para nordeste os declives acentuam-se e a VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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linha de talude continua bem visível. Na vertente este surgem declives mais acentuados e a linha de talude deixa de ser percetível. Para sueste, sul e sudoeste, os declives voltam a suavizar sem que a definição da linha de taludes seja clara. Por fim, na vertente oeste os declives voltam a suavizar-se e a linha de talude é novamente bem visível. Na zona intermédia as áreas mais favoráveis ao assentamento de construções localizam-se a norte e a oeste, embora nas restantes áreas o grau de pendente não nos pareça impeditivo da edificação de construções. Nesta zona parecem conservar-se bons potenciais estratigráficos. A área inferior envolve a intermédia e estende-se até ao limite da área topografada, situando-se hipoteticamente fora da área construída do sítio. Nesta zona os declives são mais fortes, sendo nalgumas zonas, como a vertente este, impeditivos de urbanização. 5.2. UNIDADES ARQUEOLÓGICAS

Os trabalhos de prospeção resultaram na identificação de 9 Unidades Arqueológicas (UA), sendo classificadas como estruturas (1 a 7) ou como outros vestígios (8 e 9) (Figs. 3 e 7). Note-se que 7 das nove UA identificadas se situam em áreas afetadas pela construção de um caminho rural em terra batida, bem como pela realização de algumas terraplanagens, sendo essa a razão pela qual estas afloram à superfície. 5.3. MATERIAIS CERÂMICOS

Figura 6. Marcação da quadriculagem.

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A prospeção em quadrícula possibilitou a recolha de 4013 fragmentos cerâmicos que equivalem a um total de 64,600 kg. Deste conjunto foram isolados 53 fragmentos cerâmicos de cronologia pré-romana e romana, pertencentes a ânforas, cerâmica de mesa e comum, com vista à realização de estudos futuros, tendo sido depositados nas reservas do Museu Municipal de Tavira, conforme definido no PATA. Os restantes materiais, findado o processo de análise, foram devolvidos às quadrículas de proveniência. O mapa que obtivemos para a distribuição das densidades de cerâmica pelas quadrículas deixa perceber que os valores mais elevados se situam na área inferior,

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sendo também percetíveis algumas concentrações elevadas nas quadrículas localizadas junto às linhas de talude. No sector noroeste, localizado em posição algo afastada do topo da colina, as densidades são tendencialmente baixas (Fig. 3). No que toca à representatividade dos diferentes tipos de materiais, verifica-se que os recipientes grandes são os mais representados com 56,12% do total, seguindose os recipientes médios com 40,65%, os materiais de construção com 1,65% e os recipientes pequenos com 1,58%. Em relação à distribuição dos diferentes tipos de recipientes pelos sectores, para os recipientes grandes, verifica-se uma homogeneidade na distribuição, enquanto que os recipientes médios apresentam tendência diferente, concentrando-se nos sectores norte, este e sul, verificando-se igual tendência para os recipientes pequenos (Fig. 4). Comparando os diferentes sectores, pode ainda observar-se que o sector este é o que apresenta proporções de materiais mais equilibradas,

Figura 4. Densidades de cerâmica por tamanhos de recipientes. VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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Figura 5. Materiais cerâmicos provenientes do Cerro do Cavaco: Ânforas tipo Mañá Pascual A4, 1; CC.NN., 2; D de Pellicer, 3; Mañá C2, 4 e 5; Castro Marim 1, 6; Classe 67, 7; Greco-Itálicas; Classe 67,7; Greco-italicas, 8 e 9; Dressel 1, 10 e 11; e cerâmica campaniense tipo A, forma Lamboglia 5/7, 12; e tipo B, forma Lamboglia 6, 13. 730

chegando a possuir percentagens de recipientes pequenos iguais às dos médios, enquanto nos restantes sectores os recipientes grandes suplantam sempre e largamente os médios e os pequenos. Se analisarmos a distribuição dos tipos de recipientes pelas áreas definidas, vemos que a percentagem de recipientes grandes é superior em todas elas, ainda que menos vincada na área superior. No que toca às cores de pastas identificadas para o total dos materiais recolhidos, observa-se uma representatividade idêntica entre as pastas claras (41,67%) e as pastas avermelhadas (41,54%), seguindo-se as pastas acastanhadas (16,49%) e as cozeduras redutoras (2,09%). Se analisarmos as cores de pastas por tipos de recipientes, verificamos que os valores se distanciam um pouco, prevalecendo as pastas claras nos recipientes médios e pequenos, enquanto nos grandes se sobrepõem as pastas avermelhadas. Quanto às pastas acastanhadas e cozeduras redutoras, mantém sensivelmente as mesmas proporções, independentemente dos tipos de recipientes. No que aos materiais provenientes da prospeção em linha diz respeito, foram recolhidos um total de 125 fragmentos cerâmicos de cronologia pré-romana, romana e medieval, pertencentes a ânforas, cerâmica fina, opérculos, cerâmica comum, tégulas, pesos de tear e talhas estampilhadas de cronologia medieval islâmica. Embora o principal objetivo da realização de uma prospeção de recolha seletiva no Cerro do Cavaco tenha sido o de criar bases para estudos futuros, torna-se necessária uma caraterização geral dos mesmos, de forma a enquadrar cronológicoculturalmente os dados obtidos na prospeção em quadrícula. Desta forma, privilegiámos os dados relativos aos materiais anfóricos, por ser a categoria melhor estudada para o período cronológico em questão (II Idade do Ferro). De um modo geral, pode dizer-se que o conjunto das ânforas identificadas no Cerro do Cavaco se enquadra em produções que poderão ter decorrido entre os séculos IV ou III e o século I a.C., apresentando influências culturais ditas turdetanas, púnicas e romanas. As cronologias mais recuadas são fornecidas pelos exemplares de tradição pré-romana como o tipo D de Pellicer, com cronologias entre meados do século IV e finais do I a.C. (Pimenta et al. 2005), o tipo Mañá Pascual A4, com datações entre o século IV e III a.C. (Filipe 2010; Santos 2010), ou ainda pelo tipo CC.NN, da segunda metade do século II a.C. (Pimenta 2006). De tradição cla-

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ramente púnica, estão presentes as Mañá C2, datadas de entre a segunda metade do século II até ao último quartel do séc. I a. C. (Filipe 2010; Viegas 2009). Como primeiras formas ocidentais de inspiração romana, identificámos ânforas da Classe 67, com datações para a segunda metade do século I a.C. (Arruda et al. 2006), ou do tipo Castro Marim 1, datadas do período tardo-republicano (Viegas 2009). Por fim, igualmente associadas à presença romana, identificámos ânforas Greco-Itálicas, presentes nesta região sobretudo, na segunda metade do século II a.C., coexistindo neste período com as Dressel 1, também presentes no Cerro do Cavaco e cuja produção se estende até ao final do século I a.C. (Bargão 2006) (Fig. 5). Entre o conjunto de cerâmicas finas, da II Idade do Ferro, pode atestar-se a presença de cerâmica com linhas ou bandas pintadas, cinzenta, de tipo Kuass e de engobe vermelho. Para a época romana-republicana destaca-se a presença de cerâmica campaniense (Fig. 5), que aparece com alguma frequência no sítio, pertencendo aos tipos A e círculo da B, com datações entre o século II e o I a.C. ou seja, contemporâneas da conquista romana do sul da Península (Dias 2010; Luís 2003a). Ainda no que respeita ao campo das cerâmicas finas, apesar da referência à presença de cerâmica de paredes finas (Fabião 2003), não nos foi possível atribuir, com segurança, esta classificação a nenhum dos fragmentos recolhidos. Além destes materiais recolheram-se também alguns fragmentos de cerâmicas de armazenamento, de cozinha e de uso múltiplo, 1 fragmento de peso de tear, bem como 2 dos 3 fragmentos de tégula identificados. No que respeita aos materiais de cronologias mais recentes, recolheram-se os dois únicos fragmentos identificados de talha estampilhada e vidrada a verde, de época islâmica, registando-se também a presença, muito residual, de cerâmicas de vidrado melado e faianças. 5.4. OUTROS MATERIAIS

Além das cerâmicas foram identificados outros tipos de materiais. Dada a sua fraca representatividade optámos apenas por registar a sua presença, recolhendo uma pequena amostra exemplificativa. No que toca aos restos faunísticos, identificaram-se alguns ossos longos de mamíVII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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feros de médio porte, moluscos (ameijoa, ostra e vieira) e peixes. Os metais também estão presentes, tendo sido identificados alguns fragmentos de metal ferroso, pertencentes a objetos indeterminados, e restos de fundição. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A imponência e as formas desenhadas pelas linhas de talude existentes no Cerro do Cavaco já haviam suscitado comentários, da parte de Manuel Maia (1987) e Carlos Fabião (2003), no sentido de poderem ocultar algum tipo de estruturas. Os trabalho realizados vieram a confirmaram esta hipótese, pelo menos num troço de cerca de 70 m localizado na vertente oeste, na segunda linha de talude, entre as UA’s 1 e 3 (Fig. 3). Com base nesta pista, interpretamos esta porção da linha de talude como podendo corresponder a uma única estrutura que, dada a sua localização periférica em relação ao topo da colina e dadas as fracas densidades de materiais aí recuperadas, julgamos tratar-se de um muro delimitador da área construída do sítio, suposição que ganha sustento se analisarmos convenientemente a UA 8. Esta é composta por terras escuras com grande quantidade de cinzas, carvões e conchas, contendo cerâmica cinzenta da Idade do Ferro, de engobe vermelho, campaniense e ânforas do tipo Castro Marim 1, podendo portanto ser interpretada como lixeira. Uma vez que se situa numa zona muito próxima à face oeste (ou exterior) da UA 1, reforça a ideia de muro delimitador, uma vez que é comum a formação de lixeiras no exterior das muralhas. No que respeita à localização e configuração da primeira linha de taludes, assumindo que esta oculta estruturas, julgamos que poder tratar-se de uma plataforma superior, envolta pela inferior, ocupando lugar de destaque intra-sítio. Embora não lhe estando diretamente associadas, são visíveis 2 UA’s de tipo estrutura (6 e 7), localizadas no seu interior que, aparentemente possuindo orientações perpendiculares a esta, podem indiciar a existência de construções no seu interior. Além destas, foi também identificada uma outra UA (9), que corresponde a uma anormal concentração de pedras, localizada no extremo oeste desta plataforma, podendo ser entendida como o resultado da degradação de uma estrutura de grandes dimensões (Fig. 3). Assim, em termos de estruturação interna do sítio, podemos alvitrar tratar-se de um povoado em altura, provavelmente delimitado 732

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por uma estrutura contínua, localizada um pouco acima da zona de meia encosta, que envolve uma outra situada a cota superior. Pelo tipo de implantação em altura, em posição de controlo sobre o rio Séqua, zona estuarina, cidade de Tavira e acessos ao mar, poderemos ainda supor que a escolha daquele lugar obedeceu a preocupações defensivas e de controlo do território, nomeadamente a ligação entre o mar e o interior (Fig. 2). No que ao contributo dos resultados da prospeção em quadrícula diz respeito, verificámos que os mesmos se mostraram um pouco aquém do esperado. As reduzidas dimensões e grau de rolamento dos materiais, impeditivos de uma classificação formal, associados ao forte pendor das vertentes, condicionaram fortemente as interpretações acerca da estruturação interna do sítio. A topografia do terreno foi o fator que mais distorceu os resultados, chegando ao ponto de inviabilizar qualquer tipo de análise de dispersão de materiais. A forte inclinação das vertentes fez com que as maiores densidades de materiais se localizem nas zonas mais próximas ao sopé da colina, não significando que as áreas de maior atividade antrópica aí se situem, mas sim que os materiais aí existentes são fruto de escorrências. Junto das linhas de talude é também visível um aumento das densidades que, a nosso ver, se deve à resistência à gravidade provocada pela micro-topografia do próprio talude. A única área a salvo do pendor das vertentes é a superior, dada a sua tendência aplanada. No entanto, visto se tratar da área central do sítio e por ser a zona mais visitada, foi sendo alvo de sucessivas recolhas não autorizadas, o que contribuiu para adulteração dos resultados. Desta forma, julgamos imprescindível, ainda em fase prévia à escolha da metodologia de prospeção, uma ponderação cuidada entre as caraterísticas do terreno e os factores que podem distorcer os resultados de uma prospeção de superfície. Colocado de parte deve ser o uso da prospeção em quadrícula em locais com vertentes muito inclinadas. Embora as condicionantes referidas exerçam o seu peso nos resultados que obtivemos, é possível tecer algumas considerações acerca dos mesmos. O primeiro dado que salta à vista é a sub-representação de materiais de construção. Em toda a prospeção efetuada no Cerro do Cavaco, apenas se detetaram 3 fragmentos de tégula, aos quais se acrescentam cerca de 2,5 kg de fragmentos de telhas de canudo, de aspeto moderno. Tendo em conta que uma telha de canudo pesa em VII ENCUENTRO DE ARQUEOLOGÍA DEL SUROESTE PENINSULAR - PROSPEÇÃO ARQUEOLÓGICA INTRA-SÍTIO: O CERRO DO CAVACO E A II IDADE DO FERRO EM TAVIRA, PORTUGAL -CELSO CANDEIAS

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média cerca de 1,5 kg, não temos em toda a amostra o equivalente a duas telhas. Igualmente de destacar é o facto de não se ter detetado nenhum fragmento de argamassas de cal. Estas evidências podem indiciar a presença de construções em materiais perecíveis, mostrando também que a verdadeira introdução das construções ditas romanas, nesta região da Península, só se efetiva em plena época imperial, onde os sítios arqueológicos passam a apresentar grandes quantidades de materiais de construção. Em relação à maior representatividade de recipientes grandes, pensamos que pode refletir a necessidade de garantir o armazenamento de grandes quantidades de alimentos, enquanto que a quantidade considerável de recipientes médios se poderia destinar à preparação dos mesmos. No que toca aos recipientes pequenos, que correspondem às cerâmicas finas, dada a sua fraca representação, não é possível tirar grandes conclusões. No entanto, é possível afirmar que elas existem no Cerro do Cavaco e que algumas delas apresentam padrões de elevada qualidade, podendo indiciar a presença de indivíduos destacados na sociedade. Em relação às cores das pastas, verifica-se que as percentagens entre pastas claras e pastas avermelhadas são idênticas, o que mostra não haver uma região preferencial de abastecimento. Nota-se sim, analisando as cores de pastas presentes nos vários tipos de recipientes, uma supremacia das pastas avermelhadas para os recipientes grandes, muito derivado das ânforas de importação itálica e norte africana, ao passo que, para os recipientes médios e pequenos, as cores dominantes são as claras. Este facto poderá indiciar a existência de diferentes regiões preferenciais de abastecimento, consoante o tipo de recipientes procurados. Em relação às cronologias de ocupação do sítio, se ficou comprovada a presença romana republicana (II-I a.C.), contemporânea do processo de conquista, atestada pelas ânforas greco-itálicas e Dressel 1, bem como de cerâmicas campanienses, que cessou antes da entrada na época imperial, como o prova a ausência de cerâmica tipo terra sigillata, o mesmo não se poderá dizer acerca da existência, ou não, de uma ocupação anterior a esta. Apesar de existirem fragmentos cerâmicos no Cerro do Cavaco que possam remontar ao século IV ou III a.C., na maior parte dos casos, os mesmos são produzidos até ao século I a.C., impedindo assim esta 734

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confirmação. No entanto, a quantidade a qualidade e a diversidade de materiais pré-romanos existentes no Cerro do Cavaco, levam-nos a achar plausível a hipótese de uma ocupação anterior. No que toca à relação existente entre o sítio e a cidade de Tavira, dado que os poucos dados publicados apontam para um abandono da cidade no decurso do séc. III a.C. (Maia 2006), torna-se plausível, a partir desse momento, uma transferência do povoado para o Cerro do Cavaco, onde a maioria dos materiais parece centrar-se nos séculos II e I a.C.. Por fim, resta-nos referir que só a realização de escavações arqueológicas no local poderá refutar ou confirmar as hipóteses aqui apresentadas. BIBLIOGRAFIA

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