Casos e Descasos da Terceirização na Administração Pública: Apontamentos, Percepções e Reflexões em Órgãos de Minas Gerais

June 2, 2017 | Autor: R. Rodrigues da S... | Categoria: Outsourcing, Gestão Pública, Terceirização
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Casos e Descasos da Terceirização na Administração Pública: Apontamentos, Percepções e Reflexões em Órgãos de Minas Gerais Autoria: Ronaldo André Rodrigues da Silva, Regina Coelho de Souza RESUMO Os processos administrativos na gestão pública sofreram radicais transformações na última década em função das mudanças na gestão de empresas de maneira global. Novas formas de gestão e novas tecnologias gerenciais transformaram o mundo do trabalho e propuseram novos desafios às empresas. Na gestão pública brasileira esta transformação também se encontra presente, seja na legislação ou em sua estrutura administrativa. Este trabalho busca uma análise embrionária dos processos de terceirização, sua aplicação às empresas públicas e privadas e sua especificidade quando implementado no setor público. Assim, busca-se verificar a pertinência e as ações desenvolvidas em torno dos processos de terceirização, avaliando os pontos positivos e negativos dessa tecnologia de gestão. O trabalho foi desenvolvido a partir de fontes escritas acerca da análise dos documentos e coleta e análise de dados sendo escolhidos como amostra 03 (três) órgãos estatais de Minas Gerais. Ao final as reflexões realizadas se pautam por avaliar as atividades terceirizadas no setor público, sua importância para uma adequada gestão da “máquina” administrativa, mas também os problemas e incorreções apresentados na utilização da terceirização como forma de gestão. 1. APRESENTAÇÃO As novas tecnologias e o aumento da concorrência aparecem como fatores relevantes para as empresas se desenvolverem a partir da necessidade de modernização. Além disso, as organizações necessitam construir estratégias agressivas que propiciem a perpetuação de um sistema de operação com o máximo de qualidade e o mínimo de despesas e custos. As alterações do processo produtivo, o desenvolvimento dos sistemas de trabalho, as novas tecnologias, o aumento da concorrência são fatores relevantes para as empresas atravessarem um processo de modernização radical. Em função desses fatores, as políticas de privatização ocorridas no sistema produtivo brasileiro e incentivadas nos últimos anos definem um novo modelo organizacional que busca otimizar os processos produtivos. Este modelo surge como padrão de competitividade e de oportunidades, em que o ‘novo’ sistema de trabalho apregoa conquistas e melhorias adquiridas ao corpo profissional. É importante ressaltar que, na prática, assiste-se muitas vezes a um atrofiamento das possibilidades de desenvolvimento do corpo profissional, bem como a garantia dos direitos assegurados pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT. Esse atrofiamento ocorre, em grande parte, pela transferência realizada pelas mega corporações, de uma gama de pequenos serviços à mão de obra terceirizada. Um dos modelos organizacionais definido por esta nova conjuntura que busca maximizar os resultados foi definido tecnicamente como outsourcing que aparece como padrão de competitividade e de ampliação de oportunidades. Em geral, as grandes corporações definiram-no para as conquistas de mercado e determinaram sua disseminação junto às pequenas empresas que lhes eram vinculadas. Tal modelo intensificou uma nova configuração organizacional e passou a vigorar no cenário global determinando o surgimento das redes organizacionais. Contudo, divergências e incompatibilidades no campo das relações entre as organizações e relações de trabalho são visíveis ou veladas e se tornam freqüentes no relacionamento entre contratantes (grandes empresas) e contratados (pequenas empresas), bem como entre os profissionais das grandes empresas e sua incorporação nessa nova

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configuração produtiva (MARINHO e AMATONETO, 1995; AMATO NETO, 1995, 2000; RODRIGUES DA SILVA, 2003). Extremamente difundida no setor privado, a prática da terceirização chegou ao Brasil na década de 1950, tendo sido objeto de sucessivas regulações. Na administração pública, teve seu marco no Decreto-Lei nº 200/67 com o qual implementou-se uma decisiva reforma administrativa no âmbito empresarial/organizacional. Esse decreto passou a designar uma diversidade de práticas profissionais que requerem uma execução indireta de serviços. Assim, a administração pública passou, mediante as concessões dispostas na legislação supracitada, a contratar serviços e mão-de-obra de outras empresas para atender a seus interesses. Dessa maneira, o poder público pôde contratar diretamente os servidores de que necessitava, e esses passaram a colaborar, transitoriamente, para o exercício de funções públicas. Por toda a complexificação que passou a evocar na esfera do setor público, a terceirização revela-se como tema de extrema relevância no contexto da gestão e do funcionamento das instituições estatais. Nota-se que no setor público brasileiro é crescente a contratação de mão-de-obra terceirizada. Este se torna um fato preocupante, pois se sabe que, para a eficiência de certas atividades, não se pode apenas por em relevância o número de executores necessários à sua realização, mas também a capacitação e qualificação dos mesmos para desempenhá-las. Torna-se interessante avaliar esses pontos positivos e negativos da terceirização visto que esses são questionamentos que atravessam continuamente o âmbito das organizações do setor público. Procura-se, também, avaliar os efeitos gerados pela contratação de servidores terceirizados, levando em consideração o envolvimento com a empresa contratante e com a instituição onde prestam suas atividades. Para tanto, é importante refletir acerca da percepção de todo o corpo organizacional quanto à parceria que envolve o processo de terceirização. 2. CONSIDERAÇÕES À TERCEIRIZAÇÃO A terceirização de serviços não integra um processo novo. A partir do período pós Segunda Guerra Mundial, na década de 60-70, se tornou uma arma estratégica para o mercado industrial mundial. Com o advento da guerra fria, o fenômeno do desenvolvimento acelerado da indústria e conseqüente expansão das organizações norte-americanas em todo o globo, motivou sua reformulação estratégica, a partir de novos métodos de trabalho, visando a conquista de novos mercados. Este cenário de disputas e concorrência atuou como catalisador de muitos processos ainda em uso no mundo das organizações e contribuiu para a evolução do conhecimento e a intensificação de estudos de escolas voltadas para a administração de empresas. Conseqüentemente, inicia-se uma expansão sem tamanho ou comparação na história mundial, levando as empresas a buscarem o lucro através da racionalidade científica e não a intuitiva, que imperava até então. Através do avanço expressivo da tecnologia e da produtividade/competitividade da economia japonesa, os países do continente americano, inclusive o Brasil, se viram impulsionados a agilizar suas transformações no campo da produção e da tecnologia de bens e serviços. Assim, as empresas desses países passaram gradualmente a determinar um comportamento competitivo, cujos métodos e gestão da produção baseavam-se em processos de produção ‘enxutos’ e nas filosofias de qualidade total e de produção just-in-time. (DRUCK, 1999). Para acompanhar as mudanças organizacionais, as empresas adotam estratégias voltadas à descentralização produtiva, ou seja, passam a focalizar os esforços nas atividadesfim (core business). Assim, surgem práticas inovadoras que, aos poucos, determinam um certo tipo de estrutura organizacional no qual se privilegia a produção em massa e a integração vertical das empresas. Neste processo, as empresas tentam reunir em uma mesma unidade, o máximo de atividades produtivas e de apoio possíveis (CASTRO et alli, 2001).

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Através dessas mudanças, a terceirização aparece como uma alternativa a qual as empresas desenvolvem uma relação de parceria. Nesta, as atividades se desenvolvem em conjunto, visando o alcance de fins comuns, apesar dos interesses distintos. Nesse contexto, um processo diferenciado surge no qual as empresas buscam diferenciar-se positivamente no mercado através da contratação de mão-de-obra qualificada por um custo mínimo. Essa distinção aparece motivada por movimentos estruturais de mercado, pela necessidade de competitividade, por demandas externas e reestruturação interna. Percebe-se assim, que a terceirização pré-determina a necessidade de alterações nos princípios de condução das atividades da instituição. Isto porque, em um cenário global, os serviços não são mais executados única e exclusivamente sob a ótica dos proprietários da empresa cuja realização é firmada sob a forma de contrato no qual se definem os compromissos das partes envolvidas – contratante e contratado. Assim, o contratado se dispõe a gerar produtos/serviços para a contratante, surgindo deste novo sistema de relacionamento, a parceria. Essa pressupõe a co-responsabilidade no resultado final do processo. Por envolver uma gama de fatores que complexificaram a esfera das relações organizacionais e das relações de trabalho, o conceito de terceirização continuamente ganha novas acepções. Gradualmente o conceito alcançou maior complexidade à medida que surgiam várias justificativas para o fortalecimento da racionalização empresarial, ligada à diferenciação positiva da organização no mercado e favorável à implementação da terceirização. Os aportes dessa racionalização se constituem em uma estratégia de focalização que consiste em uma tendência chave ao deslocamento do foco das organizações. A utilização e gerência das informações, sem abandonar o maior objetivo, o conhecimento torna-se ponto central. Conclui-se assim, que atividades não centrais, ou seja, aquelas que não constituem o core business organizacional, em princípio, podem ser terceirizadas. Para tal, uma mudança na cultura organizacional, no entendimento dos processos administrativos e produtivos e uma conscientização dos corpos gerencial e produtivos são pontos críticos de sucesso na terceirização empresarial. (HANORO et all., 1998; MARTINS, 2000). Em sua formulação conceitual, um fenômeno crucial no contexto das organizações mundializadas e nos processos de terceirização pode ser percebido: a redução do tamanho físico e a complexificação das atividades. As empresas se tornam mais flexíveis e ágeis, atentando-se ao fato de as organizações se tornarem mais enxutas. Além de realizarem um número menor de processos, possibilitam a redução de custos e melhor controle de desempenho e qualidade. Esses últimos são elementos fundamentais para o enfrentamento da concorrência no mercado atual. Podendo-se somar todas as contribuições conceituais à noção de outsourcing, observa-se que a terceirização de serviços tornou-se um sistema de ações pelo qual se busca alterar, de forma marcante, a estrutura das organizações. Esse sistema introduz nas mesmas uma nova mentalidade que, apesar de não ser um processo novo, passou a acarretar mudanças na organização com significativos efeitos, otimizadores e limitadores. 2.1. A Terceirização no Brasil No Brasil, o processo de terceirização se iniciou com a instalação das multinacionais, através das técnicas de gestão trazidas principalmente pelas montadoras de veículos, que se mantiveram isoladas, diferenciando-as das organizações nacionais. Posteriormente, a partir de uma política competitiva direcionada aos consumidores, da exigência de aprimoramento da qualidade dos produtos e da eficiência nos serviços de baixo custo, o Brasil passou a priorizar a questão da racionalização econômica como via de maior crescimento estratégico no mercado nacional e mundial. Aos poucos, a terceirização começou a ser implantada em atividades consideradas extremamente periféricas na produção com a limpeza, conservação e segurança patrimonial. Mais tarde atingiu as chamadas atividades-meio, tais como vigilância,

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transportes, informática, reprografia, telecomunicações, manutenção de prédios e equipamentos, entre outras. A partir da década de 90, com a abertura do mercado nacional e atuando em uma economia globalizada, o empresariado brasileiro se viu diante da necessidade de uma maior racionalidade de recursos, onde a praticidade e a flexibilidade se atrelassem à qualidade, ao preço e à competitividade. Esse resultado otimizador não leva em conta somente a questão da contenção de custos, mas uma produção com qualidade flexiva, aliada a uma maior agilidade. As parcerias estratégicas, como meio para o alcance desses resultados, têm sido o caminho escolhido. No ano de 1996, a prática do outsourcing representava um significativo crescimento no Brasil, gerando, assim, impactos econômicos, políticos, tecnológicos e sócioculturais. Do ponto de vista econômico, o resultado desse impacto foi muito favorável para as organizações brasileiras. Isso se deu pelo fato da organização terceirizada ser beneficiada com abatimentos de impostos na utilização das despesas com terceiros, ao trocar gastos de capital por gastos de operações. Além disso, ela impede a depreciação de seus artigos de bens de capital, objetivos estes próprios da economia capitalista. Assim, pode-se reduzir os custos e priorizar a qualidade, mediante força contratual junto às organizações contratadas, para que cumpram prazos e se mantenham atualizadas. Sabe-se que a redução de custos por parte das organizações tem causado um impacto evidente. Contudo, o impacto social com relação à demissão de funcionários e ou possíveis transferências para a organização contratante, tornouse uma prática comum. Do ponto de vista tecnológico, as organizações mudaram seu foco, exigindo uma contínua promoção do aumento da capacitação interna no tratamento das tarefas estratégicas. Na opinião de Braga (1998), a terceirização permite a transferência de know-how e conhecimentos específicos da contratante à contratada e vice-versa. Tal determinação competitiva faz com que as empresas apliquem seleções e triagens sucessivas aos funcionários, frente aos programas de qualidade. Como conseqüência dessa dinâmica, o desemprego colocou-se como tema incontornável em uma abordagem sobre terceirização. Há um enxugamento de um certo número de benefícios do trabalhador, como assistência à saúde, alimentação, etc., que só é freado pela atuação de sindicatos fortes. No entanto, há aqueles que vêm tais conseqüências como partes de um processo de mudança que está inserido no bojo das transformações globalizantes. A terceirização teria feito surgir um novo paradigma produtivo. Esse novo modelo seria “menos mecanicista – menos cartesiano, menos burocrático, menos fragmentado, mais participativo, mais questionador; menos orgânico ou atitudinal e mais holístico – valorização do ser humano, da diversidade, da informação, da flexibilidade e da inovação”. (HANORO et all., 1998: 14). Tal mudança mostra-se inevitável no âmbito das organizações. Por tanto, cabe aos gestores organizacionais se prepararem para assumirem suas novas missões. Uma das primeiras formas dessa habilitação é o conhecimento e a revisão constante das políticas e técnicas que suas organizações adotam e sua relação com o cenário global e local. Investigar, portanto, as vantagens e desvantagens da prática da terceirização, torna-se ponto imprescindível a esse empreendimento. 2.2. A Terceirização no Setor Privado A terceirização, bastante utilizada no âmbito da iniciativa privada, aparece hoje basicamente como contratação, por determinada empresa, de serviços de terceiros para o desempenho das atividades-meio. Por isto, a terceirização se mostra inseparável da idéia de parceria. As principais vantagens estão na especialização da empresa contratada e na possibilidade da empresa tomadora em concentrar-se na execução das atividades-fim. Outras apreciações, como a diminuição dos encargos trabalhistas e previdenciários e as conseqüentes

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reduções do preço do produto ou serviço e a simplificação da estrutura empresarial são consideradas. Assim, no setor privado a terceirização assume, de maneira geral, a forma de empreitada de obra e de serviço, de locação de serviços por meio de interposta pessoa (fornecimento de mão-de-obra) e de franquia. Para PRADO (apud DI PIETRO, 2000), ela supõe três estágios: dumbsouring, smartsourcing e o avançado. Permeando os três estágios, o autor aponta três modalidades: a tradicional, a de risco e a de parceria. Na terceirização tradicional, o preço se torna decisivo para a transferência, o que pode permitir comportamentos dissimulados para preservar interesses individuais, uso de mão-deobra não especializada, resultados técnicos insatisfatórios, exploração da mão-de-obra, reclamatória, baixa produtividade, entre outras interferências dos contratantes na atividade terceirizada para obter um mínimo de qualidade na produção. Segundo DI PIETRO (2000), dentre os riscos da terceirização pode-se citar a transferência de obrigações trabalhistas e a intermediação de atividades que visam mascarar a relação de emprego. Os principais vícios percebidos nesse tipo de terceirização contemplam a contratação de mão-de-obra temporária por período superior ao permitido por lei, para realizar finalidades não permitidas (por não haver capacitação técnica para administrá-la e supervisioná-la, limitando-se ao simples aluguel do registro trabalhista à contratante). Finalmente, na terceirização como parceria, ocorre a transferência da execução das atividades acessórias a parceiros especializados, visando tornar a empresa mais ágil e competitiva em sua atividade principal. Esta modalidade está presente no estágio avançado. Pode-se observar que predomina o interesse coletivo, enquanto nas duas outras formas o interesse individual é privilegiado o que leva a resultados imediatistas, sem convergência de interesses. Independentemente das modalidades escolhidas para se fazer uso da terceirização, deve-se considerar importantes cuidados necessários às organizações na obtenção de uma terceirização otimizadora (PAGNONCELLI, 1999). Mesmo atentando-se aos cuidados sugeridos pelo autor, os riscos de insucesso rondam toda e qualquer iniciativa dos gestores do campo empresarial privado, mesmo que só agora as análises sobre os impactos da terceirização nesse contexto estejam ganhando contornos mais claros. Mas quando se trata da implantação da terceirização no setor público, questões mais contundentes são lançadas aos gestores públicos, aos funcionários e aos demais grupos que são afetados e estão inseridos nesse âmbito. Faz-se necessário observá-las melhor. Assim, a construção de parcerias organizacionais para uma conseqüente formação das redes empresariais e processo de cooperação e integração das empresas deve ser acompanhada de níveis de regulação adequados das atividades e de políticas e ações a serem adotadas pelas partes que se tornam fator relevante para a determinação e manutenção das relações de parceria, além da maior capacidade de competitividade e adequação aos objetivos próprios e de mercado. (RODRIGUES DA SILVA, 2003). 2.3. A terceirização no Setor Público No âmbito do setor público, a terceirização suscita debates intermináveis, especialmente quando sua aplicabilidade entra em conflito com os interesses e garantias dispostas nos dispositivos legais reguladores da atividade profissional dos trabalhadores públicos e os trabalhadores contratados. A situação se torna complicada à medida que os contratos de trabalhadores terceiros têm sido celebrados sob a forma de prestação de serviços técnicos especializados, de tal modo a assegurar uma aparência de legalidade. No entanto, não há, de fato, a prestação de serviços pela contratada, já que se limita a fornecer mão-de-obra para o Estado. Isto é, contratam-se pessoas sem prestar concurso público, para realizarem serviços em órgãos da administração direta e indireta do Estado. Muitas vezes, estas pessoas não possuem qualquer vínculo com a entidade onde prestam serviços, não assumem cargos, empregos ou funções e não se submetem às normas constitucionais sobre servidores públicos.

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O indiscriminado uso do conceito de terceirização como forma de enxugar o corpo funcional – os funcionários ‘dispensáveis’ – pelo fato de não serem detentores de informação, conhecimento ou tecnologia, não se apresenta apenas como um equívoco do conceito, mas envolve riscos cuja extensão empresas e empregados não têm avaliado. No caso das empresas públicas, o fato em questão não é apenas o dispensar de funcionários, mas também a escolha dos melhores parceiros. Isto é, torna-se cada vez mais desafiador ao setor público estabelecer um processo em que ambas as partes negociem com precedentes de autonomia e capacidade empreendedora, inexista vínculos de dependência e no qual os fornecedores não tenham no cliente a única fonte de renda. A parceria baseada em uma relação de reconhecimento permanente das capacidades e das interdependências quebra paradigmas de qualquer relação de dependência e exclusividade, tornando uma relação produtiva mais saudável. Mesmo diante desses desafios, há analistas que vêem a terceirização como uma solução favorável para muitas empresas no Brasil, especialmente as empresas públicas. (SOUZA et all., 1999). Além disso, os gestores do setor público esbarram em outros dilemas, pois o processo de terceirização envolve inúmeras brechas e burla as legalidades que regem o aparelho do Estado e o gerenciamento de seu patrimônio. Quando avaliada a conjuntura de aspectos que envolvem a implantação desse modelo é importante ressaltar a necessidade em se distinguir as atividades desempenhadas pelo setor público: as meramente administrativas daquelas chamadas “sociais”. Deve-se observar que tais funções concernem ao funcionamento e à organização do serviço. Elas tornam a terceirização no setor público uma prática profundamente heterogênea, uma vez que, em certos casos, as regulações são feitas pela pessoa jurídica encarregada da exploração, e as otimizações são decididas pela pessoa pública que possui a direção dos objetivos. (DI PIETRO, 2000). Estas considerações acerca das atividades desenvolvidas pelo setor público merecem uma necessária análise e investigação sobre os pressupostos legais disponíveis à regulamentação da prática de outsourcing nas instituições públicas. Um adequado entendimento do complexo processo que envolve a parceria e o desenvolvimento de redes de atuação em que se relacionem as instituições públicas e privadas deve estar voltado para o papel de cada uma e as atividades e funções a serem exercidas. (MOTTA, 1987). 3. METODOLOGIA O trabalho foi desenvolvido a partir de duas fontes metodológicas: as fontes escritas acerca da análise dos documentos da temática escolhida e a coleta e análise de dados obtidos mediante aplicação de questionários. Dentro do universo de análise proposto – a terceirização no setor público – foram escolhidos como amostra 03 (três) órgãos do Estado de Minas Gerais para sua composição que se compôs de 235 (duznetos e trinta e cinco) entrevistados. Na pesquisa, foram aplicados dois tipos de questionários estruturados (para servidores efetivos e contatados) cuja análise seguiu procedimentos quantitativos de tabulação. Através dos instrumentos de pesquisa utilizados buscou-se direcionar a investigação a partir dos efeitos otimizadores e entraves relacionados à terceirização. Procurou-se assim, verificar os graus de integração acerca dos entrevistados e as políticas de implantação da terceirização, bem como de suas prerrogativas no setor. Na construção dos instrumentos de coleta procurou-se averiguar a relação entre o tempo de trabalho e o conhecimento dos servidores acerca de suas instituições, bem como opinião e posicionamento acerca da implementação do processo de terceirização. Analisou-se também a relação entre a natureza do vínculo empregatício – efetivo ou contratado – o grau de satisfação dos mesmos baseada na relação interpessoal de convívio e , ainda, quanto às suas expectativas, através de sondagem dos pontos negativos e positivos dos servidores em questão

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Primeiramente, faz-se necessário conhecer a quantidade de servidores efetivos, bem como a de servidores terceirizados nos órgãos públicos que nos servem de modelo analítico exemplar. Observa-se que da amostra composta por 235 servidores pertencentes à órgãos públicos distintos do Estado, 81 são terceirizados e 154 efetivos, o que percentualmente se traduz em 31% e 69%, respectivamente. Avalia-se, entretanto, que apesar da pequena amostra de servidores, a proporção de terceirizados é significante, o que representa a grande utilização dos mesmos pela administração pública. 4. REFLEXÕES E PERCEPÇÕES EM ÓRGÃOS DE MINAS GERAIS Analisando os questionamentos levantados junto aos servidores efetivos e terceirizados das instituições públicas escolhidas, identificam-se alguns tópicos que se mostram de relevância central, como tempo de implementação da terceirização na Instituição, a opinião quanto à terceirização na administração pública, as atividades mais terceirizadas e quanto à qualidade dos serviços e relação interpessoal com terceirizados. Quanto ao tempo de implementação da terceirização na Instituição, tem-se que de acordo com as instituições pesquisadas, o tempo médio obtido a partir dos contratos e dos períodos de implementação da terceirização obteve o valor de 04 (quatro) anos. Observa-se assim que o processo de terceirização não é recente ou mesmo temporário, pois como valor médio, pode-se inferir que alguns contratos são superiores a 05 (cinco) anos ou mais. Por todo esse tempo de utilização da terceirização pela administração pública é necessária uma análise pelas instituições da importância no contexto, através da avaliação dos resultados obtidos por sua implementação. Os resultados avaliados justificam, dessa forma, o tempo de contrato como distorção, por tratar-se apenas de uma ‘alternativa flexível’ face às severas políticas de contratação de pessoal impostas pelo governo e que vêm desencadeando continuamente a escassez de recursos humanos necessários ao desempenho das atividades públicas, como abordado por gerentes das instituições pesquisadas. Assim, ao avaliar a percepção dos servidores quanto à terceirização na administração pública, a maioria, ou seja 60%, respondeu tratar-se de “um meio de flexibilização da estrutura organizacional”, seguido por 21% dos entrevistados para a “alternativa de gestão”, conforme mostra o gráfico 01 a seguir. Flexibilização da Estrutura Gerenciamento Moderno Modismo Alternativa de Gestão Outros 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Gráfico 01 – Opinião quanto à Terceirização na Administração Pública Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Observa-se que as escolhas têm haver com a imagem considerada pelos servidores de interpretação de uma organização ‘burocrática e ultrapassada’ da administração pública. Entretanto, a “flexibilização” e a “alternativa de gestão” são contrárias ao pensamento por sugerir mudanças. Seguindo-se esta linha, quando indagados sobre a alternativa de flexibilização empresarial, a compatibilidade e percepção da terceirização apresentam visões

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contraditórias. A maioria opinou por discordar – total ou parcialmente –, conforme gráfico 02, com 50% dos entrevistados, 47% concordam sob as mesmas perspectivas. 50% 40% 30% 20% 10% 0% Concorda Totalmente

Concorda Parcialmente

Indiferente

Discorda Parcialmente

Discorda Totalmente

Gráfico 02 – Terceirização como Alternativa de Flexibilidade Empresarial Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Observa-se, assim, que os servidores reconhecem a importância da flexibilização organizacional obtida pela terceirização na administração, contudo, a discordância pode refletir a necessidade de adaptá-la ao setor público, pois a administração pública prima por princípios a ela inerentes que jamais devem ser esquecidos pelo gestor público. Ao se avaliar os motivos que levaram as instituições a se terceirizar, segundo a opinião de 54% dos entrevistados, deveu-se à “escassez de mão-de-obra efetiva”, seguida por 23% para a alternativa relacionada à “melhoria e agilização das atividades”, conforme gráfico 03. Desenvolvimento Atividades Escassez de Mão-de-Obra Melhoria das Atividades Redução Custos Outros 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Gráfico 03 - Motivos que Levaram a Instituição a Terceirizar Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Essas escolhas sugerem a necessidade de concurso público, devido ao fato de existir em algumas um número de pessoal contratado superior ao efetivo. Observando-se a variável que se refere à melhoria e agilização das atividades atividades-fim, tem-se uma agravante, uma vez que os terceirizados concentram-se nas atividades-meio. Enfim, torna-se necessário definir e priorizar as funções e a execução das atividades para uma efetiva melhoria dos serviços públicos prestados. Assim, quando questionados sobre o maior problema relacionado à escolha do parceiro ideal, as respostas foram equilibradas e preponderantes, com percentuais próximos, conforme gráfico 04. Quanto aos “preços cobrados” ressalta-se que a opinião de 29% dos entrevistados como mais preocupante, seguida pela “falta de qualificação e idoneidade” apontado por 28% e “exclusividade do parceiro” mencionada por 27%.

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Falta de Qualificação e Idoneidade Falta de Competitividade Preços Exclusividade do Parceiro 0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

Gráfico 04 – Problema quanto à escolha do Parceiro Ideal Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Em relação à escolha das alternativas acima, tem-se que o servidor reconhece que os preços cobrados são desproporcionais, aliada ao fato de que a mão-de-obra contratada necessita de maior qualificação. Coincidentemente, na entrevista realizada com os gestores de recursos humanos das instituições, foi constatado que a mão-de-obra terceirizada apresenta um custo bastante elevado. Quanto à parceria, observa-se a importância dada à idoneidade bilateral, ressaltando-se a problemática da exclusividade. Foram apontados por 59% dos pesquisados como riscos e/ou desvantagens que a terceirização pode trazer para a administração pública, a alternativa relacionada a “burlar a exigência constitucional do concurso público”, conforme gráfico 05. Contratar Servidores Afastados Taxas Incompatíveis Adiamento Concurso Público Apadrinhamento Mascarar Relação Emprego 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Gráfico 05 – Riscos e/ou Desvantagens da Terceirização para a Administração Pública Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Pode-se concluir, baseado nessas escolhas, que o servidor associa as contratações como improbidade constitucional, aliando o fato à não realização de concurso público, que seria legalmente a forma exercida pela administração pública. No entanto, ficou comprovado pela entrevista com gerentes das instituições que a falta de pessoal efetivo foi o motivo primordial que os levaram a terceirizar. Quanto à relação custo-benefício, foram unânimes em afirmar que, apesar do apoio dado à realização das atividades, o custo com o processo de terceirização é elevado, devido a encargos, tributos e taxa de administração cobrados. Procurou-se também conhecer a opinião dos servidores quanto aos fatores positivos ao processo de terceirização nas instituições pesquisadas. Das alternativas relacionadas, conforme gráfico 06 abaixo, 51% acham que o processo propiciou maior preocupação com as atividades-fim, e um percentual significativo de 32% opinou como sendo fator positivo a exigência de pessoal qualificado para as atividades desempenhadas.

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Maior Preocupação Atividades-Fim Flexibilização de Pessoal Redução Custos Operacionais 0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

Gráfico 06 – Fatores Positivos ao Processo de Terceirização nas Instituições Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Observando o gráfico acima se constata a relevância, na opinião dos pesquisados, de uma preocupação em relação às atividades-fim, todavia pela entrevista realizada com os gestores das instituições em que se percebe um interesse primordial no processo. Esta se refere à locação de mão-de-obra em contrapartida ao déficit de pessoal efetivo, ficando constantemente renegadas a ‘segundo plano’ as decisões pertinentes à melhoria das atividades-fim. É necessário avaliar a relação entre a implementação da terceirização e os resultados obtidos, a fim de que sejam traçadas as estratégias para o desenvolvimento das atividades. Ao se avaliar as relações pessoais existentes entre efetivos e contratados têm-se que o grau de sua satisfação dos primeiros em relação ao servidor terceirizado apresenta, comparativamente, resultados equivalentes em relação à eficiência e à qualidade dos serviços. Na opinião dos efetivos, o grau de eficiência e de qualidade dos serviços é considerado “bom” para 43% e 41% respectivamente. Entretanto, estes mesmos serviços, cumulativamente, são considerados regulares – 32% para eficiência e 25% para qualidade – ou ruins – 7% e 11% respectivamente, conforme gráfico 07 seguinte. 45% 30% 15% 0% Ótimo

Muito bom

Bom

Eficiência

Regular

Ruim

Qualidade

Gráfico 07 – Eficiência e Qualidade dos Serviços Terceirizados Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Através destes resultados pode-se inferir que a eficiência e qualidade dos serviços são reconhecidas parcialmente, pois, manifesta-se o desejo por melhora para parte dos servidores. Sabe-se que o bom desempenho das atividades terceirizadas pode propiciar meios de se redefinir prioridades para atingir um melhor aproveitamento na consecução dos objetivos. Conclui-se que o aumento do processo de terceirização ocorre sem a devida análise de causas e conseqüências quanto à implementação, o que denota não haver uma preocupação no sentido de este processo atender às perspectivas da estrutura organizacional. Quanto ao relacionamento entre efetivos e terceirizados, gráfico 08, o grau de satisfação mencionado por 62% dos efetivos é “muito bom”, contra 46% dos contratados. Entretanto, a relação se inverte, sendo considerada “ótima” por 35% dos contratados e 14% dos efetivos.

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70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Ótima

Muito Boa

Boa

Efetivo

Regular

Ruim

Terceirizado

Gráfico 08 – Percepção das Relações Interpessoais Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Isso representa que apesar da avaliação profissional merecer uma maior atenção, o nível de relacionamento entre ambos – efetivo e terceirizado – adquiriu notoriedade, o que faz com que as atividades sejam compartilhadas de maneira harmoniosa, objetivando uma finalidade em comum, apesar de suas categorias distintas. Assim, o servidor, peça fundamental no processo, deve tentar manter-se informado sobre conseqüentes mudanças ou perspectivas inerentes a classe. Em relação à instituição onde prestam serviços, os servidores também se mostraram satisfeitos. A alternativa “muito satisfeito” foi escolhida por 62% e 58% dos pesquisados efetivos e contratados, respectivamente. Seguiu-se a “totalmente satisfeito” por 17% e 29% dos respectivos grupos entrevistados, conforme segue no gráfico 09. 75% 60% 45% 30% 15% 0% Totalmente Satisfeito

Muito Satisfeito

Pouco Satisfeito

Efetivo

Parcialmente Totalmente Insatisfeito Insatisfeito

Terceirizado

Gráfico 09 - Grau de Satisfação dos Servidores Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Sabe-se que a satisfação no ambiente de trabalho é um dos fatores principais de motivação pessoal. Observa-se que apesar do servidor se ressentir quanto a certos problemas enfrentados por sua categoria, no dia a dia, a satisfação com a instituição onde executa suas atividades e seu relacionamento interpessoal é surpreendente, ainda que, às vezes, possa sentir-se pouco valorizado como terceirizado. Assim, nota-se que apesar das queixas levantadas, os servidores, ainda assim, consideram-se “muito satisfeito” com as empresas que trabalham ou lhes contratam. Até certo ponto, isto pode ser considerado contraditório, mas dado o temor da divulgação de sua opinião e/ou a crise atual de desemprego, os servidores omitem sua real satisfação. Entretanto, de acordo com o instrumento de pesquisa aplicado, foi solicitada aos servidores terceirizados a opinião quanto aos pontos negativos em relação à empresa que os contratou e à instituição onde prestam serviço. Das alternativas sugeridas em relação a pontos negativos da empresa

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que os contratou, 34% acham que é a falta de treinamento, seguida de 31% que consideram os “baixos salários”, apresentados os resultados no gráfico 10 abaixo. Desorganização Seleção por Indicação Alta Rotatividade Falta de Treinamento Baixos Salários 0%

10%

20%

30%

40%

Gráfico 10 - Pontos Negativos da Empresa (Terceirizada) Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

O resultado obtido leva a refletir sobre os fatores preocupantes na opinião dos entrevistados, o que demonstra um interesse da classe em se especializar para melhor aproveitamento em suas atividades. Conclui-se que o fator mais citado pelos terceirizados correlaciona-se diretamente aos demais, pois se não há interesse em treinamento, o perfil profissional se torna inadequado, podendo levar à alta rotatividade de servidores. Talvez, estes resultados, possam ser justificados pelo fato de serem vistos os contratados, como servidores sem vínculo com a instituição e de não se submeterem às mesmas normas do servidor efetivo que o considera vulnerável em termos de substituição. As respostas obtidas levam ao reconhecimento de maiores preocupações, quando se pensa em uma colocação no mercado. Uma postura empresarial idônea atrai o servidor, sua permanência e dedicação à empresa, mesmo com a falta de outros incentivos. Contudo, podese notar que os pontos positivos relacionados à valorização do servidor tiveram percentuais bem inferiores, conforme análise seguinte. Observa-se que as alternativas mais citadas, estão relacionadas diretamente à integridade e importância da empresa, ficando em segundo plano aquelas que pressupõem expectativas entre os servidores. Quanto à instituição onde trabalham, 41% dos servidores destacam o fato de “gostar das atividades que desempenham”, conforme gráfico 11 abaixo. Condições de Trabalho Conceito da Instituição Identificação Profissional Cooperação Atividades Boa Convivência 0%

10%

20%

30%

40%

50%

Gráfico 11 – Pontos Positivos da Instituição em que Trabalha (Terceirizados) Fonte: Pesquisa Primária, 2003.

Tais resultados demonstram não haver, na opinião dos pesquisados, interesse das empresas que os contratam em promover melhoria para seu quadro de pessoal. E isso torna-se extremamente importante porque gostar de realizar um trabalho é essencial para que seja feito da melhor maneira possível. Se os servidores se consideram satisfeitos em realizar suas atividades é provável que busquem melhores condições para desenvolvê-las e assim, serem reconhecidos por seu trabalho.

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Assim, percebe-se, pelas informações acima obtidas, que as empresas exigem muito ao buscar o profissional no mercado, todavia, não investem numa periodicidade de treinamento para o seu desenvolvimento profissional. Se a empresa requer experiência e qualificação na hora de contratar, deve atentar-se também ao desenvolvimento das atividades necessárias a este mundo globalizado em que o treinamento constitui ferramenta fundamental de sobrevivência no mercado. Nota-se, que as empresas contratadas, querem obter sem maiores custos, o profissional requisitado, sem ao menos lhe propiciar alguma qualificação. Isto para as instituições que necessitam delegar certas atividades, torna-se uma questão delicada, devido ao descrédito com os mesmos e a conseqüente falta de opção em substituí-los. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Refletir sobre a implantação da terceirização do setor público é estar inserido nas discussões e apontamentos mais recentes sobre os aspectos que a tornam uma prática possível e facilitadora dos serviços públicos, bem como dos aspectos que restringem seu pleno funcionamento. Essas restrições podem assumir um caráter puramente econômico ou tecnológico (devido à escassez de recursos que o país dispõe, frente a sua crise estrutural) e/ou também um caráter social – visto que esbarra em problemas agudos como o do desemprego, a desigualdade nas relações trabalhistas etc. Portanto, faz-se necessária a reflexão sobre cada um desses pontos, no sentido de compreender mais profundamente a natureza do objeto de estudo proposto. É possível apontar também alguns aspectos que acabam atuando como fatores restritivos da implementação da terceirização no setor público. Eles envolvem diretamente os gestores públicos, e por isso é necessário que eles se mostrem sensíveis e afinados a sua importância decisiva. Aspectos como o desconhecimento da alta administração, a resistência e o conservadorismo existentes na cultura organizacional permitem que haja dificuldade de se encontrar parceiros ideais. Diante dessa dificuldade, as organizações do setor público se mostram suscetíveis aos riscos que envolvem a coordenação dos contratos. Se esses não forem relativamente previstos ou detectados a tempo, podem gerar outros entraves, como uma crise interna decorrente da falta de parâmetro dos custos, o que implicará demissões. Essas demissões, associadas, em geral, ao desconhecimento da legislação trabalhista proporcionam conflitos intermináveis com sindicatos. A crise torna-se estrutural. Se a terceirização de mão-de-obra é permitida e avança na administração pública, passa a exigir do gestor a adoção de cautelas na sua contratação, através da escolha de empresas idôneas, com economia estável, regularidade fiscal e jurídica. É conveniente e necessária no contrato de terceirização, a indicação pelo gestor público de um responsável pelo acompanhamento e fiscalização do serviço, bem como pelas obrigações trabalhistas, sociais e fiscais da empresa em relação a seus empregados. Portanto, as parcerias suscitadas pela terceirização enfrentam cada vez mais novos problemas relacionados à gestão das relações sociais estabelecidas entre os membros de ambas. Cada empresa possui características distintas que se tornam mais evidentes quando se estreita a convivência, necessitando-se de um processo harmônico para a garantia de resultados maximizadores. Assim, os envolvidos neste processo, inserem-se em relações repletas de investimentos e riscos mútuos. Após reflexão sobre o tema mediante pesquisa bibliográfica e análise da pesquisa aplicada, constata-se a terceirização do setor público como um caminho irreversível, porém, com prerrogativas a serem definidas quanto à sua utilização e implementação. A terceirização, como vem avançando, deverá ter como estratégia pelo Estado, o deslocamento de sua atenção para a atividade-fim, que beneficie diretamente a sociedade. Para tanto, deverá imprimir como princípio básico, juntamente com seus fornecedores e parceiros, a qualidade dos serviços

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prestados, investindo-se no constante desenvolvimento da mão-de-obra, tecnologia e métodos de gestão. O que ocorrerá se o mesmo recorrer a contínuos planejamentos estratégicos para definição de caminhos de ação. Como já visto, falta de treinamento e qualificação são fatores preocupantes também ao servidor terceirizado, e este, constantemente deve ser avaliado na consecução de suas atividades. Por outro lado, na realização de parceria entre Estado e iniciativa privada é essencial que se tenha em vista a idoneidade da empresa contratada, para que não só seus interesses prevaleçam, e sim, todos os direitos e obrigações contratuais que deverão ser firmados, aliados ao compromisso moral, que venha em contrapartida de uma boa parceria. Nos órgãos públicos, deve ser discutida a oportunidade ou necessidade da prestação de serviços, considerando-se a qualidade destes, entre outros fatores. Desse modo, buscar-se-á parceiros com interesse público, que através de processo licitatório legal, assumirão esta responsabilidade. Porém, foi reconhecido pelos entrevistados, que ao se realizar esta parceria, o Estado acaba por pagar altos preços, que não condizem às expectativas, devido ao despreparo da mão-de-obra utilizada. Vê-se, também, uma crescente terceirização na máquina pública causada pela escassez de pessoal do quadro efetivo, por não haver realização de concurso público. As instituições reconhecem o problema, porém, dependem de autorização governamental. Sabe-se das formalidades e exigências para este fim. Atravessam-se anos de mandatos políticos, e tudo permanece o mesmo nesta questão. Sobressaem-se os interesses individuais dos políticos em relação às verdadeiras necessidades da administração pública. Observa-se que os dados levantados, relacionados ao Governo Federal, são reconhecidamente uma problemática que se estende à administração estadual. Ainda que informações semelhantes não tenham sido utilizadas para um melhor embasamento deste trabalho, pôde-se constatar que é preocupante o descaso em relacao ao servidor efetivo, conquanto se assiste à substituição desenfreada pelo servidor terceirizado, cujas conseqüências se percebe como a seguir: Os funcionários terceirizados no Governo Federal, sem contar as autarquias e fundações, correspondem a pouco mais de 10% do número de servidores federais. Os gastos para mantêlos já representam 1/5 da despesa com pessoal civil ativo da administração direta, cerca de 1,5 bilhão por ano. Feito os cálculos, descobre-se que cada servidor ativo custa, em média, a metade de um terceirizado. (ESTADO DE MINAS, 2003).

Informações semelhantes se fazem necessárias à administração estadual, se esta conscientizar-se das prerrogativas necessárias à política de terceirização. A terceirização, tal qual estabelecido em sua legislação específica para a administração pública, deverá ser direcionada, exclusivamente, para a realização de atividades da chamada área-meio ou administrativa. A visão dela, como vem acontecendo, leva-nos a acreditar, que o único motivo para sua utilização, neste setor, seja a redução do pessoal efetivo, e, conseqüentemente, as despesas relacionadas à aposentadoria integral e “privilégios” do funcionalismo. No entanto, devem ser revistos outros critérios quanto a economicidade nas instituições públicas, voltados à avaliação sistêmica do processo de terceirização. Sua utilização não pode valer-se como instrumento de burla à exigência constitucional do concurso público, fadado de convênios superfaturados com empresas. Nem propiciar flexibilização da estrutura pública para infiltração de contratações de parentes e de funcionários para funções específicas da administração pública. Cabe aos administradores públicos a validação quanto à vantagem ou desvantagem da terceirização no setor. E isso, só será possível através de métodos de gestão que tenham como instrumento um planejamento estratégico voltado, necessariamente, ao conhecimento das reais necessidades das instituições. Todavia, sem nunca perder de vista, o controle sobre a efetiva realização dos serviços contratados. Paralelamente ao planejamento em relação à

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terceirização, deve-se ater a uma política em prol do funcionalismo público, baseada em plano de cargos e salários condizentes com a atual conjuntura. Sabe-se que por causa do descontrole das despesas públicas, a categoria vem perdendo garantias, e isso é imoral, se observado os procedimentos constitucionais de ingresso legal na carreira pública. Conclui-se que a terceirização disciplinada em objetivos específicos, que vão de encontro às reais necessidades do setor público, pode levar a uma maior eficiência. Contudo, isso só acontecerá se as atividades terceirizadas forem encaradas como acessórias ao desenvolvimento daquelas consideradas públicas, exatamente porque, o interesse na sua realização é geral e atinge toda a comunidade. Ao se reconhecer os benefícios da terceirização, galgados em agilidade, flexibilidade e competitividade dos serviços públicos, não se pode esquecer de parâmetros que inibam confrontos entre seu uso e a livre acessibilidade, bem como, da seleção pública, garantidos pela Constituição Federal. Além disso, com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal ressurgiram grandes preocupações quanto ao equilíbrio entre os recursos de receita e despesa das organizações, principalmente em relação às despesas com recursos humanos. Essa lei supõe determinações para nortear a implantação e execução da terceirização da administração pública. Ela tenta ordenar o universo das relações trabalhistas, elucidando vantagens e desvantagens na extensa utilização e prática dessa forma de contratação. Para os melhores resultados possíveis, há de se insistir na observação de certos princípios, de certas políticas, das formas de execução e das finalidades dos serviços públicos, além do cumprimento dos preceitos legais. A terceirização já se tornou uma atividade rotineira no setor privado e caminha desenfreadamente no setor público. Porém, é necessário que sua utilização não esteja fadada aos atropelos de incautos administradores, atraídos pela rapidez e informalidade deste setor abrindo mão de prerrogativas inerentes do Poder Público a ponto de confundi-la com a privatização. Na realidade, a terceirização nos casos estudados, normalmente se enquadra nas referidas modalidades de terceirização tradicional ou de risco. Isto se deve a alguns problemas sérios que ela tem evocado nesse âmbito. O primeiro deles seria o fato de que ela mascara a relação de emprego que seria própria da administração pública, não protege o interesse público e favorece o apadrinhamento político. Além disso, burla a exigência constitucional do concurso público, escapando às normas constitucionais que regem seus servidores. Assiste-se, nesse cenário, à cobrança de taxas de administração incompatíveis com os custos operacionais, com os salários pagos e com os encargos sociais. Sua implantação não tem observado as regras das contratações temporárias, visto que contrata servidores afastados de seus cargos para prestarem serviços – sob outro título – ao próprio órgão do qual está afastado e com o qual mantém vínculo de emprego público. Há uma tendência dos governantes de responder às deficiências e às falhas no serviço público com mudanças, modificações e reformas sem a menor preocupação em analisar as causas dessa deficiência. Tais causas muitas vezes são notórias, por decorrerem de falta de recursos materiais que prejudicam sobremaneira a eficiente atuação dos servidores públicos. Mas os governantes preferem exercitar a imaginação criadora investindo insistentemente no desconhecido, ao invés de investir no que já existe melhorando a infra-estrutura dos órgãos públicos. Essas experiências que resultam no desvirtuamento de serviço público sempre acabam custando muito caro ao cidadão. Tanto o direito privado quanto o público têm sua importância, mas devem ser prestigiados cada qual no seu âmbito de atuação. Sem se confundir a facilidade, a flexibilidade e a liberdade ampla do setor privado com os rígidos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da razoabilidade e da publicidade que se deve ater a Administração Pública.

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O administrador público não deve, em nome da modernidade, esquecer-se desses princípios que existem para assegurar que o homem público sirva ao Estado com lisura e comprometimento. A modernização do setor público deve ser contínua. Na atual conjuntura, se faz ainda mais necessária a definição de um modelo que venha em contrapartida aos mecanismos lentos, burocráticos e ineficientes, em prol de uma administração voltada para atividades que beneficiem diretamente a sociedade. Os administradores devem ter o propósito de otimizar sua gestão, pois dessa forma irão contribuir em favor da qualidade, produtividade e redução de custos da máquina pública. E nesse propósito devem estar imbuídos o Estado, como principal agente de terceirização, juntamente com seus fornecedores e parceiros pelo alcance da qualidade dos serviços prestados com o desenvolvimento constante da mão-de-obra, tecnologia e métodos de gestão. Contudo, é fator relevante em favor da terceirização dos serviços no Estado, a necessidade de se ter um planejamento estratégico que defina caminhos de atuação, onde poderão ser propostas mudanças organizacionais, nas normas e procedimentos, buscando mudanças de postura e queda de paradigmas. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMATO NETO, João. Reestruturação industrial, terceirização e redes de subcontratação. IN: Revista de Administração de Empresas. São Paulo, 1995, v. 35, nº 2, mar/abr, p. 33-42. _______. Redes de cooperação produtiva e clusters regionais; oportunidades para pequenas e médias empresas. São Paulo: Atlas, 2000. BRAGA, C.F. Terceirização em tecnologia de informação: motivadores e conseqüências. Dissertação de Mestrado, Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração Pública – CIPAD – Tópicos Especiais, 1998. BENKO, C. Outsourcing Evaluation – A Profitable Process. IN: Information Systems Management. Spring, s.n. 1993. CASTRO, E.T.B, LAURIA, C.A., LIMEIRA, J.E.R.& MACHADO, N.F. Terceirização: algumas considerações sobre o tema Rio de Janeiro: FGV/COPPEAD/UFRJ, 2001. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. São Paulo: Atlas, 2000. DRUCK, Maria da Graça. Terceirização: uma prática japonesa com certeza! IN: Terceirização: (Des)fordizando a fábrica. São Paulo: Bomtempo Editorial, 1999, pp.123-155. HANORO, R.M., JACON, M.C.P. & MELO, M.C. Terceirização: mitos e controvérsias. Um estudo de caso na diretoria de informática do IBGE. Rio de Janeiro: FGV/IBGE, 1998. MARINHO, B.L.M. e AMATO NETO, J.. Terceirização e mudança organizacional: o desafio de um novo padrão de relacionamento entre empresas. 1995, p. 8-18. MOTTA, Fernando C.P.. Redes organizacionais e estado amplo. IN: Revista de Administração de Empresas. São Paulo: 1987, v. 27, nº 2, abr/jun, p. 5-13. PAGNONCELLI, Demizo. Terceirização e parceirização: estratégias para o sucesso empresarial. Rio de Janeiro, 1993. RODRIGUES DA SILVA, Ronaldo André. Redes organizacionais: uma análise teóricatopológica de variáveis estratégicas de gestão. IN: Iº Encontro de Estudos em Estratégia 3E´S. Curitiba: Anais do 3E´s, 2003. SOUZA, Geraldo Pedroso, FERREIRA, J.A. BALDO, T.R.S. Terceirização no serviço Público. Rio de Janeiro, FGV, 1993.

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