CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO: ESTRUTURA E FUNCIONALIDADE

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CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO: ESTRUTURA E FUNCIONALIDADE Revista de Direito do Consumidor | vol. 65/2008 | p. 114 - 143 | Jan - Mar / 2008 Doutrinas Essenciais de Direito Empresarial | vol. 5 | p. 633 - 668 | Dez / 2010 | DTR\2008\46

Gerson Luiz Carlos Branco Doutor em Direito Privado pela UFRGS. Professor do programa de Mestrado em Direito da Ulbra. Advogado. Área do Direito: Consumidor Resumo: A cédula de crédito bancário foi criada para pôr fim às ações revisionais dos contratos bancários. Instrumento eficaz para realização dos créditos das instituições financeiras, com facilidade de securitização e garantias praticamente infalíveis, fez parte de plano de redução do risco sistêmico que afetou o sistema financeiro nacional no final dos anos 90. Apesar de seus objetivos enquadrarem-se como protetivos dos interesses superiores da sociedade, este instrumento precisa ser estudado a partir de sua adequação constitucional e possibilidade de vulneração de direitos fundamentais. Neste sentido, a técnica legislativa criou um instrumento híbrido cuja função não pode ser alcançada, pois a outorga de direitos potestativos de caráter absoluto às instituições financeiras para constituir unilateralmente créditos violam direitos e princípios que fundamentam o sistema do direito privado. Palavras-chave: Cédula de crédito bancário - Direitos fundamentais - Títulos de crédito - Autonomia privada - Liberdade contratual Abstract: The bill credit bank was created to banish the suits to review the brazilian financial agreements. Efficient instrument to warranty the credit, easy to become a mobile value, it was part of a plan to reduce the systematic financial risk which fired brazilian economy at the end of the nineties. Even though it has the objective to protect the interest of society, the bill credit bank needs to be studied by the eyes of the Constitutional Law to avoid damages to the fundamental rights. Looking through this way, we can see that the legislator created an instrument whose function could not be achieved because it gives to the banks power to create unilaterally obligations and credits which is completely against the principles and rights of the system of private law. Keywords: Bill credit bank - Fundamental rights - Bill of credits - Private autonomy Freedom contract Sumário: Introdução - 1.Antecedentes históricos da cédula de crédito bancário - 2.Estrutura legal da cédula de crédito bancário - 3.Funcionalidade da cédula de crédito bancário - 4.Conclusão - 5.Referências bibliográficas

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A cédula de crédito bancário é o título de crédito que os bancos estavam pedindo desde o advento da Constituição Federal de 1988, tanto sob o ponto de vista político, quanto sob o ponto de vista da técnica jurídica. Para usar as palavras de Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa, pode-se comparar o título ao "mais poderoso míssil nuclear dotado de múltiplas e mortais ogivas". 1 Para entender esse míssil e a verdadeira eficácia dessas múltiplas e mortais ogivas é preciso compreender o contexto histórico do surgimento da cédula de crédito bancário no ordenamento jurídico nacional, o que auxiliará na interpretação da norma legal, bem como é preciso verificar sua compatibilidade com o sistema de proteção dos direitos fundamentais. Toma-se como pressuposto para o estudo deste modelo jurídico do direito privado uma perspectiva que é típica da análise das relações empresariais, que é chamada por Judith Martins-Costa de perspectiva macrojurídica que leva em consideração os efeitos da regulamentação na economia global da sociedade, abandonando-se uma visão baseada na justiça comutativa adstrita às relações individuais e unitariamente consideradas.2 Esse pressuposto é tomado em consideração tendo em vista que o direito privado moderno não pode ser examinado em uma esfera limitada do sujeito, seja pela pura análise da estática relação crédito e débito, seja porque a relação obrigacional quando vista como totalidade não pode ser dissociada dos seus fins. E os fins não são unicamente determinados pelo vínculo obrigacional, mas também pelos valores consubstanciados na norma jurídica que disciplina o modelo jurídico. Não basta a análise das regras postas na Lei 10.931, de 02.08.2004. É preciso estudar os princípios que lhe informaram e o conjunto de elementos que a tradição jurídica construiu ao longo do tempo e que conformam o modelo jurídico da cédula de crédito bancário em sua estrutura e funcionalidade. Ainda que no caso em análise o legislador tenha andado na contramão da técnica legislativa que privilegia as cláusulas gerais às normas estritas e fechadas, a lei não consegue fugir do conjunto de ferramentas institucionais, discursivas, comunicacionais construídas ao longo da história pela tradição.3 Por isso é preciso contextualizar social e historicamente a cédula de crédito bancário e analisar as suas duas dimensões: estrutural e funcional. A dimensão estrutural evidencia a relação entre crédito e débito, com um caráter neutro em relação aos sujeitos. A dimensão funcional, por sua vez, estabelece uma vinculação entre essa relação e sua origem, a sua causa e, por isso, a partir da função prático-social a que corresponde, há a definição dos direitos, obrigações, poderes do credor.4 Quanto à análise funcional não se pode perder de vista o sentido histórico da funcionalização dos modelos jurídicos do direito privado, a fim de evitar uma funcionalização arbitrária, tendo em vista que qualquer limitação da autonomia privada que não seja justificável em termos de utilidade social é arbitrária e inconstitucional. 5 Por outro lado, o sentido histórico de funcionalização dos modelos jurídicos fornece limites dogmáticos que evitam (1) o excesso de abstrações generalizantes e a falta de conexão das soluções jurídicas com a realidade e (2) reduzem o risco de subjetivismo e empirismo

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nas decisões judiciais. Por isso, para compreender tais fins e valores, bem como sua compatibilidade com o sistema constitucional, sem perder a perspectiva macrojurídica, o tema é enfrentado através de uma análise dos (1) antecedentes históricos da cédula de crédito bancário, para então ver sua (2) regulamentação legal (dimensão estrutural) e, na última parte (3) verificar a relação entre a estrutura legal e a funcionalidade da cédula de crédito bancário.6 1. Antecedentes históricos da cédula de crédito bancário

A análise histórica precisa ser feita pelo menos a partir do advento da Constituição Federal vigente, no ano de 1988, quando era vigente determinada realidade política, social e econômica, que levou o constituinte a estabelecer limite às instituições integrantes do financeiro nacional. A redescoberta dos poderes do parlamento com a redemocratização, somada com a ânsia de acabar com a alta inflação que assolava o país, o constituinte superestimou os seus poderes de conformação da realidade econômica e social e determinou que as instituições financeiras integrantes do sistema financeiro nacional não poderiam cobrar juros superiores a 12% ao ano, atribuindo-lhes o papel de "promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir os interesses da coletividade".7 Dois anos após, sob ordem do constituinte8 foi editado o Código de Defesa do Consumidor, que regulou parte das relações que tradicionalmente eram objeto de disciplina do direito comercial, mediante uma disciplina contratual protetiva das relações de uma sociedade de massas. De relevo, para a problemática apresentada neste artigo, o reconhecimento da lesão9 na sua feição objetiva, considerando nulas as cláusulas contratuais que estabelecessem prestações desproporcionais. Com base nesse quadro legislativo, parte da jurisprudência passou a limitar os juros ao patamar constitucional, até que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn 4, declarou que a regra do art. 192, § 3.º, da CF/1988 não era auto-aplicável e, portanto, as instituições financeiras passaram a ter liberdade na prática dos juros reais, independentemente de seu conceito.10 Apesar dessa decisão, alguns Tribunais Estaduais, em especial o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul continuaram aplicando o limite constitucional, tendo em vista o evidente conteúdo prático e político da decisão do Supremo Tribunal Federal, sem fundamentação jurídica relevante, exceto o fato de ser o Tribunal que está no topo da hierarquia do sistema recursal. Além disso, os Tribunais Estaduais também tomavam em consideração que o Código de Defesa do Consumidor não permitia a cobrança de juros em patamar que caracterize lesão, tais quais são os juros cobrados para o crédito pessoal e crédito rotativo, que mesmo em épocas como a vigente, de inflação baixa (próxima a 3,5% ao ano), chegam a 10% ao mês.11 Os casos que conseguiam ultrapassar as barreiras procedimentais chegavam ao Supremo Tribunal Federal e lá eram modificados, o que certamente era uma quantidade reduzida de casos, comparativamente com os julgados dos Tribunais Estaduais.12

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Paralelamente e conjuntamente com o debate a respeito do limite constitucional dos juros, uma verdadeira avalanche de ações revisionais chega aos Tribunais na década de 90, atacando uma série de instrumentos do direito bancário, tais como a capitalização dos juros, cobrança de serviços sem prévia contratação, cumulação de comissão de permanência com cláusula penal etc. Nesse contexto a cédula de crédito bancário é criada em novembro de 1999 por meio da MedProv 1.925/99,13 editada pelo governo federal como uma medida para dar segurança às instituições financeiras, permitindo a estas que representem seus créditos por meio de título que possibilita a cobrança de tudo o que então a jurisprudência vinha negando: capitalização mensal de juros, cumulação de comissão de permanência com juros remuneratórios e cláusula penal, executoriedade de contratos ilíquidos e títulos cujo valor é formado a partir de extratos elaborados unilateralmente etc. 14 Como a previsão estava em uma medida provisória não convertida em lei, não obstante a sua eficácia ter sido entendida pela EC 32, de 11.09.2001,15 pode-se afirmar que tal título não teve receptividade no mercado em razão da sua utilização desconfiada por poucas instituições financeiras, conhecedoras da posição dos Tribunais brasileiros. Entre as razões da cautela, a linha argumentativa de que a matéria não poderia ser regulada por medida provisória, pela falta do preenchimento dos pressupostos previstos no art. 62 do texto constitucional, em especial a relevância e urgência.16 Lembre-se que nessa época o governo abandona a chamada âncora cambial,17 começando uma política de elevação constante dos juros praticados pelo próprio Banco Central do Brasil para controlar o meio circulante, o que resultou em uma elevação do preço do crédito e dos juros bancários, em uma tendência já iniciada no final dos anos 70 para liberalização do sistema financeiro.18 Em razão dessa elevação dos juros, após o advento da eleição presidencial de 2002, foi iniciada uma espécie de cruzada para fortalecimento do sistema bancário e da criação de mecanismos para impedir que o Poder Judiciário faça o controle dos contratos bancários. 19 Havia o medo de que o chamado risco sistêmico vitimasse o sistema financeiro nacional, com efeitos similares ao que ocorreu na Argentina, onde a crise de liquidez fez com que o país perdesse cerca de 40% de seu PIB em um ano.20 A idéia de fortalecimento do sistema financeiro tem por fundamento a circunstância de que os bancos e as instituições financeiras, em geral, não emprestam seu capital próprio, mas os recursos advindos da poupança popular. Em outras palavras, "o segmento econômico bancário funciona basicamente como um intermediário entre os poupadores e os tomadores de empréstimo".21 Nessa perspectiva macrojurídica a doutrina tem considerado que a responsabilidade pelas altas taxas de juros praticadas pelo sistema financeiro é fundamentalmente provocada pela alta inadimplência e demora no processo de recuperação judicial dos créditos. 22 A análise dos dados fornecidos pelo Banco Central do Brasil sobre o perfil do spread bancário médio indica que no ano de 2001 o custo com a inadimplência representava 35% do spread bancário. 100% do provisionamento das instituições financeiras são revertidos para elevação das taxas de juros praticadas para determinado produto financeiro.23 Tendo em vista a necessidade de segmentação de riscos e preservação de liquidez (capacidade de pagamento imediato das obrigações) do sistema financeiro nacional, os

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critérios de provisionamento dos créditos inadimplidos das instituições financeiras impõem um prazo máximo de 180 dias para provisionamento de 100% das quantias em atraso, o que é absolutamente incompatível com o prazo de recuperação de crédito através do Poder Judiciário.24 Isso significa que não só os créditos não recuperáveis refletem no custo dos contratos bancários, mas também aqueles cuja recuperação se dê em prazo superior aos previstos na Resolução 2.682, de 21.12.1999, do Conselho Monetário Nacional. Evidentemente que o objetivo da regulamentação é a preservação da estabilidade da moeda e liquidez do sistema financeiro nacional, para "em última análise, preservar os recursos dos poupadores que, geridos pelos bancos, financiam a atividade produtiva e o consumo".25 Por isso, apesar de sintetizar com precisão a matéria a respeito da cédula de crédito bancário, não tem razão de ser um dos argumentos de defesa do novel título, segundo o qual a ação ordinária para cobrança dos créditos bancários é um entrave para o sistema financeiro, já que somente são cobrados judicialmente os créditos que já estão completamente provisionados, salvo exceções, pois o prazo de 180 dias é extremamente exíguo para possibilitar cobrança judicial, seja o rito executivo ou ordinário. 26 Desse modo, ao mesmo tempo em que permanece a política de juros altos praticados pelo Banco Central, inicia campanha política no sentido de que o novo governo estava tomando medidas para redução dos juros, entre elas a edição da Lei 10.931/2004, que revogou a MedProv 1.925/99 e disciplinou de maneira definitiva a cédula de crédito bancário.27 Tal disciplina já estava em documento da CNI (Confederação Nacional da Indústria) dirigida ao mercado internacional, que entre as medidas mais importantes para a consolidação do setor financeiro seria a aprovação da lei de falências e a disciplina legal da cédula de crédito bancário.28 Pois bem, o governo cumpriu a agenda e as leis foram aprovadas. O argumento político apresentado para a ampliação da segurança das atividades das instituições financeiras repousa na afirmação de que os altos juros praticados perante os consumidores origina-se mais dos riscos derivados da inadimplência e do próprio custo com as ações revisionais do que da taxa Selic fixada pelo Conselho de Política Monetária. Nesse cenário a cédula de crédito bancário surge como uma espécie de redenção das instituições financeiras contra as ações revisionais, pois afinal de contas, tudo o que a jurisprudência sempre proibiu pode ser cobrado com fundamento na própria lei. 29 Além de propiciar aos bancos um instrumento eficaz para a realização de seus créditos, visa facilitar o acesso ao crédito, bem como fomentar o microcrédito. Abrão vincula a cédula também à conta múltipla, que permite diversos investimentos atrelados ao mesmo titular, os quais podem estar vinculados a uma única cédula, que pode ser securitizada como meio de liquidação da obrigação.30 Essa vantagem econômica é importante em uma economia dinâmica na qual muitas operações são realizadas de maneira contínua, sem tempo e condições de representar o crédito em um título autônomo. Veja-se que praticamente todas as instituições financeiras apresentam um cardápio de produtos com linhas de crédito pré-aprovadas segundo o perfil

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do cliente, bastando para utilizá-lo a contratação eletrônica. A cédula de crédito bancário serve nesse contexto como um guarda-chuva jurídico que alia aspectos econômicos, administrativos e civis. Econômicos porque propicia a realização de todos os negócios e a venda de uma gama aberta de produtos por meio de uma formalização inicial; administrativos porque a estrutura jurídica da cédula de crédito bancário possibilita a securitização de créditos para qualquer particular, ainda que não seja instituição financeira, com conseqüente segmentação de riscos; e, civis, porque propicia uma garantia de que todas as obrigações vão ser cumpridas a partir dos números e registros da instituição financeira, com pouca margem para as chamadas ações revisionais. A "metodologia que prestigiou o nascimento da medida provisória criadora da cédula de crédito bancário" foi justamente a de preencher as lacunas jurídicas construídas pela jurisprudência ao longo do tempo e que limitavam as exigências de cobrança das instituições financeiras, em especial os limites decorrentes da Súmula 258 do STJ. A cédula resolve uma das questões problemáticas na jurisprudência, que é a possibilidade de que "diversos contratos podem ser renegociados e repactuados, nos quais as partes se interessam pela solução de questões antigas, resumindo a obrigação futura na cédula de crédito bancário, principalmente no fundamento da capitalização dos juros". 31 As razões políticas para a positivação de título como a cédula de crédito bancário são evidentes, pois a necessidade de se melhorar o sistema de garantias,32 bem como de aperfeiçoar os institutos jurídicos de proteção aos credores são indiscutivelmente de grande utilidade, principalmente se for levada em consideração a necessidade de preservação do sistema financeiro nacional, que gere recursos que não são propriamente dos bancos, cujo capital próprio é mínimo, mas que gere a poupança popular. Porém, não obstante essa consideração, e os fins que se buscam alcançar, não se pode esquecer que vivemos em um Estado Democrático de Direito, em um regime constitucional, que condiciona não só os juízes como o próprio legislador. Assim, é preciso compreender a construção técnica da cédula de crédito bancário para, ao final, estudá-la sob o enfoque de sua compatibilidade constitucional, já que em um sistema democrático os fins não justificam quaisquer meios, principalmente o sacrifício de direitos fundamentais, como é, por exemplo, o devido processo legal.33 E, a inusitada redação do art. 27 da Lei 10.931/2004, com a lista de permissivos que durante décadas foram proibições estabelecidas a partir de princípios previstos em lei e na própria Constituição, exige que se tenha a maior cautela quanto à validade e eficácia de tais dispositivos. 2. Estrutura legal da cédula de crédito bancário

Embora o objetivo deste artigo não seja a elaboração de comentários aos artigos da lei que tratam da cédula de crédito bancário, apresenta-se de maneira sintética, o conteúdo do título segundo os ditames da lei. 1. Consiste em promessa de pagamento, tal qual uma nota promissória, com o diferencial de que o tomador é sempre uma instituição financeira.

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2. Pode ser pactuada em moeda estrangeira. A esse respeito deve-se observar que nos casos previstos em lei, ou seja, quando for emitida para representar um negócio jurídico que pode ser objeto de pactuação em moeda estrangeira (previstos na Lei 10.192, de 14.02.2001 e Dec.-lei 857, de 11.09.1969). 3. Pode ser garantida por aval, como os títulos de crédito em geral, mas também por meio de outras garantias reais ou fidejussórias, que podem estar na cártula, ou podem estar em documento apartado. O alto grau de generalidade do texto do art. 31 da Lei 10.931/2004 permite que sejam garantia da cédula os créditos futuros advindos da folha de pagamento, nos termos da Lei 10.820, de 17.12.2003. 4. Embora pouco usual, a cédula de crédito é um negócio jurídico bilateral, que tem requisitos formais e substanciais. Quem está habituado ao estudo dos títulos de crédito poderá observar uma espécie de aberração na disciplina de tal título, pois no art. 28 da Lei 10.931/2004 constam os requisitos do contrato com base no qual poderá ser emitido o título, devendo, porém, constar todas as condições contratuais do próprio título. Além disso, o art. 29 elenca os requisitos formais da cártula. Dois artigos distintos, com finalidades distintas e que tornam a cédula um instrumento híbrido: tem todas as características de um contrato e ao mesmo tempo tem características próprias dos títulos de crédito. 5. Usando uma expressão de linguagem comum para demonstrar a gravidade da afirmação, se Ascarelli, Vivante ou João Eunápio Borges fossem vivos, não resistiriam a afirmação de que o contrato não é subjacente, mas inerente à cédula. Porém, é isso que se vê no art. 28 da Lei 10.931/2004. 6. A Lei 10.931/2004 prevê de maneira expressa que podem ser pactuados: capitalização de juros, periodicidade da capitalização, despesas e encargos decorrentes da obrigação; critérios de atualização monetária ou variação cambial; casos de mora, multas, penalidades e vencimento antecipado da dívida; critério de apuração das despesas de cobrança, honorários advocatícios judiciais e extrajudiciais (estes não superiores a 10% do valor devido); modalidade da garantia e hipóteses de substituição; obrigações da instituição financeira; obrigação de emissão de extratos e planilhas de cálculo pela instituição financeira; outras obrigações, garantias, forma de liquidação, obedecidas às disposições legais. A disposição legal deixa claro que é possível aquilo que a jurisprudência regularmente negava aos bancos com fundamento na falta de autorização legal: capitalização de juros, cumulação de multas, juros, honorários, obrigações acessórias [como por exemplo, a TAC (Tarifa de Abertura de Crédito), IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras) etc.]. Quanto à capitalização, vê-se que a cédula resolve problema que a jurisprudência sempre apontou nos demais títulos, com exceção das cédulas de crédito rural, comercial e industrial, os quais pelas disposições da Súmula 9334 do STJ e jurisprudência pacífica dos Tribunais sempre condicionaram a capitalização à previsão expressa de lei, ainda que o crédito fosse em benefício de uma instituição financeira. 7. Pode a instituição financeira promover ação de execução com base em extratos que

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devem ser elaborados segundo procedimento previsto no § 2.º, do art. 28 da Lei 10.931/2004. Porém, há imposição de pena à instituição financeira que cobrar em desacordo com os valores devidos, ficando obrigada a repetir em dobro, sem prejuízo de perdas e danos. Essa característica deve-se à identificação de que uma das razões dos altos juros praticados pelas instituições financeiras está associada à ineficiência das ações para recuperação de créditos. O procedimento executivo, com sua sumariedade e necessidade de penhora para apresentação de defesa, reduz o prazo das demandas recuperatórias. 35 A razão da inserção da regra foi combater a jurisprudência pacífica no sentido de não admitir a execução de contratos de abertura de crédito, em especial dos contratos de crédito rotativo e cartão de crédito, ainda que acompanhados de extratos bancários, afastando a incidência da Súmula 233 do STJ.36 Para parte da doutrina, com a Súmula 233 o "Sistema Financeiro ficou órfão, desamparado".37 Porém, a Súmula 233 foi o resultado de debate jurídico que já existia nos idos dos anos 80 e que não admite a fixação unilateral do crédito por uma das partes, por violar princípios superiores do ordenamento. Tampouco a cédula teve por objetivo melhorar a efetividade do processo, não se inserindo na linha das reformas processuais iniciadas a partir de 1994. A disposição, inegavelmente, retoma uma linha discutida há muito a respeito da cláusula solve et repete, pois confere à instituição financeira o poder de fixar unilateralmente o valor do crédito, ainda que mediante a elaboração de extratos e demonstrativos de cálculo. 8. Somente se admite endosso em preto, embora quem receba o título não precise ser instituição financeira, caso em que poderá, igualmente, exercitar todos os direitos decorrentes do título, inclusive juros e critério de capitalização. 9. Somente a via do credor é negociável. As demais são prova do contrato. 10. O título pode ser aditado e modificado, mediante documento em apartado, com os mesmos requisitos, devidamente datado, o qual será considerado como parte do título. 11. As garantias podem ser fidejussórias (aval, fiança civil ou fiança bancária), ou real sobre bens móveis ou imóveis, sejam bens futuros presentes, fungíveis ou infungíveis, consumíveis ou não, nos termos do art. 31 da Lei 10.931/2004. 12. A lei prevê formas de realização da garantia e de sua substituição. 13. A liquidez não é requisito essencial, pois nos termos do art. 40 da Lei 10.931/2004, sempre há possibilidade de recomposição automática do crédito rotativo. 14. Há possibilidade de protesto por indicação, eliminando um dos requisitos essenciais decorrentes do princípio da cartularidade.38 15. Dispensa do registro da cédula para eficácia das garantias, salvo eficácia contra terceiros.39 16. Possibilidade de emissão de certificado de cédulas de crédito bancário, com base nas cédulas mantidas em depósito, com a finalidade de facilitar a cessão de créditos40 no mercado de valores mobiliários. Isso permite que os créditos representados pela cédula de crédito bancários possam ser vendidos para fundos de investimento e até mesmo para

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outras instituições financeiras que tenham interesse em ficar com o risco da carteira de crédito, mediante determinado deságio. Trata-se de excelente mecanismo para o mercado de valores mobiliários, pois as instituições financeiras com vocação ao varejo, principalmente fornecimento de crédito ao consumo, mas que não tenham bom sistema de captação de recursos conseguem obter fundos mediante a cessão de tais créditos, realizando verdadeira operação de securitização, já que regra geral, aplicando-se o art. 914 do CC/2002, incidente no caso pela absoluta ausência de regras sobre endosso na Lei 10.931/2004, o endossante não garante o pagamento. Apresentadas, de maneira sintética, as características estruturais da regulamentação legal da cédula, é necessário estudar sua natureza jurídica, estrutura e respectiva funcionalidade. 3. Funcionalidade da cédula de crédito bancário

A funcionalidade da cédula de crédito bancário, por ser um título de crédito passa necessariamente pela história da letra de câmbio e dos títulos de crédito em geral. E, no que tange a estes, a sua marca está na diferenciação e distanciamento de seu regime jurídico comparativamente ao regime contratual. Enquanto o direito contratual sempre esteve apegado aos elementos substanciais que dão origem ao contrato, seja a vontade para o período da predominância da teoria da vontade, seja a causa ou a operação econômica subjacente, no período posterior à teoria preceptiva do negócio jurídico, os títulos de crédito adquiriram prestígio pela segurança jurídica decorrente da necessidade de preservação da declaração, baseada substancialmente no rigor formal. A preservação da natureza real (coisificação), eficácia estrita e unilateralidade da declaração tiveram sua formação ao longo de um período de mais de 300 anos (fase italiana, francesa e germânica), cujo aperfeiçoamento deu-se pelo pensamento de Vivante, que cristalizou nos princípios da cartularidade, literalidade, autonomia e abstração um princípio maior que é o do rigor cambiário, no qual a valorização da forma é essencial e vital. Não se desconhece a transformação dos meios de comunicação e a importância do comércio eletrônico.41 Porém, a preservação e proteção da forma dos títulos de crédito consistiu no mecanismo encontrado pelos comerciantes para garantir a segurança jurídica que os contratos não proporcionavam, tomando-se em conta que a forma não é somente uma veste extrínseca, mas um ato historicamente reconhecido.42 E, não há lugar no mercado no qual a segurança e agilidade sejam mais importantes que o sistema financeiro, o que historicamente pode ser identificado pelo nascimento da letra de câmbio como instrumento jurídico originalmente utilizado pelos banqueiros italianos. 43 A criação dos títulos de crédito teve papel fundamental para facilitar a circulação do crédito, como meio de pagamento (principalmente o cheque) e para ampliar a segurança jurídica ao credor, afastando-o do mar de incertezas derivados da cessão de créditos ou da execução dos contratos bilaterais.

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Mecanismo que privilegia a posição do credor, com base na concepção de que o crédito somente será dado com a certeza de retorno. Para isso, é preciso privilegiar o credor com instrumentos simples, eficazes e rápidos de recuperação do crédito. Os contratos praticados no mercado (para circulação de bens e serviços) são causais e bilaterais, o que impede a circulação que é propiciada por um instrumento abstrato e unilateral. Isso sem contar a desnecessidade de preservação da comutatividade, com todos riscos inerentes aos contratos bilaterais.44 Enquanto o sistema financeiro utilizava-se fundamentalmente do contrato de mútuo, sob as regras do Código Civil de 1916, que pela condição de contrato real também era unilateral,45 os títulos tradicionais serviam perfeitamente às finalidades do sistema financeiro. Porém, a diversificação dos produtos financeiros foi ampliada, tendo grande importância as diversas modalidades de contratos de abertura de crédito (crédito rotativo vinculado a conta com emissão de cheques, abertura de crédito vinculado a cobrança de títulos, abertura de crédito vinculado a contas com desconto de títulos, cartão de crédito, compror, vendor etc.). Todos esses instrumentos são de grande utilidade, seja no âmbito das relações de consumo como no âmbito do exercício de atividade econômica organizada. Essa proliferação de produtos foi uma das justificações postas na exposição de motivos da MedProv 2.160/2001, que apresenta os primeiros elementos para compreender para que serve a cédula de crédito bancário. Em outras palavras, traz elementos para compreender qual é sua função. A análise da finalidade da cédula de crédito bancário parte do pressuposto de que a busca da função de um determinado modelo jurídico é feita através da identificação da sua teleologia. Em outras palavras, uma análise funcional busca descobrir "para que coisa o direito serve" e não "como é feito o direito".46 E, a exposição de motivos tenta indicar essa finalidade ao situar historicamente a criação da cédula de crédito bancário, mediante referência expressa da cédula de crédito rural nascida no direito italiano na primeira metade do século XX: "Há muito tempo, o mercado financeiro necessita de um título de crédito que espelhe com realidade as relações jurídicas entre as instituições financeiras e seus clientes e que, principalmente, torne a formalização das diversas operações de crédito menos onerosa e complicada, conferindo maior flexibilidade e agilidade na mobilização do crédito, cumprindo assim, com a extraordinária função econômica para a qual foi concebida a primeira cédula, inspirada na legislação Italiana, especificamente na Cambiale Agrária, utilizada na concessão de crédito para a atividade agropecuária, matéria de que cuidou o Decreto-lei real n. 1.509, de 24 de julho de 1927 (que disciplinou o crédito agrário), regulamentado pelo Decreto Ministerial de 23 de janeiro de 1928, decreto esse que foi convertido na Legge 5 luglio 1928, n. 1.760."47 A linha histórica refere-se às cédulas de crédito rural, industrial, comercial e à exportação, reguladas respectivamente pelo Dec.-lei 167, de 14.02.1967, Dec.-lei 413, de 09.01.1969, Lei 6.313, de 16.09.1975 e Lei 6.840, de 03.11.1980, embora a primeira legislação a tratar sobre o tema no direito brasileiro tenha sido a Lei 492, de 30.08.1937.48 Em praticamente todos os casos pretéritos as cédulas de crédito foram associadas a linhas

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especiais de crédito, destinadas a segmentos preferenciais da atividade econômica, numa clara linha de intervenção do Estado na esfera econômica, para cumprir a sua função promocional. A cédula de crédito rural é voltada à política de financiamento à agricultura, servida por funding exclusivo, enquanto a cédula de produto rural é forma de forçar o mercado a fornecer o funding. O mesmo ocorreu com a cédula de crédito industrial, cédula de crédito à exportação e cédula de crédito comercial, cada uma buscando a realização de finalidades próprias segundo as políticas de Estado do momento. Esses títulos foram criados como instrumentos de política governamental e não propriamente como instrumentos jurídicos de mercado, pois visavam realizar políticas públicas, não obstante fossem destinados a regular relações intersubjetivas no plano do direito privado. Essa característica intervencionista foi uma marca das cédulas de crédito criadas ao longo da história, sempre voltadas à execução de políticas públicas de intervenção na ordem econômica, destoando da natureza descentralizada que sempre caracterizaram os modelos jurídicos do velho direito comercial. Nessa linha também se pode inserir a cédula de crédito bancário, como um instrumento criado pelo Poder Público para dotar as instituições financeiras de um mecanismo diferenciado para representação de seus créditos. O objetivo foi reduzir o spread bancário, os níveis de inadimplência dos contratos no âmbito do sistema financeiro nacional, para em longo prazo contribuir com o chamado grau de investimento da economia brasileira, a fim de torná-la atrativa ao arisco capital internacional. A esse respeito, é explícita a exposição de motivos da MedProv 1.925/99, que menciona expressamente o interesse de propiciar um instrumento flexível e menos oneroso às instituições financeiras. Porém, diferentemente dos títulos anteriores, na cédula de crédito bancário, a natureza contratual é berrante e talvez aberrante, pois o art. 28 da Lei 10.931/2004 descreve os requisitos do instrumento e as condições relativas à operação econômica que justifica a emissão da cédula, embora os próprios operadores do mercado considerassem tais cédulas como formas híbridas, pois eram "instrumentos capazes de, a um só tempo, representar título de dívida líquida e certa e contrato de mútuo pela possibilidade de inserção de cláusulas".49 Trata-se, portanto de um título causal, nada tendo de abstrato. Mais do que isso, a bilateralidade é admitida, já que a lei permite a emissão de cédula de crédito bancário para representar contrato de abertura de crédito. Não de garantia de abertura de crédito, mas de instrumento que representa o contrato de abertura de crédito, que é sinalagmático. Chama a atenção a exposição de motivos, no sentido de tentar carregar a cédula de crédito bancário para o sulco da tradição cambial: "as mesmas características consagradas para as diversas espécies, inclusive aquelas relativas às responsabilidades cambiais, só que unificado em modelo-padrão. Por essa razão, o projeto esforça-se por aplicar corretamente a terminologia da linguagem jurídica, definindo, claramente, a sua característica de título de crédito, mantendo a tradição consagrada no direito brasileiro, da literalidade (existência de uma obrigação independente da relação fundamental); da autonomia (as obrigações cambiais são

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autônomas e independentes uma das outras) como definido no art. 43 do Decreto 2.044, de 31 de dezembro de 1908 - Lei interna, princípio esse que foi mantido na Lei Uniforme, no art. 7.º do Anexo I; e da cartularidade (documento necessário ao exercício do direito que nele se contém, pois na clássica definição de Vivante, título de crédito é o documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo nele mencionado, definição essa acolhida mutatis mutandi pelo direito brasileiro, ex vi do disposto no art. 1.508 do Código Civil), conferindo-lhe liquidez e certeza e, enfim, possibilitando a sua transferência por endosso, total ou parcialmente, podendo constar, inclusive, o valor pela qual será transferida."50 Esqueceram-se dos princípios da abstração e da autonomia, já que não há possibilidade de se falar na livre circulação por endosso e inoponibilidade das exceções a partir de um contrato sinalagmático. Como já ensinou Ascarelli, a autonomia somente tem sentido se há abstração e unilateralidade das obrigações, tendo em vista a possibilidade de cumprimento de funções diversas nos vários casos em que o título possa ser emitido.51 Haroldo Duclerc Verçosa ao comentar a medida provisória já alertava pela aparente desatenção do legislador com a cartularidade, pois permitiu a alteração do título por meio de novo documento escrito, abandonando-se a clássica técnica do alongamento ou anexo, prevista no art. 13 da Lei Uniforme de Genebra, cujo objetivo foi a proteção da cartularidade, a fim de impedir os problemas relativos aos efeitos do título, em especial aos terceiros de boa-fé.52 Mas, a desconstrução do título de crédito não pára por aí, pois o art. 28, § 2.º, da Lei 10.931/2004 permite que o credor, a partir de uma declaração unilateral (extratos bancários e demonstrativos de cálculo) constitua o valor de seu próprio crédito, como se as instituições financeiras fossem dotadas de fé pública. Um verdadeiro direito potestativo, tal qual o do Estado de apurar e lançar o tributo, com a diferença de que a lei nada prevê sobre procedimentos para impugnação dos valores, tal como faz o art. 8.º da Lei das Duplicatas, cujo efeito é retirar a executoriedade do título. A lei estabelece uma sanção caso as instituições financeiras não respeitem a fé pública que lhes é outorgada, que é o pagamento em dobro, previsão do § 3.º, do mesmo artigo de lei. Não há, portanto, que se falar em literalidade, já que esta, segundo a clássica doutrina que vem desde Vivante, está associada ao rigor formal do título, cuja extensão dos direitos é conhecida, de plano, pela sua simples leitura. Além disso, a literalidade revela a data de criação, a praça de pagamento e, a partir destas, o próprio prazo de prescrição do título. Essas características afastam o documento de uma simples prova escrita para que nele seja incorporado o direito "literal e autônomo nele mencionado". Até é possível haver literalidade, funcionando a cédula de crédito bancário como se fosse uma nota promissória, se for preenchida com valor certo e data certa de pagamento. Não é possível, porém, considerar literal e, portanto, considerar a cédula de crédito bancário como título de crédito se nela não constar valor certo e data de pagamento, como são os casos das cédulas de crédito bancários elaboradas com fundamento no § 2.º do art. 28 da Lei 10.931/2004, que dependem de documentos elaborados unilateralmente pelo credor como são os extratos bancários e os demonstrativos de cálculo. Poder-se-ia usar o argumento que a duplicata mercantil também admite o saque e

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preenchimento unilateral do título, já que existe o aceite ficto. Porém, a situação é completamente diferente, pois o sacado assina o comprovante de recebimento da mercadoria entregue e descrita em fatura que contém todas as informações relativas ao contrato. Da mesma maneira no caso da duplicata de prestação de serviço, pois é necessário prova escrita do contrato e da prestação efetiva do serviço, nos termos do artigo 20, § 3.º, da Lei 5.474, de 18.07.1968. Além disso, o art. 7.º da Lei 5.474/68 torna obrigatória a apresentação da duplicata para aceite, podendo o título ficar pelo prazo de 10 dias nas mãos do sacado, período dentro do qual pode apresentar declaração com o conteúdo previsto no art. 8.º da mesma lei. Em tal caso a ação cambial não tomará o rito executivo, mas sim o rito ordinário, nos termos do art. 16 da Lei 5.474/68, valendo tal declaração como substitutiva do protesto. A diferença fundamental a esse respeito é que a duplicata é fruto da prática mercantil, dos usos e costumes e da própria vida econômica,53 enquanto a cédula é fruto do trabalho burocrático com um fim específico: dar tudo o que os bancos perderam pela longa e tortuosa construção jurisprudencial que nasceu com a recusa da cláusula solve et repete. E, em certa medida, a cédula de crédito bancário faz renascer a cláusula solve et repete banida pela jurisprudência e pela doutrina da década de 80, em face de sua similitude com a manus injectio. Tal cláusula, conforme doutrina da época viola a disposição constitucional do due process of law, já que permite que o credor unilateralmente declare seu crédito, independentemente de qualquer oportunidade de defesa e promova atos expropriatórios do patrimônio do devedor, no caso a penhora, necessária para que se apresente defesa em processo executivo. Considerava-se que a cláusula solve et repete violava a disposição do art. 333, I e II, do CPC, pois a convenção de redistribuição do ônus da prova tornava excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito, bem como violava a disposição, então irrenunciável do art. 153, § 4.º, da Constituição Federal de 1967, com redação dada pela EC 1/69, da pretensão à tutela jurídica.54 Por outro lado, tal disposição, segundo já foi alertado logo com a edição da medida provisória por Paulo Salvador Frontini, consiste numa indisfarçada cláusula mandato, já abolida pela jurisprudência e legislação pátrias como instrumento de garantia ao credor. No caso há concessão de "poderes legais (e não apenas contratuais, de um mandato) ao credor para, unilateralmente, apurar o saldo líquido a cargo do devedor, comunicá-lo e instrumentalizar-se para fins de protesto, execução processual ou pedido de falência".55 Somente no art. 28 da Lei 10.931/2004 é que se vê os requisitos formais da cédula de crédito bancário, o que, segundo a exposição de motivos, segue a linha das cédulas de crédito já incorporadas ao direito brasileiro.56 Porém, diferentemente de qualquer cédula de crédito regulada no direito brasileiro em data anterior, na cédula de crédito bancário há disposições tratando de um contrato, ou melhor, do contrato cujos efeitos somente serão produzidos se for obedecida a forma prevista no art. 28 da Lei 10.931/2004. Esse contrato, curiosamente pode ser unilateral ou bilateral e somente pode ser realizado por instituições financeiras. É, porém, de sua essência a natureza contratual, pois a própria norma repete no art. 27, de maneira insistente quais são os requisitos do pacto, que não

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pode ser interpretado de outra maneira que a de um negócio jurídico bilateral que cria direitos e obrigações: um contrato. E, sendo um contrato, não há como afastar a incidência do art. 421 do CC/2002, aplicando-se a esse contrato típico a cláusula geral da função social dos contratos. As conseqüências da aplicação da regra do art. 421 do CC/2002 e o conteúdo da função social dos contratos não estão no propósito deste artigo, mas somente o exame de sua incidência, que em síntese exige a adequação da funcionalidade do negócio jurídico aos fins para os quais o princípio da liberdade contratual é positivado no ordenamento jurídico pátrio.57 Ou seja, a única semelhança estrutural e funcional com as demais cédulas previstas no direito brasileiro está na denominação. Veja-se que o único caso em que no título não há uma declaração de quantia líquida e certa está no art. 3.º do Dec.-lei 167/67. Porém, o mesmo dispositivo prevê orçamento firmado por ambas as partes, ao qual fica vinculada a cédula, devendo constar no título, por força do art. 10, a quantia que ela representa. 4. Conclusão

Do estudo realizado, chega-se a conclusão que não é possível considerar como título de crédito líquido e certo ou título executivo extrajudicial o contrato bilateral de abertura de crédito, tendo em vista que, em última análise não há permissão constitucional para que legislador autorize que os particulares exercendo atos no âmbito de sua autonomia criem obrigações para terceiros. Não há autorização da Constituição Federal para que o legislador conceda aos particulares o direito potestativo de criar obrigações a partir de sua declaração voluntária, tal qual o poder que se concede ao Estado e às pessoas jurídicas de direito público para constituírem créditos.58 Pelo contrário, a autonomia privada concede o poder de os particulares auto-regular suas relações, dando-se regras a si próprios. Vinculado ao poder geral de autodeterminação (liberdade da pessoa em decidir o seu destino, conforme suas preferências), a autonomia privada trata da liberdade de autovinculação, de constituição de relações jurídicas a partir de atos autônomos e não heterônomos. 59 Jamais a autonomia privada pode ser interpretada como instrumento para que um particular imponha regras sobre terceiros. Porém, o art. 28 e parágrafos da lei em comento fazem uma espécie de delegação legislativa, estabelecendo o procedimento que as instituições financeiras precisam seguir para poderem exercer tal poder e realizar ato heterônomo vinculativo de terceiro, verdadeiro ato de autoridade. O princípio da autonomia privada, que decorre dos arts. 5.º, I, XIII, XVII e XXXVI e 170 da CF/198860 fica aleijado, sendo suprimido pela possibilidade de criação de obrigações a partir de atos unilaterais das instituições financeiras. Quanto à idoneidade dessas, não se pode discutir, mas o número de intervenções, liquidações extrajudiciais e de processos de responsabilidade dos administradores perante o próprio Banco Central do Brasil, ou mesmo de sentenças condenatórias a obrigação de

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reparação de danos que constam nos tribunais indicam que são pessoas como todos os demais cidadãos brasileiros, não se podendo dar fé pública a elas. De qualquer maneira, quando a lei atribui às instituições financeiras uma espécie de fé pública, como no caso da emissão de certificado de depósito de ações previstas no art. 27 da Lei 6.404/76, tal atividade só pode ser exercida em benefício de terceiro, jamais em benefício próprio. Além disso, a fixação unilateral da quantia devida, ainda que com base em extratos ou demonstrativos de cálculo, viola os princípios do devido processo legal e da ampla defesa, pois a possibilidade de defesa somente ocorrerá após a oposição de embargos, sem prejuízo da constrição patrimonial.61 A esse respeito, embora sem posição firme, o Superior Tribunal de Justiça negou recurso especial interposto contra decisão que considerou ausentes a liquidez e certeza de cédula de crédito bancário, não obstante a afirmação expressa do art. 28 da Lei 10.931/2004, tendo reconhecido na mesma decisão a sua natureza contratual.62 Quanto a esse ponto, a lei instituidora da cédula de crédito bancário viola o substantial due process of law,63 pois a norma tem caráter contraditório e teratológico, não obedecendo aos princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade no ponto em que atribui as características de literalidade e liquidez, quando os parágrafos do art. 28 da Lei 10.931/2004 mencionam como a instituição financeira deve apurar o quantum, fixando, inclusive, pena pela fixação equivocada desse quantum. Embora não se possa negar a soberania do legislador, este não pode ser arbitrário ao ponto de distorcer o próprio significado da linguagem, para dizer que é líquido o que evidentemente não é. Quando o legislador tenta mudar a linguagem, subvertendo a lógica inerente à própria cultura e a todo o conhecimento acumulado, inclusive invariantes axiológicas que estão por detrás da construção do conceito, há evidente violação do substancial due process of law, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal 64 na esteira da tradição democrática trilhada pela Suprema Corte norte-americana. As experiências históricas da postura do legislador nesse sentido são conhecidas, pois há pouco mais de 100 anos seres humanos que não tinham a cor da pele branca não eram considerados pessoas. Embora o exemplo histórico possa ser radical ele é elucidativo sobre os limites do legislador na definição do conteúdo das regras que regulam as relações entre os particulares. Embora o legislador possa modificar conceitos, não pode fazê-lo ao arrepio do texto constitucional, das invariantes axiológicas, da lógica e da própria cultura em que está inserido o modelo jurídico. Exemplo recente disso é o debate que ocorre nos países da comon law a respeito dos limites do legislador na fixação das normas privadas mesmo sem uma constituição formal.65 Isso não significa que a lei é inconstitucional ou que a cédula não é um título que serve aos seus fins. Somente não serve para representar contratos bilaterais, sendo excelente instrumento para representar contratos unilaterais celebrados no âmbito dos contratos bancários, desde que o quantum fixado por ela seja declarado no próprio título. O mesmo destino não se pode dizer dos parágrafos do art. 28 da Lei 10.931/2004, cuja inconstitucionalidade é evidente. Indiscutivelmente não se pode prescindir da cédula de crédito bancário pela sua

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versatilidade e funcionalidade. Porém, para que não haja violação aos direitos fundamentais supramencionados é preciso que ela seja representativa de quantia certa, já definida pelo emitente no momento em que a cédula seja firmada. E, tendo natureza contratual, submete-se aos efeitos do art. 421 do CC/2002 (função social dos contratos), bem como às regras do Código de Defesa do Consumidor, isto se a relação não for tipicamente empresarial, conforme recente decisão do Supremo Tribunal Federal. 66 5. Referências bibliográficas

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com o desenvolvimento do país, com o crescimento da sua atividade produtiva ou, contrariamente (se os juros são excessivamente altos), com o empobrecimento e com as dificuldades da atividade produtiva, pois é favorecida a especulação, e a roda da ciranda financeira se põe a girar em detrimento da produção. Subjacente a perspectiva macrojurídica está a idéia de justiça distributiva. Admite-se que o direito privado não se esgota nas relações privadas intersubjetivas, mas mantém relações diretas e reflexas com a comunidade, lócus de atuação dos interesses meta individuais ou transubjetivos". (p. 245). 3. Ferramentas no sentido utilizado por HESPANHA, António Manuel. Panorama histórico da cultura jurídica europeia. Lisboa: Europa-América, 1997, p. 26 e 27: "a tradição não representa um resultado, um valor, uma norma; mas uma série de ferramentas (...) com as quais são produzidos novos resultados. Na verdade, o trabalho de produção de novos efeitos jurídicos (novas normas, novos valores, novos dogmas) é levado a cabo com ferramentas recebidas da tradição: ferramentas institucionais (instituições, papéis sociais), ferramentas discursivas (linguagem técnica, tópicos, modelos de argumentação e de prova, conceitos e dogmas), ferramentas comunicacionais (bibliotecas, redes acadêmicas ou intelectuais). É desta forma que o passado modela o presente. Não pela imposição directa de valores e de normas, mas pela disponibilização de uma grande parte da utensilagem social e intelectual com que se produzem novos valores e novas normas". 4. A busca da função está relacionada ao aspecto causativo: "Ela assume uma disciplina segundo a sua causa, a qual é expressão da sua disciplina: o aspecto funcional e aquele causativo exprimem a mesma exigência, isto é, individuar e completar uma relação entre situações subjetivas. O credor, segundo seja a causa uma ou outra, tem, ou não, determinados poderes, obrigações (...)". PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil. Introdução ao direito civil constitucional. 2. ed. Trad. Maria Cristina de Cicco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 117. 5. Ver JHERING, Rudolf von. A finalidade do direito. Edição histórica. Trad. José Antônio Faria Correa. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1979; Idem. Do lucro nos contratos e da suposta necessidade do valor patrimonial das prestações obrigatórias. Questões e Estudos de Direito. Campinas: LZN, 2003; CIMBALI, Enrico. Opere complete. Turim: Unione Tipográfico Editrice Torinese, 1907; GOMES, Orlando. Lineamentos gerais do anteprojeto de reforma do Código Civil. Revista Forense, v. 206, 1964; Idem. Transformações gerais do direito das obrigações. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980; BETTI, Emilio. Negozio giuridico. Novíssimo Digesto Italiano, Torino: Unione Tipografico-Editrice Torinese, 1977, p. 209 e ss. ASCARELLI, Tullio. Panorama do direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1947; DUGUIT, Leon. Las transformaciones generales del derecho privado desde el Código de Napoleón. 2. ed. Madrid: Francisco Beltran, Librería española y extranjera, 1920, p. 69-74; RENNER, Karl. Gli istituti del diritto privato e la loro funzione giuridica. Un contributo alla critica del diritto civile. Bolonha: Società editrice il Mulino, 1981. Tradução da edição de 1929, por Cornelia Mittendorfer. Realizei estudo sobre as origens doutrinárias da função social dos contratos na obra As origens doutrinárias e a interpretação da função social dos contratos no Código Civil brasileiro, tese de doutorado defendida em junho de 2006 na UFRGS, no prelo, a ser publicada pela Editora Saraiva, São Paulo, em 2008.

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6. Modelo no sentido que já abordamos no livro BRANCO, Gerson Luiz Carlos; MARTINS-COSTA, Judith. Diretrizes teóricas do Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002. 7. "Capítulo IV. Do Sistema Financeiro Nacional. Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: I - a autorização para o funcionamento das instituições financeiras, assegurado às instituições bancárias oficiais e privadas acesso a todos os instrumentos do mercado financeiro bancário, sendo vedada a essas instituições a participação em atividades não previstas na autorização de que trata este inciso; II - autorização e funcionamento dos estabelecimentos de seguro, previdência e capitalização, bem como do órgão oficial fiscalizador e do órgão oficial ressegurador; III - as condições para a participação do capital estrangeiro nas instituições a que se referem os incisos anteriores, tendo em vista, especialmente: a) os interesses nacionais; b) os acordos internacionais; IV - a organização, o funcionamento e as atribuições do banco central e demais instituições financeiras públicas e privadas; V - os requisitos para a designação de membros da diretoria do banco central e demais instituições financeiras, bem como seus impedimentos após o exercício do cargo; VI - a criação de fundo ou seguro, com o objetivo de proteger a economia popular, garantindo créditos, aplicações e depósitos até determinado valor, vedada a participação de recursos da União; VII - os critérios restritivos da transferência de poupança de regiões com renda inferior à média nacional para outras de maior desenvolvimento; VIII - o funcionamento das cooperativas de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação próprias das instituições financeiras. § 1.º. A autorização a que se referem os incisos I e II será inegociável e intransferível, permitida a transmissão do controle da pessoa jurídica titular, e concedida sem ônus, na forma da lei do sistema financeiro nacional, a pessoa jurídica cujos diretores tenham capacidade técnica e reputação ilibada, e que comprove capacidade econômica compatível com o empreendimento. § 2.º. Os recursos financeiros relativos a programas e projetos de caráter regional, de responsabilidade da União, serão depositados em suas instituições regionais de crédito e por elas aplicados. § 3.º. As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar." (Redação original, posteriormente modificada pela EC 13/96 e revogada pela EC 40/2003) 8. O Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal contém comando expresso ao legislador: "Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor." Além dessa regra, a Constituição Federal determina a proteção do Consumidor nos arts. 5.º, XXXII, 150, § 5.º, e 170, V, CF/1988. 9. Apesar da controvérsia a respeito da terminologia do modelo jurídico previsto no art. 6, V, do CDC, em especial as observações da Professora MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 288 e ss., p. 904, 912, 914 e ss., para quem o instituto da lesão pelo seu caráter subjetivo não coincide com a disciplina da disposição legal em comento, optou-se por usar tal expressão Página 20

em razão de que a concepção de lesão em exame não se confunde com a do Código Civil, tendo a objetividade que marcou a lesão no período anterior ao Código Civil de 1916, não obstante a diferente matriz histórica. É certo, porém, que tal regra não se esgota na lesão, tendo em vista que é dirigida tanto para a fase da formação, quanto da execução do vínculo contratual. Não se pode deixar de mencionar duas obras de referência a respeito do tema; a primeira, o principal clássico brasileiro a respeito da lesão que é a obra de PEREIRA, Caio Mário da Silva. Lesão nos contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999, e outra, recente, mas não menos importante, BECKER, Anelise. Teoria geral da lesão nos contratos. São Paulo: Saraiva, 2000. 10. STF, ADIn 4, Pleno, rel. Min. Sydney Sanches, j. 07.03.1991, DJU 25.06.1993: "5. Como o parecer da Consultaria Geral da República (SR 970, de 06.10.1988, DO 07.10.1988), aprovado pelo Presidente da República, assumiu caráter normativo, por força dos artigos 22, § 2.º, e 23 do Dec. 92.889, de 07.07.1986, e, ademais, foi seguido de circular do Banco Central, para o cumprimento da legislação anterior Constituição de 1988 (e não do § 3.º do art. 192 desta última), pode ele (o parecer normativo), sofrer impugnação, mediante ação direta de inconstitucionalidade, por se tratar de ato normativo federal (art. 102, I, a, da CF/1988). 6. Tendo a Constituição Federal, no único artigo em que trata do Sistema Financeiro Nacional (art. 192, CF/1988) estabelecido que este será regulado por lei complementar, com observância do que determinou no caput, nos seus incisos e parágrafos, não é de se admitir a eficácia imediata e isolada do disposto em seu § 3.º. sobre taxa de juros reais (12% ao ano), até porque estes não foram conceituados. Só o tratamento global do Sistema Financeiro Nacional, na futura lei complementar, com a observância de todas as normas do caput, dos incisos e parágrafos do art. 192, é que permitirá a incidência da referida norma sobre juros reais e desde que estes também sejam conceituados em tal diploma. 7. Em conseqüência, não são inconstitucionais os atos normativos em questão (parecer da Consultoria Geral da República, aprovado pela Presidência da República e circular do Banco Central), o primeiro considerando não auto-aplicável a norma do § 3.º sobre juros reais de 12% ao ano, e a segunda determinando a observância da legislação anterior à Constituição de 1988, até o advento da lei complementar reguladora do Sistema Financeiro Nacional." 11. As decisões que reduziam os juros com base no argumento da usura real, que caracteriza a lesão e a incidência do art. 51, IV, do CDC tem fundamento na desproporcionalidade e iniqüidade de juros em patamares elevados, como se pode ver no acórdão 70007458326 do TJRS (15.º Câm. Cív., rel. Ricardo Raupp Ruschel, j. 17.03.2004), bem como de decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, deixando de conhecer a matéria por falta de prequestionamento, verbis: "Considerou o Tribunal, ao limitar os juros, a ocorrência de lesão ao consumidor decorrente do desequilíbrio contratual prejudicial ao mesmo, o que caracterizou a abusividade da disposição contratual. Esses fundamentos do acórdão não foram impugnados no especial, insistindo o recorrente apenas na aplicação da lei específica, 4.595/64, que afasta a limitação. Inatacado o principal fundamento do acórdão, mantém-se a limitação". (STJ, 3ª T., AgRg no AgIn 423.203-RS, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 02.04.2002, DJU 27.05.2002, p. 172). 12. Até mesmo a boa legibilidade do carimbo de protocolização dos recursos extremos é Página 21

considerada como pressuposto de admissibilidade dos recursos, à revelia da lei e das disposições constitucionais que tratam do devido processo legal. Embora o Supremo Tribunal Federal tenha adotado a teoria do substantial due process of law, para afastar decisões judiciais teratológicas, a ilegibilidade de um carimbo produzido pelo próprio Poder Judiciário acaba sendo mais um percalço aberrante, entre outros, ao exame de admissibilidade dos recursos, sob a justificativa de excesso de volume de processo nos Tribunais. 13. Além do projeto de lei, o BACEN também foi o responsável pela elaboração da medida provisória. GOLDFAJN, Illan. Transformações em curso no sistema financeiro, mar. 2002, disponível em:[www.bacen.gov.br], acesso em: 21.11.2006. 14. A aplicação do texto legal já teve início pelo Superior Tribunal de Justiça, como se vê de uma de suas primeiras decisões a respeito da matéria: REsp 647.580-RS, Proc. 2004/0040520-5, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª T., j. 14.12.2004, DJU 18.04.2005, p. 328. "Recurso especial. Cédula de crédito bancário. Comissão de permanência. 1. Na cédula de crédito bancário, regida atualmente pela Lei 10.931, de 02.08.2004, que revogou a MedProv 2.160-25, de 23.08.2001, está em vigor até a edição da referida lei por força do art. 2.° da EC 32, de 11.09.2001, é permitido o pacto e a conseqüente cobrança da comissão de permanência para o período da inadimplência, não cumulada com correção monetária, nem com os juros remuneratórios, calculada à taxa média dos juros de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada, entretanto, à taxa pactuada no contrato (Súmula 254 da Corte). 2. Recurso especial conhecido e provido". No Superior Tribunal de Justiça pode-se encontrar decisões que não alteram decisões proferidas pelos Tribunais Estaduais, como a que a seguir é transcrita. Porém, trata-se de decisão de não conhecimento do recurso com fundamento na ausência de competência, nos termos da Súmula 7 do STJ: AgRg no AgIn 640.483-SP, Proc. 2004/0159353-4, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4ª T., j. 12.04.2005, DJU 09.05.2005, p. 421. "Agravo regimental. Agravo de Instrumento. Título exeqüendo. Cédula de crédito bancário. Ausência requisitos certeza e exigibilidade. Reversão. Impossibilidade. Incidência súmulas 5 e 7/STJ. 1. O Tribunal de origem, com base na prova dos autos, entende estarem ausentes os requisitos de certeza e liquidez do título exeqüendo, demandando a reversão do julgado, necessariamente, o reexame do conjunto fático-probatório e interpretação do contrato firmado entre as partes, atraindo a censura das súmulas 5 e 7/STJ. 2. Agravo regimental desprovido". 15. Tendo em vista a mudança das regras a respeito da edição, aprovação e conversão em lei das medidas provisórias, foi entendida a eficácia das medidas provisórias que vinham sendo reeditadas, independentemente de nova reedição: "Art. 2.º. As medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional". 16. FRONTINI, Paulo Salvador. Cédula de crédito bancário - análise do título de crédito criado pela Medida Provisória 1.925 (DOU 15.10.1999 e reedições). Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 119. São Paulo, 2000, p. 53.

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17. "The IMF moved quickly to set up a loan package, but domestic politics (including the timing of presidential and gubernatorial elections and the relationships between the central and state governments) delayed negotiations. Finally, in December 1998 Brazil signed a $ 41.5 billion financial assistance package. The IMF program gave the financial sector time to reduce its exposure in Brazil. It was soon overtaken by events, however, as monetary policy failed to prevent a collapse of the exchange rate. Capital outflows, lack of fiscal progress, strong resistance by the domestic business community to the record high interest rates, and growing demands for correction of the overvalued exchange rate forced the government to adopt a new exchange rate regime. Thus, the real was let free to float on January 15, and by the end of February it had depreciated by more than 35 percent. (...) Following the inflationary shock of the mid-January devaluation, inflation immediately increased, pushing real interest rates down. The Central Bank reacted by increasing interest rates that, by March 1991, became extraordinarily high. As inflationary expectations fell, nominal interest rates were allowed to decline. This strategy successfully shifted the economy from a potentially explosive situation to a path of steadily declining inflation, allowing real interest rates to fall gradually." CARDOSO, Eliana. Implicit and explicit taxation of financial intermediaries in Brazil: the effect of reserve requirements on bank spreads. Georgetown University. Paper prepared for the April 8th, 2002 World Bank conference on Taxation of Financial Intermediaries, 27.03.2002, disponível em:[ www.worldbank.com], acesso em: 21.11.2006, p. 11. 18. "During the last 20 years, Brazil took long strides on the path to financial liberalization. Successive governments reduced credit controls, rationalized reserve requirements, removed all interest rate ceilings on deposits in 1979, reduced barriers to entry after 1991, and liberalized controls on international capital flows during the 1990s. The path of reforms accelerated after 1995, when the government closed or privatized 10 state banks. Between mid-1994 and mid-2001, the share of public banks in total assets of the banking sector fell by 65 percent, while the share of foreign institutions increased four times. Loans from the financial system to the public sector practically disappeared." CARDOSO, Eliana. Implicit and explicit taxation of financial intermediaries in Brazil, cit. 19. A necessidade de fortalecimento esteve associada a identificação de extrema fragilidade do sistema financeiro no período posterior ao Plano Real, quando o Banco Central do Brasil interveio em mais de 140 instituições financeiras, sendo 51 bancos, entre eles dois grandes bancos, que foram o Banco Econômico e Banco Nacional, fato que acabou gerando o tão questionado Proer, com injeção de mais de 50 bilhões de reais no sistema financeiro, para o seu saneamento, a fim de evitar colapso equivalente ao ocorrido na Argentina, em que a crise de liquidez do sistema provocou perda superior a 40% do PIB. CARDOSO, Eliana. Implicit and explicit taxation of financial intermediaries in Brazil, cit., p. 18. 20. "Risco sistêmico é aquele em que a inadimplência de uma instituição para honrar seus compromissos contratuais pode gerar uma reação em cadeia, atingindo grande parte do sistema financeiro." DATZ, Marcelo Davi Xavier da Silveira. Risco sistêmico e regulação bancária no Brasil. Dissertação de Mestrado apresentada na Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2002, sob orientação de Renato Fragelli Cardoso, acessado em:[www.bacen.gov.br], em 21.05.2007. Página 23

21. THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro. Disponível em:[www.americajurídica.com.br], acesso em: 21.11.2006. 22. Idem, ibidem. 23. "High taxation levels and the costs of non-performing loans also affect bank spreads between interest rates on deposits and interest rates on loans." CARDOSO, Eliana. Implicit and explicit taxation of financial intermediaries in Brazil, cit., p. 2, 14 e 23. 24. Resolução 2.682, de 21.12.1999, editada pelo Conselho Monetário Nacional. 25. THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. 26. "Seria impensável um banco moderno que tivesse de pactuar todos os seus empréstimos por meio de contratos ordinários de mútuo ou que, para receber seu crédito, tivesse de sujeitar-se às delongas e incertezas da ação ordinária de cobrança. Não é que juridicamente isto não pudesse mais ser praticado entre banqueiros e clientes. A verdade é que o mercado atual, como um todo, não suportaria um sistema tão emperrado e anacrônico como esse. As operações bancárias se reduziriam em proporções assustadoras e o custo das que conseguisse implementar seria tão elevado, que desestimularia os empréstimos e logo conduziria a uma estagnação econômica que o modus vivendi de nosso tempo não aceitaria e, com a qual, não teria mesmo condições de conviver sem traumas cujas dimensões nem sequer se tem como prever." THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. 27. A elevação das taxas de juros como mecanismo para controle da inflação tem origem na experiência da hiperinflação alemã de 1923, "em que a elevação das taxas de juro foi o remédio eficazmente utilizado para combater a especulação cambial". SALOMÃO, Miguel. Sistema financeiro. Anais do simpósio sobre as condições gerais dos contratos bancários e a ordem pública econômica. Promoção do Tribunal de Alçada do Paraná realizado em agosto de 1988. Curitiba: Juruá, 1998, p. 16. 28. "Lending rates ought to benefit from the fall both of raising rates (accompanying the Selic) and bank spreads. The spreads are directly related to the risk premium, compulsory reserve requirements and delinquency expenses (amongst other factors) and all of these factors will tend to decline in 2004: delinquency, thanks to the partial recovery of real income and the increase of employment. Furthermore, the possibility of the consolidation of some institutional advances, such as the new Bankruptcy Law and conversion to Law of the Provisional Measure that introduced the bank credit note (cédula de crédito bancário), may also lead to a decline of the spreads by reducing delinquency-related costs." The brazilian economy - performace and prospect. In:[www.cni.org.br], acesso em: 16.05.2005. 29. Além destas medidas, pode-se indicar as seguintes: patrimônio de afetação (garantia Página 24

para os bancos), lei de falências, cédula de crédito hipotecário, warrant rural, etc. 30. ABRÃO, Carlos Henrique. Cédula de crédito bancário. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2005, p. 3, 4 e 6. 31. Idem, ibidem, p. 12-17. 32. A respeito da chamada crise das garantias a solução que há muito vem sendo apontada pela doutrina não é propriamente a de subverter os princípios do direito privado, mas de encontrar mecanismos que há muito já vêm sendo utilizados no direito comparado. FRADERA, Véra. Os contratos autônomos de garantia. Revista Ajuris, v. 53. Porto Alegre, 1992, p. 238-251. HUCK, Hermes Marcelo. Garantia à primeira solicitação no comércio internacional. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, n. 84, 1991, p. 5 e ss. 33. A respeito da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, em especial sobre a relação entre estes e a autonomia privada, ver STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 186-229. 34. Súmula 93 do STJ: "A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros." 35. "It attributes this lack of efficiency to the low ability of creditors to enforce claims. Courts, it is argued, are inefficient. Dakolias (1999) shows that there are 2,975 cases pending per judge in Brasília and 3,129 in São Paulo, compared to 58 in Singapore and 244 in Hungary. The time taken to resolve a case (number of cases pending at the start of the year divided by the number of cases resolved during this year) is 1.9 years in Brasília and 1.6 years in São Paulo, compared to 0.04 years in Singapore and 0.5 years in Germany. Pinheiro and Cabral (1999) estimate that a judicial execution to recover a creditor claim can take between one and ten years." CARDOSO, Eliana. Implicit and explicit taxation of financial intermediaries in Brazil, cit. 36. Apesar de certa controvérsia a partir de 1988 em torno da possibilidade de execução e do princípio do devido processo legal, a matéria acabou sendo pacificada no Superior Tribunal de Justiça, pela já mencionada Súmula 233, no ano de 1999, cujo texto é o seguinte: "o contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extratos da conta corrente, não é título executivo". 37. "Inspirando-se nas cédulas de crédito já reguladas em leis anteriores, a MP 1.925/99 (atual MP 2.160-25/2001) criou a cédula de crédito bancário como título de crédito, ou seja, documento escrito, cujo conteúdo e forma são rigorosamente prescritos pela lei, capaz de circular com segurança e preservando a boa-fé daqueles que o adquirem, e de conferir a seu titular ação executiva para receber o crédito nele mencionado. A opção do Executivo Federal foi sábia em razão das extensas semelhanças que unem essas subespécies de títulos de crédito, peculiares pelo fato de poderem abrigar como negócio jurídico subjacente operações de crédito que se protraem no tempo, através de prestações periódicas que diminuem o saldo devedor declarado no título e de novas liberações de Página 25

recursos que recompõem o limite do crédito, dito, por isso, rotativo. Nada mais razoável, e mesmo racional, que se valesse o Estado de um instrumento jurídico testado e aprovado pelo mercado e pelo Judiciário, e plenamente adequado às características concretas das volumosas operações de abertura de crédito. Ademais, a criação de mais uma espécie de título de crédito dotado de força executiva insere-se no contexto político que tem favorecido, há décadas, a efetividade e a celeridade da prestação jurisdicional, e que, mais recentemente, tem motivado amplas reformas no Código de Processo Civil. Com efeito, o consenso sobre ser a execução o meio de realizar a concreta tutela jurisdicional provocou uma permanente revisão do direito positivo no último século, em busca de rever as regras processuais pertinentes ao processo de execução. A preocupação do legislador tem sido empregá-lo na programação traçada para impregnar o processo civil brasileiro do caráter de efetividade, de maneira cada vez mais adequada à consecução do objetivo máximo da jurisdição, que é o de proporcionar ao titular do direito subjetivo sua completa e real satisfação em qualquer conjuntura litigiosa." THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. 38. Observe-se que a possibilidade de protesto por indicação sempre existiu, mas somente naqueles casos como o previsto no artigo 31 do Dec. 2.044, de 31.12.1908 (vigente nesta parte por ter a Lei Uniforme sido objeto de reservas) e no art. 13, § 1.º, da Lei 5.474/68 (Lei das Duplicatas). Segundo tais disposições legais se pode protestar por indicação o título por falta de restituição. Com a nova lei, ficam estendidos para a cédula de crédito bancário os efeitos previstos no art. 8.º, parágrafo único, da Lei 9.492/97, que disciplina o protesto, tendo por conseqüência a possibilidade de remessa do apontamento do título para protesto por meio eletrônico. 39. Essa regra gerou um grande debate pelos lobistas dos dois grandes setores envolvidos, os representantes do setor notarial, a quem interessava o registro de tais contratos e os representantes do sistema financeiro nacional, para quem o registro somente tem uma razão de ser, que é o substancial aumento do custo administrativo. Neste aspecto o princípio adotado contém certa similitude com o princípio da operabilidade consagrado no Código Civil, pois não há razão prática que justifique tais registros, principalmente em razão da forte expansão das operações de crédito ao consumo, em que os preços dos bens financiados são de pequena monta. 40. Embora se use a expressão cessão, por ser a expressão comum nas normas do Banco Central do Brasil (cessão com co-obrigação ou cessão sem co-obrigação), a regular forma de transferência do título se dá por meio de endosso. Porém, trata-se de um endosso ficto, já que para a circulação dos valores mobiliários perante o mercado é necessário o registro na Cetip - Câmara de Custódia e Liquidação, na Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia ou mesmo no órgão de registro da Bolsa de Valores, na forma do art. 60 e ss. da Resolução 2.690, de 28.01.2000, do Conselho Monetário Nacional, cuja transferência é feita por mero lançamento eletrônico. 41. A esse respeito, inclusive sobre os perigos do comércio eletrônico e sobre a impossibilidade de adoção da "visão simplista de que a temática concernente aos negócios eletrônicos pode ser resolvida pela adoção de uma nova lex mercatoria", ver SANTOLIM, Cesar Viterbo Matos. Os princípios de proteção do consumidor e o comércio eletrônico no Página 26

direito brasileiro. Revista de Direito do Consumidor, n. 55. São Paulo: Revista dos Tribunais, jul.-set. 2005, p. 53-84. Veja-se também uma perspectiva apresentada por Véra Fradera a respeito das transformações no direito contratual sob influência do mesmo fenômeno FRADERA, Véra Maria Jacob de. O direito dos contratos no século XXI: a construção de uma noção metanacional de contrato decorrente da globalização, da influência regional e sob influência da doutrina comparatista. In: DINIZ, Maria Helena. O direito civil no século XXI. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 547-570. 42. IRTI, Natalino. Studi sul formalismo negoziale. Padova: Cedam, 1997, p. 104. "la forma del contratto è espressione ellittica, che sta per forme delle due o più decisioni prese dalle parti (...) La forma non viene più in rilievo come requisito di um faciendum, ma di um factum: di um fatto di ieri, riconstruitto e ripensato nell'oggi". (p. 108 e 112) 43. A respeito da história dos títulos de crédito ver: ASCARELLI, Tullio. Teoria geral dos títulos de crédito. São Paulo: Saraiva, 1969; BORGES, João Eunápio. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 1971, p. 35 e ss.; FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1962. v. 8, p. 123 e ss. 44. Não se confunda negócio jurídico bilateral com contrato unilateral. Os contratos são subjetivamente bilaterais, pois formados a partir de duas declarações receptícias, embora possam existir contratos objetivamente unilaterais, nos casos em que a prestação cabe somente a uma das partes, como é o caso do mútuo, comodato, doação pura etc. 45. Segundo os arts. 586 e 587 do CC/2002, o mútuo financeiro perfectibiliza-se com a tradição do dinheiro, razão pela qual não há obrigações para o mutuante, mas somente para o mutuário, o que lhe torna um contrato unilateral. 46. BOBBIO, Norberto. Dalla struttura alla funzione. Milão: Edizioni di Comunità, 1977, p. 63: "In parole povere, coloro che si sono dedicati alla teoria generale del diritto si sono preoccupati nolto di più sapere 'come il diritto sia fatto' che 'a che cosa serva'". 47. THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. 48. Histórico interessante é o apresentado por THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. "A partir do final da década de 30, quando o governo resolveu incrementar o financiamento da produção agropecuária do país, o contrato de abertura de crédito com garantia de penhor rural foi o grande instrumento jurídico utilizado para implemento da política creditícia oficial. Esses contratos, amparados na Lei n. 492, de 30.08.1937, sempre gozaram da força executiva, muito embora não fossem instrumento de mútuo, e sim de abertura de crédito. As execuções, desde então, baseavam-se no conjunto do contrato de abertura de crédito e na conta gráfica da utilização do numerário posto à disposição do creditado. Essa prática foi intensivamente observada pelas Carteiras de Crédito Agrícola do Banco do Brasil e de outros estabelecimentos de crédito engajados no sistema de assistência creditícia aos produtores rurais, durante duas décadas, sem que ninguém pusesse em dúvida a força executiva dos contratos utilizados. A liquidez e exeqüibilidade de tais títulos eram tão Página 27

evidentes, que o exemplo do crédito rural foi logo transplantado para o financiamento da indústria, tendo sido criados vários tipos de penhor industrial para garantir contratos de abertura de crédito similares aos que primeiramente se conceberam para a atividade campesina". 49. SALOMÃO, Miguel. Sistema financeiro, cit., p.17. 50. THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit. 51. ASCARELLI, Tullio. Corso de diritto commerciale. Introduzione e teoria dell'impresa. Milano: Giuffrè, 1962, p. 420. 52. VERÇOSA, A. D. Op. cit., p. 133. 53. Com essa afirmação não se ignora a importância fiscal que em determinado período da história assumiu a duplicata, como nota assinada. Porém, o Estado ao regulamentar a matéria respeitou as regras que a cultura mercantil implantou nas relações intersubjetivas. 54. MALACHINI, Edson Ribas. Cláusula solve et repete nos contratos bancários. Anais do simpósio sobre as condições gerais dos contratos bancários e a ordem pública econômica, cit., p. 129-145. 55. FRONTINI, Paulo Salvador. Op. cit., p. 62. 56. Exposição de motivos citada por THEODORO JR., Humberto. A cédula de crédito bancário como título executivo extrajudicial no direito brasileiro, cit.: "(...) Em razão da exigência de forma certa e determinada, isto é, da auto-suficiência da cédula de crédito bancário como documento de legitimação e prova dos direitos cambiários, preocupou-se o art. 4.º do projeto em indicar os requisitos essenciais que ela deve conter, requisitos esses que inspiraram-se, como não poderia deixar de ser, nos mesmos princípios já consagrados nos diplomas de regência das cédulas de crédito rural e industrial". 57. A respeito da função social dos contratos e seus efeitos, tratamos nas obras BRANCO, Gerson Luiz Carlos Branco. As origens doutrinárias e a interpretação da função social dos contratos no Código Civil brasileiro, cit., e no artigo BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Limites da atuação judicial na aplicação da função social dos contratos. In: NICOLAU JR., Mauro et al (Org.). Novos direitos. Curitiba: Juruá, 2007, p. 133-153. Ver também a respeito da matéria MARTINS-COSTA, Judith. Reflexões sobre o princípio da função social dos contratos. Revista DireitoGV, v. 1, n. 1. São Paulo, maio 2005, p. 41-67. TARTUCE, Flávio. A função social dos contratos, a boa-fé objetiva e as recentes súmulas do Superior Tribunal de Justiça. Revista científica da Escola Paulista de Direito, n. 1, ano 1. São Paulo: EPD, maio-ago. 2005, e TARTUCE, Flávio. A função social dos contratos - do Código de Defesa do Consumidor ao novo Código Civil. São Paulo: Método, 2005. 58. Como diz Jorge Miranda, a regra constitucional da não-discriminação impede que o legislador estabeleça discriminações entre concretos sujeitos econômicos como elemento Página 28

essencial do direito de iniciativa. MIRANDA, Jorge. Iniciativa econômica. Escritos vários sobre direitos fundamentais. São João do Estoril: Principia, 2006, p. 173-185. 59. Sobre a problemática dos limites entre autodeterminação e autonomia privada, ver RIBEIRO, Joaquim de Sousa. O problema do contrato as cláusulas contratuais gerais e o princípio da liberdade contratual. Coimbra: Almedina, 2003, p. 21 e ss. A diferença marcada pelo autor português pode ser sintetizada na natureza instrumental da conexão entre os dois conceitos: "a autonomia privada relaciona-se com a autodeterminação como um meio para o seu fim (um dos seus fins) (...) a autonomia privada não é uma componente da autodeterminação, mas apenas uma técnica de criação jurídica ajustada à autodeterminação" (p. 30). 60. O sistema constitucional pressupõe a autonomia privada a partir de uma série de comandos que devem ser compreendidos em conjunto, entre eles os incisos do art. 5.º, acima citados, que tratam da liberdade geral, liberdade profissional, liberdade de associação, e que garantem eficácia ao ato jurídico perfeito e, portanto, a eficácia obrigatória e a irretratabilidade dos negócios jurídicos. Há opinião contrária, como por exemplo, a de Ana Prata que afirma não se poder considerar a autonomia privada como manifestação da liberdade individual, porque isso representa "erigir em ordem natural aquilo que é ordem económica históricamente referenciada". PRATA, Ana. A tutela constitucional da autonomia privada. Coimbra: Almedina, 1982, p. 78. O equívoco da afirmação de Ana Prata é a confusão entre o direito fundamental da liberdade e um pressuposto direito natural à liberdade, que não estão em debate na atualidade, tendo em vista a incontestável natureza histórica dos próprios direitos fundamentais. Sua proposição é a de que a solução constitucional não é de uma "tutela constitucional da autonomia privada", mas de que a Constituição é restritiva da liberdade negocial, reordenando o seu significado clássico, colocando-a como acessório da liberdade de iniciativa e do direito de propriedade, (p. 215 e 216) argumento que não resiste a natural e indiscutível proteção da liberdade de contratar posta nas diversas disposições constitucionais, não obstante a autora portuguesa esteja correta no sentido de que a Constituição reordena a autonomia privada para afastar o conceito clássico tal qual foi concebido por Savigny. Embora a referência à Constituição referida por Ana Prata seja a portuguesa, nesse aspecto não há notas ou traços que sejam de gritante distinção com a Constituição brasileira. 61. Observe-se que apesar de a Lei 11.382, de 06.12.2006, ter dado nova redação do art. 736 do CPC para permitir a oposição de embargos independentemente da realização de penhora, os atos constritivos poderão ser realizados, não se suspendendo a execução pela oposição deles, segundo a sistemática do art. 739-A do CPC. 62. STJ, 4ª T., AgRg no AgIn 640.483-SP, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 12.04.2005, DJU 09.05.2005: "agravo regimental. Agravo de instrumento. Título exeqüendo. Cédula de crédito bancário. Ausência requisitos certeza e exigibilidade. Reversão. Impossibilidade. Incidência súmulas 5 e 7/STJ. 1. O Tribunal de origem, com base na prova dos autos, entende estarem ausentes os requisitos de certeza e liquidez do título exeqüendo, demandando a reversão do julgado, necessariamente, o reexame do conjunto fático-probatório e interpretação do contrato firmado entre as partes, atraindo a censura das súmulas 5 e 7/STJ. 2. Agravo regimental desprovido" (grifamos). Página 29

63. Sobre a concepção substancial do princípio ver OLIVEIRA, Maria Rosynete. Devido processo legal. Porto Alegre: Fabris, 1999, p. 200-208. O enfoque substantivo do due process of law significa que o Estado não pode privar arbitrariamente certos direitos fundamentais, ainda que seja observada a seqüência de etapas de um procedimento. O procedimento previsto pelo legislador, por competência constitucional, não pode estabelecer procedimentos que não garantam direitos ou a essência de direitos, como o direito à vida, liberdade e propriedade. Acolhido inicialmente por decisões dos Ministros Moreira Alves e Themístocles Cavalcanti, o Supremo Tribunal Federal "acentua a presença no devido processo legal de um conteúdo de razoabilidade, capaz de sindicar os atos estatais que se afigurem aberrantes da razão". Isso significa que pode ser reconhecida a inconstitucionalidade de leis que aberrantes da razão firam indiretamente direitos constitucionais. Devido processo legal substantivo exige senso de justiça e enquadramento nos preceitos constitucionais. No mesmo sentido o clássico texto SAN TIAGO DANTAS, F. C. de. Problemas de direito positivo. Rio de Janeiro: Forense, 1953, p. 37-64. 64. Entre outras, veja-se a recente decisão considerando inconstitucional Lei do Estado do Rio Grande do Sul por ter violado o substantial due process of law: STF, ADIn 2.806-RS, Pleno, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 23.04.2003, DJU 27.06.2003. Veja-se ainda a decisão STF, MC na ADIn 2.667-DF, Pleno, rel. Min. Celso de Mello, j. 19.06.2002, DJU 12.03.2004:"As normas legais devem observar, no processo de sua formulação, critérios de razoabilidade que guardem estrita consonância com os padrões fundados no princípio da proporcionalidade, pois todos os atos emanados do Poder Público devem ajustar-se à cláusula que consagra, em sua dimensão material, o princípio do substantive due process of law". 65. BROWNSWORD, Roger. Contract law and the Human Rights Act 1998. Contract Law themes for the twenty-first century. Oxford: Oxford University Press, 2006, p. 241-272. Ainda a esse respeito ver, entre outros, texto que trata sobre a constitucionalização do direito privado na Escócia, cujo parlamento data de 1999, inserido no sistema da Grã-Bretanha, mas cuja tradição de proteção dos direitos civis fez nascer o debate a respeito dos limites constitucionais ao legislador. The Honourable Lord Reed. The constitutionalization of private law. Electronic Journal Of Comparative Law. Scotland, maio 2001, disponível em:[http://www.ejcl.org/52/art52-4.html]. Deve-se observar, também, que assim como no Brasil, há resistências a esse movimento, como a que é apresentada no texto: SMITS, Jan M. Private law and fundamental rights: a sceptical view. In: BARKHUYSEN, Tom; LINDENBERGH, Siewert (Eds.). Constitutionalization of private law. Leiden/Boston: Martinus Nijhoff Publishers/Brill Academic, maio 2006, p. 9-22. 66. STF, ADIn 2.591-DF, Pleno, rel. Min. Carlos Velloso, rel. para acórdão Min. Eros Roberto Grau, j. 07.06.2006, DJU 29.09.2006: "1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. Consumidor, para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3.º, § 2.º, do CDC deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação Página 30

de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência".

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