Chapéus no Grande Prêmio Brasil de Turfe

June 2, 2017 | Autor: Giancarlo Zeni | Categoria: Pierre Bourdieu, Sociology of elites
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Chapéus no Grande Prêmio Brasil de Turfe[1]
Giancarlo Marques Zeni[2]


Resumo

O presente projeto de pesquisa propõe investigar as formas pelas quais
frequentadoras do Grande Prêmio Brasil de Turfe, promovido anualmente pelo
Jockey-Club Brasileiro, correlacionam sociabilidade, lazer e vestimentas à
distinção social, buscando identificar e analisar os motivos que levam
mulheres a usar chapéu na tarde do evento. Para responder ao problema de
pesquisa – "quais os sentidos atribuídos pelas mulheres ao costume de usar
chapéu no Grande Prêmio Brasil de Turfe?" -, levantaremos dados a partir de
observação participante, survey e entrevista em profundidade,
consubstanciando os resultados aos conceitos bourdieusianos de habitus,
gostos de classe, estilo de vida e capital simbólico.

Palavras-chave: chapéus; distinção; elites; Grande Prêmio Brasil de Turfe;
habitus.



Abstract

This research project aims to investigate the ways in which frequenters of
Jockey-Club Brasileiro's annual turf competition Grande Prêmio Brasil de
Turfe correlate sociability, leisure and clothing to social distinction, in
order to indeitify and analyze the reasons that lead women to wear hats and
fascinators in the event. Data will be raised from participant observation,
survey and in-depth interview and results will be substantiated to
Bourdieu's concepts of habitus, class tastes, lifestyle and symbolic
capital, looking for an answer to the research problem - "what are the
meanings attributed by women to the use of wearing hats and fascinators in
Grande Prêmio Brasil de Turfe?".

Keywords: distinction; elites; Grande Prêmio Brasil de Turfe; hats and
fascinators; habitus.





Introdução

A pesquisa aqui proposta investigará as formas pelas quais
frequentadores de um evento promovido anualmente por um clube carioca
correlacionam sociabilidade, lazer e vestimentas à distinção social.
Focamos um evento como um espaço importante de encontro da elite da cidade,
em que um acessório de vestuário - o chapéu - é operado como signo dessa
distinção.

O evento a ser observado é o Grande Prêmio Brasil de Turfe, promovido
pelo Jockey Club Brasileiro uma vez por ano, geralmente em junho. A
primeira edição foi realizada em 1933 com o objetivo de reunir, em
competição, os melhores cavalos da raça puro sangue inglês criados no
Brasil. Devido ao elevado valor de um cavalo puro sangue e às condições
restritivas de associação do Jockey Club, o turfe era um esporte
aristocrático e as tardes do Grande Prêmio Brasil se converteram, mais que
prática desportiva, em um acontecimento social (Melo, 2001).

O chapéu era, então, um item obrigatório de vestuário para mulheres
das classes altas, e sua "obrigatoriedade" em corridas de cavalos, que já
era praxe na Europa, se reproduziu também no Brasil, tornando-se uma marca
do evento através do tempo: ainda que o uso de chapéus tenha decrescido com
o passar dos anos como item usual do guarda-roupas feminino, manteve-se nas
tarde do Grande Prêmio Brasil e é tão importante para as frequentadoras que
elas repetem o costume anualmente, com grande destaque na imprensa
(Burlamaqui, 2014).

Para operacionalizar a pesquisa proposta, vamos procurar responder à
pergunta: quais os sentidos atribuídos pelas mulheres ao costume de usar
chapéu no Grande Prêmio Brasil de Turfe? A partir das evidências que serão
obtidas, a investigação irá se assentar pelos conceitos de habitus, gostos
de classe e estilo de vida, consubstanciados a partir dos pressupostos
teóricos de Pierre Bordieu, buscando compreender em que medida estes
conceitos se relacionam aos motivos da repetição deste uso através do tempo
(Bourdieu, 2007).

Parece-nos que a manutenção deste costume não se trata de mera escolha
estética, curiosidade, excentricidade ou brincadeira desprovidas de
sentido, embora, provavelmente, haja casos assim. Nossa hipótese é de que
este costume é uma escolha (mais ou menos racional, dependendo do caso) que
se insere no habitus da elite carioca – uma prática reproduzida através do
tempo e das gerações como modelo de distinção social, conforme a teoria
bourdieusiana.


Justificativa

Embora pareça irrelevante, a princípio, estudar um evento social
restrito que ocorre apenas uma vez por ano, é importante se ater a um fato
inusitado que cerca este evento: o uso de chapéu pelas mulheres. As roupas
escolhidas, isoladamente ou em conjunto, remetem a agentes dos espaços
público ou privado uma série de informações não verbais sobre grupos a que
nos identificamos ou dos quais nos distinguimos. Para Bourdieu, dominantes
e dominados se distinguem pela capacidade, maior naquele grupo, de manusear
as convenções de vestimenta e aparência (Bourdieu, 2007; Burger-Roussennac
& Pastorello, 2015).

Nesse diapasão, o estudo dos hábitos e gostos da elite pode evidenciar
aspectos relevantes da dinâmica social – como, por exemplo, a maneira com
que o poder se relaciona com o estilo de vida e os gostos de classe
daqueles que o exercem, e os meios pelos quais as características pessoais
da elite influem nas características institucionais do sistema político
(Bourdieu, 2007; Codato, 2008).

Analisar o fenômeno dos chapéus femininos em uma corrida de cavalos é
buscar compreender a perpetuação de gostos e do estilo de vida em uma
parcela da elite, bem como verificar se (e como) a distinção de classe
advinda daí é usada como ferramenta para reproduzir e aumentar a autoridade
dessa parcela da elite como grupo social e politicamente preponderante
sobre seus pares (os dominantes) e sobre os dominados (Bourdieu, 2007;
Scholz, 2009).





Objetivos

1. Objetivo principal
Identificar e analisar os motivos que levam mulheres a usar chapéu na
tarde do Grande Prêmio Brasil de Turfe, obtendo dados a partir de
observação participante, survey e entrevista em profundidade, e
correlacioná-los aos conceitos bourdieusianos de habitus, gostos de classe,
estilo de vida e capital simbólico.


1 Objetivos específicos

Averiguar se os sentidos atribuídos são, na média, homogêneos ou
se variam individualmente ou em certos grupos de forma
significativa;

Verificar, na amostragem selecionada, se a frequência ao evento é
continuada ou eventual, e se o uso de chapéu é continuado ou
eventual;

Averiguar, a partir da amostragem selecionada, se apenas mulheres
da elite frequentam o evento e usam chapéu, ou se mulheres das
classes trabalhadoras e camadas médias também frequentam o evento
e usam chapéu;

Averiguar se os sentidos atribuídos podem ser compreendidos
através da perspectiva bourdieusiana, a partir dos conceitos
elencados no objetivo principal;

Averiguar os sentidos atribuídos à ausência do uso de chapéus por
usuárias e por não usuárias.




Metodologia

A pesquisa se desenvolverá em quatro momentos. O primeiro consistirá
na revisão bibliográfica do que tem sido produzido no âmbito da sociologia
das elites, sobretudo no que se refere aos gostos e estilo de vida,
procurando situar o assunto investigado na produção científica do campo e
aprofundar a compreensão conceitual e sua aplicação nas investigações
analisadas. O segundo momento será de ida a campo para levantamento de
dados visando responder às questões levantadas, através de (i) observação
participante no dia do evento, procurando notar o modo como os
frequentadores circulam e se relacionam entre si e o papel dos chapéus
nessas interações (se há conversas e elogios direcionados aos chapéus e
suas usuárias, se são ignorados, se a atitude varia em grupos ou
individualmente, etc.) e (ii) aplicar survey (Anexo) às frequentadoras que
estejam usando e que não estejam usando chapéu, cujas questões buscarão
identificar o grupo socioeconômico a que pertencem e os costumes quanto ao
uso, ou não uso, de chapéu. No terceiro momento, trataremos os dados
obtidos à luz dos pressupostos teóricos que embasam a investigação,
analisando em que medida eles respondem satisfatoriamente, ou não, aos
objetivos levantados. No quarto e último momento da pesquisa,
selecionaremos, a partir dos surveys, uma sócia do Jockey-Club Brasileiro
que frequente o GP Brasil há muitos anos e use sempre chapéu no evento para
fazer uma entrevista em profundidade, procurando extrair da entrevista
elementos que, aliados às notas tomadas em campo e aos dados levantados
através do survey, nos permitam responder ao problema de pesquisa.

Para fins de delimitação dos conceitos utilizados, operaremos com a
mesma definição de elite que a maioria dos estudiosos do campo opera, isto
é, "grupo formado por indivíduos que, no seu campo de atividade, conseguem
apropriar-se em maior quantidade dos bens ali valorizados" (Perissinotto &
Codato, 2008). É certo que se trata de um conceito de difícil
operacionalização, especialmente quando a pesquisa se posiciona em um
contexto não institucional como o que será investigado, em que os bens mais
valorizados são rarefeitos: o prestígio e a distinção. Buscaremos, assim,
apreender das próprias entrevistadas o que consideram elementos de
distinção e prestígio naquele ambiente, procurando, se possível, constituir
um "tipo ideal" do que elite significa no contexto das entrevistadas.
Responderemos se a entrevistada pertence, ou não, à elite através das
respostas apuradas no bloco de questões socioeconômicas do survey à luz do
"tipo ideal" de elite construído por elas mesmas.



Referências bibliográficas

BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo/Porto
Alegre: Edusp/Zouk, 2007.

BURGER-ROUSSENNAC, A.; PASTORELLO, T. Se vêtir de/en politique: quelques
usages politiques du vêtement. Cahiers d'histoire. Revue d'histoire
critique, 129, 2015, p. 11-17. Disponível em:
. Acesso em: 05 abr. 2016.

BURLAMAQUI, C. A Arte e o Glamour do Rio de Janeiro nos Bons Tempos do
Grande Prêmio Brasil. Rio de Janeiro: 06 jun. 2014. Disponível em:
. Acesso em: 06 abr. 2016.

CODATO, A. Introdução: estudos de elites, uma nota metodológica. In:
________; KIELLER, M. Velhos vermelhos: história e memória dos dirigentes
comunistas no Paraná. Curitiba: Ed. Da UFPR, 2008.

MELO, V. A. Cidade sportiva: primórdios do esporte no Rio de Janeiro. Rio
de Janeiro: Relume Dumará, 2001.

PERISSINOTTO, R.; CODATO, A. Apresentação: por um retorno à Sociologia das
Elites. Rev. Sociol. Polit., Curitiba , v. 16, n. 30, p. 7-15, Junho
2008. Disponível em:
. Acesso em: 13 mai. 2016.

PERISSINOTTO, R.; CODATO, A. (Org.). Como estudar elites. Curitiba: Ed.
UFPR, 2015.

PINÇON, M.; PINÇON-CHARLOT, M. Sociologia da alta burguesia. Sociologias,
Porto Alegre, n.18, jul./dez. 2007, p. 22-37.

SCHOLZ, R. H. Habitus de classe expressado pelo capital simbólico: uma
revisão da obra de Pierre Bourdieu A Distinção. Ciências Sociais Unisinos,
São Leopoldo, v.45, n.1, jan./abr. 2009, p.88-91.

ANEXO


Chapéus no Grande Prêmio Brasil de Turfe
FGV/CPDOC – Escola Superior de Ciências Sociais
SURVEY – Frequentadoras do GP Brasil
Orientadora: Prof.ªDr.ª Angela Moreira Domingues da Silva
Pesquisador: Giancarlo Marques Zeni
BLOCO A – Identificação e dados socioeconômicos
V.1. Idade:______________________
V.2. Profissão:___________________
V.3. Estado civil: ____
01. Casada
02. Solteira
03. Separada ou divorciada
04. Viúva
99. NR
V.4. Profissão do marido, se casada:
_______________________________
V.5. É sócia do Jockey-Club: ____
01. Sim
02. Não
99. NR
V.6. Até que nível educacional estudou: ____
01. Ensino médio ou menos
02. Ensino superior incompleto
03. Ensino superior completo
04. Pós-graduação
88. NS
99. NR
V.6.a. Se Ensino superior completo ou acima, qual curso:________________
V.7. Local onde reside: ____
01. Orla da Zona Sul e endereços tradicionais (Praia do Flamengo, Av.
Rui Barbosa, Praia de Botafogo, Av. Atlântica, Av. Vieira Souto, Av.
Delfim Moreira, Av. Epitácio Pessoa, Av. Borges de Medeiros, Av.
Prefeito Mendes de Moraes, Parque Guinle, Av. Oswaldo Cruz, Jardim
Pernambuco, Alto da Gávea, região de casas do Jardim Botânico)
02. Zona Sul
03. Barra da Tijuca
04. Zona Norte
05. Zona Oeste
06. Outros
99. NR
V.8. Renda mensal familiar: ____
1. Mais de R$ 15.760,00
2. De R$ 7.880,00 a R$ 15.760,00
3. Menos de R$ 7.880,00
99. NR







BLOCO B – O que confere prestígio?
V.9. Quais os três principais elementos que a senhora julga conferirem mais
prestígio a uma pessoa ou grupo?
1º____ 2º____ 3º____
01. Profissão
02. Ser sócio(a) do Jockey-Club Brasileiro
03. Nível educacional
04. Local onde mora
05. Renda familiar
88. NS
99. NR
V.10. Quais as três profissões que a senhora julga conferirem mais
prestígio a uma pessoa ou grupo?
1º____ 2º____ 3º____
01. Administrador(a) de empresas, economista e demais profissões
financeiras
02. Advogado(a) ou profissões jurídicas (juiz(a), procurador(a),
promotor(a), denfesor(a) público(a), etc.)
03. Diplomata e demais cargos de alto escalão na esfera pública
04. Engenheiro(a) e demais profissões tecnológicas
05. Médico(a), psicólogo(a), fisioterapeuta, enfermeiro(a) e demais
profissões da área da Saúde
06. Político(a), detentor(a) de cargos eletivos ou de nomeação
07. Outros
88. NS
99. NR
V.11. Quais os três locais de residência que a senhora julga conferirem
mais prestígio a uma pessoa ou grupo?
1º____ 2º____ 3º____
01. Orla da Zona Sul e endereços tradicionais (Praia do Flamengo, Av.
Rui Barbosa, Praia de Botafogo, Av. Atlântica, Av. Vieira Souto, Av.
Delfim Moreira, Av. Epitácio Pessoa, Av. Borges de Medeiros, Av.
Prefeito Mendes de Moraes, Parque Guinle, Av. Oswaldo Cruz, Jardim
Pernambuco, Alto da Gávea, região de casas do Jardim Botânico)
02. Zona Sul
03. Barra da Tijuca
04. Zona Norte
05. Zona Oeste
06. Outros
88. NS
99. NR

BLOCO C – Frequência ao evento e uso do chapéu
V.12. Com que frequência a senhora frequenta o GP Brasil? ____
01. Anualmente
02. Frequentemente mas não anualmente
03. Raramente
04. Eventualmente
88. NS
99. NR
V.13. Está usando chapéu? ____
01. Sim
02. Não
99. NR
V.14. Com que frequência a senhora usa chapéu quando vem ao GP Brasil?
____
01. Sempre
02. Frequentemente mas não sempre
03. Raramente
04. Eventualmente
88. NS
99. NR
V.15. Com que frequência a senhora usa chapéu em sua vida social?____
01. Sempre
02. Frequentemente mas não sempre
03. Raramente
04. Eventualmente
88. NS
99. NR
V.16. Por que a senhora usa, ou não usa, chapéu no GP Brasil?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
______________________________________________________
V.17. Por que a senhora acha que certo número de mulheres usa chapéu no GP
Brasil?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
_______________________
V.18. Por que a senhora acha que certo número de mulheres não usa chapéu no
GP Brasil?
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
____________________________________________________________________________
______________________________________________________
-----------------------
[1] Projeto de pesquisa apresentado como requisito para aprovação na
disciplina de Métodos e Técnicas de Pesquisa II, do Curso de Ciências
Sociais da Fundação Getulio Vargas – FGV, ministrada pela Prof.ª Dr.ª
Angela Moreira Domingues da Silva.

[2] Graduando do Curso de Ciências Sociais da Fundação Getulio Vargas -
FGV. E-mail: [email protected]
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