CIDADANIA E SUSTENTABILIDADE: A PARTICIPAÇÃO POPULAR COMO MECANISMO DE ENFRENTAMENTO DA CRISE AMBIENTAL NO BRASIL

May 23, 2017 | Autor: Roberta Laena | Categoria: Sustentabilidade, Cidadania, Participação Popular, Crise Ambiental
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CIDADANIA E SUSTENTABILIDADE: A PARTICIPAÇÃO POPULAR COMO MECANISMO DE ENFRENTAMENTO DA CRISE AMBIENTAL NO BRASIL Roberta Laena Costa Jucá1 RESUMO Diante da crise ambiental que se alastra no mundo e no Brasil, mostra-se relevante e urgente a análise de instrumentos eficazes de enfrentamento dos problemas que, cada vez mais, degradam o meio ambiente e dificultam a qualidade de vida do homem. Objetiva-se, pois, investigar a participação popular como mecanismo constitucional e democrático apto à desconstrução da invisibilidade dos riscos e à disseminação de práticas de preservação ambiental. Analisa-se a cidadania como elemento eficaz de enfrentamento da crise ambiental, investigando seu potencial para possibilitar mudança de cultura social em relação às demandas do meio ambiente. Utiliza-se, para tanto, de pesquisa bibliográfica, documental e de campo, de natureza qualitativa e quantitativa.

PALAVRAS-CHAVES: Ambiental.

Participação

Popular;

Cidadania;

Sustentabilidade;

Crise

INTRODUÇÃO A cada dia, em todo o mundo, problemas graves relacionados ao meio ambiente afligem a sociedade mundial. A degradação ambiental decorrente de ações antrópicas se multiplica de forma contumaz e amiúde. Vive-se uma crise ambiental em que os riscos são tornados invisíveis pelo homem. No Brasil, a situação se agrava diante do panorama de miséria extrema, desigualdades sociais e falta de investimento público em algumas regiões do país, o que impõe a adoção urgente de medidas sustentáveis de contenção e prevenção de futuros danos ao meio ambiente. É nesse contexto que se mostra relevante a análise de instrumentos constitucionais e democráticos com potencial para enfrentar essa crise. Intenta-se, com isso, contribuir para o debate do tema e para a elaboração de políticas públicas de enfretamento da crise ambiental, bem como para a construção coletiva de uma nova cultura em prol do meio ambiente. Analisa-se, então, a hipótese de ser a participação popular mecanismo constitucional adequado e eficaz na desconstrução da invisibilidade dos riscos e na disseminação de práticas de preservação ambiental, de modo que se possa evitar danos e minimizar os efeitos da degradação causada pelo homem ao planeta. Para tanto, far-se-á uso da pesquisa bibliográfica e documental em livros, revistas temáticas e legislação, bem como de pesquisa de campo, de                                                                                                                 1

Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Analista Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará (TRE-CE). Professora do Curso de Direito da Faculdade Católica Rainha do Sertão, ministrando as disciplinas Direito Ambiental, Direitos Humanos e Hermenêutica Jurídica.

natureza qualitativa e quantitativa, por meio da aplicação de questionários sobre limpeza pública e descarte de resíduos na cidade de Quixadá-CE. 1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE AMBIENTAL NA ATUALIDADE A intervenção irresponsável do homem na natureza tem causado graves prejuízos ao equilíbrio ambiental nos dias de hoje. O mundo está em risco quando o homem vivencia desmatamento de florestas, extinção de espécies (fauna e flora), derretimento de geleiras, enchentes, secas, furacões e outras catástrofes naturais decorrentes do aquecimento global, contaminação química e acidentes nucleares. Numa perspectiva local, percebe-se a crise ambiental na poluição de lagos e rios, no acúmulo de lixo em vias públicas, nas doenças transmitidas pelos lixões irregulares, na falta d’água nos municípios, no corte indiscriminado de árvores, na desordenação urbana e na falta de planejamento da cidade, na falta de preservação do patrimônio histórico e cultural e no desrespeito à cultura de comunidades tradicionais como os indígenas e quilombolas. E ainda: Esqueletização das florestas que avança a passos largos, as águas interiores e os mares cobertos de espumas, carcaças de animais besuntadas de óleos, smog, erosão arquitetônica de edifícios e monumentos decorrente da poluição, a sucessão de acidentes, escândalos e catástrofes causadas por materiais tóxicos [...]. (BECK, 2011, p. 66)

Esse cenário de crise e de risco é fruto da ação humana intensificada com a Revolução Industrial, ocorrida no início do século XX, que priorizou o desenvolvimento tecnológico e científico em detrimento da qualidade de vida das pessoas e da preservação dos recursos naturais. Ulrich Beck, sociólogo alemão autor de Sociedade de Risco: rumo a uma outra modernidade, dedicou-se à análise da sociedade moderna (por ele chamada de primeira modernidade) e de sua passagem à pós-modernidade (ou segunda modernidade), para entender e desvelar a relação da sociedade com os riscos por ela produzidos, as denominadas incertezas fabricadas, fruto de decisões do homem. Segundo ele, a fé inabalável no progresso científico advinda com a Modernidade e o modelo cartesiano, fundados nos ideais da Revolução Francesa, edificaram um Estado cientista voltado prioritariamente para o desenvolvimento industrial, que se supunha capaz de prever e controlar todos os riscos decorrentes da ação humana.

Quando na segunda metade do século XX a sociedade percebe que o modelo moderno não mais se sustenta, em razão da falibilidade da ciência, da finitude dos recursos naturais e da irreversibilidade de alguns danos ambientais, molda-se o que Beck denomina de sociedade de risco. O consumo exacerbado, a prevalência dos valores econômicos e o individualismo são algumas características que marcam uma sociedade reflexiva que se vê diante do desafio de enfrentar as consequências e contradições de suas próprias ações: “[...] na potenciação e na canibalização econômica dos riscos, [a sociedade] acaba por sistematicamente produzir ameaças que a afligem e por colocar-se a si mesma em questão”. (BECK, 2011, p. 68-69). Na sociedade pós-moderna, o homem consegue prever alguns riscos, mas se vê diante da impossibilidade de controlar os efeitos deles provenientes, razão pela qual opta por não assumi-los ou torná-los invisíveis. Assim, a sociedade de risco, que opta pelo crescimento econômico desenfreado e a todo custo, age como se o progresso científico não representasse riscos ao planeta e aos seres humanos. É, pois, uma sociedade conhecedora dos problemas ambientais presentes e futuros, mas que, a despeito disso, não percebe - ou prefere não perceber - que danos e ameaças de danos existem, tornando-os invisíveis, fenômeno a que o autor intitula de “invisibilidade dos riscos”. “Aquilo que prejudica a saúde e destrói a natureza é frequentemente indiscernível à sensibilidade e aos olhos de cada um e [...] muitos dos novos riscos [...] escapam inteiramente à capacidade perceptiva humana imediata”. (BECK, 2010, p. 32). E ainda: O novo conflito ecológico tem uma disputa negativa: perdas, destruições, ameaças. [...] corresponde a um jogo negativo com soma nula de prejuízos coletivos – um jogo de autodestruição coletiva que se volta contra os jogadores. Isto é, há um jogo entre perdedores. Ou mais precisamente, entre perdedores que não querem tomar consciência de suas perdas reprimindo-as. (BECK, 2010, p. 232).

Percebe-se, dessarte, a existência de um pacto veladamente firmado entre Estado e Ciência que tenta omitir os riscos presentes e futuros - suas causas, seus efeitos e sua abrangência - da maior parte da população do planeta. A ciência monopoliza a capacidade de aferir riscos e desqualifica toda e qualquer diagnóstico não científico, o que fragiliza movimentos sociais participativos. Lima (2005, p. 46), analisando a teoria de Beck, afirma: Portadora de informações fragmentadas e sem mecanismos efetivos de participação, a sociedade civil é impossibilitada de influenciar na decisão quanto à liberação do cultivo e à utilização destes organismos para consumo humano. Tal decisão fica a cargo de órgãos governamentais que baseiam suas escolhas em questões políticas e econômicas, desconsiderando o princípio da precaução, segundo o qual sempre que

houver ameaça de danos ao meio ambiente e à saúde humana, a ausência de certeza científica quanto aos danos não deve ser utilizada para postergar medidas eficazes para prevenir a degradação ambiental.

Outra característica da sociedade de risco é a comercialização dos riscos: quem produz os riscos deles tira proveito. Cria-se um mercado do risco, com novas demandas de consumo novos, que, por consequência, gera a multiplicação de riscos. “[...] entra em cena o risco autofabricável” (BECK, 2011, p. 68), que inverte a lógica social: ao invés de diminuir, os riscos precisam crescer, de modo que não sejam superados em suas causas, mas apenas aparentemente considerados. Essa constatação explica a razão pela qual, para alguns, são interessantes a fabricação e a não prevenção de riscos, ainda que a um preço alto e arriscado aos próprios produtores dos riscos. Os riscos precisam aumentar com sua superação. Na verdade não devem ser superados em suas causas, em suas fontes. Tudo deve acontecer no âmbito da cosmética do risco: embalagem, mitigações sintomáticas da poluição, instalação de filtros purificadores ao mesmo tempo em que se mantêm as fontes poluidoras. Ou seja, nada preventivo, mas apenas uma indústria e uma política simbólicas da superação da multiplicação dos riscos. (BECK, 2011, p. 68).

Importante destacar que as sociedades em desenvolvimento são mais suscetíveis aos riscos e, por esse motivo, escolhidas para suportar os riscos mais altos. Os países que possuem mão de obra barata e situações de vulnerabilidade e desigualdade social são destino certo de indústrias de mais alto risco. “Existe uma sistemática ‘força de atração’ entre pobreza extrema e riscos extremos. No pátio de triagem da distribuição dos riscos, estações situadas em ‘rincões provinciais subdesenvolvidos’ gozam de especial popularidade”. (BECK, 2011, p. 49). Isto ocorre porque, segundo o autor, quanto maior a miséria, maior a cegueira diante do risco. Por isso que no Brasil a crise ambiental se agrava2. Diante do panorama de miséria extrema, desigualdades sociais e falta de investimento público em algumas regiões do país, a sociedade brasileira apresenta maiores dificuldades no enfrentamento dos problemas ambientais, notadamente em razão de uma maior dificuldade na percepção dos riscos, o que impõe a adoção urgente de medidas sustentáveis de contenção e prevenção de futuros danos ao meio ambiente. 2.

ENFRENTANDO

A

CRISE:

CIDADANIA

E

PARTICIPAÇÃO

SOCIAL

AMBIENTAL                                                                                                                 2

Em sua obra, Ulrich Beck (2011) cita o caso do município de Vila Parisi, no Brasil, considerado o mais sujo do mundo, para exemplificar essa atração existente entre países pobres e riscos elevados.

Constatada a crise ambiental instalada no mundo e no Brasil, relevante se mostra perquirir por mecanismos constitucionais de enfrentamento que possam minimizar riscos e danos ao meio ambiente. Nessa busca, levanta-se uma hipótese: não há como se pensar o enfrentamento da crise ambiental sem a participação direta da sociedade. Com efeito, toda a questão ambiental se sustenta no pilar participativo que responsabiliza, de igual modo, Estado e sociedade. O meio ambiente ecologicamente equilibrado, que resguarda a saúde e a qualidade de vida do homem, sendo essencial a uma vida digna, é interesse de todos e a todos beneficia, sendo, por isso mesmo, um direito e um dever de todos os atores sociais. Estado e sociedade são igualmente responsáveis pela preservação e conservação do meio ambiente para gerações do presente e do futuro, de modo a se garantir uma vida sustentável. Para a compreensão dessa participação ecológica, mister se analisar, primeiramente, a concepção de cidadania e participação política à luz da Constituição Federal de 1988. Elemento preponderante do Estado Democrático de Direito é a cidadania, fundamento da República Federativa do Brasil (artigo 1º, II, da Constituição de 1988), que se traduz na relação de pertença do indivíduo para com a sociedade, à qual se atribui o direito a ter direitos e o dever de participação ativa. A cidadania pode ser entendida, assim, como o exercício de direitos e deveres fundamentais por parte do povo. Aludindo à visão da Janoski, Listz Vieira explicita que a cidadania “é a pertença passiva e ativa dos indivíduos em um Estado-nação com certos direitos e obrigações universais em um específico nível de igualdade” (VIEIRA, 2001, p. 34), ideia que reivindica uma maior interação entre indivíduo e Estado e uma sólida atuação coletiva nas instâncias de decisão, como ocorre nos regimes intitulados sociais-democráticos. A cidadania está diretamente relacionada, pois, com a participação popular, que consiste no processo de atuação do povo na esfera pública de um Estado; traduz-se na intervenção do povo nas instâncias de poder, seja por meio da ação conjunta nos processos decisórios, seja por intermédio do planejamento e da atividade fiscalizadora, seja por meio de manifestações e reivindicações públicas, seja por meio da utilização de mecanismos legislativos e/ou judiciais.

Adota-se um conceito amplo de participação, representado pela influência do povo em tudo o que diz respeito às suas necessidades sociais. Consiste em um processo de conquista, inerente à natureza política do homem – entendendo-se política como todo e qualquer ato voltado à satisfação dos interesses da coletividade, ou seja, “a conjugação das ações de indivíduos e grupos humanos, dirigindo-as a um fim comum” (DALLARI, 2004, p. 10). A participação não é um ato isolado e estático; ao revés, é um processo – e como tal constante e inacabado – de conquista e luta, por meio do qual o povo, ciente de sua responsabilidade social e na condição de sujeito ativo de sua própria história, atua em conjunto com o poder institucionalizado, em prol do interesse da coletividade, democratizando a esfera pública. A participação popular consiste, pois, em um processo social construído a cada dia, com a prática participativa, por meio do que o homem se realiza como tal; “[... ] é o próprio processo de criação do homem ao pensar e agir sobre os desafios da natureza e sobre os desafios sociais [...] um processo dinâmico e contraditório...” (SOUZA, 2004, p. 81), de enfrentamento dos problemas da sociedade e de reconhecimento da própria essência política do homem. A participação não é somente um instrumento para a solução de problemas mas, sobretudo, uma necessidade fundamental do ser humano [...] A participação é o caminho natural para o homem exprimir sua tendência inata de realizar, fazer coisas, afirmar-se a si mesmo e dominar a natureza e o mundo (BORDENAVE, 1994, p. 16).

Para Juan Bordenave (1994, p. 22-23), participar é “[...] fazer parte, tomar parte ou ter parte” em uma democracia participativa, sendo esta “aquela em que o povo faz parte de uma nação, tem parte na condução do Estado e toma parte na construção da sociedade da qual se sentem parte”, sendo princípios basilares da participação: 1) ter a natureza de direito; 2) possuir um fim em si mesmo; 3) constituir-se em um processo de desenvolvimento de consciência crítica e aquisição de poder; 4) gerar no povo um sentimento de apropriação (no sentido de pertencimento) do poder; 5) ser algo que se aprende praticando; 6) conter a possibilidade de ser organizada e provocada; 7) necessitar dos meios de comunicação; 8) exigir respeito as suas diversas formas de manifestação; 9) suportar o risco de gerar conflitos; e, 10) não ser imprescindível em todos os momentos (BORDENAVE, 1994, p. 77-80).

No Brasil, a participação é um direito fundamental concretizador do Estado Democrático de Direito. Assim, se no Estado Liberal a participação política era sinônimo de participação restrita ao momento eleitoral, e se a partir do Estado Social o direito à participação começou a agregar o caráter democrático próprio desse período, estendendo-se a mais titulares, somente com o advento do Estado Democrático de Direito ganhou a feição que tem hoje. A participação popular deve ser entendida, pois, como um direito fundamental dos brasileiros e estrangeiros, garantido pela Constituição Federal, necessário à concretização do princípio democrático e do Estado Democrático de Direito. Nessa esteira de entendimento: [...] o direito de participação é um direito fundamental definido em normas constitucionais que decorre diretamente do princípio do Estado de Direito e do princípio Democrático. Portanto, concretiza o Estado Democrático de Direito, princípio estruturante da República Federativa do Brasil, conforme a fórmula prevista no art. 1º, caput, da Constituição Federal de 1988. (SCHIER, 2002, p. 27)

A Constituição Federal de 1988 traz em seu bojo vários preceptivos reveladores do direito à participação popular, a começar pelo princípio da soberania popular, previsto no parágrafo único do seu artigo 1º, consoante o qual “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”, e pelo regime democrático, previsto no caput do mesmo artigo. Tais dispositivos preveem, expressa ou implicitamente, o direito à participação, inclusive no Título II, nominado “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, como, por exemplo, o artigo 14, cujo preceito estabelece o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Entretanto, a participação popular não está adstrita aos institutos preconizados no artigo 14 da Constituição3, havendo vários outros preceitos consagradores do direito à participação na Carta Magna, tais como o art. 37, § 3º, que estabelece formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, o art. 74, § 2º, segundo o qual qualquer cidadão é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União, o art. 144, ao dispor que a segurança pública é responsabilidade de todos, o art. 194, VII, pelo qual a seguridade social será feita por gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados, o art. 205, que preconiza a colaboração da sociedade na promoção da educação, o art. 216, § 1º (o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o                                                                                                                 3

Cf. MACEDO (2005, p. 113).

patrimônio cultural brasileiro), e o art. 225, que impõe à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente, dentre outros. Destarte, é direito fundamental do povo brasileiro participar ativamente das instâncias públicas, enquadrando-se perfeitamente na concepção de direitos fundamentais vigente no Ordenamento Jurídico brasileiro. Primeiro, porque o direito à participação popular traduz a noção de dignidade humana, valor maior dos direitos fundamentais. De fato, influenciar nos atos de interesse da coletividade é condição básica das pessoas que a formam, sem a qual não se tem uma vida digna; significa, igualmente, concretizar os princípios constitucionais da soberania popular e do regime democrático. Nesse viés, Ingo Sarlet (2002, p. 97) declara ser o direito de participação indissociável da noção de dignidade humana, porque “a liberdade pessoal, como expressão da autonomia da pessoa humana (e, portanto, de sua dignidade) reclama a possibilidade concreta de participação na vontade geral”. Em segundo lugar, porque o direito à participação popular entremostra-se como elemento legitimador do Estado Democrático, na medida em que representa uma forma de controle estatal. O direito à participação permite tanto que o povo inspecione e acompanhe atos, órgãos e agentes públicos, como que as mais importantes decisões do Estado sejam por ele adotadas. A participação do povo legitima o Estado porque o Estado existe para o povo, e não o contrário. Essencial ao Estado Democrático, a participação popular é a concretização da própria democracia. Se democracia é governo do povo, pelo povo e para o povo, nada mais coerente que o povo tenha o direito de participar do governo (em sentido amplo). Interessante destacar, por oportuno, a finalidade educativa da participação. De todas as características desse direito fundamental, merece destaque a sua potencialidade para desenvolver nos cidadãos uma consciência crítica, contribuindo para a formação de uma cultura participativa e democrática. Com efeito, participar é uma forma de o povo absorver a essência do regime democrático e introduzir os princípios dele decorrentes no seu cotidiano. Isso se dá porque a participação implica o desenvolvimento de um senso de responsabilidade e de um discernimento crítico sobre o papel de cada cidadão na edificação de uma esfera verdadeiramente pública, que assegure os direitos fundamentais básicos, atenda aos anseios sociais e resguarde um mínimo de dignidade a todos. O indivíduo se fortalece enquanto

cidadão por intermédio das práticas participativas, para, fortalecido, participar cada vez mais, solidificando a cultura democrática e concretizando o Estado Democrático de Direito. Por isso, Bordenave (1994, p. 56) atribui à participação “uma função educativa da maior importância, que consiste em preparar o povo para assumir o governo como algo próprio de sua soberania, tal como está escrito na Constituição”, ao tempo em que Cicília Peruzzo (2004, p. 84) ressalta a participação como processo que se expressa através da conscientização, organização e capacitação contínua e crescente da população ante a sua realidade social concreta. Como tal é um processo que se desenvolve a partir do confronto de interesses presentes a essa realidade e cujo objetivo é a sua ampliação enquanto processo social.

Corroborando essa tese, afirma Carole Pateman (1992, p. 60): “A principal função da participação [...] é educativa; educativa no mais amplo sentido da palavra, tanto no aspecto psicológico quanto no de aquisição de prática de habilidades e procedimentos democráticos”. Para a autora, essa peculiaridade torna a participação um processo estável, que se autosustenta, na medida em que “promove e desenvolve as próprias qualidades que lhe são necessárias; quanto mais os indivíduos participam, melhor capacitados eles se tornam para fazê-lo” (PATEMAN, 1992, p. 61). É com base nessa concepção de participação política como elemento central do Estado Democrático de Direito que se projeta a possibilidade de enfrentamento da crise ambiental. Na medida em que os cidadãos participam ativamente e se envolvem na causa ambiental, agindo diretamente na resolução dos problemas ambientais, torna-se possível a superação da invisibilidade dos riscos e a construção de uma nova cultura política voltada à conservação e preservação do meio ambiente. A solidariedade da ação conjunta e participativa, atrelada à real conscientização dos riscos existentes pelos cidadãos, pode contribuir para a minimização do individualismo e da proeminência do capital, dando ensejo à consolidação de novos valores éticos e morais em prol da causa ecológica. Com essa mudança de paradigma, ações realizadas diretamente pelas pessoas podem se tornar fortes mecanismos de prevenção de danos ambientais. Para se transformar em eficaz instrumento de enfrentamento da crise ambiental, a participação deve ocorrer em todas as instâncias sociais. O direito de participar politicamente deve abranger desde a participação em audiências públicas, em conselhos de meio ambiente e na elaboração de políticas públicas estatais, até a possibilidade de iniciativa de leis ambientais, de direito a voto, por exemplo, nas plenárias do plano diretor das cidades, de

ajuizamento de ações judiciais e de ações diretas de prevenção e combate realizadas pelos próprios cidadãos4. Não há como negar que, para discutir, impor condutas, buscar soluções e consensos que levem à proteção ambiental, é necessária a participação dos mais diversos atores: grupos de cidadãos, ONGs, cientistas, corporações industriais e muitos outros”. (LEITE, 2008, p.161).

Ingo Sarlet aponta também o acesso à informação ambiental como elemento essencial à participação popular ecológica, destacando a Lei de Acesso à Informação (Lei n. 12.527/2011) como mecanismo que viabiliza essa prática. Segundo o autor, “somente o cidadão devidamente informado e consciente da realidade e da problemática ambiental é capaz de atuar de forma qualificada no processo político [...]” (SARLET, 2014, p. 135). Além da referida norma, há a previsão constitucional de publicidade do estudo de impacto ambiental (art. 225, § 1º, IV, da Constituição Federal) e a criação de sistemas públicos de informação ambiental, como o Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81) e o Cadastro Ambiental Rural previsto no novo Código Florestal brasileiro (Lei n. 12.651/2012). Essa possibilidade ampla e diferenciada de participação na questão ecológica é afirmada por Beck (2010). Para ele, no cenário ecológico participam da luta ambiental grupos pequenos que não são controlados facilmente e que contribuem, por exemplo, trazendo a público o fracasso das políticas oficias de prevenção. Ademais, o autor (2011) demonstra que a afirmação de direitos fundamentais pelo Estado assegura uma maior participação popular, viabilizando a construção social de uma nova cultura política que traduza a ativação política dos cidadãos, o que representa um avanço da política: “Sempre que direitos são garantidos, que ônus sociais são redistribuídos, que a participação é viabilizada, que cidadãos se tornam ativos, a política avança um pouco mais na dissolução de suas fronteiras e em sua generalização”. (BECK, 2011, p. 287). É nessa perspectiva que a Constituição Federal de 1988 prevê o princípio da participação popular ambiental, em seu art. 225, caput, estabelecendo um direito fundamental e impondo à coletividade o dever de defesa e de preservação do meio ambiente. Referida norma constitucional confere à participação popular a natureza jurídica de direito e dever                                                                                                                 4

Ingo Sarlet (2014) destaca que, na atualidade, a participação direta da sociedade nessas ações em prol do meio ambiente tem sido fortalecida pela expansão do acesso à internet que possibilita uma ampla articulação e comunicação entre os cidadãos.

fundamental, pelo que “[...] obriga o exercício de uma cidadania participativa e com responsabilidade social ambiental” (LEITE, 2008, p. 162). Nas palavras de Ingo Sarlet (2014, p. 125), “o direito ao ambiente possui, portanto, uma natureza peculiar de direito-deverfundamental”. Ou seja, o art. 225 da Carta Magna estabelece, para além de um direito, um dever fundamental. Ao preconizar que à coletividade impõe-se a defesa e a preservação do meio ambiente, juntamente com o Estado – note-se que no texto há a conjunção aditiva “e” - o Constituinte obriga a ambos, sociedade e Estado, de igual modo. Isso significa que a responsabilidade é paritária e que todos são incumbidos desse dever indistintamente, sem hierarquia ou tratamento diferenciado. Não há maior responsabilidade do Estado nessa questão, nem se deve cobrar mais da população; todos devem agir em conjunto em prol de um único objetivo: conservar e preservar o meio ambiente para presentes e futuras gerações. Se o meio ambiente é bem difuso, de interesse público e responsabilidade todos, não se pode admitir que as decisões acerca de sua implementação sejam distanciadas dos anseios coletivos e alheias aos interesses da sociedade. A questão ambiental é, antes de tudo, uma questão democrática, que deve contar com a atuação de todos. Ademais, a participação popular na seara ambiental concretiza dois direitos fundamentais: o direito à participação política e o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, ambos essenciais  à  dignidade  humana. Exerce-se, desse modo, a chamada cidadania ambiental, que abrange uma concepção mais ampla de participação, não limitada a uma nação específica nem a um povo específico (LEITE, 2008, p. 160). No mesmo viés, outros dispositivos normativos preconizam a participação popular em questões ambientais. A título exemplificativo, na esfera internacional, destacam-se a Declaração de Estocolmo, de 1972, a Declaração do Rio, de 1992, e a Convenção de Aarhus sobre Acesso à Informação, Participação Pública na Tomada de Decisões e Acesso à Justiça em Matéria Ambiental, de 1998, que entrou em vigor em 2001 na União Europeia. No âmbito interno, salienta-se a Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº. 6.938/81), a Lei de Biossegurança (Lei nº. 11.105/2005), a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº. 12.305/2010) e as Resoluções CONAMA nº. 1/86, 237/97, 9/87, que dispõem sobre participação popular – inclusive por meio de audiências públicas - no estudo e relatório de impacto ambiental e no licenciamento ambiental.

3. PARTICIPAÇÃO SOCIAL AMBIENTAL: BREVE AMOSTRAGEM SOBRE CIDADANIA E LIMPEZA PÚBLICA NA CIDADE DE QUIXADÁ-CE De modo geral, almejou-se com essa breve pesquisa confrontar dados de uma realidade específica a fim de verificar se teoria e prática se aproximam, notadamente no que diz respeito à participação popular ambiental como instrumento de enfrentamento da crise ambiental. Buscou-se aferir se a hipótese levantada inicial e teoricamente – a participação popular é fundamental à superação dos problemas ambientais decorrentes da crise ambiental diagnosticada no mundo e no Brasil – confirma-se na realidade de Quixadá5, cidade localizada no Sertão Central do Estado do Ceará, a 167 km de Fortaleza. Para tanto, elegeu-se um problema ambiental – limpeza pública da cidade – e elaborou-se questionamentos em torno dessa temática, com o escopo tanto de investigar a opinião dos moradores da cidade como de obter dados da realidade municipal. Assim, o objetivo do questionário consistiu em verificar a compreensão das pessoas sobre a limpeza da cidade de Quixadá-CE, nos mais variados aspectos: constatação da situação da cidade, causas do problema da falta de limpeza e possíveis soluções, bem como a relação da limpeza pública com a questão ambiental e com a participação de toda a sociedade. Por outro lado, intentou-se obter dados concretos sobre como é realizado o descarte dos resíduos, eventual e domiciliar, pela população de Quixadá e sobre a participação da população em programas de coleta seletiva. Foram aplicados 141 (cento e quarenta e um) questionários sobre limpeza pública e cidadania em Quixadá-CE, no período de 21 de novembro a 21 de dezembro de 2014, utilizando formulário eletrônico da plataforma google forms, divulgado por e-mail e pela rede social Facebook, além de formulários impressos preenchidos por voluntários, sendo respondido por residentes de Quixadá ou por quem, de forma habitual, permanece mais de 3 (três) dias por semana na cidade. Avaliando o aspecto geral da cidade, 76% (setenta e seis por cento) dos respondentes (107 pessoas) consideram Quixadá uma cidade suja em relação à limpeza das ruas e dos                                                                                                                 5

De acordo com dados constantes do Perfil Básico Municipal de Quixadá, publicado em 2014, pelo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), a cidade de Quixadá, em 2010, possuía uma população residente de 80.604 (oitenta mil, seiscentos e quatro) pessoas, sendo de 22.170 (vinte e dois mil, cento e setenta) o número de domicílios particulares ocupados, dos quais 15.458 (quinze mil, quatrocentos e cinquenta e oito), equivalente a 69,87% do total, possuíam lixo coletado.

equipamentos públicos, enquanto 8% (oito por cento) do total (11 pessoas) a consideram uma cidade limpa. 16% (dezesseis por cento) dos participantes (22 pessoas) marcam resposta diversa.         Indagados sobre as causas desse problema – sujeira da cidade – os entrevistados apontaram como maiores causas a ação das pessoas que sujam a cidade e a falta de coletores e lixeiras suficientes: “Grande quantidade de lixo no meio das ruas por falta de educação das pessoas e por falta de organização na coleta de lixo”; “A falta de educação das pessoas. A maioria não entende a importância de se respeitar o espaço público. Além disso, a situação do município é precária. Outra coisa, não há lixeira na cidade” e ainda: Depende da hora. Pois ao amanhecer, tipo 5:30am ou 6:00am as ruas de Quixadá ainda estão limpas. Porém quando as pessoas começam circular e a desempenhar as suas atividades empresariais, a sujeira toma conta das ruas. Principalmente o comércio do centro da cidade, que além de obstruir as calçadas com mercadorias e carrinhos, bem como as praças jogam ao final do dia muito lixo, sem uma coleta organizada e horário definido. A população de Quixadá não se importa nem um pouco com a cidade e muito menos com a limpeza dela e usam aquele velho ditado ‘estou dando emprego aos garis’. A cidade só é suja se a população sujar, não adianta ter cestos de lixo em cada esquina da cidade se as pessoas não depositarem os seus lixos no lugar correto, e sobre a coleta seletiva deveriam ter nas casas aqueles cestos altos, pois os animais das ruas sempre espalham todo o lixo.

Como se percebe, afigura-se pacífico entre os moradores de Quixadá que os problemas relacionados à limpeza da cidade têm como causa principal a falta de educação ambiental das pessoas, além de questões de gestão municipal. Todos demonstraram ter consciência de que a cidade é suja porque as pessoas não são educadas para uma postura sustentável. Questionados sobre a solução para a situação da cidade, a maior parte das respostas apontou a educação da população como essencial para o enfrentamento do problema; do total de participantes, 98% (noventa e oito por cento) - 107 respostas - afirmam que as pessoas

podem, sim, contribuir para a limpeza da cidade, seja por meio do descarte correto dos resíduos sólidos, seja por meio da coleta seletiva de lixo.         Ao questionamento de como as pessoas podem contribuir, respondem os participantes: “Não jogando lixo na rua. Educando seus filhos a ter esta consciência”; “Colocando os resíduos nas lixeiras, guardando o seu lixo até encontrar um local adequado para descartá-lo nos ambientes públicos, e aderir à coleta seletiva.”; “Levando o lixo produzido e jogar no seu devido local, reciclando, reutilizando, transformando lixo em algo que gere renda, pois hoje em dia não podemos ver o lixo como simplesmente lixo, mas sim como oportunidade de se fazer algo”. Destaca-se, por oportuno, ser quase unânime entre os respondentes a necessidade de participação social da população de Quixadá para a resolução do problema. Apenas 3 (três) pessoas, das 141 (cento e quarenta e uma) que participaram, não compreendem a limpeza pública como uma questão de responsabilidade da sociedade; a maioria defende que a solução perpassa pela conscientização e educação ambiental e culmina como uma ação efetiva e consciente das pessoas. Questionados sobre o sentimento de responsabilidade para com a limpeza pública, a maioria afirma sentir-se responsável pela limpeza da cidade, enxergando essa atividade como um dever fundamental do cidadão. Do total de participantes, apenas 6 (seis) responderam negativamente, sendo de 135 (cento e trinta e cinco) o total de pessoas que se sentem responsáveis. Nesse item, a resposta mais frequente coloca o homem como parte da cidade: “Sim, por que faço parte da cidade”; “Sim. Porque sou cidadão”; “Sim, pois vivo na cidade”; “Sim, porque nós todos devemos cuidar do que é nosso”; “Porque integro à população e como um dever de cidadania devo zelar pelo município onde resido”; “Sim, todos são responsáveis pelo lixo que produzimos”.

Portanto, evidencia-se estar presente na maior parte dos entrevistados da pesquisa o sentimento de pertença à comunidade que embasa a participação política do povo, como demonstrado anteriormente. Os participantes entendem que a participação social é um dever de todos e constitui um instrumento de realização do objetivo a ser alcançado – uma cidade ecologicamente equilibrada. Inclusive, quando solicitado que apontassem o que uma cidade limpa representa (nesse caso, poderiam indicar várias respostas), 129 (cento e vinte e nove) pessoas entendem que a limpeza é essencial para a qualidade da vida humana, 105 (cento e cinco) relacionam limpeza da cidade à saúde e 93 (noventa e três) entrevistados destacam que a limpeza pública contribui para a preservação do meio ambiente; apenas 6 (seis) pessoas afirmam que a limpeza só é importante para quem usa os espaços públicos e 1 (um) entrevistado entende tratar-se de interesse público secundário. Nenhum dos entrevistados respondeu que a limpeza da cidade não possui relevância social. Acerca da relação entre meio ambiente e limpeza, 96% (noventa e seis por cento) 135 pessoas- afirmam que o meio ambiente equilibrado depende de uma cidade limpa.         Indagados sobre o motivo dessa relação, a maioria dos entrevistados entende que o lixo polui o meio ambiente e alguns destacam que a cidade dele faz parte: “O excesso de lixo e o incorreto descarte do mesmo causa grandes prejuízos ao meio ambiente porque pode poluir rios, lençóis freáticos, criar áreas de contaminação”; “Evita a degradação do espaço público, contribui com a proteção da saúde pública, estimula o desenvolvimento sustentável, serve de parâmetro para aferir o grau de civilidade dos cidadãos, promove a beleza paisagística da cidade entre tantos outros fatores”; “A cidade é o próprio meio ambiente. Nesse sentido, a limpeza da cidade é essencial para manter a preservação do meio ambiente como um todo, tendo em conta que o meio ambiente é uno”; e ainda: O lixo jogado nas ruas e levados para qualquer lugar traz muitas doenças, principalmente, na hora da queima desse lixo. Essa situação é frequente nessa cidade, o lixão é bem próximo da cidade e queima que é feita de qualquer jeito, além de poluir o solo, poder trazer doenças para a população.

Sobre a conduta da população em relação ao descarte eventual de lixo em Quixadá, considerando a inexistência de lixeira no momento, 64% (sessenta e quatro por cento) dos respondentes - 90 pessoas- afirmam guardar o lixo para descartá-lo em casa, enquanto 30% (trinta por cento) - 42 pessoas - asseveram procurar uma lixeira mais próxima. 3% (três por cento) dos participantes assumem jogar o lixo no chão e 3% (três por cento) marcam a opção “outros”.         No que tange ao descarte do lixo domiciliar, 39% (trinta e nove por cento) das pessoas afirmam descartar o lixo em coletor público, ao passo que 33% (trinta e três por cento) deixam o seu lixo na calçada da rua em que moram e 10% (dez por cento) entregam o lixo a um catador. Apenas 7% (sete por cento) dos respondentes (10 pessoas) realizam coleta seletiva de lixo, dos quais 6 (seis) mencionam entrega do lixo no posto do ECOELCE, programa da empresa de energia COELCE que troca resíduos por descontos na conta de energia elétrica6. 11% (onze por cento) dos respondentes marcam a opção “outros”. Do total de participantes, 51% (cinquenta e um por cento) afirmam não conhecer o programa ECOELCE em Quixadá. Dessas constatações, por amostragem, pode-se inferir que a maior parte da população entrevistada possui a consciência da importância do descarte dos resíduos sólidos para a preservação do meio ambiente. Do total de participantes, a maioria realiza ação direta de prevenção ambiental, ao descartar o lixo no coletor apropriado. Verifica-se também, ser mínima a participação da população no programa ECOELCE de coleta seletiva de resíduos, ao que se atribui a falta de informação da sociedade – a maioria dos entrevistados desconhece o programa. Numa análise geral, pode-se afirmar que a participação popular na questão da limpeza pública da cidade de Quixadá vem contribuindo para o enfrentamento do problema,                                                                                                                 6 Maiores informações projetos/ecoelce.aspx.

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confirmando a hipótese levantada. Essa constatação pode ser verificada tanto pela ação direta da maior parte dos entrevistados ao realizar a coleta consciente do lixo, destinando-o aos coletores públicos, ao que se soma a realização da coleta seletiva por parte de algumas pessoas, como pela compreensão de quase a totalidade dos entrevistados de que o problema da poluição da cidade está relacionado à falta de educação e de conscientização dos próprios cidadãos, e de que todos são, sim, responsáveis pela manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. CONCLUSÃO O enfrentamento da crise ambiental que preocupa o mundo afigura-se mais premente em países como o Brasil, que apresentam um contexto protagonizado pela pobreza e por desigualdades sociais. Essa crise tem como protagonista uma sociedade de risco marcada pelo individualismo, pelo consumismo exacerbado e pela valorização do capital, que, refém da aliança Estado-Ciência, opta por tornar os riscos ambientais invisíveis, ainda que essa inviabilidade cause graves riscos a si mesma. Nesse contexto, a participação popular mostra-se como eficaz mecanismo constitucional de enfrentamento da crise ambiental, na medida em que viabiliza a construção coletiva de uma nova cultura política em prol do meio ambiente. A ação direta dos cidadãos nas questões ambientais – a exemplo da coleta consciente de resíduos sólidos – contribui para a superação da invisibilidade dos riscos, para a modificação de valores culturais e para o avanço político da sociedade na busca de uma conscientização ecológica. Ademais, a função educativa da participação, traduzida também pelo surgimento dos sentimentos de solidariedade, pertença e responsabilidade advindos com a prática da participação popular ambiental, auxilia na elaboração de um novo paradigma ecológico, mais adequado à concretização dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. REFERÊNCIAS BECK, Ulrich. Sociedade de Risco: rumo a uma outra modernidade. Traduzido por Sebastião Nascimento. 2. ed. São Paulo: Editora 34, 2011. ________. A política na sociedade de risco. Traduzido por Estevão Bosco. Ideias, CampinasSP,

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BORDENAVE, Juan E. Díaz. O que é participação. 8. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. DALLARI, Dalmo de Abreu. O que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 2004. INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATÉGIA ECONÔMICA DO CEARÁ (IPECE). Perfil Básico Municipal 2014, Fortaleza, 2014. LEITE, José Rubens Morato. Sociedade de Risco e Estado. In: CANOTILHO, José Joaquim Gomes; LEITE, José Rubens Morato (orgs.). Direito constitucional ambiental brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. LIMA, Maíra Luísa Milani de. A ciência, a crise ambiental e a sociedade de risco. Senatus, Brasília, v. 4, n. 1, p. 42-47, 2005. MACEDO, Dimas. Reflexões sobre a Democracia Direta. In: ROCHA, Fernando Luiz Ximenes; MORAES FILHO, Filomeno. Direito Constitucional contemporâneo: homenagem ao professor Paulo Bonavides. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. PATEMAN, Carole. Participação e teoria democrática. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. PERUZZO, Cicília Maria Krohling. Comunicação nos movimentos populares: a participação na construção da cidadania. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. ________. Princípios de Direito Ambiental. São Paulo: Saraiva, 2014. SCHIER, Adriana da Costa Ricardo. A participação popular na Administração Pública: o direito de reclamação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. SOUZA, Maria Luiza de. Desenvolvimento de comunidade e participação. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2004. VIEIRA, Liszt. Os argonautas da cidadania. Rio de Janeiro: Record, 2001.

APÊNDICE QUESTIONÁRIO APLICADO Como você avalia Quixadá em relação à limpeza das ruas e dos equipamentos públicos (praças, calçadas e demais espaços públicos)? * ! Limpa ! Suja ! Outro: Se você considera Quixadá uma cidade suja, qual a causa desse problema? Quais os principais problemas relacionados à limpeza da cidade? * ! O caminhão do lixo demora a passar ! Os garis não limpam a cidade ! Não há lixeiras e coletores suficientes ! As pessoas sujam a cidade ! Outro: Qual a solução para resolver o problema da limpeza da cidade? Você acha que as pessoas podem contribuir para a limpeza da cidade? * ! Sim ! Não Em caso afirmativo, de que forma as pessoas podem contribuir para a limpeza da cidade? Você se sente responsável pela limpeza da cidade? Por quê? * O que você acha sobre limpeza da cidade? * ! Essencial para a qualidade de vida das pessoas ! Importante para a saúde da população ! Relevante para a preservação do meio ambiente ! Importante apenas para quem usa os espaços públicos ! De interesse secundário, sem tanta importância ! Sem relevância social Você acha que a limpeza da cidade está relacionada à questão ambiental? * ! Sim ! Não Em caso afirmativo, qual a relação entre a limpeza da cidade e o meio ambiente? Se você estiver na rua, e não existir lixeira por perto, o que faz com o lixo a ser descartado? * ! Procura uma lixeira para descartar o lixo ! Guarda o lixo para descartar em casa

! !

Joga no chão Outro:

O que você faz com o lixo de sua casa? * ! Deixa na calçada ! Deixa em um coletor de lixo ! Entrega a um catador de lixo ! Separa o lixo (coleta seletiva) e entrega em local para reciclagem ! Outro: Caso você realize coleta seletiva de lixo, para onde leva o material separado?   Você conhece o programa ECOELCE em Quixadá? * ! Sim ! Não Você participa do programa ECOELCE em Quixadá? * ! Sim ! Não

 

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