Cidade média e desenvolvimento local: relações socioespaciais de Uberlândia (MG) e seus distritos

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I Simpósio Internacional Cidades Médias: Dinâmica Econômica e Produção do Espaço Urbano Presidente Prudente, São Paulo, 2005

MONTES, Silma Rabelo ; OLIVEIRA, Hélio Carlos Miranda de ; SILVA, Renata Rastrelo e . Cidade Média e Desenvolvimento Local: relações sócioespaciais de Uberlândia(MG) e seus Distritos. In: I Seminário Internacional Cidades Médias: dinâmica econômica e produção do espaço urbano, 2005, Presidente Prudente-SP. Anais..., 2005. v. 1. p. 1-15.

CIDADE MÉDIA E DESENVOLVIMENTO LOCAL: RELAÇÕES SOCIOESPACIAIS DE UBERLÂNDIA (MG) E SEUS DISTRITOS* Silma Rabelo Montes1 [email protected] Hélio Carlos Miranda de Oliveira2 [email protected] Renata Rastrelo e Silva3 [email protected] UFU – Universidade Federal de Uberlândia - MG Eixo 3: Redefinições Regionais e Cidades Médias

INTRODUÇÃO A cidade de Uberlândia, hoje com mais de 500 mil habitantes, já é considerada por alguns autores como uma grande cidade média. O seu crescimento populacional e econômico ocorreu principalmente a partir da década de 1970, com a modernização econômica do campo e, conseqüentemente, da cidade, através do poder de elites locais que se colocaram como construtores de uma cidade moderna, grandiosa e progressista. Como conseqüência desse processo vamos ter uma refuncionalização da rede urbana do Triângulo Mineiro e a cidade de Uberlândia torna-se um centro regional de grande relevância. Mas em uma análise sobre todo o município de Uberlândia, podemos perceber que essa imagem de cidade progressista não se estende aos distritos do município, que continuam tendo um número pequeno de habitantes e possuem uma renda muito baixa. Além disso, os distritos apesar de possuírem uma infra-estrutura básica, continuam carentes de emprego, educação e outros serviços. É por isso que as 1

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia

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Graduando e Bolsista PET do Curso de Geografia

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Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História

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relações sociais dos habitantes dos distritos, se voltam para a cidade de Uberlândia, estreitando a interação campo-cidade no município fortalecendo ainda mais o poder político-econômico da cidade e interferindo no modo de vida dos habitantes dos distritos. 1 - UBERLÂNDIA: UMA CIDADE MÉDIA DE IMPORTÂNCIA REGIONAL Estudar a cidade de Uberlândia, seguindo a hierarquização urbana proposta pelo IBGE, torna-se cada vez mais difícil. A cidade encontra-se com 501.214 habitantes conforme dados do Censo Demográfico de 2000I e tendo em vista o tamanho populacional, a influência regional, a diversidade da estrutura produtiva e a exclusão social, este estudo torna-se muito complexo. O crescimento populacional e econômico da cidade é reflexo de uma política econômica fortemente influenciada pelo poder das elites locais. Ao longo de sua formação histórica, Uberlândia tornou-se alvo de projetos políticos que visavam ao desenvolvimento local, porém, totalmente voltados para o atendimento aos interesses das classes dominantes da cidade. Esses grupos dominantes colocavam-se como construtores de uma cidade, que deveria ter como princípios realizações grandiosas, progressismo exarcebado e modernização, instrumentos para sua acumulação. A partir da década de 1970, as elites de Uberlândia passaram a comandar políticas de desenvolvimento regional, possibilitando uma refuncionalização desse espaço e tornando a cidade um centro de expressão no contexto mineiro, goiano e mato-grossense. De acordo com Soares (1995), as elites dominantes da cidade de Uberlândia fizeram-se representar no processo de intensificação do desenvolvimento econômico do município através da implementação de projetos para a modernização, tanto do campo, como da cidade e da instalação de complexos agroindustriais, universidades, hidroelétricas e outros recursos que permitiram a refuncionalização da rede urbana no Triângulo Mineiro.

A refuncionalização da rede urbana do Triângulo Mineiro orientou-se principalmente pela modernização do campo, que expulsou uma parcela significativa da população rural; pelo dinamismo de algumas aglomerações; pela intensificação dos fluxos de transportes e comunicações, bem como, pela diversificação dos serviços, que possibilitaram uma maior diferenciação entre as cidades (SOARES, 1997, p. 118).

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Nessa refuncionalização da rede urbana, aquelas cidades que foram atingidas pela modernização da economia e implantaram toda uma infra-estrutura de apoio à produção e à distribuição das mercadorias produzidas e à diversificação de serviços, criando empregos, expandiram-se e passaram a ser destino dos movimentos migratórios. Porém, aquelas cidades e vilas que não

se inseriram nesse processo

tiveram um processo de esvaziamento e diminuição nas taxas de crescimento urbano. Dentre essas cidades, Uberlândia apresenta-se como a principal cidade desta rede, uma vez que capitaliza os recursos materiais e humanos dos núcleos urbanos vizinhos menores, diversifica suas atividades econômicas, e, ao mesmo tempo cria novas oportunidades de trabalho e serviços que resultam em melhorias para a cidade e seus moradores, e mais, consolidam uma imagem urbana de beleza e poder. Ela acaba desempenhando o papel de capital regional de um conjunto de aproximadamente 30 setores de cidades, que ficam totalmente dependentes de seu comércio e serviços de saúde e educação (SOARES, 1997, p. 121).

Soares (1995) afirma que em função da diversidade de suas atividades econômicas, particularmente dos serviços financeiros, informática, apoio à produção e ensino de nível superior e saúde, a área de influência de Uberlândia ultrapassa os limites do estado de Minas Gerias. Na visão da autora,

todos esses componentes tornaram Uberlândia um centro regional de expressão no contexto mineiro, goiano e mato-grossense. Num raio de aproximadamente 150 quilômetros a partir de Uberlândia, milhares de pessoas utilizam-se de suas estruturas, para transações momentâneas ou para fixação definitiva (SOARES, 1995, p. 75).

Assim como as cidades vizinhas de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, Goiás e Mato Grosso estão sob sua área de influência socioeconômica, nos distritos do município de Uberlândia, essa influência torna-se muito mais forte. Isso ainda é reforçado quando consideramos as relações campo e cidade no município e a forte intervenção política do governo municipal sobre os distritos. É impossível estudar a estrutura sócioespacial dos distritos sem levar-se em consideração o processo de urbanização da cidade de Uberlândia e as mudanças que esta conseguiu provocar no município como um todo.

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Porém, antes de fazermos uma análise da relação atual da cidade de Uberlândia com os distritos, necessário se faz um estudo sobre a sua formação e a interferência do governo municipal e estadual para a criação desses distritos e para possíveis emancipações dos mesmos, ou seja, para a formação de novos municípios. Para isso faremos antes, uma conceituação de município, cidade e distrito.

2 - MUNICÍPIO, CIDADE E DISTRITO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Município, cidade e distrito possuem conceitos bastante diferenciados e não devem ser confundidos. De acordo com Pinto (2003, p. 29), “no Brasil, o termo cidade designa a sede municipal, independente do número de habitantes que tenha. Cidade significa ainda centro urbano”. Porém, para esse autor, o conceito de cidade como centro urbano é questionável pois existem muitos centros urbanos que crescem, desenvolvem-se e superam a própria sede do município. Para ele

a força do progresso que atua nesses centros urbanos, tornando-os dotados de vida própria, em relação ao distrito-sede com relativa autonomia econômica, política, financeira e comercial, constitui-se em um dos principais motivos que impulsiona o processo de emancipação político-administrativa e, por conseguinte, o surgimento de novos municípios. Todavia, existem muitos centros urbanos, com vida econômica autônoma, que não podem ser denominados cidades justamente por não serem sedes municipais [...] (PINTO, 2003, p. 30).

A partir de uma análise histórica sobre o município no mundo e no Brasil, Pinto (2003, p. 29) conclui que, [...] município é a menor unidade territorial brasileira com governo próprio, é formado pelo distrito-sede, onde acha-se localizada a cidade, que é a sede municipal e que leva o mesmo nome do município e, que corresponde à zona urbana municipal e; também, pelo território ao seu entorno, a zona rural municipal, que pode ser dividida em distritos, cuja maior povoação recebe, geralmente, o nome de vila.

Os artigos 32 e 33 da Lei Complementar Estadual número 37 de 18 de janeiro de 1995 regulamentam o assunto sobre criação de município no âmbito do estado de Minas Gerais e determinam que,

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Art. 32 – O município poderá dividir-se em distritos, e, estes, em subdistritos, para efeito de descentralização administrativa. Art. 33 – O distrito-sede terá o nome do município e categoria de cidades, ao passo que os demais distritos, a categoria de vila. Parágrafo único – Os distritos terão o nome do povoado que lhes deu origem, respeitada a denominação vigente na data desta Lei, e serão designados por número ordinal, conforme a ordem de sua criação.

O distrito é, portanto, uma subdivisão do município, que tem como sede a vila. Ele não tem autonomia administrativa e só pode ser criado por meio de lei municipal, porém, obedecendo aos requisitos exigidos por lei estadual. O capítulo III da lei orgânica do município de Uberlândia rege o seguinte:

Art. 5º - A criação, organização e supressão de distritos obedecerão aos critérios estabelecidos em legislação estadual. Art. 6º - A lei estruturará os distritos definindo-lhes atribuições, descentralizando neles as atividades do Governo Municipal. Parágrafo único – Cada distrito terá um Conselho Comunitário, cuja composição e competência serão definidos em leis.

O distrito é subordinado ao município de origem, portanto, não tem governo próprio. Pinto (2003, p. 57) considera que o distrito “funciona como um local de organização da pequena produção e atendimento das primeiras necessidades da população residente em seu entorno, cujo comando fica a cargo da sede do município.” De acordo com o exposto, o distrito está subordinado ao município. Mas o município não pode, através de leis próprias, criar ou extinguir distritos. Os requisitos da lei orgânica municipal sobre o assunto dependem de uma lei estadual, que estabelece os critérios necessários para a emancipação de distritos. Na história do município de Uberlândia, nenhum distrito conseguiu emanciparse apesar do distrito de Tapuirama já ter tentado tornar-se município autônomo. O poder político-econômico que a cidade de Uberlândia exerce sobre os seus distritos é muito grande e enfraquece qualquer tentativa de melhorias econômicas, sociais e até

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populacionais dos distritos e isso veremos mais adiante, depois de fazermos uma localização de cada distrito no município de Uberlândia. 3 – O MUNICÍPIO DE UBERLÂNDIA E SEUS DISTRITOS O município de Uberlândia possui quatro distritos além do distrito-sede. A figura 1 mostra a divisão territorial do município de Uberlândia em seu distrito-sede e em mais quatro distritos: Cruzeiros dos Peixotos, Martinésia, Miraporanga e Tapuirama, cada um representado pela sede do distrito, ou seja, uma vila ou cidade (no caso de Uberlândia) e por seu entorno rural. Percebemos que, em relação ao município, o distrito de Tapuirama localiza-se a sudeste, o de Miraporanga a sudoeste, o distrito de Martinésia posiciona-se mais a noroeste e o de Cruzeiro dos Peixotos a nortenoroeste. Figura 1 - Município de Uberlândia e seus distritos – 2004.

Fonte: SILVA (2004, p. 17)

Existem ligações rodoviárias do distrito-sede para os quatro distritos do município. A rodovia de acesso a Tapuirama é a BR 452, que liga Uberlândia a Araxá. A ligação rodoviária com Cruzeiro dos Peixotos e Martinésia é feita pela rodovia municipal 090 ou também conhecida como rodovia Neusa Resende. Para Miraporanga, o acesso é pela rodovia que liga Uberlândia a Campo Florido e pela antiga Estrada RealII. A distância entre o distrito-sede e os demais distritos é pequena, pois o que está mais distante é Miraporanga, que se encontra a 50 Km distante do

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distrito-sede, como se pode perceber pela tabela 1. Além disso, os distritos são servidos pelo SIT (Sistema Integrado de Transporte) que facilita à acesso aos mesmos, a exceção de Miraporanga. Na tabela 1 podemos perceber também que alguns distritos são muito antigos assim como o distrito-sede. É o caso de Miraporanga, que tem uma origem mais antiga que Uberlândia. O povoado de Santa Maria (Miraporanga) teve sua origem em 1810, com as primeiras caravanas de bandeirantes que se deslocavam em direção a Goiás e que teriam passado por essas terras. De acordo com dados históricos, Tapuirama, apesar de ter se tornado distrito em 1943, teve sua origem entre 1775 e 1816 a partir de um aldeamento indígena ao longo da Estrada do AnhangueraIII. Tabela 1 - Município de Uberlândia – Dados gerais sobre os distritos, 2000. Distritos (Nome Atual) Distrito-sede

Antigos Nomes São Pedro do Uberabinha Santa Maria Martinópolis Cruzeiro dos Peixotos Rocinha

Miraporanga Martinésia Cruzeiro dos Peixotos Tapuirama Município de Uberlândia Fonte: ARANTES (2003). Adaptado por: MONTES, S. R. (2005).

Data de Criação

Distância do distrito-sede

21/05/1852

-

09/08/1864 27/09/1926

50 Km 32 Km

31/12/1943

24 Km

31/12/1943

38 Km

31/08/1888

-

Mas a própria formação histórico-econômica dos distritos do município de Uberlândia retrata a forte influência política e econômica dos grupos dominantes regionais. A evolução político-econômica da cidade de Uberlândia, através da representação de sua imagem de cidade moderna e progressista, mostra que, apesar do grande crescimento populacional e econômico, não houve um desenvolvimento social, ou seja, não ofereceu oportunidades iguais a todos os habitantes do município, inclusive dos distritos, no sentido de aproveitar os recursos econômicos gerados pelo progresso da cidade. O crescimento populacional da cidade de Uberlândia representou uma redução da população dos distritos, pois os habitantes dos mesmos, diante das dificuldades de conseguir emprego, educação e outros serviços nos distritos, deslocaram-se e ainda se deslocam para a cidade, atraídos pela imagem de cidade moderna, progressista e acolhedora.

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A tabela 2 demonstra a evolução da população total (urbana e rural) do município de Uberlândia, no período de 1970-2000.

Tabela 1 – Uberlândia - evolução da população total (urbana e rural) – 1970-2000. Situação

Habitantes 1970

1980

1991

2000

Total 124.706 240.961 366.729 501.214 Urbana 111.466 231.598 357.848 488.992 Rural 13.240 9.363 8.881 12.232 Fonte: SOARES (2004, p. 129). Adaptado por: OLIVEIRA, H. C. M. de. (2005).

Evolução 1970-1980 93,2 107,8 -29,3

Percentagem (%) Evolução Evolução 1980-1991 1991-2000 52,2 36,5 35,3% 36,4 -5,1 37,6

Nesta tabela, podemos observar que o município de Uberlândia possui a taxa de crescimento da população urbana 28 vezes maior que a taxa de crescimento da população rural, considerando o período de 1970-2000. Além dessa taxa de crescimento diferenciada, ainda podemos perceber que o percentual de crescimento da população rural do município foi por duas vezes negativa (período 1970-1980 e 1980-1991) e uma vez positivaIV, tendo como resultado final o crescimento de apenas 3,2% em um período de 30 anos. Esse baixo crescimento da população rural está vinculado à modernização da agricultura e com o efeito de atração que a cidade de Uberlândia exerce sobre a população dos municípios vizinhos e em sua própria zona rural, como já vimos anteriormente. Dessa forma, essa baixa taxa de crescimento da população rural do município tem reflexo na taxa de crescimento da população residente dos distritos, pois as vilas urbanas desses distritos têm suas atividades estritamente ligadas ao meio rural, uma vez que tais vilas não oferecem condições de trabalho para a reprodução socioeconômica de sua população. Isso fica bastante claro na figura 2, na qual podemos observar a vila urbana do distrito de Martinésia e os equipamentos presentes. A organização interna dos distritos de Uberlândia é semelhante: uma rua principal, igrejas, algumas estruturas de lazer (praça, quadra, campo), escola (ensino fundamental e/ou médio), serviços públicos (correios, cartório de paz e registro, tabelionato de notas e registros), posto de saúde, posto policial e alguns bares e

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mercearias. Todos os distritos possuem ruas asfaltadas, energia elétrica, saneamento básico e sistema de telefonia.

Figura 2 – Distrito de Martinésia - levantamento dos equipamentos da vila urbana 2004.

Fonte: SILVA (2004, p. 18).

Os distritos são bastante pequenos, com a população variando entre 871 e 4.985 habitantes, segundo o último censo demográfico, conforme podemos observar na tabela abaixo:

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Tabela 3 – Uberlândia - população total (urbana e rural) residente nos distritos - 19912000. Habitantes Percentual (%) 1991 1996 2000 1991 1996 2000 Total 997 755 1.176 100 100 100 Cruzeiro dos Peixotos Urbana 295 374 390 29,59 49,54 33,16 Rural 702 381 786 70,41 50,46 66,84 Total 927 804 871 100 100 100 Martinésia Urbana 290 288 330 31,28 35,82 37,89 Rural 637 516 541 68,72 64,18 62,11 Total 2.703 4.360 4.985 100 100 100 Miraporanga Urbana 788 2.149 115 29,15 49,29 2,31 Rural 1.915 2.211 4.870 70,85 50,71 97,69 Total 1.625 1.994 2.126 100 100 100 Tapuirama Urbana 1.268 1.495 1.596 78,03 74,97 75,07 Rural 357 499 530 21,97 25,03 24,93 Fonte: IBGE – Censo Demográfico (1991 e 2000) e Contagem da População (1996). Adaptado por: OLIVEIRA, H. C. M. de. (2005).

O que podemos observar nessa tabela é que os distritos de Cruzeiro dos Peixotos e Martinésia perderam população entre os anos de 1991 a 1996 e houve um crescimento entre os anos de 1996 e 2000. Essa perda de população pode ter ocorrido em virtude da proximidade com o distrito sede de Uberlândia, sendo que esses dois distritos são os mais próximos da cidade de Uberlândia, com 24 e 32 quilômetros, respectivamente. Além disso, um dado que merece destaque é a redução da população rural do distrito de Cruzeiro dos Peixotos que em 1991 era de 702 habitantes, em 1996 de 381 habitantes e em 2000 o crescimento para 786 habitantes. Um ponto importante para a retomada do crescimento populacional desses dois distritos foi a implantação de SIT (Sistema Integrado de Transportes), inaugurado em julho de 1997, facilitando o acesso entre tais distritos e a cidade de Uberlândia, como conclui Silva (2004, p. 24-25):

O acesso a Uberlândia foi facilitado, em primeiro lugar, pela pavimentação da rodovia que dá acesso aos distritos de Martinésia e Cruzeiro dos Peixotos, inaugurada em 1987 e que recebeu o nome de Rodovia Municipal Neuza Rezende. O acesso foi facilitado também, mais recentemente pela implantação do SIT (Sistema Integrado de Transporte) que possui uma linha de ônibus, a linha D280 – Martinésia/Cruzeiro dos Peixotos/Terminal Umuarama, a qual faz 05 viagens diárias nos dias úteis e aos sábados e 04 aos domingos e feriados.

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Segundo relatos de moradores do distrito da Martinésia, a primeira corrida do ônibus que sai de Martinésia às 06 horas da manhã e também a última corrida que sai do Terminal Umuarama às 18 horas e 50 minutos, vão lotadas, uma vez que muitas pessoas moram nos distritos, mas trabalham ou estudam em Uberlândia (...)

Com relação aos distritos de Miraporanga e Tapuirama, eles apresentaram crescimento populacional no período de 1991 a 1996 e de 1996 a 2000, sendo que Tapuirama apresentou crescimento populacional tanto na área urbana, quanto na área rural do distrito. Entretanto, dois pontos devem ser destacados em relação a esses distritos. O primeiro é que o distrito de Tapuirama possui a maior parte de sua população na vila urbana, enquanto os outros distritos a possuem na zona rural, segundo o censo de 2000. O outro destaque é que, segundo o censo de 2000, o distrito de Miraporanga possui somente 2,31% de sua população total na vila urbana, enquanto todo o restante da população, 97,69% residem na zona rural. Essa desproporcionalidade entre a zona rural e vila urbana aconteceu no período de 1996 a 2000, conforme podemos observar na tabela 3, demonstrando que, possivelmente, a população da vila urbana desse distrito deslocou-se para a zona rural ou para a cidade de Uberlândia. Outro aspecto importante que é válido destacar sobre os distritos de Uberlândia é a renda da população, uma vez que ela (a renda) influencia na organização espacial dos distritos, pois determina ou não a existência de estabelecimentos comerciais. Dessa forma, como podemos ver na tabela 4, de 15% a 27% dos responsáveis pelo domicílio possuem renda de até 01 salário mínimo (R$ 260,00 em 2004), enquanto cerca de 50% dos responsáveis por domicílio possuem uma renda de até 780,00 reais (03 salários mínimos). Entretanto, enquanto algumas famílias sobrevivem com até 260,00 reais, outras possuem renda de mais de 15 salários mínimos, demonstrando que nos distritos também existem a desigualdade social e uma má distribuição de renda, como nos grandes centros urbanos. Tabela 4 – Distritos de Uberlândia - rendimento nominal mensal por pessoa responsável pelo domicílio – 2000. Dados de Rendimento Nominal Mensal Classes de Rendimento Nominal Mensal em Percentual Pessoa Responsável pelo DomicílioV – Salário Mínimo + de + de + de + de + de + de Sem

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Até 1 1 a 3 3 a 5 5 a 10 10 a 15 15 a 20 20 Rendimentos Cruzeiro 15,87 52,63 15,08 10,05 2,39 0,26 0,8 2,92 dos Peixotos Martinésia 27,24 49,8 10,11 5,83 1,95 0,39 1,18 3,5 Miraporanga 19,58 51,57 10,15 4,04 0,55 0,32 0,79 13 Tapuirama 23,3 57,24 7,65 6,49 0,66 0,17 0,5 3,99 Fonte: Secretaria Municipal de Planejamento e Desenvolvimento Urbano – SEDUR Divisão de Planejamento Social – Prefeitura Municipal de Uberlândia – PMU IBGE – Censo Demográfico 2000. Adaptado por: OLIVEIRA, H. C. M. de. (2005).

Assim, podemos dizer que a renda da população residente nos distritos é um fator determinante para entendermos a estruturação urbana do distrito, seus modos de vida e sua relação com a cidade de Uberlândia, uma vez que quando as populações desses distritos necessitam de serviços e produtos que não encontram nas vilas urbanas, eles deslocam-se até a cidade de Uberlândia. 4 – DISTRITOS DE UBERLÂNDIA: MODOS DE VIDA E RELAÇÃO CAMPO-CIDADE Ao observarmos os distritos do município de Uberlândia, podemos ver um típico cenário que se repete: praça, igreja, escola, poucas ruas. Porém, essa aparente repetição de lugares pode nos levar ao erro de não perceber que, por trás desses lugares, há sujeitos sociais que significam os espaços dos distritos de forma diferenciada. Nesse sentido, como afirma Samuel (set89/fev90) não podemos tratar um lugar como se ele fosse uma “comunidade”, um “conjunto cultural”, pois isso dá uma falsa idéia de homogeneidade que acaba por rechaçar os conflitos sociais que marcam esses espaços. Como já foi demonstrado, em termos populacionais, os distritos apresentam diferenciações. Enquanto o distrito de Martinésia possui apenas 871 habitantes, o de Miraporanga possui 4985, sendo que desses, 4880 vivem no campo; já no distrito de Tapuirama ocorre o inverso, a maioria da população vive na sede distrital. Sendo assim, é preciso que tenhamos cuidado para não cairmos em generalizações e, sim, que busquemos analisar as experiências dos sujeitos históricos. Um dado importante a ser levado em conta para compreendermos os modos de viver dos moradores desses distritos é a relação estabelecida por eles com a cidade de Uberlândia, uma vez que não é possível estudar o rural separado do urbano, já que esse influencia o campo e vice-versa.

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Ao analisarmos a relação estabelecida entre os moradores do distrito de Martinésia e a cidade de Uberlândia, vimos como essa relação se modificou ao longo do tempo. Se na década de 1950, alguns moradores relatam que a diversão das famílias do distrito era a visita aos vizinhos e algumas festas, hoje, talvez em virtude do acesso facilitado a Uberlândia pela rodovia asfaltada e pela linha de transporte urbano, muitas vezes, a diversão dos moradores de Martinésia está no shopping, nas churrascarias, pizzarias da cidade. Uma jovem de 14 anos, moradora da zona rural desse distrito, ao ser perguntada sobre sua diversão predileta disse que era passear no shopping e fazer compras. A diversão não é a única forma de relacionamento com a cidade de Uberlândia, pois muitos moradores dos distritos desse município trabalham ou estudam em Uberlândia. Segundo Tadeu (2003), outro dado importante a ser mencionado é que grande parte dos habitantes dos distritos é constituída por idosos, pois na cidade há grande dificuldade de encontrar emprego e o ritmo acelerado da cidade assusta esses moradores que optam pela tranqüilidade dos distritos, permanecendo neles, talvez com baixa renda, muitas vezes proveniente de aposentadoria que é completada com plantações de hortaliças, criação de animais, como porcos, galinhas, vacas. Ainda segundo esse mesmo autor, um dos graves problemas enfrentados pelos moradores dos distritos do município de Uberlândia é o desemprego, uma vez que o comércio local é pequeno, não há indústrias nem propriedades rurais que empregam uma grande quantidade de pessoas. A questão do desemprego pode ser relacionada ao processo de modernização do campo ocorrido no Brasil a partir dos anos 1970 e que privilegiou grandes e médias propriedades rurais em detrimento das pequenas, promovendo a expulsão do homem do campo e a substituição do homem pela máquina, o que não foi diferente nos distritos do município de Uberlândia, nos quais muitas pessoas tiveram que optar pela cidade na busca de estudo e emprego. Mais uma vez voltamos à relação estabelecida entre campo e cidade. Os distritos do município de Uberlândia possuem infra-estrutura como esgoto, água tratada, asfalto, postos de saúde. Todavia, o fato de haver esses aparelhos tipicamente urbanos e dos moradores dos distritos terem uma relação muito próxima com a cidade, não podemos afirmar que o modo de vida dos moradores desses distritos seja tipicamente urbano, na medida em que, muitos ainda mantêm relações de trabalho com o campo, possuem hábitos rurais, como por exemplo, a alimentação

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com a permanência do tradicional frango caipira e também das festas religiosas que ocorrem nesses distritos, tais como as festas de Santos Reis e Cavalhada. Desse modo, essa realidade complexa que envolve os distritos e a cidade de Uberlândia deve ser tratada de forma atenta para que não se caía em incorreções do tipo afirmar categoricamente que o modo de vida desses moradores é urbano, sem que se perceba a permanência de muitos hábitos rurais na vida dessas pessoas. E mais, é preciso estar atento ao fato de que o campo não é mais o mesmo que o de 30 anos atrás, ou seja, é necessário estar ciente de que campo e cidade são realidades em movimento que se diferenciam ao longo do tempo; logo, não podemos entender o campo com aquela visão idílica de antigamente e nem entendê-lo em oposição à cidade. CONSIDERAÇÕES FINAIS A cidade de Uberlândia tornou-se um centro urbano regional de grande importância no estado de Minas Gerais e até em parte de Goiás, São Paulo e Mato Grosso. Essa cidade, a partir da década de 1970, cresceu rapidamente em termos econômicos e populacionais, principalmente sobre a influência de elites regionais que colocaram em prática políticas de modernização do campo e da cidade para alcançar esse desenvolvimento. É a partir daí que se questiona essa forma de modernização. No campo, privilegiou-se a formação de grandes e médias propriedades rurais em detrimento das pequenas, que resultou na concentração de terras rurais e na expulsão do homem do campo, que foi substituído por máquinas ou por trabalhadores temporários, que acabam não recebendo direitos trabalhistas legais. E tudo isso resultou no desenvolvimento de uma agropecuária voltada para a produção de gêneros que se destinavam aos mercados externos ou ao atendimento das agroindústrias que foram criadas no município. A cidade, por sua vez, atraiu os habitantes do campo do próprio município e também de outros municípios, devido à diversificação de seus serviços, às suas indústrias e também pela intensificação dos fluxos de transportes e comunicações. Mas a cidade moderna e progressista, como foi representada, também não possuía estrutura para promover um desenvolvimento social, dando oportunidades iguais a todos os habitantes que para lá se dirigiram. Mas foi a opção que muitos

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habitantes do campo tiveram de melhorar de vida. É por isso que se intensificaram as interações entre campo e cidade. Devido a essas questões ocorreu no município de Uberlândia, nas três últimas décadas, uma redução da população rural que se dirigiu para o distrito sede. E isso aconteceu também em relação aos distritos do município. Os quatros distritos possuem juntos, menos de 10 mil habitantes, incluindo a população das vilas, que é contada pelo IBGE como urbana e a população do entorno rural. Esse número é muito pequeno considerando que o município possui 501.214 habitantes. Não foi apenas em termos de população que os distritos uberlandenses não se desenvolveram. Apesar de possuírem uma infra-estrutura básica, os mesmos não oferecem muitas oportunidades de emprego, ou seja, de melhoria de vida. Nisso percebe-se um descaso da administração municipal que apesar de em sua estrutura política contar com uma Secretaria dos Distritos, na prática ela não funciona, pois não promove melhorias significativas nos mesmos, principalmente porque dependem de outras secretarias para viabilizarem qualquer projeto. Assim, nos perguntamos, como será o futuro desses distritos? Permanecerão com estão, com a população se mantendo em suas vilas e com seu modo de vida voltado ora para o urbano, ora para o rural e sob uma forte influência da cidade de Uberlândia, onde esses moradores buscam trabalho, lazer, estudo? Ou talvez se emancipem, tornando-se novos municípios? Esta é a situação mais complicado, pois a emancipação de distritos, como vimos, depende de uma lei municipal, subordinada à uma lei estadual e agora também dependente da Emenda Constitucional nº 15, de 12 de dezembro de 1996, que foi criada como o objetivo de dificultar o processo de emancipação municipal. Entre outras mudanças, ela prevê que a consulta plebiscitária deverá envolver a população de todo o município envolvido e não mais somente a população diretamente interessada. E como falamos anteriormente, dificilmente as elites uberlandenses permitirão esse processo, pois envolve interesses particulares de acumulação de renda e poder. Dessa forma, coloca-se como sugestão a própria organização dos habitantes desses distritos de se unirem e lutarem por melhorias nos mesmos e para isso será necessário uma conscientização dos moradores dessas localidades, e da importância de uma ação social que envolva todos os habitantes da região. Essa conscientização só será possível, resgatando-se a cidadania dos moradores dos distritos, reconstruindo suas identidades, devolvendo-lhes sua condição de agentes sociais. Muito importante também seria que a administração municipal desmontasse o discurso

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político-ideológico e tomasse providências concretas para melhorar as condições socioeconômicas da população desses distritos. REFERÊNCIAS ARANTES, Jerônimo. Cidade dos sonhos meus: memória histórica de Uberlândia. Uberlândia: UDUFU, 2003. IBGE - INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo demográfico. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br/bda. Acesso em: dezembro 2004. MINAS GERAIS. Lei complementar n. 37, de 18 de Janeiro de 1995. Disponível em: . Acessado em: jun. 2003. PINTO, George José. Do sonho a realidade: Córrego Fundo-MG: fragmentação territorial e criação de municípios de pequeno porte. 2003. 248f. Dissertação (Mestrado em Geografia). IG-UFU, Uberlândia, 2003. SAMUEL, R. Documentação – História Local e História Oral. Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 9, nº 19, set89/fev90, p. 219-243. SILVA, Renata Rastrelo e. Memórias, vivências e festas religiosas em Martinésia. Monografia de História, Instituto de História, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia-MG, 2004, 62p. SOARES, Beatriz Ribeiro. Uberlândia: da cidade jardim ao Portal do Cerrado – imagens e representações no Triângulo Mineiro. 1995. 347f. Tese (Doutorado em Geografia Humana). FFLCH-USP, São Paulo, 1995. ___________________. Urbanização no cerrado mineiro: o caso do Triângulo Mineiro. In: Silva, J. B. da; COSTA, M. C. L.; DANTAS, E, W. C. A cidade e o urbano. Fortaleza: EUFC, 1997, p. 105-130. SOARES, Beatriz Ribeiro; BESSA, K. C. F. O; OLIVEIRA, B, S; ENGEL, A. S. Dinâmica urbana na bacia do rio Araguari (MG) – 1970-2000. In: LIMA, S. do C; SANTOS, R. J dos. Gestão ambiental na bacia do rio Araguari: rumo ao desenvolvimento sustentável, Uberlândia: UFU/IG, Brasília: CNPq, 2004, p. 125-161. TADEU, Rogério. Moradores dos distritos sofrem com o desemprego. Correio. Uberlândia, p. 3, 04 ago. 2003. UBERLÂNDIA, Lei orgânica do município de. . Acesso em: jun 2003.VI

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Disponível

em:

Trabalho realizado sob a orientação da professora Dra Beatriz Ribeiro Soares, do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia.

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I

De acordo com pesquisa do IBGE, em 2004, Uberlândia teria 570 mil habitantes, passando a ser a segunda maior cidade do estado, ultrapassando Contagem e ficando atrás apenas de Belo Horizonte. Ver dados em Correio, 18 nov. 2004, p. B1. II A Estrada Real foi construída em 1824. Inicialmente não foi muito utilizada, mas, posteriormente, tornou-se a principal ligação com São Paulo, Goiás e Cuiabá, substituindo a Estrada da Anhangüera. III

A Estrada do Anhangüera foi um caminho régio, entre os territórios das minas goianas e São Paulo, aberto em 1730, que correspondia aproximadamente, ao trajeto que Anhangüera, ou seja, Bartolomeu Bueno da Silva e João Leite da Silva Ortiz fizeram entre 1722 e 1725, quando descobriram as Minas dos Goiases. Alguns autores a chamam de Estrada dos Goiases. IV

Esse crescimento de 37,6% da população rural no período de 1991-2000 também tem como reflexo a presença de dois bairros do distrito sede do município (a cidade de Uberlândia) na zona rural, uma vez que o perímetro urbano do município deixa esses bairros fora do sítio urbano da cidade. V

De acordo com dados da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Urbano (SEDUR) e da Divisão de Planejamento Social da Prefeitura Municipal de Uberlândia, em 2000, o distrito de Cruzeiro dos Peixotos possuía 378 imóveis; o de Martinésia, 257; o de Miraporanga, 1261 e o de Tapuirama, 601. Foram considerados o total de imóveis, incluindo urbanos e rurais.

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