Cidades Sustentáveis

July 18, 2017 | Autor: Pedro Vaz Serra | Categoria: Sustentabilidade
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Cidades sustentáveis (publicado no Diário de Coimbra, em 13/09/2008 – sábado)

Os diplomatas da ONU têm a difícil tarefa, por vezes inglória, de criar conceitos flexíveis visando consensos a nível planetário, não obstante a diversidade de culturas, prioridades e interesses. Um exemplo, bem sucedido na teoria, mas, mais lento na sua aplicação prática, é o de desenvolvimento sustentável, hoje tão na moda e que mudou a visão do mundo e algumas das práticas e obrigações de todos nós. O conceito de cidade sustentável e, inevitavelmente, o de construção sustentável, são cada vez mais usados. Mas o conteúdo desses conceitos é muito variável. E muda no tempo (até porque evolui) e nas circunstâncias. A sustentabilidade transcende o carácter ambiental estrito. Assenta no mínimo em três pilares: ambiental, económico e social. Quanto a cidades e construção, opta-se, geralmente, por uma visão multi-pilar da sustentabilidade, pois é mais realista e, em particular, mais ajustada à realidade portuguesa. O conceito de cidade sustentável implica coexistência de “ambientes”. Criatividade, com rapidez de mudança, abertura de mentalidades, empreendedorismo. Contactos fáceis, cada vez mais abrangentes, com maior mobilidade e com informação directa, utilizando, cada vez mais, meios digitais. Um maior relacionamento entre a população, resultante de concepção urbana policêntrica, mas razoavelmente compacta, valorizando a vizinhança e a convivência, sem as impor. Justiça, na equilibrada usufruição da própria justiça e no ordenamento do território, participação na governação, emprego, educação, combate à pobreza e à doença. Estética e beleza, mobilizadora dos espíritos e sentimentos, harmonia na arquitectura, na arte e na paisagem. Ecologia, com pequenos impactos ecológicos negativos, com infra-estruturas e edifícios eficientes e recursos para as gerações actuais e vindouras. Diferença, na concepção e desenvolvimento estratégico, capaz de garantir originalidade, identidade própria e animação ao conjunto de actividades sobrepostas. Esta é uma visão possível de cidade sustentável, mas não é única. Muitas outras são possíveis e desejáveis. A sustentabilidade duma cidade impõe a aplicação do conceito de construção sustentável a um número crescente de edifícios existentes ou novos. E a outras construções. A construção sustentável procura equilibrar o desempenho ambiental com outros desempenhos. Economicamente, não pode atingir custos que ponham em risco a viabilidade. Socialmente, não pode aumentar o risco quanto à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores que a constroem e daqueles que, posteriormente, aí habitam, trabalham ou, simplesmente, aí passam algum do seu tempo livre e de lazer. Esteticamente, não pode colidir com critérios de puro bom-senso e razoabilidade – é, quase sempre, impossível agradar a todos, mas pior ainda é não agradar a ninguém. Estruturalmente, não pode ser objecto de danos inaceitáveis por solicitações sísmicas, ventos ou inundações e incêndios.

Mesmo com estas limitações, o conceito de construção sustentável abre um mundo imenso de novas possibilidades. Para quem projecta. Para quem fabrica materiais e equipamentos para a construção. Para o promotor. Para quem utiliza ou compra. Para quem legisla, aplica impostos e atribui benefícios fiscais. Para todos nós, habitantes. A sustentabilidade deve ser avaliada ao longo da vida do edifício, desde a concepção e projecto inicial, à construção e utilização, passando pela manutenção, até à sua eventual demolição/reciclagem dos produtos e materiais. E tanto deve ser verificada quanto aos materiais e equipamentos incorporados (incluindo a sua fase de aprovisionamento de matérias primas, fabrico, transporte para a obra e colocação em obra, até à demolição do edifício) como ao edifício global. A fase de utilização dos edifícios deve também merecer clara análise dos impactos ambientais, em particular quanto à emissão de gases, de partículas e de ruído, consumo e desperdício de energia não renovável e de água no edifício e nos transportes, emissão de esgotos, criação de resíduos sólidos e poluição química e libertação de outras substâncias perigosas. As cidades e a construção sustentáveis potenciam um universo vasto e aliciante de direitos, deveres e oportunidades. Para a sociedade civil e para o Estado. No qual a formação e a educação têm lugar essencial e, desde logo, são, elas próprias, a garantia de uma sustentabilidade sustentável.

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