Ciência e tecnologia nas notícias, 1854-1929

June 5, 2017 | Autor: M. Almeida | Categoria: Technology, Contemporary History, History of Science, Press, History of Epidemics, News Analysis
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Ficha técnica: Título: Ciência e tecnologia nas notícias, 1854-1929. Autora: Maria Antónia Pires de Almeida Publicação: e.book. Lisboa, 2015. Capa e apoio técnico: Catarina Rosa. Imagem de capa: anúncio de máquina de costura Singer, O Comércio do Porto, nº 201, 25-08-1899. ISBN: 978-989-20-5394-3.

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Índice: Introdução Temas de Ciências e Tecnologia 1. Ciência 2. Viagens / Expedições científicas 3. Tecnologia / Inovação 4. Educação / Formação Científica 5. Exposições / Congressos 6. Museus e Sociedades / Instituições científicas 7. Personalidades 8. Publicações Científicas 9. Riscos/ Acidentes/ Anomalias Conclusões Bibliografia Anexo: base de dados

Imagens: Figura 1: Cabeçalho d’O Século Figura 2: Cabeçalho do Diário de Notícias Figura 3: Diário de Notícias, nº 133, p. 4, terça-feira, 13-06-1865. Figura 4: Diário de Notícias, nº 12105, p. 1, segunda-feira, 21-08-1899. Figura 5: Diário de Notícias, nº 12108, p. 1, quinta-feira, 24-08-1899. Figura 6: O Comércio do Porto, nº 200, p. 4, quinta-feira, 24-08-1899. Figura 7: O Comércio do Porto, nº 201, p. 4, sexta-feira, 25-08-1899. Figura 8: O Comércio do Porto, nº 202, p. 2, sábado, 26-08-1899. Figura 9: Diário de Notícias, nº 12112, p. 1, segunda-feira, 28-08-1899. Figura 10: Diário de Notícias, nº 12114, p. 1, quarta-feira, 30-08-1899. Figura 11: Diário de Notícias, nº 12189, p. 1, segunda-feira, 13-11-1899. Figura 12: O Comércio do Porto, nº 281, p. 3, domingo, 26-11-1899. Figura 13: Diário de Notícias, nº 18736, p. 4, sábado, 12-01-1918.

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Figura 14: O Comércio do Porto, nº 17, p. 3, domingo, 20-01-1918. Figura 15: Diário de Notícias, nº 18745, p. 1, segunda-feira, 21-01-1918. Figura 16: Diário de Notícias, nº 18746, p. 1, terça-feira, 22-01-1918. Figura 17: O Comércio do Porto, nº 27, p. 4, sábado, 02-02-1918. Figura 18: O Comércio do Porto, nº 33, p. 3, sábado, 09-02-1918. Figura 19: O Comércio do Porto, nº 33, p. 3, sábado, 09-02-1918. Figura 20: Diário de Notícias, nº 18777, p. 4, sábado, 23-02-1918. Figura 21: Diário de Notícias, nº 18781, p. 4, quarta-feira, 27-02-1918. Figura 22: O Comércio do Porto, nº 69, p. 4, domingo, 24-03-1918. Figura 23: Diário de Notícias, nº 18812, p. 4, sábado, 30-03-1918. Figura 24: Diário de Notícias, nº 18817, p. 4, quinta-feira, 04-04-1918. Figura 25: O Comércio do Porto, nº 78, p. 2, quinta-feira, 04-04-1918. Figura 26: Diário de Notícias, nº 18822, p. 4, terça-feira, 09-04-1918. Figura 27: O Comércio do Porto, nº 88, p. 3, terça-feira, 16-04-1918. Figura 28: Diário de Notícias, nº 18831, p. 4, quinta-feira, 18-04-1918. Figura 29: Diário de Notícias, nº 18842, p. 4, segunda-feira, 29-04-1918. Figura 30: Diário de Notícias, nº 18907, p. 4, quarta-feira, 03-07-1918. Figura 31: Diário de Notícias, nº 18924, p. 4, sábado, 20-07-1918. Figura 32: O Comércio do Porto, nº 196, p. 3, terça-feira, 20-08-1918. Figura 33: O Comércio do Porto, nº 206, p. 3, sábado, 31-08-1918. Figura 34: O Comércio do Porto, nº 219, p. 3, domingo, 15-09-1918. Figura 35: O Comércio do Porto, nº 230, p. 3, sábado, 28-09-1918. Figura 36: O Comércio do Porto, nº 230, p. 3, sábado, 28-09-1918. Figura 37: Diário de Notícias, nº 19040, p. 3, sexta-feira, 15-11-1918. Figura 38: Diário de Notícias, nº 19040, p. 4, sexta-feira, 15-11-1918. Figura 39: Diário de Notícias, nº 19041, p. 4, sábado, 16-11-1918.

Quadro 1: Áreas temáticas e subcategorias.

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Quadro 2: Notícias e anúncios sobre ciência, 1854-1918. Quadro 3: Notícias e anúncios sobre tecnologia / inovação, 1854-1918. Quadro 4: Notícias e anúncios sobre educação / formação científica, 1854-1918.

Gráfico 1: Notícias e anúncios de ciência e tecnologia, 1854-1918. Gráfico 2: Ciência e tecnologia. Entradas na base de dados, 1854-1918. Gráfico 3: Percentagens das notícias e anúncios das diferentes áreas temáticas nos anos de epidemias. Gráfico 4: Percentagens das notícias e anúncios sobre saúde pública no total da ciência e tecnologia. Gráfico 5: Percentagens das notícias e anúncios sobre ciência no total da ciência e tecnologia. Gráfico 6: Percentagens das notícias e anúncios sobre tecnologia / inovação no total da ciência e tecnologia. Gráfico 7: Percentagens das notícias e anúncios sobre educação / formação científica no total da ciência e tecnologia.

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Introdução Na continuação de uma já longa carreira em investigação científica em Portugal nas áreas da História Contemporânea e da Ciência Política, em 2008 fui contratada como investigadora do Departamento de Ciências Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, no âmbito do programa Ciência 2007 (FCT/MCTES, ref. C2007-453-CHFCT-1). Passei a integrar também a equipa de investigação do CIUHCT, Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia. Durante cinco anos fui responsável pelo projeto “A Popularização da Ciência e da Técnica em Portugal (séculos. XIX-XX)”, o qual implicou a consulta de jornais diários e a recolha de notícias sobre ciência e tecnologia, com o objetivo de compreender o modo como estas áreas eram divulgadas ao público não especializado. Ao longo de três anos li os microfilmes da Biblioteca Nacional, nos quais consultei os jornais O Comércio, diário publicado no Porto entre 2 de junho de 1854 e 30 de julho de 2005, que em 1856 mudou o nome para O Comércio do Porto; O Eco Popular, também do Porto, publicado diariamente entre 1847 e 1860; O Século, jornal diário de Lisboa, publicado entre abril e dezembro de 1855, data em que interrompeu a sua publicação; um novo jornal com o mesmo nome foi publicado entre 1881 e 1977; e finalmente o Diário de Notícias, também de Lisboa, o mais antigo jornal diário ainda em circulação, fundado em 29 de Dezembro de 1864. Foi seguido pelo diário do Porto O Primeiro de Janeiro, fundado em 1869 e ainda em publicação.

Figura 1: Cabeçalho d’O Século

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Figura 2: Cabeçalho do Diário de Notícias

Após a leitura integral de todos os exemplares dos jornais referidos nos anos de 1854, 1855, 1865, 1899 e 1918, recolhi mais de 6.700 notícias, artigos desenvolvidos, correspondência e anúncios referentes às áreas científicas e tecnológicas, os quais foram inseridos numa base de dados e classificadas na seguinte grelha temática:

Quadro 1: Áreas temáticas e subcategorias.

Ciência Educação/ Formação Científica

Agronomia / Silvicultura; Antropologia; Arqueologia; Astronomia; Biologia; Economia; Estatística; Esoterismo; Físico-Química; Geografia / Demografia; Geologia; Grafologia; História; Matemática; Medicina; Meteorologia e Geofísica; Reconhecimento das profissões científicas; Sociologia; Veterinária; Zoologia Cursos; Manuais escolares; Instrução primária; Instrução secundária; Instrução superior; Ensino artístico; Gabinetes de Leitura

Exposições/ Congressos Museus Personalidades Publicações Científicas Riscos/ Acidentes/ Anomalias Saúde Pública Sociedades/ Instituições Científicas

Tecnologia / Inovação Viagens/ Expedições Científicas

Alimentação; Epidemias no gado; Doenças; Farmácia / medicamentos / tratamentos; Higiene; Prevenção / tratamento da Tuberculose; Reciclagem; Tabaco; Vacinação

Agricultura; Armamento; Artes e Espetáculos; Comunicações; Energia; Engenharia; Enologia; Farmácia / medicamentos / tratamentos; Fotografia; Indústria; Medicina; Meteorologia e geofísica; Obras Públicas; Transportes; Veterinária; Vida Urbana Geografia; Medicina; Novas espécies

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Gráfico 1: Notícias e anúncios de ciência e tecnologia, 1854-1918. Ciência

Ciência e Tecnologia: áreas temáticas 1%

1% 1% 11%

10%

0% 7%

Educação/ Formação Científica Exposições/ Congressos Museus

1%

4%

0%

Personalidades Publicações Científicas Riscos/ Acidentes/ Anomalias Saúde Pública

64%

Sociedades/ Instituições Científicas Tecnologia / Inovação Viagens/ Expedições Científicas

Gráfico 2: Ciência e tecnologia. Entradas na base de dados, 1854-1918.

1% Anúncio 42%

Artigo desenvolvido Artigo informativo

53%

Caricatura Encenação / diálogo / comédia Notícia 0%

2%

2%

Opinião

0%

A esta pesquisa somou-se também a consulta do Magazine Bertrand, cujo primeiro número saiu em janeiro de 1927. Dirigido por João de Sousa Fonseca, 8

propriedade e edição de João C. de Eça, esta revista era publicada pelas Livrarias Aillaud e Bertrand e proclamava-se “O magazine mais lido da língua portuguesa (…) É um magazine português e feito para dignificar a língua portuguesa, respeitando-a”. Tinha uma tiragem de 25.000 exemplares mensais e apresentava grafismos muito modernos, com ilustrações de Almada Negreiros e outros. Nesta revista são relevantes os anúncios para uma tentativa de compreensão dos hábitos alimentares da época e dos padrões de saúde e beleza. Os anúncios de chocolates, do Toblerone e na farinha láctea Nestlé são reveladores da mudança dos hábitos alimentares. No início do século XX era importante que as crianças tomassem alimentos muito energéticos para sobreviverem a uma infância sem vacinas nem antibióticos, que davam origem a altas taxas de mortalidade infantil. Considerava-se que crianças mais robustas teriam maiores hipóteses perante as doenças, que as debilitavam e podiam matar. E havia muitos problemas com crianças com falta de apetite, por isso era necessário estimulá-lo com óleo de fígado de bacalhau e outros medicamentos. Os primeiros resultados desta investigação foram divulgados em 2009 no XXIII International Congress of History of Science and Technology. Ideas and Instruments in Social Context, realizado em Budapeste, Hungria, no qual apresentei a comunicação “The 1853-1856 cholera morbus epidemic in Portugal as seen by the press”. Esta deu origem a um artigo com o mesmo nome publicado na revista Notes & Records of The Royal Society, 2012, listada na rede Scopus. Seguiram-se comunicações a congressos e conferências em Sopron (Hungria), Lisboa, Barcelona, Coimbra, Praga, Évora e Cambridge, cujos conteúdos estão disponíveis online. Sobre este tema publiquei seis artigos em revistas internacionais com arbitragem científica, quatro dos quais inseridos na base de dados Scopus, dois capítulos de livros e nove biografias de cientistas,

médicos

e engenheiros

portugueses

na

base

de

dados

online

http://www.ciuhct.com/index.php/pt/biografias.html: Bernardino António Gomes, Carlos Roma du Bocage, Domingos Pinheiro Borges, Fernando da Silva Correia, José Vicente Barbosa du Bocage, Luís da Câmara Pestana, Ricardo Jorge, José Tomás de Sousa Martins. Os temas da saúde e da higiene surgiram como o principal fator de interesse nos jornais consultados, já que os anos escolhidos foram marcados por crises sanitárias particularmente graves, nos quais se manifestaram em Portugal, e especialmente no Porto, epidemias de cólera, peste bubónica, febre tifoide, gripe pneumónica e varíola, o que teve como consequência uma maioria significativa de 64% destes temas no conjunto das notícias e anúncios sobre ciência e tecnologia.

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Gráfico 3: Percentagens das notícias e anúncios das diferentes áreas temáticas nos anos de epidemias.

90,0 80,0 70,0 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0

1854 / 1855 1865

1899

1918

Gráfico 4: Percentagens das notícias e anúncios sobre saúde pública no total da ciência e tecnologia.

Saúde Pública 100,0 80,0 60,0 40,0 20,0 0,0 1854 / 1855

1865

1899

1918

E se as notícias sobre epidemias atingiram percentagens altas no conjunto das notícias e anúncios publicados nesses anos, os restantes temas de saúde pública também apresentaram valores significativos que revelaram as preocupações das respetivas épocas. 10

A análise desta questão foi desenvolvida na obra Saúde pública e higiene na imprensa diária em anos de epidemias, 1854-1918, Editora Colibri, 2013. O presente livro é sobre os outros 36%. Continua-se aqui a análise das notícias sobre Ciência e Tecnologia e apresenta-se em anexo a totalidade da base de dados construída. No anexo podem ler-se notícias sobre todos os temas, com algumas imagens apelativas, as que se conseguiram digitalizar a partir dos microfilmes com muito baixa qualidade. A linguagem é rica, os redatores opinam e comentam de forma muito significativa da mentalidade da época e pode comprovar-se a completa irregularidade ortográfica, típica do século XIX. Algumas notícias foram transcritas na íntegra, outras foram apenas em parte, assim como os artigos desenvolvidos o foram quase só nas suas partes essenciais. O leitor poderá aguçar a sua curiosidade e ir à Biblioteca Nacional ler em microfilme o resto do artigo.

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Temas de Ciência e Tecnologia

1. Ciência A área da ciência ocupou 10% das notícias e anúncios recolhidos. Nesta área destacam-se as notícias que dizem respeito ao reconhecimento das profissões científicas, à meteorologia e geofísica e às disciplinas da Agronomia e da Silvicultura.

Quadro 2: Notícias e anúncios sobre ciência, 1854-1918. Ciência



Agronomia / Silvicultura Antropologia Arqueologia Astronomia Biologia Economia Esoterismo Estatística Físico-Química Geografia / Demografia Geologia Grafologia História Matemática Medicina Meteorologia e geofísica

89 7 37 14 1 1 4 21 8 39 16 2 5 2 44 114

12,86 1,01 5,35 2,02 0,14 0,14 0,58 3,03 1,16 5,64 2,31 0,29 0,72 0,29 6,36 16,47

Reconhecimento das profissões científicas Sociologia

268 1

38,73 0,14

19

2,75

Zoologia Total

%

692 100,00

Gráfico 5: Percentagens das notícias e anúncios sobre ciência no total da ciência e tecnologia.

Ciência 20,0 15,0 10,0 5,0 0,0 1854 / 1855

1865

1899

1918

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Comparativamente às notícias e anúncios sobre saúde pública e epidemias, nos anos estudados verificou-se uma oscilação negativa dos restantes temas de ciência e tecnologia. Se em 1854, 1855 e 1865 havia uma clara intenção de educar o público e divulgar as mais recentes descobertas científicas, com descrições longas e pormenorizadas, no final do século XIX e início do XX o espaço ocupado por estes temas nos jornais chegou quase a zero. Na ciência, as disciplinas da agronomia e silvicultura registaram 89 entradas (12,86%), entre as quais a maioria foi constituída por notícias acerca da “moléstia das vinhas”, o oidium tuckeri, que atacou o Douro nos anos 50 do século XIX, causando a ruína a muitos produtores, antes da filoxera, já perto do final do século, lhes ter dado a estocada final. Estas duas pragas obrigaram à reconversão total das vinhas (Radich, 1996). Os tratamentos disponíveis foram descritos ao pormenor nas páginas d’O Comércio: nos anos estudados os únicos conhecidos eram à base de enxofre, sobre o qual o Barão de Forrester escreveu uma “Memoria sobre a moléstia das vinhas no distrito vinhateiro do Alto Douro em Abril de 1854”, que apresentou à Real Sociedade de Londres. Este texto foi examinado pelo príncipe Alberto e foi oferecido ao Rei D. Pedro V. Os redatores do jornal do Porto pediram-no ao autor e traduziram-no, fazendo um apelo a que outros entendidos escrevessem sobre esta matéria (O Comércio, 01-09-1854, pp. 1-2). Tal como os conhecimentos sobre a cólera nestes anos, também os que diziam respeito à “moléstia” que atacou as videiras eram muito escassos, não só em Portugal como no estrangeiro. Por exemplo em Bordéus reuniuse uma comissão para estudar a doença, que não conseguiu resultados satisfatórios (O Comércio, 01-06-1855, p. 3). Publicaram-se, entre outras, notícias sobre as qualidades e vantagens das culturas da alfarroba (O Comércio, 21-07-1854, p. 1), do sésamo (O Comércio, 17-111854, pp. 1-2), do carrapateiro ou planta do rícino para o bicho da seda, com o título “Nova Riqueza Agrícola e Industrial para a Europa” (O Comércio, 10-01-1855, p. 1), dos prados artificiais (O Século, 11-05-1855, pp. 3-4), e do grão sarraceno, ou trigo negro, sem glúten (O Século, 13-05-1855, pp. 3-4). Numa notícia que incluiu a certificação científica de um membro de uma sociedade de agricultura, revelou-se a descoberta, num sarcófago no Egito, de trigo que germinou ao fim de milénios enterrado: “Trigo quase antediluviano. (…) Abrindo-se no Cairo um antigo sarcófago egípcio, encontrou-se a par da múmia uma certa quantidade de espigas de trigo. Nove dos grãos destas espigas foram dados a um professor de agricultura, que à ventura se apressou em confiá-lo à terra. (...) este fenómeno se efetuou à vista de um membro da Sociedade de Agricultura de Compiegne (...) estes definhados grãos não tinham 13

perdido o seu poder de germinação, pelo contrário apresentaram uma vegetação assombrosa...” (O Comércio, 21-08-1854, p. 2). Pouco depois outra notícia dentro do mesmo tema: “Lord Lindsay conta que durante o curso das suas explorações entre as pirâmides do Egipto descobrira uma múmia que, segundo os seus hieróglifos, devia ter pelo menos dois mil anos. Examinando esta múmia, depois de se lhe tirarem as ligaduras, achou-se numa das mãos fechadas uma raiz tuberosa ou bolbosa. Desejoso de saber quanto tempo podia durar a vida vegetal, tirou esta raiz da mão da múmia, plantou-a num lugar exposto ao sol, deixou que a chuva e o orvalho caíssem sobre ela, e ao cabo de algumas semanas, com grande alegria sua, a raiz germinava e se convertia numa bela dália” (O Comércio, 26-01-1855, p. 2). Em 1855 O Século publicou uma série de artigos desenvolvidos assinados por Rodrigo Morais Soares, que em 1865 era o diretor da repartição de comércio e indústria do Ministério das Obras Públicas, sobre a necessidade de aumentar a produção de carne em Portugal como fator de desenvolvimento, com estatísticas comparativas entre os consumos em Portugal e Bélgica, as medidas a tomar para melhorar a criação e melhoramento das raças de gado, incluindo a descrição das melhores forragens, e o incentivo à estabulação e ao aproveitamento dos estrumes para a agricultura. Estes artigos foram publicados entre 15-05-1855 e 10-07-1855, extraídos do Jornal do Comércio, e incluíram uma polémica com Cláudio Adriano da Costa, o qual publicara o livro Do contrabando dos cereaes em Portugal (Costa, 1855). A compilação destes artigos foi depois publicada em livro (Soares, 1855). Em 1899 nova doença afetou as vinhas do Douro: a maromba, cujos tratamentos e medidas legislativas para a combater foram publicados n’O Comércio do Porto (20-07-1899, p. 1, 01-08-1899, pp. 1-2). Em 1918 ainda se discutiam “caldas básicas e caldas ácidas” para combater o oídio numa série de artigos escritos por Duarte de Oliveira sobre “Vinhas e vinhos”, publicados pel’O Comércio do Porto entre 06-08-1918 e 12-10-1918. Os artigos desenvolveram também os temas da defesa da casta do vinho Bastardo, a aplicação do bagaço da uva como combustível e a utilização das folhas da videira como forragem para os animais. Foi igualmente dada atenção à necessidade de um recenseamento geral da floresta portuguesa e do repovoamento florestal (O Comércio do Porto, 18-10-1918, p. 1). O reconhecimento das profissões científicas destacou-se com 268 entradas (38,73%). Este foi um período importante na área da formação e da motivação dos recursos humanos para a indústria (Mendes, 1993: 363). Grande parte dos anúncios publicados nestes anos incidiu sobre pedidos e ofertas de professores habilitados nas mais diversas áreas, tanto para estabelecimentos de ensino, como para aulas 14

particulares; também foram publicados pedidos de cirurgiões, enfermeiros e praticantes de farmácia, todos devidamente habilitados. Só em 1855 foram publicados 56 anúncios sobre este tema, 46 dos quais a pedir cirurgiões para embarcar em navios com destino ao Brasil e outros países. Esta necessidade, estabelecida por lei, gerou discussão sobre a falta de cirurgiões habilitados, que estivessem dispostos a fazer estas viagens, apesar das boas condições oferecidas: “Continuamos a notar que os cirurgiões não se prontificam a embarcar como facultativos nos navios que são obrigados a esta prescrição da lei. Já tivemos ocasião de mostrar quantas vantagens poderiam tirar os novos cirurgiões recentemente habilitados, que embarcassem nos navios da carreira do Brasil, podendo fazer 3 viagens no ano, ganhando o melhor de 600$000 réis” (O Comércio, 27-06-1855, p.3). Foi amplamente discutida a necessidade de aumentar o soldo dos cirurgiões militares e de ter um corpo de saúde do exército comandado pelos próprios, assim como a falta de facultativos para as povoações e para o serviço da marinha, responsabilizando-se o excesso de formação, com os respetivos custos, que provocavam a falta de vontade de exercer medicina em condições menos favoráveis, quando podiam formar-se profissionais mais rapidamente com cursos mais práticos e úteis (O Comércio, 07-08-1855, p. 1). Houve

notícias

que

anunciaram

concursos

públicos

para

institutos

universitários; exaltaram a atuação dos cirurgiões militares durante a epidemia de cólera e reclamaram o seu reconhecimento como classe profissional; elogiaram os engenheiros nacionais e as obras públicas em curso (O Comércio, 23-11-1855, p. 1); e reconheceram o importante trabalho dos enfermeiros (O Comércio, 24-01-1855, p. 2) e das irmãs da caridade em cenários de guerras e de epidemias (O Século, 03-10-1855, pp. 1-2). Em 1918 já existia uma Associação de Classe dos Enfermeiros do Porto, que reuniu em assembleia-geral para “pedir à Associação Médica Lusitana que insista junto dos seus clínicos para não autorizem pessoas sem estudos de enfermagem a fazer tratamentos (...) que no curso de enfermagem somente seja facultada a matrícula aos empregados nos serviços de enfermagem dos hospitais e aos alunos externos que apresentam documentos comprovativos de que praticam o serviço de enfermagem sob a direção de médicos em postos de socorros, consultórios de cirurgia e casa de saúde, com a obrigação de frequentarem o banco do hospital duas vezes, ao menos, por semana...” (O Comércio do Porto, 06-01-1918, p. 1). Os artigos de opinião centraram-se sobre o estabelecimento das diversas categorias dos profissionais ligados à medicina. Por exemplo, n’O Século lê-se o seguinte título: “Comunicado. Que significação tem o título de médico-cirurgião?”. No 15

artigo discutiram-se as diversas categorias de médicos praticantes, num comentário à lista dos indivíduos que exercem a arte de curar em Lisboa, fornecida pelo governo civil de Lisboa e publicada pelo Almanack de Portugal (O Século, 22-05-1855, p. 3). Foi também defendida a necessidade da criação de um corpo de enfermeiros navais (O Século, 01-12-1855, p. 1) e da formação de um quadro de farmacêuticos de marinha, “com o fim de embarcarem e fazerem o serviço da sua profissão a bordo dos navios do estado: pois que os cirurgiões sós não podem bem satisfazer às necessidades de saúde que muitas vezes se dão nos navios, especialmente nos que transportam grande número de indivíduos, porque a farmácia teórica que estudam só com relação à medicina não os habitua a manipular os medicamentos que necessitam empregar no tratamento dos seus doentes, nem às vezes o tempo lhes permite tais trabalhos, encarregando-os aos enfermeiros, que são homens completamente estranhos à farmácia, por isso as boticas de bordo são sempre deficientes, com grave prejuízo dos doentes” (Diário de Notícias, 25-11-1865, p. 3). Em 1899 destaca-se a criação dos serviços médico-legais, para os quais foram nomeados “distintíssimos professores já bem conhecidos pelos seus trabalhos e pela sua comprovada capacidade” como o Dr. Miguel Bombarda, “ilustre professor da Escola Médica e diretor do hospital de Rilhafoles; o Sr. Dr. Júlio de Matos, diretor do hospital do Conde de Ferreira; e o Sr. Dr. Augusto Rocha, lente de Universidade...” (Diário de Notícias, 04-12-1899, p. 1). E a notícia sobre a primeira mulher que no Brasil “ocupou a tribuna judiciária. A doutora Myrthes Campos, recentemente formada na Faculdade Livre de Direito, muito jovem ainda, defendeu nos últimos dias do mês transato um indivíduo levado à barra do tribunal por ter praticado ferimentos graves em um outro. Presidia ao tribunal o Sr. Dr. Viveiros de Castro, um dos luminares da ciência jurídica, que, deferindo o requerimento da novel advogada para defender aquele acusado, expôs os motivos por que o fazia, dissertando longamente sobre o corpus juris e omununs publicum que já não estão de acordo com as ideias avançadas dos tempos modernos no tocante à individualidade e capacidade cívica da mulher. Dias depois, outra advogada, a doutora Maria Coelho, formada em 1880, na Faculdade do Recife, defendia outro acusado. Vasta erudição, inteligência robusta, grande preparo demonstraram ambas as advogadas no correr dos seus discursos, conseguindo absolver os seus constituintes. Este facto provocou no Instituto da Ordem dos Advogados uma reunião para que eles se manifestassem sobre a capacidade da mulher para exercer a profissão da advocacia. A comissão encarregada de dar parecer a esse respeito fê-lo favorável à liberdade de profissões exercidas igualmente pelas mulheres; mas o Instituto rejeitou o 16

parecer por 16 votos contra 11. No senado o senador Pires Ferreira apresentou um projeto de lei concedendo à mulher a faculdade de exercer a advocacia. (...) Quem, no entanto, não concordou com o Instituto dos Advogados foi o juiz Viveiros de Castro que, com extraordinária clareza e largueza de vistas, demonstrou o quanto eram já improcedentes em nossos tempos as razões que influíam outrora para que a mulher estivesse colocada em plano inferior ao homem, sendo-lhe vedado exercer profissões civis. Se as faculdades concedem um diploma de habilitação a uma senhora, porque não poderá ela fazer uso de um título que conquistou provando as suas aptidões e requisitos para o obter?” (O Comércio do Porto, 16-11-1899, p. 1). Em Portugal só em 1918 foram reconhecidos às mulheres direitos iguais para o exercício de algumas profissões jurídicas: “Concessão de direitos às mulheres. Deve ser publicado amanhã um decreto reconhecendo pela primeira vez às mulheres formadas em direito o poderem advogar e exercer os cargos de ajudantes de notários. Em igualdade de circunstâncias com os homens poderão ter ingresso na carreira de registo civil e exercer os cargos de oficiais, chefes de posto, etc., menos o de conservador. As mulheres que exerçam comércio e como tal estejam registadas no Tribunal do Comércio, poderão também votar nas eleições para o júri comercial e terão ainda ingresso na burocracia do Estado, das corporações administrativas tuteladas pelo governo, em igualdade de circunstâncias com os homens” (O Comércio do Porto, 17-07-1918, p. 1). Na Primeira República foi vedado o ensino particular aos professores do ensino público: “O Sr. Ministro da Instrução fez expedir uma circular aos reitores dos liceus, solicitando a rigorosa observância da lei que não permite a nenhum professor de instrução secundária exercer o magistério particular” (O Comércio do Porto, 16-111918, p. 3). Era uma questão de prestígio profissional, mas houve queixas de que os professores não ganhavam o suficiente. A imprensa refletiu sobre o tema, defendendo que os professores deviam ganhar mais pela preparação que lhes era exigida e para viverem de acordo com o seu estatuto. Numa argumentação muito atual, podemos ler: “O professorado. Entre os absurdos que caracterizam a administração pública, neste país, sobressai o de se pretender que o ensino melhore sem que se remunerem devidamente aqueles a quem esse ensino é confiado. A remuneração dos professores é, em Portugal, consideravelmente inferior à dos outros países e diminuta em relação à preparação, ao esforço e à representação social que se impõe àqueles que exercem o magistério. Por isso é raro no nosso país aquele que seja apenas professor oficial (...) Muitos professores são forçados a procurar em ocupações estranhas ao magistério os recursos que pelo magistério não podem auferir. Assim se explica serem 17

raros, entre nós, os trabalhos de investigação científica, os trabalhos originais, etc. (...) É preciso que os poderes públicos se convençam, de uma vez para sempre, de que a remuneração condigna do professorado é elemento indispensável para aumentar a proficuidade do ensino em Portugal e, portanto, para levantar o nosso nível intelectual” (O Comércio do Porto, 27-02-1918, p. 1). Neste ano houve uma reforma do regulamento das farmácias que instituiu regras que se mantiveram sem grandes alterações durante quase um século: “nenhuma pessoa poderá abrir uma farmácia ao público ou adquirir outra já estabelecida sem que previamente registe perante as autoridades o seu diploma de farmacêutico. As farmácias que venham a estabelecer-se de futuro serão obrigadas a ter inserido exteriormente em caracteres bem legíveis o nome do farmacêutico proprietário ou o do responsável técnico. (…) Nenhum farmacêutico poderá explorar de futuro, em seu nome individual mais de uma farmácia (...) Por morte do farmacêutico estabelecido é permitido aos herdeiros continuar com a exploração da farmácia pelo tempo de um ano, a partir da data do falecimento, desde que a direção seja confiada a um farmacêutico. (...) O exercício de farmácia compreenderá somente a preparação e venda de medicamentos e acessórios, o aviamento de receitas de profissionais autorizados a receitar, e a venda de drogas medicinais e produtos químicos com aplicação a farmácia, assim como de aparelhos cirúrgicos, tóxicos empregados na destruição dos animais nocivos e ainda artigos destinados a usos terapêuticos ou higiénicos. (...) A receita só será aviada quando se apresentar redigida e assinada por pessoa com qualidade para esse efeito...” (Diário de Notícias, 25-051918, p. 2). O regime jurídico das farmácias de oficina foi alterado com o Decreto -Lei n.º 307-2007, de 31 de agosto, que permitiu a posse das farmácias a pessoas não licenciadas em farmácia. Foram recolhidos seis artigos e notícias sobre antropologia em 1855 e 1865. O primeiro apresentou “Cálculos curiosos relativos ao homem”, entre os quais a corpulência dos homens e das mulheres, o peso que cada um pode suportar e arrastar e a velocidade que atingem a correr e a andar (O Século, 12-04-1855, p. 4). Foram também desmistificados “Os Gigantes”, num artigo que afirmou que as dimensões corporais dos seres humanos não variaram assim tanto ao longo da história, com citações de Homero e outros autores clássicos e a comparação entre os tamanhos dos caixões das múmias do Egito e os “caixões ordinários”, assim como a descrição das medidas dos reis e infantes de Portugal (O Século, 18-08-1855, pp. 3-4). Outro artigo debruçou-se sobre a evolução do ser humano e a linguagem (O Século, 11-09-1855, pp. 3-4). E os restantes incidiram sobre os costumes de um povo que vive sob o 18

domínio do Japão (Diário de Notícias, 27-01-1865, p. 4), sobre a comparação entre os costumes europeus e turcos (Diário de Notícias, 12-08-1865, p. 2) e sobre a introdução de influências europeias nos povos do Pacífico: “A Nova Caledónia no Oceano Pacífico é hoje uma possessão francesa. O respetivo governador publicou uma proclamação no idioma vernáculo em que faz saber que, sendo a ilha hoje da França, não é permitido aos seus habitantes devorarem-se uns aos outros. O canibalismo será punido como assassínio. Já se vão sentindo naquelas remotas regiões salutares influências europeias. Congratulemo-nos a bem da humanidade” (Diário de Notícias, 26-07-1865, p. 2). Em 1918 foi publicada uma notícia sobre este tema na área da pedologia, uma ciência que estuda o desenvolvimento infantil, na qual se descreveram os trabalhos do “talentoso professor Sr. Henrique da Cunha Cardoso” que mediu os alunos de uma escola, verificou a acuidade visual dos mesmos (determinada pelo quadro optométrico dos médicos Martim Moutinho e Costa Sacadura) e organizou gráficos com os diferentes elementos numéricos, tudo acompanhado por uma fotografia de grupo (O Comércio do Porto, 27-04-1918, p. 1). Só foram encontradas notícias de arqueologia em 1854, 1855 e 1865. A maior incidência das notícias publicadas n’O Comércio a partir de 15-11-1855, retiradas do jornal Setubalense, recaiu sobre as escavações das ruínas da antiga Cetóbriga, em Troia, de iniciativa da Sociedade Arqueológica, e financiadas pelo Rei D. Fernando, pelo Duque de Palmela e pelas joias dos demais sócios. Houve também notícias sobre a descoberta de um aqueduto submarino entre a cidade de Siracusa e a ilha de Ortígia (O Comércio, 15-09-1854, p. 2); sobre uma expedição arqueológica à Terra Santa (O Comércio, 09-10-1854, p. 2); sobre conchas e vegetais petrificados descobertos nas escavações para encontrar carvão de ferro nas proximidades da Batalha (O Século, 16-05-1855, p. 2); esqueletos de habitantes primitivos encontrados nas Caraíbas (O Século, 31-05-1855, p. 3); descobertas arqueológicas em Roma (O Comércio, 30-081855, p. 2); e a múmia de uma princesa egípcia que foi levada para Londres (Diário de Notícias, 28-06-1865, p. 3). As notícias sobre astronomia remetem-nos para o eclipse do Sol em Nova Iorque no dia 26 de maio de 1854 (O Comércio, 26-06-1854, p. 3); a passagem de um meteoro na Suécia em fevereiro de 1855 (O Comércio, 07-03-1855, p. 3); e as descobertas de novos planetas e cometas por astrónomos dos observatórios de Paris e de Bilk, perto de Dusseldorf (O Século, 20-04-1855, p. 4, 21-06-1855, p. 3; O Comércio, 08-05-1855, p. 3). Em 1865 mais uma vez se demonstra a intenção de divulgação científica da imprensa, com esta notícia em linguagem acessível e com 19

recurso a comparações para que as pessoas menos preparadas compreendessem a mensagem: “A distância da terra ao sol é de 150 milhões de quilómetros, distância tão considerável que só se pode compreender por meio de comparações. Assim o homem, caminhando a pé, fazendo 8km por hora, e não descansando nem dia nem noite, gastaria 2.000 anos para chegar ao sol. Uma locomotiva a toda a força, fazendo 60km por hora, gastaria três séculos para o mesmo fim. Uma bala de artilharia, conservando a sua velocidade inicial, chegaria lá em 10 anos. Finalmente o mais rápido dos agentes imponderáveis, a luz, que se considera como tendo uma velocidade de transporte quase instantânea, precisa de 8 minutos para vencer essa distância” (Diário de Notícias, 08-08-1865, p. 1). Em 1899 a única referência a este tema encontrou-se numa caricatura da atriz Sarah Bernhardt que atuava no Teatro D. Amélia, atual Teatro Municipal São Luís, no mesmo dia em que se daria a passagem de um cometa descoberto pelo Dr. Rudolph Falb, austríaco, que fez várias previsões sobre fenómenos sísmicos e publicou uma revista sobre Astronomia (Diário de Notícias, 13-11-1899, p. 1). No primeiro dia de 1918 O Comércio do Porto apresentou a lista dos eclipses previstos para esse ano, com as respetivas descrições e localizações. Ao longo do século XIX assistiu-se à afirmação da autonomia de várias ciências. Por exemplo a estatística, cujas notícias nos revelam o interesse que essa ciência começava a despertar. Foram publicadas, entre outras, notícias sobre os trabalhos estatísticos na administração pública portuguesa, na nova repartição do Comércio e Indústria (O Comércio, 04-09-1854, p. 1), cálculos sobre a espécie humana na terra (O Comércio, 15-11-1854, p. 2), estatísticas sobre o vício da embriaguez nos EUA, incluindo a despesa que esta causou à nação, o número de pessoas na cadeia, assassinatos, alienação mental, suicídios, órfãos… (O Comércio, 18-05-1855, pp. 2-3). Estes cálculos realizados para os anos de 1840 a 1850 por M. Everest, antigo embaixador dos EUA junto da corte de Inglaterra, já denunciam a preocupação que no início do século XX deu origem à Lei Seca. Foram também publicadas estatísticas sobre calçadas macadamizadas em França e Inglaterra (O Comércio, 24-05-1855, pp. 2-3), sobre o movimento da população de Coimbra, da Crimeia e de Boston (O Comércio, 17-10-1855, p. 2), cálculos sobre a vida de um homem: tempo gasto em alimentação, trabalho, descanso (O Comércio, 10-12-1855, p. 2) e até sobre a própria estatística como ciência e a necessidade da sua aplicação em Portugal (O Século, 29-11-1855, pp. 1-2). A geologia ocupou um lugar importante com diversas entradas informativas sobre a descoberta de minas de carvão de pedra e de ferro no distrito de Leiria em 20

1855, que em muito iram melhorar a “sorte do país”, pois “em breve cessaria de ser dependente da Inglaterra”, e “o impulso que vão receber os caminhos de ferro devido à abundância destes minerais” (O Século, 23-05-1855, p. 1). Estas notícias foram complementadas por um artigo desenvolvido com a descrição das potencialidades das minas portuguesas, assinado por um engenheiro espanhol (O Século, 01-08-1855, pp. 1-2). Houve ainda notícias sobre um dos maiores diamantes do mundo, descoberto no Brasil, o “Estrela do Sul”, que foi apresentado na Academia das Ciências de Paris (O Comércio, 25-01-1855, p. 2) e sobre uma montanha de carvão a arder na Pensilvânia, EUA, desde pelo menos 1847, portanto há oito anos (O Comércio, 27-07-1855, p. 2). Outra ciência que estava em desenvolvimento e em processo de afirmação nesta época era a história, para a qual em Portugal muito contribuíram os trabalhos de Alexandre Herculano. E foi precisamente a investigação deste historiador que deu origem a quatro notícias, as quais relataram a sua viagem ao norte de Portugal com o objetivo de “explorar as ricas minas dos nossos cartórios das províncias (…) para o andamento da tarefa nacional que a si mesmo se impôs, escrevendo sem preocupações a história portuguesa” (O Comércio, 26-06-1854, p. 3). As notícias sobre meteorologia e geofísica incluíram descrições de tremores de terra em vários pontos do mundo, como as ilhas gregas, Constantinopla, Itália, Japão e no Minho. Houve também um número significativo de terramotos no sul de França, cujas causas foram relacionados com a erupção do Vesúvio em maio de 1855. Em Portugal lamentava-se a falta de chuva, o frio intenso e a neve que caiu no Porto em janeiro de 1855, o que fez a cidade apresentar “uma vista pitoresca” (O Comércio, 1901-1855, p. 2). Descreveram-se grandes temporais, trovoadas, tufões, nevões fora de época e os efeitos dos raios em navios e em casas particulares. Dois artigos desenvolvidos dissertaram sobre a influência das correntes do mar nos climas (O Comércio, 12-01-1855, pp. 1-2, 13-01-1855, pp. 1-2); outro sobre a influência da lua na meteorologia (O Comércio, 20-01-1855, p. 2) e dois sobre o auxílio do telégrafo elétrico para a ciência da meteorologia (O Século, 27-11-1855, p. 4, 28-11-1855, p. 4). Em 1899 os jornais italianos noticiaram que o Etna se achava “em plena atividade”, o que provocou terramotos que se sentiram em “diversas povoações da Itália” (O Comércio do Porto, 26-07-1899, p. 2), e em 1918 o Vesúvio teve uma “erupção violenta” (Diário de Notícias, 03-01-1918, p. 1). Nas áreas da geografia / demografia houve descrições de possessões na África portuguesa, dos Açores e do Algarve, e de países e regiões estrangeiras, como o Império Russo, o Monte ou Pico de Adão, em Ceilão, e das Ilhas Galápagos. Analisaram-se os oceanos Atlântico e Pacífico, as respetivas profundidades e níveis 21

das águas. Publicaram-se cinco anúncios aos mapas do teatro da guerra em 1854, com os retratos da rainha Victória, Luís Napoleão, Czar Nicolau e o sultão Medjid e mapas do mar Báltico e dos Golfos da Livónia, Finlândia e Bósnia, da Grécia moderna, arquipélago, Tessália, Macedónia e Albânia. Destacamos aqui o trabalho do Barão de Forrester e a publicação do seu Novo Mapa do Rio Douro, que mereceu um artigo desenvolvido n’O Comércio: “Um dos cavalheiros estrangeiros que mais se tem interessado nos melhoramentos materiais do nosso país com as suas publicações artísticas e literárias é sem dúvida o Ilmº Sr. Forrester. (...) toda a sua atenção para a canalização do rio Douro – rio tão importante, por onde têm de passar todos os produtos do rico país vinhateiro para se armazenarem aqui antes de irem abastecer os mercados do mundo. (...) o magnífico mapa deste rio, obra primorosamente acabada e para a qual foram precisas grandes despesas – o mapa do país vinhateiro – e as suas publicações sobre o importante negócio de vinhos e melhoramentos a fazer no leito do rio. O Sr. Forrester empreendeu ultimamente uma viagem ao Douro e o Comércio teve a honra de ser o jornal escolhido por s. sª para publicar as interessantes cartas (...) algumas fotografias (...) tenciona apresentar estes novos trabalhos na exposição de Paris – e oferecê-los depois ao governo francês” (O Comércio, 09-10-1854, p. 2). Após a publicação de vários artigos desenvolvidos sobre a produção de vinho e as suas experiências com o oidium, José James Forrester foi convidado pelos redatores d’O Comércio para escrever entre uma série de artigos que tinham “por objeto os interesses do comércio desta cidade”, especialmente “esclarecimentos e observações sobre o rio Douro – as suas margens e produção – o seu país vinhateiro dentro e fora da demarcação – o sistema das provas – o melhoramento da sua navegação…”. Como resposta, o Barão de Forrester publicou 12 cartas intituladas “Viagem ao Douro”, entre 11 de setembro e 25 de outubro de 1854, nas quais descreveu pormenorizadamente a geografia e produções da região, assim como a população e seus costumes, revelando-se um retrato etnográfico do maior interesse (Bennett, 2005, Cluny, 2008).

2. Viagens / Expedições científicas As cartas de Forrester foram integradas na área temática das viagens / expedições científicas, junto com relatórios de viagens em África, a territórios até então inexplorados, como a nascente do Nilo (O Século, 03-06-1855, p. 3; Diário de Notícias, 14-01-1865, p. 2). Salienta-se também nesta época a conquista de alguns 22

cumes dos Alpes, como o Grande São Bernardo, ou a descoberta do cadáver congelado do guia Jacques Balmat em Chamonix, que em 1786 tinha conquistado o Monte Branco junto com Saussure (O Comércio, 17-07-1855, p. 3). As notícias sobre alpinismo foram escritas com a ironia própria dos redatores dos jornais portugueses, que não entendiam as razões pelas quais alguém se dedicaria a “esta ginástica”: “O seguinte facto contado pelo Jornal do Havre mostra bem o carácter arrojado e a originalidade dos ingleses: Ultimamente falava-se muito de um inglês que no verão tinha subido o Monte Branco; os ingleses porém não precisam de esperar pelo verão para se entregarem a esta ginástica! Em Londres não há ninguém que não saiba que no Inverno passado lord B... apostara que havia de passar o Grande São Bernardo com a sua carruagem, e isto no mês de janeiro...” (O Comércio, 19-04-1855, p. 3). Esta foi também a época das grandes viagens de exploração científica ao Polo Norte e à passagem do Oceano Pacífico para o Atlântico pelos mares árticos, seguidas de conferências em Londres com os “mais ousados exploradores do mundo, Sir Josh Ross, o capitão Collinson, o capitão MacClure, o capitão Inglefield, etc.” (O Comércio, 25-07-1855, p. 2). Neste tema insere-se ainda o relatório da visita de estudos feita pelo Dr. Ferraz de Miranda, secretário do conselho geral de beneficência, aos estabelecimentos de caridade e hospitais de Inglaterra, França, Bélgica e Itália (transcrito da Gazeta Médica, O Século, 04-08-1855, pp. 1-2). Em 1865 dois naturalistas ingleses viajaram ao Japão “à pesquisa de plantas raras e madeiras proveitosas em que aquele pouco conhecido país parece ser abundante e um naturalista alemão explorou as margens do Amazona e seus confluentes (Diário de Notícias, 03-08-1865, p. 2, 16-03-1865, p. 3). Em 1899 apenas uma notícia nesta área temática: “O sr. dr. Nascimento, nomeado para prosseguir não só na exploração zoológica da província de Angola, que estava confiada ao falecido explorador Anchieta, mas para proceder a explorações científicas de utilidade prática na intuito de alargar os conhecimentos geográficos, climatológicos e geodésicos, parte, segundo ouvimos, para Luanda no paquete de 23 do corrente mês” (Diário de Notícias, 06-01-1899, p. 1).

3. Tecnologia / Inovação As notícias são maioritárias na área da tecnologia / inovação, que ocupa 11% da base de dados. Os únicos anúncios em 1854-55 são os do atelier do fotógrafo Miguel Novaes, que faz “Retratos a Daguerreótipo sobre Lâmina, Vidro, Papel e Tela” (O Comércio, 14-06-1854, p. 4, Nunes, 2005, Vaquinhas, 2011: 456) e os dos sapatos 23

de borracha americanos de H. Guichard (O Comércio, 20-12-1854, p. 3). Em 1865 já há mais anúncios nas áreas da agricultura, como por exemplo a máquina de debulhar a vapor da Kansomes & Sims, de Inglaterra, que cortava a palha por um modo novo (Diário de Notícias, 18-11-1865, p. 3). E em 1865 e 1899 repetiram-se os anúncios às máquinas de costura Singer (Diário de Notícias, 13-06-1865, p. 4) e White (O Comércio do Porto, 25-08-1899, p. 2).

Quadro 3: Notícias e anúncios sobre tecnologia / inovação, 1854-1918. Tecnologia / Inovação



Agricultura Armamento Artes e Espetáculos Comunicações Energia Engenharia Enologia Farmácia / medicamentos / tratamentos Fotografia Indústria Medicina Meteorologia e geofísica Obras Públicas Transportes Veterinária Vida Urbana Total

% 34 27 14 141 31 51 13

4,37 3,47 1,80 18,12 3,98 6,56 1,67

5 130 152 13 2 15 142 2 6 778

0,64 16,71 19,54 1,67 0,26 1,93 18,25 0,26 0,77 100,00

Gráfico 6: Percentagens das notícias e anúncios sobre tecnologia / inovação no total da ciência e tecnologia.

Tecnologia / Inovação 16,0 14,0 12,0 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 1854 / 1855

1865

1899

1918

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As comunicações ocupam a maior percentagem desta área temática: 26% em 1854-55, 18% no total. Salientam-se as várias notícias sobre a instalação do telégrafo elétrico por toda a Europa, no Império Otomano e na Índia, e sobre a sua aplicação na guerra da Crimeia e nos caminhos de ferro. O telégrafo elétrico submarino dava nestes anos os seus primeiros passos e também ocupou grande parte das notícias, desde o projeto no Mediterrâneo, para comunicação entre a Europa, a África e a Ásia; ao projeto de ligação entre a América do Norte e a Europa, que se completou dez anos mais tarde. E até mesmo o projeto do telégrafo subaquático na Suíça, cujas linhas telegráficas iriam passar sob as águas de alguns lagos (O Comércio, 18-10-1854, p. 3). A grande preocupação destas grandes obras era o isolamento dos cabos elétricos submarinos e várias experiências foram realizadas nesse sentido, com a utilização da guta-percha, um latex natural, antecedente da borracha. Enquanto o telégrafo elétrico que uniu os oceanos Atlântico e Pacífico através do território dos Estados Unidos da América começou a funcionar em 12 de agosto de 1855 (O Comércio, 01-10-1855, p. 2), em Portugal ainda se planeava o telégrafo entre Lisboa e o Porto, e Lisboa e Badajoz. O contrato de estabelecimento das três linhas telegráficas elétricas, todas a partir do Terreiro do Paço, foi assinado em agosto de 1855 entre o Ministério das Obras Públicas e Alfredo Bréguet, como representante de Bréguet e companhia, de Paris (O Século, 08-081855, pp. 3-4). Em setembro o primeiro “condutor elétrico” foi colocado para comunicação direta entre a secretaria das obras públicas e o Paço das Necessidades, residência do Rei (O Século, 15-091855, p. 3). Este teria sido também o ano das primeiras transmissões de fax: “Um habitante de Nice descobriu, segundo a Gazeta de Saboia, o meio de empregar o telégrafo elétrico para transmitir escritas autógrafas e desenhos à pena ou a lápis com a maior precisão; de tal sorte que se poderia de Turim assinar uma obrigação ou uma letra de câmbio num papel, que estaria em Génova ou em Paris. Este resultado obter-se-ia por um telégrafo de vários arames por meio de um mecanismo, que ainda não é conhecido do público, mas cujo sucesso completo é garantido pelo inventor...” (O Comércio, 27-08-1855, p. 2). De facto, o pantelégrafo inventado por Caselli usava o telégrafo elétrico para transmitir imagens e em 1865 já funcionava entre Paris e o Havre, “com êxito muito satisfatório. A transmissão é mais fácil e rápida do que no telégrafo ordinário, e evitam-se os erros das cópias que davam lugar a tão esquisitos equívocos. O espedidos do despacho escreve-o numa plancha metálica, e a máquina do ponto onde o telegrama é recebido tira dele um ‘fac simile’ ou cópia exata de

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extrema fidelidade. Que mais maravilhas descobrirá a inteligência humana?” (Diário de Notícias, 01-04-1865, p. 3). Realmente, que mais maravilhas? Só mesmo o telefone, mas isso ficou para umas décadas mais tarde, apesar da notícia sobre uma “descoberta admirável”, num “século de milagres, numa época em que já de nada nos podemos admirar. A telegrafia elétrica ainda há pouco foi inventada e vai agora ser aperfeiçoada de modo a permitir a transmissão da palavra tão rapidamente como a transmissão dos sinais. Assim, diz o Journal do Havre, duas pessoas colocadas, uma em Perigueux, outra em Paris, poderiam conversar e falar tão facilmente como se estivessem num téte-à-téte! Esta descoberta é devida a um relojoeiro de Saint-Étienne, M. Peyrot” (O Comércio, 11-10-1854, p. 3). Uns meses mais tarde ainda se escrevia sobre este “milagre” que não teve, na altura, continuidade: “um certo Mr. Peyrot, relojoeiro em Saint-Etienne, achou o meio de transmitir a palavra humana, com velocidade igual à dos telégrafos elétricos e de maneira que duas pessoas, das quais uma se ache, por exemplo, em Lisboa e outra em Londres, podem conversar tanto à vontade uma com a outra como se estivessem juntas. Ótima notícia para os amantes” (O Século, 14-04-1855, p. 4). Grandes inovações marcaram estes anos, como um piano estenógrafo (O Comércio, 01-11-1854, pp. 2-3), mais um ensaio de uma máquina de escrever, antes das primeiras que foram patenteadas apenas na década seguinte. O interesse na transmissão dos sons à distância incentivou inúmeras experiências, como a que se realizou no “anfiteatro de física da Real Instituição Politécnica de Londres, por Mr. Pepper, diretor do estabelecimento, com umas varas que atravessavam o chão, e faziam de tubos condutores do som, que era produzido em baixo do palco por outros músicos”. Esta demonstração fora imaginada pelo “célebre físico Wheatstone, da bem conhecida propriedade que têm os corpos sólidos de transmitirem com mais intensidade e prontidão do que o ar, as ondas sonoras” (O Século, 10-06-1855, p. 3). Enquanto estas invenções não eram desenvolvidas, outros meios de comunicação eram incentivados, como os sinais ou código de Marryat, um alfabeto de bandeiras inventado pelo comandante Frederick Marryat (1792-1848), que passou a ser aplicado a partir de 1817 e que ainda no presente é usado pelos escuteiros. Em tempos de epidemia, a utilização deste código permitia a comunicação com os navios sem o contacto físico. Também foi inventada uma máquina de selar cartas no correio, pelo espanhol Cosme Garcia, “de grande utilidade para o expediente rápido. Com ela selam-se à vontade 14.000 cartas por hora, ou 200 por minuto” (O Século, 27-051855, p. 4). E ainda a “substituição na tipografia por filetes de zinco, dos filetes rígidos de que ela usa, o que a habilita, em vista da flexibilidade do zinco, para executar 26

trabalhos que lhe foram até aqui defesos. Não é agora uma impossibilidade na tipografia, como o não era já na litografia e na gravura, o reproduzir curvas, esferas, todas as figuras geométricas”. Esta invenção dos Srs. Castro e Irmão, apresentada na Exposição Universal de Paris, foi considerada pelo periódico francês Palais de l'Industrie “o maior passo que deu Portugal no caminho do progresso” (O Século, 2010-1855, p. 1). Em suma, as inovações na área das comunicações estavam, em meados do século XIX, a despertar o maior interesse tanto da ciência e da tecnologia, como da imprensa que as divulgava. A velocidade das comunicações era objeto de espanto, assim como as novas aplicações da telegrafia. De tal modo que periodicamente os jornais publicavam resumos das “maravilhas do mundo nos nossos dias”: “1ª A viaférrea pelo istmo do Panamá. 2ª O telégrafo elétrico de Bombaim, Madras, Calcutá, Agra e Lahore, com uma extensão de 3.000 léguas. 3ª Estabelecimento da comunicação com os países do interior da Austrália, mediante a navegação com vapores sobre o rio Murray (...). 4ª Comunicação com o interior de África. 5ª A abertura do istmo do Suez, cujos trabalhos vão principiar dentro em pouco” (O Século, 31-051855, p. 3). E os redatores dos jornais mostravam-se verdadeiramente impressionados com as novas tecnologias e a sua aplicação, por exemplo, no combate ao crime: “Abençoado seja o telégrafo elétrico, invento maravilhoso que, trazendo incalculáveis benefícios à humanidade, torna impossível a impunidade do crime. O Sr. Francisco Luís, dono de um lugar de carne e frutas na Ribeira Velha, tinha ao seu serviço um caixeiro, de 19 anos de idade (...) foi ali subtrair uma conta no valor de 47$140 rs. (...) safando-se em seguida para o Porto no primeiro comboio. O roubado deu logo parte no governo civil. Dali expediram-se imediatamente telegramas que deram em resultado ser o roubador preso pela polícia do Porto na estação das Devesas (...) o acusado foi ontem entregue ao poder judicial” (Diário de Notícias, 19-12-1865, p. 1). Uma máquina para compor textos também provocou exclamações, numa época em que as tentativas para aperfeiçoar e comercializar as máquinas de escrever ainda eram muito incipientes: “Ontem pela manhã fui convidado a ir ver uma máquina inventada por M. L. Casolari, com o síndico marquês Campori e outras pessoas. Ficámos surpreendidos ao ver compor, por meio deste aparelho, cinco versos de Dante com um comentário, em nove segundos por linha de trinta letras. Nós mesmos compusemos os nossos nomes. O inventor facilmente nos convenceu que, servindonos destas máquinas, se pode compor um discurso à medida que for sendo pronunciado, achando-se impresso antes de o orador descer da tribuna.” (Diário de Notícias, 28-12-1865, p. 1). 27

Em 1899 a transmissão de sons à distância e a telegrafia sem fios estavam na ordem do dia (Briggs, Burke, 2001: 133-142), tal como a instalação de linhas telefónicas em Lisboa e no Porto: “Telephonio (sic) sem fios. As maravilhas da eletricidade sucedem-se com surpreendente rapidez. Após o telégrafo sem fios, eis que as revistas científicas estrangeiras se referem ao radiophonio ou telephonio sem fios, aparelho inventado por um americano chamado Hayes. A transmissão telefónica faz-se perfeitamente por intermédio daquele aparelho, diz-se, tendo as últimas experiências feitas em New York dado os melhores resultados. Se o novo telephonio nos livrasse das intermináveis chamadas, seria uma revolução que ninguém deixaria de aplaudir” (O Comércio do Porto, 05-07-1899, p. 1). “O telégrafo sem fios. O governo dos Estados Unidos resolveu fazer uso nos navios de guerra do telégrafo sem fio, sistema Marconi. Este vai partir em princípios de setembro para os Estados Unidos, na esperança de que por meio do seu telégrafo sem fio se chegue a comunicar entre a América e a Europa. Falando com um jornalista, Marconi declarou que o projeto oferece grandes dificuldades, mas que as não julga insuperáveis. Lembrou vários problemas

científicos,

que

pareciam

impossíveis

e

que mais tarde foram

satisfatoriamente resolvidos” (O Comércio do Porto, 27-08-1899, p. 2). Em 1918 verificaram-se vários roubos de fios telefónicos em Lisboa e no Porto: “Ontem, eram 11 horas e meia da noite, quando, mais uma vez, deixou de funcionar o telephonio de Lisboa. (…) é sabido e esperado, nada havendo portanto a estranhar e muito menos… a reclamar, porque ninguém ouve” (O Comércio do Porto, 19-02-1918, p. 1). E foi notícia a comunicação de rádio entre Inglaterra e a Austrália: “Mais um progresso da Telegrafia sem fios. A Agência Técnica e Comercial Limitada, representante da Marconi's Wireless Telegraph Company, comunica-nos a seguinte informação telegráfica que acaba de receber de Londres: Realizaram-se com o maior sucesso as experiências oficiais de comunicações radiotelegráficas diretas, entre a estação de Carnavron (Inglaterra) e a estação de Sidney (Austrália). As novas estações foram inauguradas com mensagens trocadas entre Mr. Huges, PrimeiroMinistro da Austrália, e Sir Joseph Cook, Ministro da Marinha Britânica. Estas estações estão em comunicação direta dia e noite, a uma distância de cerca de 22.000 km, o que excede em muito tudo quanto a telegrafia sem fios tem conseguido até hoje. A Marconi's Wireless Telegraph Company continua portanto na vanguarda de todos os progressos da radiotelegrafia” (Diário de Notícias, 12-10-1918, p. 2). Tal como as comunicações, os transportes ocupam uma percentagem alta das notícias sobre tecnologia / inovação: 18,25%. Estas notícias e artigos desenvolvidos incidiram especialmente sobre a navegação a vapor, com descrições detalhadas da 28

maquinaria, das velocidades alcançadas, capacidade de carga, tonelagem e materiais utilizados, a substituição da madeira pelo ferro e da roda pela hélice. Em dois artigos desenvolvidos O Século defende o uso dos canais em Portugal para transporte dos produtos agrícolas e industriais, enquanto noutro transcreve um artigo de um jornal espanhol com a descrição dos trabalhos para exame técnico acerca da possibilidade da navegação do Tejo em toda a sua extensão, escrito por uma comissão de engenheiros, encarregada pelo governo de Espanha (O Século, 04-11-1855, pp. 2-3). A navegabilidade dos rios foi também alvo da preocupação de um inventor que resolveu o problema dos bancos de areia nos rios e mares, que “paralisam a navegação e algumas vezes até arrastam a perda dos navios. (…) Este problema acaba de ser resolvido dum modo simplicíssimo por meio da eletricidade. (…) Suponhamos pois que os navios estejam armados na sua proa ou na extremidade do mastro de gurupés de um longo tubo de ferro que mergulha no mar (...) e desde então este varão poderá atuar sobre um comutador. Este último poderá pôr em movimento também uma porção de campainhas de alarme colocadas perto do piloto ou do maquinista...” (O Comércio, 29-12-1855, p. 3). E ainda duas notícias de pormenor: um projeto de um relógio para a marinha, o qual durante a marcha do navio marca a latitude e longitude (O Comércio, 11-09-1854, p. 2); e um sino mergulhador, inventado por um engenheiro da marinha napolitana, e experimentado por três homens que permaneceram debaixo de água a uma profundidade de 50 pés, “os quais, durante aquele tempo, se regalaram com um bom almoço” (O Comércio, 14-04-1855, p. 2). Para além dos transportes marítimos e fluviais foram recolhidas notícias sobre transportes aéreos, cuja preocupação incidiu sobre a orientação dos balões aerostáticos: numa “Mr. Sourbieu criou um aparelho com o qual o problema da navegação aérea, que se julgava insolúvel, parece resolvido. O maquinismo de Mr. Sourbieu é muito simples, ainda que muito engenhoso; já se fez uma experiência em África, e no canal do Meio-Dia, dando um completo resultado. Mr. Sourbieu tem os certificados que o atestam. Dirige-se a Paris para ali fazer uma experiência no Campo de Marte” (O Comércio, 12-01-1855, p. 3); noutra Bordelez pretende ter resolvido o problema da direção dos balões: “o seu novo aeróstato, que intitula correio aéreo, é uma espécie de balão retangular, movido por uma máquina...” (O Comércio, 30-101855, p. 2). Em 1865 houve várias notícias sobre o “célebre Nadar” e o seu balão gigante, e outros inventores de aeróstatos, como por exemplo: “Um despacho telegráfico de Leão, datado de domingo 2, dizia que naquela tarde se verificara a ascensão do balão o ‘Gigante’, levando em si o célebre Nadar e mais sete passageiros. O ‘Gigante’ dirigiu-se para os lados do meio-dia da França. O tempo

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estava sereno e o céu limpo de núvens. Que coisa sublime é o ver-se o homem a voar por esse infindos horizontes” (Diário de Notícias, 09-07-1865, p. 2). As preocupações relativas aos transportes terrestres são demonstradas num artigo desenvolvido no qual se faz a defesa das estradas de macadame, “por onde possam percorrer com celeridade as diligências e carros de transporte, é um pensamento eminentemente organizador, que é espírito de bem público não pode deixar de aplaudir...” (O Comércio, 16-06-1854, p. 1). A construção do caminho de ferro e as inaugurações de troços, com as descrições das respetivas cerimónias e convidados, também ocupam um número significativo de notícias, particularmente no que diz respeito à imagem de progresso que isso transmite, sobretudo no estrangeiro. Por exemplo, O Século faz referência a uma gravura publicada na revista Ilustração Francesa de dezembro de 1855 representando o ato da inauguração do caminho de ferro de Sintra (15-12-1855, p. 2). A importação de materiais e de engenheiros do estrangeiro também dava prestígio a estas obras nacionais e eram usadas para promoção do mérito do governo: “Chegou, vinda de Inglaterra, a ponte que deve ser colocada no sítio de Xabregas. No último paquete chegaram igualmente os engenheiros ingleses que vêm levantar o traçado da via-férrea de Coimbra ao Porto. Soubemos também que o Sr. Lecotte está embarcando em Inglaterra os materiais e máquinas precisas para o começo do caminho de ferro de Lisboa a Sintra. (...) Agora o que fazemos é desafiar os órgãos da oposição a que se vinguem de nós, citando-nos destas misérias ocorridas no seu tempo...” (O Século, 25-08-1855, p. 1). Neste século de experiências científicas e tecnológicas, as tentativas de autonomização dos veículos terrestres foram repetidas e as façanhas dos seus inventores, mais ou menos fantasiosas, foram amplamente noticiadas. Por exemplo: um “esperançoso jovem” construiu um modelo de caminho de ferro movido por transferências de água, sem locomotiva (O Comércio, 22-12-1855, p. 3); outro “obreiro mecânico” foi de Lyon a Paris “com uma carruagem de sua invenção, rodando sem cavalos e sem auxílio do vapor. O veículo é movido só pelo efeito do peso dos viajantes que o ocupam. Se se der crédito ao inventor, a sua carruagem colocada sobre os rails de um caminho de ferro correria com uma presteza de 30 a 35 km por hora” (O Comércio, 10-12-1855, p. 2). E “na avenida de St. Cloud fez-se a experiência de um coupé de 4 rodas, movido por uma máquina de vapor do tamanho de um chapéu de homem. Esta máquina também movia uma pequena imprensa que lançava prospectos à direita e à esquerda. É invento de um caixeiro-viajante. No mesmo

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instante via-se na grande avenida dos Campos Elísios um cavalo que puxava com rapidez um cabriolet com uma só roda” (O Comércio, 15-09-1855, p. 3). As notícias vindas do estrangeiro não deixavam de provocar incredibilidade nos redatores dos jornais portugueses, que aproveitavam todas as oportunidades para ironizar, ou simplesmente colocar exclamações no meio das notícias: “Uma maravilha da indústria humana existe neste momento em poder do Rei de Wurtemberg. É um cavalo autómato que executa todos os movimentos que podem exigir-se a um cavalo verdadeiro. Montam-no e governam-no, e presta-se a todas as fantasias da equitação. Esta preciosidade só funciona diante de pessoas de grande intimidade do rei. Era de um bicho destes que precisava cada colaborador desta folha para fazer as suas excursões diárias” (Diário de Notícias, 29-12-1864, p. 1). “Alegrai-vos ó sectários do verdadeiro progresso! A electricidade vai ser aplicada à locomoção! Carruagens movidas pela electricidade (…) locomotivas electromagnéticas (…) Mr. Luiz Bellet em colaboração com Mr. de Douvre explicaram o seu aparelho e fizeram a experiência em frente de grande número de sábios em Paris, e dos representantes da imprensa. Calcula-se que por este meio se possa ir de Paris a Marselha em duas horas...” (Diário de Notícias, 21-01-1865, pp. 1-2). Para finalizar, o eterno projeto do Túnel da Mancha, que só teve concretização um século e meio mais tarde: “O doutor Payerne apresentou um novo projeto para o caminho de ferro submarino entre a Inglaterra e a França, comprometendo-se a fazer construir um túnel pelo meio do qual o espaço que separa estes dois países será atravessado em 33mn. O custo desta obra maravilhosa é de 10 milhões de libras (45 mil contos)” (O Comércio, 27-07-1855, p. 1). A indústria ocupou quase 20% das notícias e anúncios na área da tecnologia / inovação. As preocupações são muito variadas, desde a discussão das vantagens dos tubos de grés para encanamentos de água e gás, já que o grés é uma cerâmica de grande resistência (O Comércio, 09-06-1854, p. 4); ao álcool extraído de milho e de arroz, cujo rendimento suplantaria a vinha e a beterraba (O Comércio, 09-10-1854, p. 2). Os têxteis tiveram grande desenvolvimento neste século, novas matérias-primas foram ensaiadas e os teares foram aperfeiçoados com a introdução da eletricidade. Alguns exemplos: “ontem à noite no boulevard Montmartre abriu-se o primeiro armazém de vestidos de homem de todas as espécies cosidos por mecânica. Tem 24 máquinas de coser movidas por uma máquina a vapor locomotiva da força de um cavalo. 24 mulheres sentadas dirigem com os dedos o trabalho das máquinas, cada uma das quais dá com uma precisão matemática 600 pontos por minuto e faz uma calça em 40 minutos” (O Comércio, 15-09-1855); “No Pertshire fez-se ultimamente 31

uma modificação importante na manufactura das redes dos pescadores. Empregou-se algodão em lugar de cânhamo, e as redes feitas segundo este novo processo serviram toda a estação e corresponderam a tudo quando se podia desejar. São, além disso, mais macias e mais leves que as de cânhamo, e por conseguinte mais fáceis de tirar da água. Também secam mais depressa e mais completamente” (O Comércio, 18-101854); “O tear eléctrico do cavalheiro Caetano Bonelli está em plena actividade na casa Dupré. (…) Os teares de Jacquard podem ser facilmente convertidos em teares eléctricos; a invenção do cavalheiro Bonelli sem dúvida se propagará. Na exposição universal de Paris de 1855 este tear eléctrico figurará duma maneira distinta e gloriosa para a Itália” (O Comércio, 25-01-1855). O mesmo Bonelli, director dos serviços telegráficos de Turim, também aplicou o telégrafo eléctrico aos caminhos de ferro e ao telégrafo submarino (O Comércio, 08-02-1855, p. 2; O Século, 07-08-1855, p. 2). Na indústria dos artigos de luxo, Lyon sempre se destacou: um inventor desta cidade impregnou fios de seda com ouro, prata e outros metais, de modo a produzir tecidos flexíveis e metalizados. Logo uma empresa foi criada para os produzir e alguns destes tecidos foram apresentados na Exposição Universal de Paris (O Comércio, 0207-1855, p. 2). Foram também alvo das notícias as novas aplicações da borracha, especialmente a borracha flexível que agora podia ser usada em sapatos, a partir da invenção da borracha galvanizada por Goodyear, patenteada em 1844. Além de muitas outras aplicações que iam sendo experimentadas: “O cahuchú tem-se tornado duma aplicação quase geral; as diversas maneiras de o empregar multiplicam-se todos os dias. Começa-se agora a usar para forrar os navios, em lugar de folhas de cobre, folhas de cahuchú endurecido e laminado. Esta composição, que recebeu de M. Durand, seu inventor, o nome de metallo para, não se oxida como os metais, não ganha musgo no mar, nem percebes, e conserva o exterior do navio liso e polido como se fosse esmaltado. Estas lâminas podem também ser empregadas com utilidade para cobrir todos os lugares, soalhos, paredes, etc. onde se receia humidade” (O Comércio, 27-01-1855). Em Berlim começou a aplicar-se a guta-percha às rodas das carruagens (Diário de Notícias, 21-07-1865, p. 3). Outra grande inovação desta época: o alumínio. Depois da sua descoberta recente, os primeiros objetos estavam agora a ser produzidos e seriam apresentados na Exposição Universal de Paris de 1855. Tanto O Século como O Comércio publicaram artigos desenvolvidos sobre a História deste material, os “sábios” que o estudaram (Davy, Sainte-Caire Deville, Wohler), as suas propriedades e os seus usos potenciais. 32

Em paralelo com inúmeras notícias sobre tentativas de suicídio com fósforos, J. A. d'Oliveira, colaborador d’O Comércio, divulgou um novo método para os preparar, descoberto por um químico austríaco, M. Schotter, que eliminou os seus inconvenientes graves (O Comércio, 05-07-1855). Para além da publicitação oficial de várias patentes de invenção que eram requeridas a nível nacional depois de publicadas no Diário do Governo, os jornais também divulgaram nestes anos os concursos internacionais que ofereciam prémios para estimular a investigação científica nas mais diversas áreas. A Exposição Universal de Paris de 1855 foi um polo aglutinador de várias novidades científicas e tecnológicas, assim como a do Porto em 1865. É o caso de uma lâmpada luminosa, culinária e calorífera (O Comércio, 25-01-1855, p. 2) e de um instrumento que mede a força dos ventos (O Século, 27-05-1855, p. 4). No que diz respeito à representação portuguesa, foram divulgados instrumentos de cirurgia e vinhos portugueses, que ganharam importantes prémios, revelando “a nossa superioridade vinícola” (O Século, 01-09-1855, p. 1). O ano de 1855 ficou também marcado pela introdução da iluminação a gás nas ruas e nas casas particulares das principais cidades portuguesas, o que deu origem a notícias recorrentes e comentários. As notícias de meados do século XIX referem algumas inovações na agricultura, como o emprego de cola na água da rega, que “ativa e fortifica a vegetação” (O Comércio, 25-08-1854, p. 1); uma máquina de transplantar as árvores, invenção de M. Stewart MacGlashen, de Edimburgo, que foi demonstrada em Paris, diante do imperador e da imperatriz (O Comércio, 22-12-1854, p. 3); o uso do guano natural como adubo na América do Sul, as vantagens da sua aplicação na agricultura europeia e a instalação de uma fábrica de guano artificial em Espanha (O Comércio, 07-02-1855, pp. 1-2, 25-08-1855, pp. 1-2; O Século, 20-04-1855, p. 4); a recomendação do uso do arado americano, “que se fabrica na fundição de Massarelos” (O Comércio, 20-06-1855, p. 3); descrição, funcionamento e rentabilidade da máquina de debulhar e limpar os cereais, chamada Ventilador, ou Blutoir (O Século, 08-07-1855, pp. 2-3); um novo sistema de cultura de arroz no Egipto, por invenção do “sábio agrónomo de Veneza, M. Jérome Lattis” (O Comércio, 01-08-1855, p. 2); o relatório das culturas, sistemas e maquinismos postos em prática na quinta experimental do Instituto Agrícola (O Século, 08-08-1855, pp. 2-3); entre outras. No tema do armamento há duas notícias sobre o “aeronauta M. Godard, muito conhecido em Viena por muitas ascensões” que “descobriu ultimamente um meio de

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empregar os balões aerostáticos nas operações militares. O governo austríaco aceitou a invenção de M. Godard e ofereceu-lhe os fundos necessários para a desenvolver” (O Comércio, 28-07-1854, p. 2). E mais duas com o título “Como se destroi Cronstadt”, sobre o Sr. Gardoni, “aeronauta francês” que “efetuou em Londres a sua primeira ascensão num balão tricolor (...) Trata-se de um monstruoso balão suscetível de levar uma pesada barrica ou pipa. O balão enche-se de gás hidrogénio puro, podendo-se isto levar a efeito a bordo de uma nau ancorada à vista de um porto fora do alcance da artilharia inimiga...” (O Século, 30-08-1855, p. 4; O Comércio, 01-09-1855, p. 2). As notícias sobre esta área são sobretudo transcrições de periódicos estrangeiros e incidem sobre novas peças de artilharia com maior alcance (O Comércio, 09-08-1854, pp. 2-3); experiências sobre balas de antimónio, mais destruidoras que as de ferro (O Comércio, 23-08-1854, p. 2); a invenção de uma clavina elétrica, que lança 66 balas por minuto à distância de 600 a 700m (O Comércio, 25-01-1855, p. 2); uma bomba com o sistema inovador de François-Thaslin, sem espoleta e que pode rebentar num momento determinado com antecipação (O Comércio, 04-04-1855, p. 3); uma nova máquina de guerra inventada por um mecânico suíço chamado Federer, e que pode lançar 700 projéteis por minuto (O Século, 17-05-1855, p. 4); a aplicação da luz elétrica “ao tempo de darem fogo os canhões nos ataques noturnos” por parte do exército russo, que causa grande estrago no exército aliado e “prova os grandes adiantamentos da arte militar na Rússia” (O Século, 26-05-1855, p. 4); a nova espingarda de aço, inventada por M. W.-G. Armstrong (O Comércio, 05-06-1855, p. 2); a nova utilização das granadas de mão pelo exército da Baviera, depois de terem sido inventadas pelos franceses, que pela primeira vez se serviram delas no cerco de Arles, em 1536 (O Comércio, 07-07-1855, p. 3); e as experiências russas sobre baterias flutuantes (O Século, 29-11-1855, p. 3). Em 1865 o Diário de Notícias divulgou que o Rei D. Luís inventara uma bala, a partir de uma carta do Imperador Napoleão que “escreveu a el-rei de Portugal pedindo-lhe que se sirva aperfeiçoar a bala de sua invenção para ser adotada no exército francês” (Diário de Notícias, 05-06-1865, p. 1). O mesmo periódico publicou notícias sobre uma espingarda para 30 tiros inventada por um frade português, talvez uma antecessora da metralhadora (Diário de Notícias, 07-03-1865, p. 2); o uso da nitroglicerina em substituição da pólvora de canhão (Diário de Notícias, 01-04-1865, p. 2); e sobre a invenção de uns “foguetes-flecha” pelo “artista português o Sr. Francisco António Tavares”, comentada com ironia pelo redator: “O foguete-flecha percorreu com a rapidez do raio um espaço de 850 m. A arte da destruição vai caminhando na vanguarda do progresso” (Diário de Notícias, 28-04-1865, p. 3). Nos estaleiros

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franceses de Toulon foi construído um navio couraçado inventado pelo imperador Napoleão, descrito como uma máquina de guerra cujo peso e velocidade faria o inimigo “em estilhaços” (Diário de Notícias, 01-06-1865, p. 2); e foram feitas experiências “com ótimo resultado” a uma “máquina infernal submarinha”, adjetivada de “diabólica invenção”, pois “qualquer que seja a posição em que se ache o navio inimigo, a máquina surpreende-o de pronto e o destrói com a rapidez do relâmpago” (Diário de Notícias, 28-06-1865, p. 3). Foi inventado um cronógrafo eletro-balístico para medir o “pequeno espaço de tempo que um projétil gasta em percorrer um elemento da sua trajetória”, que foi considerado “mais uma aplicação útil do eletromagnetismo a juntar às muitas com que a ciência se tem modernamente enriquecido” (Diário de Notícias, 27-09-1865, p. 2); e uma “uma espada rewolver de seis tiros”, uma “arma branca preciosa que reúne as duas condições de arma branca e de fogo mais aperfeiçoadas, pois o projétil percorre muito maior distância que o do rewolver” (Diário de Notícias, 05-12-1865, p. 2). Em 1918, em plena Guerra Mundial, a única notícia sobre armamento surge na legenda de uma fotografia, no meio de um artigo sobre o desenvolvimento da guerra: “Nova catapulta para arremesso de pesadas bombas, inventada pelos alemães e tomada pelos franceses no sector de Oise” (Diário de Notícias, 21-01-1918, p. 1). Em 1918 os anúncios a automóveis e máquinas de escrever tornam-se uma atração, assim como a publicidade aos pneus Michelin, com gravuras fascinantes que podem ser vistas no anexo (Diário de Notícias, 27-02-1918, p. 4, 30-03-1918, p. 4, 2904-1918, p. 4, 03-07-1918, p. 4, 20-07-1918, p. 4, 16-11-1918, p. 4). Os pneus Soly foram a resposta portuguesa a este produto (O Comércio do Porto, 09-02-1918, p. 3). Nas artes e espetáculos há apenas duas notícias em 1855, mas que revelam grande inovação, pelo menos aparente: uma sobre distribuição de música pelas casas, “assim como se distribui a água e o gás”. No entanto o redator d’O Século que transcreveu a notícia da Revista dos Teatros considera que esta “não passa de um puff, un canard, uma espirituosa invenção do sobredito jornal” (O Século, 04-04-1855, p. 4). E outra sobre uma “descoberta importante para o mundo artístico”: “o marfim tornado líquido pode ser empregado a tomar a moldura dos baixos-relevos e das esculturas da maior dimensão. Reduzido a massa, o marfim é colocado no molde (...) As esculturas de madeira do coro de Notre Dame de Paris acabam de ser reproduzidas por este novo meio plástico” (O Comércio, 22-12-1855, p. 2). Em 1865 o Diário de Notícias publicou um artigo desenvolvido sobre a galvanoplastia ou eletrometalurgia, sua origem e sua aplicação às artes (Diário de Notícias, 12-05-1865, p. 3) e quatro anúncios a oficinas de litografia que ofereciam 35

serviços muito variados e rápidos: “Litografia Franco-Portuguesa. Os proprietários desta litografia, sendo os proprietários desenhadores e gravadores, oferecem a seus fregueses um sem número de vantagens com imediata relação aos preços e execução dos trabalhos. Incumbem-se de desenhos em todo o género, quer sejam – Plantas topográficas, apólices, diplomas, letras de câmbio, conhecimentos, ordens de cobre, retratos, paisagens, faturas, bilhetes, mapas, figurinos, cartas de jogar, ornatos, bilhetes de visita, cartas e cartões de participação de casamento, circulares, rótulos, tarjas, imagens, etc. (desenhos à pena e aquarelas). Bilhetes de visita. Os mais adotados atualmente pela brevidade, nitidez, duração e barateza, são os litografados e impressos em cartão sem lustro…”. No mesmo número, uma referência à mesma casa, assinada por “um apreciador”: “Em boa hora vimos ontem a exposição de desenhos existentes na praça do Loreto, e recomendamos este atelier como único no seu género quanto a desempenho, barateza e brevidade. Seriam 9 horas quando ali nos dirigimos a fazer várias encomendas, dentre as quais nos surpreendeu obtermos no mesmo dia às 5 horas da tarde 700 bilhetes de visita com 7 nomes diversos, e pelo preço de 800 rs. cada cento! A razão é por ser proprietário o próprio desenhador. À vista desta barateza e prontidão ainda haverá quem queira cegar o próximo fazendo uso dos bilhetes relevados em branco…” (Diário de Notícias, 04-06-1865, p. 4). Em 1899 o Salão Kodak teve “enchentes sucessivas” com o “magnífico Diorama Animatográfico que se exibe neste salão, rua Ivens, 48 (…) Todos os dias há sessões às 5, 7, 9 e 11 horas da noite e sempre com quadros novos de fotografia animada” (Diário de Notícias, 02-01-1899, p. 2). Já mais avançada em 1918, a indústria cinematográfica portuguesa dava os seus primeiros passos: “No Jardim Passos Manuel assistimos ontem à exibição de uma interessante película portuguesa, que tem por assunto uma alegre aventura de frades, espirituosamente narrada pelo brilhante escritor Sr. Júlio Dantas, numa das suas crónicas das quintas-feiras no Primeiro de Janeiro. A referida película, cuja propriedade pertence à conhecida empresa Invicta Film, desta cidade, em cujos ateliers foi confecionada (...) não lhe faltando o relevo e a movimentação da vida real...” (O Comércio do Porto, 06-08-1918, p. 1). Neste ano foram publicados anúncios a gramofones e aos respetivos discos, “Últimas novidades, enorme e variado sortido” (O Comércio do Porto, 06-01-1918, p. 4). Em 1929 a publicidade da Kodak tornou-se mais sofisticada e apelativa: “Bébé só ficará Bébé em fotografias ‘Kodak’. Como Bébé está crescido!... Em breve os calções ou as saias substituirão o pequeno vestido curto de Bébé, e os seus belos caracois, doirados ou castanhos, que hoje constituem o vosso orgulhoso enlevo, terão 36

de cair sob as tesoiras impiedosas. Bébé só ficará Bébé em fotografias ‘Kodak’. Mamãs, quando os anos tiverem levado a adorável infância dos vossos filhos, bastarvos-há folhear o vosso Album ‘Kodak’, para contemplardes de novo os encantadores rostos, as graciosas atitudes dos vossos Bébés. Em alguns minutos aprendereis a manejar o vosso ‘Kodak’” (Magazine Bertrand, 06-1929, p. 9).

4. Educação / Formação científica A área temática da educação / formação científica ocupa 7% da base de dados e é constituída maioritariamente por anúncios de professores particulares e de colégios e cursos de todos os níveis e áreas de ensino, incluindo línguas por professores estrangeiros, preparação para admissão a escolas superiores e manuais escolares.

Quadro 4: Notícias e anúncios sobre educação / formação científica, 1854-1918. Educação/ Formação Científica Cursos Ensino artístico Gabinetes de Leitura Instrução primária Instrução secundária Instrução superior Manuais escolares Total

Nº % 99 19,92 27 5,43 7 1,41 191 38,43 32 6,44 79 15,90 62 12,47 497 100,00

Gráfico 7: Percentagens das notícias e anúncios sobre educação / formação científica no total da ciência e tecnologia.

Educação/ Formação Científica 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0 1854 / 1855

1865

1899

1918

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Um exemplo de um anúncio de curso de caligrafia em 1855: “Godinho. Gabinete Caligráfico. (…) Do 1º de maio em diante os cursos de escrita serão: Das 6 às 8h da manhã, e das 4 às 6h da tarde para indivíduos do sexo masculino. Do meiodia às duas da tarde para senhoras. Preço 1$920 réis mensais, pagos sempre adiantados. O estabelecimento dá tudo, menos canivete.” (O Século, 26-04-1855, p. 4). Nos colégios é interessante analisar os currículos propostos, tanto para os meninos como para as meninas, e os comentários que os respetivos anúncios provocaram nas notícias. Por exemplo, no Colégio de Mademoiselle Aucta Pawley de Araújo realizaram-se “os exames das disciplinas que ali se ensinam, e a distribuição dos prémios àquelas meninas que mais se distinguiram. (…) Fizeram-se exames sobre gramática portuguesa – aritmética – caligrafia – francês – inglês – geografia – história de França – música – desenho e dança. Estranhamos que nos exames não entrasse a história de Portugal, entrando a história de França. Não podemos crer que a falta provenha de ser a história portuguesa banida de um colégio frequentado por meninas portuguesas que, a terem de aprender a história de algum país, deveriam principiar pela da sua nação” (O Comércio, 02-10-1854, p. 2). Exemplos de anúncios publicado em vários números d’O Comércio: “Colégio de Instrução para meninas dirigido por Ana Ramos Soares. A Diretora e sua família, há pouco chegados do Brasil, onde dirigiram por espaço de oito anos um igual estabelecimento, participam ao respeitável público que no dia 1º de outubro do corrente ano abrem o seu colégio nesta cidade do Porto (…) pensionistas, meiaspensionistas e alunas externas, todas as quais serão tratadas com o maior esmero possível. Neste colégio se ensinará o seguinte: Religião. Doutrina Cristã, etc. Primeiras Letras – leitura, escrita, gramática e aritmética. História. Desenho. Línguas – Francesa e Inglesa. Música – Piano e Canto. Prendas – Meia, renda, costura, crivo, bordados a branco, matiz, relevo, ouro, cabelo, missanga e petit-point, diversos trabalhos de crochet e várias obras de cabelo. (...) ensinando-lhes além dos estudos acima mencionados, que são próprios do seu sexo, a escrituração mercantil. O professor desta aula é o marido da Diretora, coadjuvado por seu livro...” (O Comércio, 27-09-1855, p. 4). Colégio Nacional, “dirigido por D. Ana Cândida da Fonseca Braga. Continua a aceitar educandas internas e externas, no qual se ensina toda a qualidade de prendas modernas, piano, canto, dança, francês e desenho…” (O Comércio, 19-051855, p. 4).

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Entre as notícias, salientam-se algumas discussões sobre a conveniência dos cursos comerciais e sobre o ensino artístico. Também sobre a abertura dos cursos do Instituto Industrial de Lisboa e respetivas vantagens: “Quando o livro de química repouse sobre o tear, quando o lápis do desenho se confunda com a lima do manufatureiro de ferro, quando o artista de qualquer classe se aclimatize a um tempo com a oficina e com a escola, então o futuro da arte não se fará esperar por muito entre nós...” (O Comércio, 08-11-1854, p. 1). E sobre novos métodos de instrução primária e aprendizagem da leitura e escrita, como o método Castilho (O Comércio, 23-08-1854, p. 3); sobre a aplicação da mnemónica às línguas e às ciências (O Comércio, 20-04-1855, p. 3); ou exaltando a modernidade dos sistemas de ensino em Inglaterra e no Império Turco, onde em 1846 se publicara legislação sobre instrução pública: “todo o cidadão é obrigado, logo que seus filhos chegarem à idade de seis anos, a inscrever-lhes os nomes nos livros de uma das escolas públicas, exceto se provar que se acha em estado de os educar em casa. Em Constantinopla há agora 396 escolas gratuitas, frequentadas por 22.700 alunos de ambos os sexos. Há também seis escolas de instrução secundária com perto de 1.000 alunos (...) Há também uma escola de instrução superior para os mancebos, que se destinam aos empregos públicos, um colégio para o mesmo objeto, uma escola normal para a educação de professores, um colégio imperial de medicina, uma escola militar naval e de agricultura. O Sultão é o superintendente destas escolas, e assiste aos exames. As livrarias públicas de Constantinopla contêm 80.000 volumes” (O Comércio, 16-021855, p. 3). Teve ainda interesse e foi alvo de repetidas notícias em todos os jornais a fundação, por parte do Rei D. Pedro V, de uma escola primária no palácio de Mafra: “O mestre, os livros e mais aprestes necessários para a escola funcionar, é tudo por conta de El-rei. Sua Majestade, fundando no seu próprio palácio uma escola de instrução popular, deu um exemplo eloquente aos que devem por encargo oficial promover a difusão do ensino público, principalmente o primário, que tão ao desamparo e mal retribuído anda neste reino. (…) este ato, verdadeiramente digno de um rei constitucional, inteligente e civilizador, auspicia-nos um reinado grandemente fautor das ciências, das letras, e das artes, com o concurso das quais tanto se têm engrandecido e nobilitado as nações mais ilustres da Europa” (O Século, 15-12-1855, p. 2). D. Pedro tinha especial interesse pelas ciências e pela educação. Nas suas frequentes viagens pela Europa, o rei visitava museus, jardins zoológicos e botânicos, exposições e instituições científicas, geralmente com um guia especializado (o diretor 39

do museu ou da instituição) e com direito a cerimónia e convidados ilustres a acompanhar. Correspondia-se com cientistas da época e era leitor assíduo das mais recentes novidades científicas. São conhecidos os seus diários de viagem e correspondência com toda a família, especialmente com o primo Alberto, marido da Rainha Vitória (Mónica, 2007). Dentro do espírito científico da época foi um colecionador, e adquiria recordações das viagens, especialmente espécimes de história natural, como aves embalsamadas. Formou o seu próprio museu de história natural, que deu origem ao Museu de História Natural de Lisboa e Jardim Botânico da Ajuda. E, tal como outros membros da sua família, tinha interesse pela arte, desenhava, pintava e fazia fotografia. D. Pedro V fundou o Curso Superior de Letras em Lisboa em 1859 e a sua memória foi recordada nesta instituição quando se anunciou uma subscrição para colocar o seu retrato na sala das preleções (Diário de Notícias, 20-10-1865, pp. 2-3). O ano de 1854 ficou marcado pela discussão no parlamento sobre a reforma do ensino superior. Houve uma proposta de retirar do Porto e centralizar em Lisboa a Escola Politécnica, que foi logo contestada, com sucesso, pela Associação Comercial do Porto; ao mesmo tempo defendeu-se a criação de uma Escola de Economia Política no Porto e de Institutos Comerciais em Lisboa e no Porto, temas que deram origem a numerosos artigos desenvolvidos nos jornais consultados. Foram ainda publicadas notícias regulares sobre doutoramentos na Universidade de Coimbra. Em 1865 o Diário de Notícias publicou diversos anúncios a professores de música e de desenho e a gabinetes de leitura franceses e espanhóis, onde se faziam alugueres de livros (Diário de Notícias, 27-07-1865, p. 4, 01-11-1865, p. 4). Em 1899 foram publicados anúncios de professores de línguas e de várias disciplinas científicas. Por exemplo, o Sr. Louis Dyson Vaz anunciou cursos práticos de francês para aqueles que desejasse ir a Paris à exposição Universal de 1900 e um capitão do exército dava “lições de matemática superior, matemática elementar e física, em curso e em particular” (Diário de Notícias, 13-08-1899, p. 2). Foram notícia, entre outras, os exames de habilitação para professoras do Instituto de Surdos-Mudos Araújo Porto, aos quais se apresentaram duas candidatas, que foram aprovadas (O Comércio do Porto, 24-08-1899, p. 2; neste ano ainda não tinham sido divulgados os trabalhos de Hellen Keller e Annie Sullivan, cujas autobiografias só foram publicadas, respetivamente, em 1903 e 1911); o anúncio oficial da abertura dos cursos de médicocirurgião, farmacêutico e parteira na Escola Médico-Cirúrgica do Porto, com a descrição das diferentes habilitações exigidas para as respetivas matrículas (O Comércio do Porto, 07-09-1899, p. 3); e a inauguração do curso de patologia exótica 40

na Escola Naval, “sob a regência do sábio professor o Sr. D. António de Lencastre”, um “ilustre clínico” que, na conferência inaugural defendeu o avanço das ciências ligadas ao colonialismo e a necessidade da criação de uma escola de medicina tropical: “O sábio Virchw, em pleno parlamento alemão, não hesitou referindo-se a nós e à Espanha, em proclamar bem alto, à luz dum critério severíssimo e implacável, que Portugal nem cientificamente tinha direito à posse de tão largos domínios coloniais, porque nada produzíamos sobre patologia, geografia médica, climatologia, etc.” (Diário de Notícias, 17-11-1899, p. 2). Já havia escolas de medicina tropical em Liverpool desde 1898 e Londres desde 1899; depois foram criadas outras semelhantes em Hamburgo em 1901 e em Lisboa em 1902. Este tema enquadra-se no maior debate da época sobre a ocupação efetiva das colónias, que tinha dado origem ao Ultimato Inglês e à questão do Mapa Cor-de-Rosa. Ora aqui observa-se que a comunidade científica internacional também colocava o conhecimento científico sobre as colónias ao mesmo nível da ocupação militar e humana dos territórios. Em 1918, para além dos habituais anúncios a explicadores, divulgaram-se regularmente as escolas móveis agrícolas, criadas por decreto que instituiu o ensino agrícola móvel, “que será essencialmente prático e consistirá em lições sem carácter erudito, que engenheiros agrónomos, agricultores, diplomados ou regentes agrícolas, e também eventualmente engenheiros silvicultores e médicos veterinários realizarão em iniciativas temporárias, de local variável, sob a forma de palestras, demonstrações e exercícios aos centros rurais e nas propriedades de particulares ou do Estado (...) e se destinará a difundir, entre os agricultores da respetiva região, por meios intuitivos, os conhecimentos dos bons processos culturais, zootécnicos e tecnológicos. Por este decreto são desde já criadas cinco escolas de ensino agrícola móvel: no Porto, em Tomar, nas Caldas da Rainha, em Beja e em Faro...” (Diário de Notícias, 25-09-1918, p. 1). A Escola Móvel Agrícola "Maria Cristina" foi particularmente ativa neste ano, e publicou anúncios periodicamente sobre os cursos que ia ministrar nas várias localidades, discriminando as matérias. Por exemplo, quando deu o seu curso em Armamar, publicou o seguinte anúncio, detalhando as lições e os trabalhos práticos a desenvolver: “Preleções – Doenças das vinhas e das árvores de fruto. Trabalhos práticos – Enxofre e poda verde. Palestra – Realiza-se amanhã em Armamar sobre tratamento da vinha” (O Comércio do Porto, 11-05-1918, p. 2). As preocupações republicanas com a educação e a formação dos cidadãos foram postas em prática neste ano com iniciativas que abrangeram a reforma do ensino primário: “Prosseguindo na execução do seu vasto plano da reforma dos diversos ramos de instrução pública, o esclarecido ministro da instrução Sr. Dr. Alfredo 41

de Magalhães está agora empenhado na remodelação em moldes inteiramente novos, do ensino primário (…) São tantos os progressos e as inovações introduzidas no ensino primário e na educação infantil que o século XX, nos domínios da pedagogia, se proclamou o século da criança...” (O Comércio do Porto, 19-12-1918, p. 1). E a formação dos respetivos professores e dos seus filhos, com a criação da escola de ensino primário superior (O Comércio do Porto, 13-07-1918, p. 3) e do Instituto do Professorado Primário, “internato de educação moral e profissional para os filhos dos professores primários”, altamente elogiado pela imprensa, por ser “merecedora de todas as simpatias a aplausos...” (O Comércio do Porto, 19-07-1918, p. 1). Foram publicadas notícias sobre novos métodos de ensino, como por exemplo o “Método Moderno de leitura, escrita e cálculo do professor de Sendim de Tabuado, Sr. Alfredo Serra, o qual deve trazer grandes vantagens ao ensino das crianças que frequentam as escolas primárias, como a prática já o tem demonstrado na escola a cargo do mesmo professor” (Diário de Notícias, 05-01-1918, p. 1), e discussões sobre a necessidade de desenvolver o ensino técnico, industrial e comercial, a partir dos inevitáveis exemplos estrangeiros: “Por toda a parte se está observando, depois que findou a guerra, uma intensa propaganda de ideias, no sentido de se intensificar a preparação técnica para a poderosa transformação económica que tem de operar-se em todos os países. Há poucos dias ainda, o ministro da instrução pública de França (...) afirmou que o aperfeiçoamento da cultura científica se torna indispensável, mas muito mais indispensável é o aperfeiçoamento do ensino técnico. Está-se observando lá fora um eficaz movimento conjunto, em que se cuida, simultaneamente, do ensino técnico superior e do ensino profissional médio e elementar. Para realizar esse amplo plano reconhece-se indispensável transformar as instalações existentes: As oficinas e laboratórios ocupam o lugar que outrora era reservado a cursos teóricos...” (O Comércio do Porto, 08-12-1918, p. 1). “A reforma do ensino industrial e comercial, ultimamente realizada pela Secretaria do Estado do Comércio, obedece ao louvável pensamento de preparar para duas grandes profissões, a indústria e o comércio, aqueles que possam prestar-lhe concurso valioso, contribuindo assim para o engrandecimento económico de Portugal. O ponto essencial dessa reforma é o que estabelece a criação de escolas de artes e ofícios e de aulas comerciais em toda a parte onde elas sejam julgadas proveitosas. (...) É preciso ir pensando em tornar o ensino profissional obrigatório, como está na Alemanha (...) Receamos que as escolas de artes e ofícios e as aulas comerciais organizadas pela forma por que se acham estabelecidas no recente decreto, venham a constituir órgãos inadaptáveis ao nosso meio (...) Pelo que diz respeito ao ensino 42

superior, foram introduzidos diversos aperfeiçoamentos na organização do Instituto Superior Técnico, cujo plano de estudos, concebido e posto em execução pelo seu ilustre diretor Sr. Dr. Alfredo Bensaúde era já um excelente modelo no seu género...” (O Comércio do Porto, 13-12-1918, p. 1). A reforma do ensino secundário e a introdução da ginástica nos currículos também foi elogiada pela imprensa: “O Diário do Governo publica o decreto aprovando o novo regulamento de instrução secundária, pelo qual em cada uma das capitais de distrito funcionará um liceu nacional. Nas cidades de Lisboa, Porto e Coimbra funcionam, respetivamente, quatro, dois e um liceus nacionais centrais; em cada uma das de Lisboa e Porto um liceu nacional central feminino e na de Coimbra um liceu nacional feminino...” (O Comércio do Porto, 14-09-1918, p. 2). “Pela repartição de instrução da Câmara Municipal de Lisboa foi notificado aos professores regentes e diretores das escolas da capital que começa desde já, pelo menos em 40 escolas do sexo masculino e feminino da capital, o ensino da ginástica. Para tal ensino foram nomeados os professores das escolas oficiais de Lisboa (…) É gratuita a função daqueles professores que terão a seu cargo uma determinada área…” (Diário de Notícias, 04-01-1918, p. 1). Foram apreciadas medidas de estímulo à especialização dos professores no estrangeiro, com bolsas de estudo, na altura designadas por pensões: “Estabelecendo o decreto nº 4.880, de 14 de julho findo, que reformou os serviços da instrução secundária, no artigo 55º, um novo regime de pensões de estudo no estrangeiro, foi agora publicado pelo ministério da instrução uma portaria contendo o regulamento da concessão das pensões de estudo, que poderão ser requeridas até 29 do corrente pelos professores dos liceus. (...) providência muito acertada e louvável (...) o aproveitamento

do tempo

de férias que está

decorrendo (...)

cursos

de

aperfeiçoamento que por esta época se professam nas universidades e escolas de ensino especial da Grã-Bretanha e da França (...) O ensino secundário muito terá a lucrar com a especialização literárias e científica do respetivo professorado (...) estreitamento de relações intelectuais e económicas, base do intercâmbio científico e mercantil dos povos que têm interesses comuns...” (O Comércio do Porto, 10-08-1918, p. 1). E foi reconhecido o mérito dos estudantes portugueses no estrangeiro: “O Sr. Cavalier, da Universidade de Toulouse, tendo notado que os alunos portugueses que frequentam aquele estabelecimento de ensino, um dos mais antigos da França, eram, de entre os estrangeiros, aqueles que melhores classificações obtinham, quis conhecer de perto o nosso país e veio há poucas semanas percorrer as nossas 43

universidades, fazendo conferências onde não deixou de salientar este facto, bastante honroso para nós. (...) concluíram brilhantemente naquela universidade, na presente época, os seus cursos de engenheiros eletricistas os nossos compatriotas...” (O Comércio do Porto, 20-07-1918, p. 1). Entre as notícias personalizadas sobre licenciaturas e doutoramentos destacou-se neste ano o “Ato de doutoramento” de uma médica: “Na Faculdade de Medicina do Porto defendeu ontem tese de doutoramento, ficando plenamente aprovada, a Srª D. Laura Domingues Lopes, que dissertou sobre ‘Tratamento cirúrgico do cancro uterino’. Presidiu ao ato o Sr. Dr. Teixeira Bastos, sendo arguentes os Srs. Drs. Lourenço Gomes e Rocha Pereira e vogais os Srs. Drs. Maximiano Lemos e Abel Salazar” (O Comércio do Porto, 02-10-1918, p. 1). Na seção de manuais escolares os anúncios foram abundantes, mas uma notícia refletiu uma preocupação muito atual: “União dos Pais de Estudantes. Esta associação solicitou dos vários editores de livros escolares, em favor dos filhos e protegidos dos seus associados, um bónus sobre a venda desses livros, a fim de facilitar a sua aquisição aos estudantes, muitos dos quais lutam com grandes dificuldades para conseguir os seus cursos. Espera, pois, esta coletividade, com o auxílio dos referidos editores, poder proporcionar, nesta ponte, uma importante vantagem aos seus sócios...” (Diário de Notícias, 21-01-1918, p. 3). Neste ano, os inúmeros anúncios dos colégios, muitos deles dirigidos por padres, refletiam as teorias higienistas e exaltavam as disciplinas científicas e a modernidade: “Colégio Internato dos Carvalhos. Situado em local elevado e muito saudável. Edifício amplíssimo e apropriado às exigências da higiene e educação moderna, excelentes recreios e campo de jogos. Vigilância assídua e meticulosa da Direção sobre a educação moral e intelectual dos alunos. Alimentação cuidada e abundante, observância rigorosa das boas práticas da higiene (...) não houve um único caso de doença grave em todo o ano letivo findo. Curso primário, liceal e comercial. Pedir prospetos ao diretor, Padre António Luís Moreira” (O Comércio do Porto, 17-091918, p. 3). “Escola Académica do Porto. (…) Educação física e literária. Cursos completos de instrução primária, comércio e liceu. Gabinetes de física e química; museu de história natural. Balneário. Todas as instalações adaptadas às exigências mais modernas da higiene e pedagogia; edifícios expressamente construídos para o fim a que se destinam…” (O Comércio do Porto, 27-09-1918, p. 2). O Sr. João Diogo, diretor do Colégio da Boavista do Porto, deu o maior exemplo da aplicação das novas e mais modernas teorias à educação, a começar pela

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alimentação dos alunos. O anúncio deste estabelecimento de ensino em Abril de 1918 ocupou três colunas da página da publicidade d’O Comércio do Porto e apresentou a forma de um diálogo entre o diretor e um pai, no qual a dieta dos alunos foi promovida como uma das principais vantagens do colégio. As refeições foram descritas ao pormenor, incluindo as quantidades e a composição dos alimentos, com argumentos fundamentados em obras estrangeiras e com o objetivo pedagógico de elucidar os leitores sobre os critérios mais modernos e científicos para uma boa alimentação: “D. – As refeições são quatro: almoço de garfo (às 8 1/2), lunch (ao meio-dia), jantar (às 3 1/2) e chá (às 8 1/2 da noite). Ao almoço há um prato apenas, abundante, café com leite e pão de trigo (2 pães); ao jantar: sopa e dois pratos, sobremesa e dois pães de trigo; ao lunch: um pão de trigo e fruta (figos, castanhas, laranjas) e ao chá, essa bebida e dois pães com manteiga. P. – Não seria melhor dar ao aluno uma refeição ligeira pela manhã? D. – Não; dos três costumes conhecidos anglo-holandês, alemão e francês, com os melhores higienistas escolares, preferimos, com leves alterações, o regime anglo-holandês. A refeição de manhã, à francesa – café com leite – para um estudante é ultraligeira. (...) As minhas preferências, de acordo com Gautier e Maurice Fleury, são mais para o regime vegetaliano. A alimentação é mista, porém. (...) A alimentação é variada. Há duas séries de menus. A primeira vigora desde outubro a abril (...) Todos os almoços ou jantares se repetem de oito em oito dias. (...) Seguimos a fórmula teórica – a que dá a ração alimentar ideal, a de Crouchet. Ela indica a quantidade de alimentos simples necessários e suficientes para alimentar um quilograma de peso do corpo da criança, isto é: água 65g; albuminoides 1,75g; gorduras 3,5g; hidratos de carbono 6,25g. (...) Multiplicam-se essas quantidades pelo peso do aluno. (...) Fórmula que se segue: água 2.600g; albuminoides 75g; gorduras 45g; hidratos de carbono 250. Calorias fornecidas: 1.607. (...) Temos uma tabela que seguimos, depois dos notáveis trabalhos de Gautier, a que nos colégios modelares franceses se dá o nome de Baréme des allocations. (...) O português, como é geralmente sabido, come demais. (O nosso colégio é) um dos mais higiénicos. Na atual epidemia não teve nenhum aluno, tanto externo, como interno, atacado (...) Colégio que melhores resultados tem obtido nos exames finais. Corpo docente competentíssimo e experimentado. Emprego dos melhores métodos de ensino...” (O Comércio do Porto, 04/04/1918, p. 4). No início do ano letivo seguinte, o mesmo Sr. João Diogo tinha mudado o nome do colégio e enviou o seu programa diretamente à redação do jornal, antes de publicar o respetivo anúncio: “Não é exclusivamente um programa escolar o opúsculo que acabamos de receber, elaborado pelo esclarecido professor Sr. João Diogo, que

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transformou o seu reputado Colégio da Boavista em Escola Anglo-Latina. É um valioso estudo pedagógico, em que o Sr. João Diogo, conhecedor dos trabalhos dos mais notáveis psicólogos europeus e norte-americanos, como Rein, Kerachen, Dewcy, James Brooks, Thornolite, Spearmann e outros, se mostra um educador guiado por uma orientação moderna e segura, traçando com mão de mestre o caminho a seguir para preparar o novo modo de ser social que há de seguir-se ao termo da guerra. (...) ‘Queremos viver e não existir apenas; queremos ser educados e não exclusivamente instruídos’. A essa fórmula suprema obedece a nova organização da Escola AngloLatina, fórmula do progresso em qualidade. Na denominação que adota vai uma homenagem aos povos aliados – ingleses e a quase totalidade dos latinos – que se batem para repelir o cesarismo alemão (...) O seu lema é este: Formar o carácter e fazer portugueses. Que mais belo ideal poderia encontrar-se?” (O Comércio do Porto, 29-10-1918, p. 1). Um mês depois foi então publicado o anúncio, que denota já sérias preocupações com rankings: “Exames da 2ª época. Todos os alunos, sem exceção alguma, que foram submetidos a exames nesta época, ficaram aprovados. Isto prova a larga experiência do seu corpo docente e a sua alta competência. Eis os nomes dos educandos, precedidos dos números que lhes coube na pauta afixada e patente no átrio do Liceu Rodrigues de Freitas, onde o público esclarecido poderá verificar a exatidão dos resultados para depois colher informações: (segue lista de alunos da 2ª e da 3ª classes). Nenhuma reprovação! Nenhuma falta! O exame atento dessa pauta, afixada no átrio do Liceu Rodrigues de Freitas, em que o número de exclusões e reprovações é assustador, é de uma eloquência esmagadora, marca o nosso incontestável triunfo (…). Não será, pois, além de outros motivos, a Escola AngloLatina O melhor colégio do Porto para Rapazes?...” (O Comércio do Porto, 30-111918, p. 3).

5. Exposições / Congressos Na área das Exposições / Congressos há 66 entradas, maioritariamente relacionadas com a Exposição Universal de Paris de 1855 e os incentivos à participação portuguesa. As exposições universais, juntamente com os museus técnicos e os congressos internacionais, marcaram de forma significativa a afirmação da sociedade industrial do século XIX, e foram expressões da ideia de progresso (Matos, 2011). Esta exposição foi fundamental para a divulgação das mais recentes descobertas científicas e industriais de todo o mundo e a participação portuguesa

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constituiu um polo aglutinador das várias novidades científicas e tecnológicas nacionais. Logo no final de 1854 foi formada uma comissão para a Exposição Universal de Paris: “A Comissão central portuguesa, a quem sua majestade El-Rei (D. Fernando), regente em nome do Rei (D. Pedro V), confiou o honroso encargo de organizar a exposição dos produtos da agricultura e da indústria fabril de Portugal, na Exposição Universal de França, por este meio se dirige ao país...” (O Comércio, 13-121854, p. 2). A imprensa colaborou na divulgação da exposição e descreveu as vantagens da participação na mesma para os expositores portugueses, exaltando o “espírito de nacionalidade” dos “nossos distintos industriais agrícolas e fabris” (O Comércio, 15-12-1854, p. 1). “A Comissão portuguesa encarregada de dirigir e promover a comparência dos produtos da indústria nacional na grande Exposição que vai ter lugar em Paris acaba de endereçar novo convite aos que por qualquer modo possam concorrer àquele ato das fadigas da arte. Animada pela ideia patriótica de fazer figurar a nação portuguesa no concurso a que todas as nações são chamadas...” (O Comércio, 26-01-1855, p. 1). A Associação Industrial Portuense elegeu cinco artistas (artesãos) para visitarem a participarem na exposição de Paris, os quais representavam as artes mais significativas para a indústria da época: serralheiro, fabricante de loiça, latoeiro, fabricante de tecidos, carpinteiro (O Século, 21-04-1855, p. 2). O Barão de Forrester apresentou fotografias do Douro, assim como amostras de diversas qualidades de vinhos, aguardentes e vinagre, e do azeite purificado do seu fabrico: “o snr. Forrester não se esquece de enviar os instrumentos com que se servem no Douro para a cultura daquele país especial. Um modelo em ponto pequeno de uma adega do Douro, assim como de um engenho para o melhor azeite não são os objetos menos curiosos. Também ali vimos uma coleção da variedade de granitos que formam o leito do rio Douro e dos pontos que obstruem a sua navegação” (O Comércio, nº 58, p. 2, segunda-feira, 12-03-1855). Como se disse, a representação portuguesa incluiu instrumentos de cirurgia e vinhos portugueses, que ganharam prémios (O Comércio, nº 273, 28-11-1855, pp. 12), e a importante inovação dos Srs. Castro e Irmão na arte da tipografia. Nesse ano foram também publicadas notícias sobre o congresso internacional de estatística e o desejo do estabelecimento de sistemas unitários de pesos, medidas e moedas (O Comércio, 16-05-1855, p. 3; 17-10-1855, p. 1; 18-10-1855, pp. 1-2) e o congresso de medicina homeopática, ambos em Paris (O Comércio, 11-08-1855, p. 2).

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Em 1865 realizou-se a Exposição Internacional do Porto, para a qual foi construído o Palácio de Cristal. Nesse ano foram amplamente descritos nas notícias os produtos expostos, tanto os portugueses como os estrangeiros: “Espera-se que na exposição internacional portuense (…) apareçam uma charrua a vapor, de Fowler; um debulhador a vapor de Ranson e Sims; máquinas de irrigação e esgoto; bombas centrífugas, de Gueyume; com locomóveis, de Ranson e Sims; importantes mecanismos de que o país deve tirar grande proveito” (Diário de Notícias, 06-05-1865, p. 3). “Na exposição internacional portuguesa há de figurar a magnífica máquina de debulhar com sua locomóvel, dos srs. R. Garret & Filhos, que está na real tapada da Ajuda” (Diário de Notícias, 12-08-1865, p. 3). “Consta-nos que do arsenal da Marinha é remetida para a exposição internacional do Porto uma pequena coleção de máquinas ferramentas, que ali se tem feito ultimamente e continuam a fazer-se na respetiva oficina. Além das máquinas, vão outros objetos e entre eles acha-se um ‘pharolim’ ou ‘anterna de porto’, do sistema lenticular de Fresnel, que é a primeira que se fabrica em Portugal, tendo sido feita na nova oficina de faróis, onde outras idênticas se acham em construção. É uma bela peça feita em chapa de cobre por um hábil oficial de caldeireiro do arsenal...” (Diário de Notícias, 20-08-1865, pp. 1-2). Foram também enviados para a exposição armas (Diário de Notícias, 29-081865, p. 3); tecidos de lã extraída do pinheiro silvestre (Diário de Notícias, 05-09-1865, p. 2); escadas de salvação para os incêndios (Diário de Notícias, 08-09-1865, p. 2); contadores de gás, torneiras, forjas para soldar (Diário de Notícias, 15-09-1865, p. 1); e vários produtos extraídos das matas, como a resina e a essência de terebentina. A fábrica de vidros da Marinha Grande enviou um “rico berço de cristal” (Diário de Notícias, 21-09-1865, p. 3). “O número de expositores que hão de figurar no magno congresso industrial que se vai realizar na cidade do Porto orça em três mil, pouco mais ou menos. Quatrocentos pertencem à França, quinhentos à Alemanha, cento e tantos à Inglaterra, mil e tantos a Portugal, e o resto aos outros países” (Diário de Notícias, 0109-1865, p. 2). E a vertiginosa velocidade dos transportes da época foi exaltada: “Dizem-nos que durante a exposição universal do Porto haverá diariamente entre Lisboa e aquela cidade comboios expressos, que percorrerão a distância entre aqueles dois pontos, 333 km, no limitado espaço de sete horas e cinquenta e oito minutos. Já é andar!” (Diário de Notícias, 08-09-1865, p. 3).

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Os reis D. Luís e D. Maria Pia foram ao Porto de comboio para inaugurarem a Exposição Internacional: saíram de Lisboa às 8 horas da manhã, com paragens no Entroncamento e em Coimbra, e chegaram às 17.30. No total demoraram 9 horas e meia (Diário de Notícias, 15-09-1865, p. 1). No dia 16 visitaram a exposição em visita particular e dois dias depois foram à inauguração oficial: “Palácio de Cristal, 18 de setembro às 3h (…) a inauguração da exposição foi brilhantíssima. Suas majestades e altezas foram recebidos pelo júri (…) A exposição é magnífica. A vista da nave principal é admirável. Há aqui produtos muito ricos. A nossa secção industrial é abundantíssima e excelente...” (Diário de Notícias, 19-09-1865, p. 1). Ainda nesse ano foram publicadas notícias sobre o Congresso Internacional de Veterinária de Viena, com a representação do Sr. Joaquim Sabino Eleutério de Sousa, “distinto professor do instituto agrícola” e enviado do Governo Português (Diário de Notícias, 07-07-1865, p. 3, 14-09-1865, p. 1). Também sobre o Congresso Médico de Bordéus (Diário de Notícias, 12-10-1865, p. 3), a Conferência Sanitária Internacional a realizar em Constantinopla para discutir a epidemia de cólera (Diário de Notícias, 2010-1865, p. 2, 27-10-1865, p. 3, 08-12-1865, p. 3), e o Congresso de Botânica e Horticultura (Diário de Notícias, 12-04-1865, p. 4). Em 1899 as notícias incidiram sobre a “Exposição permanente de animais de diferentes regiões do globo” no Jardim Zoológico de Lisboa (Diário de Notícias, 01-011899, p. 1), nesta época a funcionar em S. Sebastião da Pedreira. Também sobre o Congresso de Internacional de Ciências Geográficas em Berlim (Diário de Notícias, 12-08-1899, p. 1), a Conferência Sanitária Internacional de Veneza de 1897 sobre a peste bubónica, com a participação de Portugal (O Comércio do Porto, 15-08-1899, p. 2), e uma Exposição Hortícola no Palácio de Cristal (O Comércio do Porto, 22-081899, p. 2). E em 1918: notícias sobre exposições de frutas em Lisboa promovidas pelos horticultores do Porto e visitadas pelo ministro da agricultura (O Comércio do Porto, 30-08-1918, pp. 1-2); exposições de frutas e flores no Porto (O Comércio do Porto, 3108-1918, p. 2); e o congresso de medicina de Madrid, no qual ia discutir-se a epidemia de gripe e que foi adiado devido à mesma epidemia (O Comércio do Porto, 27-091918).

6. Museus e Sociedades / Instituições Científicas Os museus e as sociedades científicas constituíram veículos fundamentais de divulgação científica do seculo XIX. Não obstante terem ocupado apenas 1,5% do total 49

da base de dados, as notícias e anúncios publicados são representativos das mais importantes instituições científicas criadas ou em funcionamento em Portugal na época estudada. As notícias de 1854 e 1855 referem-se à Sociedade Flora e Pomona, para o melhoramento da horticultura e das árvores frutíferas (O Comércio, 01-09-1854, p. 1), Academia Politécnica do Porto, na qual um professor de Zoologia tomou posse do seu cargo (O Comércio, 04-09-1854, p. 2), à Sociedade Farmacêutica Lusitana, que defendia os interesses desta classe (O Século, 13-06-1855, p. 4), à Academia Real das Ciências (O Século, 22-11-1855, p. 2), fundada pelo Duque de Lafões (Diário de Notícias, 09-09-1865, p. 3) e que tinha por protetor o Rei D. Luís, por presidente o pai deste, o Rei D. Fernando, e como “sócios honorários os seguintes príncipes: sua majestade el-rei o sr. D. Pedro II do Brasil; sua majestade o imperador Napoleão III; sua alteza o príncipe Jerónimo Napoleão; e sua alteza real e imperial o arquiduque da Áustria, Leopoldo” (Diário de Notícias, 23-09-1865, p. 2). Todas as suas sessões solenes anuais eram noticiadas (Diário de Notícias, 22-04-1865, p. 2, 02-05-1865, pp. 1-2), assim como as sessões ordinárias, as eleições, os prémios atribuídos e vários outros acontecimentos relacionados com esta instituição (por exemplo no Diário de Notícias, 09-09-1865, pp. 2-3). Em 1865 foram publicadas três notícias sobre a Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa (Diário de Notícias, 19-04-1865, p. 1, 16-07-1865, p. 1, 24-11-1865, p. 2) e as obras pedidas na Biblioteca Nacional de Lisboa, fundada em 1796, eram listadas por temas e categorias, assim como as estatísticas dos leitores e dos volumes lidos eram dados suficientemente relevantes para serem divulgados ao público com regularidade (Diário de Notícias, 09-07-1865, p. 2, 06-08-1865, p. 2, 13-09-1865, p. 3, entre outras). Nesses anos as ações da família real eram alvo de interesse, particularmente no apoio que o Rei D. Luís dava às ciências. Tal como o seu irmão D. Pedro V, este rei viajou regularmente pela Europa desde a sua juventude e ao longo de toda a sua vida adulta, o que lhe permitiu desenvolver o gosto pelas ciências e pelas artes. Para além de descrever ao pormenor as festas no Palácio da Ajuda, como por exemplo o baile Carnaval em fevereiro de 1865, no qual foi inaugurada uma “luz elétrica de surpreendente efeito” (Diário de Notícias, 07-02-1865, p. 2, 08-02-1865, p. 1), a imprensa deu grande destaque ao Museu Real de História Natural, fundado em 1858 (Pereira e Pita, 1993: 657). Este museu teve origem no Museu de Zoologia da Escola Politécnica, que foi dirigido desde 1851 por José Vicente Barbosa do Bocage, um naturalista, médico, zoólogo e primo em segundo grau do popular poeta Manuel Maria Barbosa du Bocage, que realizou um trabalho empenhado de reorganização do museu 50

com bases científicas sólidas. Barbosa du Bocage preocupou-se em publicar obras explicativas sobre a sistematização dos exemplares e outras relacionadas, como por exemplo: “O sr. dr. José Vicente Barbosa de Bocage acaba de publicar um relatório sobre o estado e necessidades da secção zoológica do museu nacional. Por ele se vê qual é o zelo com que o sr. Bocage dirige aquele estabelecimento…” (Diário de Notícias, 13-05-1865, p. 2). Sob a sua direção as coleções do museu foram enriquecidas não só pela aquisição de novos exemplares, mas também com doações de coleções privadas, precisamente as coleções dos reis D. Pedro V e D. Luís no Palácio da Ajuda: “Já estão depositadas no museu nacional todas as colecções zoológicas, paleontológicas e mineralógicas do museu real” (Diário de Notícias, 30-05-1865, p. 2). A estas somaramse as coleções de José Anchieta, originária das colónias africanas da costa ocidental (Diário de Notícias, 07-12-1865, p. 3), a de Francisco Newton, um viajante, explorador e naturalista, e outras: “O sr. Eduardo Aníbal Botto presenteou a secção zoológica do museu nacional, estabelecido na escola politécnica, com um grande crâneo de hipopótamo que trouxe de Moçambique o ano passado” (Diário de Notícias, 22-061865, p. 1); “Recebeu-se no museu mineralógico uma colecção de rochas da Índia; com elas vieram também para o nosso museu dois ídolos dos Índios. São dois grandes pedaços de feno onde estão as figuras dos deuses: um deles é extremamente bem feito” (Diário de Notícias, 13-05-1865, p. 2); “Veio ultimamente de Cabo Verde para o museu nacional de Lisboa um grande macaco, vivo, da família dos cynocephalos. É muito manso, abraçando e tocando na mão as pessoas que o visitam” (Diário de Notícias, 06-10-1865, p. 3); “O macaco que há dias dissemos ter vindo para o museu nacional de Lisboa entendeu dever pôr-se em liberdade e tratou de se evadir (…) foi capturado. É um macaco desordeiro. Ama a liberdade, e abomina o cativeiro, mas não obedece aos poderes constituídos” (Diário de Notícias, 11-101865, p. 2); “Veio de Paris para a secção mineralógica do museu nacional de Lisboa uma importante colecção de minerais. Compõe-se de 405 exemplares e de mais de 80 espécies; alguns exemplares são de notável beleza, citaremos entre eles um de carvão da Bélgica que apresenta lindíssima irisação” (Diário de Notícias, 11-10-1865, p. 2). Todas estas contribuições fizeram do Museu de História Natural “um dos mais belos e variados museus do seu género, pelas raras colecções que possui” (Diário de Notícias, 11-04-1865, p. 1). Barbosa du Bocage foi também Par do Reino, Ministro da Marinha e do Ultramar em 1883 no governo de Fontes Pereira de Melo, e Ministro dos Negócios 51

Estrangeiros no final do mesmo ano. Neste cargo foi responsável pela criação da Comissão de Cartografia, predecessora da Junta de Investigação do Ultramar e pelo Tratado Luso-Britânico de 1884 sobre o domínio português no Zaire. Algumas das mais importantes realizações de José Vicente Barbosa du Bocage como ministro traduziram-se na iniciativa do pedido de uma conferência internacional, que acabaria por ter lugar em Berlim entre o final de 1884 e início de 1885, e na qual ficou estabelecido o princípio da ocupação efetiva dos territórios. Após a Conferência de Berlim, Barbosa du Bocage formulou planos para colocar em prática a ocupação portuguesa dos territórios africanos, persistindo na ideia de ligar Angola a Moçambique. Assinou convénios com França e Alemanha que garantiram que estas potências não iam opor-se ao expansionismo português nesse sentido. Mas esses convénios foram logo repudiados pela Inglaterra. Barbosa du Bocage foi também o responsável pela negociação dos limites da Guiné e de Cabinda, que culminou com o convénio assinado, já pelo seu sucessor Henrique de Barros Gomes, em 17 de maio de 1886. Em resposta à elaboração do Mapa Cor-de-Rosa, que definiu a pretensão portuguesa de ocupação dos territórios entre Angola e Moçambique, a Inglaterra apresentou o Ultimato de 11 de janeiro de 1890, exigindo a retirada das forças portuguesas desses territórios. Esta situação provocou uma crise profunda de identidade nacional e a queda do governo de José Luciano de Castro. Depois do breve governo de Serpa Pimentel, João Crisóstomo formou novo governo em outubro de 1890, e convidou Barbosa du Bocage a ocupar de novo a pasta dos Negócios Estrangeiros. Em 27 de maio de 1892 foi nomeado para o Conselho de Estado (Almeida, 2011). Além da contribuição para o Museu de História Natural, o Rei D. Luís teve também um papel importante para a edificação do novo Observatório Astronómico de Lisboa, na Tapada da Ajuda, o qual sucedeu ao Real Observatório da Marinha. O seu edifício, da responsabilidade de Filipe Folque, foi construído em terrenos da Casa Real e contou com o financiamento dos Reis D. Pedro V e D. Luís, que contribuíram, respetivamente, com trinta contos de reis (30.000$00) e dez contos de reis (10.000$00) das suas dotações pessoais. O lançamento da primeira pedra teve lugar em 11 de março de 1861 e a inauguração realizou-se em 24 de outubro de 1863. Desde essa data e até ao final do mês de junho de 1865 o observatório foi visitado por 816 pessoas, incluindo muitos “ilustres visitantes” (Diário de Notícias, 26-07-1965, p. 2), entre os quais se salientaram o Príncipe Amadeu e o Infante D. Augusto, respetivamente cunhado e irmão do rei, que de lá seguiram para o Museu Zoológico 52

(Diário de Notícias, 17-08-1865, p. 3). Mostrava-se assim nas notícias que a família real tinha interesse pela ciência, o que promovia as instituições visitadas. O Museu Zoológico era a secção dos animais vivos do Museu Nacional, instalado na Quinta da Escola Politécnica (Diário de Notícias, 09-11-1865, p. 1). Só em 1883, também por incentivo do Rei D. Luís, começou a ser construído o Jardim Zoológico em S. Sebastião da Pedreira, inaugurado em 1884, e em 1905 mudou-se para Sete Rios, para os terrenos do Conde de Burnay. 1865 foi um ano atarefado para a família real: após o nascimento do Infante D. Afonso Henriques em julho, a visita do irmão da Rainha D. Maria Pia em agosto e a viagem ao Porto para a inauguração da Exposição Internacional em setembro, foi a vez dos Reis D. Luís e a sua mulher, acompanhados do filho mais velho, o Infante D. Carlos, visitarem os parentes espalhados pela Europa. O Diário de Notícias criou uma secção intitulada “Viagem de Suas majestades e Alteza dos Estrangeiro”, que se encontra no início de todos os números dos quase três meses que durou a viagem. Saíram de Lisboa em outubro por via marítima, mas a rainha enjoou de tal maneira que em Vigo mudaram para o comboio, transporte no qual prosseguiram o resto da viagem. Em Paris foram recebidos pelos Imperadores Napoleão III e Eugénia e ficaram hospedados no Palácio das Tulherias (Diário de Notícias, 14-10-1865, p. 2). Seguiram para os estados alemães, onde visitaram as irmãs do rei, casadas com príncipes desses mesmos estados, e para a Itália (Turim e Florença), onde a rainha visitou o pai, o Rei Vítor Emanuel, e as irmãs, que não via há três anos, desde que chegara a Portugal para casar, pouco antes de completar 15 anos. Tal como era seu hábito, D. Luís também fez turismo cultural: “Lê-se na Província de Turim: Ontem à tarde visitou el-rei D. Luís o nosso museu das ciências naturais. Sua majestade foi recebido pelos professores Siamondei e de Filipe. Sua majestade visitou tudo minudenciosamente, discorrendo com amável familiaridade acerca de todos os objectos no idioma francês e italiano. É um jovem monarca inteligente e erudito” (Diário de Notícias, 07-11-1865, p. 1). Outra instituição de grande valor científico com origem direta no trabalho de um rei foi o Aquário Vasco da Gama, inaugurado em 20 de maio de 1898 pelo Rei D. Carlos. O filho de D. Luís herdou do pai o interesse e o gosto pelas artes e pelas ciências, especialmente a ornitologia e a oceanografia, na última das quais pode ser considerado uma dos pioneiros mundiais. Com o objetivo de estudar a fauna marinha da costa portuguesa, devido à importância económica da indústria piscatória em Portugal, D. Carlos realizou doze campanhas oceanográficas entre 1896 e 1907 a bordo do seu iate Amélia. O material zoológico recolhido foi divulgado em exposições 53

e publicações científicas e constitui a Coleção Oceanográfica D. Carlos, que se encontra no espólio do Aquário Vasco da Gama, juntamente com a Biblioteca Científica do Rei (http://aquariovgama.marinha.pt/PT/museu/Pages/rei_carlos.aspx). Ao longo de vários anos D. Carlos manteve amizade e correspondência regular com o Príncipe Alberto do Mónaco, também fundador de um museu oceanográfico. Em 1899 o Aquário foi “bastante concorrido” e alvo de notícias na imprensa, como por exemplo devido à chegada de “dois novos polvos que vieram de Setúbal, de enormes proporções, bem como uma notável série de estrelas do mar, alguns moluscos e actínias, exemplares muito formosos que entraram ultimamente” (Diário de Notícias, 04-01-1899, p. 1). Esse foi o ano da peste bubónica no Porto, por isso a grande preocupação da imprensa de 1899 foi o diagnóstico, o tratamento e a contenção da epidemia. As instituições mais referidas foram as Sociedade de Medicina e Cirurgia do Porto e a Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa, onde o problema foi debatido e as principais medidas foram decididas ao longo de todo o período da crise sanitária. Foram também publicadas notícias sobre o Instituto Pasteur do Porto, dirigido pelo Dr. Arantes Pereira, na altura a desenvolver um importante trabalho sobre a profilaxia da raiva (O Comércio do Porto, 12-09-1899, p. 2). E sobre o Instituto Bacteriológico, fundado em 1892 e dirigido por Câmara Pestana até ao seu falecimento, por ter contraído precisamente a peste que andava a estudar. Por proposta dos estudantes da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa o Instituto mudou o nome para Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, e o Dr. Aníbal Bettencourt, seu colaborador na investigação, foi nomeado diretor (Diário de Notícias, 17-11-1899, p. 1). Nesse mesmo ano o instituto mudou para instalações próprias e em 1911 foi incorporado na Universidade de Lisboa, anexo à Faculdade de Medicina de Lisboa (Almeida, 2011). Em 1918 as instituições referidas nas notícias multiplicaram-se, assim como os temas tratados refletiram os maiores problemas da época. Por exemplo, na Sociedade Química Portuguesa, discutiu-se a “pesquisa do sangue”, a “unificação da terminologia e nomenclatura química e física”, “Os gazes tóxicos na guerra actual” e os “Lipóides do ovo” (Diário de Notícias, 03-01-1918, p. 2, 17-01-1918, p. 2, 19-01-1918, p. 1, O Comércio do Porto, 16-03-1918, p. 1, 02-05-1918, p. 1, 11-07-1918, p. 1, 13-07-1918, p. 1, 07-11-1918, p. 1). A Associação Médica Lusitana promoveu reuniões científicas sobre o tifo exantemático e a “a situação dos médicos mobilizados para o combate à actual epidemia” de gripe (O Comércio do Porto, 28-02-1918, p. 1, 11-07-1918, p. 1, 09-11-1918, p. 1). Na Sociedade de Geografia de Lisboa discutiu-se a “Situação actual de Moçambique” (Diário de Notícias, 07-01-1918, p. 3) e na Academia das Ciências 54

distintos cientistas fizeram comunicações sobre história da botânica em Portugal, “videiras portuguesas onde se encontra matéria corante na polpa”, dermatologia, eletricidade e “O sr. António Cabreira apresentou uma Tábua de sua invenção que estabelece o Calendário Solar Exacto, porque corrige o sistema gregoriano” (Diário de Notícias, 22-02-1918, p. 1). Foram ainda publicadas notícias sobre um grupo de estudos oceanográficos e arqueológicos (O Comércio do Porto, 11-01-1918, p. 2), dois exemplares da coleção do Jardim Zoológico de Lisboa, agora já instalado nas Laranjeiras, um hipopótamo e um boi-cavalo (Diário de Notícias, 20-01-1918, p. 2), os Museus de Zoologia e Botânica da Universidade do Porto (O Comércio do Porto, 26-01-1918, p. 1), as bibliotecas públicas do Porto e de Lisboa (O Comércio do Porto, 02-02-1918, p. 1, Diário de Notícias, 14-02-1918, p. 1), o gabinete de mineralogia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (O Comércio do Porto, 09-02-1918, p. 1), o Museu Rafael Bordallo Pinheiro (Diário de Notícias, 07-07-1918, p. 2), e a constituição da Sociedade de Antropologia, que “teve a sua primeira reunião na Faculdade de Ciências do Porto”, presidida pelo Dr. Luís Viegas e com a adesão de Leite de Vasconcelos e de “vários professores e homens de ciência estrangeiros” (O Comércio do Porto, 28-12-1918, p. 1).

7. Personalidades As 66 notícias (1%) sobre Personalidades incidem sobre uma subscrição para a construção de uma estátua a Issac Newton em Grantham (O Comércio, 16-10-1854, p. 2, Diário de Notícias, 28-06-1865, p. 3); homenagens à obra de “caridade cristã” de Florence Nightingale na Guerra da Crimeia e o seu desejo de estabelecer um hospital e uma escola de enfermagem em Londres (O Comércio, 15-11-1854, p. 2, O Século, 08-09-1855, p. 4, 12-12-1855, p. 2); Sauvage, o inventor da aplicação da hélice à navegação a vapor (O Comércio, 07-02-1855, pp. 2-3); vida e obra do capitão Ericsson, inventor do motor de ar quente e de um modelo de hélice aplicada aos barcos (O Comércio, 21-02-1855, pp. 2-3); o falecimento de José Remy, “autor da piscicultura moderna” (O Comércio, 02-03-1855, p. 2); as biografias dos engenheiros encarregados da construção do caminho de ferro do Barreiro a Vendas Novas, Mr. de Lenne e Mr. A. B. Dejante (O Século, 27-04-1855, p. 1); elogio de José de Parada e Silva Leitão, professor de Física da Academia Politécnica do Porto (O Comércio, 2505-1855, p. 2); descrição da vida de Isaac Singer e das máquinas que ele inventou (O Comércio, 22-08-1855, pp. 1-2); a história da guilhotina e do seu inventor, José Inácio

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Guillotin, médico (O Século, 28-09-1855, p. 4); o convite feito ao Conde da Graciosa pela Academia Nacional Agrícola Manufatureira de Paris para ser seu sócio, devido aos “excelentes produtos que enviou à exposição de Paris” (O Século, 01-12-1855, p. 2); e várias referências ao Barão de Forrester, já referidas anteriormente. Em 1865, tal como nos anos anteriores, as personalidades em destaque na imprensa são maioritariamente estrangeiras e ligadas à medicina. Referem-se médicos, naturalistas, botânicos e astrónomos (Diário de Notícias, 15-06-1865, p. 3), incluindo mulheres: “Os jornais americanos dizem que Miss Maria Mitchell foi nomeada professora de astronomia no Vassar female college em Poughkeepsie, lugar que os seus conhecimentos nesta ciência a tornam muito capaz de preencher. Miss Maria Mitchell é conhecida pelo descobrimento de um cometa, o que lhe rendeu uma medalha de oiro, concedida pelo rei da Dinamarca (Diário de Notícias, 27-07-1865, p. 3). E a filósofos: “A Universidade de Viena, por ocasião do seu 500º aniversário, conferiu o grau de doutor a sir John Stuart Mill, filósofo e publicista inglês” (Diário de Notícias, 18-08-1865, p. 3). Jenner, o “grande descobridor do mais profícuo remédio que se tem conhecido para evitar a terrível moléstia de bexigas que tanta devastação causou à humanidade”, foi homenageado com uma estátua em Boulogne-sur-Mer, (Diário de Notícias, 16-031865, p. 3, 11-10-1865, p. 3). O Dr. Livingstone, “o resoluto e audaz explorador”, estava nesse ano na Índia, onde deu “muito instrutivas prelecções diante dos membros da real sociedade asiática, acerca das suas explorações no solo africano” (Diário de Notícias, 26-11-1865, p. 2). Foram também publicadas notícias sobre George Stephenson, “ilustre engenheiro”, popularmente apelidado de pai dos caminhos de ferro e que “que deu impulso à primeira locomotiva” (Diário de Notícias, 05-12-1865, p. 2); sobre Thomas Pettigrew, vice-presidente da associação arqueológica britânica e um dos seus “mais sábios membros” (Diário de Notícias, 1512-1865, p. 3); e sobre Henry Barth, “distinto geógrafo”, explorador do território de África e escritor (Diário de Notícias, 20-12-1865, p. 3). As personalidades portuguesas de mérito científico neste ano referidas pelo Diário de Notícias foram: José da Silva Mendes Leal e José Eduardo de Magalhães Coutinho, que receberam a Grã-Cruz da Ordem de S. Tiago (23-06-1865, p. 2, 30-081865, p. 2), Duarte Augusto de Abranches Bizarro, “médico extraordinário do hospital de S. José” que regressou a Lisboa de uma “viagem de observação pela Europa” (2906-1865, p. 2), António José Viale, louvado pelo rei “pela dedicação com que se prestou a leccionar espontânea e gratuitamente as línguas latina e grega na biblioteca nacional de Lisboa” (25-07-1865, p. 2), J. F. Nery da Encarnação Delgado, membro da 56

Comissão Geológica (26-07-1865, p. 2), e o Dr. João Vicente da Silveira, cirurgiãomédico da Abrigada, homenageado pela sua “actuação durante a epidemia de cólera em 1855 e até ao presente” (16-11-1865, p. 4). Em 1899 foi homenageado em Alhandra o Dr. Sousa Martins no segundo aniversário da sua morte (Diário de Notícias, 18-08-1899, p. 2, Almeida, 2001), assim como a doença do Dr. Câmara Pestana foi seguida em boletins diários pormenorizados publicados por toda a imprensa. O seu falecimento e a cerimónia fúnebre foram descritos em artigos desenvolvidos (Diário de Notícias, 16-11-1899, p. 1, 17-11-1899, p. 1, O Comércio do Porto, 16-11-1899, p. 1, Almeida, 2011). Foi também acompanhada a saída de Ricardo Jorge do Porto para Lisboa, furioso com a falta de condições para realizar o seu trabalho de controlo da epidemia de peste bubónica (Diário de Notícias, 16-10-1899, p. 1, Almeida, 2011). E foi homenageada a poetisa e escritora Leonor Fonseca Pimentel no centenário da sua morte, com uma lápide na sua casa em Nápoles (O Comércio do Porto, 24-08-1899, p. 2). Já em 1918 o reitor da Universidade do Porto, Dr. Gomes Teixeira, recebeu o prémio Binaux da Academia das Ciências de Paris, pelo que foi congratulado numa sessão da Academia das Ciências de Lisboa (O Comércio do Porto, 05-01-1918, p. 1). Em abril o Dr. Ricardo Jorge, “que tinha ido a Paris tomar parte na conferência sanitária dos aliados, reassumiu as suas funções de diretor-geral da saúde” (Diário de Notícias, 10-04-1918, p. 1). Em maio o Dr. Egas Moniz, Embaixador de Portugal em Madrid, foi dos primeiros atacados pela epidemia de gripe, ao mesmo tempo que o Rei Afonso XIII, e em julho voltou para Portugal (Diário de Notícias, 30-05-1918, p. 1, 1007-1918, p. 1). Foram publicadas notícias sobre homenagens ao fundador da Escola Académica do Porto, Manoel Francisco da Silva (O Comércio do Porto, 26-05-1918, p. 1), ao “Dr. Júlio Henriques, eminente botânico e professor jubilado da Universidade de Coimbra” (O Comércio do Porto, 30-05-1918, p. 1), ao “insigne professor e musicógrafo Moreira de Sá” (O Comércio do Porto, 30-07-1918, p. 1), ao Dr. Manuel Rodrigues de Miranda Júnior, “ilustre professor da Faculdade Técnica da Universidade do Porto”, na sua jubilação (O Comércio do Porto, 24-11-1918, p. 1), ao conselheiro Jaime Moniz, diretor-geral de instrução pública (O Comércio do Porto, 28-12-1918, p. 1), e aos químicos franceses Adolfo Wurtz e Bouchardat (O Comércio do Porto, 29-111918, p. 3, 01-12-1918, p. 1).

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8. Publicações Científicas As publicações científicas ocuparam quase 4% das entradas desta base de dados, maioritariamente sob a forma de anúncios (73%), e com os restantes 27% ocupados em 65 notícias e 4 artigos desenvolvidos. Os anúncios da Gazeta Médica de Lisboa, que também tem várias referências nas notícias, dominam a lista de entradas desta área temática. Outros periódicos científicos anunciados nestes anos incluem A Agulha Medica, assim como o Escholiaste Médico, O Instituto. Jornal Literário e Científico, o Jornal de Farmácia e Ciências Acessórias de Lisboa, o jornal da Sociedade Farmacêutica Lusitana e o Almanaque Ilustrado Enciclopédico. Os anúncios de livros incidem sobre manuais de medicina e manuais homeopáticos, especialmente os dirigidos aos acometidos pela epidemia de cólera, e manuais de agronomia, também na sua maioria especificamente dirigidos contra a moléstia das vinhas que grassou nesses anos. Todas estas publicações têm também referências nas notícias, dada a atualidade dos temas em questão. Foram ainda publicados anúncios ao Novo Dicionário da Língua Portuguesa, por Eduardo de Faria (O Século, 30-05-1855, p. 4); e três anúncios na área da Geografia: Primeiro Roteiro da Costa da Índia desde Goa até Diu (O Comércio, 01-09-1854, p. 6), Tratado de Geografia Pratica (O Século, 11-12-1855, p. 4) e Visitas Às Possessões Portuguesas na Costa Ocidental de África (O Comércio, 03-08-1855, p. 4). A questão dos transportes era um tema fundamental neste meado do século XIX. A publicação em Madrid da obra intitulada: Proyecto de las líneas generales de navegacion y de ferro-carriles en la Península Espanola, da autoria do Coronel comandante de engenheiros D. Francisco Coello, autor do Atlas de Espanha, deu origem a um artigo desenvolvido de quatro colunas n’O Século, que incluiu o projeto de traçado da linha de caminho de ferro de Santarém à fronteira de Espanha (O Século, 09-08-1855, pp. 1-2). As mais recentes invenções e maravilhas do génio humano foram amplamente divulgadas em livros que eram repetidamente publicitados, não só no que diz respeito às ciências naturais e humanas, mas também ao sobrenatural (Diário de Notícias, 0301-1865, p. 4, 04-01-1, p. 2), à aplicação prática de técnicas agrícolas e industriais (Diário de Notícias, 08-01-1865, p. 4), às explicações sobre os sistemas legais de medidas (Diário de Notícias, 08-031865, p. 4, 16-03-1865, p. 4), à história das civilizações, história natural e arqueologia (Diário de Notícias, 18-05-1865, p. 3, 23-061865, p. 3, 09-09-1865, p. 1, 15-11-1865, p. 4), à astronomia e meteorologia (Diário de Notícias, 10-06-1865, p. 2), geologia (Diário de Notícias, 19-08-1865, p. 1), diversas enciclopédias, a apologia da ginástica (Diário de Notícias, 22-09-1865, p. 4), e

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manuais de telegrafia elétrica, de paleografia e de fotografia (Diário de Notícias, 26-101865, p. 4, 10-09-1865, p. 4, 28-12-1865, p. 3, 31-12-1865, p. 4). “O excelente semanário A Medicina Contemporânea”, hebdomadário português de ciências médicas, dirigido pelo Dr. Miguel Bombarda, começou a ser publicado em janeiro de 1883. Foi tema de notícias na imprensa diária não especializada, com a descrição do respetivo índice, e publicou anúncios regulares (Diário de Notícias, 0901-1899, p. 2), assim como o seu homólogo do Porto, A Medicina Moderna, publicado desde janeiro de 1894 e dirigido pelo Dr. Oliveira Castro (O Comércio do Porto, 12-091899, p. 3). Além da divulgação dos habituais livros de medicina descritos nas notícias e publicitados nos anúncios, neste ano de 1899 especialmente dedicados ao tema da peste bubónica que assolou o Porto, o Diário de Notícias anunciou a publicação do “segundo volume dos Resultados científicos das campanhas oceanográficas de sua majestade el-rei, a bordo do seu Yacht Amélia, volume que se ocupa da pesca do atum, no Algarve, no ano corrente” (28-07-1899, p. 1). Nas publicações científicas foram também incluídos anúncios a folhetos explicativos para a agricultura (Diário de Notícias, 13-08-1899, p. 3) e a notícia da publicação de um livro sobre História de Portugal em Inglaterra (O Comércio do Porto, 02-09-1899, p. 1). Em 1918 repetiram-se os anúncios a livros de agricultura, incluídos na coleção Livraria do Lavrador, todos com o índice detalhado (O Comércio do Porto, 04-01-1918, p. 3, 15-10-1918, p. 3, 31-10-1918, p. 3), e ao jornal O Lavrador, órgão da já referida Escola Agrícola “Maria Cristina” (O Comércio do Porto, 01-03-1918, p. 1). Foram publicados também anúncios a livros de veterinária, de J. V. Paula Nogueira, e de viticultura e vinificação, escritos pelos enólogos Pedro Bravo e Duarte de Oliveira, e todos com referência nas notícias (O Comércio do Porto, 12-01-1918, p. 1, 13-011918, p. 3, 27-01-1918, p. 3, 13-07-1918, p. 1). Ainda nesta área foi anunciada a revista Pomologia Moderna, sobre “fruticultura, horticultura e indústrias agrícolas” (O Comércio do Porto, 27-01-1918, p. 3). O Comércio do Porto publicou também anúncios a livros sobre hidrogeologia (16-02-1918, p. 3), sobre medicina (20-07-1918, p. 3) e mais especificamente sobre a febre tifoide tratada pelos banhos frios (02-031918, p. 3), sobre educação e ensino (13-03-1918, p. 2, 13-08-1918, p. 1, 20-08-1918, p. 1), gramática inglesa (31-10-1918, p. 3), e a uma revista de higiene e alimentação (04-04-1918, p. 3). A revista científica de engenharia prática e de ensino técnico Electricidade e Mecânica foi mais longe nos métodos de propaganda para angariar assinaturas, oferecendo um “magnífico automóvel”, máquinas de escrever e aparelhos de telegrafia sem fios que seriam sorteados entre os assinantes. O anúncio desta publicação era de 59

grandes dimensões, com gravuras, e um espaço de destaque nas páginas de diversos números do Diário de Notícias e d’O Comércio do Porto (12-01-1918, p. 4, 20-01-1918, p. 3, respetivamente). Era habitual os anúncios serem complementados pela oferta de alguns exemplares da revista aos diretores dos jornais de maior circulação, que escolhiam referir nas notícias os temas que mais lhes interessavam. Assim, alguns dos artigos desta revista tiveram direito à divulgação dos temas considerados mais relevantes, como por exemplo a notícia sobre “O raio e como se defender d'elle” que O Comércio do Porto publicou como engodo para mais uma propaganda dissimulada (22-01-1918, p. 2). O mesmo se verificou com o Almanach do Dr. Ayer, um óbvio anúncio disfarçado entre as notícias (16-02-1918, p. 1); com a Encyclopedia Universal Illustrada, cujos editores enviaram o nº 36 “desta magnífica e curiosíssima obra de êxito mundial” aos redatores do mesmo jornal, os quais publicaram a notícia na 1ª página e o anúncio na 4ª (15-06-1918); com o Boletim da Sociedade Portuguesa de Ciência Social (13-03-1918, p. 1); com o “Anuário de telégrafos e telephonios sem fios, universalmente conhecido pela sua denominação inglesa ‘The year-book of wireless telegraphy and telephony’” (26-07-1918, p. 2); e com o Boletim Pharmacologico, uma nova revista publicada pela Farmácia e Laboratório Farmacológico de J. J. Fernandes & Cª, cujo primeiro número foi mencionado como vindo “preencher uma lacuna na classe farmacêutica” (21-09-1918, p. 1). Em 1929 o Magazine Bertrand publicou em quase todos os seus números o anúncio a um livro de puericultura.

9. Riscos/ Acidentes/ Anomalias Esta área temática, de expressão muito reduzida no conjunto das notícias, não deixa de ser interessante, especialmente pelos comentários dos redatores dos jornais portugueses após a leitura dos jornais estrangeiros onde recolheram a informação. A incredulidade é manifestada, assim como a ironia não deixa de estar presente. Há notícias sobre aves com um único olho (O Comércio, 27-10-1855, p. 2), siameses (Diário de Notícias, 29-12-1864, pp. 1-2, 21-04-1865, p. 2), casos de sonambulismo (Diário de Notícias, 03-01-1865, p. 3), ciclopes femininos (Diário de Notícias, 26-011865, p. 2), gigantes e anões (Diário de Notícias, 04-03-1865, p. 2, 09-07-1865, p. 1), várias explosões provocadas pelo gás, e chuvas de rãs (Diário de Notícias, 13-101865, p. 1). Algumas curiosidades referidas são muito atuais e ainda hoje espantam as populações europeias. Por exemplo a questão dos chineses que querem ser 60

enterrados na China: “Lê-se no Jornal do Havre: Há pouco mais ou menos de três meses que saiu de S. Francisco um navio com um carregamento de nova espécie, a saber, um grande caixão com os restos mortais dos chineses que faleceram nessa cidade, e cujos corpos eram reclamados pelas suas famílias. O Ecco do Pacífico anuncia que muitas companhias chinesas se organizaram com o fim de transportar para a China os cadáveres de todos os chineses falecidos na Califórnia. As despesas de transporte serão pagas pelos parentes residentes em S. Francisco, ou pelas companhias que delas serão embolsadas nos portos para onde se dirigirem os navios. É um frete de nova espécie, do qual de certo não se lembravam os armadores da Europa quando enviavam os seus navios para a Califórnia” (O Século, 30-08-1855, p. 4). E numa época em que os espartilhos eram um acessório fundamental da elegância feminina e até masculina, já que o próprio Almeida Garrett os usava (Santana, 2011: 431-436), um acidente inesperados provocou uma morte: “Uma senhora da aristocracia francesa acaba de morrer no Havre, quase repentinamente. (…) Fez-se-lhe a autópsia e descobriu-se que a aristocrata tinha três costelas enterradas no fígado. Hoje as senhoras do grande tom não morrem de febre tifoide, ou de tuberculose pulmonar, morrem por causa do espartilho” (Diário de Notícias, 03-031865, p. 3). Para concluir com um tema também de grande atualidade, que é alvo de discussão e ainda não está resolvido a nível mundial: a pena de morte, abolida em Portugal em 1 de julho de 1867 para os crimes civis. Antes dessa data já o assunto era apresentado no Diário de Notícias como algo urgente e os redatores deste jornal indignavam-se contra tal prática, manifestando as suas opiniões de forma assertiva: “A pena de morte acaba de ser abolida em muitas repúblicas da América do Sul. Vai também sê-lo na Itália, em Portugal, na Suíça, na Roménia e na Grécia” (26-02-1865, p. 2). Sobre a pena de morte em França: “Ó sociedade degradada dos tempos modernos, tu cometes um assassínio dando a morte ao criminoso!” e “Víctor Hugo é o apóstolo da abolição da pena de morte!” (12-04-1865, p. 2, 22-04-1865, p. 3).

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Conclusões: Muitos temas e discussões que encontramos na imprensa do século XIX e início do XX apresentam semelhanças com a atualidade. Aliás, aplicam-se a qualquer época e encontramo-los na ordem do dia das notícias: a falta de médicos no interior do país, o estatuto e as remunerações dos grupos de profissionais especializados, como os professores, os farmacêuticos, os enfermeiros e as parteiras, por exemplo, a necessidade de melhorar as condições de habitabilidade das classes desfavorecidas, a higiene para a prevenção das doenças, a tentativa de encontrar medicamentos e tratamentos para curar doenças sobre as quais ainda não se sabe o suficiente. Sobretudo, a inexistência de medidas a longo prazo, mas apenas de respostas pontuais a crises. Após a seleção de notícias apresentadas, podemos afirmar a diversidade dos temas abordados e o interesse na divulgação das novidades científicas e tecnológicas por parte dos redatores dos jornais de meados do século XIX e início do XX. O que lemos nos jornais permite-nos concluir que as inovações tecnológicas foram concebidas para serem usadas por um número alargado de pessoas, sem o qual perdiam o seu significado e aplicação prática. E os jornalistas e intelectuais portugueses em geral nesta época consideravam que tinham a missão de educar o público e divulgar as mais recentes descobertas científicas e tecnológicas. Os redatores dos jornais generalistas revelaram desde o início uma forte tendência para o pensamento racionalista e claro, com ênfase na ciência e nos conhecimentos. A imprensa diária provou-nos que a circulação do conhecimento era uma realidade, por meio da divulgação de livros, transcrições e traduções de revistas especializadas, comentários das obras mais recentes. Sabemos também que os médicos

e

cientistas

portugueses

participavam

em

conferências

científicas

internacionais e realizavam viagens de estudos aos melhores laboratórios e centros de conhecimento europeus. No entanto, esse conhecimento restringia-se aos grandes centros. Era uma realidade a pouca disponibilidade dos melhores profissionais para se deslocarem à província, onde faltavam meios, equipamentos e medicamentos para acudir às populações. Ao longo do período analisado foi clara a evolução dos conhecimentos e das práticas médicas e a diferença entre as medidas sanitárias impostas. Em todos os casos descritos, a imprensa revelou-se uma fonte histórica indispensável. A generalidade das notícias sobre ciência e tecnologia refletiu o estado da arte da sua época, incluindo a preocupação de publicar resenhas históricas sobre

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os diversos temas, revelando-nos o tipo de informação que chegava a um público tão alargado quanto era possível para os níveis culturais de então. Perante estas imagens transmitidas pela imprensa, colocam-se várias questões: até que ponto é que estes conselhos chegaram ao público e a que públicos? E como foram recebidos e entendidos? Os jornais transmitiram-nos uma parte do comportamento humano em tempos de crise, as perceções e as crenças das populações, mediadas por editores e redatores com objetivos muito concretos. Revelaram-nos sentimentos de vulnerabilidade e crenças na ciência da época, cujas soluções foram discutidas e aplicadas com resultados variáveis. Como foi esta informação transformada em conhecimento? Não podemos responder se isto é sequer possível de apurar pelas notícias dos jornais. Mas fica o retrato possível de três épocas traumáticas e bastante reveladoras das dificuldades com que a ciência lidou para resolver os problemas e das respostas da sociedade às medidas aplicadas.

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