CIÊNCIAS BIOLÓGICAS 3º PERÍODO ZOOLOGIA DE INVERTEBRADOS

June 2, 2017 | Autor: P. Corgosinho | Categoria: Zoologia, Apostilas, Zoologia De Invertebrados, Universidade Aberta Do Brasil
Share Embed


Descrição do Produto

Frederico de Siqueira Neves Magno Augusto Zazá Borges Paulo Henrique Costa Corgosinho

ZOOLOGIA DE INVERTEBRADOS CIÊNCIAS BIOLÓGICAS 3º PERÍODO

Paulo Henrique Costa Corgosinho Magno Augusto Zazá Borges Frederico de Siqueira Neves

ZOOLOGIA DE INVERTEBRADOS CIÊNCIAS BIOLÓGICAS 3º PERÍODO

Montes Claros - MG, 2010

Copyright ©: Universidade Estadual de Montes Claros

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES REITOR Paulo César Gonçalves de Almeida

IMPRESSÃO, MONTAGEM E ACABAMENTO Gráfica Yago

VICE-REITOR João dos Reis Canela

PROJETO GRÁFICO E CAPA Alcino Franco de Moura Júnior Andréia Santos Dias

DIRETOR DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÕES Giulliano Vieira Mota CONSELHO EDITORIAL Maria Cleonice Souto de Freitas Rosivaldo Antônio Gonçalves Sílvio Fernando Guimarães de Carvalho Wanderlino Arruda REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA Arlete Ribeiro Neponuceno

EDITORAÇÃO E PRODUÇÃO Alcino Franco de Moura Júnior - Coordenação Andréia Santos Dias Bárbara Cardoso Albuquerque Clésio Robert Almeida Caldeira Débora Tôrres Corrêa Lafetá de Almeida Diego Wander Pereira Nobre Gisele Lopes Soares Jéssica Luiza de Albuquerque Karina Carvalho de Almeida Rogério Santos Brant

REVISÃO TÉCNICA Cláudia de Jesus Maia

Catalogação: Biblioteca Central Professor Antônio Jorge - Unimontes Ficha Catalográfica:

2010 Proibida a reprodução total ou parcial. Os infratores serão processados na forma da lei. EDITORA UNIMONTES Campus Universitário Professor Darcy Ribeiro s/n - Vila Mauricéia - Montes Claros (MG) Caixa Postal: 126 - CEP: 39041-089 Correio eletrônico: [email protected] - Telefone: (38) 3229-8214

Ministro da Educação Fernando Haddad Secretário de Educação a Distância Carlos Eduardo Bielschowsky Coordenador Geral da Universidade Aberta do Brasil Celso José da Costa Governador do Estado de Minas Gerais Antônio Augusto Junho Anastasia Secretário de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Alberto Duque Portugal Reitor da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes Paulo César Gonçalves de Almeida Vice-Reitor da Unimontes João dos Reis Canela Pró-Reitora de Ensino Maria Ivete Soares de Almeida Coordenadora da UAB/Unimontes Fábia Magali Santos Vieira Coordenadora Adjunta da UAB/Unimontes Betânia Maria Araújo Passos Diretor de Documentação e Informações Giulliano Vieira Mota Diretor do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde - CCBS Maria das Mercês Borém Correa Machado Chefe do Departamento de Ciências Biológicas Marcílio Fagundes Coordenador do Curso de Ciências Biológicas a Distância Ronaldo Reis Júnior

AUTORES Paulo Henrique Costa Corgosinho Biólogo, Bacharel em Ecologia pela UFMG, Mestre em Zoologia pela UFPR, Doutor em Biologia de Água Doce e Pesca Interior pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA/UFAM. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes. Magno Augusto Zazá Borges Biólogo, Bacharel em Parasitologia pela UFMG, Mestre em Parasitologia pelo Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, Doutor em Ciência Animal pela Escola de Veterinária da UFMG. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes. Frederico de Siqueira Neves Biólogo, Bacharel em Ecologia pela UFMG, Mestre em Entomologia pela UFV, Doutor em Conservação e Manejo da Vida Silvestre pelo Instituto de Ciências Biológicas da UFMG. Professor do curso de Ciências Biológicas da Unimontes.

SUMÁRIO DA DISCIPLINA

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 07 Unidade I: Introdução à Zoologia e Classificação Zoológica . . . . . . . 09 1.1 Classificação zoológica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09 1.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Unidade II: Reino Protista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.1 Sistemática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 2.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Unidade III: Filo Porifera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 3.2 Filo Porifera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.3 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Unidade IV: Filos Cnidaria e Ctenophora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.1 Introduçãoa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.2 Filo Cnidaria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 4.3 Filo Ctenophora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 4.4. Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Unidade V: Platyhelminthes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 5.1 Filo Platyhelminthes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56 5.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Unidade VI: Filos Blastocelomados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 6.1 Filo Rotifera. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 6.2 Filo Nematoda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 6.3 Outros filos menos diversos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 6.4. Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 Unidade VII: Filo Mollusca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 7.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 7.2 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92 Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 Referências básica e complementar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 Atividades de aprendizagem - AA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

APRESENTAÇÃO

Olá futuros biólogos! Estamos iniciando agora o estudo da zoologia, uma das disciplinas mais queridas pelos alunos de biologia. A zoologia é o estudo dos animais (metazoários) e dos protistas (também conhecidos como protozoários). Por questões didáticas, o estudo da zoologia é dividido em zoologia de vertebrados e invertebrados. Neste curso estudaremos a primeira parte do estudo dos invertebrados, englobando os protistas e os metazoários mais simples. Mas a simplicidade estrutural destes organismos não diminui a sua importância nos ecossistemas e até mesmo no dia a dia das pessoas. Entre os metazoários estudados nesta disciplina estão organismos marinhos como os corais, que junto com esponjas e anêmonas formam os recifes de corais, um verdadeiro bercarios da vida marinha. Logo depois comecamos a estudar os platelmintos ou vermes chatos, onde encontramos tanto parasitos como o Schistosoma e a Taenia, bem conhecidos de todos por causarem doencas comuns ao seres humanos, como importantes organismos aquáticos de vida livre (não parasitos) como as planárias. Terminando os platelmintos, começaremos o estudo dos organismos antes conhecidos como pseudocelomados (hoje chamados de blastocelomados), que possuem uma outra cavidade corporal além do tubo digestivo, característica inexistente nos platelmintos. Entre os blastocelomados estudaremos os dois filos maiores, Nematoda e Rotifera. O filo Nematoda, dos vermes “cilíndricos”, abriga o verme mais comum em humanos, o Ascaris lumbricoides, além de outros parasitos e milhares de vida livre, presentes em praticamente todos os tipos de habitats terrestres. Os rotíferos são organismos aquáticos comuns em todos os corpos d'água do mundo, principalmente nos de água doce. São importantes na ciclagem de nutrientes no ecossistema e se destacam por seu sistema de propulsão. O curso se encerra com o estudo de um dos filos mais numerosos da natureza, os moluscos. Os moluscos, encontrados facilmente até no jardim de sua casa, são caracterizados por seu corpo mole e viscoso. O grupo é muito diverso, reunindo organismos bem diferentes, como caramujos, mariscos, polvos e lulas. Além destes bem conhecidos de qualquer um que já foi ao litoral, estudaremos outros bem diferentes, como os quítons. Agora é começar a estudar e explorar este maravilhoso e diverso mundo da zoologia.

07

1

UNIDADE 1

INTRODUÇÃO À ZOOLOGIA E CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICA

Olá futuros biólogos! Agora é hora de começar a aprender sobre os animais e protistas, organismos estudados pela Zoologia. Nesta unidade, você terá as primeiras noções sobre os principais grupos de seres vivos (reinos) e noções básicas sobre sistemática e nomenclatura zoológica.

1.1 CLASSIFICAÇÃO ZOOLÓGICA Inicialmente, vamos discutir um pouco sobre como os seres vivos podem ser classificados. As primeiras tentativas bem documentadas de classificar os seres vivos foram feitas pelo filósofo grego Aristóteles (384-322 ac). No entanto, o sistema de Aristóteles era bastante simples e os animais eram arbitrariamente agrupados de acordo com similaridades superficiais compartilhadas. Por exemplo, inicialmente os animais eram agrupados de acordo com o meio em que viviam (terra, água e ar), ou de acordo com a forma que reproduziam. Com isso, eram criadas classificações, muitas vezes, artificiais, onde organismos não aparentados evolutivamente eram colocados em um mesmo “grupo taxonômico” devido à convergência de caracteres. As ideias de como as diferentes formas se originavam não incorporavam nenhuma ideia de mutabilidade e evolução, já que Aristóteles acreditava em um universo imutável, que sempre existiu em toda sua complexidade. Mas já nessa época, Aristóteles aplicava o princípio de classificação dicotômica desenvolvido anteriormente por Platão (427-347 ac) e utilizado até hoje, nas chaves de identificação. Vários foram os filósofos e naturalistas que se preocuparam com o método biológico após Aristóteles, mas a classificação era regional, os nomes variavam de país para país e entre regiões em um mesmo país. Não existia um sistema central de referência que pudesse ser aplicado em todo o mundo. Foi Carl Linnaeus (1707-1778) que, em 1735, em sua obra Systema Naturae, formalizou o método binomial de classificação de espécies que usamos até hoje. A história da classificação biológica e o papel da evolução na formação das espécies e suas variedades são repletos de simplismos e injustiças. A primeira tentativa de classificação levando em conta uma teoria evolutiva foi Ernst Haeckel (1834-1919) em 1866. Ele divide os seres vivos em três reinos: Plantae, representados pelas plantas (incluindo algas pluricelulares, fungos e briófitas), Protista (microorganismos) e Animalia (animais) (Fig.1). Esse autor baseou grande parte de seu trabalho na revolucionária teoria de Wallace e Darwin, primeiramente divulgada em 1858 com o nome “Sobre a tendência das espécies para formar variedades; e sobre a perpetuação das variedades e espécies por meio de seleção” (On the Tendency of Species to form Varieties; and on the Perpetuation of Varieties

09

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

and Species by Natural Means of Selection). Um ano após, em 1859, Darwin publica seu livro “Sobre a origem das espécies por meio de seleção natural, ou a preservação das raças favorecidas na luta pela vida” (On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life). No entanto, o pensamento evolutivo e a ideia de que os organismos se modificam, adaptando-se ao ambiente em que vivem já tinha aparecido, embora de forma distinta, nos trabalhos e anotações de Erasmus Darwin (1731-1802), Jean-Baptiste Lamarck (1744–1829), Étienne Geoffroy Saint-Hilaire (1772-1844), Robert Knox (1791-1862), Robert Edmond Grant (1793-1874), Robert Jameson (1774-1854), Robert Chambers (1802–1871), dentre outros.

Figura 1: Árvore da vida de Haeckel. Fonte: domínio público.

1.1.1 Sistemática e Taxonomia Atualmente, existem cerca de 1.5 milhões de espécies de animais descritas, o que representa apenas cerca de 20% das espécies existentes. Então, como podemos entender toda essa diversidade e como agrupá-la para compreender as relações entre os organismos? Para isso foi criada a Sistemática e um sistema de classificação. A Sistemática é definida como o estudo científico dos organismos em sua diversidade, sua evolução no tempo e no espaço e sua classificação, traduzindo as relações de ancestralidade e parentesco, também é chamada de ciência da Biodiversidade.

10

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Em 1627 o naturalista John Ray introduziu um sistema de classificação mais abrangente que resultou posteriormente no trabalho do botânico Carolus Linnaeus (Fig. 2) que elaborou o sistema de classificação, o “Systema Naturae”. A ideia de Linnaeus era organizar os organismos e as regras de classificação para padronizar e evitar erros, como dar um mesmo nome para espécies distintas ou nomes diferentes para uma mesma espécie. Para isso, são necessárias regras que são organizadas pela Taxonomia, parte da Sistemática responsável por organizar os princípios a serem usados para comunicar os resultados da análise sistemática. Ou seja, a Taxonomia é responsável pelas regras de nomenclatura, tais como: dar nomes às espécies, gêneros e famílias. Além disso, a Taxonomia é responsável pelas regras para formar coleções taxonômicas, rotulagem e publicações taxonômicas.

Figura 2: Carl Linnaeus (1707-1778), ou Carolus Linnaeus (forma latinizada por ele próprio), ou ainda Carl Von Linné ou Carl Linné, propositor do sistema taxonômico binomial. Pintura de 1775 feita por Alexander Roslin, atualmente está no Museu Nacional de Estolcomo na Suécia. Fonte: Fig2.jpg

1.1.2 Sistema hierárquico de classificação: O sistema de Linnaeus na organização de organismos em séries ascendentes de categorias menores. Ele dividiu o Reino Animal em espécies e deu a cada uma delas um nome particular. Uma espécie era considerada um agrupamento de indivíduos que revelam profundas semelhanças entre si, tanto na estrutura arquitetônica quanto funcional, mostrando grandes similaridades biológicas e capazes de se reproduzirem naturalmente, dando origem a descendentes férteis (Fig. 3).

11

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Entretanto, na Natureza ocorrem espécies que, embora diferentes entre si, guardam grandes aproximações. Assim são reunidas dentro de uma categoria taxonômica comum que é o gênero. Seguindo o mesmo raciocínio, diversos gêneros, muito próximos, são reunidos num grupamento taxonômico comum, conhecido como família. A reunião de famílias semelhantes forma uma ordem. Por sua vez, a reunião de ordens forma uma classe, que reunidas dão origem a um filo. A reunião de todos os filos forma a maior das categorias taxonômicas, o reino. Após a publicação da teoria da evolução, a classificação de Linnaeus foi drasticamente modificada, mas o princípio básico do seu sistema é ainda seguido. A hierarquia das categorias taxonômicas expandiu-se, consideravelmente, desde os dias de Linnaeus (Tab. 1). Ela inclui atualmente sete categorias principais para o reino Metazoa, em ordem decrescente: reino, filo, classe, ordem, família, gênero e espécie. Todos os organismos classificados devem pertencer a pelo menos sete táxons, um para cada categoria principal. Os taxonomistas têm a opção de subdividir ainda mais estas sete categorias e atualmente são conhecidas mais de 30 categorias taxonômicas em grupos mais diversos e complexos como peixes e insetos. , Tabela 1: Exemplos de categorias taxonômicas, as quais pertencem alguns representantes dos animais. Categoria Taxón Reino Metazoa Metazoa Metazoa Metazoa Filo Arthropoda Chordata Chordata Chordata Classe Insecta Amphibia Mammalia Mammalia Ordem Diptera Anura Primates Primates Família Culicidae Centrolenidae Hominidae Hominidae Gênero Culex Hyalinobatrachium Gorilla Homo Espécie Culex quinquefasciatusHyalinobatrachium eurygnathum Gorilla gorilla Homo sapiens Nome popular

mosquito

perereca-de-vidro

gorila

homem

Figura 3: Tabela do Reino Animal (Regnum Animale) da primeira edição do Systema Naturae Linnaeus (1735). Fonte: Fig3.jpg

12

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

1.1.3 Regras de nomenclatura: Considerando-se o imenso número de idiomas e dialetos espalhados pelo mundo, torna-se absurdo o número de nomes diferentes pelos quais são chamados os animais e as plantas. Assim, Linnaeus, propôs uma forma de nomenclatura mais simples, em que cada organismo seria conhecido por dois nomes apenas seguidos e inseparáveis. Assim, surgiu a nomenclatura binomial que é ainda hoje adotada. Dessa forma, cada espécie animal ou vegetal teria dois nomes: o primeiro, o gênero, deveria refletir as características mais genéricas ou coletivas; o segundo, a espécie, que reflete as características mais específicas, aquelas mais peculiares. A Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica foi criada em 1895 com o intuito de criar um sistema estável, lógico e universal que pudesse ser aplicado à nomenclatura zoológica, além de assegurar que cada nome seja único e distinto. A primeira versão do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica foi publicada em 1961, embora algumas tentativas de normatização da taxonomia zoológica datem da metade do século XIX, antes mesmo da fundação da Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica. Atualmente o código está em sua quarta edição, datado em 1999. Exemplos de regras retiradas do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica (1999): ? O nome dos animais deve ser escrito em latim ou idioma

latinizado e deve estar em destaque no texto. Exemplo: Canis lupus (lobo); ? Todo animal deve ter umnome específico binomial composto pelo nome genérico, escrito com primeira letra em maiúscula, seguido pelo epíteto específico todo em minúsculo. Exemplo: Musca domestica (mosca)Musca (gênero), Musca domestica (espécie); ? Disponibilidade e Validade- Um nome, para ser disponível deve ser publicado em meios que permitam acesso público e registro permanente e deve ser impresso por meios que garantam reprodução múltipla e fidedigna. Após 1930, um nome, para ser disponível a um dado táxon, deve satisfazer as provisões citadas acima, além de: ? Deve ser acompanhado por uma descrição que defina os caráteres diagnósticos para o táxon ao qual é dado o nome, ou ser acompanhado de uma referência bibliográfica que contenha os caráteres diagnósticos propostos para o novo táxon; ? Deve ser expressamente designado como um novo táxon (tax nov.; nom. nov; spec. nov, etc); ? Uma espécie tipo deve ser explicitamente designada. Cada

espécie tipo deve ter um fixador do nome específico. Normalmente, esse fixador é um espécime tipo, ou holótipo designado pelo autor, no momento da descrição da espécie e que servirá como padrão para a espécie;

13

ATIVIDADES

Classifique cinco animais não citados na figura acima, segundo as sete categorias taxonômicas principais de Linnaeus.

DICAS

Entre no site (http://www.iczn.org/iczn/index .jsp) para encontrar o Código Internacional de Nomenclatura Zoológica. Neste site você poderá entender todos os passos para descrição e nomeação de uma nova espécie (página e código em inglês). Para uma versão menos atualizada, porém didática e em língua portuguesa de algumas normas presentes no ICZN, consultem o livro Fundamentos Práticos de Taxonomia Zoológica, de autoria de Nelson Papavero (2004, Fundação Editora UNESP).

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

? Princípio da prioridade - Se vários nomes forem propostos para um mesmo táxon, é o mais antigo que deverá vigorar. Dois ou mais nomes estão em sinonímia se são aplicados em um mesmo nível taxonômico, para o mesmo táxon. Por exemplo, o gênero Paraforficatocaris (Crustacea da órdem Copepoda) foi proposto por Jakobi em 1972 para incluir a espécie Paraforficatocaris paraensis jakobi, 1972. Antes da publicação desse gênero, também em 1972, o mesmo autor, em um trabalho diferente, propôs o gênero Brasilibathynellocaris para incluir 3 outras espécies relacionadas. E s t u d o s r e c e n t e s i n d i c a r a m q u e Pa r a f o r f i c a t o c a r i s é u m Brasilibathynellocaris. Portanto, apesar de que ambos os nomes sejam válidos, os dois são sinônimos, sendo Paraforficatocaris um sinônimo júnior. Pelo princípio da prioridade, o nome genérico Brasilibathynellocaris, proposto anteriormente, deve ser adotado. ? Princípio da homonímia- Quando dois táxons totalmente

distintos recebem o mesmo nome, o táxon descrito primeiramente deverá permanecer com o seu nome original, enquanto o táxon descrito posteriormente, com o mesmo nome, deverá receber um nome diferente. Assim temos homônimos (táxons diferentes com o mesmo nome), onde o mais recente é considerado um homônimo júnior, devendo seu uso ser discontinuado em função do homônimo mais velho. Exemplo: Selys, em 1817, descreveu o gênero de uma libélula como Podopteryx. Em 1971, Sharov utilizou o mesmo nome (Podopteryx) para um fóssil de pterossauro. Assim, seguindo o código de nomeclatura o nome Podopteryx deve ser aplicado somente para o gênero proposto por Selys. Em 1981, Cowen propôs um novo nome, Sharovipteryx, em substituição ao homônimo Podopteryx dado ao pterossauro (FIG. 4).

Figura 4. O pterossauro Sharovipteryx e uma libélula da subfamília Argiolestinae, a mesma da Podopteryx. Desenho do pterossauro: Arthur Weasley. Foto da libélula: R. A. Nonenmacher. Fonte: fig4.jpg

14

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

? Em trabalhos científicos, depois do nome da espécie, coloca-se o nome do autor que o descreveu seguido de vírgula e data (ex: nome de uma espécie de besouro rola-bosta muito comum no norte de Minas Gerais: Deltochilum verruciferum Felsche, 1911). Se o nome entra em sinonímia, autor e ano da descrição original aparecem entre parênteses (ex: Paraforficatocaris paraensis Jakobi, 1972 é sinonímia júnior de Brasilibathynellocaris paraensis (Jakobi, 1972). No caso de homonímia, o novo nome recebe o nome do autor que identificou o problema e propôs o novo nome (Podopteryx Sharov, 1971 é sinônimo sênior de Sharovipteryx Cowen, 1981).

ATIVIDADES

1.1.4 Sistemática filogenética O método de sistemática filogenética proposto pelo entomólogo alemão Willy Hennig em 1950 é um marco no desenvolvimento da sistemática biológica, a partir do momento que ofereceu um sistema lógico, embasado em ideias evolucionistas, que permitiu o teste de hipóteses das relações de parentesco entre as espécies de diferentes grupos taxonômicos. Basicamente, o método proposto por Hennig se baseia na ideia de que organismos mais aparentados compartilharão caracteres comuns somente a eles, herdados de seu ancestral comum mais próximo. Esses caráteres são denominados apomorfias (ver também autapomorfias e sinapomorfias), e definem grupos monofiléticos. São monofiléticos os grupos onde estão representados todos os descendentes de um mesmo ancestral comum. Grupos onde um ou mais descendentes de um mesmo ancestral comum não estão representados são denominados parafiléticos. Grupos parafiléticos são caracterizados por plesiomorfias (ver também simplesiomorfias), sendo plesiomorfias aqueles caráteres ancestrais, que surgiram em etapas anteriores, ao evento de especiação que leva a um novo grupo monofilético. Já os grupos polifiléticos são constituídos por espécies que não compartilham um mesmo ancestral comum mais próximo. Esses grupos são caracterizados por homoplasias (convergências) (FIG. 3).

Figura 5: Hipótese das relações filogenéticas dentro dos vertebrados e delimitação de alguns grupos monofiléticos, parafiléticos e polifiléticos. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/User:TotoBaggins.

15

Dê um exemplo de uma espécie animal, que você conhece, que possui mais de um nome popular e tente encontrar na internet o nome específico desse organismo, juntamente com o autor e a data de publicação.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Um outro ponto chave no método hennigiano é o reconhecimento de que proximidade filogenética não quer dizer, necessariamente, similaridade morfológica, como defende os taxonomistas tradicionais. Em outras palavras, o método é biológicamente mais realista, levando em conta que estruturas homólogas (aquelas derivadas de um mesmo ancestral comum) podem divergir grandemente em forma e função, em virtude de pressões seletivas diferenciadas.

ATIVIDADES Diferencie a Taxonomia tradicional da Sistemática Filógenética.

DICAS

Para entender melhor a classificação moderna dos seres vivos, é muito interessante consultar a página da internet do projeto “Tree of Life” http://www.tolweb.org/Life_on_ Earth/1. Você pode ir navegando através dos “galhos” da árvore e explorar a biodiversidade. É bom lembrar que todas as classificações são hipóteses e que não há verdade absoluta em ciência.

1.1.5 Os Reinos da Natureza Como tudo em biologia, ainda hoje existe uma grande controvérsia quanto ao número de reinos da natureza, mas a maioria dos autores concorda que existem 5 ou mais reinos: Com o objetivo de simplificar, nosso objetivo não é introduzir desnecessária discussão sistemática nesse momento, iremos adotar a divisão da natureza em cinco reinos: Monera, Fungi, Plantae, Protista e Metazoa. Esses cinco reinos permaneceram com a classificação mais aceita, até o desenvolvimento da sistemática molecular, ao final do século XX, quando ficou aparente que nem os Protistas e nem os Moneras são monofiléticos. Atualmente, muitos autores dividem o reino Monera em dois: Eubacteria e Archaea. Os antigos Protistas são divididos em um número ainda maior de grupos monofiléticos mais próximos de fungos, animais, plantas e alguns “Moneras’’. Vírus não são incluídos dentro dos cinco reinos, havendo uma ampla discussão a respeito da condição de seres vivos proposta para esses “organismos’’. O reino Monera (FIG. 6) engloba os organismos procariotos, isto é, organismos que não possuem células com núcleo ou organelas envoltas por membranas. Dentro deste reino estão as bactérias e cianofíceas (algas azuis ou cianobactérias). Todos os outros reinos são de organismos eucariotos, cujas células que possuem membranas circulando o núcleo e as outras organelas. O estudo destes organismos se encontra inserido na microbiologia, mais especificamente na bacteriologia.

Figura 6: Exemplo de organismo do Reino Monera Helicobacter pylori em microscopia eletrônica. Fonte: Foto Yutaka Tsutsumi.

16

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

O reino Fungi é representado por organismos heterotróficos (não produzem seu próprio alimento), saprofágicos (se alimentam de matéria orgânica em decomposição), que possuem parede celular quitinosa. Aqui se encontram os fungos e cogumelos (FIG.7). O estudo dos organismos deste reino é chamado de micologia.

Figura 7: Exemplo de organismo do Reino Fungi – O cogumelo Amanita muscaria. Fonte: Foto de Afbeelding Onderwijsgek.

As plantas (FIG.8) multicelulares formam o reino Plantae; são organismos autotróficos (produzem seu próprio alimento) e fotossintetizantes. Aqui estão as briófitas e as plantas vasculares. São foco de estudo da Botânica.

Figura 8: Exemplo de organismo do Reino Plantae . Fonte: Foto Magno Borges.

Em zoologia, por questões históricas e didáticas, estudaremos os dois reinos restantes: Protista e Metazoa. Esta divisão é puramente didática, uma vez que são organismos muito diferentes. O reino Protista é formado por organismos unicelulares ou multicelulares, porém sem apresentar tecidos verdadeiros ou desenvolvimento embrionário. Abrigam os chamados “protozoários” e as algas.

17

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

O reino Metazoa, também conhecido como Animallia, é formado por organismos heterotróficos, multicelulares e que, na sua maioria, apresentam tecidos verdadeiros (exceto Porifera, Rhombozoa e Orthonectida; ver páginas 227 a 230 do livro Princípios Integrados de Zoologia, escrito por Hickman, Roberts & Larson; 11a edição), além de células reprodutivas, reprodução sexual e divisão celular por meiose. Estimase que estes animais teriam surgido há 600-900 m.a., nos períodos précambrianos, provavelmente nos fundos dos oceanos e mares, são divididos comumente em Protostomia (invertebrados nos quais o blasóporo origina a boca) e Deuterostômia (composto por alguns invertebrados sem notocorda e Chordata, onde o blastóporo origina o ânus).

REFERÊNCIAS Darwin, C. & Wallace, A. R. On the Tendency of Species to form Varieties; and on the Perpetuation of Varieties and Species by Natural Means of Selection, Journal of the Proceedings of the Linnean Society of London. Zoology 3: 46-50. 1858. Darwin, C. On the Origin of Species by Means of Natural Selection, or the Preservation of Favoured Races in the Struggle for Life. London, John Murray, 1859 Haeckel, E. Generelle Morphologie der Organismen. Vol. 1 e 2, Berlin, Verlag von Georg Reimer, 1866. Hennig, W. Grundzüge einer Theorie der phylogenetischen Systematik. Berlin, Deutscher Zentralverlag, 1950. HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. International Commission on Zoological Nomenclature. International code of zoological nomenclature online. 4. ed. Disponível em http://www.iczn.org/iczn/index.jsp> Acesso em: 18 Nov. 2009. ISBN 0853010064. Linnaeus, C. Systema naturae per regna tria naturae :secundum classes, ordines, genera, species, cum characteribus, differentiis, synonymis, locis. Holmiae (Laurentii Salvii), 1735. RAY, J. Historia plantarum species, etc. 3 vols. Vol. I. Londini: Clark, 1686. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

18

2

UNIDADE 2 REINO PROTISTA

Os Protistas são um reino grande e diverso, que reúne organismos tão distintos como as amebas intestinais unicelulares e os sargaços, algas marinhas que podem chegar a vários metros. Por essa diversidade de formas, muito além da aparência, os cientistas não conseguem chegar a um consenso sobre a classificação destes organismos. Vamos aprender sobre eles, para que ao final vocês possam ter sua própria opinião sobre o assunto.

Introdução Os protistas são organismos eucariotos unicelulares ou pluricelulares, mas que não possuem um grau de especialização celular significante, mecanismos de adesão celular ou tecidos verdadeiros. Muitos livros ainda os chamam de “Protozoa” (do grego Proto, “primeiro” e Zoon, “animal”) ou protozoários, mas a maioria dos textos modernos utiliza “Protistas”. Eles realizam todas as suas funções fisiológicas somente com as organelas celulares, variam de 1µm (Micromonas), até uns poucos milímetros (alguns dinoflagelados, amebas e ciliados). Corliss (1999) estima que existam 12.000 a 19.000 protistas conhecidos. 2.1 SISTEMÁTICA

ATIVIDADES A mais tradicional classificação dos Protistas era baseada nas suas organelas de locomoção: ? Flagelados; se locomovem por flagelos. ? Sarcodinos; se locomovem por pseudópodos. ? Ciliados; se locomovem por cílios. ? Esporozoários; não possuem organelas de locomoção.

Essa classificação não mostra a verdadeira diversidade de protistas, nem suas ligações de parentesco, por isso é considerada uma classificação artificial (Fig.9). Isso se deve a ela ser baseada somente em uma característica, as organelas de locomoção. Ela ainda tem a sua utilidade didática, para facilitar o trabalho do professor em sala de aula. Aqui mesmo, usaremos essa classificação algumas vezes.

19

Pesquise a classificação dos Protistas em livros didáticos de biologia. A classificação encontrada corresponde a mais moderna, adotada neste trabalho? São chamados de Protistas ou Protozoários?

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 9: Diversidade entre os protistas: a – Exemplos de ciliados de vida livre. b – Três flagelados simbióticos não-pigmentados. c – Um euglenóide fotossintetizante. d – dois dinoflagelados de vida livre (a figura acima de água doce, abaixo marinho). e – duas amebas tecadas, com diferentes pseudópodos. f – Um foraminífero. g – Um radiolário, exibindo a complexidade de seu esqueleto. h – Uma gregarina (apicomplexa). i – Dois pseudofungos saprofágicos. j – Duas algas marinhas. k – Um 19TTP191919ia19dio (protista fungal). l – Dois myxosporidios. Fonte: Corliss (2002).

A classificação dos Protistas é muito controversa, não havendo nenhum tipo de consenso até hoje. Em situações como essa a melhor alternativa é escolher uma classificação e segui-la. Para o nosso estudo, utilizaremos a classificação adotada por Brusca & Brusca (2003) e falaremos dos filos mais comuns e representativos de protistas. Filos “Flagelados” Características Gerais Flagelos são estruturas em forma de chicote que algumas células apresentam e têm função de locomoção. Os flagelos das células eucariotas se diferenciam dos presentes nas células procariotas pela sua estrutura peculiar: Nove pares fundidos de microtúbulos envolvendo dois microtúbulos centrais (Fig. 10 e 11), estes microtúbulos são envolvidos por uma continuação da membrana plasmática e preenchidos pelo citoplasma da célula. Os microtúbulos deslizam entre si e produzem o movimento flagelar, semelhante o produzido por um motor de popa de barco.

20

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

DICAS

Estudar os protistas é como estudar a própria célula eucariota. É um bom momento para relembrar o que foi aprendido em biologia celular. Use seu material e anotações como auxílio para o estudo dos protistas.

Figura 10: Desenho esquemático do corte de um flagelo eucarioto. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/File:Eukaryotic_ flagellum.svg. fig10.png

Figura 11: Microscopia eletrônica de transmissão do corte longitudinal do flagelo de Chlamydomonas reinhardtii. Fonte: Dartmouth Electron Microscope Facility, Dartmouth College. Autores: Elizabeth Smith, Louisa Howard, Erin Dymek.

O que chamamos de “protistas flagelados” aqui é um grupo enorme de organismos de vida livre, comensais ou parasitas. A única característica que vai reuni-los como um todo é possuir flagelo na maior parte de seu ciclo de vida. Eles são frequentemente divididos em fitoflagelados (flagelados fotossintetizantes) e zooflagelados (flagelados heterotróficos). Principais filos: A. “Fitoflagelados”

21

B GC

GLOSSÁRIO

A

E

F

Fotossintetizante: Organismos que possuem a capacidade de realizar a fotossíntese, produzindo seu próprio alimento (glicose). São os produtores na cadeia alimentar. Heterotrófico: organismos que não produzem seu próprio alimento e se alimentam de outros organismos. São os consumidores na cadeia alimentar.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Filo Euglenida Os protistas deste filo são aproximadamente 1.000 espécies, a maioria de água doce e uns poucos marinhos, muito comuns em corpos d’água ricos em matéria orgânica, podendo ser úteis como bioindicadores de qualidade de água. Seu corpo possui um formato relativamente rígido, mantido por uma película formada por fitas de proteínas, abaixo da membrana plasmática. Essa película é facilmente visível ao microscópio em algumas espécies (Fig. 12).

Figura 12 Euglena sp. Fonte: Proyecto Agua. Fonte: www.flickr.com/photos/microagua/

Eles portam normalmente dois flagelos de tamanho desigual e possuem uma única mitocôndria com cristas discoidais e somente um núcleo. Um terço deles possui cloroplastos e é fotossintetizante, que lhes dá a cor verde. Apresentam clorofila a e b e a sua substância de reserva é o paramilo, diferente das plantas verdes, por exemplo, que estocam amido. Os fotossintetizantes possuem fototropismo positivo (são atraídos por fontes de luz), portanto uma organela fotoreceptora (estigma) pigmentada na base do flagelo (Fig.12). Os outros dois terços não possuem cloroplastos e são heterótrofos, se alimentando basicamente de matéria orgânica dissolvida. Algumas formas fotossintetizantes podem facultativamente se tornarem heterótrofas. Existem algumas formas predadoras (Peranema) e umas poucas parasitas de invertebrados e girinos. Reproduzem-se por divisão binária simples, não havendo fase sexuada. Filo Dinoflagellata São chamados de dinoflagelados (do grego Dinos, girar), por causa de sua maneira peculiar de se movimentar: possuem dois flagelos, um longitudinal e um transversal, que faz com que eles rodem como um pião. Estes flagelos repousam em sulcos próprios: sulco longitudinal e sulco equatorial (Fig.13). Esta é uma característica diagnóstica para este filo.

22

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 13: Desenho esquemático de um dinoflagelado, mostrando a localização dos dois flagelos. Fonte: Desenho: Rebecca Stritch / BIODIDAC.

Existem aproximadamente 4.000 espécies de dinoflagelados, muitas delas fósseis, uma vez que estes protistas podem portar armaduras de celulose (Fig. 14) que se preservam no registro fóssil. São comuns em todos os habitats aquáticos, mas sua maior diversidade é marinha. Pelo menos a metade deles é fotossintetizante, possuindo clorofila a e c2, ficobilinas, carotenóides e xantofilas, esta última lhes conferindo a cor dourada ou marrom. As espécies heterotróficas podem ingerir partículas por fagocitose ou são saprofágicas (se alimentam de matéria orgânica em decomposição). Suas substâncias de reserva são gotas lipídicas (óleos) ou amilo. Reproduzem-se por divisão binária oblíqua ou desigual, mas existem espécies que possuem reprodução sexuada. Eles possuem espécies bioluminescentes (Fig.15), quando em grande quantidade e à noite, produzindo efeitos luminosos quando a superfície marinha é perturbada. Alguns dinoflagelados, quando em grande quantidade (blooms) podem liberar substâncias tóxicas que podem causar a morte de outros organismos marinhos, como peixes. Este fenômeno é

23

ATIVIDADES Procure imagens de “maré vermelha” no Google imagens (http://images.google.com/). Experimente fazer a busca em inglês (red tide).

Figura 14: Ceratium sp., um dinoflagelado planctônico. Fonte: Keisotyo (http://comm ons.wikimedia.org/wiki/User: Keisotyo).

Figura 15: Noctiluca scintillans, um dinoflagelado bioluminescente. Fonte: Foto de Maria Antónia Sampayo, Instituto de Oceanografia, Faculdade Ciências da Universidade de Lisboa.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

chamado de “maré vermelha”, porque o trecho de mar atingindo costuma apresentar uma cor avermelhada. Pode ser causado por espécies como Alexandrium spp. e Gymnodinium catenatum. Uma espécie, a Pfiesteria piscicida, possui uma toxina mil vezes mais poderosa que o cianeto. Filo Chlorophyta São a chamadas “algas verdes”, motivo de disputas entre botânicos e zoólogos por anos! Isso porque, algumas são unicelulares e possuem todas as características que se espera de um protista (Chlamydomonas) e outras já possuem um nível de diferenciação próximo das plantas (Ulva) (Fig. 16). Seus cloroplastos são muito semelhantes aos das plantas, possuindo clorofila a e b, e estocam nutrientes na forma de amido. Algumas formam colônias, como a Volvox.

Figura 16: As clorófitas Ulva lactuca e Chlamydomonas sp. Fontes: Kristian Peters e Dartmouth Electron Microscope Facility, Dartmouth College.

Filo Stramenopila Formado por um grupo heterogêneo de organismos: Diatomáceas, Crisófitas (algas douradas) e “fungos flagelados” (Oomycota). Caracterizamse por possuir dois flagelos desiguais que portam pelos tripartidos.

Figura 17: Paraphysomonas butcheri exibindo o flagelo com pelos tripartidos. Fonte: http://starcentral.mbl.edu/microscope/

24

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

São encontrados em todos os habitats aquáticos, inclusive os glaciais. As mais conhecidas são as diatomáceas, por serem extremamente comuns e numerosas e possuírem belos esqueletos silicosos ou calcários (Fig.17). Em algumas praias, as diatomáceas são tão abundantes que grande parte da areia é composta por elas, formando a chamada “areia de diatomáceas”, que é usada na cosmética como esfoliante. Suas características celulares são: mitocôndrias com cristas curtas tubulares, núcleo único, as formas fotossintéticas possuem clorofila a, c1 e c2, xantofilas amarelas e marrons, que lhe dão uma cor marrom-esverdeada, por isso são chamadas por alguns de “algas douradas”.

Figura 18: Alguns exemplos de Diatomáceas. Fonte: Fotos: Damián H. Zanette.

ATIVIDADES B.“Zooflagelados” Filo Kinetoplastida Os membros deste filo se caracterizam por possuir uma única mitocôndria modificada e alongada chamada cinetoplasto. O cinetoplasto possui um tipo de DNA próprio, chamado kDNA. Esta organela se mostra bem evidente em preparações microscópicas, estando sempre associada ao flagelo (Fig.19). Possuem 1 ou 2 flagelos inseridos numa depressão na região anterior do organismo. Em Leishmania e Trypanosoma da família Trypanosomatidae, o flagelo arrasta-se e conecta-se ao longo dos lados do corpo por meio de uma membrana ondulante.

25

Observação a fresco de protistas. Tragam amostras de água de riachos e lagoas, de preferência coletem de locais ricos em plantas aquáticas. Levem para o laboratório e observem no microscópio os organismos presentes. Vocês conseguem reconhecer alguns dos protistas estudados?

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 19: Trypanosoma sp., em lâmina de esfregaço sanguíneo. Fonte: Autor: Dr Myron G. Schultz – CDC. Fig19.png

Existem cerca de 600 espécies descritas de Kinetoplastida, que podem ser divididas em dois grupos: os bodonídeos e os tripanossomatídeos. Os bodonídeos são de vida livre e vivem em ambientes aquáticos marinhos e de água doce, ricos em matéria orgânica. Os tripanossomatídeos são exclusivamente parasitos, infectando invertebrados, vertebrados e até plantas. Dentro deste grupo temos importantes parasitos humanos, como o Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas (Fig.20), e as Leishmania spp. causadoras das Leishmanioses. Estas parasitoses serão estudadas a fundo na disciplina Parasitologia.

Figura 20: Ciclo da Doença de Chagas. Fonte: CDC (www.cdc.gov).

26

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Filo Choanoflagellata Conhecidos como coanoflagleados são um pequeno grupo de protistas marinhos e dulcícolas de vida livre, com pouco mais de 125 espécies conhecidas. Podem ser solitários ou coloniais, sésseis ou livrenatantes. As espécies sésseis prendem-se por meio de uma haste, parte de uma teca. Os indivíduos coloniais são unidos por uma matriz gelatinosa ou por seus colares, têm como característica distintiva possuir um colar cilíndrico de microvilos ao redor da base do flagelo único, formando um sistema filtrador para a captura de bactérias para alimentação (Fig. 21). Para ver uma animação sobre este sistema acesse o site: www.biology.ualberta.ca/facilities/multimedia/uploads/zoology/choanoflagellate.html.

Figura 21: Microfotografia do coanoflagelado Desmarella moniliformis Fonte: Foto de Sergey Karpov.

Os coanoflagelados sempre chamaram a atenção dos zoólogos por sua semelhança com células típicas dos poríferos (esponjas), os coanócitos. Estudos de filogenia demonstraram que os coanoflagelados são um grupo irmão dos metazoários, isto é, são os protistas filogeneticamente mais próximos dos metazoários. Filo Parabasilida Formado por protistas anaeróbios endosimbiontes de animais, sendo conhecidas somente 4 espécies de vida livre, todas de ambientes anóxicos (sem oxigênio). Poucos são parasitos, mas o filo engloba parasitos de importância médico-veterinária, como o Trichomonas vaginalis, humano e o Tritrichomonas foetus, bovino. Suas características distintivas são a

27

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

presença do aparato parabasal (Complexo de Golgi associado com fibras parabasais), ausência de mitocôndrias, substituídas por uma organela chamada hidrogenossoma. Uma outra estrutura que facilita o reconhecimento deste filo é o axóstilo, uma estrutura rígida em forma de agulha que atravessa o citoplasma (Fig. 22).

Figura 22: Trichomonas vaginalis. Fonte: Foto: CDC (www.cdc.gov).

Existem aproximadamente 300 espécies conhecidas de Parabasilida, normalmente divididas em dois grupos os tricomonadidas e os hipermastigotos. Os tricomonadidas são simbiontes ou parasitos no trato digestivo, respiratório e reprodutor de vertebrados. Os hipermastigotos possuem centenas de flagelos e vivem como mutualistas obrigatórios no trato digestivo de insetos, como cupins e baratas. Nestes insetos eles atuam produzindo enzimas que digerem a celulose. Filo Diplomonadida São protistas comensais no trato digestivo de animais, as poucas espécies de vida livre são achadas em águas poluídas. Seu nome vem da organização bilateral de sua célula (Fig.26). Caracteristicamente possuem dois núcleos, um número variável de flagelos, mas o mais comum são oito. Não possuem mitocôndrias. São heterotróficos, se alimentando de substâncias orgânicas através da fagocitose e da pinocitose. Reproduzem-se por divisão binária longitudinal e podem formar cistos (formas de resistência) durante o seu ciclo de vida.

28

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 23: Desenho esquemático de Giardia. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2 e Giardia intestinalis em montagem corada com tricrômico. Fonte: CDC.

C. Protistas “Sarcodinos” Os protistas conhecidos como “Sarcodinos” (denominação sem valor taxonômico) são por definição aqueles que se locomovem por pseudópodos (Fig.24). Esta definição é falha, uma vez que muitos “sarcodinos” podem exibir flagelos temporariamente e alguns “flagelados” podem emitir pseudópodos. Por isso, em alguns livros vocês podem encontrar a denominação “Sarcomastigophora” se referindo a um filo que englobaria os Sarcodinos e os Flagelados. Pseudópodos são extensões citoplasmáticas temporárias, que servem tanto para o movimento do protista como para englobar partículas para sua alimentação. Existem tipos diferentes de pseudópodos: ? Lobópodos: típicos da maioria das amebas, sendo largos com

extremidade arredondada (Fig. 24); ? Filópodos: Possuem a extremidade afilada, sendo às vezes,

ramificado; ? Reticulópodos: típicos de foraminíferos são filiformes, ramifica-

dos e anastomosados, formando uma pequena rede (retículo); ? Axópodos: típicos de heliozoários são pseudópodos finos, em forma de agulha, irradiando da superfície, com um bastonete central axial constituído de feixe de microtúbulos, o que o torna um filamento rígido.

29

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 24: Desenho esquemático de um membro do filo Rhizopoda. Fonte: Modificado do original de Pearson Scott Foresman.

Filo Rhizopoda Conhecidos popularmente por “Amebas”, os membros deste filo possuem corpo de formato irregular e emitem pseudópodos, que podem ser lobópodos ou filópodos. Alguns Rhizopoda têm sua membrana plasmática coberta por uma teca (“concha”), secretada pelo próprio protista (Arcella) ou feita de material coletado no ambiente (Difflugia). Essas amebas são conhecidas como “amebas tecadas” (Fig.25) enquanto as que não possuem tecas são chamadas de “amebas nuas” (Fig. 26).

Figura 25: Nebela tubulosa, uma ameba tecada. Fonte: Foto: de Proyecto Agua (www.flickr.com/photos/microagua/).

30

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 26: Amoeba proteus, uma ameba nua. Fonte: Foto de Proyecto Agua (http://www.flickr.com/photos/microagua/).

As amebas estão presentes em todos ambientes aquáticos, inclusive no solo úmido. Existem também as amebas comensais e parasitas, algumas de importância médica como a Entamoeba hystolitica. A maioria delas apresenta duas formas: a forma trofozoítica (ou trofozoíto), que é a forma metabolicamente ativa, isto é, a que alimenta e se reproduz; e a forma cística (cisto), que é a forma de resistência. Filo Actinopoda São protistas de simetria esférica ou ovóide que se destacam por possuírem estruturas esqueléticas, que podem ser orgânicas ou inorgânicas. Estes esqueletos podem ser esteticamente muito bonitos, chamando a atenção para os membros deste grupo sempre que são observados em microscópio. Eles emitem pseudópodos finos e em forma de agulha (Axópodos). Cada axópodo contém um bastão axial central, que é recoberto com um citoplasma adesivo e móvel. Algumas espécies podem apresentar filópodos delicados e longos. Seu citoplasma é dividido em duas regiões, o endoplasma e o ectoplasma, que são separados por uma parede composta normalmente de mucoproteínas (Fig. 27).

31

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 27: Actinosphaerium, um heliozoário. Foto: Proyecto Agua (www.flickr.com/photos/microagua/).

Podem ser divididos em três grupos principais: Os radiolários, os acantários e os heliozoários. Os dois primeiros são exclusivamente marinhos, enquanto os heliozoários são mais comuns em água doce. Os radiolários possuem esqueletos silicosos, enquanto os acantários possuem esqueletos de sulfato de estrôncio (Fig. 28). Os heliozoários podem ser nus ou possuírem esqueletos silicosos ou orgânicos (Fig. 29).

Figura 28: Um acantário à esquerda. Fonte: Micro*scope (http://starcentral.mbl.edu/microscope/) Autor: Dave Caron (University of Southern California, Los Angeles). Dois esqueletos de radiolários coloridos por computador à direita. Autor: Mateus Zica. Fig28.jpg

Filo Granuloreticulosa Mais conhecidos como foraminíferos. Esses protistas possuem uma concha de material orgânico, aglutinado ou calcário, que podem ser de câmara única ou com vários compartimentos (Fig. 23). Estas conchas se preservam bem no registro fóssil, por isso são conhecidas 40.000 espécies de foraminíferos, entre atuais e extintas. São bons indicadores paleoecológicos e bioestratigráficos (ver glossário), sendo usados inclusive por geólogos na prospecção de petróleo.

32

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

A concha inteira é preenchida com citoplasma contínuo de uma câmara para outra. Os pseudópodos (reticulópodos) saem de uma abertura ou de perfurações na parede da concha (Fig. 29). Existem foraminíferos com multicâmaras que se parecem com colônias. No entanto, eles são uma única célula. Muitos são grandes o suficiente para serem visíveis a olho nu e podem ser vistos facilmente entre os grãos de areia marinha com uma lupa (Fig. 29). A maioria é bentônica e marinha, existindo também formas planctônicas e sésseis.

Figura 29: O foraminífero Ammonia tépida, emitindo reticulópodos. Fonte: Foto de Scott Fay. Conchas de foraminíferos e outros invertebrados bentônicos. Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration / USA.

D.Filo Ciliophora – “Ciliados” O filo Ciliophora é um dos poucos filos de protistas que pode ser considerado monofilético. Sua característica mais marcante é a presença de cílios pela membrana plasmática, que podem ser usados na locomoção e na captura de alimento. São cerca de 12.000 espécies conhecidas, entre espécies aquáticas de vida livre, comensais e parasitas. Podem ser móveis ou sésseis (Fig. 30), e habitam tanto habitats de água doce, quanto marinhos.

Figura 30: Um ciliado séssil, Stentor sp. Notar que os cílios se concentram na parte apical da célula. Fonte: Protist Image Database.

33

B GC

GLOSSÁRIO

A

E

F

Paleoecologia: Estudo dos ecossistemas de eras geológicas passadas, feitos através de fósseis. Bioestratigrafia: é uma subárea da geologia sedimentar que trata do mapeamento da biota fóssil no tempo e no espaço, para estabelecer a idade de rochas sedimentares entre diferentes localidades.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 31: Um ciliado livrenatante, Paramecium sp. Fonte: Foto de Luis Fernández García.

Eles possuem como os Apicomplexa e Dinoflagellata, um sistema de vesículas logo abaixo da membrana plasmática, chamado sistema alveolar, que contribui para manutenção do formato da célula. Estes filos são conhecidos como “Alveolados” e provavelmente guardam uma relação filogenética próxima. Além deste sistema, possuem um sistema infraciliar, composto de corpos basais ciliares ou cinetossomos, localizado abaixo da superfície ciliar. Apresentam 2 tipos de núcleos: ? Macronúcleo (vegetativo) – relacionado com a síntese de RNA e

DNA; ? Micronúcleo (reprodutivo); relacionado primariamente com a

síntese de DNA. Os ciliados são os melhores nadadores entre os protistas, se locomovendo com maior rapidez e agilidade e com grande capacidade de manobra. O batimento dos cílios não é aleatório, mas ocorre em ondas por toda a célula do protista, com cada cílio realizando um movimento de força e recuperação semelhante ao que ocorre no remo esportivo (Fig. 32).

Figura 32: Desenho esquemático do movimento ciliar. Fonte: Modificado de Nonaka et al. (PloS Biol. 2005 August; 3(8): e268.

34

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

O movimento ciliar pode ser invertido, com o indivíduo se movendo para trás. Em alguns ciliados os cílios podem se juntar formando cirros, que podem funcionar como pequenas “pernas” como em Stylonychia (Fig. 33).

Figura 33: Stylonychia sp., “andando” em uma alga. Fonte: Foto de Keisotyo (http://commons.wikimedia.org /wiki/User:Keisotyo).

Os Ciliados são heterótrofos, podendo ser filtradores, predadores, se alimentam de algas filamentosas e diatomáceas. Independente do tipo de alimentação, ela ocorre em uma estrutura complexa chamada citótosma (boca celular) e a citofaringe (fig.34). Alguns poucos ciliados são parasitos, como o Balantidium coli humano. Outros podem ser simbiontes no intestino de vertebrados como os ungulados.

Figura 34: Desenho esquemático de um ciliado generalizado. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2.

35

Ciências Biológicas

ATIVIDADES Pesquise o processo de conjugação em Paramecium. Compare o processo descrito em livros didáticos de ensino médio com o descrito nos livros textos desta disciplina.

Caderno Didático - 3º Período

Como a maioria dos ciliados é de vida livre, possuem vacúolos contráteis bem desenvolvidos, principalmente nas formas de água doce. Os canais radiais esvaziam seu conteúdo no vacúolo, que contrai e elimina o excesso de água. Possuem dois tipos diferentes de núcleos, com função distinta: um macronúcleo, que controla o funcionamento geral da célula, geralmente poliplóide (com vários grupos de cromossomos) e normalmente grande; um ou mais micronúcleos diplóides, responsáveis pela troca de material genético em um processo conhecido como conjugação. Filo Apicomplexa – “Esporozoários” São um grupo de cerca de 5.000 espécies de protistas, exclusivamente parasitas, caracterizados pela presença de uma combinação de organelas exclusiva chamada de complexo apical (Fig. 35). O complexo apical está envolvido no processo de penetração na célula hospedeira; estruturas como o anel polar e o conóide atuam mecanicamente, enquanto as róptrias e micronemas liberam substâncias químicas.

Figura 35: Desenho esquemático de um Apicomplexa generalizado. Fonte: Modificado de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Franciscosp2.

Os apicomplexa abrigam importantes parasitos para as medicinas humana e veterinária, como os Plasmodium spp., causadores da malária e o Toxoplasma gondii, causador da toxoplasmose. Entre os parasitos de invertebrados, um gênero muito comum é Gregarina, facilmente encontrado no intestino de insetos domésticos como, baratas e tenébrios (Fig.36).

36

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 36: Esquizonte de Plasmodium falciparum dentro de uma hemácia humana. Fonte: Foto de Ernst Hempelmann.O parasito de invertebrados Gregarina sp. Fonte: Foto de Sonja I. Rueckert.

Os apicomplexas possuem em seu ciclo reprodução sexuada e assexuada. O ciclo geral de um apicomplexa tem três estágios básicos: ? Gametogonia: A fase sexuada, com formação de macrogametas

e microgametas, fecundação e formação do oocisto (fig.37); ? Esporogonia: Fase de desenvolvimento do oocisto, a forma de resistência do parasito, ocorre à formação de esporozoítos (formas infectantes) por fissão múltipla; ? Fase proliferativa: Corresponde à fase aguda da doença no

hospedeiro, caracteriza-se pela intensa reprodução assexuada dos parasitos, podendo ser por divisão binária e/ou múltipla.

Figura 37: Oocisto de Toxoplasma gondii. Fonte: CDC.

37

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

REFERÊNCIAS

BRUSCA, R. C.; BRUSCA, G. J. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 1098p. CORLISS, J.O. Biodiversity and Biocomplexity of the Protists and an Overview of Their Significant Roles in Maintenance of Our Biosphere. Acta Protozool., v.41, p.199-219, 2002. HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

38

3

UNIDADE 3 FILO PORIFERA

Os Porifera ou como são mais conhecidas, as esponjas, são animais tão peculiares que os primeiros naturalistas nem consideravam como “animais” e sim como plantas. Só depois que descobriram que estes organismos assimétricos e cheios de poros podiam criar correntes de água entre o seu corpo e o meio ambiente, foram por eles considerados animais. Será que vocês poderiam ser enganados como os antigos naturalistas? Vamos conhecer mais sobre estes organismos.

3.1 INTRODUÇÃO As esponjas (Fig.37), são representantes do filo Porífera, são os animais multicelulares mais simples dentre todos os metazoários. O filo possui cerca de 5.500 espécies descritas, destas somente 150 são encontradas em água doce, as demais são todas encontradas em ambientes marinhos. Nesta unidade, conheceremos melhor estes animais, que, apesar de simples, possuem uma estrutura corporal bastante diferente de outros metazoários. Mas, antes de entrar nos detalhes do filo Porífera, vamos discutir um pouco sobre o surgimento dos metazoários.

Figura 37: Esponjas de diferentes formatos, representantes do filo Porífera. Fonte: Nick Hobgood.

39

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Desvendar a origem dos animais é uma das maiores questões na Zoologia. Devido à inexistência de um registro fóssil do provável ancestral metazoário foram formuladas várias hipóteses a partir do final do século XIX, com os trabalhos do zoólogo Ernst Haeckel. As diversas hipóteses sobre a origem dos metazoários se diferenciam pelos “atores” envolvidos e pela definição das estruturas para o estabelecimento de homologia, isto é, quais estruturas dos possíveis ancestrais protistas (unicelulares) seriam homólogas a quais estruturas dos metazoários (multicelulares). Vamos discutir três das principais hipóteses: 1. Os metazoários surgiram de um organismo protista ancestral dos ciliados atuais, que apresentava uma forma celular sincicial. Assim, através do surgimento de novas membranas internamente, essa célula protista se dividiu, originando uma massa multicelular única. Segundo essa hipótese, os primeiros metazoários seriam semelhantes aos platelmintes atuais (veja unidade 5), com hábito de vida bentônico, e habitando os fundos marinhos primitivos. O principal problema dessa hipótese é que se o primeiro animal fosse realmente um organismo com características semelhantes as dos platelmintes, como teriam surgido organismos mais simples como os poríferos e cnidários? (veja unidade 4). Além disso, essa hipótese não explica a presença de espermatozóides flagelados em metazoários e a simetria radial nos cnidários.

Figura 38: Célula típica de um Porífero, um Coanócito. Fonte: Desenho de Ivy Livingstone / BIODIDAC.

2. Os metazoários surgiram de uma forma flagelada colonial na qual as células se tornaram gradualmente mais especializadas e independentes. De acordo com essa hipótese, os animais descenderam de ancestrais caracterizados por uma colônia esférica de células flageladas ocas. As células individuais dentro da colônia tornam-se diferenciadas para papéis funcionais específicos. O ancestral seria um organismo flagelado colonial e semelhante às larvas plânulas de cnidários. Atualmente essa é a hipótese mais aceita devido a várias evidências que a corroboram, como a existência de organismos que seriam bem semelhantes aos possíveis ancestrais, aos Coanoflagelados e às larvas plânulas, à existência de espermatozóides flagelados nos metazoários, os coanócitos (Fig. 38)

40

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

em poríferos e mais recentemente evidencias filogenéticas moleculares baseadas no RNA ribossômico e em similaridades de vias bioquímicas complexas. 3. Alguns zoólogos preferem a ideia de que os metazoários tiveram uma origem polifilética, assim os poríferos, os cnidários e os outros animais evoluíram independentemente. Os poríferos teriam surgido a partir de uma colônia de zooflagelados (ver unidade 2). Os cnidários teriam surgido a partir de uma colônia de protistas amebóides, e os demais animais a partir de um protista ciliado mulinucleado. 3.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS O nome Porifera significa portador de poros (Fig.39), realmente seus representantes, as esponjas, possuem um grande número de poros e canais que formam um sistema de filtragem/alimentação adequado para seu hábito de vida séssil. São animais que dependem de correntes de água que entram para o interior dos canais e trazem alimento e oxigênio, e levam para fora do corpo os restos metabólicos a as excretas.

Figura 39: Grupo de esponjas mostrando vários poros de saída (Ósculo) de água e outras partículas. Fonte: Foto de Albert Kok.

As esponjas não possuem nenhum órgão ou tecido verdadeiro, e até mesmo suas células mostram um certo grau de independência, não possuem um sistema nervoso ou órgãos dos sentidos. Por todas essas características, são denominadas como Parazoários, ou seja, um grupo paralelo ao metazoa. As esponjas variam em tamanho desde alguns milímetros até 2 m de diâmetro, podem apresentar formas, cores e diversas (Fig.40). Muitos animais (caranguejos, moluscos, ácaros e peixes) vivem como comensais ou parasitas dentro ou sobre as esponjas, principalmente nas esponjas maiores.

41

B GC

GLOSSÁRIO

A

E

F

Um organismo sincicial apresenta vários núcleos que não estão separados por uma membrana plasmática.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 40: Exemplos de esponjas com diferentes formas e cores. Fonte: Denis Barthel.

3.2.1. Estrutura corporal e função O corpo de um porífero é pouco mais que uma massa de células embebidas em uma matriz gelatinosa, enrijecido por um esqueleto de espículas de carbonato de cálcio, sílica ou colágeno. Essa estrutura circunda um sistema peculiar de canais hídricos, no qual as únicas aberturas corpóreas são seus minúsculos poros de entrada conhecidos como óstios, e os poros de saída, chamados de ósculos (Fig. 41). Essas aberturas são conectadas por um sistema de canais que podem apresentar células flageladas com colarinho, denominadas coanócitos (Fig.38). Essas células formam uma corrente de água que entra pelos óstios e saí pelo ósculo. Os coanócitos além de manter a corrente de água, capturam e fagocitam as partículas alimentares que são trazidas pela água.

Figura 41: Estrutura da parede de uma esponja asconóide. As setas indicam a direção da corrente de água. Fonte: Modificado de Xvazquez and Lilyu.

42

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Dentro do corpo das esponjas, as células são organizadas de uma maneira frouxa em uma matriz gelatinosa denominada mesohilo (Fig.5). Nele são encontradas várias células amebóides, fibrinas e espículas esqueléticas. Tipos celulares encontrados no mesohilo (ver Fig.41): ? Pinacócitos: são células achatadas que cobrem a superfície externa e parte das superfícies inferiores, formando a pinacoderme. As células secretam um material de fixação da esponja no substrato. Alguns pinacócitos são modificados em miócitos contráteis e auxiliam na regulação da entrada de água pelos óstios; ? Coanócitos: são células ovóides com uma extremidade embebi-

da no mesohilo e a outra exposta. A região exposta tem contato com a água e possui um flagelo circundado por um colarinho (Fig. 38). O batimento do flagelo empurra a água através do colarinho em forma de peneira. As partículas que ficam retidas no colarinho são fagocitadas pela célula e posteriormente passadas para células amebócitas vizinhas para que ocorra a digestão intracelular. Os coanócitos revestem os canais e as câmaras flageladas que se ligam com os poros de entrada de água; ? Arqueócios (amebócitos): células amebóides que se localizam

no mesohilo. São responsáveis por uma série de funções como fagocitar partículas na pinacoderme e receber partículas dos coanócitos para digestão, substituir e formar outros tipos celulares, como os esclerócitos (que secretam as espículas), os espongiócitos (que secretam as fibras de espongina), e os colêncitos (que secretam o colágeno fibrilar). Tipos de estrutura (Fig.42): ASCON — mais simples — forma tubular, espongiocele flagelada; SICON — dobramento da parede do corpo, canais flagelados; LEUCON — alto grau de dobramento da parede do corpo – formas variadas, câmaras flageladas. ? A superfície da esponja ascon é perfurada por muitas aberturas

pequenas, chamadas óstios (ou poros incorrentes), de onde deriva o nome porífera (portador de poros). Esses poros abrem-se dentro da cavidade interior, a espongiocele (Átrio), que por sua vez abre-se para o exterior através do ósculo. Uma grande abertura no topo do tubo. Urna corrente de água constante passa através dos poros para o interior do átrio e sai pelo ósculo.

43

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 42: Tipos de estrutura corporal dos Porifera. Fonte: Modificado de Ewan ar Born.

FISIOLOGIA ? Nutrição: filtradores. Os coanócitos estabelecem fluxo de água fagocitando bactérias e outras partículas. As partículas alimentares são transferidas por amebócitos e coanócitos às outras células; ? Digestão intracelular, os detritos oriundos da digestão e excreção

são levados pelo fluxo d’água; ? Trocas gasosas e excreção: difusão; ? A osmorregulação é realizada pelos vacúolos contráteis em

esponjas de água doce; ? Não existe sistema nervoso.

REPRODUÇÂO ? Assexuada; ? Brotamento (externo); ? Gemulação (brotos internos); ? Regeneração (fragmentos maiores que 0.4 mm); ? Sexuada; ? Formação de gametas através de coanócitos e arqueócitos,

organismos normalmente monóicos; ? Organismos vivíparos ou ovíparos.

3.2.2. Classificação dos Porifera: As esponjas são um grupo antigo, com seu registro fóssil abundante se estendendo desde o Cambriano. Os poríferos atuais são distribuídos em três classes: Calcarea (fig. 43), Hexactinellida (fig. 44) e Demospongiae (fig.45). Para diferenciação entre as classes são utilizadas características esquéticas das espículas, morfologia externa, histologia e dados ecológicos (ver Tab 2).

44

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Tabela 2: Características distintivas das três classes pertencentes ao filo Porífera; Calcarea, Hexactinellida e Demospongiae.

Figura 43: Clathrina clathrus, uma esponja da classe Calcarea. Fonte: Foto de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Esculapio. e Figura 44: Esqueleto de uma esponja Hexactinellida não identificada, sobre conchas de cauris. Fonte: Foto de http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Malte.

A classe Demospongiae é a mais comum, representa 95% das esponjas e é a única classe do filo Porífera que conseguiu conquistar o ambiente dulcícola. Na água doce são encontradas fixadas em talos de plantas aquáticas, madeira ou rocha em lagoas e riachos (Fig. 44). As Demospongiae marinhas são bastante variadas possuem cores vivas e formas bem interessantes.

45

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 45: Uma demospongiae, a esponja de água doce, Spongilla lacustris, do rio Columbia no estado de Washington, USA. Fonte: Foto de Kirt L. Onthank.

? Certamente uma razão para o sucesso das esponjas como um

grupo se deve ao fato de possuir poucos inimigos naturais. O que se deve à grande quantidade de compostos químicos impalatáveis secretados por esses animais, além da armação esquelética.

REFERÊNCIAS HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

46

4

UNIDADE 4 FILOS CNIDARIA E CTENOPHORA

Os Cnidaria e Ctenophora são animais na sua maioria marinhos e que possuem simetria radial, o que os destaca dentro dos metazoários. Entre eles estão animais bem conhecidos dos banhistas das praias brasileiras, as águas-vivas, que eventualmente “queimam” banhistas desavisados. Além disso, alguns são tão abundantes que formam acidentes geográficos, como os recifes de corais. Vamos entrar no mundo destes animais de uma simplicidade fascinante. 4.1 INTRODUÇÃO

Os Cnidaria e Ctenophora são considerados os filos mais basais dentro dos Eumetazoa. Considera-se Eumetazoa todos os Metazoários que apresentem organização corporal ao menos no nível tecidual. Portanto, ao contrário dos Porifera e outros filos menores como Orthonectida e Rombozoa, a partir de Cnidaria todos os animais apresentarão epitélios e outros tipos de tecidos. Um epitélio é um tecido composto por uma ou mais camadas celulares, onde as células estão intimamente conectadas umas as outras por meio de zonas de aderência, assentando-se e fixando-se sobre uma camada de substância extracelular amorfa denominada lâmina basal. Os epitélios apresentam pouca substância intercelular e revestem as cavidades do corpo e a superfície exterior do animal. Portanto, dois tipos de folhetos embrionários evoluem na base dos Eumetazoa, sendo conservados como tecido único dos Cnidaria e Ctenophora (ambos diblásticos). O ectoderma, que reveste a superfície externa do animal e o endoderma, que reveste a cavidade interna (gastroderme). Aqui, pela primeira vez, aparece uma cavidade gástrica onde ocorre, primeiramente, digestão extracelular (autapomorfia dos eumetazoa). Evolutivamente, o aparecimento dos epitélios permitiu um maior controle e independência do meio interno com relação ao meio externo. Com isso, o aparecimento dos tecidos promoveu um aumento da homeostase interna, possibilitando a evolução de outros sistemas teciduais com funções cada vez mais específicas. Uma outra característica marcante dos Eumetazoa é o aparecimento de simetria que, na base dos Eumetazoa (Ctenophora e Cnidaria) e em alguns organismos primariamente sésseis, como os Echinoderma (fig.46), é radial. Com as devidas excessões (ver exemplo na fig.46), todos os metazoários mais derivados que os Cnidaria e Ctenophora (que na evolução apareceram posteriormente a esses grupos) são triblásticos e apresentam simetria bilateral.

47

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Alguma discussão existe a respeito da condição presente nos Porifera. Dado que as larvas de Porifera possuem simetria, alguns pesquisadores hipotetizaram que eles pudessem ser organismos simétricos degenerados (organismos que perderam, secundariamente, a simetria). No entanto, simetria parece estar relacionada intimamente com o aparecimento dos tecidos. Considerar que os Poríferos, além da simetria, perderam a condição tecidual exige muitas explicações (especulações) adicionais (ad hoc). Além do mais, dados morfológicos e moleculares não têm dado suporte a essa hipótese.

Figura 46: Uma estrela do mar, exemplo de animal com simetria radial. Fonte: Foto de Amaury Borneo.

Em livros nem tão antigos sobre zoologia, não era incomum vermos os filos Cnidaria e Ctenophora agrupados em um superfilum denominado Radiata. Isso devido ao fato de que ambos os filos possuem simetria radial no seu plano basal. No entanto, um grande volume de dados tem questionado a monofilia dos Radiata e suportado hipóteses distintas dessa. Com isso, o nome Radiata vem sendo abandonado pela maioria dos livros texto de zoologia. 4.2 FILO CNIDARIA Os Cnidários são organismos diblásticos, apresentando um ectoderma e um endoderma separados por uma mesogléia acelular ou um mesênquima celular, dependendo do grupo taxonômico em questão. É quase que um consenso geral de que nem a mesogléia, nem o mesênquima sejam homólogos ao mesoderma. Ao redor de um eixo oral-aboral, os Cnidários apresentam simetria primariamente radial, secundariamente birradial ou tetrarradial.

48

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Uma das características marcantes dos Cnidários (autapomorfia para o grupo) é a presença de estruturas urticantes de defesa, ou captura de alimentos denominados cnidae ou nematocistos, localizados na epiderme e, em alguns grupos, também na gastroderme. Daí o nome dos cnidários. Os nematocistos ou cnidae são produzidos no interior de células denominadas cnidoblastos. Uma vez que a cnida está completamente formada, a célula recebe o nome de cnidócito ou nematócito. É interessante saber que existe a hipótese de que os nematócitos tenham evoluído por associação simbiótica entre protistas e o grupo de metazoários que deu origem aos Cnidários, dado que alguns flagelados, esporozoário e microsporídeos, apresentam estruturas similares às cnidas. Um cnidócito é composto por um cnidocílio sensorial e uma estrutura eversível, contendo o flagelo, no interior de uma cápsula, o nematocisto (fig.47). O estímulo do cnidocílio promove um aumento abrupto da pressão osmótica no interior do nematocisto e a eversão do cnidocílio. Com a descarga do nematocisto, um novo cnidócito deve ser produzido.

Figura 47: Esquema do cnidócito carregado e descarregado. Fonte: Ivy Livingstone / Biodidac.

A musculatura de um Cnidaria é formada por células mioepiteliais, derivadas dos epitélios ectodérmicos e gastrodérmicos. O sistema nervoso é intraepitelial e difuso (não há um único centro nervoso controlador), concentrados em anéis nervosos em pólipos e medusas. Embora, tenha sido observada, em alguns casos, uma sinapse unidirecional, os neurônios são apolares (o impulso ocorre nos dois sentidos da célula) e sem bainha de

49

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

mielina. Os transmissores sinápticos em Cnidaria são: IMRFamida, norepinefrina e serotonina. Acetilcolina está presente somente nos Anthozoa (também em Ctenophora e Bilateria) mas, aparentemente, não possui função sináptica. A respiração, excreção e circulação ocorrem por difusão. Células reprodutivas de origem ecto- ou endodérmica são geralmente liberadas no meio externo. A fecundação pode ser interna ou externa. Larva plânula, ciliada, aparece no plano basal do grupo. Basicamente existem dois tipos morfológicos. O polipóide séssil e o meduzóide livre-natante (fig.48).

Figura 48: As duas formas básicas dos cnidários, o pólipo séssil e a medusa móvel. Fonte: Desenhos de Ivy Livingstone / Biodidac.

Um pólipo apresenta aspecto de um saco ou tubo cujas paredes são constituídas por ectoderma e endoderma, separadas por uma delicada (nos hidrozoários polipóides) ou espessa (antozoários) camada de mesogléia. Na extremidade basal, encontra-se um disco achatado, ou contendo inúmeras invaginações (nos corais verdadeiros), pelo qual o animal se conecta ao substrato. Na extremidade oposta o tubo cilíndrico sofre atenuação, formando o hipóstomo (onde se abre a boca). Ao redor da boca encontramse tentáculos sólidos ou ocos (continuação da gastroderme em Anthozoa). Em Anthozoa, um tubo estende-se para o interior da cavidade gastrodérmica, formando uma espécie de faringe. Nesses organismos, a cavidade gastrovascular é dividida por inúmeros septos denominados mesentérios (não homólogo ao mesentério dos organismos celomados). Uma medusa é a forma pelágica dos Cnidaria (fig.49). O corpo apresenta uma margem aboral (oposto à boca) convexa e uma região oral dilatada em um disco côncavo (umbrela) de cujo centro pende um tubo cilíndrico (o manúbrio), na extremidade da qual a boca se abre. Os tentáculos distribuem-se na margem da umbrela. A região delimitada pelas margens da região oral é denominada cavidade subumbrelar. Em algumas medusas

50

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

como as da classe Hydrozoa, uma parede muscular e circular, o véu ou velum, estende-se para o interior da cavidade subumbrelar. A mesogléia pode ser delgada e acelular, como nos Hydrozoa, ou espessa e celular, com formas amebóides, nos Scyphozoa.

Figura 49: Estrutura geral de uma medusa. Fonte: Modificado de Mariana Ruiz Villarreal.

4.2.1 Evolução Muito, tem-se discutido sobre a forma ancestral dos Cnidários (medusa ou pólipo?). Alguns autores consideram os hidrozoários e scifozoários (ambos primariamente meduzóides) os grupos mais primitivos. Nesses, os pólipos seriam uma especialização larval/juvenil. Outros autores consideram a forma polipóide como sendo o caráter ancestral para os Cnidários, enquanto a forma meduzóide ocuparia a condição de caráter apomórfico dentro do filo. Uma relação de grupo irmão (maior proximidade filogenética) entre a classe Anthozoa e Medusozoa (todas as demais classes de Cnidaria; todas primariamente meduzóides) é suportada por vários caráteres e indica que a forma polipóide tenha aparecido primeiro dentro dos Cnidaria (apomorfias são seguidas pelas plesiomorfias que estão entre parêntesis): Nematocistos nos Medusozoa possuem opérculo (sem opérculo nos Anthozoa), Cnidocílio não móvel nos Medusozoa, provavelmente devido à fusão de vários cílios (móvel, formado por um único cílio nos Anthozoa), simetria birradial nos Anthozoa, com faringe ectodérmica (simetria radial nos Medusozoa).

51

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

4.2.1 Classificação dos Cnidaria 4.2.1.1 Classe Hydrozoa Organismos polipóides e meduzóides, geralmente marinhos, havendo alguns representantes de água doce (fig.50). A maioria das 3200 espécies de hidrozoários possui tanto formas polipóides quanto meduzóides em seu ciclo de vida. Quando polipóides, podem ser coloniais (maioria) ou não. Nas formas coloniais os pólipos dão origem a formas meduzóides reprodutoras e livre-natantes (alternância de gerações). Os pólipos são polimórficos morfológica e funcionalmente (gastrozóides para a digestão, dactilozóides para defesa e captura de presas e gonozóides para a reprodução) nas formas coloniais e estão interconectados pelo celênteron (homólogo à cavidade gastrovascular das formas não coloniais). As formas meduzóides possuem velum, canal circular, mas não possuem ropálio. As cnidas são epidérmicas nos hidrozoários e a maioria dos Hydrozoa possui sexo separado. Os gametas surgem da epiderme. A fecundação é normalmente interna, não havendo cópula. Os machos liberam o esperma na água. As formas polipóides podem possuir uma cutícula quitinosa ou de carbonato de cálcio (hidrocorais).

Figura 50: Hydra vulgaris, um hidrozoa de água doce. Fonte: Foto de Stephanie Guertin.

4.2.1.2 Classe Scyphozoa Cerca de 200 espécies exclusivamente marinhas. Medusas geralmente livres e de grande porte (fig. 51). A cavidade gástrica é percorrida por filamentos delicados que provavelmente possuem função digestiva. Formas polipóides são pequenas e inconspícuas. Algumas formas não possuem pólipo. As medusas se formam por divisão assexuada (estrobilação do pólipo). As bordas da umbrela são lobadas, apresentando tentáculos e

52

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

órgãos do sentido. Elas não possuem velum e o manúbrio prolonga-se em longos braços orais. Os gametas são produzidos na gastroderme. Nematócitos presentes na ectoderme e gastroderme, geralmente sem canais circulares.

Figura 51: Uma medusa Scyphozoa, do rio Guadiana, Vila Real de Santo António, Portugal. Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/User:BuzzWoof.

4.2.1.3 Classe Anthozoa Com cerca de 6500 espécies, são os cnidários conhecidos como anêmonas e corais verdadeiros. Exclusivamente marinhos, com formas solitárias ou coloniais, não apresentam fase meduzóide. Tentáculos em número de oito ou múltiplos de seis (fig.52). Nematócitos presentes na gastroderme e epiderme. Gastroderme dividida por mesentérios. Em suas extremidades aborais, os mesentérios possuem cordões mesentéricos, faringe perfurada por um ou mais sulcos flagelados (sifonóglifo). Mesogléia é espessa. Os pólipos podem reproduzir-se de forma sexuada ou assexuada. Gametas surgem na gastroderme.

Figura 52: O coral Tubastraea faulkneri, um antozoário. Fonte: Foto de Nick Hobgood.

53

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

4.2.1.4 Classe Cubozoa Marinhos, quase todas as espécies são tropicais ou subtropicais. Extremamente tóxicas. Pólipos produzem medusa por metamorfose completa, sem estrobilação. Corpo quase quadrangular em corte transversal. A margem do sino dobra-se para o interior da cavidade subumbrelar, formando uma estrutura análoga ao velum, o velarium. Tentáculos interradiais ocos (um de cada ângulo do corpo) pendem de estruturas em forma de lâmina denominadas pedálias (fig.53).

Figura 53: Um cubozoa, conhecido como “vespa do mar”. Fonte: Foto de autor desconhecido, disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Chinorex_fleckeri.jpg.

4.3 FILO CTENOPHORA Constitui-se juntamente com os Bilateria, um grupo mais derivado dentro dos Eumetazoa reconhecido como Acrossomata por alguns autores, devido ao fato de que os membros desse grupo possuem um único e grande acrossomo, na região anterior do corpo do esperma. Embora exista alguma divergência a respeito, muitos autores classificam os Ctenophora como triblásticos (organismos com ecto-, endo- e mesoderma), sendo a mesoderme uma mesogléia ou muscular. Os Ctenophora apresentam somente algumas similariades superficiais com os Cnidários; notadamente uma simetria radial ou birradial, um corpo gelatinoso (fig.54), sistemas de canais gastrodérmicos e, como alguns Cnidários, bioluminescência. No entanto, divergem grandemente dos Cnidários por locomoverem-se por meio do

54

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

batimento sincronizado de feixes de cílios compostos distibuídos em faixas longitudinais ao longo do corpo. Além do mais, os Ctenophora possuem uma estrutura, usada na defesa e captura de presas, denominada coloblasto. Os nematocistos são complexas organelas intracelulares. Já os coloblastos não possuem qualquer tipo de estrutura ejetável. O que se vê na cabeça das células do coloblasto são pequenos grânulos periferais contendo substância mucosa pegajosa. Os coloblastos não apresentam qualquer similaridade ontogenética ou mesmo superficial com os cnidoblastos, o que inviabiliza qualquer hipótese de homologia entre essas estruturas. São formados continuamente pelas células ectodérmicas da região basal dos tentáculos.

Figura 54: O ctenóforo Bathocyroe fosteri Fotne: Foto de Marsh Youngbluth / U.S. N.O.A.

REFERÊNCIAS BRUSCA, R. C.; BRUSCA, G. J. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 1098p. HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

55

ATIVIDADES Existem milhares de belas fotos de recifes de corais na internet. Visite o Google imagens e procure por corais ou “coral reefs” e veja as imagens. Procure diferenciar dentro das imagens os diferentes organismos que você já conhece: Anêmonas, corais, e esponjas.

5

UNIDADE 5 PLATYHELMINTHES

Depois de estudar os animais diblásticos (com dois folhetos embrionários), iniciaremos os estudos dos triblásticos. Um novo folheto derivado do endoderma surge sendo chamado mesoderma. A presença de um novo folheto embrionário vai se traduzir em uma maior complexidade corporal. O grupo dos animais triblásticos, também é chamado de Bilateria, possui simetria bilateral, diferente dos diblásticos (Cnidaria e Ctenophora) que possuem simetria radial. Alguns Bilaterias vão exibir simetria radial, como os equinodermos, mas mesmo estes se originam de antepassados bilaterais. A simetria bilateral tem um grande impacto no desenvolvimento dos animais; como os animais passam a explorar o ambiente em somente uma direção, os órgãos dos sentidos e o sistema nervoso começam a se concentrar na parte anterior do corpo (apical). Este processo se chama cefalização. Os animais de simetria radial exploram o ambiente em todas as direções e apresentam um sistema nervoso difuso. Os Acelomados são animais pouco complexos, não possuindo nenhuma cavidade corporal interna além do tubo digestivo (alguns nem tubo digestivo têm!). Esta divisão pela presença de cavidades corporais é útil e didática para o estudo dos animais. A presença de compartimentos e cavidades corporais aumenta a possibilidade de órgãos mais complexos e sistemas. Iniciaremos nosso estudo dos acelomados pelo seu grupo mais importante, os platelmintos. 5.1 CARACTERÍSTICAS GERAIS Os membros do filo Platyhelminthes são conhecidos popularmente como “vermes chatos”, porque a maioria deles possui corpo achatado dorso-ventralmente (fig.55). Entre as 20.000 espécies conhecidas deste filo estão importantes parasitos humanos e dos animais, como os Schistosoma spp., causadores das esquistossomoses, as Taenias spp. são causadoras da teníase e da cisticercose. Dividem-se em quatro classes, sendo três parasitas (Trematoda, Monogenea e Cestoda) e uma predominantemente de vida livre (Turbellaria). Comparados com os táxons estudados até o momento, os platelmintos exibem vários dos mais importantes avanços encontrados no reino animal.

56

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 55: Desenho esquemático de um Turbellaria, mostrando os sistemas nervoso e digestivo. Fonte: Modificado de Andreas Neudecker.

São os primeiros animais que apresentam três folhetos germinativos, além do ectoderma e endoderma. Vão apresentar um novo folheto germinativo originado da diferenciação do endoderma, chamado mesoderma. Todos os animais após os platelmintos vão possuir três folhetos germinativos e serão chamados de animais triblásticos. Os platelmintos também são os primeiros a exibir simetria bilateral na fase adulta. Na simetria bilateral somente um plano divide o corpo do animal em duas partes, uma imagem no espelho da outra (fig. 56). Este plano é chamado de plano sagital.

Figura 56: A mosca Eristalis alleni, mostrando o plano sagital dividindo seu corpo em duas partes. Fonte: USDA.

O surgimento da simetria bilateral acarreta uma mudança na posição dos órgãos dos sentidos, que passam a se localizar na parte anterior do animal, uma vez que este, possuindo polarização corporal anterior e posterior, passa a explorar o ambiente em um sentido somente, diferente dos animais com simetria radial, que exploram o ambiente em todos os sentidos.

57

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

A concentração dos órgãos dos sentidos e do sistema nervoso na parte anterior do corpo do animal é chamada de cefalização. Os platelmintos possuem um sistema nervoso cefalizado, possuindo um gânglio cerebral anterior, de onde partem quatro cordões nervosos longitudinais que se interconectam. Os platelmintos não possuem nenhuma cavidade corporal além do tubo digestivo (que alguns nem possuem!), sendo chamados por isso de acelomados. Não possuem também nenhum tipo de sistema circulatório ou respiratório especializado, todo transporte de nutrientes e as trocas gasosas são feitas por difusão. As substâncias só podem ser transportadas por difusão em pequenas distâncias, por esse motivo estes vermes são sempre achatados ou muito pequenos. O espaço corporal entre a epiderme e o tubo digestivo será preenchido por um tecido de origem mesodérmica, chamado parênquima (fig.57).

Figura 57: Corte longitudinal de uma planária. Fonte: Modificado de Ivy Livingstone/Biodidac.

Os platelmintos que possuem tubo digestivo não apresentam ânus, e os seus dejetos são eliminados pela boca ou em ânus temporários, como ocorre em platelmintos de intestino muito ramificado como os Polycladidas. Sua excreção é realizada por protonefrídios, estruturas que são compostas por células ciliadas chamadas células flamas, que coletam os dejetos nitrogenados, direcionando para canais que desembocam em poros no corpo do animal. 5.1.1 Classificação dos Platyhelminthes 5.1.1.1 Classe Turbellaria Os turbelários são conhecidos popularmente como planárias e são um grupo de platelmintos primariamente de vida livre (não parasitas). A maioria das 4.500 espécies de turbelários é marinha, mas possui espécies de água doce e terrestres, sendo que a maioria dos terrestres habita margens de corpos d’água. Sua epiderme é celular e ciliada, possuindo inúmeras células produtoras de muco. Seu deslocamento é resultado de movimentos musculares e deslizamento através do movimento ciliar no muco (fig.58).

58

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 58: Corte do epitélio de uma planária (Ordem Tricladida) demonstrando o epitélio celular e os cílios. Fonte: Foto de Jon Houseman (Biodidac)

Este batimento ciliar provoca redemoinhos visíveis na água, causando os “turbilhões” que deram nome a classe. Além do modo de movimentação por rastejamento, alguns turbelários, especialmente os da ordem Polycladida, podem nadar ativamente na coluna d’água ondulando as bordas da sua superfície corporal, em um movimento semelhante às ondulações das barbatanas de peixes (fig.59).

ATIVIDADES Figura 59: O Polycladida Pseudoceros dimidiatus, mostrando as ondulações na borda da superfície corporal. Fonte: Foto de Richard Ling.

A maioria dos turbelários é predador ou saprófago, se alimentando de qualquer tipo de matéria orgânica animal disponível. Uns poucos são herbívoros ou se alimentam de algas. Alguns turbelários podem ser comensais, se aderindo à superfície de algum organismo aquático maior, como insetos aquáticos e crustáceos (ex: gênero Temnocephala). O sistema digestivo dos Turbelários é formado por uma boca e uma faringe que leva a

59

Os Polycladidas são os platelmintos mais coloridos. Confirme isso fazendo uma busca de imagens no Google com a palavra Polycladida ou polyclads (Policládidos em inglês).

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

um intestino incompleto, isto é, sem ânus. A faringe pode possuir glândulas produtoras de muco, para facilitar a ingestão, ou até mesmo enzimas proteolíticas, para iniciar a digestão. A faringe vai variar morfologicamente dentro do grupo, dependendo do modo de alimentação. Algumas são tubulares simples, outras podem se projetar para fora do corpo e até capturar pequenas presas. As planárias do gênero Dugesia apresentam uma faringe ventral que se projeta para a fora do corpo (fig. 60).

Figura 60: A planária do gênero Dugesia exibindo sua faringe ventral. Fonte: Desenho de Ivy Livingstone / Biodidac.

O formato do intestino dos turbelários vai variar de acordo principalmente com o tamanho do corpo, os turbelários pequenos tendem a apresentar intestinos simples, no formato de saco, enquanto as formas grandes como os Tricladida (planárias) e os Polycladida, tendem a apresentar intestino ramificado (fig.32). Os turbelários são hermafroditas, possuindo sistemas reprodutores masculinos e femininos completos, de morfologia diversa entre as espécies. Por exemplo: podem ter testículos únicos, em pares ou múltiplos. Estas diferenças são importantes na taxonomia dos Turbelários. Apesar de hermafroditas, a fecundação é cruzada, normalmente com fecundação simultânea, isto é, os dois transferem espermatozóides um para o outro e os dois vão colocar ovos. Os ovos fecundados ou zigotos são armazenados no útero ou desovados imediatamente. Dentro desse Filo, a evolução selecionou organismos que investissem em uma pequena quantidade de zigotos, cujo desenvolvimento ocorra de forma direta (sem a fase de larva). Os turbelários possuem uma grande capacidade de regeneração tecidual, podendo se reproduzir por fragmentação, com cada parte fragmentada dando origem a um novo indivíduo.

60

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

5.1.1.2 Trematoda As classes restantes de platelmintos, os Trematoda, Monogenea e Cestoda, são predominantemente parasitas, ao contrário de Turbellaria. Começaremos estudando os trematódeos. Os trematódeos, chamados de Flukes em inglês, são uma classe de platelmintos parasitos de grande importância médico-veterinária. Nesta classe, encontram-se os vermes do gênero Schistosoma, causadores da esquistossomose, uma das grandes endemias tropicais. Na área de veterinária existem vários parasitos como Fasciola hepatica, causadora da Fasciolose bovina, motivo de prejuízos na pecuária. Os trematódeos, assim como as outras classes parasitas dos platelmintos, vão apresentar uma epiderme modificada chamada de tegumento. O tegumento tem uma estrutura complexa e possui várias camadas, podendo ser totalmente sincicial ou celular. Os sincícios são estruturas semelhantes a uma célula gigante multinucleada, diferente da maioria dos tecidos, formados por células mononucleadas (fig.38). Em um animal endoparasita (parasitas internos) como os Trematoda, uma epiderme sincicial pode fornecer uma barreira mais eficiente contra as defesas do hospedeiro, uma vez que não existem espaços intracelulares como nos tecidos convencionais.

Figura 61: Desenho esquemático do tegumento de um trematódeo, onde se vê: A. Camada superficial sincicial; B. Camadas musculares, longitudinal e circular; C. Camada de células mergulhadas no parênquima e ligadas a camada sincicial por prolongamentos citoplasmáticos. Fonte: Modificado de Ivy Livingstone/Biodidac.

61

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Os Trematoda se alimentam de fluídos e tecidos dos hospedeiros, algumas espécies se alimentam do conteúdo intestinal destes. A comida é levada para o intestino por bombeamento, graças à faringe muscular. No intestino que pode ser em formato de saco ou ramificado, ocorre à digestão, parte extracelular e parte intracelular. Seu mecanismo de excreção é semelhante ao dos turbelários, através de protonefrídios. A maioria dos trematódeos é hermafrodita, mas como os turbelários, geralmente se reproduzem por reprodução cruzada mútua. A localização e o formato dos órgãos reprodutivos são muito importantes na taxonomia destes vermes. Alguns como Schistosoma, possuem sexos separados e dimorfismo sexual. São vermes altamente fecundos, colocando 100.000 vezes mais ovos que um turbelário de vida livre. Isso se deve à necessidade destes vermes de se dispersarem no ambiente, aumentando a chance destes alcançarem um hospedeiro adequado. Os Trematoda possuem um ciclo heteroxeno, isto é, com dois ou mais hospedeiros. O hospedeiro definitivo é um vertebrado e o intermediário é um invertebrado, na maior parte das vezes um molusco. Pode haver mais hospedeiros, mas obrigatoriamente haverá as duas fases acima. Neste trabalho usaremos o ciclo do Schistosoma mansoni, como exemplo (fig.62).

Figura 62: Ciclo do Schistosoma mansoni. Fonte: Modificado de figura do CDC por http://commons.wikimedia. org/wiki/User:EuTuga.

O Schistosoma mansoni habita o sistema porta-hepático humano (sistema de veias que ligam o fígado e o intestino), se alimentando de sangue. O casal de S. mansoni, logo após a cópula migra para as veias mesentéricas e fazem a oviposição na parede do intestino. Estes ovos atravessam a parede intestinal e caem na luz intestinal, sendo eliminados pelas fezes e ganhando o meio ambiente. Uma vez no ambiente, estes ovos têm de alcançar um corpo d’água para que possam eclodir. Quase todos os trematódeos estão associados à habitats de água doce, porque seus hospedeiros intermediários são em sua maioria gastrópodos (caramujos) dulcícolas, mas alguns podem

62

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

ser transmitidos por caramujos terrestres ou outros moluscos, como alguns bivalves (mariscos). Uma vez que os ovos conseguem alcançar a água, eclode uma larva ciliada chamada miracídio (fig.63), que obrigatoriamente tem de encontrar um caramujo na água para completar seu ciclo. No caso de S. mansoni, são caramujos do gênero Biomphalaria. Os miracídios penetram na pele do caramujo e passam por várias fases (esporocisto, rédia), até o momento que se transformam em cercárias (fig.63) que deixam pouco a pouco o caramujo.

Figura 63: Ovo de Schistosoma haematobium, exibindo um miracídio dentro dele por transparência e uma cercaria de S. mansoni.

As cercárias nadam com o auxílio de sua cauda, procurando seu hospedeiro definitivo, o homem. Quando encontram um ser humano penetram na sua pele e ganham a corrente sanguínea, perdendo sua cauda neste processo. Uma vez na corrente sanguínea as cercárias se transformam em esquistossômulos que migram para o sistema porta-hepático e se transformam em adultos. Os ciclos dos trematódeos envolvem basicamente estas fases descritas para Schistosoma. 5.1.1.3 Monogenea Os Monogenea são, em sua maioria, parasitos externos (ectoparasitos) de peixes, parasitando principalmente a pele e as brânquias. Alguns parasitam outros vertebrados aquáticos como sapos (Protopolystoma) e um parasita hipopótamo (Oculotrema hippopotami).

ATIVIDADES

Diferenciam-se dos Trematoda por exibirem ciclo direto (com somente um hospedeiro) e por possuírem uma série de estruturas de fixação, como ganchos, ventosas musculares e glândulas adesivas. Estas estruturas estão presentes na parte anterior do verme, formando o que chamamos haptor e na parte posterior, formando o opistaptor (fig. 64).

Procure o ciclo dos trematódeos Fasciola hepatica e Eurytrema spp. e compare com o ciclo do Schistosoma mansoni. Existem mais semelhanças ou diferenças?

63

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 64: O Monogenea Neopolystoma fentoni parasito de tartarugas. Fonte: PLATT, Thomas R. Neopolystoma fentoni n. sp. (Monogenea: Polystomatidae) a parasite of the conjunctival sac of freshwater turtles in Costa Rica. Mem. Inst. Oswaldo Cruz [online]. 2000, vol.95, n.6 [cited 2009-09-28], pp. 833-837.

Sua alimentação, tegumento e excreção se assemelham aos dos trematódeos. A reprodução também se assemelha, exceto pela simplicidade do ciclo, como pode ser visto na fig.65. Os adultos liberam os ovos na água, estes eclodem liberando uma larva ciliada chamada oncomiracídio, que é livrenatante e procura ativamente um novo hospedeiro. Encontrando este hospedeiro os oncomiracídios se fixam e se desenvolvem em adultos.

Figura 65: Ciclo geral de um Monogenea. Fonte: Modificado de Publication FA28. U.S. Department of Agriculture, Cooperative Extension Service, University of Florida, IFAS, Florida.

5.1.1.4 Cestoda Esta classe é altamente adaptada para o hábito parasitário e todos são endoparasitas. Não possuem tubo digestivo, absorvendo seus nutrientes diretamente de seu tegumento, que apresenta microvilosidades para aumentar a área de absorção. Este tegumento ainda protege estes vermes de serem digeridos no intestino de seus hospedeiros, onde vivem.

64

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Seu corpo é dividido em três partes (fig.64): ? Escólex, que se localiza na parte anterior do organismo e atua

fixando o verme adulto em seu hospedeiro, para isso pode portar ventosas ou ganchos; ? Colo, região logo após o escólex, responsável pelo crescimento

do corpo do verme; ? Estróbilo ou corpo do verme, formado por unidades chamadas proglotes, que possuem individualidade alimentar e reprodutiva, isto é, podem se alimentar e reproduzir independentes umas das outras.

Os cestódeos podem atingir grandes comprimentos, como a Taenia saginata, que pode chegar a 8 metros de comprimento. Para atingir um tamanho como esse, seu estróbilo é formado de centenas de proglotes, mas alguns Cestoda podem ser pequenos e apresentar somente três, como Echinococcus granulosus, que possui uma proglote jovem, uma madura e uma grávida. Estes três “estados” das proglotes se referem a sua maturidade sexual. A proglote jovem ainda é imatura sexualmente, suas gônadas (testículos e ovários) ainda não se desenvolveram. A proglote madura já está desenvolvida sexualmente, mas ainda não foi fecundada. A proglote grávida já foi fecundada e está repleta de ovos (fig.64).

Figura 64: A. Escólex de Taenia solium, exibindo suas ventosas e ganchos; B. Escólex e colo de T. solium; C. Proglote grávida de T. saginata, mostrando o útero ramificado cheio de ovos; D. Ovo de Taenia sp. Fonte: Montagem feita com fotos do CDC.

Seu ciclo normalmente envolve uma relação predador-presa: o hospedeiro intermediário é predado pelo hospedeiro definitivo. O hospedeiro definitivo é sempre um vertebrado, e abrigará os vermes adultos em seu tubo digestivo. Estes vermes se desenvolvem se alimentando do alimento pré-digerido de seus hospedeiros. As proglotes amadurecem sexualmente e ocorre a fecundação, que pode ser entre proglotes de diferentes indivíduos,

65

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

entre proglotes diferentes do mesmo indivíduo e por autofecundação. A fecundação cruzada ocorre com o cirro (órgão copulador) de cada proglote penetrando no poro genital da outra, liberando os espermatozóides. As proglotes fecundadas se tornam grávidas, com o útero cheio de ovos e se destacam do corpo do verme, saindo para o ambiente externo com as fezes. Uma vez no ambiente externo, estes ovos têm de ser ingeridos por um hospedeiro intermediário. Uma vez dentro deste hospedeiro, o ovo eclode liberando um embrião que se transforma em uma larva nos tecidos ou cavidades corporais do hospedeiro intermediário. Este hospedeiro pode ser um vertebrado, como o bovino para a Taenia saginata humana, ou um artrópode como a pulga no ciclo do Dypilidium caninum dos cães. As larvas recebem nomes diferentes de acordo com a sua morfologia, por exemplo, as larvas de Taenia spp. são chamadas de cisticercos, as larvas do D. caninum e do Hymenolepis spp. são chamadas de larvas cisticercóides. O hospedeiro definitivo se infecta ingerindo estas larvas nos tecidos do hospedeiro intermediário ou ingerindo todo o hospedeiro intermediário com larvas em suas cavidades (como os cães e as pulgas). A figura 67 mostra o ciclo das tênias humanas, que usaremos de exemplo.

Figura 67: Ciclo das tênias humanas. 1. As proglotes grávidas saem nas fezes e liberam os ovos no ambiente; 2. Os ovos são ingeridos pelos hospedeiros intermediários: porco (Taenia solium) e bovinos (T. saginata); 3. No intestino destes animais o ovo eclode e libera o embrião ou oncosfera, que penetra na parede intestinal e cai em um vaso sanguíneo, ganhando a circulação. Estes embriões chegam aos tecidos (muscular, nervoso) dos hospedeiros e se transformam em larvas (cisticercos); 4. Os humanos se infectam ingerindo carne (na verdade, tecido muscular) crua ou mal cozida destes animais contendo as larvas da Taenia; 5. As larvas chegam ao intestino delgado humano, se fixam na mucosa intestinal pelo escólex e se desenvolvem em vermes adultos (6). Fonte: CDC.

66

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

REFERÊNCIAS HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

67

6

UNIDADE 6 FILOS BLASTOCELOMADOS

? Os animais blastocelomados eram chamados antigamente e

ainda em alguns livros de “pseudocelomados” ou reunidos em um grupo heterogêneo chamado “asquelmintos”. Neste trabalho, usaremos a definição de Brusca e Brusca (2003), onde blastocelomados são os animais cuja cavidade corporal é uma blastocele (cavidade da blástula) que persiste até a idade adulta. O importante é entender a importância das cavidades corporais, que proporcionam vantagens como o transporte facilitado de substâncias, fornecem espaço para o desenvolvimento de órgãos, podem servir como esqueleto hidrostático, entre outras vantagens inerentes de cada filo. Neste trabalho, detalharemos dois filos blastocelomados como exemplo, os filos Rotifera e Nematoda. Os outros filos serão somente citados, mas vocês podem conhecer mais através dos livros texto indicados. 6.1 FILO ROTIFERA São pequenos animais aquáticos, sendo que a sua maioria não excede 1mm., mas são extremamente diversos e complexos. A maioria das mais de 2.000 espécies de rotíferos é de água doce, existindo uns poucos marinhos. Sua característica de maior destaque ao observador é a coroa ciliada que estes animais exibem em sua extremidade anterior (fig.68). Essa coroa geralmente forma redemoinhos na água, o que dá o nome ao filo Rotifera ou Rotatoria. Os rotíferos possuem uma cavidade corporal preenchida por líquido, como todos os blastocelomados; intestino completo; epiderme sincicial, mas com um número pré-determinado de núcleos (eutelia).

Figura 68: A. O rotífero rastejante Habrotrocha rosa. Fonte: Foto de http://en.wikipedia.org/wiki/User:Rkitko. B. O rotífero planctônico Brachionus calyciflorus. Fonte: Foto de Takehito Yoshida e Randy O. Wayne. http://biology.plosjo urnals.org/perlserv/?request=slideshow&type=figure&doi=10.1371/journ al.pbio.0050255&id=85051.

68

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

O corpo dos rotíferos é divido em três partes: cabeça, tronco e pé. Na cabeça ficam os órgãos ciliados (coroa ou corona), que variam muito em morfologia dentro do filo, podendo ser mais desenvolvidos em algumas espécies e mais simples em outras (fig.69). Logo após a coroa fica a boca, que em rotíferos filtradores recebe o fluxo de água produzido pelos órgãos ciliados. Abaixo da boca está uma faringe modificada e característica do filo chamada mástax. O mástax é formado por duas partes chamadas trofos, que tem morfologia distinta nas Figura 69: Morfologia geral de um rotífero. diferentes espécies, sendo Fonte: Modificado de Ivy Livingstone – Biodidac. importantes na taxonomia do grupo. Essa morfologia reflete o tipo de alimentação do rotífero, pode ser usada para triturar, pinçar plantas, ou mesmo para capturar presas. Seguindo o mástax estão as glândulas salivares, que podem funcionar como lubrificantes para o movimento do mástax ou secretar enzimas digestivas. A digestão começa no mástax e é completada extracelularmente no estômago, com auxílio das enzimas produzidas nas glândulas gástricas. Não possuem órgãos especiais para o transporte de substâncias ou trocas gasosas. O líquido que preenche o blastoceloma serve como meio para circulação dentro do corpo, ajudado por contrações musculares corporais. A excreção é feita através de protonefrídios, normalmente um par, que se conectam a uma bexiga que desemboca na cloaca. Este sistema protonefridial tem uma função primariamente osmoreguladora, principalmente nas espécies de água doce. Uma característica adaptativa importante para os rotíferos que utilizam corpos d’água temporários é a capacidade de dormência. Os rotíferos conseguem, depois de dessecados, resistir por anos em um estado de dormência, reativando seu metabolismo após a reidratação. O gânglio cerebral dos rotíferos localiza-se dorsalmente ao mástax e dele partem dois grandes cordões nervosos longitudinais ventrais e dorsais. A área da coroa abriga cerdas sensitivas e algumas vezes pequenos poros quimioreceptores.

69

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

A reprodução dos rotíferos intriga os pesquisadores, uma vez que a maioria das espécies é partenogenética (veja glossário), inclusive não foram descritos machos em algumas espécies.

B GC

GLOSSÁRIO

A

Partenogênese: Do grego parthenos “virgem” e gênesis “criação”. É um tipo de reprodução assexuada onde um ovo não fecundado dá origem a um organismo.

E

F

Em algumas espécies os machos só são gerados em situações de stress, como o dessecamento do corpo d’água na seca (fig.70). Quando as fêmeas partenogenéticas recebem estímulos do ambiente indicando condições adversas, começam a produzir ovos haplóides (n) além dos ovos diplóides (2n) que normalmente dão origem a outras fêmeas. Estes ovos haplóides darão origem a machos, que copularão com as fêmeas que estão produzindo ovos haplóides e os fecundarão, dando origem a um ovo diplóide com a casca dura, chamado ovo dormente. Este ovo resiste à dessecação e eclodirá quando for reidratado, dando origem às fêmeas, que enquanto as condições forem favoráveis só colocarão ovos 2n, voltando a produzir ovos haplóides quando as condições forem adversas.

Figura 70: Ciclo do rotífero Brachionus plicatilis demonstrando a reprodução assexuada e sexuada e a formação dos ovos dormentes (ver texto). Fonte: Modificado de Denekamp et al. BMC Genomics 2009 10: 108 doi:10.1186/1471-2164-10-108

6.2 FILO NEMATODA Os Nematoda são chamados de “vermes cilíndricos”, principalmente por causa da comparação com os platelmintos. Esta comparação com os platelmintos vem do fato que estes dois filos abrigam a maioria dos “vermes” de importância médico-veterinária. Entre os Nematoda encontramos Ascaris lumbricoides, considerado a mais frequente

70

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

verminose humana, Ancylostoma duodenale, Necator americanus, Enterobius vermicularis, Trichiuris trichiura, Wuchereria bancrofti, só para citar os parasitos humanos. Estão descritos entre 16.000 a 17.000 espécies de nematódeos, mas estima-se que existam pelo menos 40.000 espécies. Cerca de 33% das espécies descritas são parasitos de vertebrados, o que demonstra a falta de estudos taxonômicos sobre os Nematoda de vida livre, que são abundantes e diversos tanto no solo, quanto em habitats marinhos e dulcícolas. Os Nematoda possuem corpo cilíndrico, delgado e alongado, normalmente afilando em suas extremidades. Sua epiderme pode ser celular ou sincicial e é recoberta por uma camada acelular chamada cutícula. Secretada pela própria epiderme, a cutícula tem como função primordial proteção contra ambientes hostis (como o interior do corpo dos hospedeiros, por exemplo) e contra a dessecação. A cutícula é flexível, mas à medida que o nematódeo vai crescendo, ele secreta uma nova cutícula e se livra da antiga, em um processo conhecido como muda ou ecdise.

Figura 71: Corte longitudinal de um nematódeo de vida livre e corte transversal de Ascaris lumbricoides fêmea. Fonte: Modificado de Ivy Livingstone – Biodidac.

O sistema muscular dos Nematoda é bastante peculiar, não apresentando musculatura circular, somente musculatura longitudinal. Essa conformação produz seu movimento chicoteante característico. Os músculos se inserem em cordões epidérmicos dorsais e ventrais (fig.71), um arranjo único entre os Metazoa. O blastoceloma dos Nematoda é preenchido por líquido, formando um esqueleto hidrostático que funciona como uma força antagonista para os músculos na produção do movimento. Os nematódeos são extremamente diversos em relação à alimentação, podendo ser detritívoros, alimentadores de depósito, parasitos de plantas e animais, herbívoros e predadores. O tipo de alimentação irá refletir na morfologia da cápsula bucal destes organismos, que poderá portar

71

ATIVIDADES Um nematódeo de vida livre é tão bem estudado que até o seu genoma já foi totalmente mapeado. É o Caenorhabditis elegans. Pesquise na internet e descubra porque este pequeno verme de vida livre é tão importante.

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

dentes, espinhos, lábios, mandíbulas, estiletes, etc. A faringe também refletirá o tipo de alimentação, podendo ser delgada (filarióide) ou bulbosa (rabditóide). Estas características são as mais importantes na taxonomia dos Nematoda (fig.72).

Figura 72: Diversidade de cápsulas bucais e esôfagos de Nematoda. A. Thoracostoma sp (Enoplina). B. Acromoldavicus mojavicus (Tylenchina: Cephalobomorpha). C. Enoploides sp. (Enoplina). D. Pontonema cf. parpapilliferum (Oncholaimina). E. Ceramonema sp. (Plectida).F. Latronema sp. (Chromadorida). G. Actinca irmae orylaimida). Fonte: Fotos de De Ley, P. A quick tour of nematode diversity and the backbone of nematode phylogeny(January 25, 2006), WormBook, ed. The C. elegans Research Community, WormBook,doi/10.1895/wormbook.1.41.1, http://www.wormbook.org.

Os Nematoda não apresentam nenhum sistema complexo para trocas gasosas e circulação. Como os outros blastocelomados, estas funções são realizadas por difusão e pelo fluido da cavidade corporal. Seu sistema excretor é formado por uma ou duas células renete que se conectam diretamente a um poro excretor ventral. Este arranjo também é único entre os metazoários. O sistema nervoso dos Nematoda é formado por um anel nervoso circunfaringial e vários gânglios associados, que irão conectar nervos longitudinais que passarão por dentro dos cordões epidérmicos. Seus órgãos dos sentidos constituem-se de papilas e cerdas tácteis, e dois órgãos quimioreceptores, os anfídios e os fasmídeos. Os fasmídeos são estruturas glandulares simples, os anfídeos são órgãos pareados localizados lateralmente a área cefálica. Consistem de um poço ligado ao meio anterior por um poro, que contém em seu interior uma glândula unicelular. A presença e a localização destes órgãos também têm importância taxonômica. Os Nematoda são dióicos e exibem dimorfismo sexual, os machos normalmente são menores e possuem sua extremidade anterior encurvada. Em alguns, como os Ancylostomidae, o macho exibe uma bolsa copuladora

72

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

na extremidade posterior. A cópula ocorre com o macho abrindo a vulva da fêmea com uma espícula e transfere os espermatozóides por contrações do ducto ejaculatório. Uma curiosidade sobre os Nematoda é que seus espermatozóides não são flagelados, se locomovem por movimentos amebóides. Uma vez fecundada a fêmea produzirá ovos que serão liberados no ambiente. Dentro do ovo ocorre o desenvolvimento de uma larva, que passará por quatro mudas antes de atingir o estágio adulto. Algumas destas mudas podem acontecer dentro do ovo, como é o caso de Ascaris. Na maioria dos nematódeos parasitos a larva de 3º estádio é a forma infectante. Os ciclos dos principais parasitos humanos serão estudados na disciplina parasitologia. 6.3 OUTROS FILOS MENOS DIVERSOS 6.3.1 Filo Nematomorpha Este filo compreende 320 espécies de vermes cujos adultos possuem um corpo muito fino, semelhante a um cabelo como o da crina de um cavalo, de onde vem seu nome vulgar em inglês “horsehair worms”. Em média possui de 1 a 3mm de diâmetro e pode chegar em até um metro de comprimento. Os adultos são de vida livre, enquanto as larvas são parasitas de artrópodes, comumente ortópteros (Fig. 73).

Figura 73: O Nematomorpha Spinochordodes tellinii adulto emergindo de um Meconema thalassinum. Fonte: Foto de D. Andreas Schmidt-Rhaesa

73

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

6.3.2 Filo Priapula Os priapulídeos são organismos vermiformes e cilíndricos com o corpo dividido em probóscide, tronco e em algumas espécies apêndice caudal. Esta probóscide é reversível e pode ser armada com espinhos (fig.74). São animais que vivem enterrados no substrato marinho, usando a probóscide para realizar esta escavação. 6.3.3 Filos Loricifera e Kinorhyncha Estes três filos englobam organismos chamados interticiais. Organismo interticiais são aqueles que vivem nos espaços entre os grãos de areia no substrato dos ambientes aquáticos. A maioria deles se encontra dentro da classe de tamanho que abrange os organismos conhecidos como meiofauna. São da meiofauna todos os organismos maiores que 40 micrômetros e menores que 1mm (1000 micrômetros).

ATIVIDADES Existem ainda outros filos acelomados e blastocelomados menos diversos, porém não menos importantes do ponto vista evolutivo. Procure na internet e liste as principais características destes filos.

Figura 74: O priapulídeo Ottoia enterrado em sua posição típica. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/User:Smokeybjb.

74

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

REFERÊNCIAS HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

75

7

UNIDADE 7 FILO MOLLUSCA

Os Moluscos são um dos mais diversos grupos de metazoários, e um dos mais importantes para os seres humanos. São largamente utilizados na alimentação humana, como escargot, lulas, polvos, mariscos e mexilhões. Alguns são bem conhecidos por serem vetores de doenças de importância médico-veterinária, como a esquistossomose e a fasciolose. 7.1 INTRODUÇÃO 7.1.1 O mesoderma e a origem do celoma Dentro dos protostômios (organismos em cujo blastóporo dá origem a boca), os Mollusca compartilham com os Anellida, Onycophora, Tardigrada e Arthropoda uma cavidade celomática (fig. 75). Em outras palavras, os moluscos compartilham um ancestral comum com os outros táxons citados acima. Todo esse grupo compartilha como sinapomorfia uma cavidade (celoma) revestida por epitélio de origem mesodérmica, formada por cavitação de uma massa compacta de células, derivadas da proliferação postero-anterior de células mesentoblásticas 4D. O padrão de formação do celoma nos deuterostômios (organismos onde o blastóporo origina o ânus) é distinto e não envolve cavitação de células mesentoblásticas.

Figura 75: Desenho esquemático de um organismo celomado. Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/User:Philcha.

76

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

A evolução do celoma foi um avanço significativo na estrutura corporal dos Metazoa. Dado que a difusão entre a superfície corporal e o interior do organismo torna-se menos eficiente quanto menor for à relação área/volume (a área aumenta ao quadrado e o volume aumenta ao cubo), quanto maior for um organismo, proporcionalmente ainda maior será o seu volume e, consequentemente, menor será a eficiência de difusão entre o meio externo e o interno. O celoma, sendo um espaço preenchido por líquido, inicialmente resolve as limitações de tamanho impostas aos organismos acelomados. Com isso, dentro de certos limites, o celoma permite um aumento do tamanho corporal, sem a necessidade de que sistemas acessórios sejam necessários no processo de transporte de substâncias. Adicionalmente, uma cavidade celomática, agora revestida por um endotélio, permite o surgimento e especialização de complexos tecidos e órgãos, além de também permitir uma grande variedade de arquiteturas corporais. 7.1.2 Diversidade e biologia geral O filo Mollusca originalmente surgiu em ambiente marinho. Atualmente, é um grupo extremamente diverso, sendo representados mais comumente pelos caramujos, lesmas, ostras, mexilhões, polvos e lulas (Fig.76). A grande diversidade dos moluscos deve-se ao sucesso evolutivo desse grupo como colonizador de diferentes tipos de ambientes, tanto de marinhos e de água doce, quanto terrestres.

Figura 76: Exemplos de classes de moluscos: Uma lula (foto: Jan Derk), um gastrópodo (foto: U.S. N.O.A.), mariscos (foto: Marlith), um quíton (foto: Jérôme Holvoet-Vermaut), um monoplacophora (desenho: Georg Liljevall) e um polvo (foto: Albert Kok).

77

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Contando com cerca de 110000 espécies descritas (cerca de 35000 em ambiente terrestre), é menos diverso somente que os Arthropoda. Isso não necessariamente quer dizer que Mollusca e Arthropoda sejam os filos mais diversos dentro de Metazoa. Dados recentes indicam que os Nematoda possam ser o grupo de metazoários com a maior diversidade global, ocorrendo em quase todos os tipos de ambientes. Como grupo, os moluscos são uma importante fonte de alimento para os seres humanos, sendo muito importantes para a economia de alguns países. Eles são fonte de pérolas e ainda fornecem matéria prima para a confecção de diversos outros produtos de menor valor econômico (ex: botões e pentes de madrepérola). O grupo não é necessariamente completamente benéfico ao homem. Alguns bivalves marinhos, por exemplo, são brocadores de madeira, danificando barcos e outras estruturas de madeira submersa. O bivalve Dreissena polymorpha (Fig.77), comumente conhecido como mexilhão zebra é uma espécie invasora, introduzida em todo o mundo por meio da água de lastro dos navios provenientes da Europa. Essa espécie, quando introduzida, é extremamente prolífica e se encrusta em grandes densidades sobre o substrato, com sérios problemas para a diversidade (por deslocamento de espécies nativas) e economia, por causar danos à indústria de alimentos, à indústria de energia (por entupimento das turbinas das hidroelétricas), à indústria naval, de abastecimento de água, etc. Outros moluscos, como os gastrópodes do gênero Biomphalaria (Fig. 3), são hospedeiros intermediários de diversas parasitos que podem ter o homem como hospedeiro final.

Figura 77: Exemplos de moluscos prejudiciais ao homem e meio ambiente. Mexilhão zebra Dreissena polymorpha (foto U.S. N.O.A.) e Biomphalaria glabrata (foto: Fred A. Lewis, Yung-san Liang, Nithya Raghavan & Matty Knight).

78

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Moluscos são, na sua maioria, organismos de pequeno (microscópicos) a médio porte (escala de cm), sendo raros os casos de gigantismo, como nas lulas gigantes (ex: gênero Architeuthis) que podem atingir cerca de 21 metros e 250 Kg e a ostra gigante (Tridacna gigas), que pode atingir até 1,5 metros e 250 Kg 7.1.3 Morfologia e fisiologia básica de um molusco Em geral um Mollusca é um organismo bilateralmente simétrico e celomado, embora o celoma seja reduzido a pequenas cavidades em torno do coração, nefrídios e gônadas. A maior parte de seus sistemas de órgãos (digestivo, excretório e reprodutivo) estão concentrados em uma massa visceral (Fig.78). Dobras dorsais encerram uma cavidade do manto (ou páleo) entre elas e a massa visceral. Uma cabeça anterior pode estar presente em alguns grupos como os Gastropoda.

Figura 78: Morfologia geral de um molusco generalizado. Em verde sistema digestivo, em vermelho sistema circulatório, em azul sistema nervoso e em amarelo sistema reprodutivo. Legenda: 1. Rádula; 2. Boca; 3. Concha; 4. Estômago; 5. Gônadas; 6. Coração; 7. Celoma; 8. Nefrídio; 9. Manto; 10. Cavidade do manto; 11. Ânus; 12. Brânquias; 13. Pé; 14. Hemocele; 15. Cordão nervoso podal; 16. Intestino; 17. Cordão nervoso visceral; 18. Anel nervoso. Fonte: Desenho adaptado de Ruppert, E.E., Fox, R.S., and Barnes, R.D. (2004). Invertebrate Zoology (7 ed.). Brooks / Cole. pp. 284-291. ISBN 0030259827, por http://en.wikipedia.org/wiki/User:Philcha.

Um pé muscular ventral é o principal, senão o único, mecanismo de locomoção da maioria das espécies (grande parte dos bivalves, gastrópodes, poliplacóforos e monoplacóforos) embora outros meios de locomoção incluindo jatos de água expelidos pela cavidade do manto (cefalópodes), ou o fechamento abrupto das valvas de um bivalve (ex: vieiras), também sejam comuns. Além da locomoção, o pé dos moluscos pode promover a fixação do animal ao substrato, a captura de alimento (cefalópodes), ou ainda, pode ser uma combinação entre locomoção e qualquer uma das funções enume-

79

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

radas acima. Em algumas formas pelágicas, como em alguns nudibrânquios, a natação dá-se por meio do batimento do pé muscular e ondulação do corpo. Moluscos também podem deslocar-se na coluna d'água por meio de regulação da concentração gasosa em cavidades especiais como a cavidade do manto nos gastrópodes, ou as câmaras da concha dos cefalópodes do gênero Nautilus (Fig.79).

Figura 79: Morfologia da concha de um Nautilus. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/User:Philcha.

A porção exterior do manto pode secretar uma concha com função protetora na maioria dos membros do filo Mollusca. A concha é secretada em 3 camadas. A camada externa, denominada perióstraco, é uma região córnea, delgada, rica em proteína, com função protetora, reduzindo ou evitando a erosão das camadas inferiores ricas em carbonato de cálcio. Células do manto, na porção externa desse secretam as proteínas do perióstraco. A camada intermediária, denominada camada prismática, é a mais espessa e é formada por carbonato de cálcio e material de origem orgânica. Células da camada externa do manto secretam essa camada. A camada interna da concha, ou camada nacarada (responsável pelo crescimento da concha em espessura) é formada por uma fina camada de carbonato de cálcio e material orgânico e é secretada por células localizadas ao longo de toda a borda do epitélio do manto. Em alguns moluscos, como cefalópodes, a concha pode ser interna.

80

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

A cavidade do manto, em algumas espécies, pode funcionar como pulmões ou pode possuir brânquias. No caso dos moluscos terrestres, essa cavidade é umedecida e irrigada por numerosos capilares. Desta forma, a cavidade do manto funciona como um pulmão, proporcionando as trocas gasosas entre o ar e o sangue, diretamente através de uma mucosa irrigada e úmida. As brânquias são estruturas lamelares, ricamente irrigadas, onde um sistema composto por um vaso aferente, um vaso eferente e capilares lamelares funcionam em contra-corrente (cílios lamelares movimentam a água contra o fluxo sanguíneo). O resultado disso é uma otimização das trocas gasosas, visto que ao longo do gradiente de troca gasosa haverá sempre uma diferença do potencial de CO2 e O2 em diferentes porções da lamela branquial. Em outras palavras, o sangue pobre em O2 e rico em CO2, que entra nas brânquias, pelo vaso aferente, encontrará uma corrente de água, rica em O2 e pobre em CO2 sendo movimentada em sentido oposto. Já o vaso eferente rico em O2 e pobre em CO2, encontra uma camada de água com as mesmas propriedades. A epiderme dos moluscos tem importante função respiratória. Em moluscos aquáticos, a contínua corrente de água que entra e sai da cavidade do manto, por meio do batimento contínuo de cílios presentes nessa região, além de trazer oxigênio e remover CO2, também remove dejeto e escretas, é responsável pela eliminação de gametas ou ovo com zigoto e, em bivalves, também proporciona alimento. Os moluscos possuem um tubo digestivo completo, com boca e ânus (condição plesiomórfica ao menos para os protostômios). Esse tubo digestivo consiste, basicamente, de três regiões: intestino anterior, de origem ectodérmica, intestino médio, de origem endodérmica e intestino posterio, de origem ectodérmicar. O intestino anterior se divide em três regiões: boca, faringe e esôfago. A boca é apenas o vestíbulo da faringe. A faringe, então, alarga-se e possui a rádula e o saco da rádula. A rádula é uma característica sinapomórfica para os Mollusca (não aparece somente em bivalves, provavelmente como adaptação a um hábito de vida bêntico e filtrador). Esse é um órgão glossiforme, adaptado a diferentes tipos de alimentação, composto por dezenas de milhares de dentículos quitinosos arranjados em fileiras (secretados dentro da cavidade bucal, na base do saco da rádula), assentados sobre um odontóforo cartilaginoso. Músculos associados ao odontóforo movimentam-no para dentro e para fora da cavidade bucal. Músculos associados à rádula fazem com que essa corra sobre o odontóforo em um movimento de vaivém. Após a faringe, o intestino anterior estreita-se em um tubo mais ou menos longo que leva ao estômago. O intestino médio, contendo o estômago, constitui a maior parte do tubo digestivo.

81

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 80: Estrutura geral da rádula de um molusco, exemplificado por um gastrópode. e = esôfago; m = boca; mx = maxila; o = odontóforo; op = músculo protactor do odontóforo;r = rádula; rp = músculo protactor da rádula; rr = músculo retrator da rádula. Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/User:Debivort)

O sistema circulatório dos moluscos, com exceção dos cefalópodes, consiste de um coração dorsal ao tubo digestivo e um sistema aberto, por onde o sangue flui livremente. Os vasos sanguíneos nos moluscos, ao contrário dos vertebrados, não são revestidos por endotélio. Nesses organismos, o endotélio reveste a margem externa dos vasos sanguíneos, enquanto a cavidade por onde o sangue flui é revestida pelo tecido conjuntivo subjacente ao endotélio. O sistema excretor é representado por um ou dois tubos nefridiais que se abrem na cavidade pericárdica e no manto. Nos gastrópodes e cefalópodes podem apresentar uma região esponjosa, sendo denominado de rim (mas não apresenta qualquer homologia com o rim dos vertebrados). Um tubo nefridial típico é um “funil aberto” dividido em uma região anterior, ciliada, denominada nefróstoma, uma região tubular enrolada que leva até uma bexiga e um nefróporo que se abre na cavidade do manto. Nos cefalópodes e em outros organismos celomados com sistema circulatório fechado (ex: anelídeos e cordados), o sangue passa por ultrafiltração diretamente através da parede dos capilares para o interior dos tubos nefridiais.

82

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

O sistema nervoso dos moluscos é derivado do padrão protostômico básico de um arranjo de gânglios circumentéricos e cordões nervosos ganglionares conectados por comissuras. Nos moluscos mais basais como os Aplacophora e os Polyplacophora (que divergiram inicialmente na evolução dos moluscos) há um par de gânglios dorsais à faringe (gânglios cerebrais), um par ganglionar ventral a esse (gânglios podais) conectado ao par dorsal por cordões nervosos circumentéricos e de onde partem cordões nervosos pedais. Adicionalmente, dos gânglios cerebrais partem, lateralmente aos nervos pedais, um par de nervos viscerais que inervam o manto e as vísceras. Em outros grupos mais derivados dentro dos Mollusca, os cordões nervosos podais e os viscerais podem apresentar gânglios intercalados. Moluscos apresentam diferentes órgãos dos sentidos como os estatocistos, osfrádios e olhos. Além desses órgãos, existem células táteis distribuídas por todo o corpo, principalmente nos tentáculos. Os estatocistos são órgãos relacionados ao equilíbrio, situados próximos aos gânglios podais. Os osfrádios são órgãos olfativos, localizados próximos às brânquias. Os olhos são mais desenvolvidos nos cefalópodes e gastrópodes (Fig.81).

Figura 81: Olho de um cefalópode. Fonte: Foto de Nick Hobgood.

Em geral, os sexos são separados e as gônadas são pares nos moluscos, embora existam alguns bivalves e um grande número de gastrópodes sejam hermafroditas (hermafroditismo pode ocorrer também em outros grupos dentro desse filo). A fecundação é interna em muitos gastrópodes e cefalópodes, embora, a maioria das formas aquáticas pratique fecundação externa. A maioria dos moluscos possui larvas livre natantes denominadas trocófora (Fig.82). Essas larvas ciliadas são similares às larvas de Polychaeta e dão suporte à hipótese de que Annelida e Mollusca sejam próximos filogeneticamente. Um segundo estágio, véliger, livre natante sucede o estágio de trocófora. Nesse estágio já é possível observar um pé, concha e cavidade do manto.

83

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 82: Microscopia eletrônica de varredura da larva trocófora de Haliotis asinina nove horas após a fertilização. Fonte: Daniel J Jackson, Gert Wörheide and Bernard M Degnan: Dynamic expression of ancient and novel molluscan shell genes during ecological transitions. BMC Evolutionary Biology 2007, 7:160. doi:10.1186/ 1471-2148-7-160.

7.1.4 Evolução e as principais classes do filo Mollusca O estudo das formas viventes de moluscos, bem como o estudo do registro fóssil permitiu que alguns cientistas hipotetizassem o ancestral do grupo como sendo um organismo achatado dorso-ventralmente, não segmentados, vermiformes e rastejantes. Esse animal pode ter tido cutícula quitinosa e escamas calcáreas sobrepostas. Outros cientistas hipotetizam o ancestral Mollusca como sendo uma espécie de verme segmentado que ao longo da evolução, tornou-se não segmentado secundariamente, dando origem aos moluscos. Atualmente os membros do filo Mollusca são agrupados em sete classes: Aplacophora, Monoplacophora, Polyplacophora, Gastropoda, Cephalopoda, Bivalvia e Scaphopoda. Aplacophora, Monoplacophora e Polyplacophora são considerados os grupos mais basais dentro desse filo, exibindo um grande número de caracteres que estão no plano basal desse grupo. Os Bivalvia e Scaphopoda são considerados os grupos mais derivados dentro dos Mollusca. Isso não quer dizer que sejam mais “evoluídos” ou mais “complexos” do que outros grupos como os Gastropoda e os Cephalopoda, enquanto os Aplacophora, Monoplacophora e Polyplacophora seriam “menos evoluídos” e “primitivos”. Na verdade, uma relação desse tipo, entre “complexidade” (morfologicamente “mais complexos”) e “evolução” (no sentido de serem “mais ou menos evoluídos”) ou adaptabilidade (no sentido de serem “mais adaptados”) não pode ser estabelecida. Um grupo mais derivado pode ter vários sistemas de órgãos simplificados ao longo da evolução pela qual seus descendentes passaram

84

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

até atingirem a condição morfológica atual. Também não podem ser classificados como menos evoluídos, visto que a evolução é um processo natural que acomete a todos os seres vivos sem distinção, forçando-os à adaptação aos seus respectivos ambientes. Ao menos para as formas viventes não podemos dizer que um grupo é mais adaptado que outro, a não ser que a comparação seja relativa, levando-se em conta os nichos ecológicos ocupados por diferentes espécies. Acima do nível de espécie, dizer que um dado grupo taxonômico é mais adaptado é incorreto, dado que adaptação e evolução ocorrem ao nível individual e populacional, respectivamente. Portanto, dizer que um táxon é mais derivado significa que esse, ao longo da história evolutiva de um grupo maior como os Mollusca, surgiu posteriormente. Os mais basais surgiram no início da diversificação do grupo. 7.1.4.1 Aplacophora Moluscos bênticos, marinhos, vermiformes, sem concha. Pé rudimentar, representado por um longo sulco ventral. Epiderme coberta por espículas de aragonita. Cavidade do manto reduzida; sem olhos, tentáculos e nefrídios. Ex: Chaetoderma. 7.1.4.2 Monoplacophora Contando com algumas dezenas de espécies descritas, os monoplacóforos possuem uma única concha cobrindo todo o corpo e que dá nome ao grupo. O pé forma um disco muscular ventral fraco, com oito pares de músculos retratores. Uma pequena cavidade do manto em torno do pé contém de 3 a 6 pares de ctenídeos (brânquias) (Fig.83). Possuem rádula e cabeça reduzida sem olhos. Tentáculos presentes somente ao redor da boca. Dois pares de gônadas, 3 a 7 pares de metanefrídeos, 4 atria no coração. Ex: Neopilina.

Figura 83: O monoplacofora Laevipilina antarctica. Fotne: Foto de Gonzalo Giribet et al. Evidence for a clade composed of molluscs with serially repeated structures.

85

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

7.1.4.3 Polyplacophora Marinhos, corpo elíptico, face ventral achatada, pé achatado e desenvolvido, circulado por um sulco (cavidade do manto) onde as brânquias estão inseridas (Figura 84). Corpo protegido por uma concha dividida em oito peças transversais (Fig.84). Fixa-se às rochas por meio do pé que funciona como ventosa. Ex: Chiton

Figura 84: Um quíton, Chiton glaucus, da península de Whangaparaoa Nova Zelândia. Fonte: Foto de Graham Bould.

7.1.4.4 Gastropoda São as lesmas, nudibrânquios e caracóis (cerca de 50000 espécies) (Fig.85). Principalmente marinhos, com algumas espécies de água doce e terrestres (pulmonados). Apresentam uma grande diversidade de hábitos alimentares, podendo ser herbívoros, predadores ou carniceiros. A rádula é adaptada para cada tipo de hábito alimentar, sendo extremamente modificada em alguns predadores, como os do gênero Conus, onde a rádula é modificada em um arpão venenoso. Corpo dividido em uma região céfalo-pedal e massa visceral. Pé muscular bem desenvolvido. A maioria dos gastrópodes possui concha, embora alguns grupos como as lesmas e os nudibrânquios a tenham perdido, ou reduzida a uma pequena estrutura calcária envolta por tecido. Concha univalve, espiral e unilocular.

86

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Figura 85: Dois gastrópodos terrestres copulando. Fonte: Foto de http://commons.wikimedia.org/wiki/User: Jangle1969.

Durante o desenvolvimento embriológico (normalmente durante o último estágio de véliger) os gastrópodes passam por torção (autapomorfia dos gastrópoda) (Fig.86). Torção é o processo pelo qual o ânus e a cavidade do manto são deslocados de uma posição posterior para a região anterior do corpo, como consequência do crescimento desigual dos músculos laterais. Com isso, a massa visceral e suas estruturas internas sofrem uma torção no sentido anti-horário de cerca de 180°. Como resultado da torção, o intestino é dobado em “U”, enquanto os nervos viscerais trocam de lado (o sistema nervoso assume a forma de um “8”).

Figura 86: Ilustração do processo de torção em um gastrópode. Fonte: Ivy Livingstone / Biodidac.

Em muitos gastrópodes podem-se verificar diferentes graus de reversão secundária da torção. Ainda não há consenso sobre o significado evolutivo da torção. Alguns pesquisadores hipotetizam que a torção permite a acomodação e proteção da cabeça dentro da cavidade do manto, enquanto outros “acreditam” que o posicionamento anterior da cavidade do manto

87

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

permita aos gastrópodes com torção, um contato direto dos órgãos do sentido presentes na cavidade do manto e das brânquias, com a água no sentido do deslocamento do animal. O processo de espiralização da concha é independente da torção. Na verdade, as evidências fósseis indicam que o desenvolvimento de uma concha planoespiral (cada volta da concha exatamente em cima da anterior) tenha desenvolvido anteriormente à torção. Uma concha planoespiral tem a desvantagem de não ser muito compacta. Com isso, cada volta concêntrica aumenta demasiadamente o diâmetro da concha do animal. Além disso, em animais com esse tipo de morfologia, a abertura da cavidade do manto está diretamente localizada sobre a cabeça. Nesses animais, uma fenda na concha e na cavidade do manto impede que os dejetos sejam descarregados sobre a cabeça.

Figura 87: Exemplo de concha de arqueogastrópodos. Observe o buraco em cima da concha. Fonte: Foto de Sharon Mooney.

Uma solução diferente para o problema da autopoluição aparece com a evolução da concha assimétrica, onde cada volta localiza-se ao redor de um eixo central denominado columela. Com o aparecimento da concha assimétrica, o centro de gravidade deve ser deslocado. Com isso, a concha posiciona-se obliquamente ao corpo e a abertura do manto também dirigese lateralmente. O posicionamento oblíquo da concha, no entanto, posiciona a cavidade do manto do lado esquerdo do corpo, tendo efeitos profundos na morfologia do animal, com a redução ou perda do nefrídio, brânquia e aurícula do lado direito. Ex: Biomphalaria glabrata (hospedeiro intermediário da equistosomose).

88

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

7.1.4.5 Pelecypoda ou Bivalvia Com cerca de 20000 espécies, são organismos principalmente marinhos, embora um bom número tenha se diversificado e se adaptado ao ambiente de água doce. São comumente conhecidos como ostras, vieiras e mexilhões. Possuem uma concha bivalve, presa uma a outra por ligamentos elásticos (interno e externo; abrem a concha) e por um a dois músculos adutores (fecham a concha). Tanto a concha, quanto o ligamento são secretados pelo manto. Adaptações especiais, a charneira (“dentes” maiores e menores, calhas, depressões e sulcos que se engrenam) aparecem ao nível do umbo (porção superior da concha), ajudando a manter a concha em posição, e prevenindo o movimento lateral desta (fig. 88).

Figura 87: Morfologia da concha de um bivalve generalizado. Fonte: Modificado de Muriel Gottrop.

89

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Corpo desprovido de cabeça diferenciada; rudimentar, sem olhos, embora olhos e estatocistos possam aparecer em alguma região qualquer do corpo. Massa visceral bem desenvolvida. Pé retrátil, claviforme ou lameliforme. Simetria bilateral perfeita. Dois rins, duas brânquias. Filtradores, desprovidos de rádula. Presença de uma glândula secretora do bisso, que prende os bivalves ao substrato. Uma das características marcantes da classe é o grande desenvolvimento do manto, criando uma extensa cavidade (cavidade do manto ou cavidade paleal) onde localizam-se grandes brânquias (pectinadas e complexamente “dobradas”) em cada lado da massa visceral. Essas brânquias possuem função tanto respiratória quanto de captura de alimento por filtração. O manto desenvolve-se frequentemente em dois sifões, um inalante (entrada de água) e um exalante (saía de água) (fig. 88).

Figura 88: Um grupo de mariscos exibindo seus sifões. Fonte: Foto de Stefan Didam.

Bivalves se dispersam por meio de larvas planctônicas. São, no entanto, organismos basicamente bênticos, muitos fixos ao sedimento ou a qualquer outro tipo de substrato. Podem ser de grande importância econômica, fazendo parte da dieta de um grande número de seres humanos. Secreções do manto, como as pérolas, atingem alto valor comercial. As conchas também podem ser usadas para a fabricação de diversos outros produtos de menor importância econômica. São pragas para a indústria naval e do entretenimento, fixando-se firmemente ao casco de navios e reduzindo a sua vida útil e aumentando os gastos com manutenção. Algumas espécies, como a Dreissena polymorpha é verdadeira praga nos ambientes onde é introduzida, causando danos às turbinas de hidrohelétricas, barcos, deslocando ou extinguindo a fauna de moluscos nativos e promovendo rápida eutrofização (poluição por deposição de material de origem orgânica) do ambiente devido à grande quantidade de dejetos e carcaças eliminadas na água.

90

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

7.1.4.6 Cephalopoda Com cerca de 900 espécies vivas, são os polvos, lulas, sépias e amonitas (Nautilus). São exclusivamente marinhos, na maioria pelágicos, carnívoros. Cabeça grandemente desenvolvida (Fig.89), nitidamente separada da massa visceral por um estrangulamento. Os gânglios nervosos desenvolvem-se grandemente, concentrando-se em torno do esôfago. Acham-se protegidos por uma cápsula cartilaginosa. Dois olhos complexos, um de cada lado da cabeça.

Figura 89. Um octópodo, Octopodus vulgaris. Fonte: Foto de http://de.wikipedia.org/wiki/Benutzer:Beckmannjan.

Número variável de tentáculos localizados ao redor da cavidade bucal, providos ou não de ventosas adesivas. Nos polvos são oito, nas lulas são dez e nos Nautilus são cerca de quarenta, sem ventosas. Desprovidos de concha (exceto Nautilus) ou com concha rudimentar e interna. Nos Nautilus (fig.90) a concha é bem desenvolvida, enrolada em espiral e dividida por um septo em várias câmaras, das quais o animal ocupa apenas a última. As demais câmaras são denominadas câmaras de ar. Cada septo entre as câmaras é perfurado no meio e atravessado por um tubo calcário fino, no interior do qual encontra-se um cordão de tecido delgado denominado sifúnculo que é um prolongamento da massa visceral. O sifúnculo secreta gás no interior das câmaras vazias, permitindo que o animal controle a sua flutuabilidade.

91

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

Figura 90: Nautilus sp. do zoológico de Berlin. Fonte: Foto de J. Baecker.

Uma grande cavidade paleal ventral contém um ou dois pares de ctenídeos e um a dois pares de nefridióporos. O manto prolonga-se em um sifão muscular que auxilia na locomoção do animal. O sistema circulatório é fechado. O aparelho digestivo possui a morfologia básica da de um molusco, inclusive com rádula. No entanto, na região bucal há um bico córneo, na forma de um bico de papagaio, associado a glândulas digestivas. Um órgão excretor especial, a bolsa de tinta, abre-se ao lado do ânus e secreta uma substância negra de defesa. Um grande número de cromatóforos na pele permite que o animal assuma a cor do meio (proteção e predação).

REFERÊNCIAS HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

92

RESUMO

A disciplina Zoologia dos Invertebrados I engloba a Introdução à Zoologia e o estudo morfofisiológico, biologia, ecologia, relações evolutivas e taxonomia dos reinos Protozoa e Metazoa e dos filos: Porifera, Cnidária, Platyhelmintes, Blastocelomados e do filo Mollusca. A Introdução à Zoologia trata principalmente de um histórico da taxonomia animal, com noções de sistemática filogenética e uma introdução ao código internacional de zoologia. Zoologia é o ramo da biologia que estuda os organismos dos reinos Protista e Metazoa. O reino Protista é formado por organismos unicelulares ou multicelulares, porém sem apresentar tecidos verdadeiros ou desenvolvimento embrionário. Abrigam os chamados “protozoários” e as algas. O reino Metazoa, também conhecido como Animallia, é formado por organismos heterotróficos, multicelulares e que, na sua maioria, apresentam tecidos verdadeiros. Os protistas são organismos eucariotos unicelulares ou pluricelulares, mas que não possuem um grau de especialização celular significante, mecanismos de adesão celular ou tecidos verdadeiros. Muitos livros ainda os chamam de “Protozoa” (do grego Proto, “primeiro” e Zoon, “animal”) ou protozoários, mas a maioria dos textos modernos utiliza “Protistas”. Realizam todas as suas funções fisiológicas somente com as organelas celulares. Variam de 1µm (Micromonas), até uns poucos milímetros (alguns dinoflagelados, amebas e ciliados). Corliss (1999) estima que existam 12.000 a 19.000 protistas conhecidos. Neste trabalho, estudamos mais detalhadamente os filos Euglenida (Euglenas), Dinoflagellata (Dinoflagelados), Chlorophyta (Algas verdes), Stramenopila (diatomáceas), Kinetoplastida (alguns parasitos importantes como Trypanosoma e Leishmania), Choanoflagellata (semelhantes aos coanócitos das esponjas), Parabasilida (entre ele o Trichomonas vaginalis humano), Diplomonadida (Giardia), Rhizopoda (amebas), Actinopoda (Acantários e heliozoários), Granuloreticulosa (foraminíferos), Ciliophora (Ciliados) e Apicomplexa (antigos esporozoários). Iniciamos, o estudo do reino Metazoa com o filo Porifera, ou como são mais conhecidas, as esponjas. Os poríferos são os animais multicelulares mais simples dentre todos os metazoários. O filo possui cerca de 5.500 espécies descritas, destas somente 150 são encontradas em água doce, as demais são todas encontradas em ambientes marinhos. O nome Porifera

93

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

significa portador de poros, realmente seus representantes, possuem um grande número de poros e canais que formam um sistema de filtragem/alimentação adequado para seu hábito de vida séssil. São animais que dependem de correntes de água que entram para o interior dos canais e trazem alimento e oxigênio, e levam para fora do corpo os restos metabólicos a as excretas. Os Porifera ainda não possuem folhetos germinativos, o que surge com o próximo grupo estudado, os Cnidaria e Ctenophora. Os Cnidaria e Ctenophora são animais na sua maioria marinhos e que possuem simetria radial, o que os destaca dentro dos metazoários. Os Cnidaria e Ctenophora são considerados os filos mais basais dentro dos Eumetazoa. Considera-se Eumetazoa todos os Metazoários que apresentem organização corporal ao menos no nível tecidual. Portanto, ao contrário dos Porifera e outros filos menores como Orthonectida e Rombozoa, a partir de Cnidaria todos os animais apresentarão epitélios e outros tipos de tecidos. Possuem dois folhetos germinativos (ectoderme e endoderme) e simetria radial, o que os torna únicos dentro dos animais. Os Cnidaria são organismos diblásticos, apresentando um ectoderma e um endoderma separados por uma mesogléia acelular ou um mesênquima celular, dependendo do grupo taxonômico em questão. Uma das características marcantes dos Cnidaria (autapomorfia para o grupo) é a presença de estruturas urticantes de defesa, ou captura de alimento denominado cnidae ou nematocistos localizados na epiderme e, em alguns grupos, também na gastroderme. Os Ctenophora apresentam somente algumas similariades superficiais com os Cnidaria; notadamente uma simetria radial ou birradial, um corpo gelatinoso, sistemas de canais gastrodérmicos e, como alguns Cnidaria, bioluminescência. No entanto, divergem grandemente dos Cnidaria por locomoverem-se por meio do batimento sincronizado de feixes de cílios compostos distibuídos em faixas longitudinais ao longo do corpo. Além do mais, os Ctenophora possuem uma estrutura usada na defesa e captura de presas denominadas coloblasto. Depois de estudar os animais diblásticos (com dois folhetos embrionários), iniciaremos os estudos dos triblásticos. Um novo folheto derivado do endoderma surge, sendo chamado mesoderma. A presença de um novo folheto embrionário vai se traduzir em uma maior complexidade corporal. O grupo dos animais triblásticos também é chamado de Bilateria, possui simetria bilateral, diferente dos diblásticos (Cnidaria e Ctenophora) que possuem simetria radial. Alguns Bilateria vão exibir simetria radial, como os equinodermos, mas mesmo estes se originam de antepassados bilaterais. A simetria bilateral tem um grande impacto no desenvolvimento dos animais; como os animais passam a explorar o ambiente em somente uma direção, os órgãos dos sentidos e o sistema nervoso começam a se concentrar na parte anterior do corpo (apical). Este processo se chama cefalização. Os animais de simetria radial exploram o ambiente em todas as direções e apresentam um sistema nervoso difuso.

94

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

Os Bilateria mais simples são chamados de acelomados, por não possuírem nenhuma cavidade corporal interna além do tubo digestivo (alguns nem tubo digestivo têm!). Esta divisão pela presença de cavidades corporais é útil e didática para o estudo dos animais. A presença de compartimentos e cavidades corporais aumenta a possibilidade de órgãos mais complexos e sistemas. Iniciamos nosso estudo dos acelomados pelo seu grupo mais importante, os platelmintos. Os membros do filo Platyhelminthes são conhecidos popularmente como “vermes chatos”, porque a maioria dele possui corpo achatado dorso-ventralmente. Entre as 20.000 espécies conhecidas deste filo estão importantes parasitos humanos e dos animais, como os Schistosoma spp. causadores das esquistossomoses, as Taenia spp. causadoras da teníase e da cisticercose. Dividem-se em quatro classes, sendo três parasitas (Trematoda, Monogenea e Cestoda) e uma predominantemente de vida livre (Turbellaria). Não possuem também nenhum tipo de sistema circulatório ou respiratório especializado, todo transporte de nutrientes e as trocas gasosas são feitas por difusão. As substâncias só podem ser transportadas por difusão em pequenas distâncias, por esse motivo estes vermes são sempre achatados ou muito pequenos. O espaço corporal entre a epiderme e o tubo digestivo será preenchido por um tecido de origem mesodérmica chamado parênquima. Sua excreção é realizada por protonefrídios, estruturas que são compostas por células ciliadas chamada células flama, que coletam os dejetos nitrogenados, direcionando para canais que desembocam em poros no corpo do animal. Os animais, blastocelomados, eram chamados antigamente e ainda em alguns livros de “pseudocelomados” ou reunidos em um grupo heterogêneo chamado “asquelmintos”. Blastocelomados são os animais cuja cavidade corporal é uma blastocele (cavidade da blástula) que persiste até a idade adulta. As cavidades corporais proporcionam vantagens como o transporte facilitado de substâncias, fornecem espaço para o desenvolvimento de órgãos, podem servir como esqueleto hidrostático, entre outras vantagens inerentes de cada filo. Neste trabalho, detalhamos dois filos blastocelomados como exemplo, os filos Rotifera e Nematoda. Os Rotifera são pequenos animais aquáticos, sendo que a sua maioria não excede 1mm, mas são extremamente diversos e complexos. A maioria das mais de 2.000 espécies de rotíferos é de água doce, existindo uns poucos marinhos. Sua característica de maior destaque ao observador é a coroa ciliada que estes animais exibem em sua extremidade anterior. Essa coroa geralmente forma redemoinhos na água, o que dá o nome ao filo Rotifera ou Rotatoria. Os Rotifera possuem uma cavidade corporal preenchida por líquido, como todos os blastocelomados; intestino completo; epiderme sincicial, mas com um número pré-determinado de núcleos (eutelia). Os Nematoda são chamados de “vermes cilíndricos”, principalmente por causa da

95

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

comparação com os platelmintos. Esta comparação com os platelmintos vem do fato que estes dois filos abrigam a maioria dos “vermes” de importância médico-veterinária. Entre os Nematoda encontramos Ascaris lumbricoides, considerado a mais frequente verminose humana, Ancylostoma duodenale, Necator americanus, Enterobius vermicularis, Trichiuris trichiura, Wuchereria bancrofti, só para citar os parasitos humanos. Estão descritos entre 16.000 a 17.000 espécies de nematódeos, mas estimase que existam pelo menos 40.000 espécies. Cerca de 33% das espécies descritas são parasitos de vertebrados, o que demonstra a falta de estudos taxonômicos sobre os Nematoda de vida livre, que são abundantes e diversos tanto no solo, quanto em habitats marinhos e dulcícolas. Os Nematoda possuem corpo cilíndrico, delgado e alongado, normalmente afilando em suas extremidades. Sua epiderme pode ser celular ou sincicial e é recoberta por uma camada acelular chamada cutícula. Secretada pela própria epiderme, a cutícula tem como função primordial a proteção contra ambientes hostis (como o interior do corpo dos hospedeiros, por exemplo) e contra a dessecação. A cutícula é flexível, mas à medida que o nematódeo vai crescendo, ele secreta uma nova cutícula e se livra da antiga, em um processo conhecido como muda ou ecdise. Seguindo, estudamos o filo Mollusca, o único filo celomado estudado na Zoologia I, os outros serão estudados na Zoologia II. Os Moluscos são um dos mais diversos grupos de metazoários, e um dos mais importantes para os seres humanos. São largamente utilizados na alimentação humana, como escargot, lulas, polvos, mariscos e mexilhões. Alguns são bem conhecidos por serem vetores de doenças de importância médico-veterinária, como a esquistossomose e a fasciolose. Em geral um Mollusca é um organismo bilateralmente simétrico e celomado, embora o celoma seja reduzido a pequenas cavidades em torno do coração, nefrídios e gônadas. A maior parte de seus sistemas de órgãos (digestivo, excretório e reprodutivo) está concentrada em uma massa visceral. Dobras dorsais encerram uma cavidade do manto (ou páleo) entre elas e a massa visceral. Uma cabeça anterior pode estar presente em alguns grupos como os Gastropoda. Um pé muscular ventral é o principal senão o único mecanismo de locomoção da maioria das espécies. Além da locomoção, o pé dos moluscos pode promover a fixação do animal ao substrato, a captura de alimento (cefalópodes), ou ainda, pode ser uma combinação entre locomoção e qualquer uma das funções enumeradas acima. A porção exterior do manto pode secretar uma concha com função protetora na maioria dos membros do filo Mollusca. A cavidade do manto, em algumas espécies, pode funcionar como pulmões ou pode possuir brânquias. No caso dos moluscos terrestres, essa cavidade é umedecida e irrigada por numerosos capilares. Desta forma, a cavidade do manto funciona como um pulmão, proporcionando as trocas gasosas entre o ar e o sangue, diretamente através de uma mucosa irrigada e úmida. As brânquias são

96

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

estruturas lamelares, ricamente irrigadas, responsáveis pela troca gasosa no ambiente aquático. Os moluscos possuem um tubo digestivo completo, com boca e ânus, seu sistema circulatório, com exceção dos cefalópodes, consiste de um coração dorsal ao tubo digestivo e um sistema aberto, por onde o sangue flui livremente, o sistema excretor é representado por um ou dois tubos nefridiais que se abrem na cavidade pericárdica e no manto. O sistema nervoso dos moluscos é derivado do padrão protostômico básico de um arranjo de gânglios circumentéricos e cordões nervosos ganglionares conectados por comissuras. Atualmente os membros do filo Mollusca são agrupados em sete classes: Aplacophora, Monoplacophora, Polyplacophora (quítons), Gastropoda (caramujos e lesmas), Cephalopoda (polvos, lulas e nautilus), Bivalvia (Ostras, mariscos e mexilhões) e Scaphopoda.

97

REFERÊNCIAS

BÁSICAS

HICKMAN, C. P.; LARSON, A; ROBERTS, L. S. Princípios Integrados de Zoologia, 11. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2004. 872p. RIBEIRO-COSTA, C. S. & ROCHA, R. M. Invertebrados: manual de aulas práticas. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2002. 226p. RUPPERT, E. E.; FOX, R. & BARNES, R. D. Zoologia dos Invertebrados. 7. ed. São Paulo: Roca, 2005. 1168p.

COMPLEMENTARES

BRUSCA, R. C.; BRUSCA, G. J. Invertebrados. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007. 1098p. CORLISS, J.O. Biodiversity and Biocomplexity of the Protists and an Overview of Their Significant Roles in Maintenance of Our Biosphere. Acta Protozool., v.41, p.199-219, 2002. International Commission on Zoological Nomenclature. International code of zoological nomenclature online. 4. ed. Disponível em Acesso em: 18 Nov. 2009. ISBN 0853010064. PAPAVERO, N. Fundamentos práticos de taxonomia zoológica: Coleções, bibliografia e nomenclatura. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1994.

99

ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM - AA

1) Em que se baseia o sistema binomial de nomenclatura? Exemplifique. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 2) Defina as seguintes terminologias: filogenia, grupo monofilético, grupo polifilético, grupo parafilético, apomorfia e plesiomorfia. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 3) filo Protista é considerado um grupo parafilético. Explique essa afirmação. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 4) Quais tipos celulares aparecem nos Porifera? Em que se assemelham um coanoflagelado e um coanócito? ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________

101

Ciências Biológicas

Caderno Didático - 3º Período

5) Resumidamente, descreva as formas ascon, sicon e leucon. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 6) O que caracteriza um organismo com nível de organização tecidual? Quais são as vantagens conferidas pelo aparecimento dos tecidos? ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 7) Em que se assemelham e se diferenciam uma Cnidaria medusóide de uma Ctenophora? ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 8) Faça um quadro comparativo sobre os Platyhelminthes dos Blastocelomados. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ 9) Explique o processo de torção nos Gastropoda. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________

102

Zoologia de Invertebrados

UAB/Unimontes

10) Caracterize um Cephalopoda. ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________ ______________________________________________________________

103

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.