Codas silábicas nas línguas Macro-Jê Orientais

June 1, 2017 | Autor: Andrey Nikulin | Categoria: Historical Linguistics, Historical Phonology, Jê languages, Maxakali, Macro-Jê Languages
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Codas silábicas nas línguas Macro-Jê Orientais Andrey Nikulin [email protected]

LALLI — UnB, CAPES

Campinas, Universidade Estadual de Campinas 29 de junho de 2016

Tronco Macro-Jê • Todos os autores incluem as seguintes famílias: Jê, Maxakalí, Krenák (Botocudo, Aimoré), Karajá, Ofayé, Rikbáktsa. • Evidências fortes para a inclusão de Jabutí e Bésɨro (Chiquitano). • Ainda não foram encontradas evidências lexicais fortes para a inclusão das famílias Karirí, Kamakã, Boróro, Yathê, Purí, Guató. • Embora não haja consenso quanto à classificação interna do tronco Macro-Jê, os cálculos lexicoestatísticos preliminares correspondem bastante bem à distribuição geográfica dos grupos étnicos Macro-Jê.

Tronco Macro-Jê • As línguas Macro-Jê são faladas tanto ao oeste (Karajá, Ofayé, Rikbáktsa, Jabutí, Chiquitano) quanto ao leste (Maxakalí, Krenák) do Cerrado brasileiro. • Os falantes das línguas Jê habitam uma área extensa que corresponde majoritariamente ao Cerrado e à Mata das Araucárias. • Há evidências lexicais que permitem provisoriamente agrupar a família Jê com as famílias Maxakalí e Krenák (“línguas Macro-Jê Orientais”). As línguas faladas ao oeste do Cerrado, com a exceção do Bésɨro, formariam outro grupo (“línguas Macro-Jê Ocidentais”). O Bésɨro foi a primeira língua a se separar do tronco.

Tronco Macro-Jê

Família Jê

• Macro-Jê (definição ampla)

• Jê

• Bésɨro • Macro-Jê (definição estreita) • Macro-Jê Orientais • Jê • Maxakalí • Krenák

• Macro-Jê Ocidentais • • • •

Karajá Ofayé Rikbáktsa Jabutí

• Jê Meridionais • Ingain • Kaingáng + Xokléng

• Jê Amazônicas (Jê do Cerrado) • Jê Centrais (Xavánte, Xerénte) • Jê Setentrionais (definição ampla) • Panará • Jê Setentrionais (definição estreita) • Apinajé + Mẽbengokré • Timbíra • Kĩsêdjê + Tapayúna

Maxakalí • As sílabas (max. CVC) podem ser nasais ou orais. /p/ /m/ /t/

/n/

/c/

/ɲ/

/k/

/ŋ/

/a/ /e/ /i/ /o/ /ɨ/

oral

p

b

t

d





k

g

a

ɛ

i

o

ɨ

nasal

p

m

t

n



ɲ

k

ŋ

ã

ɛ̃





ɨ̃

• As células em cinza correspondem a alofones de ocorrência limitada (provavelmente de origem secundária). • A consoante /h/ não têm outros alofones.

Maxakalí • As consoantes em coda são precedidas por uma transição vocálica que não possui caráter fonêmico (Silva 2015). /-p/

[-ɤ̯p], [-ɤ̯]

/-m/

[-ɤ̯̃m], [-ɤ̯̃]

/-t/

[-ə̯̃t], [-ə̯̃]

/-n/

[-ə̯̃n], [-ə̯̃]

/-c/

[-i̯c], [-i̯]

/-ɲ/

[-i̯ɲ ̃ ], [-i̯]̃

/-k/

[-k], [-ɰ]

/-ŋ/

[-ŋ], [-ɰ̃]

Maxakalí e Krenák • Codas labiais: Maxakalí

Krenák

hõm ɲɨ̃hɨ̃m pɨtɨp kɨb-ɲãm coʔop / cop pip

um̊ hɛp / ɲɛ̃p pɾɨ̃m kəp jɔp wip

LABIAL

LABIAL

‘dar’ ‘estar sentado’ ‘querer’ ‘pernilongo’ ‘beber’ ‘estar deitado’

Maxakalí e Krenák • Codas palatais: Maxakalí

Krenák

baih cɨc toc coc

ⁿbət jət ɾɔ̃n jũn

PALATAL

CORONAL

‘bom’ ‘folha’ ‘comprido’ ‘dente’

Maxakalí e Krenák • Codas coronais: Maxakalí

Krenák

pɨtahat pɨcɛt mɨ̃nĩhĩn ɲĩn mãɲõn

ⁿbɾɔgⁿ putʃik pɾik tʃĩŋ m̊ũɲak, m̊ɨ̃ɲak

CORONAL

VELAR

‘caminho’ ‘um’ ‘formiga’ ‘carne’ ‘sol’

Maxakalí e Krenák • Codas velares: Maxakalí

Krenák

kɨtok ɲõɲcõŋ, ɲĩcõŋ mõŋ

kɾuk kitʃɔk mũŋ

VELAR

VELAR

‘filho’ ‘língua’ ‘ir’

Maxakalí e Krenák • Hipótese:

• o Krenák teria conservado as características articulatórias (fonação, modo, presença de pós-nasalização) das consoantes em coda com a exceção do ponto de articulação • as línguas Jê oferecem menos evidências, mas parecem mais parecidos com o Maxakalí (veja ainda Krenák kɾɛ̃n ~ PJ *kɾʌ̃j̃ ‘cabeça’) • o Maxakalí conservou apenas o ponto de articulação das consoantes em coda Proto-MJO Maxakalí Krenák

*labiais /-p/, /-m/ labiais

*palatais /-c/, /-ɲ/ coronais

*coronais /-t/, /-n/ velares

*velares /-k/, /-ŋ/ velares

Maxakalí e Krenák • Mas a correspondência pode ser mais sofisticada, cf. rimas em vietnamita (Ho Chi Minh): vietnamita de Hanoi /ɛn, en, in/ [ɛn, en, in] /ɛŋ, eŋ, iŋ/ [aŋʲ, eŋʲ, iŋʲ] /ɛt, et, it/ [ɛt, et, it] /ɛk, ek, ik/ [akʲ, ekʲ, ikʲ] /an, ɔn, on, ɨn.../ [an, ɔn, on, ɨn...] /aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ.../ [aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ...] /at, ɔt, ot, ɨt.../ [at, ɔt, ot, ɨt...] /ak, ɔk, ok, ɨk.../ [ak, ɔk, ok, ɨk...]

vietnamita de Ho Chi Minh /ɛn, en, in/ [ɛn, ɘn, ɨn] /ɛn, en, in/ [ɛn, ɘn, ɨn] /ɛt, et, it/ [ɛt, ɘt, ɨt] /ɛt, et, it/ [ɛt, ɘt, ɨt] /aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ.../ [aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ...] /aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ.../ [aŋ, ɔŋ, oŋ, ɨŋ...] /ak, ɔk, ok, ɨk.../ [ak, ɔk, ok, ɨk...] /ak, ɔk, ok, ɨk.../ [ak, ɔk, ok, ɨk...]

Jê do Cerrado (“Jê Amazônicos”) PJA

PJS

PJC

*-pᵊ *-tᵊ *-cᵊ *-kᵊ *-ɾᵊ *-bⁿᵊ *-dⁿᵊ *-gⁿᵊ *-j *-bⁿ

*-pᵊ *-tᵊ *-cᵊ *-kᵊ *-ɾᵊ *-∅ *-∅ *-∅ *-∅ *-bⁿᵊ

*-pV / *-ːbV *-tV / *-ːdV *-tsV *-∅ / *-kV *-ɾV / *-ːɾV *-∅ / *-mV + nas. *-∅ / *-nV + nas. *-∅ / *-kV *-j / *-∅ *-b / *-m / *-∅

(PJA *tɛpᵊ, PJS *tɛpᵊ, PJC *tepe / *teːbe ‘peixe’) (PJA *ⁿbutᵊ, PJS *ⁿbutᵊ, PJC *butu / *buːdu ‘pescoço’) (PJA *ⁿbɛcᵊ, PJS *ⁿbɛcᵊ, PJC *petse ‘bom’) (PJA *tikᵊ, PJS *tikᵊ, PJC *di / *diki ‘estômago’) (PJA *paɾᵊ, PJS *paɾᵊ, PJC *paɾa / *paːɾa ‘pé’) (PJA *kobⁿᵊ, PJS *ko, PJC *ku / *kɔ̃mɔ̃ ‘chifre, árvore’) (PJA *ⁿbɯdⁿᵊ, PJS *ⁿbɯ, PJC *bɨ / *mɨ̃nɨ̃ ‘pescoço’) (PJA *ⁿbogⁿᵊ, PJS *ⁿbo, PJC *pu / *puku ‘lagoa’) (PJA *ⁿgoj, PJS *ⁿgo, PJC *kuj / *ku ‘água’) (PJA *tʌbⁿ, PJS *tʌbⁿᵊ, PJC *tɛb / *tɛm / *tɛ ‘novo’)

Jê Meridional • Só permite /m/, /n/, /ɲ/, /ŋ/, /ɾ/, /j/, /w/ em coda. • Correspondências entre o PJM e o PJA: • • • • •

PJA *-bⁿᵊ, *-dⁿᵊ ~ PJM *-∅ PJA *-pᵊ, *-tᵊ, *-kᵊ ~ PJM *-∅ + bloqueio de apofonia (Nikulin 2015) PJA *-bⁿ ~ PJM */ŋ/ PJA *-ɾᵊ ~ PJM */n/ (?) PJA *-j ~ PJM */j/ (?)

Jê Meridional • Sufixo ampliador de valência

• transforma /-w/ em /-m/, /-j/ em /-ɲ/, /-ɾ/ em /n/ PJM *ⁿgɔwᵊ /ŋɔw/ ‘quebrado’ > PJM *ⁿgabⁿ /ŋam/ ‘quebrar’ PJM *ⁿbɾɤjᵊ /mɾɤj/ ‘quebrado’ > PJM *ⁿbɾʌɟⁿ /mɾʌɲ/ ‘quebrar’ PJM *kʌɾᵊ /kʌɾ/ ‘acabado’ > PJM *kadⁿ /kan/ ‘acabar’

• alomorfe imprevisível depois de vogais

PJM *kuɬɯ /kuɬɯ/ ‘pesado’ > PJM *kuɬɯgⁿ /kuɬɯ-ŋ/ ‘pesar’ PJM *ⁿdɯ /nɯ/ ‘rir’ > PJM *ⁿdɯdⁿ /nɯ-n/ ‘fazer rir’ PJM *pʌɬʌ /pʌɬʌ/ ‘mamar’ > PJM *pʌɬabⁿ /pʌɬa-m/ ‘dar de mamar’ PJM *ɾakɛ /ɾakɛ/ ‘tarde’ > PJM *ɾakaɟⁿ /ɾaka-ɲ/ ‘entardecer’

Jê e Maxakalí • Correspondências entre segmentos (os mais seguros): PJA *pᵊ PJA *bⁿᵊ PJA *bⁿ PJA *ɾᵊ PJA *jᵊ

PJS *∅ PJS *∅ PJS */ŋ/ PJS */n/ ? PJS */j/ ?

Maxakalí p Maxakalí p Maxakalí p Maxakalí t Maxakalí c

• Muitos casos de correspondências do tipo PJA *∅

PJS *∅

Maxakalí p, t, c, k

Jê e Maxakalí • Hipótese: • existiam PJ *-p, *-t, *-k, -c em correspondência com Maxakalí p, t, k, c • essas consoantes foram apagadas em todas as línguas Jê, mas a qualidade delas pode ser reconstruída através do alomorfe do sufixo ampliador de valência em PJM: • • • • • • •

Maxakalí cɨp ~ PJ *cop ‘chupar’ (PJM */=ɬʌ/ > */=ɬa-m/ ‘dar de mamar’) Maxakalí cit ~ PJ *=cet ‘fio’ (PJM */=ɬe/ > */=ɬɛ-n/ ‘fiar’) Maxakalí kɨtok ~ PJ *kɾak ‘filho’ (PJM */kɾã/ > */kɾã-ŋ/ ‘dar a luz’) Maxakalí =cɛt-ʔac ~ PJ *ci=jit / *ji=jit ‘nome’ (PJM */ɬiji / jiji/ > */jiji-n/ ‘dar nome’) Maxakalí catit ~ PJ *caɾet / *jaɾet ‘raiz’ (PJM */ɬaɾe / jaɾe/ > */jaɾɛ-n/) Maxakalí ɲɨ̃m ~ PJ *ɲʌ̃p ‘sentar-se’ (PJM */nɪ̃/ > */nɪ̃-m/ ‘colocar sentado’) Maxakalí kɨt ~ PJ *ⁿgot ‘piolho’ (PJM */ⁿgʌ/ > */ⁿga-n/ ‘carunchar’)

Jê e Maxakalí • Contudo, há exceções: • Maxakalí cap ~ PJ *cɯbⁿᵊ ‘semente’ (PJM */ɬɯ/ > */ɬɯ-n-ɬɯ-n/ ‘ensementar’) • Maxakalí kɨtɛc ~ PJ *ⁿgɾɛ ‘cantar, dançar’ (PJM */ⁿgɾɛ-n/) • Maxakalí mõŋ ~ PJ *mũ ‘ir.PL’ (PJM */mũ/ > */mũ-n/ ‘mover.PL’)

• Possíveis soluções: • analogia • sílabas abertas na proto-língua

Proposta de Ribeiro (2012) • Ribeiro observa que alguns empréstimos de outras línguas apresentam acréscimo de consoante final não etimológica e conclui que as codas Maxakalí que correspondem a zero no Proto-Jê são de origem secundária. • • • • • • • •

ãmãdɛc ‘sacerdote’ ãbic ‘agulha’ taɲũbak ‘dinheiro’ kapɛc ‘café’ kamadok ‘cavalo’ kobɛdok ‘cobertor’ pɛ̃ɲɔ̃ŋ ‘feijão’ kapitɔ̃ŋ ‘capitão

< Tupí abaré < Tupí abi < Tupí itajúba

Proposta de Ribeiro (2012) • Ribeiro não considera os dados morfofonológicos das línguas Jê Centrais; a reconstrução das codas silábicas Jê que ele usa não explica os dados das línguas Jê Centrais e Meridionais • A existência de correspondências entre o Maxakalí, as línguas Jê Meridionais e o Krenák apresentadas contradiz a hipótese de Ribeiro.

Conclusão • Os dados do Maxakalí e do Krenák, assim como os dados morfofonológicos de outras línguas Macro-Jê, são essenciais para a reconstrução fonológica do Proto-Macro-Jê. • É necessário considerar ainda os dados das línguas extintas das famílias Maxakalí e Krenák que carecem de estudos fonológicos. Os dados do Pataxó Hã-hã-hãe são particularmente interessantes. • As línguas Macro-Jê Ocidentais normalmente não admitem sílabas fechadas com a exceção do Rikbáktsa (apenas -k em coda) e possivelmente Ofayé (apenas -ʔ em coda). A origem das consoantes finais nestas línguas é desconhecida.

Referências • Nikulin, Andrey. 2015. Apofonia e sistema vocálico do Proto-Jê Meridional: contribuição para estudos comparativos das línguas Jê. Revista Brasileira de Linguística Antropológica 7(2). Brasília: UnB. • Ribeiro, Eduardo Rivail. 2012. Final consonants in Maxakalí and their comparative status. LIAMES 12. Campinas: UNICAMP. • Silva, Mário André Coelho da. 2015. A coda consonantal em Maxakalí. Campinas: UNICAMP

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