Coesão Social: O caminho de Portugal

June 14, 2017 | Autor: Bruno Oliveira | Categoria: Public Policy - Social Welfare Policy
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Oliveira, Bruno (2015), Coesão social: O caminho de Portugal – recensão critica do artigo An evaluation of the social and employment aspects and challenges in Portugal, de Claudia Valente e Paulo Marques, Policy Note (Janeiro de 2014)

Coesão Social: O caminho de Portugal Recensão crítica do artigo An evaluation of the social and employment aspects and challenges in Portugal Bruno Oliveira1 ISCTE-IUL

O caminho faz-se caminhando. Esta frase podia muito bem ser utilizada para descrever o longo caminho que Portugal tem pela frente em matéria de emprego e coesão social. Para perceber esta questão, os autores deste artigo fizeram uma análise das políticas conduzidas em matéria de emprego e coesão social e o seu impacto no mercado de trabalho e na economia portuguesa, relacionando com a estratégia da Europa 2020 e com as convenções da OIT2, argumentando que estas políticas estão a pôr em risco a estratégia da Europa 2020. Vejamos, relativamente à criação de emprego, Portugal está muito longe de atingir os objetivos europeus. De 2005 a 2012 Portugal desceu de 72.3% para 66.5% na taxa de emprego. O desemprego atinge, sobretudo, as gerações mais jovens atrasando a sua transição para a vida ativa, ao mesmo tempo que expõe ex-trabalhadores a um desemprego de longa duração. Por este motivo, a emigração de jovens torna-se hoje motivo de debate público, tendo em conta a seu impacto na economia portuguesa. Associado à criação de emprego estão os objetivos sociais de reduzir o número de

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Licenciado em Sociologia pelo ISCTE-IUL (Lisboa, Portugal). Mestrando em Politicas de desenvolvimento em Recursos Humanos pela mesma instituição. 2 OIT - Organização Internacional do Trabalho, agência da Organização das Nações Unidas especializada em questões do trabalho.

indivíduos em risco de pobreza ou exclusão social3. O objetivo da estratégia 2020 para Portugal é de reduzir o número de pessoas em risco de pobreza em cerca de 200 000 até 2020. Contudo, nada indica que este objetivo se irá concretizar tendo em conta que o número de pessoas nesta situação aumentou em cerca de 64 000, entre 20114 e 2012. Durante a aplicação do memorando de entendimento negociado com a Troika5 puseram-se em causa as convenções da OIT6. Desde 2011 houve um declínio no número de acordos coletivos de trabalho o que, segundo Lima (2013), é mesmo visto como fazendo parte de uma nova estratégia dos empregadores (cit. por Valente e Marques, 2014), que passa por substituir a contratação coletiva por novos contratos, em linha com o novo código do trabalho, que reflete uma nova tendência, a de flexibilização laboral. Quanto ao salário mínimo nacional (SMN), foi alvo de grande contestação por parte dos sindicatos (UGT e CGTP). Em Dezembro de 2006 foi estabelecido, entre o Governo e os parceiros sociais, que o SMN iria aumentar para 500€ em 2011. No entanto, à revelia da consulta dos parceiros sociais e das orientações da OIT, assim não aconteceu, ficando este pelos 485€ até hoje (2014) com base no argumento que uma subida do SMN iria ter um impacto negativo no emprego. Para além do congelamento do SMN, o Governo implementou medidas mais rígidas de acesso à proteção social, o que fez com que houvesse um decréscimo no número de beneficiários, o que representou um acréscimo no número de indivíduos em risco de pobreza. O diálogo social desde 2008 que tem sido ocupado pelo conflito social. Houve várias manifestações organizadas pelos sindicatos (UGT e CGTP) e sociedade civil (Movimento 12 de Março de 2011) contra as políticas seguidas pelo Governo. Estas constituíram a maior onda de protestos desde o 25 de Abril de 1974. Aliás, desde 1974 que as manifestações eram organizadas exclusivamente pela CGTP, mas em 2010 a UGT também se uniu na onda de protestos, passando a introduzir um novo elemento no sistema das relações industriais portuguesa e no paradigma de contestação politica sindical. 3

Novo indicador criado pelo Eurostat para medir a pobreza (desde 2010) que contempla três sub-indicadores: O número de pessoas em risco de pobreza após as transferências sociais, o número de pessoas em privação material severa e o número de pessoas abaixo dos 60 anos que vivem em agregados com baixa intensidade de trabalho. 4 2011, data em que o memorando de entendimento com a Troika foi assinado. 5 Troika - Formação constituída pela comissão Europeia, Banco Central Europeu (BCE) e Fundo Monetário Internacional (FMI), responsável pela monetarização do “programa de ajustamento económico e financeiro” que está a ser implementado em Portugal, como condição para a ajuda financeira solicitada pelo Governo português em 7 de Abril de 2011. 6 A convenção sobre o direito à negociação coletiva (No 98), a convenção sobre a fixação do salário mínimo (No 131) e a convenção sobre a segurança social (No 102).

Podemos, assim, concluir que o Governo português e a Troika parecem seguir uma politica do contraditório com as orientações da OIT e os objetivos da Europa 2020, pois se é objetivo da EU reduzir o número de pessoas em situação de pobreza, o facto de limitar o direito à contratação coletiva e promover novas formas de trabalho precário constitui um bloqueio aos objetivos da Europa 2020. O projeto Europa 2020 pretende corrigir isto ao querer trazer mais indivíduos para o mercado de trabalho de forma a reduzir o risco de pobreza, no entanto, aquilo a que assistimos é que à medida que o desemprego aumenta, o número de beneficiários de proteção social diminui (INE, 2014), ou seja, quando esta proteção é mais necessária face à vicissitude de ficar sem rendimentos, é quando esta proteção falha, empurrando um número maior de pessoas para a pobreza. Em vez de proteger quem está menos protegido, afeta quem mais precisa. Mesmo os que arranjam trabalho, são trabalhos com contratos precários e de baixo salário, que os tornam nos novos “trabalhadores pobres”. No entanto, parece ser esta a política do governo com base no argumento que o problema do desemprego não advém da falta de crescimento económico e da criação de emprego, mas sim da falta de rotatividade entre os empregos existentes, o que equivale a dizer que para ajudar e proteger todos aqueles que procuram trabalho, é necessário ajudar e proteger menos quem tem trabalho. Passam para o individuo a culpa do desemprego, desresponsabilizando o Estado desse dever (Morel et al, 2011: 12 e 13). Um dos grupos mais afetados são os jovens, que votados a estes trabalhos ou ao desemprego acabam por voltar para casa dos pais ou nem logram em sair de casa destes, dando aso à “famíliaprovidência” (Alves et al, 2011), em contraste com a ausência do Estado-providência que não está lá para eles. Face a este cenário, os jovens emigram, não apenas para fugir ao desemprego e precariedade a que foram votados, mas sobretudo, para concluírem a transição para a vida adulta, pois no Pais Natal apenas conseguiam ser jovens, isto é, incertos e intermitentes (Lopes, 2014). No final, quem restará para financiar o Estado Social? Num País marcado pelo envelhecimento e baixa natalidade.

Referências bibliográficas:

- ALVES, Nuno de Almeida, CANTANTE, Frederico, BAPTISTA, Inês, CARMO, Renato Miguel do (2011), Jovens em transições precárias – trabalho, quotidiano e futuro, Lisboa, Editora Mundos Sociais. - LOPES, João Teixeira et al (2014), “Geração Europa?”: Um estudo sobre a jovem emigração qualificada para França, Instituto de Sociologia da Universidade do Porto. - MOREL, Nathalie, PALIER, Bruno e PALME, Joakim (2011), Towards a social a investment state?: Ideas, policies and challenges. Policy Press. - Portal de internet INE (2014), http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&indOcorrCod=0004350&c ontexto=bd&selTab=tab2 - VALENTE, Ana Cristina e MARQUES, Paulo (2014), An Evaluation of the Social and Employment Aspects and Challenges in Portugal, Policy Note requested by the European Parliament’s Employment and Social Affairs Committee.

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