Como as Tecnologias de Informação e Comunicação em Saúde podem contribuir para o processo de empoderamento dos pacientes psiquiátricos?

June 15, 2017 | Autor: Eduardo Guagliardi | Categoria: Psychiatry, Mental Health, Health Informatics, Patient Empowerment
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Como as Tecnologias de Informação e Comunicação em Saúde podem contribuir para o processo de empoderamento dos pacientes psiquiátricos? Eduardo Cesar Guagliardi1 Fabio Teixeira 2

1.

Graduação em Medicina. Faculdade de Medicina – UFRJ, Rio de Janeiro, (RJ), Brasil. Especialista em Psiquiatria pela Associação Brasileira de Psiquiatria

2.

Doutorando e Mestre em Ciências. Programa de Pós-graduação em Gestão e Informática em Saúde – PPGIS, Universidade Federal de São Paulo, (SP), Brasil

Resumo: O presente estudo tem por finalidade fazer uma revisão bibliográfica na literatura acerca do tema do empoderamento dos pacientes psiquiátricos, à luz das novas tecnologias de informação e comunicação aplicadas ao campo da saúde. Este estudo procura lançar algumas reflexões sobre como estas tecnologias poderiam contribuir, efetivamente, para que pacientes psiquiátricos adquirissem maior controle e poder sobre seus processos de tratamento, aumentando com isso a adesão e qualidade do cuidado médico dispensado. A literatura médica já conta com um número expressivo de trabalhos enfocando o tema do empoderamento dos pacientes, em geral. A introdução das tecnologias de informação e comunicação nos serviços de saúde mental, no entanto, é um fenômeno relativamente recente. Sendo assim, estudos investigando especificamente o papel destas novas tecnologias sobre o processo de empoderamento dos pacientes psiquiátricos ainda são relativamente difíceis de serem encontrados, mesmo fora do Brasil. Esta revisão pretende assim dar uma contribuição à discussão sobre o papel e alcance das tecnologias de informação e comunicação na área da saúde mental. Descritores (MeSH Terms): Community Networks; Consumer Participation/trends; Delivery of Health Care/trends; Medical Informatics/trends; Patient Participation/methods; Formatado: Inglês (EUA)

Introdução: O impacto das novas tecnologias de informação e comunicação sobre a sociedade vem sendo estudado em diversas áreas. Em áreas complexas, como a saúde, estes impactos são especialmente difíceis de serem investigados uma vez que existem múltiplos fatores e atores envolvidos. A introdução de novas tecnologias nos serviços de saúde já vem ocorrendo há algumas décadas, ainda que de modo desigual se considerarmos a região ou país onde esse processo ocorre. As diferenças também ocorrem conforme a área da saúde em questão, percebendo-se que algumas especialidades médicas já adotam

avançados recursos tecnológicos enquanto que outras ainda não. Seja por barreiras culturais ou por dificuldades orçamentárias, a área da saúde mental parece exibir, em todos os países, certo atraso em se tratando de introdução de novas tecnologias de informação e comunicação. No Brasil, especificamente, a área da saúde mental, tinha até recentemente seu modelo de atenção e cuidados psiquiátricos concentrado em grandes hospitais com características asilares e caracterizados pelo baixíssimo investimento em infraestrutura, tecnológica inclusive. Nos últimos anos, serviços substitutivos como os “Centros de Atenção Psicossocial” (CAPS) tem apresentado forte expansão, imprimindo novas práticas, valores e conceitos na assistência psiquiátrica baseados na humanização dos cuidados e no empoderamento dos pacientes, entre outros aspectos(1) . No que tange às tecnologias, estes novos serviços caracterizam-se por um modelo de gestão que pressupõe o emprego de recursos informatizados para o envio de dados administrativos aos sistemas de informação em saúde atualmente existentes. Entretanto, programa oficial de avaliação destes novos serviços constatava, em 2008/2009, que apenas 50% dos serviços pesquisados em todo o país contavam com computadores e acesso à internet (1). Neste mesmo período, um edital foi lançado visando o desenvolvimento de pesquisas em gestão e organização da atenção, com ênfase, entre outros pontos, na investigação de sistemas de informação e produção de indicadores de qualidade e cobertura, revelando portanto a preocupação em dotar a área da saúde mental de novas ferramentas de gestão. Mesmo em outros países onde a introdução de recursos tecnológicos na saúde pública ocorreu há mais tempo, relativamente poucos estudos conseguiram, até o momento, acompanhar o impacto destas tecnologias sobre os usuários dos serviços de saúde mental e entender como estes recursos poderiam ser melhor utilizados, por exemplo aumentando a adesão dos pacientes aos tratamentos propostos. Da mesma forma que a adoção de tecnologias de informação de saúde é vista como poupadora de recursos, existe a ideia de que pode contribuir, direta ou indiretamente, para o empoderamento dos pacientes. No entanto, pacientes psiquiátricos apresentam algumas particularidades e o uso que estas pessoas fazem, por exemplo, de redes sociais e da internet ainda precisa ser melhor elucidado com vistas ao desenvolvimento de estratégias, produtos e serviços a elas voltados e que de fato as empodere (2). Como estes serviços substitutivos entre nós são relativamente recentes e a incorporação de recursos tecnológicos em sua gestão e funcionamento mais recente ainda, não existem estudos analisando este processo nem seus resultados (3). É certo que uma vez integrados, mesmo que parcialmente, aos sistemas de informações em saúde do país, estes serviços de saúde mental se tornem aptos, por exemplo, a produzirem estatísticas confiáveis quanto aos tipos de atendimentos realizados disponibilizando tais dados para pesquisas, caracterizando-se um primeiro momento de uso das tecnologias em saúde, voltado às demandas administrativas. Num segundo momento, tanto os profissionais de saúde como os usuários destes serviços devem começar a experimentar alguns recursos ou ferramentas, como prontuários eletrônicos, prescrições eletrônicas, sites ou redes

sociais específicas para interação entre terapeutas e usuários etc. No entanto, alguns fatores como a falta de alfabetização digital, os limitados recursos econômicos da população atendida pelos serviços públicos de saúde para adquirir equipamentos e serviços de internet, entre outros motivos, podem vir a retardar ou comprometer esta etapa. Estudo realizado, por exemplo, entre pacientes psiquiátricos pertencentes a grupos étnicos minoritários e provenientes de serviços comunitários de saúde mental, na Grã-Bretanha, discutindo o que chamou de “divisão digital”, mostrou que estas mesmas pessoas, embora tenham interesse pelo uso de novas tecnologias, podem necessitar de suporte especial para se engajarem como ativos usuários destes recursos(4), salientando-se a importância de medidas específicas de inclusão digital para este grupo. A própria introdução das tecnologias de informação e comunicação na área da saúde passou por transformações nos últimos anos. Assim como ocorreu noutras áreas, as inovações trazidas pela chamada web 2.0, aumentando a interação e participação das pessoas, também repercutiram na saúde e impactaram diretamente na forma como as tecnologias são vistas e usadas, tanto por pacientes como por profissionais de saúde. As possibilidades de interação e participação trazidas, por exemplo, pelas redes sociais, a ampliação do acesso à internet, sobretudo a partir dos dispositivos móveis e seus aplicativos, assim como um rápido e vertiginoso processo de incorporação de novos usuários de produtos e serviços tecnológicos, sobretudo nos grandes centros urbanos do país - tudo isso contribuiu para transformar simples usuários em verdadeiros consumidores críticos das tecnologias empregadas em todos os setores da vida diária, inclusive na saúde. Mais do que isso, e muitos estudos já ressaltam este ponto, a web 2.0 na saúde oferece, na verdade, condições ideais para que pacientes adquiram e desenvolvam empoderamento, assumindo assim controle sobre sua saúde e tratamento (5). No entanto, a incorporação dessas e de outras inovações tecnológicas nos serviços de saúde mental da rede pública, pode vir a representar um desafio uma vez que estes serviços pouco ou quase nada parecem se basear no emprego de tecnologias materiais. Sobretudo na última década, a partir da substituição dos grandes hospitais e centros ambulatoriais por serviços abertos à comunidade, como é o caso dos CAPS, pode-se perceber que a ênfase está concentrada nas chamadas “tecnologias não-materiais”, como o vínculo e o acolhimento - que prescindem do suporte das novas tecnologias de informação e comunicação – em detrimento do emprego de programas ou sistemas computacionais(6), um aspecto majoritariamente ausente nos materiais pesquisados. Nesta revisão, pretende-se discutir o conceito do empoderamento(7) - entendido como uma filosofia dos cuidados de saúde onde os pacientes são estimulados a tomar parte ativa no próprio gerenciamento de seus tratamentos – articulado às consequências do uso das tecnologias de informação e comunicação em saúde. Em particular, a abordagem desta revisão escolheu tratar do tema do empoderamento de pacientes psiquiátricos sob este novo prisma, buscando reunir estudos recentes realizados com este grupo, na realidade ainda muito pouco estudado. Através da

apresentação e discussão de alguns trabalhos que mostram o empoderamento de pacientes psiquiátricos como resultado do uso de tecnologias de informação e comunicação, pretende-se demonstrar a enorme importância destas tecnologias materiais para a área bem como a necessidade de se promover rapidamente uma profunda inclusão digital tanto de profissionais de saúde mental como de usuários destes serviços. Método: Estudo de revisão de literatura realizado com artigos publicados no período de 2008 à 2013, coletados na base de dados do PubMed, Scielo, ICMCC, JMIR e BVSMS . A busca inicialmente pensada giraria em torno de estudos tratando do tema do empoderamento de pacientes. A imensa maioria dos artigos retornados utilizando-se do termo em inglês patient empowerment não fazia menção ao emprego de tecnologias de informação e comunicação em saúde e de suas consequências sobre o chamado empoderamento de pacientes. Este aspecto dizia respeito principalmente aos artigos mais antigos, anteriores à 2008, sendo o conceito do empoderamento abordado por um viés psicológico e relacionado à relação médico-paciente e suas estratégias. Percebemos a necessidade de ajustarmos o período de pesquisa para o mais recente possível, aumentando-se assim as possibilidades de se encontrar artigos tratando do tema do empoderamento relacionando-o à introdução das tecnologias de informação e comunicação, fenômeno sabidamente mais recente, ao menos em seus impactos estudados. Do mesmo modo, a imensa maioria dos estudos encontrados era sobre pacientes portadores de doenças crônicas, um grupo distinto daquele escolhido por nós, o dos pacientes psiquiátricos, muito embora sejam os transtornos mentais condições crônicas (estes resultados estavam concentrados em torno do termo MeSH Chronic Disease/psychology) . A pesquisa a partir de termos genéricos como patient empowerment precisou ser ajustada na direção de estudos concentrados na área da saúde mental, daí a combinação de alguns termos (do vocabulário MeSH) como Psychiatry/trends, Delivery of Health Care/trends e Mental Health Services/standards , tentando-se com isso captar novas tendências surgidas na área, nos últimos anos. Outros dois termos utilizados foram Medical Informatics/methods e Medical Informatics/trends. Em paralelo às pesquisas tratando do empoderamento motivado na área da saúde pelo uso das tecnologias, foi ficando evidente que seria preciso ajustar os termos que pudessem fazer referência às tecnologias, especificando que tipo de tecnologia (e seus impactos) queríamos estudar. Ainda que a introdução de tecnologias de informação e comunicação em serviços de saúde não seja, na verdade, um fenômeno tão recente, o que este estudo de revisão pretendia levantar dizia respeito mais aos efeitos do uso da chamada web 2.0 na área da saúde mental. A busca, portanto, por artigos tratando genericamente do tema “tecnologias e saúde mental” precisou ser ajustada para termos mais específicos que pudessem retornar artigos mais próximos de nossos objetivos. Alguns termos que retornaram

artigos utilizados nesta revisão: Community Networks e Consumer Participation/trends. O primeiro, por fazer referência ao funcionamento em rede e ao uso de redes sociais em saúde. O segundo termo do vocabulário MeSH retornou artigos abordando o aspecto participativo dos novos usuários dos serviços de saúde, à semelhança do comportamento exibido por consumidores de outros serviços onde as tecnologias são empregadas. Resultados: Os artigos encontrados e selecionados para a leitura completa encontram-se sistematizados no Quadro 1. A seguir serão relatados os dez artigos selecionados para o presente estudo. Em 2008, um estudo(7) analisou as implicações do uso das tecnologias de comunicação e informação no empoderamento de pacientes através de uma revisão sobre alguns de seus aspectos centrais - o Registro Eletrônico de Saúde, o telecuidado e as redes sociais de pacientes - dentro do contexto dos recentes desenvolvimentos da Saúde 2.0. Empoderamento de pacientes, segundo os autores, descreve uma situação em que os cidadãos são encorajados a tomar uma parte ativa em seu próprio gerenciamento de saúde. Empoderamento é uma filosofia de cuidados de saúde, com o entendimento de que ótimos resultados de intervenções são obtidos quando os pacientes se tornam ativos participantes no processo. A ênfase é o envolvimento individual em processos de tomada de decisão em saúde. Neste artigo, destaca-se o papel fundamental dos recursos envolvidos na telemedicina no que diz respeito ao empoderamento dos pacientes. Alguns questionamentos são levantados: - Haverá de fato interesse dos pacientes em serem monitorados e enviarem dados a todo momento, através de diferentes dispositivos eletrônicos? - Qual o papel que as redes sociais de pacientes podem começar a ter no direcionamento das pesquisas médicas? Num outro estudo de revisão(5), realizado mais recentemente, em 2013, os autores partem do termo “empoderamento dos pacientes” para uma pesquisa na literatura sobre as abordagens que vem sendo utilizadas neste sentido. Os autores ressaltam, já de início, que embora o empoderamento de pacientes tenha implicações psicológicas, a revisão da literatura que se propõem a fazer diz respeito ao emprego da tecnologia com este propósito. Os resultados mostram que abordagens práticas para empoderar os pacientes variam de escopo, objetivo e tecnologia. Alfabetização em saúde dos pacientes, acesso remoto aos serviços de saúde e mecanismos de auto-cuidados são os meios mais valorizados para se atingir o empoderamento. Segundo os autores, embora a tecnologia atual já permita estabelecer os primeiros passos do caminho, uma mudança de atitude de todas as partes interessadas (profissionais, pacientes, autoridades etc) é necessária.

Em artigo escrito em 2010(8), os autores procuram distinguir os termos “Health 2.0” e “Medicine 2.0” que geralmente são associados ao uso das tecnologias de informação e comunicação em saúde . Segundo os autores, estes termos acabam sendo usados de maneira indistinta para definir a utilização dos recursos da chamada web 2.0 no campo da saúde. Não existe um consenso sobre o que caracteriza cada um dos termos, havendo ocasiões em que até outros termos são utilizados para definir a mesma coisa. Em 2008, um outro estudo(9) já havia abordado a adoção das chamadas "tecnologias web 2.0", ressaltando a importância destas tecnologias no desenvolvimento da grande área de "e-health" (saúde eletrônica). O autor destacara que o uso destas tecnologias coincidia com o surgimento de plataformas pessoais de saúde e Registros Pessoais de Saúde (como o Microsoft HealthVault). De acordo com o artigo, aplicativos, serviços e ferramentas "medicina 2.0" são definidas como serviços baseados na web para consumidores de cuidados de saúde, cuidadores, pacientes, profissionais de saúde e pesquisadores biomédicos, que usam as tecnologias web 2.0 para possibilitar e facilitar especificamente: 1)redes sociais, 2) participação, 3)apomediação, 4)abertura e 5)colaboração, dentro e entre estes grupos de usuários. Neste artigo, são destacadas justamente as características fundamentais da web 2.0 que podem contribuir para o empoderamento dos pacientes-usuários. Analisando especificamente o papel das tecnologias empregadas na telessaúde/telemedicina no processo de empoderamento de pacientes psiquiátricos, os autores de um estudo publicado em 2013(10) afirmam que as tecnologias digitais estão cada vez mais direcionadas a melhorar o acompanhamento, gestão e tratamentos em saúde mental. No entanto, em seu entendimento, a sua potencial contribuição para as redes sociais e suporte de auto-gestão para as pessoas diagnosticadas com uma doença mental grave raramente tem sido considerada. Esta avaliação e meta-síntese teve como objetivo analisar os processos de engajamento e relevância percebida e a adequação das intervenções de telessaúde para pessoas com um diagnóstico de esquizofrenia. A revisão aborda três questõeschave: Como é o uso de tecnologias de comunicação digital enquadrado na literatura psiquiátrica? Como podem os benefícios reconhecidos da telessaúde serem traduzidos para as pessoas com diagnóstico de esquizofrenia? Qual é a perspectiva do usuário, relativo à Internet e tecnologias de comunicação? Também em 2013, um estudo brasileiro(6) realizado num Centro de Atenção Psicossocial e num Centro de Convivência investigou o conceito de empoderamento entre usuários de serviços de saúde mental, familiares e profissionais, constatando diferentes níveis de compreensão do conceito entre estes grupos. Neste trabalho, o empoderamento é relacionado às tecnologias não-materiais baseadas no vínculo e no acolhimento e é estratégia fundamental para a chamada Reforma Psiquiátrica em curso no país. Em 2009, outro estudo brasileiro já havia abordado a avaliação da estrutura de Centros de Atenção Psicossocial no município de São Paulo, procurando descrever

a estrutura física, recursos humanos e modalidades de atenção existentes nestes novos serviços (3). Em 2010, em relatório de gestão divulgado pelo Ministério da Saúde sobre a saúde mental, são reunidos os diversos programas em curso e apresentados os dados de expansão da cobertura assistencial, com destaque para a expansão dos Centros de Atenção Psicossocial em todas as regiões do país (1). Em 2012 foi publicado um artigo sobre a chamada “divisão digital” na saúde mental(4). O artigo destaca que embora a adoção de novas tecnologias seja crescente, existe o perigo de que aqueles que não tenham acesso à ela ou que não a usem possam acabar não se beneficiando das inovações trazidas pelas tecnologias de informação em saúde, gerando assim uma divisão (ou brecha) digital. Os autores questionam resultados de outros estudos em que se afirma que aqueles que não se engajam nas novas tecnologias seriam “auto-excludentes” e destacam a necessidade de suporte especial para grupos minoritários e usuários idosos, na introdução de recursos informatizados em serviços de saúde mental. Já em 2010 um estudo havia investigado como pacientes esquizofrênicos usavam a internet para buscar informações relacionadas à sua doença(2). Nesta publicação, os autores mostram que o uso que estes pacientes fazem da internet não difere muito da forma como pessoas que não apresentam transtornos mentais o fazem. Os autores destacam algumas particularidades do quadro esquizofrênico como inabilidade de lidar com grandes volumes de informação, dificuldades de concentração entre outras, ressaltando que estas dificuldades vão acompanhar o uso das tecnologias. Além disso, destacam que a informação através da Internet foi subjetivamente percebida como tendo o potencial de mudar significativamente as atitudes dos pacientes em relação à medicação e suas relações com os médicos.

Quadro 1. Artigos encontrados nas bases de dados PubMed, Scielo, ICMCC, JMIR e BVSMS sobre Empoderamento de Pacientes Psiquiátricos, seus objetivos e resultados Artigo How technology is empowering patients? A literature review

Base de dados PubMed

Objetivo Esclarecer como a tecnologia está sendo aplicada para aumentar o empoderamento do paciente, tendências e marcos atuais (e futuros) deste aspecto.

Definition of Health 2.0 and Medicine 2.0: A Systematic Review

PubMed

Identificar as definições únicas de Saúde 2.0/Medicine 2.0 e temas recorrentes dentro das

Resultados Os resultados indicam que abordagens práticas para capacitar pacientes variam em escopo, objetivo e tecnologia. Alfabetização em saúde dos pacientes, o acesso remoto a serviços de saúde, e de mecanismos de autocuidado são as formas mais valorizadas para realizar o empoderamento do paciente. Saúde 2.0/Medicina 2.0 ainda são áreas em desenvolvimento. No entanto, ainda não há um

definições.

consenso geral sobre a definição de Saúde 2.0/Medicina 2.0. Os autores analisam as implicações do uso das tecnologias de comunicação e informação no empoderamento de pacientes através de uma revisão sobre alguns de seus aspectos centrais - o Registro Eletrônico de Saúde, o tele-cuidado e as redes sociais de pacientes dentro do contexto dos recentes desenvolvimentos da Saúde 2.0.

Patient 2.0 Empowerment

ICMCC

Analisar as implicações do uso das tecnologias de comunicação e informação no empoderamento de pacientes

Medicine 2.0: Social Networking, Collaboration, Participation, Apomediation, and Openness

PubMed e JMIR

Analisar as tecnologias web 2.0 no contexto da saúde, destacando seus principais aspectos e utilidades

O artigo aborda a adoção das chamadas "tecnologias web 2.0" ressaltando a importância destas tecnologias no desenvolvimento da grande área de "e-health" (saúde eletrônica).

A visão de usuários, familiares e profissionais acerca do empoderamento em saúde mental

Scielo

Discutir o processo do empoderamento de pacientes psiquiátricos no contexto da Reforma Psiquiátrica e de seus serviços substitutivos

What is the potential for social networks and support to enhance future telehealth interventions for people with a diagnosis of schizophrenia: a critical interpretive synthesis

PubMed

Analisar o uso da internet por pacientes esquizofrênicos visando desenvolver intervenções de telessaúde para este grupo

O artigo apresenta “tecnologias não materiais” baseadas no vínculo e no acolhimento, destacando diferentes níveis de compreensão do empoderamento entre usuários, familiares e profissionais dos serviços. Pessoas com diagnóstico de esquizofrenia ou psicose usam a Internet principalmente para fins de divulgação e coleta de informações. Mais pesquisas precisam determinar os mecanismos pelos quais intervenções de telessaúde podem ser potencialmente benéficas ou prejudiciais para o engajamento e a gestão de pessoas com um diagnóstico de esquizofrenia

How Patients With

JMIR

Investigar a natureza e as

Os resultados do estudo

Schizophrenia Use the Internet: Qualitative Study

consequências subjetivas do uso da Internet relacionadas com a saúde entre pacientes com esquizofrenia.

Saúde Mental no SUS: as novas fronteiras da Reforma Psiquiátrica. Relatório de Gestão 20072010.

BVSMS

Avaliação da estrutura dos centros de atenção psicossocial do município de São Paulo, SP

Scielo

Can’t surf, won't surf: The digital divide in mental health

PubMed

Relatório sobre os principais indicadores e dados sobre as transformações da saúde mental no país Descrever a estrutura física, recursos humanos e modalidades de atenção existentes nos centros de atenção psicossocial (CAPS).

Avaliar a extensão em que os usuários dos serviços de saúde mental têm acesso, suas habilidades no uso e o apetite para várias tecnologias.

sugerem que a Internet é uma fonte influente de informações relacionadas à doença em pacientes com esquizofrenia. Alguns problemas específicos de pacientes com esquizofrenia – como incapacidade de lidar com a abundância de informação, dificuldades de concentração, idéias paranóides, etc – foram descritos. O relatório apresenta dados acerca da expansão da rede de assistência em saúde mental no país ocorrida no período O artigo faz um levantamento de 21 unidades no município, constatando heterogeneidade na formação das equipes, ênfase em atividades grupais e pouca integração aos outros equipamentos de saúde O uso da tecnologia e acesso foram muito semelhantes ao da população em geral. Atenção especial pode ser necessária para minorias étnicas na introdução de tecnologias em serviços.

Discussão: A introdução das tecnologias de informação e comunicação na área da saúde é um processo relativamente recente e complexo. Fatores os mais variados podem interferir neste processo, entre eles a área da saúde ou o tipo de serviço onde as tecnologias sejam empregadas. A área da saúde mental talvez represente uma das áreas da saúde onde este processo de introdução de novas tecnologias esteja mais atrasado, particularmente no Brasil. As últimas décadas no país se caracterizaram por uma forte e crescente expansão de serviços substitutivos à tradicional internação hospitalar(1). Os dados apresentados pelo Ministério da Saúde evidenciam o aumento da cobertura assistencial em saúde mental em todas as regiões do país, assim como a variedade de abordagens utilizadas, todas relacionadas à medicina baseada na comunidade. Nestes novos serviços é enfatizada a utilização preferencial pelas chamadas

tecnologias não-materiais, representadas nas estratégias de “vínculo” e “acolhimento”, entendidos como importantes instrumentos para o empoderamento dos pacientes(6). É perceptível a ausência, nos documentos analisados – como os relatórios de gestão – de referências à informatização destes serviços ou ao desenvolvimento de ferramentas específicas para a área como registros ou prescrições eletrônicas. Chama a atenção, por exemplo, que em 2009, um programa oficial de avaliação dos Centros de Atenção Psicossocial por todo o país tenha encontrado computadores em apenas 50% destes novos serviços(1). Nesta mesma linha de modestos resultados em matéria de adoção de recursos tecnológicos, em artigo publicado também em 2009, onde se avalia a estrutura física de Centros de Atenção Psicossocial no município de São Paulo, não se encontram referências, por exemplo, ao uso de registros eletrônicos de atendimento em nenhum dos 21 serviços analisados da capital paulista (3). Percebe-se, nos documentos oficiais analisados e nos poucos estudos de avaliação sobre os serviços de saúde mental existentes em nosso meio (1,3,6), que o empoderamento dos pacientes, conceito que pode ser relacionado ao exercício de uma plena cidadania, é visto como resultado de uma série de ações e estratégias políticas onde as tecnologias não parecem ter lugar. À medida porém, que a rede com estes novos serviços fracamente informatizados se expande há um risco de que os pacientes psiquiátricos venham a ser muito pouco beneficiados, na prática, pelas tecnologias de informação e comunicação. Em artigo que analisa justamente como as tecnologias estão empoderando pacientes, os autores destacam as três formas mais valorizadas para se promover o empoderamento: a alfabetização em saúde dos pacientes, o acesso remoto à serviços de saúde e de mecanismos de auto-cuidados(5). Nenhum destes itens entretanto pode ser percebido nos textos oficiais analisados, podendo-se supor que ainda não existam políticas públicas voltadas para a inclusão digital de pacientes psiquiátricos, nestes novos serviços estruturados. Há um risco inclusive que venha a ocorrer uma “divisão digital” na saúde mental, como a que foi constatada em estudo na Grã-Bretanha em 2012(4), onde se mostrou que pacientes psiquiátricos que não faziam uso de tecnologias não eram, na verdade, autoexcludentes mas que necessitavam, isso sim, de suporte específico para a introdução destes novos recursos. O estudo demonstra inclusive o interesse dessas pessoas em contarem com novas ferramentas de contato com seus médicos e para a pesquisa sobre suas condições de saúde, por exemplo, mas destaca que pacientes psiquiátricos (assim como grupos minoritários) podem precisar de auxílio neste processo. Em resumo, no caso brasileiro, percebe-se que um determinado entendimento do que vem a ser o empoderamento dos pacientes, determina a opção, nestes novos serviços de saúde mental, pelo uso de “tecnologias não-materiais” em detrimento do uso de tecnologias de informação e comunicação já associadas ao empoderamento de pacientes, em outros países. Assim é que, após décadas de expansão da rede assistencial por todo o país, parte destes novos serviços sequer ainda dispõe de computadores e nenhum deles conta com recursos como prontuário ou prescrição eletrônica. Num mundo onde as tecnologias estão já disseminadas por

todas as áreas da vida diária é de se perguntar como os pacientes poderão se apropriar das tecnologias de informação e comunicação em seu próprio benefício se não estiverem tendo a oportunidade de usá-las? Até onde, portanto, o empoderamento deles poderá chegar, sem a contribuição das novas tecnologias de informação e comunicação? Importante considerar também que as particularidades da área da saúde mental ou, mais precisamente, dos pacientes psiquiátricos, faz supor que a adoção de soluções tecnológicas do tipo prontuário eletrônico ou telemedicina requeiram adaptações ou ajustes de modo à torna-las utilizáveis ou atraentes para essas pessoas. Por outro lado, chama a atenção o fato de que, mesmo em países onde a introdução de novas tecnologias em serviços de saúde já seja uma realidade, existam ainda poucos estudos analisando como essas tecnologias repercutem em pacientes psiquiátricos(10). Em particular, condições severas de transtornos mentais como as que se observam na esquizofrenia, deveriam estar sendo alvo de estudos aprofundados nesta direção, o que ainda não ocorre de maneira expressiva (2). Vale lembrar que o público-alvo destes novos serviços substitutivos como os CAPS é, majoritariamente, constituído por pessoas portadoras de transtornos mentais severos e persistentes, como a esquizofrenia. Entender como estes pacientes recebem e usam novas tecnologias está portanto relacionado diretamente ao processo de empoderamento. Conclusões: Os artigos selecionados evidenciam que as tecnologias de informação e comunicação na área da saúde, em particular a partir da chamada web 2.0, apresentam características que facilitam e potencializam o processo de empoderamento dos pacientes em geral. Alguns recursos como o acesso remoto à serviços de saúde (através da telemedicina) estão associados, na literatura, a um maior grau de participação e adesão dos pacientes aos seus tratamentos, assim como parecem contribuir para uma melhoria da relação médico-paciente. Entretanto, talvez mais do que se observa em outras áreas da saúde, parecem faltar na saúde mental estudos que acompanhem o processo de introdução de novas tecnologias junto aos pacientes psiquiátricos, registrando as particularidades da adoção destes recursos por estas pessoas. Alguns trabalhos aqui reunidos mostraram que em condições severas como na esquizofrenia os pacientes vão apresentar determinadas características de concentração, por exemplo, que podem alterar a forma como usam a internet e as informações nela obtidas. Importante também destacar que os poucos estudos existentes já apontam para o fato de que pacientes psiquiátricos não são desinteressados pelo uso de tecnologias demonstrando portanto o mesmo grau de interesse e expectativa que outros pacientes apresentam. No Brasil, onde a rede de serviços alternativos à hospitalização como os CAPS experimentou forte crescimento nas últimas décadas, nota-se igualmente uma carência de estudos sobre o impacto da adoção de novas tecnologias em pacientes psiquiátricos. Além disso, percebe-se que a própria expansão destes serviços vem

se dando sem estar acompanhada pelo desenvolvimento e aplicação de soluções tecnológicas específicas para a área. Novos serviços são montados com ênfase em tecnologias não-materiais, o que pode vir, por exemplo, a comprometer a eficiência e transparência da gestão. Ao mesmo tempo que esta rede se expande, ela o faz portanto sem incorporar as novas tecnologias que poderiam contribuir para o empoderamento e autonomia das pessoas. Da mesma forma que pacientes ficam privados de experimentar empoderamento através de ferramentas tecnológicas, profissionais da área, assim como gestores, em serviços que sequer estão informatizados, não conseguem desenvolver expertise na utilização destes recursos. Neste cenário, a área da saúde mental pode perpetuar um círculo vicioso em que novos serviços não são informatizados porque suas equipes e usuários não são familiarizados com tecnologias, ao mesmo tempo que não podem se familiarizar porque novos serviços não são informatizados. Dotar novos serviços de saúde mental dos mais modernos recursos tecnológicos é, portanto, uma condição fundamental para que o empoderamento dos pacientes possa também se dar pela apropriação destes novos recursos, já presentes noutros domínios da vida social. Referências: 1. Saúde Mental no SUS: as novas fronteiras da Reforma Psiquiátrica. Relatório de Gestão 20072010. Ministério da Saúde: Brasília. Janeiro de 2011, 106 p. Disponível

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