(Como) Pode a democracia mudar? Anotações sobre pressupostos e desafios que dificultam a (observação da) reinvenção da Democracia

June 30, 2017 | Autor: Mateus Fernandes | Categoria: Democratic Theory, Democratization, Democracia, Demofobia, Demofilia
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(Como) Pode a democracia mudar?  Anotações sobre pressupostos e desafios que dificultam a (observação da) reinvenção da Democracia  por: Mateus Fernandes1 Ensaio apresentado ao GT “Teoria Política e Pensamento Social Brasileiro”,   durante   o   I   Seminário   Internacional   de   Ciência Política (SICP), realizado entre 9 e 11 de setembro de 2015 na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), sob o tema “Estado e Democracia em mudança no Século XXI”. Resumo: (Como)   Pode   a   democracia   mudar?   Anotações   sobre   pressupostos   e   desafios   que   dificultam   a   (observação   da) reinvenção da Democracia Com o objetivo de apontar elementos que dificultam a observação e implementação de mudanças tanto nas dinâmicas sociais quanto no próprio regime de Estado, este ensaio evidencia um conjunto de três pressupostos a partir dos quais são   geralmente   concebidas   as  esferas   da   atividade   política:   aquela   acerca   da  natureza   humana  –  entendida   como guerreira e adversarial; a que visa explicar a  natureza operativa  das ações coletivas, afirmando sua dependência de líderes e, assim, certa oligarquização em qualquer coletivo; e a que trata da natureza organizativa da sociedade como fraturada   por   hierarquias   e   permeada   por   desigualdades   (naturalizadas)   insuperáveis.   Tais   ideias,   mesmo   quando implícitas   nas   teorias   da   democracia,   sustentam   seus   principais   desafios   sobre   bases   antidemocráticas.   Apresento, assim, uma síntese de 4 desafios, forjados pelas atuais teorias da democracia como delimitadores da democratização. O Desafio das Grandezas indica que as democracias atuais, centradas no Estado­nação, precisam lidar com os “grandes números” – de pessoas, de territórios e dos temas e problemas que daí advém. O Desafio das Desigualdades desdobra­ se sobre as distintas maneiras como a democracia se mantém apesar de (ou mesmo por causa de) suas “promessas não cumpridas” de igualdade, liberdade e justiça. O Desafio da Representatividade aponta para a complexidade do tema da representação, por estar em flagrante contraste com a noção de “governo do povo”, e sugere que seu desenvolvimento precisa ser repensado, antes, como um tripé “Adesão­Participação­Interação”. O  Desafio da Autoimunidade  trata do fato de o projeto da democracia não oferecer proteções finais eficazes para se lidar com os usos da democracia contra ela   mesma:   enquanto   mecanismo   de   regulação   de   conflitos,   a   democracia   é   confundida   com   sistema   eleitoral,   e enquanto   regime   político   agonístico,   a   democracia   é   identificada   à   administração   do   Estado.   Se   a   miríade   de experiências de democratização puder ser observada a partir de outros pressupostos, então talvez possamos repensar nossos   desafios   atuais   e   abordar   seus   fenômenos   indagando:   estamos   no   caminho   de   uma   terceira   invenção   da Democracia? Palavras­chave: Democracia; pressupostos; desafios; demofobia; demofilia.

1 Mateus Braga Fernandes é doutorando em Ciência Política pelo IPol/UnB e bolsista da CAPES. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

INTRODUÇÃO Os debates contemporâneos realizados no interior da Teoria e da Filosofia Políticas sobre a democracia deparam­se com arraigados pressupostos especulativos, com diversos problemas, com distintos   (e,   por   vezes,   insuperáveis)   desafios,   com   algumas   soluções   propostas,   revistas, reformadas e acumuladas ao longo de sua tradição e com, pelo menos, um importante paradoxo entre   consenso   e   insatisfação.   Nesse   texto,   pretendo   descrever   esse   paradoxo   e   problematizar algumas   delimitações   da   articulação   entre  os   desafios,   informadas   por   pressupostos   presentes, mesmo quando implícitos, nas principais teorias da democracia.  Para isso, partirei de três ideias mais  gerais  sobre democracia  e sobre suas  mudanças  intermitentes,  com  o objetivo de apontar elementos que dificultam ou impedem a implementação, e mesmo a observação, de tais mudanças tanto nas dinâmicas  e padrões  sociais (nos  graus  de democracia) quanto no próprio regime de Estado (no tipo de democracia). Primeiramente, se podemos definir Democracia a contrario como a tentativa permanente de   desconstituição  de   dinâmicas   sociais   autocráticas,   então   ela   pode   ser   entendida   como   um metabolismo social inerentemente vinculado à mudança – até mesmo quando, no limite, trata­se apenas   da  “circulação   de   suas   elites”.   Como   indica   Mouffe   (2005,  p.   98),  autores   de   diversos matizes   concordam   que   a   democracia   é,   fundamentalmente,   “a   struggle   against   all   forms   of autocratic power”; em especial, contra o poder autocrático da tecnocracia de grandes empresas e da burocracia   de   grandes   governos   centralizados.   Assim,   uma   teoria   da   democracia   pode reiteradamente   retomar   a   noção   de   (exercício   do)   poder   do   povo   para   contrapor­se   ao   poder autocrático e validar um processo que não desconsidere sua etimologia, mas que precisa ir além dela, como também argumenta Sartori (1994, Vol. 1, p. 53). A segunda ideia pretende sustentar que, sendo o oposto de Autocracia, a Democracia é um artifício da invenção humana2 para, pelo menos: i) dar forma e vasão ao ethos político e agonístico que circunda a tomada  coletiva de  decisões  políticas  sobre o destino  público  e comum de um grupamento humano plural, e; ii) regular conflitos, inerentes à coletivização dessas decisões3. Em 2 Isso significa que a política não é nem uma atividade natural, que existe sempre que homens e mulheres se encontram, nem tampouco alguma substância original que pertença à essência dos seres humanos. Para Arendt (1999, p. 23), é Hobbes quem primeiro compreende essa questão, embora ele substitua a natureza política aristotélica por uma natureza bélica. 3 Sartori (1994, Vol. 1, p. 286 e ss.) estabelece distinções, que procuramos seguir aqui, entre decisões coletivas e coletivizadas, assim como entre graus e tipos de democracia (idem, p. 246 e ss.). I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

outras palavras, a Democracia foi e é inventada, em apelos ora idealistas, ora normativos, para tentar realizar o que literalmente promete em sua etimologia: ser o “governo do  dēmos”, isto é, garantir e regular a autonomia e a autolimitação coletivas dos membros daquele grupamento, o dēmos,   para   poder   decidir,   fazer   e   gerir,   interagir   entre   si   e   inter­relacionar­se   com   outros grupamentos4. Nesse sentido, autonomia difere de autocracia justamente por ser um poder limitado e controlado pelas circunstâncias da vontade das pessoas por ele relacionadas, de modo que possa ser revogável tanto quanto descentrado (policrático) ou distribuído5. Assim é que, a partir de  um  continuum  de  variações no que se entende por  dēmos, em como ele é constituído e em que medida ele é constituinte da política, a terceira ideia pode ser formulada:   a   Democracia   é   inventada   e   reinventada   entre   a  demofobia  –   que   vai   do   medo   da inclusão   ou   da   abrangência   do  dēmos  na   tomada   de   decisões   a   restrições   procedimentais   ou institucionais ao poder ou à interação do  dēmos  – e a  demofilia, que vai do apelo ao povo ou do engajamento das pessoas, massas ou multidões a ampliações procedimentais ou institucionais no poder ou na interação do  dēmos6. Vê­se então que a Democracia inventada é atravessada ora por movimentos de democratização, ora por recuos de desdemocratização 7, o que pode ocorrer no polo demofóbico do continuum, mas também em seu polo demofílico. O que torna inevitável, portanto, que sua dinâmica seja a da própria mudança.  A tentativa de enumerar pressupostos e de sintetizar desafios das teorias da democracia atuais,   ainda   majoritariamente   limitadas   por   fundamentos   antidemocráticos8,   sejam   eles demofóbicos ou demofílicos, pode contribuir para desanuviar seu horizonte de possibilidades. Esta tarefa parece relevante quando se fala, cada vez mais, não só de crises “institucionais” ou “de representação”, mas do risco de que esteja em xeque a forma atual de democracia. Portanto, se a

4 Holloway (2003, pp. 43-51) indica que quando o fazer não é alienado, em um fluxo social de produção não fraturado, ele implica poder, e que poder-fazer, nesse sentido, deve ser entendido como “poder-para”; em contraste com o “poder-sobre”, um poder-para, como dito, garantir a autonomia e a autolimitação coletivas. 5 Sartori (1994, Vol. 1, p. 279) define autocracia como poder sem controle, sem limites, irrevogável e concentrado (monocrático) tanto quanto permitem as circunstâncias. Por isso, para ele, democracia é não-autocracia. 6 Proposta semelhante pode ser encontrada em Stepan (1999), embora seu continuum fale sobre modelos de federalismo que são mais “demos-constraining” ou mais “demos-enabling”, a depender das possibilidades de minorias parlamentares terem poder de veto sobre iniciativas da União. 7 Essa proposta é desenvolvida por Tilly (2013). 8 Miguel (2002) demonstra, em argumento que utilizamos aqui, como as principais teorias da democracia foram erigidas sobre bases antidemocráticas. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

miríade   de   experiências   de   democratização   em   curso   puder   ser   observada   a   partir   de   outros pressupostos,   então   talvez   possamos   repensar   nossos   desafios   e   arranjos   atuais   e   abordar   seus fenômenos indagando, com esperança e crítica: estamos no caminho de uma terceira invenção da Democracia?  ENTRE O CONSENSO E A INSATISFAÇÃO No último século, houve número crescente de países – entre Estados, Nações e Territórios – ingressando no grupo das democracias formais (ou mínimas). Apesar disso, no início desse século XXI observa­se certa estabilidade (ou mesmo pequeno declínio) nesse número9, para surpresa ou preocupação de alguns que tomam como dada seja a impossibilidade, seja a disseminação global do regime democrático. Ao lado dessa constatação empírica, outra porém, da ordem mais abstrata da cultura e dos valores políticos, não mais causa espanto: a afirmação de que a democracia apresenta­ se   como   um   valor   universal10  –   valor   ao   qual   todos   os   povos   teriam   direito,  a   priori  e independentemente de sua condição atual –, desatando o nó que prendia a democratização a uma transição gradual ou evolutiva de países, instituições e povos. Além disso, é um valor que conquista sua   legitimidade   por   dar   origem   ao   “único   regime   político   capaz   de   garantir   a   aceitação   dos governados” (Miguel, 2014. p. 12).  Há   certo   consenso,   portanto,   sobre   a   escolha   –   ou   melhor,   sobre   a   reivindicação   de democratização – da democracia tanto como regime político e mecanismo de regulação de conflitos intra e interestatal quanto como um padrão social (adequado e vantajoso) de organização da vida comum – aquilo que, desde os Antigos, se costumou chamar de ethos ou modo de vida.  Dito de outro modo, haveria certo acordo, mais ou menos difundido, de que  é preciso democratizar   as   instituições   –   e,   talvez,   não   só   as   políticas  stricto   sensu,   mas   também   as corporativas,   as   educacionais   e   as   empresas   privadas,   como   indica   Bobbio   (1986,   pp.   55­57),

9 Segundo os relatórios “Freedom in the World”, temos: i) em 2006, 90 Países Livres (47% de 193 países), 58 Países Parcialmente Livres (30%), 45 Países Não Livres (23%); ii) em 2008, 89 Países Livres (46% de 193 países), 62 Países Parcialmente Livres (32%), 42 Países Não Livres (22%); iii) em 2011, 87 Países Livres (45% de 195 países), 60 Países Parcialmente Livres (31%), 48 Países Não Livres (24%). Ao comparar os dados da Freedom House (2012), vê-se que 123 países (64% de 193 países) são considerados Democracias Eleitorais em 2006 e, em 2011, apenas 117 países (60% de 195 países). 10 A universalização da democracia, ou a compreensão de que a democracia (ou sua democratização) é um valor historicamente universal, é a aposta defendida por autores, pensadores e políticos tão diversos como Enrico Berlinguer (2006), ex-secretario-geral do Partido Comunista Italiano, seguido de Carlos Nelson Coutinho (2006), e o ganhador do prêmio nobel de Economia em 1998, Amartya Sen (1999). I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

embora nesse ponto os dissensos possam ser mais explícitos11. Haveria certa disseminação, no senso comum   cotidiano,   da   ideia   de   que   os   processos   democráticos   (mais   interativos   e   inclusivos, protegidos e garantidos, responsivos e mutuamente vinculantes 12) são não só mais legítimos para conferir autoridade política como são, em alguma medida, “melhores” ou mais bem­vindos que os demais: e a democracia caminharia, então, no sentido de deixar de ser aquele second best, como há até bem pouco era conhecida.  Mas há, também e ao mesmo tempo, certa insatisfação com os limites experimentados na e pela   democracia,   talvez   diante   de   suas   “promessas   não­realizadas”13,   ou   mesmo   com   o  deficit democrático, isto é, com a diferença sempre deficitária no balanço entre os ganhos da inclusão, da participação e da redistribuição e entre a manutenção sistemática das desigualdades e dos problemas institucionais e sociais da representação, somada àquilo que poderíamos chamar de autoimunidade 14 da democracia – sua incapacidade genética de impedir, por meios democráticos, os usos que podem ser feitos contra ela própria.  No entanto, a própria observação desses problemas está condicionada, sobremaneira, por ideias arraigadas em nossa tradição. É preciso, portanto, evidenciá­las para que se possa avaliá­las.

11 Algumas críticas à plausabilidade da disseminação da democracia representativa a todas as esferas de convivência humana estão em Mouffe (2005, pp. 103-104). 12 Tomamos emprestada, com alterações, a formulação proposta por Charles Tilly (2013), para quem a democracia é um conjunto de relações (entre Estados e cidadãos) qualificadas por esses quatro elementos: i) amplitude (a quantidade de grupos de cidadãos que conseguem expressar demandas e a extensão de suas manifestações); ii) igualdade (o quão equitativamente diferentes grupos de cidadãos experienciam a tradução de suas demandas em políticas); iii) proteção (em que extensão as opiniões e demandas recebem proteção política para serem expressadas); e iv) caráter mutuamente vinculante (o quanto o processo de tradução de demandas em políticas mantém os lados envolvidos e obriga a implementação das decisões). 13 Pode-se entender algumas das promessas não-realizadas da democracia representativa a partir do que se costuma chamar de “atributos da crise da representação”, mesmo sendo tais atributos “de difícil comprovação”, como afirma Miguel (2014, p. 98): i) o declínio no comparecimento eleitoral que evidencia, parcialmente, a crise nas eleições; ii) a ampliação da desconfiança em relação às instituições representativas e à sua eficácia; iii) o consequente esvaziamento dos partidos políticos, seja por questionamentos à sua relevância para a mediação, seja por impedimentos – como a crescente burocratização interna – que dificultam o acesso a ele e, portanto, sua permanência no horizonte de alternativas viáveis aos cidadãos. Sobre o tópico i), cf. também Ribeiro; Borba; Da Silva (2015). Sobre os tópicos ii) e iii), e em especial sobre accountability eleitoral, cf. também Rebello (2015). 14 Para Derrida (2003), a relação democrática e aporética entre igualdade e liberdade expõe a democracia à suscetibilidade ao que ele chamou de “lógica da autoimunidade”, fazendo referência àquela supressão do sistema imunológico de um corpo que visa o proteger contra agressões internas ou externas. Como exemplifica Patton (2007), a alteração de procedimentos democráticos pode ser utilizada (de modo não democrático) para proteger a própria democracia; ou ainda, a suspensão de liberdades civis pode ser usada com vistas a, supostamente, proteger (de modo não democrático) a liberdade dos cidadãos. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

E assim, talvez, depurar aquelas que inviabilizam, per se, análises políticas comprometidas com o aspecto intrinsecamente social e cooperativo da política democrática15.  Se a democracia é um fenômeno social, isto não pode querer dizer outra coisa senão que ela emerge de condicionamentos recíprocos entre a realização de determinados padrões sociais de organização  e   entre   a   atualização   de  mecanismos   políticos   específicos   para   regular   conflitos, também   sociais.   Isso   significa   que   a   democracia   depende   de   algumas   condições   necessárias   – embora   não   suficientes,   porque   não   são   causais   –   e   de   algumas   dinâmicas   próprias   para   se cristalizar, isto é, para ser reinventada.  Mesmo em suas disputas competitivas e conflituosas, ela ainda pode ser entendida como um sistema de colaboração 16 por meio de ações coletivas17, que se deparam com possibilidades para serem cada vez mais conectadas e distribuídas pela multidão18. Argumento, portanto, que a realidade da democracia – o que acontece quando as pessoas fazem política – depende fundamentalmente:  i)  da conectividade e dos graus de interação entre pessoas e grupos, o que condiciona reciprocamente a distribuição da rede social e; ii) da diminuição de barreiras entre hierarquias  e de agentes intermediadores entre elas – isto é, de um padrão de organização mais distribuído19 e não só decentralizado20 –, o que aumenta a conectividade da rede social. Certo   é   que   as   abissais   desigualdades   políticas   mantenedoras   de   autocracias,   que   a imobilidade social geradora de castas e de sistemas sociais fechados, e que as disparidades quase absolutas no acesso aos  loci  de poder e de produção (material ou intelectual) ainda persistem. E, 15 O caráter competitivo não impede a emergência da cooperação, de modo que tais conceitos não são antônimos. No entanto, não é a competição somente, mas a disposição guerreira e adversarial, que visa à exclusão de um dos polos do binômio amigo-inimigo, o que aparece ao se pressupor, por exemplo, uma natureza humana hobbesiana. 16 O clássico de Robert Axelrod (2010), “The evolution of cooperation”, demonstra empiricamente como a cooperação emerge e evolui, se há perspectivas de interações futuras, mesmo sem organização centralizada e a partir de indivíduos egoístas. Para argumentos que extrapolam os limites da mera agregação de ações autointeressadas e egoístas, cf. Alves, 2006; em especial, pp. 13-46. 17 Para uma visão com suspeitas pertinentes sobre as assimetrias sociais que impactam a possibilidade de mutualidade e cooperação, cf. Young (2001). 18 Alguns bons exemplos sobre a (re)descoberta da inteligência das multidões podem ser encontrados no curioso livro do jornalista James Surowiecki (2005) 19 Como demonstrou Paul Baran (1964), distribuição refere-se a uma topologia diferente daquela encontrada na mera descentralização. Nessa última, a multiplicação de centros pouco conectados entre si amplia as distâncias sociais e cria diversas instâncias de intermediação – o que se vê claramente na burocratização. 20 Em uma topologia centralizada, ao menos tem-se os nós periféricos conectados ao centro. Como afirmam Arretche (2013) e Stepan (1999), se por um lado a concentração da autoridade aumenta o risco da tirania da maioria, por outro, nota-se maior impacto de Estados centralizados na redução de desigualdades sociais, ainda mais quando associado à cooperação com as minorias e à ampliação do poder do dēmos. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

durante boa parte da história da humanidade, isso contribuiu para que o fenômeno cooperativo que ocorre em redes sociais mais interativas e distribuídas não fosse suficientemente aparente aos que se ocupavam das teorias políticas.  Ainda sim, não é difícil verificar que nenhuma dessas barreiras historicamente erigidas foi ou é suficiente para impedir toda e qualquer interação entre as pessoas ou alguma insubordinação à intermediação das hierarquias, senão a democracia nunca teria sido inventada como um fenômeno social. De sorte que, como veremos, a própria noção de indivíduo separado e isolado não faz,  a priori, nenhum sentido, tanto em termos sociais quanto em termos políticos. PRESSUPOSTOS Muito embora esses argumentos não sejam exatamente novos nas análises políticas, os pressupostos   colocados   à   disposição   dos   cientistas   políticos   caminham   em   direção   contrária   – quando não, impedindo mesmo que fenômenos políticos sejam desvelados em sua face social. Ao menos três dessas ideias ainda hoje figuram, mesmo implicitamente – ou talvez até mesmo como preconceitos –, nas teorias da democracia. Podemos configurá­las como um conjunto de três esferas concêntricas a partir das quais é geralmente concebida a atividade política:  i) da maneira como foi exposta por pensadores que vão de Hobbes a Schimitt, a primeira esfera procura descrever a natureza humana como sendo guerreira e adversarial, o que nos levaria a forjar indivíduos atomizados, racionais e egoístas, e assim; ii) se considerarmos as marcas deixadas contemporaneamente pelas teorias das elites e da escolha racional, vemos que a segunda esfera visa explicar a natureza operativa das ações coletivas afirmando   sua   dependência   de   líderes   e,   com   isso,   a   tendência   à   oligarquização   de   qualquer coletivo, de modo que; iii)  a   organização   social   aumenta   tanto   mais   se   verticalizam   suas   hierarquias   pois concebemos a terceira esfera, sobre a  natureza organizativa  da sociedade, como inevitavelmente fraturada por divisões e permeada por desigualdades insuperáveis, porquanto naturalizadas, o que parece ser um dos traços definidores da tradição política iniciada por Platão, em sua separação total entre governantes e governados. Como   consequências   desse   conjunto   concêntrico,   além   dos   vieses   deixados   implícitos, podem ser geradas confusões epistemológicas sobre a natureza do político e sobre o sentido da política. E isso limita, ao fim e ao cabo, tanto a imaginação de soluções e a invenção de novos e I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

variados   arranjos   democráticos,   quanto   a   descrição   de   seus   fenômenos   políticos   por   meio   de padrões já conhecidos. Por isso, vale nos determos em cada um deles um pouco mais detidamente. A   despeito   de   todo   o   caráter   metafísico   ou   especulativo   de   seu   argumento,   Hobbes inaugura, com sua  bellum omnium contra omnes, não só um estado de natureza guerreiro – que poderia culminar no extermínio dos homens – mas também um ideal unitário de Estado que visa justamente controlar, pela exclusividade no emprego dos meios de coerção, a natureza humana bélica21. Carl Schmitt, por sua vez, ao fazer uso da categoria política identitária de amigo­inimigo22, estabelece que a medida do político não passa somente pelo agonístico ou competitivo desacordo, mas pela necessária exclusão do adversário, que é encarado sempre como inimigo 23, pela natureza adversarial do político. E tudo isso poderia ser sintetizado na fórmula invertida de Clausewitz­ Lênin, de modo que, a partir do primeiro pressuposto – a natureza humana é bélica e adversarial – a política só poderia ser a continuação da guerra, ainda que por outros meios.  O pressuposto sobre uma natureza essencialmente beligerante e não­cooperativa dos seres humanos nos levaria à disjunção entre a motivação individual e a possibilidade de cooperação, o que foi chamado de “dilema da ação coletiva”24. Ele depende, em primeiro lugar, de que esses grupos   sejam   vistos   como   mero   agregado   de   indivíduos,   pois   o   foco   é   na   racionalidade   e intencionalidade individuais, embora a explicação se dê ao nível de padrões de grupo. E esse salto supõe   que   padrões   coletivos   sejam   idênticos   a   agregados   numéricos.   Isto   é,   não   pode   haver nenhuma disposição coletiva ou complexidade sistêmica que supere a soma das partes individuais 25. 21 Mesmo se e quando o estado de natureza hobbesiano não pode ser erradicado, como aponta Mouffe (2005, p. 6), ele pode de fato ser controlado por alternativas mais viáveis, vale ressaltar, tanto mais elas forem democráticas, isto é, não-autocráticas. 22 Para Holloway (2003, p. 108), “a teoria política de Carl Schmitt ao se concentrar na distinção entre amigo e inimigo é, simplesmente, o desenvolvimento coerente da lógica da identidade”. Ferreira (2004) a chama de “A invenção do inimigo”; em especial, ver o capítulo I, “A medida do político”. 23 Das descrições de Marx sobre a “luta de classe”, inapelavelmente destinada a enterrar a burguesia, poder-se-ia extrair algo semelhante – ainda que efetivamente ele parta de visões diferentes (pois trata da expropriação dos meios de produção e do prejuízo da sociedade capitalista à natureza humana, para ele mais próxima da proposta rousseauniana) e que tenha objetivos diferentes (proporcionar condições para a reforma da sociedade e do homem, e não subtrair sua natureza). 24 Como descrito por Olson (1999), esse dilema conclui que pessoas, em grandes grupos, não agem voluntariamente para promover seus interesses comuns. E isso se dá tanto porque não percebem os benefícios da cooperação diante de sua contribuição mínima quanto, e principalmente, porque não consideram razoável, do ponto de vista individual, arriscar-se a cooperar quando a deserção pode produzir menos prejuízos ou ter menores custos ao indivíduo. 25 Ao contrário dos funcionalistas e dos estruturalistas, os teóricos da escolha racional não utilizam as consequências não intencionais das práticas sociais para explicar os padrões coletivos da ação – isto é, não consideram como e por quê elas persistem como práticas. Seja por sua “função” social, seja por estruturas sociais que as condicionam isso I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

Em segundo lugar, ele depende da baixa conexão entre os membros do grupo, pois o critério é de que não haja confiança mútua possível de ser acumulada, nem expectativa de conexões futuras e reincidentes – o que simplifica o modelo, mas o torna inútil frente a realidade de alguns grupos políticos   concretos26.   Finalmente,   a   conclusão   depende   de   que   seja   possível   (e   necessário) identificar   alguma   forma   de   centralização,   seja   em   líderes   ou   em   organizações   –   o   que,   vale ressaltar, é a própria conclusão do argumento. Ainda assim se mantém nas análises políticas, às vezes de modo velado, esse  segundo pressuposto, sobre a natureza operativa dos coletivos humanos: para mobilizar e organizar a ação coletiva são necessários líderes destacados, empreendedores que arriscam mais que outros (e que, possivelmente por isso mesmo, devam recolher mais benefícios e passem a dominar os demais).  Outra consequência que tal visão particular sobre a natureza bélica e adversarial do ser humano parece produzir é limitar o indivíduo a uma racionalidade atomizada e autocentrada. E é nessa direção que vai a teoria da escolha racional para explicar a lógica da ação coletiva, como argumenta   Ostrom   (1991),   quando   torna­se   evidente   a   fratura   assumida   por   parte   das   ciências sociais ao estudar o fenômeno político27.  Embora a existência de líderes que iniciam e contribuem para organizar a ação coletiva seja evidentemente  um fenômeno político  observável, dele não se pode  concluir  que haja  uma conexão causal – e, portanto, necessária – com a ação coletiva, a não ser a posteriori. E é parte da dinâmica   democrática,   se   continuamos   entendendo­a   como   movimentos   de   desconstituição   da autocracia, empreender não só a rotatividade de funções e lideranças, mas a distribuição da rede social e a reconfiguração de barreiras entre hierarquias. Daí essa evidência ex post facto não poder figurar como premissa para teorias da democracia, a menos que tal corrente tenha como propósito conjecturar, em bases antidemocráticas e elitistas, sobre a impossibilidade mesma da democracia28.  invalidaria a identidade entre a agregação e os padrões. 26 Como vimos, é justamente a expectativa de interações futuras que representa, no modelo evolutivo de Axelrod (1981; 2010), uma das condições propícias para a emergência e estabilização da cooperação. 27 A utilização de métodos econômicos para o estudo de fenômenos não econômicos – marcadamente, por exemplo, na publicação de An economic theory of democracy (1957), de Anthony Downs – é a novidade da teoria da escolha racional, apresentada em 1980 e descrita por alguns como “o último assalto imperialista da economia na Sociologia: a subordinação do homo sociologicus ao homo economicus” (Baert, 1997. s/p). 28 Esse é o caso, precisamente, dos principais teóricos elitistas: Pareto, Mosca e Michels. Como explica Miguel (2014, p. 42), “a afirmação da impossibilidade de uma organização social em que não haja uma minoria dominante é o traço definidor das teorias das elites”. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

Além   disso,   a   tendência   a   excluir   motivações   coletivas   e   emocionais29  dos   debates políticos, por sua complexidade, inadequação ou característica idiossincrática, apresenta­se como “falso­dilema” não só empírica e factualmente30, como também teórica e conceitualmente31. Desse modo, como demonstra Teles  (2007), o problema de regular conflitos  no presente democrático dando publicidade aos traumas e ressentimentos do passado, que não se encerram com a transição democrática,   poderia   contribuir   mais   para   o   aprimoramento   da   convivência   pública   do   que   a tentativa – felizmente destinada ao fracasso – de impor ao discurso e às opiniões políticas suposta racionalidade, almejada linearidade, inabalável lógica ou perigosa instrumentalidade. Obviamente não é minha intenção, no espaço exíguo desse texto, refutar a possibilidade de que, no longo prazo e sem condições propícias para empreender movimentos de democratização, tendências   autocratizantes   para   manter   determinados   grupos   em   posições   oligárquicas   e   de dominação possam efetivamente ocorrer. Ainda assim, é premente que essas afirmações sobre nossa natureza operativa sejam questionadas e revistas. Se de fato não são elas quem sustentam sozinhas, por   exemplo,   o   edifício   da  Lei   de   Ferro   da   Oligarquia,   proposta   por   Michels   (1982),   ou   da weberiana racionalização burocrática, certamente elas tampouco servem para observar e explicar fenômenos   políticos   como   os   aglomeramentos   (clustering),   enxameamentos   (swarming)   e amassamentos (crunching), que tanto têm impactado as democracias atuais. Ao menos não a partir da complexidade que eles exigem: são fenômenos em que a constelação de multidões converge com a   pluralidade   de   comunidades   emergentes,   em   que   a   potência   multitudinária,   local   ou   global, aparece sem a dependência necessária de líderes destacados, de organização prévia ou mesmo de coordenação centralizada. E não são fenômenos essencialmente novos, embora as condições atuais em   que   eles   ocorrem   certamente   possam   contribuir,   como   já   ocorreu,   para   a   reinvenção   da democracia. 

29 Iris Young (2002, pp. 52-77) observou três aspectos da comunicação que tornariam as teorias da democracia mais inclusivas, alargando as possibilidades de representação e de entendimento mútuo por serem formas de “passionate persuasion”: narrativas, retórica e saudações. Sob o anedótico nome “bringing the passions back in” (Kingston; Ferry, 2008), uma coletânea com outros autores reforça essa tese. 30 Para um argumento baseado na relação histórica entre o surgimento das tragédias gregas e o desenvolvimento da democracia em Atenas, cf. Nascimento; Fernandes, 2015. pp. 281-284. 31 Para uma crítica sobre os problemas da derrocada da narrativa na modernidade, cf. Benjamin, 1994. Sobre os perigos do historicismo e das “profecias históricas” pretensamente racionais ou científicas em Platão, Hegel e Marx, cf. Popper, 1974. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

No entanto, como a dinâmica de interação entre pessoas é condicionada reciprocamente por seu padrão de organização, movimentos isolados que simplesmente ampliem a interação, como em propostas simplistas de democracias diretas, virtuais ou assembleístas, não são capazes de gerar, per   se,   estruturas   mais   democráticas,   isto   é,   mais   distribuídas   e   com   menos   barreiras   entre hierarquias ou burocracias de intermediação. Assim, um sem­número de exemplos poderiam ilustrar o que é tomado, inclusive para as análises políticas mais recentes, como o  terceiro pressuposto, sobre a natureza organizacional das sociedades humanas: não há funcionamento social – mas o caos ou o estado de natureza – sem hierarquia, centralização ou especialização 32. E um corolário desse terceiro pressuposto, que funciona como justificativa para sua manutenção, é a naturalização da  separação   entre  governantes   e  governados,  importante   elemento  de   nossa  tradição   política, inaugurada por Platão. A separação naturalizada entre governantes e governados – e é preciso enfatizar que isso é diferente da mera distinção entre funções e atribuições específicas, temporárias ou rotativas – põem em risco, e em alto grau, três princípios básicos da democracia, que se foram firmando histórica e politicamente justamente por sua relevância contra a autocracia:  i)  a liberdade de influenciar nas decisões políticas e de se ver protegido de suas ameaças;  ii)  a igualdade (legal e política, mas também relacionada à relevância social e epistemológica) de falar e ser escutado, de participação e presença, de acesso e oportunidade; e  iii)  a justiça de ver equilibrado o balanço entre esses dois primeiros (para que a liberdade seja um dispositivo de desconstituição de autocracias e opressões e para   que   a   igualdade   seja   um   dispositivo   de   reconfiguração   de   hierarquias   e   de   superação   de desigualdades), de modo público (isto é, não privativo de um grupo ou organização social) e com sentido comum (isto é, na produção daquilo que se entende como commons). É preciso investigar, portanto, a gênese desses dilemas para fundamentar nossas atuais análises políticas em pressupostos mais condizentes com as possibilidades de interação e conexão da atual sociedade­em­rede. Daí, talvez, possamos ver emergir novas experimentações de política democrática, como os fenômenos contemporâneos de aglomeração de multidões, de articulações 32 Vale notar que esses três nomes dizem respeito, fundamentalmente, a uma mesma e única coisa: i) toda hierarquia vertical depende da existência da distinção e da manutenção da separação entre o centro e a periferia, entre o topo e base; ii) toda centralização se dá por alguma atribuição especial àquelas pessoas que estão (porque devem estar) no centro, em relação à periferia, o que tende a permanecer no tempo por sua naturalização; e iii) toda especialização como uma separação de “tipos” sociais – e não só como distinção de funções específicas – diminui a mobilidade social, impedindo o fluxo ou o acesso de pessoas “não especializadas” e, portanto, contribuindo para a materialização e a cristalização das hierarquias e da centralização. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

transnacionais, de ondas de democratização globais e de experimentações democráticas locais. E é preciso   fazer   isso  não   somente   como   a   tentativa   de  mera   expansão   dos   limites   da   democracia representativa, que adviria de sua reforma ou da radicalização de sua suposta democratização, nem tampouco como reprodução (anacrônica) do comunitarismo político dos gregos Antigos, mas como uma possível (e necessária) reinvenção: a terceira invenção da Democracia. DESAFIOS As teorias da democracia que são informadas, mesmo que implicitamente, pelo conjunto de pressupostos   descritos   –  isto   é,   que  sustentam   um   estado   de  natureza   hobbesiano,   premissas   e previsões   exclusivamente   elitistas   ou   racionalistas,   e   mesmo   atravessadas   pelas   separações   da tradição platônica –, parecem ser não somente a vertente hegemônica, mas também aquelas que efetivamente   guiam   nosso   entendimento   sobre   as   possibilidades   reais   e   concretas   das   atuais democracias.   Assim,   os   desafios   endereçados   por   elas   funcionam   como   delimitadores   de   suas mudanças e nos apontam não só para o que é a democracia atualmente, mas também até onde podem ir seus movimentos de democratização. Argumento, na sequência, que se pode fazer uma síntese desses delimitadores a partir de 4 conjuntos de desafios, sustentados por e nessas teorias da democracia.  A   tentativa   de   democratização   que   leva   à   ampliação   do  dēmos,   fazendo   multiplicar disparidades e divergências dentro daquela suposta unidade do “povo soberano”, faz surgir pelo menos quatro condições às quais, conjugadas, poderíamos chamar de Desafio das Grandezas:  i)  a extensão física, territorial e numérica da comunidade política soberana, geradora de distâncias e de condições de acesso que dificultam o diálogo e a presença de cada membro, além de colocar em xeque a validade dos consensos (da maioria) e das diferenças (das minorias); ii)  a   complexidade   tanto   das   questões   a   serem   discutidas,   que   requerem   por   vezes   a presença de especialistas, de alguma aprendizagem prévia ou de algum domínio epistemológico específico, quanto das clivagens sociais encampadas pela inclusão universal de grupos e de seus interesses ao  dēmos, o que requer algum tipo de mecanismo político de regulação de conflitos e alguma mediação entre seus diversos interesses; iii)  a gestão individual do tempo entre a participação pública e a vida privada de cada pessoa, cujos critérios além de serem bastante variáveis, tratam de conciliar não só o civismo com

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as   condições   materiais,   mas   também   o   contexto   político   e   algum   balanço   entre   confiança, expectativas e benefícios; e iv) a gestão coletiva do tempo, do mandato e dos recursos materiais entre a proposição, as etapas intermediárias e a avaliação das políticas. Assim, no conjunto denominado Desafio das Grandezas, vemos que a democracia precisa lidar com a complexidade de um arranjo em que a multiplicidade de interesses e a diversidade de representações do  dēmos, em que os limites de tempo e distância para a construção de espaços públicos   de   debate   e   deliberação   e   em   que   os   riscos   e   possibilidades   do   número   de   pessoas envolvidas, tudo isso a configura, antes, como o regime das múltiplas minorias. Se, por um lado, o grande número pode revelar­se como “tirania da maioria” 33, ou como “questão social”34, por outro lado, o pequeno número pode revelar­se tanto no “ódio de si” e em minorias discriminadas quanto nos “narcisismos das pequenas diferenças”35 e em minorias privilegiadas. Ainda sim, nota­se que o desenvolvimento da democracia passou – e se mantém – pela ampliação do dēmos, diante de alterações nas condições da comunidade política (isto é, no número de seus membros, em sua abrangência territorial e nas questões de que ela se ocupa). E isso sugere que esse modo de democratização se deu, em suma, pela abertura institucional à inclusão (de grupos sociais antes excluídos, ou por meio da congregação de territórios) e com a ampliação das agendas políticas, abarcando diferentes interesses e temas.  Não   seria   inimaginável,   portanto,   propor   soluções   para   o  Desafio   das   Grandezas  que passassem por novas alterações naquelas condições e que não interferissem na abertura institucional já   conquistada.   Arranjos   democráticos  glocais  –   quando   o   significado   do   global   e   do   local   se tornam, temporariamente, intercambiáveis pela conexão entre eles, ou seja, em que os efeitos da glocalização  passam a poder ser efetivamente considerados – parecem uma alternativa viável ao 33 Como argumenta Dahl (1989, p. 17), embora a tradição federalista (e, em particular, o pensamento madisoniano) tenha deixado mais explícitos seus temores frente a tirania da maioria, “a tirania legislativa, ou da maioria, não é menos tirânica que a tirania do executivo, ou da minoria. São ambas por igual indesejáveis”. Mais ainda, teorias elitistas defenderiam a ideia de que, uma vez que a maioria jamais governa de fato, toda tirania adviria, quando fosse o caso, de uma minoria – de uma elite dominante. Essa é, como relembra Dahl (1989, pp. 56-57), a objeção apresentada por Gaetano Mosca. 34 Em sua estrita distinção entre o espaço público-político e a esfera privada, Arendt (2001, p. 52) aponta para os riscos da invasão do primeiro pela última, quando o regime de necessidade, e a economia, tomam de assalto a política, aumentando “a probabilidade de que o social, e não o politico, constitua a esfera pública”. 35 Como explicam Reino & Endo (2011), Freud escreve a expressão em três diferentes obras, mas é em O mal-estar na civilização (1930) que o tema é mais explorado, no sentido que nos interessa aqui. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

dilema   de   manter   a   abertura   institucional   à   inclusão   frente   ao   aumento   das   grandezas   da democracia. Em outras palavras, pode­se imaginar arranjos democráticos que tenham números de membros e abrangência territorial variáveis e que se ocupem, desse modo, de questões que serão uma função dessas variações. Como antevia Dahl (2001, p. 121), “talvez hoje e cada vez mais no futuro seja  possível  resolver o problema  territorial  com o emprego dos  meios  de  comunicação eletrônico”.  Contudo, de um modo ou de outro, as tecnologias (de mídias ou de métodos, seja em plataformas   digitais   para   participação   virtual,   seja   em   conselhos   e   conferências   presenciais pulverizadas   pelo   território)   continuam   com   a   representação   limitando   seu   horizonte   de possibilidade e, portanto, deságuam quase sempre em procedimentos indiretos (aqueles em que há delegação de poder a outra pessoa). E isso significa que, embora o Desafio das Grandezas tenda a ser minimizado com a experimentação de diferentes tecnologias, ele se mantém como desafio para a democratização sempre e quando está atrelado – como causa ou como efeito – aos outros dois desafios, que consideraremos em sequência.  O  Desafio   das   Desigualdades  desdobra­se   sobre   as   distintas   maneiras   como   as democracias representativas atuais se mantêm apesar de (ou mesmo por causa de) suas “promessas não­realizadas”, e no que diz respeito  à relação entre seus princípios de igualdade, liberdade e justiça. Se,  como  afirma   Dahl   (2001,  p.  20.  grifo  do  autor),   “um  impulso  para  a   participação democrática desenvolve­se a partir do que poderíamos chamar de  lógica da igualdade”, então as desigualdades   que   vemos   surgir   no   e   pelo   processo   democrático   parecem   mesmo   andar   na contramão dessa lógica, que por si só já é bastante complexa. Assim, é necessário estabelecer uma definição de desigualdade que possa contribuir para a clareza e especificidade do que é expresso por essa palavra. Nesse sentido, parece útil a definição apresentada por Miguel (2014, p 300): Desigualdade […] significa uma assimetria no controle de determinados recursos que: (1) possui   impacto   nas   trajetórias   possíveis   relativas   de   indivíduos   e   grupos;   (2)   reflete padrões estruturais, não sendo efeito do acaso ou de escolhas pessoais livres; e (3) está vinculada   a   relações   de   dominação,   isto   é,   à   capacidade   de   uns   bloquearem   a   ação autônoma e/ou a obtenção de ganhos por parte de outros.

Se as diferenças precisam ser organizadas artificialmente pela política democrática para que se alcance o ethos igualitário que a inspira, pode­se argumentar que a força de estruturas sociais

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(como, por exemplo, uma organização de baixa conectividade para a rede social) tende a limitar as possibilidades de dinâmicas sociais, reduzindo “as possibilidades de ação política dos indivíduos de grupos   prejudicados   pelas   desigualdades”   (Miguel,   2014.   p.   301),   como,   por   exemplo,   um hardware limita a operabilidade de um software. Do ponto de vista da topologia da rede social, portanto, é a distribuição – e não somente a descentralização – que pode interferir nos processos de hierarquização com vistas à redução de desigualdades. Essa hierarquização (ou centralização de recursos econômicos, sociais, políticos e simbólicos36) faz surgir pelo menos quatro desafios aos quais, conjugados, poderíamos chamar de Desafio das Desigualdades:  i)  desigualdades e opressões sociais (de classe, gênero, raça, vinculadas à sexualidade), sustentadas por um padrão de hierarquização das diferenças entre modos de vida que privilegia aspectos de grupos dominantes, bloqueando acessos a recursos e oportunidades sociais, usufruídos ou controlados de modo privado (isto é, como privilégios) por esses grupos dominantes, reduzindo a capacidade de ação, intervenção e representatividade dos grupos dominados e favorecendo uma dinâmica social de subordinação, oposta ao ideal democrático de autonomia coletiva; ii)  assimetrias  de  recursos  e  poder  político,  associadas   tanto  aos   privilégios  de  grupos dominantes quanto aos estigmas e diferenças de status que marcam negativamente a trajetória dos grupos dominados, seja quando da produção coletiva de suas identidades e propostas, seja quando da   defesa   ou   consecução   de   seus   objetivos   políticos,   favorecendo   uma   dinâmica   social   de heterodeterminação, oposta ao ideal democrático de liberdade de autodeterminação e autolimitação; iii) diferenças cognitivas ou epistemológicas, forjadas a partir de hierarquização prévia de posições sociais e conhecimentos específicos que remodelam a valorização de funções (por critérios anteriores à interação ou à sua aplicação) e limitam a pluralidade de conhecimentos validados social e   politicamente,   aumentando   a   tecnocratização   e   favorecendo   uma   dinâmica   social   de heterodidatismo e de naturalização das especializações, oposta ao ideal democrático de igualdade (e mesmo do que se deveria entender por mérito);

36 Baseados no trabalho de Dahl em sua fase inicial (1940), e no entendimento de que a democracia é tentativa de desconstituição da autocracia, podemos concluir que a concentração do poder é a antítese da igualdade democrática. Assim, só com a redistribuição de recursos econômicos, sociais, políticos e simbólicos é que se pode falar em uma ordem social que contribua para efetivas reduções de desigualdades. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

iv)  disparidades entre reconhecimento e redistribuição, aprofundadas por uma tendência sistêmica   e   capitalista   de   concentração   de   riquezas,   associada   à   privatização   do   poder   e   da influência, favorecendo uma dinâmica social de subrepresentatividade (quando são reduzidos os efeitos das expressões, das oportunidades de engajamento e da amplitude das interações de grupos vulneráveis ou com baixo reconhecimento), oposta ao ideal democrático de justiça social37.  Essa   conjugação   proposta,   no   entanto,   precisa   ser   compreendida   de   maneira   a   não esquecermos que “esses diferentes padrões de desigualdade se inter­relacionam de forma complexa: não   são   nem   independentes   entre   si,   nem   redutíveis   uns   aos   outros”   (Miguel,   2014.   p.   304). Portanto,   por  óbvio   que   seja,   é   preciso   explicitar   novamente   sua   interconexão   com   o  próximo conjunto de dilemas. O  Desafio da Representatividade  aponta para a complexidade do tema da representação como  impasse   das   democracias   representativas   contemporâneas:   o   povo   é   o   soberano   que   não governa, pois deve ser representado pelo governante para exercer sua soberania.  Talvez não se possa contornar esse impasse com o simples abandono, impensável atualmente, da representação política. É isso que parece justificar o argumento de que “a representação política é incontornável para   qualquer   tentativa   de   construção   da   democracia   em   Estados   nacionais   contemporâneos” (Miguel, 2014. p. 13). Seria preciso considerar, portanto, a democratização da representação como condição para o aprimoramento das atuais democracias38.  Além disso, no entanto, sugiro repensar os movimentos de democratização como um tripé “Adesão­Participação­Interação”, visando ao aumento na interação do dēmos. Nesse tripé, a Adesão é o modo que exige que a representação se limite a um dos lados da separação funcional entre 37 Nesse sentido, pode-se tomar a definição de injustiça apresentada por Iris Marion Young, para quem ela é “mais do que simplesmente o fato de que pessoas sofrem infortúnios que não merecem. Ela diz respeito a como regras institucionais e interações sociais conspiram para estreitar as opções que muitas pessoas têm” (apud Miguel, 2014. p. 305). E, disso, tem-se que justiça social, definida a contrario, ou seja, sendo o oposto de injustiça, diz respeito a como regras institucionais e interações sociais contribuem para (e são derivadas de) a ampliação de acesso a opções, caminhos e recursos, de modo que pessoas e grupos possam validar socialmente seus modos de vida. 38 Miguel (2014, pp. 15-17) aponta para, pelo menos, quatro entraves para uma representação mais democrática: i) a separação entre governantes e governados, apontada no que chamamos de “terceiro pressuposto”; ii) a formação de uma elite política, a reprodução das desigualdades sociais e a subrepresentação, pela distância e especialização funcional entre governantes e governados, e pela dificuldade de aplicação do “princípio da rotatividade”, já que a permanência no poder tende a ser o principal objetivo desse grupo governante – o que foi discutido em nosso segundo pressuposto e no Desafio das Desigualdades; iii) a ruptura do vínculo entre a vontade dos representados e a vontade dos representantes, dada pela diferenciação social e funcional entre seus interesses – o que foi discutido em nosso segundo e terceiro pressupostos; e, iv) na representação eleitoral, a distância entre o momento das promessas de campanha e o momento do exercício do mandato – problematizado pelo Desafio da Autoimunidade. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

tomadores de decisão e o cidadão comum submetido a essas decisões (isto é, aumenta a distância entre representantes e representados); a  Participação  diz respeito à capacidade de influência na agenda pública e à inclusão (da presença ou da “perspectiva social”) nos debates públicos; e a Interação corresponderia à ampliação das condições de formação autodeterminada das preferências (individuais e/ou coletivas), por meio da associação temporária para o engajamento em problemas comuns e públicos.  Isso poderia contribuir para analisarmos a representatividade, e não só a representação. A representatividade, portanto, tem a ver com as capacidades reais ou socialmente viabilizadas, em condições artificialmente estabelecidas pela política como iguais, para que grupos ou indivíduos e seus interesses possam “contar”, pois indica: i) o efeito da liberdade de expressão (i. e., de falar e ser escutado); ii) a efetividade do engajamento (i. e., de ter condições para produzir ou interferir na agenda pública) e;  iii) a eficácia da interação (i.e., da ampliação de acesso a recursos materiais e simbólicos para a ação política). Assim, do ponto de vista das dinâmicas sociais e dos mecanismos políticos de ampliação da representatividade, cada um desses graus da livre­interação, porquanto limitados e distintos, mas interdependentes, faze surgir pelo menos um impasse específico que, juntos, conformam aquilo que denominaremos como Desafio da Representatividade:  i) buscar resolver a crise da representação39, que envolve em larga medida sua legitimação, dentro das esferas necessária e estritamente representativas, o que limita a interação a uma forma de adesão  aos   mecanismos,   mais   ou   menos   inclusivos,   de   formação   de   interesses,   identidades   ou comunidades   políticas   (que,   por   sua   vez,   só   poderiam   ser   constituídas   por   essa   mesma representação), invisibilizando os diferentes graus em que pessoas e grupos interagem entre si (e as diferentes experimentações de democracia que podem surgir daí); ii)  considerar   que   a   constituição   das   agendas   depende   exclusivamente   do   aumento   da participação em uma agenda pública e, portanto, da capacidade de universalização de interesses e demandas, compatíveis com a certa hierarquização de aplicação de recursos, o que desconsidera 39 As tentativas de formular essa ideia mais amplamente como “crise da democracia” se mostram míopes, quando não enviesadas, pois deixam de visualizar o paradoxo intrínseco à junção do substantivo (democracia), que fala sobre o governo do povo, com o adjetivo (representativa) que retira do povo, justamente, o governo, ao atribuí-lo aos representantes. A justificativa para isso têm como ponto de partida as “democracias atualmente existentes”, que são essencialmente democracias representativas e eleitorais, como aponta Miguel (2014, p. 98). Sobre isso, cf. também a nota 13. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

tanto   os   impedimentos   (formais   e   materiais)   para   essa   universalização   quanto   se   sustenta   na percepção (equivocada) da agenda pública como um funil e não como parte (importante, mas não única) na mobilização da opinião e dos recursos públicos para a resolução de problemas em um ambiente de pluralismo político (ou seja, como se os únicos problemas dignos de atenção tivessem de se apresentar como “grandes questões nacionais”); iii) considerar que a opinião pública, a formação das preferências e das identidades ou a vontade coletiva podem ser vistas como mera  agregação  de aspectos singulares (ou individuais), impondo   desafios   à   adaptação   da   representação   ao   crescente   descentramento   de   identidades,   à diversificação de comunidades políticas e à variação nos mecanismos de resolução de conflitos em um ambiente de pluralismo social; iv) sustentar que o princípio representativo em que “um fala em nome de outros”, fundado na lógica da geração artificial de escassez e de unidade, seja o melhor (quando não o único) modo de  interação política  para a decisão autônoma e coletiva sobre problemas comuns e públicos, de modo a inutilizar métodos alternativos que se fundam na lógica da abundância e da multiplicidade e, portanto, no reequilíbrio da redistribuição de recursos, no questionamento de sua hierarquização preestabelecida   (às   vezes,   extra­politicamente),   na   remodelação   dos   critérios   de   validação   de interesses e no reconhecimento de suas esferas públicas correspondentes.  Podemos afirmar então, em sintonia com a formulação de Miguel (2014, p. 135) para uma teoria   ampliada   (e   tridimensional)   da   representação   política,   que   há   uma   “precondição   do funcionamento   de   um   regime   democrático:   a   difusão   das   condições   materiais   mínimas   que propiciem, àqueles que o desejem, a possibilidade de participação na política”. E vale agregar a esse conjunto o questionamento de que haja uma  aptidão especial para o governo  – e a consequente hierarquização que a partir dela se mostra necessária e que, ao mesmo tempo, a justifica. Talvez seja isso, também, o que precisa ser problematizado para que se retome aquele impulso da lógica da igualdade, que sustenta que pessoas têm iguais capacidades para decidirem sobre o destino comum que lhes afeta40. O Desafio da Representatividade, portanto, procura conciliar diversas formulações e justificações do “princípio da distinção”41 – ao mesmo tempo em que procura manter os vínculos 40 Uma proposta nesse sentido, mesmo que ainda incipiente diante do problema colocado, já se encontra em O Mestre Ignorante (2002[1987]) e O Espectador Emancipado (2012), de Jacques Rancière. 41 Manin (2010. pp. 187-188) usa essa expressão para relembrar o fato de que, na instituição do governo representativo, “representantes eleitos podiam e deviam ser cidadãos eminentes, socialmente diferentes dos que os elegiam”. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

entre representantes e representados para legitimar tal separação – com um regime que se funda na igualdade. Assim é que esses dois desafios – o da Representatividade e o das Desigualdades – tratam, cada um a seu modo, mas interconectados, de princípios fundantes do que quer que se entenda por democracia – a lógica da liberdade e a lógica da igualdade. Falta ainda, no entanto, um último desafio a ser apresentado e que, se não é o mais destacado, certamente é o único aporético por definição. O Desafio da Autoimunidade trata das partes constituintes (os “genes”) desses projetos de democracia, isto é, daquilo que parece ser inescapável e que foi sendo conformado como um traço inequívoco   de   continuidade   e   perecimento   –   ou   seja,   de   indeterminação   –   entre   as   distintas Democracias   Inventadas   –   a   primeira,   pelos   antigos   gregos,   e   a   segunda   pelos   modernos antiabsolutistas. Com isso, constatamos a manutenção de alguns impasses que, desde sempre, geram insatisfação   e   promessas   não   cumpridas.   Ao   menos   três   deles   constituem   o   que   chamamos   de Desafio da Autoimunidade:  i)  o   projeto   da   democracia,   envolvendo   um   balanço   aporético   entre   os   princípios   de liberdade e igualdade, não oferece proteções finais eficazes (isto é, democráticas e justas) para se lidar com os usos da democracia contra ela mesma e, assim; ii) enquanto mecanismo de regulação de conflitos, a democracia é identificada ao sistema eletivo vigente, o que atualmente mantém a confusão entre o princípio da liberdade democrática e a competição eleitoral e partidária, e a confusão entre o princípio da igualdade democrática e o voto universal – confusões ampliadas tanto mais a democracia se limite a ser definida somente como método ou “regras do jogo” – e, ainda;  iii)  enquanto   regime   político  agonístico,   a  democracia   é  identificada  ao   Estado,  o  que atualmente mantém a confusão entre política e violência, ampliada tanto mais sua  dinâmica de administração estatal for adversarial e bélica, e tendo como consequência a diminuição do sentido do público como aquilo que é comum entre governantes e governados.  Sobre   o   primeiro   impasse,   vê­se   que   um   dos   grandes   dilemas   a   ser   enfrentado   na democracia é a possibilidade sempre presente de uso de seu instrumento político – seja a oratória, o discurso e a persuasão, seja  o voto e a competição eleitoral  – contra a própria democracia. Isso coloca   em   risco   não   só   a   estabilidade   de   seu   princípio   de   justiça,   uma   função   aporética   da I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

convergência entre igualdade e liberdade, mas coloca em questão também sua capacidade mesma de servir como artifício legítimo para decisões coletivas sobre o destino comum e público. Assim desdobra­se o segundo impasse, quando “o desafio gerado pela possibilidade de manipulação   da   determinação   da   'vontade   coletiva',   através   do   uso   estratégico   das   normas   de agregação de preferências” (Miguel, 2014. pp. 14­15), levaria à conclusão de que qualquer forma de decisão   coletiva   sobre   questões   comuns   seria   inócua   e   vazia,   quando   não   inapropriada,   pois   é facilmente manipulável. Conclusões desse tipo, além de insustentáveis, dependem justamente da identidade, questionável, entre democracia e sistema eletivo. Embora seja crucial saber “como” se decide, a democracia também precisa considerar “quem” decide, “onde” decide, “o que” decide e, com efeito, a autolimitação de saber sobre “o que não” se decide.  Ainda assim, esse problema do uso democracia – ou, particularmente, das eleições – contra a   própria   democracia  parece   não   poder   ser   eliminado,   por   meios   democráticos,   mas   somente controlado42  dentro   dos   limites   das   atuais   democracias   representativas.   Embora,   é   claro,   ele tampouco possa se superado sem algumas das “condições mínimas” asseguradas por essas mesmas democracias, uma vez que elas garantem janelas de oportunidade para a expressão e reivindicação de   soluções.   Por   isso   a   democracia   precisa   não   somente   ser   reafirmada,   como   ampliada   e reinventada. Sobre o último impasse, vê­se que o Estado, enquanto instituição política desenhada para conter a  bellum omnium contra omnes, passa a valer­se pouco a pouco da democracia, enquanto regime político agonístico, como método “aceitável” de administração dos conflitos. Desse modo, pelo   condicionamento   recíproco   entre   a   dinâmica   democrática   e   a   estrutura   estatal,   tal   como acontece   ao   se   rodar   um  software  em   um  hardware  limitado   ou   incompatível,   a   violência (estrutural)   é  amalgamada  à  (dinâmica)  política.  Daí  o  pressuposto  de a  natureza  adversarial  e guerreira dos seres humanos não poder ser erradicada, na política democrática, mas tão­somente controlada (pela violência do Estado). A   Democracia,   no   entanto,   parece   ter   sido   inventada   pelos   antigos   justamente   com tentativa de separação entre o âmbito da política, marcado pelo poder­fazer ou pela persuasão no 42 Diversos mecanismos sociais e institucionais de controle, tanto de “checks and balances” (freios e contrapesos) como de accountability horizontal e vertical, foram sendo paulatinamente agregados ao jogo democrático com vistas a diminuir a incidência do problema da ação ameaçadora das partes no processo de delegação de poder, por meio de sua limitação recíproca. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

interior da comunidade política, e o momento da guerra, marcado pela coerção ou pelo uso da violência no exterior da comunidade política43. Com a unificação de comunidades políticas sob a égide do Estado­nação, o que muda no contexto – e que se reflete como a segunda invenção da democracia – não é somente o elevado número de pessoas ou a complexidade e o tempo para a tomada de decisões, mas a criação de uma nova unidade política: o indivíduo, arrebanhado para constituir uma nação pouco conectada entre si, isto é, com alta hierarquização, forte centralização e incrementada especialização. Esse indivíduo inventa, portanto, um modo de regulação indireto (ou mediado) – a democracia representativa –, que não só modifica o estatuto da igualdade democrática (e o limita, como vimos, ao voto), mas também seu princípio de liberdade, ao concentrar­se mais em garantir proteção individual frente ao Estado, por meio da “possessão” de direitos individuais44 – o que foi entendido pelos modernos como “liberdade negativa”. E isso ocorre sempre que o Estado moderno apresenta­se como ameaça a seus próprios cidadãos. Como sintetiza Miguel (2014, p. 13), esse é o dilema entre “permitir a livre expressão dos interesses em conflito e ainda assim manter uma unidade mínima, sem a qual nenhuma sociedade pode existir”.  Desse modo, quando coesão social e coerção do Estado passam a ser uma e a mesma coisa, a   democracia   limita­se   a   um   método   de   unificação   da   comunidade   política,   constituída   por indivíduos, para administração do Estado. E deriva­se daí não haver democracia fora do Estado ou para além da “posse” de direitos individuais, assegurada exclusivamente por ele 45. Com isso, as atividades sociais (e políticas) são vistas como a luta contra inimigos por recursos escassos, uma estrita hierarquização é estabelecida conforme o mando­obediência, é reforçada a separação entre os que ordenam e os que executam as ordens, isto é, entre as decisões tomadas por um grupo e a execução   a   ser   levada   a   cabo   pelos   demais,   com   a   imposição   de   suas   consequências   a   todos, partícipes   ou  não   do  processo   de   decisão   –  em   suma,   todas   elas   características   presentes   num “estado   de   guerra”.   Por   isso   a   democracia   se   depara,   cotidianamente,   com   o  Desafio   da 43 A distinção entre poder (político) e violência (guerreira), como argumenta Arendt (2009), foi perdida com o advento do Estado-nação justamente porque essa é uma instituição desenhada para a guerra (e não para a política, portanto), conformada por seus meios coercitivos e seu aparato bélico-policial, além do próprio caráter de exceção de sua soberania. O Estado-nação, assim descrito, está sob o risco permanente seja da guerra total, seja do regime totalitário. Por isso ela pretende resgatar a dignidade (e o sentido) da política; não para imitar os gregos, mas para enfatizar aquela distinção necessária. 44 Mouffe (2005, pp. 18-19) argumenta que direitos e cidadania, pensados democraticamente, devem ser exercidos de modo coletivo ou coletivizado, mesmo quanto articulados pelo indivíduo liberal. 45 A apatridia, desse modo, deixaria um conjunto de pessoas sem, de fato, nenhuma garantia sobre sua humanidade. Essa é uma das problemáticas que a universalização dos direitos humanos enfrenta, pelo menos, desde 1789. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

Autoimunidade, que impõe limites ao desenvolvimento da própria democratização e ao que, na ânsia de superá­los, são impostos quase sempre movimentos de desdemocratização. E, assim, em suas intermitentes mudanças, caminha a Democracia. CONSIDERAÇÕES FINAIS O que se pretendeu argumentar aqui, em síntese, é que os limites da imaginação sobre soluções para os desafios da democracia se mantêm estanques se são tratados tão somente como impasses perenes da democracia, e não também como inadequação dos princípios que nos guiam diante deles. Assim, projetos de democratização deveriam buscar remover de suas bases os aspectos de “não­democracia” – isto é, de autocracia – que se fazem presentes seja nas teorias da democracia seja   nas   práticas   democráticas,   seja   em   dinâmicas   sociais   seja   em   instituições   políticas representativas ou participativas. A formulação um tanto extensa e com algumas subdivisões internas pretendeu, por um lado, contribuir para explicitar e melhor apresentar a complexidade de alguns dos desafios para as teorias   da   democracia.   No   entanto,   a   carência   de   síntese   pode   impor   custos   à   elegância   e   ao entendimento. E, prejudicado o entendimento, o que se dilui é justamente a potência do argumento.  Para um bem­vindo auxílio nessa tarefa – não só de elegância estilística, mas também de precisão conceitual –, apresento a formulação de Norberto Bobbio (1983, p. 89) sobre “os quatro inimigos   da   democracia”,   quais   sejam:   “as   grandes   dimensões,   a   burocratização   crescente   do aparelho estatal, o tecnicismo sempre maior das decisões a tomar, e a tendência à massificação da sociedade civil”46. Qualquer   tentativa   de   recorrer   a   uma   conexão   determinante   entre   os   desafios   aqui sistematizados e cada um desses “paradoxos da democracia” pode ser arriscada, dadas as diferenças tanto de abordagem quanto de léxico entre eles. No entanto, pode ser frutífero reconhecer que Bobbio (1983, pp. 59­62) apresenta:  i)  um   primeiro   paradoxo   que   fala   algo   sobre   o  Desafio   das   Grandezas,   quando explicitamente menciona as grandes dimensões das sociedades atuais e a complexidade de se “pedir sempre mais democracia em condições objetivas sempre mais desfavoráveis”; ii) um segundo paradoxo que considera a possibilidade de que a organização burocrática – “um aparelho de estrutura hierárquica e não democrática, de poder descendente e não ascendente” – 46 Para o argumento em sua forma mais desenvolvida, cf. Bobbio (1983, pp. 58-66). I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

cresce em proporção e amplitude junto com o  Desafio das Desigualdades, se é verdade que “o processo de democratização e o processo de burocratização não somente ocorrem ao mesmo tempo, mas o segundo é consequência direta do primeiro”47; iii)  o   diagnóstico,   no   terceiro   paradoxo,   de   que   incrementos   na   tecnocratização   das decisões,   comuns   em   sociedades   industriais   contemporâneas,   leva   ao   aumento   de   espaços   de decisão   reservados   a   especialistas   e,   assim,   impõe   barreiras   à   superação   do  Desafio   da Representatividade quando restringe, se este for mesmo o caso, movimentos de democratização da própria representação, de modo que seria contraditório “pedir sempre mais democracia em uma sociedade sempre mais tecnicizada”48; iv) o problema autoimposto pela democracia de lidar com sua indeterminação e com suas tendências ao nivelamento e à massificação, o que faz ser “necessário o emprego, mais ou menos amplo, mais ou menos intenso, de técnicas de organização do consenso”, que nos parece semelhante à formulação do Desafio da Autoimunidade. Assim,   são   justamente   as   variações   no  dēmos  –   em   sua   ampliação,   interatividade, constituição e em seu poder – que nos levam a reinventar a democracia como processos mais interativos   e   inclusivos,   protegidos   e   garantidos,   responsivos   e   mutuamente   vinculantes.   Desse modo, seus desafios criam (e são criados por) um tipo de sociedade e de regime político, moldado pelas   atuais   democracias   representativas   mas   não   limitado   a   elas,   que   precisa   continuamente inventar, legitimar e tornar a questionar seus padrões de organização e seus modos de regulação – apesar dos conflitos gerados em sua coletivização, mas seguramente também por causa deles.

47 A conexão mais própria entre diminuição das desigualdades pelo Estado e sua consequente burocratização aparece na citação, feita por Bobbio (1983, p. 60), de Silvio Spaventa: “Uma sociedade democrática, na qual foi proclamada a igualdade jurídica de todos diante da lei, tem exigências que impõem ao estado um número sempre maior de serviços e repartições, cujo objetivo é o de criar as condições através das quais cada indivíduo possa, com sua própria atividade, conquistar um estado que, de algum modo, corresponda à sua igualdade de direitos. Daí a necessidade de alargar sempre mais os limites da administração comum, que cria sempre novas relações entre cidadãos e o representante desta administração comum, que é justamente o estado”. Que o estado seja o único responsável, ou mesmo o mais indicado em todos os casos, pela indução do desenvolvimento ou pela redução das desigualdades sociais é questão polêmica, da qual não tratarei aqui. 48 O aspecto contraditório, para Bobbio (1983, p. 61), se encontra no fato de que “pedir mais democracia significa pedir a extensão das decisões que competem àquele que, pelas condições objetivas do desenvolvimento da sociedade moderna, se torna sempre mais incompetente”. Embora concorde com a conclusão, a premissa de incompetência parece, senão temerária, potencialmente antidemocrática. I Seminário Internacional de Ciência Política Universidade Federal do Rio Grande do Sul | Porto Alegre | Set. 2015

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