COMO SE PROCESSA A ALIENAÇÃO DO SER HUMANO

June 25, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Social Psychology, Economics, Social Sciences, Political Science
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COMO SE PROCESSA A ALIENAÇÃO DO SER HUMANO Fernando Alcoforado* A alienação das pessoas é a principal arma utilizada pelos detentores dos meios de produção e do poder político para evitar a conscientização da população sobre a servidão econômica e política em que se acha submetida e dela resulte a rebelião contra os desumanos sistemas econômicos e políticos em vigor. Karl Marx, filósofo, cientista político, e socialista revolucionário muito influente em sua época (século XIX) até os dias atuais afirma que existe alienação: 1) em relação ao produto do trabalho; 2) no processo de produção; 3) em relação à existência do indivíduo enquanto membro do gênero humano; e, 4) em relação aos outros indivíduos (Ver o artigo O que é alienação em Marx? disponível no website ). A alienação em relação ao produto do trabalho significa o estranhamento do ser humano trabalhador em não se reconhecer como autor do produto que produz graças a seu trabalho. O exemplo clássico é o da linha de produção, em que o trabalhador não se reconhece no produto final e nem mesmo sabe seu destino. O produto final é do empregador sendo um objeto estranho a qualquer indivíduo que trabalhou na sua produção. No fim do processo de trabalho, o produto feito se transforma em algo estranho, independente do ser que o produziu. A alienação no processo de produção é o que Marx chama de “alienação ativa” quando o trabalhador é forçado a trabalhar para sobreviver e trabalha além do necessário para produzir mais valia (diferença entre o salário pago e o valor do trabalho produzido) em benefício do empregador. O salário pago ao trabalhador tem por objetivo satisfazer suas necessidades básicas, como comer, dormir, beber, etc. enquanto a mais valia que é o trabalho não pago beneficia o empregador. O próprio trabalho é estranho ao indivíduo, que só trabalha sob coerção. Nessas circunstâncias, o trabalho é sempre considerado como o fardo para a sobrevivência do trabalhador. Uma tentativa de fazer do trabalho algo bom é constantemente praticada pelos empregadores realizando palestras motivacionais, criando um ambiente saudável e incentivando que os trabalhadores sigam sua “vocação” sob a perspectiva meramente econômica do capitalismo. A alienação do sujeito enquanto pertencente ao gênero humano se materializa no fato do individuo estar separado de sua essência, de sua ligação com a comunidade, de seu trabalho ao se tornar uma pessoa solitária deixando de ser mais um membro de sua espécie. O trabalho enquanto fator que faz com que o trabalhador se considere um indivíduo isolado é criticável também por considerar que ele só vale enquanto trabalhador, não enquanto ser humano. Segundo as coordenadas culturais da ideologia capitalista, cada indivíduo precisa estar apto e livre para buscar sua felicidade individual, que é reconhecida como o fim último e sentido da vida e não da espécie humana. A alienação em relação aos outros homens é a consequência óbvia da individualização da vida. Quando não se reconhece em seu aspecto mais fundamental, que é o trabalho, e quando ele não é reconhecido como parte essencial da vida humana e do ser humano enquanto gênero/espécie, então sua vida e a de seus semelhantes deixa de ter significado. Ser alienado enquanto parte da espécie humana, implica em se alienar 1

também dos outros. A teoria da alienação mostra o vazio do sujeito alienado, mostra a descaracterização da própria humanidade, da essência do sujeito. Segundo Althusser (ALTHUSSER, Louis. Aparelhos ideológicos de estado. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Graal, 1985), para que a produção sobreviva, é necessário que ela faça a reprodução dos meios de produção. Tais meios de produção são formados pelas forças produtivas e pelas relações sociais de produção existentes. A reprodução da força de trabalho se dá fora da empresa, e o meio material pelo qual ela se reproduz é o salário. O salário é indispensável para a reconstituição da força de trabalho do assalariado (vestimentas, alimentação, etc.), e também é indispensável à educação das crianças. Contudo, não basta apenas fazer com que a força de trabalho se reproduza; ela deve ser capaz de manusear as máquinas e equipamentos da empresa. Esta qualificação ocorre por meio do sistema escolar capitalista. Na escola, além de ler e escrever, são aprendidas também as regras do "bom comportamento", ou seja, aprende-se a ser submisso à ordem vigente, fazendo com que as pessoas sejam submissas em relação à ideologia dominante. Além da escola, também a Igreja e outros aparelhos, como as Forças Armadas, são aparelhos ideológicos do estado. Eles dominam não apenas pelo uso da força, mas também pelo uso da ideologia para manter a classe dominante no poder. Althusser separa o aparelho de estado do poder de estado. O objeto de disputa política é o poder do estado. Quem detém o poder do estado usa o aparelho do estado em benefício de sua classe. É preciso ter em mente não apenas a distinção entre poder de estado e aparelho de estado, mas também admitir a existência de uma realidade que não se confunde com o aparelho repressivo de estado: são os aparelhos ideológicos de estado. A diferença básica entre os aparelhos repressivos de estado (ARE) e os aparelhos ideológicos de estado (AIE) é que os ARE utilizam-se predominantemente de argumentos repressivos e coercitivos para atingirem seus objetivos. Já os AIE utilizam predominantemente a ideologia para manter sua dominação. Os AIE trabalham sobre a mente das pessoas. São integrantes dos AIE, dentre outros, o sistema de diferentes igrejas, o sistema escolar (tanto público quanto privado), o sistema familiar, o sistema jurídico, o sistema político, o sistema sindical, o sistema de informação e o sistema cultural. Outra diferença entre os ARE e AIE está na maneira de atuação. Os ARES utilizam-se da repressão e coerção, enquanto os AIE utilizam-se da ideologia. Enquanto os ARE são totalmente públicos, grande parte dos AIE pertence ao domínio privado. Isto não significa dizer que exista alguma diferença entre AIE públicos e privados: ambos funcionam como aparelhos ideológicos de estado. A função dos aparelhos repressivos do estado é não só manter as condições políticas da reprodução das relações sociais de produção, mas também manter, pela repressão, as condições políticas do exercício dos aparelhos ideológicos do estado. São estes que garantem a mais efetiva reprodução das relações sociais de produção. É aí que a ideologia da classe dominante funciona. A função de provedor da reprodução das relações de produção existe desde o pré-capitalismo. Em tal época, o principal AIE era a Igreja Católica, que tinha funções não só religiosas, mas também educacionais, além de uma boa parte das funções de informação e de cultura. Durante o século XIX, com a progressiva separação entre Estado e Igreja, surgiram novos AIE: a escola e a mídia. Estes AIE são os que mais influenciam no momento, pois é a escola quem dá formação a todas as pessoas, independentemente de classe social, desde o maternal até a 2

universidade e a mídia condiciona também o comportamento das pessoas, sobretudo através da TV. Portanto, é por meio da educação e da mídia que a reprodução das relações sociais de produção ocorre no momento. Esta ideologia, entretanto, está oculta, pois a escola é tida como neutra na formação do indivíduo e a mídia é considerada neutra na disseminação da informação. A escola e a mídia desempenham um papel determinante na reprodução das relações sociais de produção no sentido de manter o modo de produção dominante em cada sociedade. Na história da humanidade, a alienação já existia antes do advento do capitalismo com o surgimento da propriedade privada. O nascimento da propriedade privada como algo separado do sujeito que a produz existe juntamente com a alienação do trabalho. O sujeito alienado é, portanto, aquele que não se reconhece no produto de seu trabalho, que não se satisfaz na sua atividade de trabalho e que não se reconhece enquanto membro da espécie humana. O sujeito alienado é, portanto, um sujeito impotente. Este sujeito destituído de tudo que lhe é próprio não está apto para assumir a responsabilidade de guiar a sociedade junto com seus companheiros e não consegue perceber a possibilidade de uma mudança econômica, política e social. O fim da alienação do ser humano é fundamental para que ocorra o progresso da humanidade. Para alcançar este objetivo, é preciso eliminar todos os fatores que contribuem para a existência da servidão humana. * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no BrasilEnergia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015).

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