COMPETIÇÃO E ESTRUTUÇÃO DO SISTEMA PARTIDÁRIO BRASILEIRO

May 22, 2017 | Autor: D. Vieira da Rocha | Categoria: Competição Eleitoral, Partidos E Sistemas Partidários, Sistemas Eleitorais
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COMPETIÇÃO E ESTRUTUÇÃO DO SISTEMA PARTIDÁRIO BRASILEIRO

Introdução

Os estudos sobre partidos e sistemas partidários, e também sobre os efeitos do tamanho do sistema partidário tem tido bastante relevância para compreender o fenômeno da dinâmica desses atores políticos nas democracias contemporâneas. Esses estudos tem focado bastante nos determinantes do tamanho do sistema partidário ao redor do mundo (DUVERGER, 1954; LIPSET & ROKKAN, 1967; RAE, 1971; RIKER, 1982; SARTORI, 1976). Em grande medida esses diversos trabalhos focam nas estruturas e incentivos da formação do sistema partidário como leis eleitorais (regras majoritárias ou proporcionais para os cargos, sistema de um ou dois turnos, fórmula eleitoral, etc.), sistema de competição, ideologia e bases sociais, federalismo e heterogeneidade social em geral para analisar os fatores determinantes de seu tamanho. Porém, algo que tem muitas vezes sido dado pouca atenção são as estruturas institucionais que fazem com que as elites partidárias tenham que agir estrategicamente como, por exemplo, nas eleições presidenciais. (GOLDER, 2006) dependendo se as eleições presidenciais são realizadas próximas a do legislativo, no mesmo período ou com alguma distância. Quanto maior a proximidade temporal entre eleições majoritárias e proporcionais e dependendo do nível de coordenação pré-eleitoral (número de candidatos competitivos) conduz-se a um efeito direto no sistema partidário. Partindo desse ponto, busco discutir aqui alguns pontos relativos ao efeito da estrutura da competição sobre a fragmentação partidária no cenário brasileiro, e buscar algumas bases para posteriores estudos comparados sobre a fragmentação partidária no Brasil e em outras democracias presidencialistas. Se assumimos que a estrutura da competição é um dos pontos determinantes da maior ou menor fragmentação partidária, partidos que dão mais prioridade a disputas majoritárias seriam penalizados ou recompensados em disputas proporcionais? Se são penalizados, quanto isso tem inserido de custo ao chefe do Executivo? Concorrer em pleitos majoritários contribui com uma interferência na força dos partidos (interferência

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que pode ser positiva, negativa ou neutra)? Haveria um trade-off nas estratégias partidárias que obrigariam que as coordenadas pré-eleitorais indicassem que para sobreviver dever-se-ia escolher uma das duas arenas (majoritária ou proporcional) para lograr o sucesso? Esses são os pontos principais que assumimos aqui para debater o atual quadro de fragmentação do sistema partidário brasileiro que nas eleições de 2014 atingiu um número de 28 partidos representados dentro da Câmara dos deputados e que tem causado ampla discussão nos meios de comunicação, entre intelectuais e também no senso comum sobre o sistema político brasileiro e traz consigo a já conhecida discussão sobre a reforma do sistema como forma de melhorar algo que tem muitas vezes recebido a crítica como um sistema político pouco representativo ou funcional. Primeiramente vamos analisar como alguns autores tipificam os sistemas partidários e buscar compreender em que tipologia ou estrutura está calcado o atual sistema partidário brasileiro. Em seguida, vamos analisar os dados relativos aos maiores partidos para visualizar em que arenas cada um desses tem priorizado disputar, qual o nível de competição cada um tem selecionado (se mais nacionalizado ou focado em estados) e qual tem sido o retorno político eleitoral dessas estratégias. Por fim, concluímos com um panorama geral sobre o estado do sistema partidário brasileiro e o que se pode inferir sobre conceitos que em geral são dados como estabelecidos na literatura internacional como a correlação entre sistemas proporcionais e instabilidade política, fragmentação partidária e aumento de poder de veto de minorias parlamentares que podem incorrer em paralisia da agenda de governo, entre outros pontos críticos que tem sido extensivamente relacionados ao tamanho do sistema partidário e funcionamento das instituições democráticas.

Competição partidária e fragmentação: o atual cenário do sistema partidário

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A experiência política brasileira inicia a formar partidos nacionais e a estabelecer um processo partidário competitivo em 1946 que logo é interrompido em 1964 por um golpe militar. Logo após o período (1946-1964), a ditadura militar manteve algum arcabouço institucional com eleições regulares mesmo que com restrições a formação de partidos, regras autoritárias e casuísticas na intenção de promover uma imagem de “democracia relativa” (FLEISCHER, 2004, p. 249). Houve então uma transição democrática que iniciou a reestabelecer o processo competitivo e a liberdade de formação e organização de partidos que veio a se consolidar a partir de 1988 com a volta do processo constitucional como mediador das relações políticas. Pensando pela perspectiva de que o sistema partidário brasileiro foi forçosamente desmontado com uma legislação arbitrária que impunha o bipartidarismo, temos nesse novo período democrático um sistema multipartidário que se caracteriza por diversas nuances que pedem estudos mais aprofundados sobre os múltiplos aspectos que assume. A necessidade de se dar prosseguimento a essa agenda de estudos e também de abrir novas perspectivas mais amplas sobre o tema que se torna cada vez mais importante uma vez que o sistema partidário brasileiro vem passando por diversas mudanças com entradas de novos atores e aumento do processo competitivo.

O sistema partidário brasileiro conta atualmente com 35 partidos com registros deferidos no TSE dentre os quais 30 deste todo possuem assento na Câmara Federal e 17 no Senado Federal. Constam ainda 24 registros de partidos em análise no TSE1. Isso proporciona que não haja partidos majoritários no Congresso Federal e que assim tenhamos um sistema presidencial multipartidário mais fragmentado em todo mundo. Como podemos visualizar no quadro partidário brasileiro, desde o final de 1979 quando o congresso encerrou o bipartidarismo forçado, partidos vem sendo criados com bastante frequência. Em períodos pré-eleitorais ou em dissidências das elites partidárias, pode-se visualizar quebras partidárias. Como era de se esperar, no período de reabertura para a criação ou reorganização de agremiações partidárias muitas siglas começaram a ser fundadas. Por 1

http://www.tse.jus.br/partidos/partidos-politicos/partido-em-formacao - Pesquisa feita em 14/06/2016

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toda a década de 90 enquanto o quadro partidário ainda estava se estabilizando em torno dos maiores partidos também houve uma grande mobilização das lideranças partidárias na criação de partidos. Após a eleição de 1998 esse quadro de criação de partidos se estabiliza e fica estável por toda década de 2000 voltando a crescer novamente a partir de 2011 e com números crescentes de agremiações sendo formadas, muitas das quais conquistando espaço dentro do Congresso Nacional sem ter concorrido a nenhuma eleição, demonstram em certa medida o caráter altamente burocratizado e ligado ao Estado que esses partidos têm. Isso consequentemente faz com que a força de bancadas de partidos maiores se reduza e faça com que o governo tenha que se mobilizar mais na sua relação com o legislativo. Para ser reconhecido pelo TSE, um partido precisa se organizar em apenas um terço dos estados, ou seja, o partido não necessariamente está apto a ter candidatos a todos os cargos em todos os distritos. Lançar candidatos em todas as unidades da federação como tem sido feito em grande medida pela grande maioria dos partidos nas últimas eleições requer requisitos mínimos organizativos como a atração de filiados, criação de diretórios e realização de convenções. O aumento substantivo das dotações do fundo partidário e as regras de distribuição que tem ajudado a partidos pequenos por buscar a equidade, tem contribuído com esse aumento de oferta de candidatos pelos partidos e contribuído para que possam estar presentes em disputas em quase todo o território nacional. Em 2014 tivemos a 7° eleição realizada desde a volta do período democrático e sob os auspícios da nova Constituição de 1988. Com exceção das eleições de 1989, desde 1994, PT e PSDB tem polarizado a disputa presidencial conseguindo deixar bastante claro ao eleitor quais são os projetos de cada partido. Esse processo competitivo também proporcionou uma estruturação no sistema partidário fazendo com que outras siglas estivessem sempre circulando em torno dessa disputa. Como a estrutura da competição presidencial com coalizão permite que mesmo que um partido que não ganhou o pleito majoritário possa participar no governo, o sistema partidário tem se estabilizado quando se analisa tal processo competitivo. A noção de estabilização ou estruturação do sistema partidário atual tem gerado algumas divergências na literatura sobre o tema. Algumas inovações teóricas seguidas

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de uma visão mais minimalista dos partidos, adotada por autores como ROSE e MACKIE (1988) e MAIR (1997) dão mais ênfase a relação dos partidos diretamente com o Estado e o processo de formação do governo. Sendo assim, BRAGA (2010) TAROUCO (2010), MELO (2010) tem apontado para a estrutura da competição presidencial como um fator de estabilidade do sistema partidário e da competição. Porém, MELO (2010); MELO e ALCÂNTARA (2012); CARREIRÃO (2014) tem apontado que mesmo que se possa indicar uma estabilização no sistema partidário, os efeitos do sistema eleitoral aninhado a estrutura da competição tem contribuído para a manutenção da fragmentação que produz uma oferta excessiva de candidatos, dificultando a escolha por parte do eleitorado e produzindo cada vez mais pequenos partidos que passam a ter algum poder de veto. Consequência disso é que com partidos mais voltados a sua relação com o Estado, mais se mantém a falta de laços entre partidos e sociedade contribuindo para a sensação de uma falta na representação política e no processo de accountabillity sobre a tomada de decisão dos agentes políticos. No debate corrente, tem se discutido muito sobre as proporções que tem tomado a fracionalização partidária, questionando a necessidade desse aumento constante. Em grande medida se leva em conta que para analisar um sistema partidário, deve-se analisar o universo de partidos existentes. O total de partidos conta, porém deve-se olhar para o percentual de votos que cada partido recebe para analisar sua força eleitoral (RAE, 1971; SARTORI, 1976). As análises que compõe o quadro de análise dos sistemas partidários põe em geral uma visão pessimista sobre os sistemas proporcionais indicando que uma alta fragmentação partidária ocasionaria em geral em um processo de instabilidade MAINWARING (1993). Em certa medida há uma confusão quanto ao desenho político que erra na crítica ao colocar como problema a representação proporcional, quando na verdade o que tem tido maior proeminência na fragmentação do sistema partidário são fatores estruturais ligados ao sistema partidário e eleitoral NICOLAU (2002; 2006). A representação proporcional é parte explicativa da configuração partidária brasileira, mas não é o fator que está diretamente correlacionado a alta fracionalização do sistema. Modificar a representação proporcional certamente pode reduzir o nível de

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fracionalização, mas fatores dentro do sistema de representação proporcional reduzem ou aumentam esse nível. Tais fatores como expostos por NICOLAU (2002; 2006) são; A magnitude dos distritos que é um primeiro fator que contribui para o aumento da fragmentação. Como os distritos no Brasil tem em geral um tamanho médio ou alto, há uma contribuição para que partidos pequenos conquistem um assento nesses espaços. A coligação é um segundo fator que contribui para que partidos pequenos possam se manter, se coligando com partidos com extensa votação e obtendo benefícios nesse sentido. Um dos problemas de coligações é que elas tratam desigualmente o voto dos eleitores. Um candidato pode se eleger a partir do total de votos da coligação conquanto outros que alcançam um número maior de votos, mas não atingem o quociente eleitoral podem ficar de fora. E por fim, se unindo a esses dois fatores tem-se como problemática o voto em lista aberta que produz uma acentuação de voto mais centrado na figura pessoal de um candidato enfraquecendo os laços entre eleitores e partidos. A identidade partidária no Brasil é bastante volátil e não produziria os partidos de representação de massa SAMUELS (2006). AMORIM NETO e COX (1997) expõe o sentido da alta fragmentação partidária como um efeito de grandes clivagens política e/ou sociais em um determinado contexto dentro de um país com amplas clivagens. Não havendo essas clivagens tão aprofundadas no Brasil (embora haja grande heterogeneidade social e regional), o que tem determinado de fato tem sido as fórmulas eleitorais e as estratégias alcançadas pelos partidos. A Competição política passa a se tornar um pressuposto de estabilidade política. Por mais que em razão das leis eleitorais se tenha um sistema que se produz cada vez mais fragmentado, o sistema partidário deve ser visto não apenas em razão de seu tamanho, mas de seu nível de representação e de possibilidade de entrada de novas lideranças como buscamos fazer mais a frente. A representação passa a ser um monopólio do sistema partidário, que engloba o sistema participativo no qual diversos setores se apropriam para disputar poder no sistema social. A estabilidade ou a polarização independe do número de partidos, como supõe alguns teóricos da teoria

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democrática (mais especificamente Sartori neste caso), mas sim de como se organizam as elites dentro do sistema. De tudo isso, temos o quadro com o qual saímos das eleições de 2014 que pode ser analisado como uma situação atípica no Congresso Brasileiro. Com 32 siglas concorrendo ao pleito eleitoral, 28 partidos tomaram acento dentro da Câmara Federal. Não só há uma dispersão partidária, mas também nas forças de cada um deles individualmente; o maior partido dentro da Câmara, o PT elegeu 69 deputados somando apenas 14% do total de cadeiras. Contribuindo ainda com o resultado já fragmentado das eleições, mais três siglas foram criadas em 2015 (Partido Novo, REDE, Partido da Mulher Brasileira) já conquistando cadeiras via migração partidária. Sem ainda haver participado de eleições, o Partido criado pela ex-senadora e candidata a presidência Marina Silva, o REDE Sustentabilidade, logo de sua criação já contava com nomes de partidos grandes e atualmente possui cinco deputados federais (1% do total de cadeiras, suficiente para criar uma bancada partidária). Já o Partido da Mulher Brasileira (PMB) conta atualmente com um grupo de 19 Deputados Federais correspondendo a 4% de cadeiras dentro da Câmara dos Deputados o que lhe dá possibilidades de recursos e barganha com o governo bastante consideráveis2. Com essas migrações, partidos grandes tiveram perdas de lideranças importantes. Mesmo com a criação destes novos partidos, algumas lideranças já se organizam em torno de novos projetos partidários, como é o caso da Deputada Luíza Erundina (PSB) que descontente com sua agremiação atual, já se mobiliza para a criação de seu Partido Raiz Movimento Cidadanista, inspirado em partidos movimento europeus3. Com essas variações, somam-se mais 2 partidos com representação dentro da Câmara dos Deputados chegando a soma de 30 partidos com representação O que se tem no atual cenário partidário brasileiro é que embora o sistema esteja se estruturando via competição partidária pela formação de governo, o sistema ainda possui muita abertura para a entrada de novas lideranças e realocação de lideranças dentro do quadro geral. Isso tem como consequência que o sistema partidário brasileiro

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http://www.camara.leg.br/internet/deputado/bancada.asp - Acessado em 16/02/2016 http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,erundina-vai-fundar-seu-partido-a-raiz--imp-,1816238 – Acessado em 16/02/2016 3

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embora venha se consolidando, tem conduzido a uma crescente competição e consequentemente pela necessidade de maior organização e estratégias partidárias.

Estrutura da competição e desempenho partidário

O conjunto de regras que regulamentam a competição e o andamento de uma determinada instituição são indicadores de seu funcionamento e de sua condição de institucionalização/estruturação. Segue-se como objetivo aqui, informar como os partidos e elites partidárias se utilizam das regras do jogo e como os arranjos institucionais influenciam diretamente na tomada de decisão. Cabe aos partidos assumirem posições no processo decisório, tomando posição sobre como distribuir a oferta de candidaturas, optar por uma coordenação eleitoral para assumir um protagonismo que conduz a sua maior ou menor consolidação dentro do sistema partidário. Os partidos e as elites partidárias são atores racionais que visam a maximização dos seus ganhos e a minimização dos custos e das perdas. Assim, temos indivíduos que pretendem atingir seus objetivos (nesse caso o acesso a cargos da administração pública, podendo compor o governo). De modo racional, em que haja vários atores jogando e com uma sequência de jogos cuja informação aos jogadores é escassa, diferentes arranjos institucionais são criados (NORTH, 1990, ELSTER, 1994, OLSON, 1999). Desse número de arranjos institucionais que informam as regras do jogo são produzidos os arranjos políticos diversos nos quais os partidos disputam espaço. As opções feitas por um determinado partido, influenciam diretamente na tomada de decisão de outros. Como muito bem salienta MAIR (1997): “Rather, this dimension became established and consolidated as a result of the strategies of the parties themselves- the issues on which they competed, the ways in which they appealed to voters, the approaches they adopted to the process of government formation, and the various alliances and a divisions which they fomented. The party system is thus the creature of the parties, but at the same time they also become its prisoners. Stasis is

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the norm, and for party systems, as for institutional structures more generally (Krasner, 1984:235), there is a ‘capital stock’ embodied which cannot easily be dispensed with.” (MAIR, 1997, p. 15) Como bem expõe o autor, o sistema de partidos vai produzindo uma estabilização como resultado da competição e das estratégias adotadas pelos partidos. Porém, ao mesmo tempo que estes produzem uma estabilidade na competição, se tornam fechados dentro dela, sendo obrigados a agir dentro dessa estrutura para que possam atingir os objetivos estabelecidos. Instituições políticas como a estrutura da competição que se forma com as regras do jogo e com as ações por parte dos atores políticos envolvidos afetam diretamente a tomada de decisão sobre as questões partidárias. Os principais atores, analisando as preferências por parte das instituições políticas e sociais se movem em direção a maior possibilidade de ganhos. Toda essa estrutura institucional (principalmente de campanhas majoritárias unidas às proporcionais) aliada a distritos com magnitudes médias ou altas e coligações tem contribuído em grande medida para o alto grau de fragmentação atual e para o seu constante aumento. A coordenação pré-eleitoral produzida pelos partidos, busca dentro desse cenário construir os meios com maior possibilidades de ganhos eleitorais e consequentemente ganhos no processo de formação do governo. A dispersão existente em magnitudes maiores obriga que partidos adotem estratégias eleitorais para buscar se estabelecer eleitoralmente. Adotar uma estratégia significa escolher em quais arenas e espaços atuar e consequentemente abrir espaços para que partidos menores possam adotar estratégias que busquem os espaços deixados de lado pelos maiores. Em uma estrutura onde os jogos são aninhados, um pay-off produzido em uma determinada área afeta diretamente outras áreas do jogo sendo necessário obter um nível de informação sobre como jogam os outros competidores TSEBELLIS (1998). Isso proporciona em alguma medida a institucionalização do sistema partidário e um aumento na competição eleitoral, mesmo com o sistema tendo pouca identificação partidária entre eleitores e representantes como identifica CARREIRÃO (2014).

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Aliado ao tamanho das magnitudes, temos como movimento sequencial dentro dessa lógica que: estratégias eleitorais (coligações proporcionais com possibilidades de coalizão dentro do governo) produzem um aumento na competição política e fracionalização do sistema partidário que se institucionaliza por manter diversos partidos nas disputas em eleições seguidas. Como há uma “aninhamento” das eleições majoritárias e proporcionais no Brasil, partidos menos competitivos se utilizam de uma coligação, abrindo mão de disputar na majoritária com a possibilidade futura de compor a base do governo e também produzir políticas públicas para seu eleitorado MELO (2010). Essa estrutura possibilita aos partidos que se tornem mais competitivos na arena eleitoral conquistando uma maior estabilidade dentro do sistema partidário. Como podemos ver no gráfico 1, os partidos que tem tido preponderância nas eleições presidenciais, embora ainda mantenham as maiores bancadas, tem visto sua força individual ser cada vez mais reduzida aumentando os custos de transação na formação de governo e também de construção da oposição.

Deputados Federais eleitos por PSDB e PT de 1994-2014 120 100 80 PSDB

60

PT 40 20 0 1994

1998

2002

2006

2010

2014

Fonte: Elaborado pelo autor com dados da Câmara dos Deputados. Se podemos afirmar que PT e PSDB mesmo com perdas ainda se mantém como principais lideranças, temos que os custos de transação tem aumentado cada vez mais.

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Se em 1994 o governo FHC conseguia maioria simples (de 50% mais 1) fazendo alianças com apenas mais 2 grandes partidos (PMDB e PFL) de caráter ideológico mais aproximado, o atual governo Dilma precisa de pelo menos 7 partidos em sua base PT (59), PMDB (67), PP (41), PSD (32), PR (35), PTB (22) e PC do B (12). 4 O número de partidos na formação de governo aumentou e também houve uma descontinuidade ideológica. PT que na oposição atuou sempre ao lado de partidos à esquerda do espectro ideológico como PSB e PDT, agora tem como coalizão partidos mais alocados por todos os pontos ideológicos. Essa mudança afeta também a oposição. Atualmente o maior bloco que está unido na base oposicionista e que apoia o processo de impeachment instalado no final de 2015 é formado por PSDB (53), DEM (21), PPS (10), Partido Solidariedade [SD] (15) e PV (5). Por outro lado a oposição conta também com PSB (33), REDE (5) e PSOL (5) que podem se unir em votações bastante específicas contra o governo, mas que não se veem como base de uma mesma contiguidade ideológica. O gráfico 2 mostra como o desempenho eleitoral dos maiores partidos embora os mantenha ainda como partidos fortes na formação de governo e na oposição, tem decrescido eleição após eleição sem conseguirem restaurar números já atingidos anteriormente.

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PT saiu com a maior bancada das eleições, mas devido ao processo de crise econômica e política que se agravou em 2015 acabou perdendo nomes de seu quadro

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Evolução de Deputados Federais nos maiores partido 1994/2014 120 PSDB 100

PT PMDB

80

PFL/DEM PP

60

PSB 40

PDT PPS

20

PL/PR 0

PV 1994

1998

2002

2006

2010

2014

Fonte: Elaborado pelo autor com dados da Câmara dos Deputados. Como se pode notar, todos os partidos puderam sentir um movimento de queda em seus resultados eleitorais. Olhando primeiro para os partidos de oposição, vemos que a distância dos recursos estruturais proporcionados quando estavam no governo, afetaram bastante seu desempenho na arena eleitoral. Tais partidos não tem conseguido mobilizar o eleitorado para dentro de uma agenda na contramão das políticas produzidas pelo Governo. O partido que sofre uma queda quase vertical, bastante percebida é o DEM (antigo PFL) que vê sua bancada sendo diminuída ano após ano, e tem sentido ainda mais a perda pós 2010 quando da criação do Partido Social democrático (PSD) criado pelo ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. O PPS também tem sido bastante atingido pela sua dificuldade de propor um discurso que possibilite a abertura de uma outra agenda. O PSB que sempre foi um aliado do PT na oposição e no governo, vinha com ganhos eleitorais crescentes e em 2014 optou por disputar as eleições presidenciais, e fazer parte da oposição teve uma leve perda, que embora ainda não possa ser considerada como constante, mas que demonstra o efeito da estrutura institucional sobre o desempenho partidário. Concorrer em eleições majoritárias como terceira via sem

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chances reais de vitória pode incorrer em perdas diretas ao partido5. A falta de coordenação das elites partidárias pode reduzir o grau de otimização desejada pelo partido. Em 2014, a fracionalização partidária atingiu um percentual de 0,93 indicando uma ampla dispersão partidária dentro da Câmara dos Deputados, número não alcançado em nenhum momento nas instituições político-representativas brasileiras. Essa fracionalização tem produzido se não uma instabilidade de governo, tem produzido alguma incerteza na agenda, visto que a manutenção de um número maior de partidos na base de formação do governo tem gerado um gasto maior de força para o direcionamento das lideranças partidárias aprovarem a agenda de políticas do governo.

Considerações finais:

Embora a relação comumente feita entre fracionalização partidária e instabilidade coloque em relevância os custos de transação para a formação de governo, o que se tem visto é que fracionalização impõe também perdas grandes a formação de uma oposição. Com uma oposição que também se fracionaliza e consequentemente se torna mais heterogênea ideologicamente, a proporção com que esta possa criar barreiras ao governo também reduz. Nessa sinergia partidária, podemos dizer que um governo com diferentes matizes ideológicas tem mais meios para coordenar suas ações do que uma oposição com essas características. Assim, algumas considerações que podem ser feitas a respeito do atual cenário são as que: - A fracionalização aumenta a inconsistência ideológica dentro da coalizão de governo e isso gera conflitos entre as bases e a formação de governo. A inconsistência ideológica 5

Até antes do trágico acidente de Eduardo Campos, então cabeça de chapa do PSB, as pesquisas eleitorais davam apenas 8% de intenções de voto no candidato, o que demonstrava que seria uma candidatura pouco competitiva. Apenas após seu acidente e a com candidata Marina Silva se tornando cabeça de chapa, é que o partido começou a se tornar um possível ganhador. Porém, um imponderável do processo político.

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aumenta ainda mais o conflito na oposição que não pode abrir mão de suas bases a não ser por conquistas mais consistentes e a possibilidade real de ganhar o governo. - Embora haja alta fragmentação, os partidos maiores ainda tem dominado a maioria dos votos no congresso garantindo a estabilidade do sistema. - A alta fragmentação para além de aumentar os custos de transação do governo, tem tornado mais custoso ainda a manutenção da oposição que tem decrescido e se fragmentado mais do que o governo, gerando pouca força de contestação e até mesmo perdas eleitorais. Com isso, o que se tem, é que a despeito das diversas literaturas que associam fragmentação à instabilidade não corroboram com os fatos vistos dentro do sistema partidário brasileiro que tem sido considerado um dos mais fragmentados do mundo. Olhar apenas o número total de partidos sem analisar as reais possibilidades de representatividade e accountability que esses possam gerar, pode criar a ideia de uma instabilidade ou “crise” que fazem parte não diretamente do número que compõe o sistema partidário mas sim do acirramento de ânimos das principais matizes ideológicas que competem pelo governo.

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Resumo: Esse artigo busca entender principalmente como instituições políticas afetam a coordenação e o comportamento de tomada de decisão dos agentes políticos. Os incentivos institucionais que a estrutura da competição proporciona, principalmente no que tange a concomitância de eleições majoritárias e proporcionais tem contribuído como fator importante no aumento da fragmentação. A partir de dados eleitorais, buscamos analisar aqui em primeiro lugar o grau de fragmentação do sistema partidário brasileiro. Em seguida discutir como a estrutura da competição tem afetado o desempenho eleitoral dos partidos e por fim considerações a respeito dos dados discutidos. Concluímos que a despeito da literatura que associa fragmentação à instabilidade não corrobora com os fatos vistos dentro do sistema partidário brasileiro. Palavras-chave: sistema partidário; competição política; comportamento político. Abstract: This article seeks to understand how political institutions affect mainly the coordination and decision-making behavior of political actors. Institutional incentives that the structure of competition provides, especially regarding the concurrence of majority and proportional elections has contributed as an important factor in increasing fragmentation. From electoral data, we analyze here first the degree of party system fragmentation. Then discuss how the structure of competition has affected the electoral performance of the partys and finally considerations regarding the data discussed. We conclude that although the literature that associates fragmentation instability does not corroborate the facts seen within the brazilian party system. Keywords: party system; political competition; political behavior.

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