CONCEITOS E PRÉ-CONCEITOS: UMA ANÁLISE DAS CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO SOBRE TEMAS EM BOTÂNICA

May 24, 2017 | Autor: Renato Moul | Categoria: Botany, Education
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CONCEITOS E PRÉ-CONCEITOS: UMA ANÁLISE DAS CONCEPÇÕES DE ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO SOBRE TEMAS EM BOTÂNICA

RENATO ARAÚJO TORRES DE MELO MOUL FLÁVIA CAROLINA LINS DA SILVA

ENSINO E DIDÁTICA DA BIOLOGIA

Resumo Uma das áreas de estudo da Biologia, a botânica, é vista por muitos docentes como um obstáculo para a transposição didática. O ensino de botânica por vezes se dá de forma fragmentada e desprovido de contextualização, numa abordagem que dificulta a adequada aprendizagem dos conceitos. A fim de detectar as concepções prévias dos estudantes acerca de temas em botânica e suas respectivas relações com a construção de conceitos, investigamos as concepções sobre definição de plantas e sua importância para o planeta. Utilizamos a análise do discurso do sujeito coletivo, comparando o discurso individual e o discurso num contexto macro, haja vista que o discurso individual mostra não apenas a percepção e concepção individual de mundo, mas uma percepção compartilhada que forma também um discurso coletivo. Como resultado, observou-se que muitas concepções dos estudantes seguem pré-conceitos que contribuem para uma inadequada formulação de conceitos em Botânica. E ainda, uma visão reducionista, onde os estudantes apontam como plantas importantes para o planeta, aquelas mais próximas de sua realidade. Palavras-chave: Ensino, Concepções, Botânica, Discurso.

CONCEPTS AND TRENDS: AN ANALYSIS OF THE CONCEPTIONS OF HIGH SCHOOL STUDENTS ABOUT TOPICS IN BOTANY

Abstract One of the Biology study areas, botany, is seen by many teachers as an obstacle to the didactic transposition. The teaching of botany sometimes occurs in a fragmented context, an approach which hinders the proper learning of concepts. In order to detect the preconceptions of students on topics in botany and their relations with the construction of concepts, investigated the views on the definition of plants and their importance to the planet. We used the analysis of the collective subject speech, comparing the individual speech and speech in a macro context, given that the individual speech shows not only the perception and individual conception of the world, but a shared perception that also forms a collective discourse. As a result, it was observed that many of the concepts students follow preconceptions that contribute to inadequate formulation of concepts in botany. Moreover, a reductionist view where students signalize as important plants for the planet those closer to their reality. Keywords: Education, Conceptions, Botany, Speech. Introdução

As situações de ensino e aprendizagem devem promover a construção do conhecimento no percurso acadêmico de cada estudante. Todavia, por vezes, após uma série de exposições do conteúdo e consequente execução de atividades - que nada mais permitem que simples reproduções - o produto gerado não permite a correta assimilação dos conceitos e sua aplicação em situações de vivências distintas, por parte do discente. Diversas áreas de ensino da Biologia, uma ciência natural que lida com um objeto de estudo que ora se mostra abstrato ora se mostra concreto, apontam dificuldades aos docentes que ministram suas aulas com métodos engessados que não viabilizam a construção do conhecimento, numa “abordagem do currículo que ocorre desprovida de considerações históricas e pautada na simples apresentação de nomes científicos, com um complexo conjunto de conceitos e sistemas de classificações não apreendidos pelos educandos (MORALES, 2014)”. Para muitos docentes, uma

contextualização não se opera e o processo de ensino-aprendizagem “revela-se como o estudo de nomenclaturas técnicas utilizando-se de metodologias tradicionalistas que estimulam memorização dos conteúdos (ARAÚJO; SILVA, 2015). Dentre as muitas áreas da ciência que estuda a vida, a Botânica também é vista como obstáculo, por muitos professores, para a transposição didática. Ceccantini (2006) afirma que muitos professores de Biologia fogem das aulas de Botânica alegando ter dificuldade em desenvolver atividades práticas que despertem curiosidade nos estudantes e mostrem a utilidade daquele conhecimento no seu dia-a-dia. Uno (2009) indica que os estudantes não veem plantas ou botânica como um conteúdo inerentemente interessante. Amadeu e Maciel (2014) apontam que as experiências de ensino dos conteúdos botânicos são consideradas desinteressantes por parte dos educandos, uma vez que as práticas pedagógicas empregadas geram um aprendizado mecânico e com baixo rendimento escolar. Este é um problema que se repete nos ambientes de ensino: os estudantes não aprendem e suas “notas baixas” revelam apenas o desinteresse destes para com a disciplina. Por outro lado, esses dados geram inquietações que nos trazem indagações, a ponto de levar-nos a uma reflexão da prática pedagógica, a fim de saber se essa problemática se relaciona apenas ao desinteresse dos estudantes. A forma como se aborda um conteúdo e como se operacionaliza o ensino e a aprendizagem não seriam também influenciadoras destes resultados em sala de aula? Silva, Cavallet e Alquini (2006) afirmam que mesmo com uma fundamentação pedagógica crítica, é possível, que alguns professores considerem muito mais prático e cômodo conduzir o aprendizado dos conteúdos de Botânica “pensando” apenas em quais diferentes recursos didáticos utilizar dentro de uma lógica formal, do que refletir criticamente sobre o caráter inerentemente relacional do conteúdo, ou seja, na perspectiva do contexto social, econômico, histórico, cultural, ambiental. Outrossim, essas reflexões por si só não geram a necessária renovação do ensino, sem que antes haja um compromisso maior com o olhar do docente para o discente que lhe rodeia, pois como se vê:

É muito comum acontecer de os alunos passarem de uma série para outra e em pouco tempo esquecerem grande parte do conteúdo específico que o professor considerou relevante. O que mais importa é que os alunos apreendam os conhecimentos necessários de forma articulada porque assim fará muito mais sentido para eles. Além disso, é importante também que eles apreendam os caminhos que devem percorrer caso necessitem aprofundar os

assuntos em outra ocasião. A autonomia intelectual só é construída quando o aluno constrói os mecanismos necessários para tal fim e essa é a maior aprendizagem que um professor pode proporcionar. Quando o professor não é mais necessário aí se deu a aprendizagem real. Todo professor deveria almejar que os alunos em determinado momento do processo educativo não precisassem mais dele, ou seja, se ele “desaparecesse” não faria diferença (Silva, Cavallet e Alquini, 2006).

Bocki et al., (2011) ressaltam que a problemática do ensino de Botânica não se resume apenas à sala de aula, mas que mesmo nos documentos que regem o ensino como os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) e as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2008) -, não há um enfoque direcionado para estudo da Botânica, que aparece como figurante num cenário que tem como protagonista a biodiversidade. Evidenciando-se assim, uma “cegueira botânica” citada em trabalhos anteriores (MENEZES et al., 2009; TOWATA, URSI e SANTOS, 2010). Wandersee e Schussler (1999) cunharam a frase “plant blindness” para caracterizar a inabilidade para ver as plantas em seu próprio ambiente, levando à inabilidade de reconhecer a importância das plantas na biosfera. Felizmente, é possível usar concepções alternativas de estudantes para mapear o ensino, detectando deficiências e lacunas, que com a consequente intervenção didática, poderá reorientar as práticas pedagógicas e contribuir para um processo de ensino e aprendizagem bem sucedido. Hershey (2004, 2005) tem escrito extensivamente sobre concepções equivocadas em botânica, classificadas em simplificações, generalizações e conceitos obsoletos. Entre elas, figuram com maior frequência a ideia de glicose como maior produto da fotossíntese e a visão de plantas como sendo organismos exclusivamente terrestres. Muitas destas concepções são por vezes disseminadas pelos livros didáticos, um recurso usado extensivamente nas salas de aula. Diversas pesquisas apontam concepções inadequadas acerca das plantas, por parte das crianças e até mesmo dos adultos, após sua formação básica. McNair e Stein (2001) mostram que ao pedir para crianças e adultos desenharem uma planta, eles frequentemente desenham apenas as flores. Bell (1981) mostrava que alguns estudantes do ensino básico não consideravam árvores como plantas e só consideravam um organismo como planta se ao menos possuísse flores. Uma forma de romper as obstruções no ensino de Botânica está, segundo Bonfim et al., (2015), na compreensão do

papel mediador do professor entre os

educandos e seus conhecimentos prévios, associados às práticas que valorizem os saberes locais estimulando a participação de todos na conservação da biodiversidade.

Ainda segundo os autores, os educadores em suas práticas pedagógicas, além do conhecimento científico, devem valorizar os saberes que os educandos já possuem sobre plantas, pois o uso destas faz parte do dia a dia das comunidades em que estão inseridos. Evidencia-se a necessidade de atividades educativas que tornem a escola um ambiente propício para a produção científica, partindo das representações simbólicas construídas historicamente pelos alunos. Ausubel (1978) já afirmava que o processo de aprendizagem depende do conhecimento que o estudante já possui, o seu conhecimento prévio, pois o fator mais importante influenciador da aprendizagem é o que o aluno já sabe. Em alguns trabalhos, levantamentos do conhecimento prévio dos estudantes acerca de plantas revelaram dados que elucidam alguns questionamentos relacionados à aprendizagem em Botânica, trazendo em geral, definições de plantas vagas e generalistas que apresentam conceitos incompletos ou em nível muito básico por parte dos discentes (BRITO, 2009; BOCKI et al., 2011; SILVA e GHILARD-LOPES, 2014). Para identificar concepções equivocadas dos estudantes, Uno (2009) sugere construir uma base de dados com questões que os estudantes esquecem de responder nos exames e os tipos de repostas que eles dão. Desse modo, procuramos analisar quais as concepções dos alunos do 2º ano do ensino médio sobre as plantas e como eles veem a diversidade destes seres vivos e sua respectiva importância para o ambiente, procurando a relação do conhecimento prévio sobre plantas com a construção dos conceitos em Botânica.

Metodologia

Este trabalho possui uma natureza qualitativa descritiva e teve por embasamento a Análise do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC) de modo a realizar comparações sobre as concepções empreendidas por alunos do 2º ano do ensino médio. A pesquisa foi realizada numa escola privada da Região Metropolitana do Recife (PE), com 67 alunos que se dispuseram voluntariamente, após a assinatura dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Em dois encontros de 120 minutos cada, executou-se o levantamento dos dados. Inicialmente, foi proposta uma problematização: Por muitos anos, os fungos e as plantas eram considerados como sendo muito semelhantes. Com o avanço dos estudos, percebeu-se que as plantas deveriam estar alocadas num grupo

taxonômico próprio. Para isso, foram listadas diversas características que as tornam distintas. Que características são essas? Os estudantes foram então convidados a escrever numa ficha, de forma individual e anônima, uma definição para planta. Logo em seguida, foram convidados a descrever de três a cinco plantas que eles consideravam vitalmente importantes para o planeta Terra. No segundo encontro, foram lidas as respostas e discutidas com os estudantes, que tiveram a oportunidade de se colocar diante das expressões escritas. Em seguida, os dados obtidos foram reunidos para consequente análise do discurso coletivo. O discurso pode ser compreendido, de acordo com Fernandes (2007), como pronunciamento estético com eloquência e signos rebuscados ou como uma manifestação concreta da língua, dotado de sentido e de significado socialmente construído. O discurso individual mostra não apenas a percepção e concepção individual de mundo, mas uma percepção compartilhada que forma também um discurso coletivo (GONDIM; FISCHER, 2009), uma vez que o contexto macro também é compartilhado. Desse ponto, inserimos para análise dos dados a contribuição de Lefèvre e Lefèvre (2005) com a metodologia do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Considerando que o pensamento individual se expressa de acordo com um processo de internalização socialmente construído, Lefèvre e Lefèvre (2005) sugerem quatro operações para produzir DSCs: (1) Expressões-Chave (E-Ch), (2) Ideias Centrais (IC), (3) Ancoragens (AC), e (4) Discursos do Sujeito Coletivo (DSC) propriamente ditos, explicados brevemente na Quadro 1. Quadro 1. Operações do Discurso do Sujeito Coletivo E-Ch

Trechos selecionados do material verbal de cada depoimento, que melhor descrevem seu conteúdo.

IC

Fórmulas artificiais que descrevem os sentidos presentes nos depoimentos de cada resposta e nos conjuntos de respostas de diferentes indivíduos, que apresentam sentido semelhante ou complementar.

AC

Fórmulas sintéticas que descrevem as ideologias explícitas no material verbal das respostas individuais ou das agrupadas.

DSC

Reunião das E-Ch presentes nos depoimentos, que têm IC e/ou AC de sentido semelhante ou complementar, escrito na primeira pessoa do singular para representar o pensamento de uma coletividade. Fonte: os autores

Dessa forma, utilizamos o procedimento descrito por Lefèvre e Lefèvre (2005) que sugerem trabalhar com um processo de: (a) seleção de expressões-chave presentes nos discursos individuais que representem ideias centrais; (b) formulação de um excerto que descreva os sentidos presentes nos depoimentos; e, por fim, (c) elaboração de um depoimento que represente o dizer coletivo. Através desse procedimento é possível, segundo Gondim e Fischer (2009), apreender a língua, o sujeito, a história e a ideologia subjacente. Permitindo assim, compararmos o discurso individual e como ele se mostra um grupo com interação entre os pares. Analisaram-se ainda quais plantas foram mais citadas pelos estudantes, a fim de se observar a interação do conhecimento prévio na aprendizagem dos conceitos e formulação de concepções.

Resultados e Discussão

Com relação a primeira parte da pesquisa, que se debruça sobre as concepções sobre plantas, foram obtidas respostas dos mais variados tipos, algumas muito sumárias, mas que ainda assim contribuem para a análise, como o caso de dois alunos que afirmaram “Planta é um ser vivo.” Outras três respostam se destacam com simplicidade: “São seres vivos muito importantes.” “Qualquer vegetal.” “É um ser vivo beneficiante em nossas vidas.” Entre as concepções estão algumas que englobam inadequadas conceituações com relação a fotossíntese, com 43,3% das definições citando fotossíntese e/ou autotrofia, nos mais variados graus de profundidade, como vemos abaixo: “Um produtor de fotossíntese” “Envolve ar, fotossíntese. Sem as plantas não haveria vida.” “É um organismo vivo que produz seu próprio alimento e também é essencial para a fotossíntese e o ecossistema.” “Planta é o ser vivo autotrófico responsável pela produção de oxigênio e outros produtos derivados.”

“Planta é um ser eucarioto, multicelular, constituído de clorofila. Ela realiza a fotossíntese como fonte de produção de seu alimento, colaborando para a quantidade de O2 na atmosfera. Tem importância na alimentação e na produção de remédios.” Na maioria das citações, a definição de fotossíntese segue concepções alternativas: “Ela produz seu próprio alimento, no caso, autotrófo, é fotossintetizante, respiram gás carbônico e libera oxigênio” “A planta ela recebe gás carbônico e libera oxigênio ao contrário de nós seres humanos” Essas concepções se dão de forma incongruente com os conceitos apontados como adequados, apresentando - através do discurso - uma ausência de solidez do conhecimento científico ou ainda uma limitação para a escrita, figurando essas duas causas de modo isolado e por ora, interpostas. Isso pode ser motivado também ao se apresentar os temas em Botânica de forma descontextualizada, onde em geral, no currículo básico, os estudantes vivenciam o conteúdo de metabolismo das plantas numa série distinta da qual vivenciam a fisiologia e anatomia vegetal. Muitas das definições apontam erros conceituais no tocante à fotossíntese. Souza e Almeida (2002) em um trabalho semelhante, trazem uma análise sobre a epistemologia dessas concepções alternativas e uma definição para fotossíntese, como sendo um processo que resulta na produção global de glicose e oxigênio, acontecendo em geral nos vegetais verdes, através da energia luminosa captada pela clorofila onde há uma transformação de doze moléculas de água, mais seis moléculas de gás carbônico, em uma molécula de glicose, seis de oxigênio e seis de água. Ressaltamos ainda que esta definição, por si só não é completa, devido ao fato de não abrigar formas alternativas de fotossíntese, com uso de H2S e sem liberação de oxigênio, como no caso de algumas bactérias. Percebe-se assim, que mesmo no meio acadêmico-científico os conceitos precisam ser reelaborados. Por outro lado, outra característica bem presente é a concepção utilitarista, explícita em 47,8% das respostas. A utilidade das plantas segue um largo espectro, pois permite produção de “matérias, medicamentos e recursos que nos auxiliam no dia a dia”, e “também nos ajuda a se proteger do sol”. Tudo isso porque “é um ser vivo, cuja

característica é cooperar na ajuda de beneficiar, evoluir e transformar a vida de outros seres vivos.” Encontramos ainda uma visão holística das plantas participando das teias alimentares, sempre com ressalvas de sua importância para o ecossistema. Brito (2009) alega que os discentes identificam os vegetais como seres que possibilitam a purificação do ar, estando esta ideia relacionada com a crença generalizada de que plantas são agentes despoluidores. Segundo Bonfim et al., (2015) o conhecimento relativo às plantas relatado pelos discentes revela que o professor dispõe de uma ferramenta adicional para trabalhar o conteúdo de Botânica de forma que o aluno seja protagonista da ressignificação dos conceitos. Para isso, o docente deve saber lidar com o conhecimento prévio trazido pelos estudantes, a fim de contribuir para a elaboração de novos conceitos. Algumas respostas extremas ainda apareceram no universo da pesquisa, que apontam a a necessidade de maior atenção ao ensino de Botânica na educação básica, pois ainda muitos estudantes compreendem plantas como seres inanimados, por serem sésseis embora possuam movimentos e respostas à estímulos externos: “Plantas são seres não vivos, mas bastantes importantes para os seres humanos e para os animais, que servem para muitas coisas como alimentar vários animais e até os humanos.” Ou ainda, uma visão de planta apenas como composto. Uma visão molecular de planta, reducionista. “Composto orgânico necessário para a existência dos seres vivos.” “Planta é um composto orgânico necessário para a existência dos seres vivos por conta da sua “transformação” de gás carbônico em oxigênio que é essencial para a vida humana e de alguns animais. Além de ter uma área sombria o que ajuda no resfriamento terrestre.” Estas definições são preocupantes, apresentando uma problemática do ensino, que talvez esteja embasada na fragmentação do currículo, descontextualização das aulas, ou ainda pela deficiência na formação de conceitos, como pode ser visto nesta resposta:

“Planta, simplesmente o que nos dá vida, mesmo não podendo se locomover, nos fornece ar puro mesmo quieta no seu canto, mesmo sendo maltratada e em carcére nunca nos deixa na mão fornecendo frutos pra nossa alimentação.” Esta concepções acima citadas podem ser estudadas à luz da dos pressupostos teóricos do perfil conceitual (AMARAL e MORTIMER, 2001; EL-HANI e BIZZO, 2002), onde as ideias primeiras dos estudantes não devem ser descartadas por completo em busca de uma reelaboração total. Ao contrário, o conhecimento prévio mantém o seu lugar cognitivo, de onde o estudante parte, alargando as fronteiras do saber. A partir das respostas dadas pelos estudantes, pode-se elaborar uma síntese que reúne as expressões chave e ideias centrais que mais aparecem, configurando o discurso coletivo. Esta análise é exectuda a partir do que se mostra no Quadro 1, que exemplifica a formulação utilizando algumas respostas.

Quadro 1 – Análise do Discurso coletivo Sujeito

Discurso

Expressões Chave

Ideias Centrais

01

“É um organismo vivo que produz seu próprio alimento e também é essencial para a fotossíntese e o ecossistema.”

“Planta produz o próprio alimento” “É essencial para a fotossíntese”

1: Organismo que produz seu próprio alimento 2: É essencial para a fotossíntese e o ecossistema

02

“Plantas são seres muito importantes para o equilíbrio ecológico. As mesmas fazem fotossíntese e são morada para diversas espécies de seres vivos.”

“Fazem fotossíntese e servem de morada para outros seres”

03

“Seres que fazem fotossíntese e serve como alimento para outros animais e contribui no ecossistema.”

“Fazem fotossíntese e servem como alimento”

1: São muito importantes para o equilíbrio. 2: Fazem fotossíntese. 3: São morada para diversas espécies 1: Fazem fotossíntese 2: Serve como alimento para animais 3: Contribui no ecossistema

Fonte: os autores

Desse modo, como resultado da análise dos dados, obtemos o seguinte discurso coletivo:

“As plantas são seres muito importates para o ecossistema pois fazem fotossíntese, são responsáveis em fornecer nosso oxigênio para a respiração e produzem alimentos, frutos e remédios para o homem.” O discurso coletivo assim, expressa uma visão antropocêntrica, concebendo as plantas como servindo apenas ao homem no ambiente. Os estudantes desconsideram a significativa produção fitoplanctônica de oxigênio, além de demonstrarem uma visão generalista onde se tem angiospermas como sinônimo de plantas. Observa-se também no discurso a relevância que se dá ao conhecimento popular sobre as plantas medicinais, muito presente em alguns grupos sociais. Com relação à segunda parte desta pesquisa, que versa sobre as percepções da importância das plantas, pedimos aos estudantes para citar de três a cinco plantas que consideram importantes para todo o planeta. Foram obtidos duzentos e setenta e nove registros, sendo as plantas mais citadas representadas no Gráfico 1. 8

Plantas importantes para o planeta Terra segundo as concepções dos estudantes

7 6 5 4 3 2 1 0

Figura 1 Gráfico com as plantas mais citadas no questionário

Silva e Ghilard-Lopes (2014) ao solicitarem que os estudantes desenhassem plantas, obtiveram maioritariamente angiospermas em seus resultados, se destacando roseira, girassol e coqueiro. Enquanto houve ausência de referências ao grupo das “briófitas”.

No trabalho realizado por Bitencourt et al., (2011) a planta mais citada foi a samambaia (Nephrolepis polypodium). O coqueiro (Cocos nucifera L.) foi a planta alimentícia de maior destaque seguida da mangueira (Mangifera indica L.), o que pode ser facilmente explicado pela presença constante no ambiente e cotidiano local dos discentes. O eucalipto também aparece em destaque, o que em nosso contexto pode ser devido a grandes áreas de reflorestamento, onde esta planta é utilizada nas cidades circunvizinhas às dos estudantes. Bonfim et al., (2015) apontam como mais citada a samambaia e dentre as alimentícias destacam a mangueira. Como planta medicinal a mais mencionada foi a erva-cidreira (Lippia alba (Mill.) N.E.Br. ex P. Wilson). Encontramos em nossos resultados muitas plantas medicinais nas citações, entre elas colônia (Alpinia speciosa Schum), erva doce (Pimpinella anisum L.) e capim santo (Cymbopogon citratus (DC.) Stapf]). Todas essas espécies são comuns no dia a dia dos estudantes, sendo envolvidas nos mais diversos usos. Por outro lado, encontramos algumas respostas como babacenon e pampulha, cujos nomes científicos não foram identificados. As algas também aparecem citadas duas vezes, o que ilustra o frequente equívoco de conceber esses organismos como plantas. Conceber as plantas como seres não vivos, com a finalidade máxima de servir ao homem – ou animais – e a fotossíntese como meramente produção de glicose ou oxigênio, reúne alguns dos pré-conceitos que contribuem para formulação inadequada de conceitos. Esses pré-conceitos devem ser lapidados no âmbito escolar que, conforme Libâneo (2004), continua sendo o ambiente de mediação cultural que através dos docentes desenvolve habilidades nos estudantes para aquisição dos conceitos científicos na formação de cidadãos capazes de refletir conscientemente perante problemas enfrentados no cotidiano e de tomar as necessárias decisões racionais.

Considerações finais

O ensino de Biologia urge a necessidade de um nova prática pedagógica, não como modelos e receitas prontas. No entanto, cabe aqui apontarmos a contextualização e a problematização nas aulas, como forma de obter ligação entre o conhecimento prévio dos estudantes e os novos conceitos que serão formados. Com novas pesquisas no ensino de ciências, se encontrarão novos olhares para a realidade escolar - intrinsecamente ligada aos docentes e aos estudantes – apontando uma reformulação na didática, promovendo um processo de ensino e aprendizagem

sóbrio, inclusivo, renovador, que permite alargar fronteiras, do conhecimento prévio ao conhecimento científico. Como disse Uno (2009), devemos fornecer aos estudantes amplas oportunidades para engajar-se no processo de descoberta nas aulas e ainda aplicar o conhecimento conceitual e científico em suas vidas fora da sala de aula. Caso contrário, nos arriscamos a perder uma futura geração de cientistas e cidadãos cientificamente alfabetizados. Referências AMADEU, Simone Oliveira; MACIEL, Maria Delourdes. A dificuldade dos professores de educação básica em implantar o ensino prático de Botânica. Revista de Produção Discente em Educ. Matemática, v.3, n.2, 2014, p.225 - 235. AMARAL, Edênia M. Ribeiro; MORTIMER, Eduardo F. Uma proposta de perfil conceitual para o conceito de calor. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, v. 1, n. 3, p. 1 – 14, 2001. ARAÚJO, Joeliza Nunes; SILVA, Maria de F. Vilhena. Aprendizagem significativa de Botânica em ambientes naturais. Revista Areté, v.8, n.15, 2015, p. 100 - 108. AUSUBEL, David Paul; NOVAK, Joseph D.;

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