Conceitualização da WEB-SEMÂNTICA - Projeto de Iniciação Científica - 2003

May 30, 2017 | Autor: Paulo Alves de Lima | Categoria: Semantic Web
Share Embed


Descrição do Produto

Paulo Alves de Lima Aluno do curso de Design de Multimídia - 2º Semestre / Noite Relatório Final de Pesquisa - Dezembro de 2003

Projeto de Iniciação Científica

Conceitualização da WEB-SEMÂNTICA

Orientador Prof. Dr. Edson Pfutszenreuter

Centro Universitário SENAC -São Paulo Versão revisada pelo autor em de outubro de 2014


1 de 12

Resumo Este trabalho trata do contexto e das condições necessárias para o surgimento da WebSemântica e em que medida essa se difere da Web atual. Quais as especificidades da Web-Semântica e os requisitos conceituais e tecnológicos para seu surgimento, quais as eventuais mudanças quantitativas e qualitativas que ela poderá promover no contexto sócio-histórico. A pesquisa se referencia no Mapa da Estrada proposto por Tim Berners-Lee e pelo grupo de Web-Semântica do W3C (Comitê Internacional Gestor da WWW) e nas proposições sobre o assunto feitas durante conferência no IX CONIP - Congresso Nacional de Informática Pública - pelo pesquisador francês da Universidade de Ottawa no Canadá, Pierre Lévy, em contraposição as críticas de Neil Postman, teórico da comunicação e diretor do Departamento de Comunicação da Universidade de Nova York, autor de Tecnopólio, e de Paul Virilio, arquiteto, urbanista, filósofo e ex-diretor da Escola de Arquitetura de Paris, autor de A Bomba Informática.

O contexto Paradoxalmente à sua origem militar, a infra-estrutra da Internet se expandiu e segue crescendo constantemente por suas características randomicas e universais, já a Web segue mantendo seu aspecto fundamental de uma rede dominada pelo espaço-informação sob o poder do hyperlink e de sua capacidade de ligar virtualmente qualquer coisa a qualquer coisa, de modo que todo dado ou informação pode estar ligado ou linkado, como quer o neologismo corrente, a qualquer outro de qualquer natureza, independentemente de coordenadas tempo/espaço ou do conteúdo conceitual, formal ou cultural dessa informação. O modo como se constitui o hyperlink resulta numa das peculiaridades da atual era digital, o fato de que os dispositivos de busca e inter-relacionamento de termos e conteúdos sejam capazes de atingir uma massa de proporções perturbadoras de dados, esses mecanismos não são capazes de distinguir um simples rascunho de uma produção elaborada, um conteúdo meramente comercial de um acadêmico, ou ainda de diferenciar o significado em diferentes contextos de culturas, línguas e mídias, de modos que a razão humana ainda permanece como o mais eficaz instrumento de discernir e relacionar esses dados.

2 de 12

O volume e a característica caótica dos hyperlinks torna-se ainda mais desnorteador à medida que nosso tempo seguir produzindo informação em quantidade e em baixo custo como nunca foi feito na história humana a ponto de extrair a seguinte declaração de Umberto Eco:

”Brinco dizendo que não há diferença entre o jornal stalinista Pravda e o New York Times dominical. O primeiro não possui notícia alguma e o outro tem 600 páginas de informação. Uma semana não é suficiente para ler essas 600 páginas.”1 Eco lembra ainda: “Hoje você aperta um botão e recebe 10.000 títulos sobre um tema. Só que você não tem tempo nem de ler os 10.000 títulos, sem falar nos livros – isso ilustra como o excesso de informação pode transformar-se em puro silêncio.”2 Como compreender em meio a essa avalanche de dados? Como conseguir discernir a informação desejada ou necessária? Sobre isso, escreve a professora Marília Levacov:

“Mas se o velho sonho renascentista de conhecer tudo provou ser impossível, pelo menos agora podemos acessar "tudo". Ou quase. Importa saber onde a informação está. Como achá-la. Como validá-la. Como utilizar os operadores lógicos booleanos (antes domínio da álgebra, da lógica) sem nunca tê-los aprendido formalmente e poder, desta maneira, refinar a busca inicial de 132.983 itens para um resultado manipulável e significativo.”3 Vale lembrar que o fenômeno não se dá apenas pela extensão da massa de dados sobre qualquer assunto, mas também como esses mesmos dados podem variar, e muito, de natureza e forma ao longo de um mesmo eixo temático, facilmente podemos partir de um poema e chegar a um dispositivo de banco de dados. Esse é um dos maiores dilemas da ordenação por hyperlink, a relação não semântica entre informações permitindo associações randomicas, não óbvias e até malévolas fazendo com que na maioria das vezes apenas o discernimento humano seja capaz de localizar e separar o alvo desejado da teia de relações e inferências intransponíveis a um olhar desatento.

1

ECO. Umberto. From Internet to Gutenberg. Paper apresentado em 12 de novembro de1996 na The Italian Academy for Advanced Studies in America. 2

ECO. Umberto. From Internet to Gutenberg. Paper apresentado em 12 de novembro de1996 na The Italian Academy for Advanced Studies in America. 3

LEVACOV. Marília. As novas tecnologias digitalizando o mundo. 3 de 12

Dessa maneira, compreender, discernir, verter informação em dados, transformar ruído em audição, torna-se a tarefa mais premente para o futuro, e vale ainda lembrar, que para compreender será preciso produzir ainda mais informação para que possamos ordenar a que já existe, tudo isso em meio a tecnologias que seguem acelerando dramaticamente a velocidade e o volume de dados e processos disponíveis. No entanto a despeito desse modo caótico foi dessa maneira que a Internet atual se desenvolveu muito mais rapidamente do que em suas primeiras décadas, ainda nos anos 60, 70 e 80. Mesmo que constituída sobre uma infraestrutura massiva de componentes e dispositivos ela tem permanecido como um meio preferencialmente humano para circulação e troca de informações, um meio de ligações Homem-Homem, não um meio onde dados e informações possam automaticamente ser processados e intercambiados pelos dispositivos que a compõem ou um meio de ligações Máquina-Máquina, sem intermediação do discernimento humano. Basta ver que dispositivos como celulares, PDAs, agendas eletrônicas e computadores mesmo lidando com dados de mesma natureza, números telefônicos endereços e datas de eventos, não são plenamente capazes de intercambiar formalmente esses dados entre si, e muito menos de forma semântica, ainda que dentro de uma mesma plataforma, fabricante ou desenvolvedor.

A Web-Semântica: Compartilhamento autônomo de informação entre computadores através de dispositivos e operadores semânticos “The Semantic Web is a vision: the idea of having data on the web defined and linked in a way, that it can be used by machines - not just for display purposes, but for using it in various applications.” (Semantic Web Org) Para Tim Berners-Lee e outros entusiastas da Web-Semântica nos aproximamos dia a dia da capacidade de viabilização dessa idéia, um cenário em que se somam o avanço da infra-estrutura de circulação de dados, com e sem cabos, com bandas de capacidades cada vez maiores, com dispositivos sempre menores, mais baratos e dotados de maior mobilidade e alcance para troca ou acesso a base de dados, com usuários, pesquisadores e organizações que caminhando, conscientemente ou não, em direção a soluções e formulações conceituais, de arquitetura da informação que permitam a troca autônoma– e semântica – de informações entre dispositivos computacionais ou não.

4 de 12

A Web-Semântica não é, ou não será, uma nova rede para além da atual, será uma extensão evolutiva da Web de hoje, um ambiente onde as informações estarão disponíveis de acordo com significados bem definidos, através de uma ontologia tão simples quanto ampla, dispostos de modo estruturado e claramente identificados, para que possam ser intercambiadas, compreendidas e validadas pelos agentes de troca e mecanismos de busca interconectados, sejam eles computadores ou não, fixos ou móveis, permitindo que através dessas ferramentas os homens trabalhem melhor em conjunto, simultaneamente, potencializando em muito os frutos dessa cooperação. É importante frisar que a Web-Semântica não é uma proposição que almeja apenas melhorar os dispositivos de busca e troca de dados na Web, ainda que evidentemente esses serão beneficiados no curso de seu desenvolvimento. Entre as organizações que conscientemente trabalham pela Web-Semântica destacam-se o W3C – Comitê Gestor da Web – em âmbito mundial (http://www.w3.org/) e seu grupo especializado em Semantic Web (http://www.w3.org/2001/sw/) que desenvolveu um roteiro composto de cinco eixos que sustentam as bases e premissas para o desenvolvimento da Web-Semântica, são eles:

Expressão dos Significados Para que as expressões semânticas possam ser universalmente eficientes é preciso que possuam modelos comuns, minimalistas, de grande generalidade, pois somente com modelos generalistas é que aplicações poderão ser mapeadas dentro de parâmetros diversos. A generalidade passa pela simplicidade na construção dos modelos de indexação de dados, de dados sobre dados – metadados – e das afirmações sobre afirmações que descrevem recursos, sobre recursos que contêm parâmetros implícitos sobre outras afirmações e outras indexações de recursos e dados.

Representação do Conhecimento O funcionamento desse modelo de Web-Semântica pressupõe o acesso dos computadores e toda sorte de outros dispositivos a coleções estruturadas de informações, a grupos de inferências, que conduzam ao discernimento sobre a palavra ou tema requisitado. Esse processo, chamado de Representação do Conhecimento, já é uma área há muito investigada pelos pesquisadores de Inteligência Artificial – AI, que mesmo antes da Internet já desenvolviam processos com modelos análogos aos que hoje se conhece por hyperlinks, no entanto embora a Web tenha lançado suas sementes e crescido de modo vertiginoso valendo-se dos hyperlinks ela ainda não foi capaz de produzir resultados efetivos na direção da Inteligência Artificial. 5 de 12

Um dos problemas estes no fato dos processos de representação de conhecimento desenvolvidos na Web serem, via de regra, centralizados, exigindo o uso de definições e conceitos implementados através de controles rígidos, resultando em sistemas abarrotados de idiossincrasias, consequentemente ingovernáveis à medida que crescem, tornando-se por fim ingovernáveis ao longo do tempo excluindo reais possibilidades de gerenciamento. Na perspectiva de avançar com normatização dessa área de investigação, o The World Wide Web Consortium criou um orgão chamado RDF – Resource Description Framework - que busca definir, como seu próprio nome adianta, uma estrutura de recursos para descrição de dados e conteúdos. Outro importante passo nessa direção vem sendo dado pela tecnologia eXtensible Markup Language, conhecida por XML4 , que permite a qualquer desenvolvedor criar seus Tags (frases de programação com comentários descritores de conteúdo), sem que no entanto esses Tags façam referência ao significado da estrutura geral que comporta essas informações, atendo-se arbitrariamente às propriedades de suas partes, que entretanto fazem parte do todo. É importante frisar que nesses caso específico os processos de representação do conhecimento buscam essencialmente habilitar dispositivos a compreenderem dados e documentos semânticos uns dos outros e não a possuírem a habilidade de compreender a fala ou a escrita humanas.

Ontologia Pesquisadores de Inteligência Artificial – AI e Internet recorreram à filosofia para o empréstimo do termo Ontologia a ele imprimindo a característica de ser um designador de um documento ou arquivo, aquele que define formalmente suas características, sua relação com termos e significados, como uma espécie de taxologia, a ciência da classificação, com suas regras de inferências e padrões. Ou seja, como ramo da filosofia a Ontologia pergunta: Quais são as categorias do mundo? Quais leis regulam essas categorias? Essas questões trazem ainda consigo outra: Essa classificação geral pode servir de base para todas as outras classificações?. É isso o que o filósofo alemão Reinhardt Grossmann dedicado a ordenar classes de pensamentos designa por categorização. Com isso já poderíamos distinguir ao menos duas categorias (ou entidades): Indivíduos e Propriedades de Indivíduos. 4

Em 2014 quando da revisão do artigo o XML já uma realidade, tornando-se quase que um padrão no desenvolvimento de conteúdos e aplicações para Web, menos como recurso universal de conexão de entidades autônomas e mais como um recurso descritor comum, algo como um Esperanto capaz de permitir o diálogo entre diferentes linguagens de programação. 6 de 12

“O problema que agora se nos depara é o de saber em que diferem os indivíduos das propriedades que eles possuem. Desse modo surge uma das questões maiores da ontologia: “Será que existem objectos abstractos?”5 Como exemplifica Reinhardt Grossmann acima, a Ontologia busca recursos para a definição das propriedades que caracterizam e definem os elementos, sejam eles físicos ou meramente virtuais, daí a oportunidade de seu uso nas relações de conhecimento no mundo digital, no entanto, como definir e categorizar tal quantidade de elementos que se relacionam no ciberespaço de modo comum e abrangente permanece sendo o maior do obstáculos no trato semântico da informação.

Agentes de Troca Os chamados Agentes de Troca da Web-Semântica passam pela criação – por mãos humanas – de programas capazes de coletar conteúdos de diversas fontes e formas, processa-los e compartilhá-los com outros aplicativos e dispositivos que recebam e igualmente retornem informações debaixo de chaves de encriptação para certificação de origem e autenticidade dos dados trocados, em um ambiente com linguagem estruturada sob vocabulário controlado permitindo o intercâmbio semântico das informações. Desse modo pretende-se que na Web-Semântica seja possível tratar de modo flexível essas conexões, em contraste com as soluções de padronização já tentadas até aqui, como os dispositivos Plug and Play6 ou a arquitetura Jini7 , que até o momento se mostraram pesadas e insuficientes dada a incapacidade de abertura a novos desdobramentos tecnológicos. A perspectiva de rígida padronização, no sentido normativo e mais restritivo da palavra, traz consigo ainda outro risco tão ou mais daninho que a inflexibilidade, a tentação por uma solução única, engessada dentro de um só desenvolvedor ou fabricante, direcionando os progressos por caminhos comercialmente mais adequados a poucos interesses específicos.

Evolução do Conhecimento Do modo como vêm sendo pensada por Berners-Lee e pelo Semantic Web da W3C a WebSemântica é mais do que uma ferramenta capaz de incrementar buscas na rede ou interligar 5

GROSSMANN. Reinhardt. The Existence of the World: An Introduction to Ontology, Londres: Routledge, 1992. 139 p. 6

Tecnologia de conexão de dispositivos e periféricos da Microsoft, surgida originalmente sob o nome Microsoft Universal Plug&Play destinada a permitir o reconhecimento de dispositivos sem a instalação de drivers conectores. 7

Tecnologia de conexão de dispositivos semelhante ao Plug&Play desenvolvida pela Sun Microsystems. 7 de 12

dispositivos de natureza diferente, trata-se de um esforço para impulsionar o conhecimento humano como um todo que no entanto enfrenta enormes dificuldades ela escala de suas pretensões já que um dos primeiros percalços é o fato de que a despeito de pequenos grupos humanos conseguirem rapidamente incrementar sua criatividade, eficiência e inovação respondendo a ações específicas, por seu turno esses mesmos processos resultam em sub-culturas que trazem consigo o inconveniente de não serem compreendidas ou partilhadas com a mesma facilidade e eficiência das linguagens comuns a outros grupos, sejam eles maiores ou menores. Até aqui a breve história dos processos culturais e de comunicação dessa natureza têm mostrado a tendência a nascerem pequenos e eficientes, a partir de uma idéia pessoal ou de um pequeno grupo e tornarem-se com o tempo grandes e incompreensíveis. Tornar sub-culturas específicas integradas e compreensíveis em um contexto maior de uma linguagem comum, oferecendo todos os demais grupos conceitos similares que permitam mútua compreensão e interação tem sido o grande desafio nesse campo.

A Inteligência Coletiva Segundo a proposição de Pierre Lévy a Inteligência Coletiva é um fenômeno que se daria a partir da somatória de todos os recursos de infra-estrutra tecnológica, ou seja, de todas as redes e dispositivos de processamento de dados mais todo o conteúdo informacional trafegante nesse universo. Lévy destaca que bastaria um código comum durante o processo de troca de informações, o que o autor denomina de CIML – Collective Intelligence Mark-up Language – somado a uma Ideografia Dinâmica Estruturada, para estabelecer uma linguagem comum de compartilhamento de informação entre seres humanos e computadores em nível global. Desse modo, a Web-Semântica poderia servir como uma ferramenta para implementação de um processo educacional e de desenvolvimento global, interligando progressivamente num ciclo evolutivo virtuoso todo o conhecimento humano, partilhado através de uma nova classe de dispositivos, ferramentas lógicas e agentes semânticos, que permitiriam aa humanidade trabalhar, aprender e desenvolver conhecimento em níveis muito superiores aos já conseguidos até aqui pelos sistemas tradicionais de socialização. Nesse momento estariam, então, para Pierre Lévy, dadas as condições para o estabelecimento da Inteligência Comunitária ou Inteligência Coletiva, um fenômeno que surge não da soma das partes que compõem essa grande rede, mas da interação dinâmica que se processa através do compartilhamento simultâneo, da relação de livre circulação das informações entre 8 de 12

culturas, sociedades, Homens e dispositivos. Para Lévy a Inteligência Coletiva só existe, ou só existirá, como o resultado de um fenômeno conectivo e não como um dispositivo único passível de apropriação por algo ou alguém.

Novos códigos para o Nascimento da WEB-SEMÂNTICA

A Comunidade é o coração da Inteligência COLETIVA /COMUNITÁRIA

WI-FI + BANDA LARGA + WEB + CIML = WEB SEMÂNTICA

LIVRE CIRCULAÇÃO

O Significante é o Significado

CRIAÇÃO DE DIVERSIDADE

SER

PAZ

SIGNIFICADO SIGN

IDEOGRAFIA DINÂMICA

OBJETO

SERES HUMANOS

! Esquemas Propostos por Pierre Lévy Figura 1. Reprodução de diagrama de Pierre Lévy com as bases para criação da Inteligência Coletiva, exibido no IX CONIP - Congresso Nacional de Informática Pública, São Paulo, julho de 2003.

A ACELERAÇÃO DA REALIDADE

O debate sobre os efeitos das novas tecnologias sobre a cultura não é contemporâneo, A aceleração da realidade remontando à Grécia antiga, já nos diálogos de Sócrates relatados por Platão no Fedro há a da seguinte passagem recontada por Neil Postamn em “Tecnopólio” 6:

Se por um lado o entusiasmo com as novas possibilidades que se descortinam com a Era O Rei Thamuz recebeu entre outros presentes a escrita do Deus Thoth, que com seu invento Digital é enorme de outro o debate sobre os efeitos das novas tecnologias sobre a cultura não é alardeava a melhora na sabedoria e na memória do povo, dádiva que tornaria Thamuz mais novo, remontando inclusive a Gréciapara antiga. Já nosdediálogos Sócrates relatados opor Platão no poderoso e popular, no entanto, espanto Thoth, de Thamuz desdenhou presente e desqualificou o inventor como o melhor dePostamn seu próprio invento, e 8mais, ao invés do bem, a Fedro há a seguinte passagem recontada porjuiz Neil em Tecnopólio invenção haveria de promover o mal. Para Thamuz, escrita tornaria os homens esquecidos pela falta de da memória “OaRei Thamuz recebeu entre outros presentes a escrita doexercício Deus Thoth, que com confiantes que estariam nasalardeava lembranças escritas, a confiança sinais os faria seu invento a melhora naesabedoria e nadepositada memória donos povo, dádiva que inseguros de suastornaria própriasThamuz potencialidades já que dependeriam anotações, escrita, portanto, mais poderoso e popular, nodas entanto, para aespanto de Thoth, não melhoraria aThamuz memória, serviria como rememoração, uma ilusão de aumento da sabedoria. desdenhou o presente e desqualificou o inventor como o melhor juiz de 8

POSTMAN. Neil. TECNOPÓPLIO - A rendição da Cultura à Tecnologia, São Paulo, Nobel, 1994. 9 de 12

8

seu próprio invento, e mais, ao invés do bem, a invenção haveria de promover o mal.” Para Thamuz, a escrita tornaria os homens esquecidos pela falta de exercício da memória confiantes que estariam nas lembranças fornecidas pela escrita, a confiança depositada nos sinais gráficos os faria inseguros de suas próprias potencialidades já que dependeriam das anotações – a escrita – portanto o presente não melhoraria a memória, serviria como uma rememoração, uma ilusão de aumento da sabedoria. Séculos depois monges escribas do Renascimento temiam pelos problemas que a imprensa de Johannes Gutenberg haveria de causar, não só difundindo idéias inadequadas aos preceitos cristãos como também o prejuízo material a igreja pois ofício de copiar os livros era uma renda importante dos mosteiros. Esse temor foi descrito por Vitor Hugo em O Corcunda de Notre-Dame, na passagem em que o personagem do Arcebispo, com uma mão sobre o livro fita a Catedral de Notre Dame da janela de seu claustro e profetiza: – “Isso vai destruir aquilo…”. A propósito desse mesmo episódio Umberto Eco afirma: “…o livro destrói a catedral e o alfabeto destrói a imagem…”9 Se Thamuz talvez tenha errado ao rejeitar a escrita, que nos deu a literatura, sem dúvida uma das mais refinadas e espetaculares realizações do intelecto humano, ele e os monges acertaram ao prever que a tecnologia, representada na escrita e na imprensa, mudariam de forma definitiva a cultura e o conhecimento. Esses exemplos do impacto da tecnologia sobre a cultura no leva a refletir sobre a zona de atrito entre novas tecnologias e a cultura já estabelecida, região onde operam as reflexões de Neil Postman e Paul Virilio que advertem sobre a ciência que produziu o atual avanço tecnológico, sem precedentes na história humana:

“Ciência do extremo, aquela que assume o risco incalculável do desaparecimento de toda a ciência. Fenômeno trágico de um conhecimento que de repente se tornou CIBERNÉTICA, essa tecnociência se torna então, enquanto tecnocultura de massa, agente não mais da aceleração da História, como outrora, mas da vertigem da aceleração da realidade...”10

9

ECO. Umberto. From Internet to Gutenberg. Paper apresentado em 12 de novembro de1996 na The Italian Academy for Advanced Studies in America. 10

7- VIRILIO. Paul. A Bomba Informática, São Paulo, Estação Liberdade, 1999. 10 de 12

A ciência a que Virilio se refere produziu os meios físicos e tecnológicos para A Sociedade da Informação que é definida pela professora Marília Levacov como:

“aquela cuja atividade primária é a produção e a comunicação da informação. É aquela onde a informação tem tanto valor que é comprada, vendida, e na qual leis são criadas para protegê-la. Apesar de existir apenas como produto simbólico do cérebro humano, é traduzida para o plano material, onde a economia organiza-se sobre seu (teórico) valor”.11 Não tão alarmista quanto Virilio mas não menos preocupado com o futuro, Neil Postman aponta cinco aspectos fundamentais a respeito das mudanças tecnológicas atuais sobre as quais se deveria refletir antes de entregar-mos nosso entusiasmo, são elas: • Toda mudança tecnológica impõe um preço, geralmente o maior deles. • As mudanças tecnológicas criam vencedores e derrotados, e invariavelmente os primeiros tentam convencer os demais sobre os benefícios acrescentados. • Toda grande tecnologia traz consigo um prejuízo epistemológico, político ou social, sendo as vezes o Bias é maior que os benefícios. • As mudanças tecnológicas não são aditivas e sim ecológicas no sentido que alteram por completo o meio-ambiente em que operam. • A tecnologia tende à mitificação e acaba por tomar mais de nossas vidas do que seria desejável.

A sociedade da informação talvez esteja a nos impor obrigações e responsabilidades maiores do que simplesmente conseguir que conteúdos informacionais se comuniquem autonomamente entre si tirando proveito da brutal massa de dados já circulantes e por circular na Web; essa era exige, isso sim, que pensemos também a respeito do impacto e das transformações que essas tecnologias operarão na cultura e nas relações humanas, um desafio nada simples para o qual alerta Paul Virilio:

“Como se sabe, o que é excessivo é insignificante”, “uma ciência sem consciência é apenas a ruína da alma” e “uma tecnociência sem consciência de seu fim iminente não passa de um esporte que ignora a si mesmo!”12

11 11 12

7- VIRILIO. Paul. A Bomba Informática, São Paulo, Estação Liberdade, 1999.

7- VIRILIO. Paul. A Bomba Informática, São Paulo, Estação Liberdade, 1999. 11 de 12

Referências Bibliográficas BERNERS-LEE. Tim. Realising the Full Potential of the Web, Comunicação apresentada ao encontro do W3C, Londres, 1997/12/3. –––––––––––––––––– What the Semantic Web can represent, Setembro de1998. ––––––––––––––––––. HANDLER James. LASSILA. Ora. The Semantic Web: A new form of Web content that is meaningful to computers will unleash a revolution of new possibilities, May 17, 2001, Scientific American, NSF Sponsored Workshop International Semantic Web Working Symposium (SWWS) - Isabel F. Cruz (editora) University of Illinois at Chicago. ECO. Umberto. O dilúvio da informação, Entrevista a Tânia Menai, Veja, Vida Digital nº 4. –––––––––––– From Internet to Gutenberg. Paper apresentado em 12 de novembro de1996 na The Italian Academy for Advanced Studies in America. GROSSMANN. Reinhardt. The Existence of the World: An Introduction to Ontology, Londres: Routledge, 1992. p. 139. LEVACOV. Marília. As novas tecnologias digitalizando o mundo, Centro de Informação em Ciência & Tecnologia - Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados - UFRGS (http:// www.levacov.eng.br/marilia/bahia.html) LÉVY. Pierre. The Semantic Web - A Tool for Education and Human Development, Palestra realizada durante o X CONIP - Congresso Nacional de Informática Pública, São Paulo, julho de 2003. LIMA. Karina Medeiros de. Determinismo Tecnológico, Revista Eletrônica Espiral, Ano I nº 4, setembro de 2000, ECA-USP. POSTMAN. Neil. TECNOPÓPLIO - A rendição da Cultura à Tecnologia, São Paulo, Nobel, 1994. ––––––––––––– Five Things We Need to Know About Technological Change, Palestra realizada em Denver, Colorado, em 27 de março de 1998. VIRILIO. Paul. A Bomba Informática, São Paulo, Estação Liberdade, 1999.

12 de 12

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.