Concorrência no sector ferroviário

July 25, 2017 | Autor: Miguel Moura e Silva | Categoria: Competition Law, Direito da Concorrência
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Concorrência no sector ferroviário Miguel Moura e Silva* Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa *As opiniões expressas nesta apresentação são puramente pessoais

21.2.2013

Miguel Moura e Silva – FDUL

Âmbito da intervenção • O que vamos analisar: •  Regras de concorrência aplicáveis às empresas (regras comportamentais); •  Regras sobre o controlo de concentrações (regras estruturais); • O que não vamos analisar: •  Auxílios públicos; •  Serviços de Interesse Económico Geral, direitos especiais e exclusivos, obrigações de serviço público;

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Regras comportamentais • Artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União

Europeia (TFUE) e artigos 9.º e 10.º da Lei n.º 19/2012: proíbem os acordos e práticas concertadas entre empresas e as decisões de associação de empresas que tenham por objetivo ou como efeito restringir a concorrência; • Artigo 102.º do TFUE e artigo 11.º da Lei n.º 19/2012: proíbem a exploração abusiva de uma posição dominante detida por uma ou mais empresas; • Artigo 12.º da Lei n.º 19/2012: proíbe a exploração abusiva de um estado de dependência económica; • Normas do TFUE: supõem o preenchimento de um requisito de competência, a afetação do comércio entre Estados-membros;

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Regras estruturais • Controlo de concentrações de dimensão comunitária:

Regulamento n.º 139/2004; • Controlo de concentrações a nível nacional: artigos 36.º e seguintes da Lei n.º 19/2012. • A concentração poderá ser proibida caso entrave significativamente uma concorrência efetiva no mercado comum (UE) ou nacional (PT) ou numa parte substancial destes, em particular em resultado da criação ou do reforço de uma posição dominante; • São raras as decisões de oposição: nos casos que suscitam problemas jusconcorrenciais, é frequente a alteração da operação em função de compromissos assumidos pelas notificantes.

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Evolução histórica • Regulamento n.º 1017/68 – regime especial de aplicação

dos atuais artigos 101.º e 102.º do TFUE: O sector dos transportes era visto como escapando em grande medida às regras de concorrência; • Além de reproduzir as regras de concorrência do Tratado (sugerindo que aquelas só eram aplicáveis aos transportes por intermédio do Regulamento n.º 1017/68), incluía um conjunto específico de derrogações e isenções (e.g., acordos técnicos no art. 3.º e acordos relativos a agrupamentos de PMEs no art. 4.º), que continuam a em vigor.

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Evolução histórica • Com o Ato Único Europeu e o objetivo de criação do

Mercado Interno surge a pressão para aplicar ao sector as regras de concorrência que regulam as restantes atividades económicas: •  Decisão UIC (1992): a Comissão condenou a UIC por violação do

atual art. 101.º/1 TFUE devido a uma recomendação aos seus membros quanto à nomeação de agentes de viagens e a uma comissão standard; os tribunais europeus anularam a decisão por ela se fundar no Regulamento n.º 17/62 e não no diploma sectorial; •  Decisão Eurotunnel (1994): acordo de partilha de capacidade entre British Rail, SNCF e Eurotunnel – a Comissão concedeu uma isenção; o Tribunal Geral considerou que a decisão se fundava numa análise errónea do grau de concorrência entre as empresas em causa; numa segunda decisão, a Comissão concluiu que o acordo não era restritivo da concorrência.

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Evolução histórica • Após a Diretiva 91/440, a Comissão procura aplicar as

regras de concorrência de modo a tornar efetivos os novos direitos (limitados) de acesso: •  Decisão ENS (1994): a Comissão considerou que o acordo entre os

incumbentes britânico, francês, belga, holandês e alemão relativo à constituição de uma empresa comum para a exploração de serviços noturnos entre o Reino Unido e aqueles países da Europa Continental eram restritivos da concorrência; a Comissão concedeu uma isenção subordinada à imposição da prestação de certos serviços ferroviários a potenciais interessados; a decisão foi anulada pelo Tribunal Geral: a Comissão não tinha demonstrado de forma suficiente que o acordo restringia a concorrência (sobretudo porque esta era ainda muito limitada pelos incipientes direitos de acesso da Diretiva 91/440) e também não tinha provado a indispensabilidade dos serviços em causa (tracção e aluguer de material circulante) para a entrada no mercado em causa.

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Aplicação do artigo 101.º TFUE • Os tribunais europeus não parecem ter sido favoráveis a

uma leitura mais liberal do enquadramento criado pela Diretiva 91/440: para que se verifique uma restrição da concorrência parece necessário demonstrar que a liberalização é suficiente para induzir essa concorrência – perspectiva que favorece os incumbentes e prejudica o efeito útil da legislação sectorial que visa construir um mercado interno. • Claro contraste com a jurisprudência noutros sectores, como o das telecomunicações;

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Abuso de posição dominante • Decisão Deutsche Bahn (1994): o incumbente alemão foi

condenado por abuso de posição dominante devido à aplicação de tarifas discriminatórias no transporte de contentores consoante o destino fosse um porto belga ou holandês, por um lado, ou um porto alemão, por outro; o Tribunal Geral confirmou a condenação (com uma coima de 11 milhões de euros);

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Abuso de posição dominante • Decisão GVG/FS (2003): um pequeno operador privado

alemão que pretendia prestar serviços de passageiros entre a Alemanha e a Itália (Milão) precisava de obter direitos de acesso às redes suíça e italiana e, quanto a esta última, de constituir um agrupamento com o incumbente italiano; o operador alemão pretendia também obter serviços de tracção e maquinistas para poder circular na infraestrutura italiana; a Comissão considerou que ao recusar a negociação de canais horários, a constituição de um agrupamento e o fornecimento de serviços de tracção, a FS tinha violado o artigo 102.º do TFUE; a FS aceitou prestar os serviços em causa e constituir o agrupamento, como condição para a não imposição de coimas.

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Regulamento n.º 1/2003 • Revoga as disposições do Regulamento n.º 1017/68 que

duplicavam os artigos do Tratado; • Introduz decisões de aceitação de compromissos: arquivamento (logo, sem condenação ou verificação de infração), mas com condições comportamentais ou estruturais; • Prevê a possibilidade de aplicação de medidas estruturais em processos sancionatórios; • Cria um sistema descentralizado de aplicação dos artigos 101.º e 102.º do TFUE pelas autoridades nacionais.

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Caso SNCF •  A Autoridade da Concorrência francesa condenou a SNCF por

abuso de posição dominante (lei nacional e artigo 102.º TFUE) a 18.12.2012 e aplicou uma coima de quase 61 milhões de euros; integração vertical e conflitos de interesse; •  Infrações condenadas: •  Utilização em proveito próprio de informações confidenciais de que

dispunha enquanto gestor de infraestruturas delegado; •  Divulgação tardia e incompleta da lista de terminais de mercadorias através do diretório de rede; •  Indisponibilizou, de forma injustificada, grande número de canais horários; •  Indisponibilizou, de forma injustificada, vagões EX que eram indispensáveis ao desenvolvimento de serviços por outros concorrentes; •  Prática de preços predatórios no mercado do transporte ferroviário de

mercadorias.

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Caso Deutsche Bahn • Em 2011 a Comissão Europeia fez buscas nas instalações

da Deutsche Bahn, encontrando-se o processo em instrução; • Em causa está o tarifário aplicado pela DB Energie ao fornecimento de energia elétrica para tração que, pelo sistema de descontos, pode ter carácter discriminatório, favorecendo as operações da própria Deutsche Bahn em detrimento dos concorrentes;

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Controlo de concentrações • Comissão Europeia: •  TLP/ERMEWA (M5579): aprovada a 22.1.2010 em 1.ª fase com condições e obrigações; •  DB/Arriva (M5855): aprovada a 29.6.2010 em 1.ª fase com condições e obrigações (alienação dos ativos Arriva Deutschland); •  Rhenus/Wincanton (6393): aprovada a 22.12.2011 em 1.ª fase: transporte por contentores no Reno – a Comissão considerou que o enquadramento regulatório alemão garantia um acesso em condições equitativas e não discriminatórias aos terminais de mercadorias da nova entidade; •  Veolia/Trenitalia (M6150): constituição de joint venture para prestação de serviços de transporte internacional de passageiros e para participação em concursos para concessões no Reino Unido; aprovada a 26.8.2011 em 1.ª fase

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Controlo de concentrações • Portugal: Arriva/Barraqueiro (CCent 37/2004): •  Decisão de proibição a 25.11.2005; a AdC considerou que a operação era susceptível de criar/reforçar uma posição dominante da qual possam vir a resultar entraves significativos à concorrência no mercado do transporte público rodoviário e ferroviário de passageiros, compreendendo todos os percursos realizados no eixo Setúbal/Lisboa, via travessia da Ponte 25 de Abril; •  Foi obtido o parecer do regulador sectorial (INTF); •  As notificantes recorreram da decisão para o Tribunal de Comércio de Lisboa; •  Não houve, até ao momento, qualquer decisão judicial sobre o caso.

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Principais desafios • Acesso: como demonstra o caso SNCF da Autoridade

francesa, a delimitação de mercados de serviços ferroviários associados à entrada de novos operadores permite uma intervenção ao nível da defesa da concorrência, mesmo quando existe um enquadramento regulatório; • Tarifação: o atual processo Deutsche Bahn poderá clarificar os princípios aplicáveis, sobretudo quanto a serviços que não estejam incluídos no pacote básico de acesso;

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Principais desafios • Equilíbrio regulação/concorrência: quanto mais eficaz for a

regulação, menor será a necessidade de uma intervenção corretiva em sede de concorrência; • O modelo de regulação do sector ferroviário não tende a criar conflitos: •  O DL n.º 270/2003 acautela a articulação AdC/regulador; •  O regulador não aprova previamente os atos das entidades reguladas;

• Mas, nunca esquecer, as regras de concorrência estão

previstas no TFUE e prevalecem sobre direito derivado da União bem como sobre o direito nacional (incluindo o enquadramento regulatório): o princípio está bem firmado na jurisprudência europeia (acórdão Deutsche Telekom).

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Fim da apresentação OBRIGADO. Miguel Moura e Silva ([email protected])

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