CONSELHOS DE SAÚDE, PARTICIPAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE INDÍGENA

June 4, 2017 | Autor: Renato Athias | Categoria: Etnologia, Antropologia Brasil índios, Antropologia da saúde
Share Embed


Descrição do Produto

Trabalho a ser apresentado no XXVII Encontro Anual da ANPOCS, no GT Povos Indígenas, Coordenado pelos Professores: João Pacheco de Oliveira e John Manuel Monteiro.

CONSELHOS DE SAÚDE, PARTICIPAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS DE SAÚDE INDÍGENA Renato Athias NEPE/PPGA/UFPE

Resumo: Desde 1999 o Ministério da Saúde vem implementando um modelo de atenção à saúde indígena através dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI). Este trabalho procura analisar a participação indígena a partir de duas experiências: a primeira entre os Pankararu de Pernambuco e a segunda entre os Tukano do Rio Negro, procurando identificar os processos de envolvimento e participação dos índios no planejamento, implementação e controle social das ações de saúde nessas áreas e busca tirar alguns elementos para nortear o debate sobre participação e políticas públicas nos processos de desenvolvimento das organizações dos serviços de saúde em áreas indígenas.

Introdução Em trabalho anterior1 iniciamos um debate sobre os temas na área da saúde pública que cruzam com as discussões na área da antropologia

e

que

chamamos

de

diálogo

interdisciplinar

no

âmbito da Saúde Indígena. Na ocasião apontávamos as seguintes seguintes áreas de conhecimento: planejamento e organização dos serviços de saúde; a noção de acesso aos serviços de saúde, sistemas de informação em saúde indígena e a participação como sendo um lugar comum de debate cujos as noções nos pareceu merecer um debate maior entre os profissionais que atuam na área indigenista. Interessa-nos aqui ampliar esse debate em torno da noção

de

participação

e

da

prática

dos

conselhos

de

saúde

indígena.

Atualmente

existem

cerca

de

34

Conselhos Distritais

de

Saúde Indígena, uma vez que estão em funcionamento 34 distritos sanitários

com

seus

territórios

específicos

e

modelos

operacionais diferenciados segundo a realidade local de cada Distrito 1

Sanitário.

Athias & Machado, 2001

Não

nos

interessa

aqui

debater

a

2 operacionalização

dos

distritos

em

suas

diversas

formas.

Gostaríamos a partir de duas realidades, a do Rio Negro e a de Pernambuco a qual tenho participado como antropólogo em reuniões de

conselhos

locais

de

saúde

(nas

comunidades

indígenas)

e

encontros de Conselhos Distritais.

Os

conselhos

locais

de

saúde

indígena

são

formados

exclusivamente pelos índios, visto pelos gestores de saúde, como usuários do subsistema. É um conselho formado por usuários com a participação eventual da equipe de saúde. Esses conselhos têm suas regras próprias de funcionamento, respeitando-se a forma de como

a

comunidade

existentes

esses

está organizada. conselhos

são

De

acordo

formais

e

com

as

normas

homologados

pelo

coordenador regional da FUNASA em suas respectivas áreas. Já os conselhos distritais, têm sua composição e disposição de acordo com a Lei. 8.080 que aponta a paridade como sendo um elemento principal

que

prestadores

de

regula

a

serviços

participação de

saúde

nas

igual

de

diversas

usuários áreas.

e

Estes

conselhos são formalizados e seus participantes têm seus nomes homologados

pelo

Presidente

da

FUNASA.

O

documento

sobre

a

política de saúde indígena não só enfatiza essa participação como determina como serão formados os conselhos distritais: “...Criação de um Conselho Distrital de Saúde e Conselhos Locais de Saúde com composição paritária entre usuários, trabalhadores do setor de saúde e prestadores de serviços conforme a Lei 8142/1998 e demais diretrizes desta Lei. Dentre os usuários, todos os povos ou regiões da área distrital devem estar representados, conforme indicação das comunidades, sendo que nenhum deles deterá a maioria (cinqüenta por cento mais um) dos assentos sendo que aos conselheiros que não dominam o português deve ser facultado o acompanhamento de interpretes por ele indicado. Dentre os prestadores de serviços, deverão ter representação as seguintes instituições: Agência Governamental de saúde indígena, Órgão Indígena Oficial, Secretaria Estadual de Saúde, Secretaria Municipal de Saúde, Universidades, Organizações Não Governamentais e Gestores de Distrito e Sub-Distrito.”2

2

Diretrizes para Elaboração do Planejamento Estratégico Para Política de Saúde Indígena, Ministério da Saúde, Abril de 1999, reeditado em março de 2002.

3

No âmbito da saúde indígena, como também na área da saúde pública ou coletiva o controle social, é visto como as formas de participação e fiscalização dos usuários dos serviços de saúde possibilitando as formas e o estabelecimento de mecanismos de participação satisfação

do

nas

ações

usuário.

de Não

saúde se

de

têm

maneira notícias

a de

garantir como

a

estão

funcionando os diversos conselhos locais e distritais de saúde indígena.

No

entanto,

durante

a

III

Conferência

de

Saúde

Indígena, foram votadas as seguintes propostas em um plenário de mais de 400 representantes indígenas e outros

400 profissionais

de

organizações

saúde

(tanto

governamentais

como

de

não

governamentais) dos diversos Estados:      

Capacitação continuada para conselheiros indígenas e não-indígenas, com abordagens pedagógicas adaptadas às realidades de cada povo. Promoção de modificações nas leis que instituem os conselhos de saúde (municipal/estadual/nacional) para garantir a inclusão de representantes indígenas Representação indígena na nova reestruturação do Conselho Nacional de Saúde e a sua homologação imediata pelo Ministro da Saúde. Recomposição da Comissão Intersetorial de Saúde Indígena - CISI, para garantir a paridade com representações indígenas das regiões: 1 norte, 1 nordeste, 1 centro-oeste, 1 sul, 1 sudeste. Implementação do Comitê Indígena para assessorar e acompanhar as ações da FUNASA Participação de mulheres nas instâncias de controle social, levando em conta a realidade de cada povo e suas diferenças étnicas e culturais.

Esses pontos acima, nos parecem indicar a direção que os formuladores das políticas de saúde com relação a participação nos espaços políticos de decisão na saúde indígena. E o primeiro deles sobre a questão da capacitação é o mais importante. A história da participação popular na organização dos serviços de saúde

no

Brasil



mereceu

muitos

trabalhos

e

imensas

discussões, pois já foram realizadas no Brasil 11 Conferências Nacionais com importante participação de setores da população Brasileira. Esse debate sobre participação pode dar pista para clarear a posição

daquele

que

comunidade. Foucault

fala,

ou

interpreta os interesses

da

situaria essa discussão nos espaços do

poder ou na heterogeneidade do poder ou no sistema de símbolos que as relações com as instituições do Estado podem produzir

4 entre os grupos indígenas. Na realidade, reconhece

a

produção

de

a teoria da ideologia

conhecimento

específico

e

a

institucionalização das práticas e os instrumentos para formação e

acumulação

de

conhecimento.

Neste

sentido



uma

relação

mecânica entre o desejo e o interesse (Cf.Spivak,1993).

Conselhos de Saúde, espaços de negociação e autonomia

O DSEI- PE compreende as Terras Indígenas das seguintes etnias:

Fulni-ô,

Pankararu,

Xucuru, Kapinawa,

Truká,

Tuxá,

Kambiwá,

Pipipã,

Atikum,e mais recentemente os Pankará, com

uma população estimada em 25.7933 índios distribuídos em 150 aldeias,

nos 13 municípios das regiões do Agreste e Sertão

pernambucano.

As ações de saúde estiveram, até então, sob a

responsabilidade

da

FUNAI

e

dos

municípios

onde

as

aldeias

indígenas estão localizadas e eram realizadas sem a preocupação de desenvolver uma reflexão em torno da especificidade de uma organização de serviços de saúde própria para essas populações. A

prática

dessas

ações

de

saúde

seguiam

os

modelos

assistencialistas, sendo realizada pela FUNAI e nos períodos eleitorais pelos municípios. Não existem registros de trabalho de ONGs com populações indígenas em Pernambuco.

As organizações indígenas em Pernambuco têm a questão da demarcarção de suas identidade étnica problemática

da

reivindicações

terras e, conseqüentemente, a afirmação da como prioritária em toda sua mobilização. A

saúde

vem

específicas

em e

segundo

plano,

pontuais.

Neste

na

forma

contexto,

de a

implantação do Distrito Sanitário Indígena se deu de uma forma verticalizada, sendo que o movimento indígena não teve o tempo necessário para entender a proposta como um todo e de discutí-la adequadamente4.

Houve uma

única

reunião

em

abril

de

1999,

agrupando todas as lideranças indígenas do Estado, promovida 3 4

Dados da FUNASA, 2002.

No caso da área Pankararu a discussão sobre o Distrito Sanitária Indígenas iniciou-se em fevereiro de 1999 por iniciativa de pesquisadores do Projeto de Saúde Reprodutiva em desenvolvimento na área implementado pelo FAGES/UFPE.

5 pela

FUNASA,

da

qual

participaram

as

lideranças

indígenas

tratando-se basicamente da definição do território distrital. Em seguida deu-se início ao processo de implementação da proposta em

um

ritmo

acelerado,

sem

a

participação

indígena

no

acompanhamento e desenvolvimento da mesma.

A equipe local diálogo

com

os

da

FUNASA, não

usuários

dos

elaborou uma prática de

serviços,

o

que

tem

provocado

reflexos importantes no processo de implantação do distrito. As articulações

do

Distrito

foram

feitas

diretamente

com

os

municípios que incorporaram parte da execução de ações de saúde nas áreas indígenas através de convênios específicos que prevêem a contratação de equipes multidisciplinares para a prestação de serviços de saúde naquelas localidades. Cabe ressaltar que o MS/FUNASA está investindo nos municípios, procurando seguir os parâmetros adotados na Norma Operacional Básica

do SUS/96, com

uma série de incentivos financeiros para que os mesmos sejam estimulados

a

executarem

a

Atenção

Básica

nas

comunidades

indígenas. Desta forma, as equipes de saúde para o distrito estão sendo escolhidas e contratadas pela prefeitura local, o que pode implicar, às portas de um ano eleitoral, num jogo de interesses políticos, sem necessariamente considerar a melhoria ao

acesso

aos

serviços

de

saúde.

Em

outras

palavras,

a

organização dos serviços de saúde nessa região, está sendo feita sem

uma

discussão

mais

ampla

com

a

população

indígena

e

a

inserção desse subsistema de saúde no SUS aponta para distorções históricas da saúde pública no país, próprias do uso políticoeleitoral da questão.

De acordo com os dados de março de 2001 os profissionais vinculados ao DSEI, estavam assim distribuídos médicos (16), enfermeiras

(16),

odontólogos

(15),

farmacêuticos

(2),

auxiliares de enfermagem (24), Agentes de Saúde (81); agentes de saneamento

(13);

técnico

de

laboratório

(1),

atendente

de

enfermagem (9), técnico de material (1), agente administrativo (5), guarda de endemias (6), monitor de saúde (4), visitadora sanitária

(2),

motorista

(6)

serviço

gerais

(2),

auxiliar

6 administrativo

(1),

total

pessoas

de

205

técnico dos

em

saneamento

quais

132

têm

(1)

perfazendo

um

seus

contratos

de

trabalhos emitidos pelas prefeituras enquanto os 73 restantes encontram-se na folha de pagamento da FUNASA.

Até a presente data não se tem um quadro consolidado sobre o

perfil

entanto,

epidemiológico como

das

principais

infecto-parasitárias,

diversas

agravos

doenças

áreas

são

indígenas.

apontados

endêmicas,

as

doenças

No

doenças crônicas

generativas. Pode-se afirmar que nunca os índios tiveram tantos profissionais atuando no âmbito saúde indígena respondendo uma demanda reprimida de muitos anos. E isso se constitui um avanço significativo. Esse fato também é observado pelas lideranças indígenas. Porém, a atuação das equipes na área indígena ainda é realizada nos moldes de uma assistência ambulatorial não levando em conta os aspectos culturais dos povos indígenas, e tampouco são

observadas

as

práticas

das

visitas

domiciliares

pelas

equipes profissionais.

As principais queixas das lideranças indígenas são: a) as contratações que segue a política das prefeituras, aumentando a distância entre o vínculo empregatício, a coordenação técnica (FUNASA) e os conselhos locais de saúde que não são respeitados, b)

o

não

indígenas.

cumprimento “Chegam

dos

tarde

horários

e

saem

de

cedo”,

trabalhos

nas

dizem

lideranças

as

áreas

indígenas, e c) a maneira discriminadora como são encaminhados e atendidos

os

treinamentos

índios para

as

na

rede

equipes

de de

saúde saúde,

referenciada. apesar

dos

Os

esforços

realizados, ainda carecem de uma melhor capacitação na área da antropologia

da

saúde.

Uma

das

principais

dificuldades

com

relação aos recursos humanos situa-se na alta rotatividade de profissionais que são contratados pelas prefeituras. Os agentes de

saúde

que

atuam

na

área

indígena

estão

divididos

entre

agentes contratados pela FUNASA (23) e os contratados (58) pelos municípios (PACS). Neste caso, amplia-se à distância entre eles, pois recebem orientações de supervisores municipais que, não

7 estão devidamente informados, encontrando-se ainda complicadores na área indígena que está situada em três municípios.

Apesar

de

avanços

organização

dos

serviços

na

participação

de

saúde,

pode-se

dos

índios,

observar

que

na os

conselhos locais de saúde carecem de treinamento adequado para exercerem suas atribuições. Não havendo um controle social dos recursos que são repassados para os pagamentos dos salários de profissionais nem os subsídios para os hospitais de referência situados no âmbito dos municípios.

Na realidade, levando-se em

conta a situação geral, pode ser percebidas a existência de alternativas imediatistas e provisórias para atender as demandas das

comunidades

perpetuadas ações

de

pela saúde

indígenas

que

inexistência por

correm

de

parte

uma

dos

o

risco

prática

de

serem

avaliativa

profissionais

de

das

saúde,

dificultando assim a consolidação de um subsistema de Atenção à Saúde Indígena.

Desde a implementação do Distrito Sanitário os índios de Pernambuco foram envolvidos nas discussões sobre os serviços de saúde

sem

exatamente

entenderem

o

processo

mais

amplo

de

distritalização. A relação que esses índios sempre tiveram com o poder público foi através da FUNAI que até a presente data detém uma

relação

tutelar

clientelista

profundamente

enraizada

no

modelo

com as comunidades indígena aonde cacique é visto como

a pessoa que vem buscar os recursos para a comunidade. Essa relação está longe de ser mudada. Neste sentido a implantação dos conselhos locais de saúde nas diversas áreas indígenas criou um novo espaço de negociação inexistente até então. Através dos relatos

dos

representantes

dos

povos

indígenas

no

conselho

distrital pode-se perceber que esse novo espaço, inicialmente para discutir as questões de saúde está se tornando um espaço amplo de discussão dos principais problemas de uma determinada etnia.

A elaboração da proposta de organização dos serviços de saúde para a região do Alto Rio Negro foi fruto de um intenso

8 trabalho

de

articulação

interinstitucional

que

vem

se

consolidando desde 1997, a partir da II Conferência de Municipal de Saúde e contou com a participação de representantes indígenas e dos profissionais de saúde ligados ao setor de toda região, políticos

locais,

inclusive

com

Forças

Armadas

que

tem

uma

representação bem expressiva nessa região.

A região do Alto Rio Negro possui características bastante peculiares quanto aos povos indígenas que ali habitam, tais como a extensão territorial às dificuldades de acesso as comunidades indígenas,

apresentando-se

como

um

grande

desafio

para

a

elaboração de uma proposta de distrito sanitário adequada a essa região. O município de São Gabriel da Cachoeira, sede distrital, 108.000km2

possui

formadores

da

de

Bacia

extensão,

do

Rio

entrecortado

Negro,

com

pelos

diversos

rios

trechos

encachoeirados, devido aos quais, muitas vezes, para se chegar à próxima comunidade é necessário fazer um trecho à pé, sendo que todos

os

equipamentos

necessários

para

o

trabalho

de

saúde

precisam ser transportados pelos profissionais de saúde e pelos comunitários.

Pensar

na

operacionalização

desses

serviços

visando a melhoria no acesso aos serviços de saúde para as populações que residem nessa região exige um esforço técnico, no sentido

de

adequar

as

rotinas

de

trabalho

sem

perda

de

revela

a

qualidade.

A

articulação

interinstitucional

constituída

maturidade das organizações e entidades de saúde que atuam nessa região, uma vez que nenhuma delas tem capacidade operacional para

dar

conta

sustentabilidade depende

do

do

trabalho

das

600

modelo mais

comunidades

assistencial intenso

na

existentes.

para

esta

formação

A

realidade

de

agentes

indígenas de saúde e outros recursos humanos locais.

A

participação

indígena

nesse

processo

de

elaboração

consolida o espaço que as organizações indígenas conquistaram ao longo

dos

anos.

Existem

na

região

cerca

de

28

associações

indígenas, filiadas à Federação das Organizações Indígenas do

9 Rio Negro que as congrega desde 1986. O trabalho da FOIRN está direcionado

para

a

defesa

dos

direitos

indígenas

quanto

à

demarcação de terras, educação e saúde. As Terras Indígenas do Rio Negro foram demarcadas em 1998 após um processo de lutas de 20 anos. Sendo assim, com este acúmulo de experiência, em termos de participação social, o movimento indígena no Rio Negro tem amplas

condições

concepção

do

de

modelo

colocar

suas

assistencial

demandas

e

no

participar

momento

das

fases

da de

execução e avaliação das atividades.

Num primeiro momento as instituições que atuam na região do Rio Negro elaboraram as propostas e planos de ação, a partir de uma setorialização entre as diversas entidades. As Organizações Indígenas,

representadas

pela

FOIRN

ocupava

um

espaço

privilegiado de controle dessas ações. Recentemente a FOIRN, tendo

em

vista

as

conjunturas

específicas

foi

aos

pouco

assumindo um duplo papel: o de controle das ações de saúde e como organização conveniada a FUNASA tem o papel de implementar as ações da saúde em todas áreas do Rio Negro. Com isso, o número de funcionários da FOIRN aumentou em 300% uma vez que todos

os

profissionais

da

área

da

saúde

são

contratados

atualmente pela FOIRN.

Os Conselhos locais de saúde e a organização territorial das

ações

de

saúde

estão

compatíveis

com

as

regiões

administrativas da Federação. Ou seja, nessas regiões agora se encontra os conselhos locais de saúde que se soma às diversas associações existentes na região. Esse espaço de negociação e discussão está colocado paralelamente os espaços já existentes de

discussão

sobre

os

diversos

projetos

e

interesses

das

associações locais.

Esse conjunto de elementos reunidos acima com relação a essas duas áreas relações

sociais

nos dá uma base para discutir às dinâmicas nas entre

os

índios

e

entre

os

não

índios

encarregados de implantar as ações de saúde. O discurso das lideranças e representantes nos diversos conselhos apresenta uma

10 clara dicotomia ou oposição. Em alguns momentos esse discurso remete a um conhecimento de causa e insiste no conhecimento próprio e em outro momento mostra-se hábil em poder negociar serviços

e

recursos

para

sua

comunidade.

Neste

processo

de

negociação pode-se perceber a maneira eles manejam a identidade indígena colocando em evidência os interesses específicos do grupo, que vai desde as relações de parentesco, a posição na hierarquia indígena possibilitando mostrar uma dinâmica própria e a habilidade de realizar alianças.

Participação Indígena e Políticas Públicas

Tanto na região do Rio Negro como em Pernambuco, a dinâmica das

relações

políticas

traduz

as

tensões

existentes

em

nas

regiões geográficas onde estão aldeias indígenas. Essas tensões podem ter origem nas relações de parentesco e nas suas áreas geográficas,

onde

os

representantes

indígenas

obtêm

a

sustentação política para suas atividades. Essa tensão é real e dificilmente o gestor de saúde indígena ou os membros da equipe de profissionais que atuam na região podem perceber com clareza os diversos pontos de tensão. Esses novos espaços de negociação estão

fornecendo

aos

povos

indígenas

novas

práticas

e

estratégias de negociação com instituições não indígenas.

Se no Rio Negro essas novas estratégias

convivem com as

formas tradicionais de exercer a liderança, em Pernambuco essas novas estratégias estão fazendo cair o clientelismo e o modelo tutelar nas relações com as instituições do Estado. Se por um lado podem-se perceber pontos comuns entre essas duas realidades principalmente

no

estratégias

negociação,

algumas

de

diferenças

tocante

que

ao por

são

estabelecimento outro

lado

significativas

de

podem-se com

novas

perceber

relação

ao

movimento indígena e sua dinâmica interna. Nas duas áreas essas diferenças

situam-se

relações de poder.

principalmente

no

âmbito

interno

das

11 Até a presente data as associações indígenas existentes nas diversas

áreas

de

Pernambuco

representação,

como

indígenas

estão

não

é

no

não

têm

do

Rio

caso

presentes

nos

exercido Negro.

espaços

o

As

de

poder

de

associações

negociação.

A

liderança exerce esse poder de representação e a fala dessas lideranças são escutada como aquela que define a direção nos processos de negociação. Trata-se de uma participação onde à liderança estabelece de antemão com a comunidade. Quem garante ao acesso aos “bens” e aos “recursos” é a liderança. No caso do Rio Negro a associação tem esse poder de trazer o recurso. Essas duas forma de atuar faz com que o aspecto da escolaridade seja um condicionante e interfere nos modelos de negociação.

Neste sentido os índios escolarizados vão obtendo maior penetração

e

importância

nesses

espaços,

uma

vez

que

a

quantidade de papéis que são distribuídos tem aumentado e a dificuldade dos índios que não estão treinados na leitura que não

conseguem

acompanhar

o

desenvolvimento

das

discussões

e

posterior decisão.

Esses indígenas

conselhos como

de

saúde

protagonistas

procuram das

ações

colocar de

os

povos

saúde.

Essas

discussões, muitas vezes, leva os representantes nos conselhos a ampliar seus desejos e interesses. No entanto, tudo esbarra na redistribuição dos recursos e no poder do Estado e bloquear as ações pretendidas e planejadas por causa dos recursos que muitas das vezes não são repassados de maneira eficiente. As discussões e

a

participação

dos

índios

no

planejamento

da

FUNASA

é

importante para a produção de conhecimentos sobre uma prática participativa, porém o controle de fato de todas as ações está ainda no espaço da FUNASA. Daí o grande debate entre os índios participantes do Conselho Distrital em Pernambuco sobre a real autonomia desse conselho, uma vez que a FUNASA determina a pauta e os índios legitimam a ação da FUNASA na região.

12

Bibliografia ATHIAS, Renato e MACHADO, Marina. 2001 . Saúde Indígena no Processo de Implantação dos Distritos Sanitários – Temas Críticos e propostas para um diálogo interdisciplinar. In Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 17(2) março, Rio de Janeiro, Fiocruz BOURDIEU, Pierre. 1996. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus. BOURDIEU, P.1989.O Poder Simbólico. Lisboa: Ed. DIFEL. BOURDIEU, P.1996. A Economia das Trocas Lingüísticas. O que falar quer dizer. São Paulo, EDUSP. FOUCAULT, Michel. 1979. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal. HABERMAS, Juergen, 1987. A nova intransparência – a crise do estado de bem-estar social e o esgotamento das energias utópicas. In Novos Estudos. 18, setembro/1987, pp. 103-114. São Paulo: CEBRAP. MENDES, Eugênio Vilaça (org.), 1998. A organização da saúde no nível local. São Paulo: Hucitec. MENDES, Eugênio Vilaça (org.), 1999. Distrito Sanitário - o processo social de mudança das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. 4ª edição. São Paulo-Rio de Janeiro: Hucitec-ABRASCO. SPIVAK, G. 1993 Can the subaltern speak? In: Williams & Chrisman (Org) Colonial discourse and Post-colonial theory, London, Havester/Wheatsheaf

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.