Conservação da Biodiversidade e Especulação Imobiliária: o caso do Morro do Moreno (Vila Velha, ES)

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XVII Congresso Brasileiro de Sociologia 20 a 23 de Julho de 2015, Porto Alegre (RS)

Grupo de Trabalho: GT 04 Conflitos Socioambientais

Conservação da Biodiversidade e Especulação Imobiliária Instituição: Universidade Vila Velha (UVV – ES); Núcleo de Estudos Urbanos e Socioambientais (NEUS/UVV – ES) Autores: SATHLER, Marcelo1; ROSA, Teresa da Silva2.

Contatos: [email protected]; [email protected];

1

Biólogo, Mestre em Conservação da Biodiversidade e Sustentabilidade/ESCAS, Pesquisador do Núcleo de Estudo Urbanos e Socioambientais/NEUS 2

Professora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, Pesquisadora do Núcleo de Estudo Urbanos e Socioambientais/NEUS

GT 04 CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS Conservação da Biodiversidade e Especulação Imobiliária: o caso do Morro do Moreno (Vila Velha, ES)

RESUMO O Morro do Moreno é um maciço rochoso de 190 m de altura e 730.854,17m2 de área, limítrofe ao oceano no município de Vila Velha/ES. Mantenedor de fragmento de mata atlântica, registra 6 espécies ameaçadas de extinção e encontra-se em conflituoso processo de implantação de Unidade de Conservação (UC). Abriga 274 domicílios e 508 habitantes, com a renda média mensal é entre 5 a 10 salários mínimos (IGBE, 2010). Os moradores e proprietários de terrenos pressionam contra a UC com receio de perda de direitos. Alguns optam pela especulação imobiliária da região, pois o metro quadrado muito valorizado (SINDUSCON-ES, 2015) e o lugar permite cobiçada visão da cidade e do mar. Uma vez as residências instaladas, o poder público não possui recursos para desapropriação. Muitas casas abrigam membros da própria prefeitura e do judiciário e percebe-se estratégia de protelação da UC para ocupação acelerada do local. Contudo, muitos terrenos, além de murarem nascentes, possuem declividade superior ao permitido por lei, não obstante, em solo passível de escorregamento. Isso favorece àqueles que advogam pela conservação local, principalmente, os membros da sociedade civil organizada. No momento, a lei de uso e ocupação do solo do município encontra-se sem definição e o Ministério Público cobra a legalidade e realiza a condução do processo. Não havendo mudança de forças, parece certa a implantação da UC apesar da grande degradação da vegetação. Palavras chave: arena pública, conflito socioambiental, ordenamento urbano e ambiental. INTRODUÇÃO As políticas de uso e ocupação do solo devem considerar as demandas dos cidadãos, colaborando assim com a criação de cidades menos segregadas e capazes de promover a mobilidade dos diversos grupos formadores do tecido social pela área urbana (BRASIL, 2001). A urbanização das cidades deve ocorrer considerando, de um lado, os processos produtivos e, de outro, os serviços ambientais prestados pelos ambientes naturais (SOUZA, 2006), tampouco restringir o acesso aos locais onde os habitantes costumam desenvolver atividades esportivas e de recreação (id, 2006). A organização do espaço urbano visa a melhoria da qualidade de vida da sua população.

O modelo socioeconômico adotado pela sociedade contemporânea reflete-se na produção do espaço urbano. Expansivo e transformador, este modelo produz alterações na cobertura dos solos

e na paisagem,

comprometendo o equilíbrio dos ecossistemas naturais e colocando a sociedade permanentemente em conflito com o meio ambiente (MARICATO, 2011). Embora por vezes exista planejamento com intuito de se evitar a degradação dos recursos naturais e o conflito entre os atores em uma determinada localidade, a pretendida organização muitas vezes fracassa na tentativa de acomodar todas as forças, resultando em divergências na arena pública e, consequentemente, em degradação ambiental e perda da qualidade de vida (SOUZA, 2006). A Mata Atlântica é o bioma brasileiro mais impactado pela expansão urbana. Dotado de uma das mais ricas biodiversidades do mundo e característico da região oriental do Brasil, originalmente, era presente em 17 estados brasileiros. Hoje perdura pouco da cobertura vegetal do passado. Resta somente 8,5 % do total, considerando-se os valores biológicos significativos em biodiversidade encontrados apenas em remanescentes florestais acima de 100 hectares ou 12,5 %, caso computados, também, os demais fragmentos menores e acima de 3 hectares, estando todos esses resquícios espalhados, principalmente, na zona rural (SOS MATA ATLÂNTICA, 2015). Os fragmentos presentes nas áreas urbanas são pressionados pelo crescimento das cidades (SOUZA, 2006) e, diferente do passado, quando as cidades majoritariamente cresciam sem controle e desconsideravam as áreas verdes, hoje existem instrumentos legais que protegem os fragmentos florestais urbanos, visto os possíveis problemas decorrentes da sua ocupação, e o valor ambiental, cultural, paisagístico e recreativo que possuem. Contudo, muitas vezes a legislação não consegue ser efetiva (id, 2006). Neste contexto, encontra-se o Morro do Moreno (MM), localizado à beira mar no município de Vila Velha, no estado do Espírito Santo. Dotado de um fragmento de mata atlântica, compõe um pequeno, porém importante, corredor ecológico urbano. Outrora inabitado e estratégico para a colonização do estado, utilizado na observação das naus que se aproximavam devido a sua altura e posição litorânea (MORRO DO MORENO, 2013). Hoje, não mais possui essa função e é cercado pelo calçamento do solo e por construções.

Com uma utilização muito distinta, é frequentado por muitos visitantes que objetivam a prática de exercícios ao ar livre, o contato com o ambiente silvestre e a visualização da paisagem, qualidades que resultam na sua vocação aos esportes naturais e radicais, porém, também, a razão da intensa especulação imobiliária que o acomete. Nos dias de hoje, o processo de ocupação residencial em curso compromete suas características naturais e viola o estabelecido no ordenamento jurídico. Loteamentos ocorrem em área de preservação permanente (APP), afetando a instabilidade do solo e ameaçando vidas humanas. Não obstante, reduzem a vegetação e privam o acesso das pessoas ao local público, extinguindo um dos poucos patrimônios históricos e culturais do município. Devido a isso, diferentes grupos contestam essa urbanização. Em determinado momento, todas as construções foram paralisadas por ação do Ministério Público Estadual e Federal, contudo, alguns proprietários conseguiram autorizações judiciais e muitas foram retomadas (MPF, 2010). No momento, o poder público organiza a implantação de uma unidade de conservação no MM, o que desagrada alguns moradores pelo receio de perda de direitos sobre suas propriedades e construções, enquanto outros atores que advogam pelos valores ambientais e sociais movimentam-se para alcançarem seus objetivos através dessa regulação. O conflito prossegue e uma das poucas referências socioambientais do município perderá parte de seu valor e áreas de uso comum caso não ocorram mudanças no jogo de forças em curso. Parte da pesquisa3 “Compreendendo a construção da vulnerabilidade socioambiental em contextos urbanos modernos: O caso de Vila Velha (ES)”, esta comunicação visa retratar a arena política instalada no MM nas últimas décadas através de observações de campo, registros (fotográficos ou não) de diferentes meios e informações de seus diversos atores sociais com vistas a contribuir para a compreensão das vulnerabilidades no munícipio em foco. Com base em um roteiro previamente estruturado, foram feitas 54 entrevistas, aleatoriamente, a saber: 15 moradores e 05 ex-moradores do MM; 4 moradores

3

Esta pesquisa é financiada pelo CNPq vem sendo desenvolvida por pesquisadores do Núcleo de Estudos Urbanos e Socioambientais/NEUS, do Programa de Pós-graduação/Mestrado em Sociologia Política, da Universidade Vila Velha.

dos prédios situados defronte a sua face sul; 20 indivíduos que percorriam as trilhas do monte e que se dispuseram a responder o questionário nas seis idas a campo efetuadas entre maio de 2014 e maio de 2015; 4 funcionários da Prefeitura Municipal de Vila Velha; e

6 membros sociedade civil organizada.

Estes dois últimos grupos de entrevistados foram encontrados em audiências públicas ocorridas entre 2014 e 2015. Características socioambientais do Morro do Moreno Situado no município de Vila Velha, o MM é um afloramento rochoso granítico da Suíte Intrusiva Espírito Santo, que pertence a uma cadeia linear de montanhas que, margeando a Baía de Vitória, é composta, de leste para oeste, do Morro do Convento da Penha, do Morro de Jaburuna, Morro da Mantegueira e do Morro do Penedo, além de outras elevações menores. De idade cambriana, o conjunto é estimado em aproximadamente 540 milhões de anos (TULLER et al, 1993). Quanto à sua área, existe divergência. Uma antiga mensuração da Prefeitura Municipal de Vila Velha (PMVV) admite 580.647,98 m²; enquanto o diagnóstico ambiental da empresa Environlink4, indica 730.854,17m2, sendo esta a mensuração usualmente mais aceita, porém não confirmada oficialmente (ENVIRONLINK, 2012).

Figura 01 - Morro do Moreno. Fonte: Environlink (adaptado).

Esta indefinição de área vem se juntar a um zoneamento conflituoso do MM que obedece ao Plano Diretor Municipal de Vila Velha, Lei Nº 4.575/2007. De acordo com a PMVV, 90% do MM é Zona de Especial Interesse Ambiental e 4

Esta foi contratada pela PMVV para identificação de categoria de unidade de conservação mais adequada para a área.

10% Zona de Proteção Ambiental e Cultural. Contudo, a falta de pronunciamento oficial sobre as diferentes mensurações de sua área gera incertezas sobre quais limites exatamente compõem essa divisão. Ainda q vigente, este plano foi criado em desrespeito à formalidade legal e sofreu diversas tentativas ilegais de alteração após a sanção, inserindo-o num imbróglio judicial que desencadeou o processo, agora corrente, de criação de uma nova lei definidora do uso e da ocupação do solo do município (SATHLER, 2014). Portanto, a lei, instável pela ilegalidade, tornou-se passageira, não havendo certeza sobre seu futuro, logo, sobre o zoneamento do Morro, ressaltando que ele nunca foi respeitado. A cadeia de montanhas a qual o Morro se insere é considerada parte de uma zona ecológica maior. Ela compreende, do outro lado da estreita baía, a capital do estado com a sua elevação central, hoje, o Parque Estadual da Fonte Grande, também coberto por Mata Atlântica e circundado por manguezais; e o Município de Serra, ainda mais ao Norte, onde o manguezal de Vitória estende-se e encontra-se com a vegetação circundante ao Morro do Mestre Álvaro, um maciço de 800 m de altura com abundante cobertura vegetal, considerada uma das 10 áreas mais relevantes para a conservação do Espírito Santo (NOVELLI et al, 2011). A flora do MM é diversa, decorrente da conjugação de fatores comoa declividade; a influência do mar, dos ventos e, em arte, pelo rio (hoje, canal) que margeavaseu sopé; e pela influência humana, seja por degradação causada na vegetação nativa existente, pela introdução de novas espécies exóticas e, até mesmo, pelos pequenos plantios com intuito de enriquecimento da Mata Atlântica presente. Ela encontra-se em diferentes estágios de recuperação: inicial, na face Norte, onde as tentativas de assentamento impedem o desenvolvimento da vegetação; e avançado, presente na face Sul, mais íngreme e menos ocupada (figura 02). Na face setentrional, a macega predomina com presença árvores esparsas e, assim como por quase todo o Morro, árvores frutíferas. Estas, embora exóticas, são aquelas típicas de pomares e não representam perigo ao ecossistema local. Porém existem outras espécies introduzidas, não alimentícias, com potencial de proliferação exacerbado e que facilitam a ocorrência de incêndios, como os que ocorrem na macega da face Norte.

Figura 02 - Diferença entre a vegetação das faces sul e norte do Morro do Moreno. A face Sul, à esquerda, apresenta vegetação de Mata Atlântica em estágio avançado. Na face Norte, à direita, a vegetação predominante é a macega, com poucas árvores espalhadas por ela. Fonte: Google Maps (2015).

A presença da foz do antigo rio da Costa permitiu o surgimento de manguezal que, mesmo com a urbanização, mantém-se no canal e no resquício de meandro do rio existente no sopé do Morro (figura 03), totalizando 10.205.61 m2 de acordo com estudo da empresa Environlink (2012). Observando toda a comunidade vegetal, composta de 161 espécies, existem espécies cujo número de exemplares na natureza encontram-se escassos (id., 2012) e, por isso, são consideradas prioritárias em todos os esforços de conservação. Apesar de que elas estejam presentes no local, outras espécies comuns a ambientes ecologicamente desequilibrados ocorrem em maior abundância e indicam como a urbanização em curso degrada o local.

Figura 03 - Resquícios dos meandros do Rio da Costa. Entre o Morro do Convento da Penha (esq.) e o Morro do Moreno (dir.) encontrava-se a foz do Rio da Costa. A fotografia mostra partes dos meandros do Rio da Costa separados pela sua retificação, o Canal da Costa, onde ocorria a Construção da ponte Darcy Castello de Mendonça (ou Terceira Ponte).

A fauna presente corrobora o desequilíbrio ecológico apontado acima apesar da ausência de fontes científicas sobre a biodiversidade do Morro. As observações in loco feitas pelos autores e o estudo efetuado pela empresa Environlink demonstraram baixa qualidade ambiental em comparação a um

ambiente

bem

preservado

de

Mata

Atlântica.

Contabiliza-se

uma

biodiversidade de 84 espécies de aves, 09 mamíferos e 13 de répteis (Environlink, 2012). Grande proporção dos animais encontrados são capazes de habitar ambientes antropizados e abertos; e as espécies mais exigentes quanto ao ambiente são escassas, porém não ausentes. Entre elas está a preguiça-de-coleira (Bradypus torquatus), vulnerável à extinção de acordo com o IBAMA (2003) e a UICN (2012), inclusive vista se reproduzindo no Morro do Convento da Penha, onde menos impactado pela urbanização, pois a presença da instituição religiosa protege a mata.

O Processo de Ocupação O processo de ocupação do MM foi tardio em relação aos primeiros assentamentos do município de Vila Velha. Após a chegada dos colonizadores, tornou-se posto de observação com intuito de proteger os primeiros habitantes do estado, sob responsabilidade de João Moreno, colono que veio de Portugal com Vasco Fernandes Coutinho, donatário da capitania. João realizava a vigia e fazia pequenos cultivos no morro. Por causa desse personagem supostamente surgiu o nome da elevação (MORRO DO MORENO, 2013). As primeiras moradias foram construídas após o desembarque dos portugueses, em 1535, entre as elevações rochosas exatamente a oeste do MM. A localização deu-se por ser, à época, a primeira praia ao se adentrar na baía de Vitória, cujas tranquilas águas facilitavam a atração dos navios e forneciam certa privacidade no tocante aos navios que navegavam próximo da costa. Nessas condições o MM era pouco acessível. Vila Velha passou séculos abandonada. Mesmo com o retorno das políticas no século XVII, apenas dois séculos depois, em 1929, que se construiu uma ponte sobre o Rio da Costa e a população de fato começou a frequentar a praia. Somente após a década de 60, com a chegada de grandes projetos industriais no estado concomitante às políticas de erradicação de cafezais no campo (Siqueira, 2010), que a movimentação de imigrantes consequente para as cidades promoveu o desenvolvimento de Vila Velha. Acreditando que haveria demanda, três loteamentos foram criados no MM: loteamento Santa Alice, loteamento Boechat e o loteamento Parque Monte do Moreno (SILVA, 2014), respectivamente criados em 1958, 1968 e 1969.

O loteamento Santa Alice não foi mencionado nos debates das audiências públicas e não surgem nos poucos registros sobre Vila Velha. Sabese que até 1978 poucas residências existiam na face sul (loteamento Boechat) e nenhuma residência estava presente na face norte (loteamento Parque Monte do Moreno) (VERACIDADE, 2015). Inclusive o bairro Praia da Costa, onde ele hoje se situa, era pouco ocupado, considerado como o bairro mais nobre do município desde que começou a ser ocupado (Goncalves, 2010). Após a década de 90, quando a construção da Terceira Ponte, ligação mais recente entre Vitória e Vila Velha, foi finalizada, o núcleo de produção imobiliária que se concentrava em Vitória venceu a barreira física da baía de Vitória e estendeu-se à Praia da Costa, aumentando a pressão da indústria da construção civil sobre o bairro (GONÇALVES, 2010) e, consequentemente o MM, resultando na ocupação descrita acima. Hoje, 50% de todos lançamentos imobiliários da Região Metropolitana da Grande Vitória estão em Vila Velha (SINDUSCON-ES, 2015), demonstrando a pressão do setor sobre o município. A urbanização intensa por todo município “ilhou” o MM através da pavimentação das vias circundantes e das construções com fins residenciais. Existem muitos lotes não ocupados, majoritariamente voltados para a Baía de Vitória, inclusive em Área de Marinha e, em quantidade muito maior, em APP. De acordo com o Censo 2010 do IBGE, contabiliza-se 274 domicílios, 55% deles são apartamentos e o restante casas; e 508 habitantes na região, cuja faixa etária média é de 21 a 49 anos e a renda média mensal varia entre 5 a 10 salários mínimos. As casas, luxuosas e não incomum com mais de um pavimento, predominam a medida que as habitações se afastam da base do morro para seu cume, enquanto os apartamentos, inversamente, são mais comuns na base da elevação ou em seu entorno, sendo que 57,6% dos domicílios são próprios e quitados e 26,1% são alugados. Dos ocupantes, 51,7% são mulheres e 48,3% são homens, com predominância de adultos na faixa etária de 21 a 49 anos, e, em média, habitam entre 2 a 4 pessoas por domicílio. Embora essa população seja atendida adequadamente por serviços de água e energia, a coleta de lixo é precária assim como o patrulhamento policial e a infraestrutura urbana, sendo estas duas as principais reclamações dos moradores.

As entrevistas com os moradores e ex-moradores evidenciaram que, quando as construções residenciais no lado setentrional, começaram a se expandir às margens da Baía e contornando o Morro, havia uma preocupação comum entre os interessados em ocupar essa região: diziam ser difícil conseguirem empregadas domésticas para trabalharem lá, uma vez que até hoje essa área não é servida pelo transporte público, o que demonstra uma ocupação promovida por uma classe social abastada, ao menos inicialmente. O transporte público atendendo todos os habitantes do Morro é inviável por questão de restritas vias. Ainda com relação a mobilidade, a pouca participação do poder público tornou alguns trechos de impossível movimentação para veículos de grande porte, havendo locais onde apenas um automóvel convencional pode trafegar por vez e com passagens de baixa visibilidade para os motoristas (figura 04). Não apenas comprometedora da mobilidade e causadora de riscos, essa ocupação desordenada condenou a possibilidade de implantação do passeio público nas ruas que produziu (figura 05) como os trechos nas ruas Magnólia Aguiar e Fernando Monteiro Lindenberg, que contornam o Morro e estendemse pela face Norte.

Figura 04 - Curva com baixa visibilidade em via estreita. Figura 05 - Via estreita. Logo após a curva da figura 04, a via estreita impede o trafego de dois carros paralelos e a implantação do passeio público.

A face Norte do MM possui um extenso loteamento aprovado, mas em irregularidade com a legislação brasileira atual e passada, compreende os lotes à beira mar, mesmo em terrenos acidentados, e outros até quase o cume do morro, em áreas íngremes e com risco de escorregamento (ENVIRONLINK, 2012). A face Sul, dotada de maior cobertura vegetal, possui um número menor de habitações ligadas ao bairro Praia da Costa, que por sua vez também avançam em direção a vegetação, contudo em um ritmo mais lento, muito devido ao terreno ser mais íngreme e por não existir um loteamento extenso

neste lado da elevação. Todavia, este avanço não é menos preocupante. Os moradores dos edifícios voltados para o Morro (dotados de boa visão da paisagem)

entrevistados

informaram

que,

nos

últimos

anos,

alguns

proprietários das residências localizadas na base do Morro começaram a “empurrar suas cercas morro adentro”, aumentando os seus quintais e suprimindo a vegetação. Há, ainda, nesta face uma ocupação irregular crescente,

exatamente

onde

a

vegetação

apresenta

maior

grau

de

amadurecimento, composta de um pequeno conjunto de casas e até mesmo um curral com uma vaca dissimulados entre as árvores. A supressão da vegetação causada pela especulação imobiliária não é a única razão da degradação da área, embora o consenso entre os atores em prol da preservação do Morro a considerarem mais maléfica. Esta, ainda, promove o surgimento de pontos viciados de lixo observados, encontrados facilmente, focos de incêndio além de alterar o soalho. De acordo com o relatorio da Environlink (2012), a movimentação do solo executada para instalação de moradias, através de cortes e aterros, e a impermeabilização decorrente dos terrenos e vias em áreas íngremes, alteram a hidrodinâmica das águas das chuvas, afetando, também, cinco nascentes presentes na face setentrional (duas intermitentes e três perenes). Além disso, promove pequenos deslizamentos de terra, podendo, por fim, favorecer a ocorrência de desastres envolvendo, possivelmente, até as moradias. Muitas dessas nascentes encontram-se muradas e foram privatizadas, exclusivas para o uso dos proprietários dos terrenos onde elas afloram, não sendo possível afirmar o destino da água. Tanto em entrevistas quanto na audiência pública foi citado que algumas casas possuem fossas, contribuindo para a saturação hídrica permanente do solo e o risco de escorregamentos, enquanto outras despejam o esgoto diretamente no oceano. Não há estudo fidedigno quanto à qualidade do solo e observando as rápidas e profundas alterações ocorridas com a omissão do poder público, é possível imaginar que o risco de acidentes aumenta à medida que a urbanização acontece. As atividades esportivas somam-se aos demais fatores degradadores do ambiente e facilitadores de acidentes dos praticantes, sendo negativas para a conservação do MM da forma que ocorrem hoje, por não haver organização ou acompanhamento das mesmas. Existem três caminhos principais de acesso ao

cume: na face Sul, uma trilha sob a vegetação e uma estrada passível de ser percorrida por veículos; e uma trilha bifurcada existente na face Norte que acompanha parte das vias do loteamento desta face (fig. 2). Esta é menos frequentada, pois a arborização escassa e a macega tornam o caminho pouco atraente, sendo que muitos moradores das partes mais altas deixam seus cães soltos, talvez pelo isolamento, o que restringe o acesso do público à área. Contudo, são encontradas modificações de certos trechos dela – como formação de pequenas rampas e elevação de suas margens – para a prática de ciclismo downhill, favorecendo a erosão e o risco de colisões. As vias de acesso na face Sul são muito mais frequentadas. A trilha existente no interior da mata foi criada possivelmente há algumas décadas e perdura sem nenhuma manutenção fora a destruição da vegetação que tenta ocupar o caminho, promovida por quem por lá eventualmente passa. Os relatos colhidos apontam que o excesso de transeuntes erodiu o solo, principalmente nos últimos 15 anos, alterando levemente o percurso e aflorando pequenas rochas instáveis, que, por vezes, se depreendem ao serem pisadas ocasionando quedas e lesões aos usuários. A movimentação de pessoas introduziu capim-colonião (Panicum maximum) debaixo da mata e promoveu pequenas aberturas de clareiras onde se formaram capinzais que impedem o retorno das plantas nativas e favorecem a incandescência da vegetação. Essa gramínea invasora margeia as outras vias citadas, competindo com as espécies nativas e subtraindo a beleza dos caminhos. A estrada é o mais acessível e movimentado dos trajetos. Os carros que a

percorrem

usualmente

transportam

asas-deltas

e

parapentes.

Os

motociclistas que frequentam o local o fazem com intuito da prática do motocross, esporte altamente prejudicial ao solo, fato agravado pelo hábito de certos praticantes de alterarem propositalmente a estrada ou abrir pequenas trilhas para proporcionar terrenos mais acidentados, semelhante aos ciclistas, porém com um impacto muito maior. As modificações desfazem-se rapidamente após poucas passagens das motocicletas em alta velocidade, não apenas causando a perda desse solo modificado, conjuntamente as depressões abertas pela pressão dos pneus permite que as chuvas as corroam e, ocasionalmente, criem aberturas de tamanho significativo no chão, dificultando a subida dos pedestres.

A ocorrência de atos classificados pela lei como atividades criminosas é atribuída à pouca presença do poder público. O MM é considerado uma zona livre para o uso de drogas, atraindo usuários de diversos locais, os quais podem ser encontrados diariamente por lá de acordo com entrevistados e observações locais. Praticantes de esportes no local citaram o contato até mesmo com pessoas visivelmente alteradas descendo os paredões de pedras. O desordenamento somado as outras características locais descritas fizeram com que o outrora pacato “Moreno” se tornasse palco de atos violentos, parte dos altos índices de criminalidade de Vila Velha (HANTEQUESTE; BARRETO; LIRA, 2008). Esses eventos violentos geraram desgaste político e forçaram a prefeitura a mobilizar agentes da guarda municipal para a realização de patrulhas recorrentes. A impossibilidade de postergação do ordenamento no MM desencadeou o processo de implantação da unidade de conservação. Em vista disso, os problemas a serem sanados se somaram aos diferentes interesses em relação a preservação do ambiente silvestre, divididos sobretudo entre os que querem a unidade de conservação e aqueles que a repudiam; ou o grupo que a deseja em uma categoria mais rígida, ao ponto de promover a desapropriação das casas em áreas irregulares, em contrapartida do que movimenta-se para tornala mais flexível possível, de modo a apenas legitimar as benfeitorias instaladas e não atrapalhar a especulação imobiliária no local. Em audiência pública, observou-se que o poder público assumiu a existência de casas em áreas indevidas, afirmando não possuir recursos para promover as desapropriações. Porém isso não o impede de cobrar impostos das mesmas durante décadas como se fossem regularizadas. A expropriação, por sua vez, não encontra impedimento apenas na suposta ausência de recursos, afinal, certas casas da área norte abrigam membros própria prefeitura ou de correligionários de associações e camarilhas que a influenciam, ainda integrantes do judiciário capixaba, inclusive promotor, tornando qualquer tentativa de retira-las, o início de um possível embate entre agentes políticos de grande influência no município. Assim, prossegue a situação do conflito na arena pública e, caso não ocorra mudança nas forças em curso, pode ocorrer maior perda de qualidade ambiental e, ainda, maior privação de acesso a um bem comum pela população.

Morro do Moreno como Arena em disputa A arena em questão se concentra na área onde se situam as residências construídas em área de preservação permanente e à beira da baía, e, principalmente, nas tentativas de se ocupar todo lado Norte da elevação. Em audiência pública, a maioria dos moradores e proprietários de terrenos no MM se posicionam contra a UC com receio de perda de direitos. Alguns proprietários de terrenos não intencionam morar no local, optando pela especulação imobiliária, pois o metro quadrado de seu entorno é altamente valorizado (SINDUSCON-ES, 2015) e o lugar permite cobiçada visão da baía e da cidade de Vitória.

Por outro lado, nas entrevistas, ambientalistas e

membros da sociedade civil organizada denunciam os danos ambientais causados pelos ocupantes do MM. Essas denúncias provocaram o Ministério Público Estadual e Federal ao ponto de demandar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para regularização das infrações e o impedimento de liberação de licenças para ocupação, lógico que sem antes a averiguação de todas as secretárias da PMVV, inclusive a de meio ambiente (MPF, 2010). A PMVV, hoje, ignora o TAC do Ministério Público liberando alvarás e licenças para ocupação dos lotes e algumas construções embargadas judicialmente desconsideram os bloqueios legais, progredindo suas obras tal como apontou a Environlink em seu relatório (2012). O entendimento da prefeitura sobre a urbanização do MM, por vezes, se alterou, no tempo, em função das mudanças de governo, estando aí, provavelmente, a razão de todo conflito. Afinal, em um momento, ela não se posiciona quanto a ocupação ocorrida ou libera licenças para ocupação do solo; e, em outro, ela mesma propõe, em Plano Diretor, a limitação da ocupação do morro por ser ele considerado “...monumentos naturais de interesse de preservação, todas as áreas delimitadas pelas Zonas de Especial Interesse Ambiental (ZEIA) do Município” (Lei 4575/2007 – Art. 350). Este entendimento foi alterado posteriormente em 20135 (Lei nº 5.430/2013), garantindo, portanto, a permanência de infraestrutura apenas onde já exista construções e lotes licenciados, não permitindo a expansão de novas casas. 5

Que diz o seguinte: “Parágrafo único. Excluem-se desta identificação, as quadras do loteamento “Monte Moreno”, aprovado pelo Poder Público Municipal, onde já existem edificações já construídas ou licenciadas. Parágrafo Promulgado pela Câmara Municipal de Vila Velha. (Redação dada pela Lei nº 5.430/2013).

No ano de 1969, a Família Aguiar, proprietária de parte do MM, requereu à prefeitura um loteamento em suas terras, concebido através do Decreto Municipal n°. 187/69 e nomeado de Parque Monte do Moreno. Totaliza cerca de 220.000 m2, equivalente a 37,88% da área do monte, segundo antiga mensuração da PMVV, ou 30,10%, conforme mensuração da empresa Environlink. Aprovado depois do código florestal da época (1965) e afetado por regras seguintes, a prefeitura ignorou o arcabouço legal e iniciou a arrecadação de IPTU, segundo se observou em audiência pública, lentamente levando serviços públicos ao local. Os lotes seguiram décadas sem ocupação.

Figura 06 - Loteamento Boechat (azul) e Loteamento Parque Monte do Moreno (amarelo). Percebe-se que as áreas mais desmatadas da elevação, visíveis na figura 02, equivalem a área do Parque Monte do Moreno. Fonte: Environlink (adaptado).

Em dois meios6, é possível se encontrar justificativas em defesa do Parque Monte Moreno onde se afirmam que o loteamento foi realizado em área de “vegetação rarefeita” (MORRO DO MORENO, 2011). Vale lembrar que esta é uma área sob influência do bioma Mata Atlântica e que a vegetação rarefeita no local é, bem provavelmente, devido ações humanas. Cabe reconsiderar que este é local de terra fértil, dotada de nascentes, numa região de alto índice pluviométrico, com fragmentos florestais próximos (tanto a sua face Sul como o Morro do Convento da Penha). Além disto, observa-se no local (face Norte) a presença de algumas árvores, ou seja, vegetação que, se não perturbada, regenerar-se-á naturalmente. Uma foto postada no site da Folha Vitória, de 2013, (figura 07), mostra a Mata Atlântica em estágio de regeneração, com foco de incêndio. Esta foto reforça a afirmação de certos entrevistados que dizem haver o uso de fogo na área – prática esta que dificultam as árvores se

6

Tanto o site do Morro do Moreno quanto na “Cartilha do Loteamento Parque Monte Moreno” (2003) da Associação de Moradores e Amigos do Morro do Moreno – AMAMOR (divulgada naquele site).

desenvolverem. Seria o uso da expressão vegetação rarefeita uma forma de amenizar o impacto daquele empreendimento?

Figura 07 e 8 - Incêndio na área do Parque Monte do Moreno (2013). À direita da foto percebese uma área cinza, desmatada, fruto, provavelmente, de um incendio mais antigo, separado do local onde o fogo ocorreu em 2013 por vegetação sadia (link da reportagem:

http://www.folhavitoria.com.br/geral/noticia/2013/08/incendio-de-grandes-proporcoes-nomorro-do-moreno-conta-com-apoio-ate-de-helicoptero-da-pm.html).

As figuras 7 e 8, também, mostram a inclinação acentuada de certas áreas que poderiam estar dentro do referido loteamento. Inclusive, segundo a ENVIRONLINK (2012) a declividade é imprópria para o trânsito de veículos em determinados trechos, mostrando a possível construção de uma situação de risco quando da tentativa de ocupação privada da área. Embora a Lei Federal n°. 6766/79, reguladora do parcelamento do solo, tenha surgido após a aprovação dos loteamentos, ela determinou que todos os loteamentos consagrados antes da sua sanção fossem adequados à mesma, determinando, ainda, que caso não fossem implantados no prazo de dois anos, o decreto de aprovação da repartição do solo seria invalidado. Ambos loteamentos não se adequando a lei e nem tampouco implantados dentro do prazo, perderam, automaticamente, a juridicidade, segundo a citada lei federal. Sendo assim, os loteamentos não poderiam ter sido revalidados da forma que foram, mesmo havendo todo um processo complexo de licenças liberadas pela PMVV, desencadeando todo conflito. Assim, tanto Lei Federal n°. 4771/65 (Código Florestal) como a Lei Federal n°. 6766/79 impediriam a fragmentação do solo da forma que os loteamentos intencionam. O antigo código florestal, em seu segundo artigo, definia que APP era aquela “coberta ou não por vegetação nativa, com função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. Esta definição mostra que o

loteamento Parque Monte do Moreno, naquela época, nunca poderia ter sido aprovado da forma que foi, inclusive parte do Loteamento Boechat, por conta das cotas altimétricas segundo exposto pela Environlink nas audiências públicas e em seu relatório final. Até mesmo o atual Código Florestal parece não justificar o dito loteamento da forma pela qual ele foi pensado inicialmente (Brasil, 20127). A lei de parcelamento dos solos (de 1979), além de fortalecer a preservação ecológica, impunha, no seu terceiro artigo, a proibição de parcelamento do solo em declividade igual ou superior a 30% e em terrenos onde as condições geológicas não favorecessem a edificação. Segue o mapeamento da elevação, em 1996, quando a PMVV atendia essas normas:

Figura 08 - Loteamento Boechat (à esquerda acima em amarelo) e loteamento Parque Monte do Moreno (à direita abaixo em azul e amarelo) de acordo com o Decreto 202/96. Fonte: PMVV. Ano: 2001. Digitalização: Arquiteto Fábio Pacheco.

O Diagnóstico Ambiental do MM para implantação de unidade de conservação produzido pela Environlink (2012) reconheceu as peculiaridades locais e indicou a implantação de um Parque Natural, que, de acordo com o SNUC (Brasil, 2000), integra a categoria de proteção integral, não permitindo a propriedade privada em seu interior, logo, exigindo a retirada das benfeitorias em prol da preservação do ecossistema e da beleza cênica, do patrimônio cultural e histórico, permitindo atividades recreativas em seu interior. A opção feita por esta categoria se justificaria pela segurança dos próprios ocupantes do morro, por estarem em áreas sujeitas a movimento de massa de acordo com os estudos realizados para o diagnóstico acima. Entretanto, a PMVV, Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do município, deu sinais de descontentamento, na audiência pública, com este resultado, dizendo que a prefeitura poderia optar por uma Área de Proteção Ambiental (APA).

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Lei 12.651, 25/05/2012.

Esse posicionamento provocou comoção por parte da sociedade civil organizada e, também, por alguns técnicos que participaram da formulação do diagnóstico da Environlink. A categoria APA é mais tolerante, permitindo perturbações nos ecossistemas e a ocupação dentro de seus limites, dispensando as desapropriações, e foca na utilização racional dos recursos naturais e na preservação da beleza cênica. Esta opção permite aumento da ocupação no Morro, o que poderia evitar o conflito entre os atuais membros da prefeitura e os agentes políticos influentes presentes no local. Visto o pronunciamento do seu porta-voz e a maneira como a PMVV desrespeita o TAC imposto pelo Ministério Público, ela parece demonstrar algum interesse na continuidade da ocupação. Por fim, assim prossegue o conflito e todas as ações relativas a ocupação, provavelmente, serão julgadas pelo Tribunal de Justiça, que decidirá o destino das ocupações.

Considerações finais O objetivo desta comunicação foi o fazer um retrato da arena pública que se instalou na área do Morro do Moreno (Vila Velha, ES, Brasil) no decorrer das últimas décadas. Este retrato - pode-se dizer efêmero - foi possível com base em observações de campo, em mapeamento sobre a área de registros digitais ou não e em informações levantadas através de entrevistas feitas com diversos atores envolvidos nesta arena. Como panorama de fundo está a busca pela compreensão de como as vulnerabilidades socioambientais são construídas no espaço urbano da Modernidade. Como foi visto, vários são os atores envolvidos na publicização de questões referentes ao papel do Morro do Moreno para a sociedade de Vila Velha. Se de um lado, o Estado pareceu estar entre a preservação ou conservação deste monumento natural (segundo a Lei 4575/2007, Prefeitura Municipal de Vila Velha) e a exclusão das quadras do loteamento “Monte Moreno” deste objetivo de preservação (de acordo com a Lei nº 5.430/2013, promulgada pela Câmara Municipal de Vila Velha); de outro, vemos pelo menos dois outros atores: os proprietários de terrenos na área que se percebem tendo o “direito” ao local por conta da aquisição dos mesmos e constrangidos pela legislação ambiental; e movimentos diversos tais como os ambientalistas, os desportistas entre outros usuários da área que lutam em prol

da preservação do morro e o seu livre acesso enquanto bem comum da população em geral. Este retrato desta arena pública desvela um jogo de interesses entre atores com um poder que, aparentemente, suplantaria os interesses da população canela-verde de um uso comum daquele monumento natural. À título de consideração final e com base nos dados e informações levantados durante a pesquisa, pelo menos uma reflexão pode ser feita conjugando o processo histórico de urbanização e a implantação de políticas públicas (ou as suas ausências) ambiental e/ou de planejamento urbano que estão na base da arena pública em questão. Cabe lembrar que o planejamento urbano é uma estratégia do Estado, agente na Modernidade responsável pela regulação social, que, de acordo com Ward (2013) surge, no século XIX, com o intuito de ordenar o espaço urbano; e que, ainda segundo este autor, no pós 2°Guerra Mundial, é colocado em prática como “... uma terrível simplificação do processo histórico de deterioração e renovação urbanos, como se a intenção fosse desmentir que nossas cidades tivessem passado.” (pág. 115). O que o ordenamento urbano parece propor, na visão deste autor, é “...um quadro fundamental de uma civilização ordenada ... que acaba por ser uma outra maneira dos ricos e poderosos oprimirem ou acossarem os fracos e os pobres.” (pag. 116). O processo de governança que se instala na área estudada tem este quadro de fundo a ser considerado, onde destaca-se o Estado atuando como agente regulador de uma ordem social, aparentemente, incapaz de dar uma resposta a um problema que, pelo retrato feito, se revela complexo na sua apreensão em busca de uma possível solução.

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