Consumo de bens duráveis e poupança em uma nova trajetória de comportamento do consumidor brasileiro

May 28, 2017 | Autor: Viviane Bittencourt | Categoria: Savings, Dissertation
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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA MESTRADO EM FINANÇAS E ECONOMIA EMPRESARIAL

CONSUMO DE BENS DURÁVEIS E POUPANÇA EM UMA NOVA TRAJETÓRIA DE COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR BRASILEIRO

VIVIANE SEDA BITTENCOURT

RIO DE JANEIRO 2011

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VIVIANE SEDA BITTENCOURT

CONSUMO DE BENS DURÁVEIS E POUPANÇA EM UMA NOVA TRAJETÓRIA DE COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR BRASILEIRO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Finanças e Economia Empresarial.

ORIENTADOR: PROF. DR. ANDREI GOMES SIMONASSI

RIO DE JANEIRO 2011

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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Mario Henrique Simonsen/FGV

Bittencourt, Viviane Seda Consumo de bens duráveis e poupança em uma nova trajetória de comportamento do consumidor brasileiro / Viviane Seda Bittencourt. – 2011. 52 f. Dissertação (mestrado) - Fundação Getulio Vargas, Escola de PósGraduação em Economia. Orientador: Andrei Gomes Simonassi. Inclui bibliografia. 1. Bens de consumo duráveis. 2. Poupança. 3. Comportamento do consumidor. I. Simonassi, Andrei Gomes. II. Fundação Getulio Vargas. Escola de Pós- Graduação em Economia. III. Título. CDD – 658.834

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VIVIANE SEDA BITTENCOURT

CONSUMO DE BENS DURÁVEIS E POUPANÇA EM UMA NOVA TRAJETÓRIA DE COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR BRASILEIRO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Escola de Pós-Graduação em Economia da Fundação Getulio Vargas como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Finanças e Economia

Empresarial.

27/05/2011. Avaliação: BANCA EXAMINADORA: _____________________________________________________ PROF. DR. ANDREI GOMES SIMONASSI (Orientador) Instituição: CAEN-UFC/CE

_____________________________________________________ PROF. PhD. PEDRO CAVALCANTI FERREIRA Instituição: EPGE-FGV/RJ

_____________________________________________________ PROF. DR. MAURÍCIO CANEDO Instituição: IBRE-FGV/RJ Rio de Janeiro, 27 de maio de 2011.

Aprovada

em

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AGRADECIMENTOS À minha família, em especial aos meus pais Luiz e Vilma, que sempre foram meu orgulho e a base de tudo o que sou hoje, agradeço por me dar apoio emocional, compreensão e motivação para seguir em frente e não desistir diante dos obstáculos. À Douglas, por todo amor e compreensão durante essa caminhada juntos. Aos meus filhos Caio e Letícia que com seu amor, carinho e paciência fazem os meus dias mais alegres e me motivam a ser cada dia melhor. Ao meu orientador, Andrei pelo incentivo, motivação e pelo conhecimento transmitido ao longo desse trabalho. Ao IBRE, pela oportunidade, aprendizado e apoio financeiro ao longo do curso. A todos os amigos que contribuíram cada um com o que melhor tem dentro de si. E finalmente agradeço a Deus e aos espíritos de luz que me protegem durante todas as etapas da minha vida.

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RESUMO O trabalho avalia a dinâmica descrita pelo consumo de bens duráveis e poupança dos consumidores brasileiros entre setembro de 2005 e abril de 2011 e contribui com a literatura ao utilizar como ferramenta de análise um modelo autoregressivo com valor limite endógeno e dados qualitativos da pesquisa Sondagem de Expectativas do Consumidor Brasileiro, da FGV. Indicadores qualitativos para essas duas variáveis foram calculados e a metodologia proposta permitiu investigar, simultaneamente, a linearidade e estacionaridade de suas trajetórias. Os resultados sugerem, em ambos os casos, uma dinâmica não-linear com raiz unitária parcial. Adicionalmente, a estacionaridade constatada a partir de um valor limite estimado de 3,3 pontos percentuais para o Indicador de Compras de Bens Duráveis e de 3,6 pontos percentuais para o Indicador de Poupança permitem classificar seus históricos com indícios de saturação da capacidade de poupança e consumo dos indivíduos.

Palavras-Chave: Consumo de Bens Duráveis; Poupança; Valor Limite Endógeno.

ABSTRACT This paper evaluates the dynamics described by the Brazilian consumer’s savings and consumption of durables between September 2005 and April 2011, and contributes to the literature applying qualitative data from FGV Consumer Survey to an endogenous threshold autoregressive model. Qualitative indicators for these two variables were developed and the methodology allowed us to investigate, simultaneously, the stationarity and linearity of their behaviors. The results suggest a non-linear dynamic with partial unit root for these two indicators. In addition, the stationarity observed from an estimated threshold of 3.3 bp for the indicator of purchases of durables and 3.6 bp to the indicator of savings show evidences of saturation of savings and consumption individual capacities.

Keywords: Consumption of Durables; Savings; Endogenous Threshold.

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LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - ICC e PIB pela ótica do consumo das famílias ...................................................... 16 Gráfico 2- Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (Sondagem do ConsumidorFGV) e Índice de Volume de Vendas de Bens Duráveis (PMC-IBGE) - Média Móvel Trimestral ................................................................................................................................. 18 Gráfico 3- Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (FGV) e Taxa de Inadimplência Pessoa Física (BACEN).................................................................................... 19 Gráfico 4 - Endividamento das Famílias (Sondagem do Consumidor FGV) e Taxa de Inadimplência (BACEN) – Média Móvel Trimestral ............................................................... 21 Gráfico 5 – Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis com ajuste sazonal (Série padrão e diferenciada) .............................................................................................................. 33 Gráfico 6 – Indicador de Poupança sem ajuste sazonal (Série padrão e diferenciada) ............ 33 Gráfico 7 – Resultados para os Testes de Causalidade de Granger.......................................... 35 Gráfico 8- Regime 1 e Regime 2 da Capacidade de Poupança ................................................ 41 Gráfico 9- Regime 1 e Regime 2 da Capacidade de Consumo de Bens Duráveis ................... 45

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LISTA DE TABELAS Tabela 1: Análise de Correlação ............................................................................................... 34 Tabela 2: Resultados do Modelo Irrestrito e Teste de Linearidade do Indicador de Poupança39 Tabela 3: Testes de Raiz Unitária para os dois Regimes do Indicador de Poupança ............... 40 Tabela 4: Observações sobre o Regime 2 da Capacidade de Poupança ................................... 42 Tabela 5: Resultados do Modelo Irrestrito e Teste de Linearidade do Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis....................................................................................................... 43 Tabela 6: Testes de Raiz Unitária para os dois Regimes do Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis ...................................................................................................................... 44 Tabela 7: Observações sobre o Regime 2 da Capacidade de Consumo de Bens Duráveis ...... 45 Tabela 8: Correlograma da Indicador de Compras de Bens Duráveis ..................................... 51 Tabela 9: Correlograma da Indicador de Poupança.................................................................. 51 Tabela 10: Teste de Raiz Unitária (Dickey –Fuller) para a série do Indicador de Compras de Bens Duráveis ........................................................................................................................... 52 Tabela 11: Teste de Raiz Unitária (Dickey –Fuller) para a série do Indicador de Poupança ... 52 Tabela 12: Teste de Causalidade de Granger (1 lag defasagem) .............................................. 53

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LISTA DE ABREVIATURAS

IBGE

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

BACEN

Banco Central do Brasil

IBRE/FGV

Instituto Brasileiro de Economia – Fundação Getúlio Vargas

CPS/FGV

Centro de Políticas Sociais – Fundação Getulio Vargas

PMC

Pesquisa Mensal do Comércio

MQO

Mínimos Quadrados Ordinários

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SUMÁRIO 1.

INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 11

2. A SONDAGEM DE EXPECTATIVAS DO CONSUMIDOR, SEUS QUESITOS QUALITATIVOS E SUAS RELAÇÕES COM VARIÁVEIS MACROECONÔMICAS ... 14 2.1 SOBRE PESQUISAS QUALITATIVAS E A SONDAGEM DO CONSUMIDOR ...... 14 2.2 SOBRE O CONSUMO DE BENS DURÁVEIS ............................................................. 17 2.3 POUPANÇA E ENDIVIDAMENTO DAS FAMÍLIAS................................................. 21 3.

LITERATURA RELACIONADA AO TEMA .............................................................. 23

3.1 TEORIA DO COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR .......................................... 23 3.2 PSICOLOGIA ECONÔMICA ...................................................................................... 25 3.3 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS NA LITERATURA......................................................... 27 4.

ASPECTOS METODOLÓGICOS ................................................................................ 31

4.1 BASE DE DADOS ........................................................................................................ 31 4.2 EXERCÍCIOS PRELIMINARES .................................................................................. 31 4.3.1

INVESTIGANDO A DINÂMICA DAS VARIÁVEIS SELECIONADAS ........... 37

4.3.2 TESTANDO A HIPÓTESE DE RAIZ UNITÁRIA EM MODELOS NÃOLINEARES ........................................................................................................................... 38 5.1 RESULTADOS PARA A CAPACIDADE DE POUPANÇA ....................................... 39 5.2 PARA A CAPACIDADE DE COMPRA DE BENS DURÁVEIS ................................ 43 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 47 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 48 ANEXO I .............................................................................................................................. 50 ANEXO II ............................................................................................................................. 51

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1. INTRODUÇÃO

As Sondagens são pesquisas qualitativas que representam a forma majoritária de monitoramento das intenções dos consumidores e empresários nos Estados Unidos e na Europa. A partir das respostas obtidas neste tipo de pesquisa são comumente construídos indicadores que traduzem, inclusive, sentimento dos indivíduos em relação aos determinantes da produção e do consumo. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Economia (IBRE) é pioneiro e desde 2005 realiza a Sondagem do Consumidor, cujas divulgações sistemáticas têm adquirido um papel cada vez mais importante entre os economistas e formuladores de política, por fornecer informações com maior tempestividade e que permitem antecipar as tendências dos agregados econômicos oficiais. Com a finalidade de sintetizar o resultado de cada pesquisa são desenvolvidos os denominados Indicadores de Confiança. Tais indicadores são variáveis endógenas e reflexos das condições macroeconômicas, mas possuem ainda a vantagem quantificar fatores psicológicos que não são captados por variáveis econômicas. A aplicação de tais fatores aos modelos econômicos e estatísticos contribui no sentido de enriquecer a análise de qualquer fenômeno econômico sem negligenciar aspectos como o otimismo, seja pelo lado da demanda ou da oferta. Há uma crescente literatura que, por exemplo, estuda a relação entre a confiança do consumidor e gastos das famílias. Nesse debate, Katona (1975) enfatiza que o sentimento é particularmente útil, uma vez que o gasto familiar não depende apenas da “capacidade”, mas também da “disponibilidade” para comprar. No Brasil, país ainda com grande nível de desigualdade, a heterogeneidade de comportamentos de consumo presentes no Modelo de Campbell e Mankiw (1989) pode ser relevante na explicação das séries agregadas de consumo brasileiro. Desta forma, a identificação de mudanças no padrão de consumo e poupança se tornam extremamente relevantes. A estabilidade e crescimento da economia brasileira nos últimos anos sustentaram o crescimento de uma nova classe média. Segundo Neri (2010), entre 2003 e 2009, 29 milhões de brasileiros ingressaram na classe C (famílias com renda mensal entre R$ 1.064,00 e R$ 4.561,00), influência de um crescimento robusto do emprego formal e aumento da renda

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concentrando 46,24% do poder de compra brasileiro em 2009, superando inclusive o poder de compra das classes A e B (44,12%). Aliada a esse cenário, a maior oferta de crédito ocorrida nos últimos anos alterou o perfil de consumo dessa nova classe média e expandiu o potencial de consumo dos consumidores das classes de renda mais baixas. A crise financeira internacional, iniciada em setembro de 2008 resultou em restrição do crédito durante os meses que se seguiram e incerteza dos consumidores com relação aos rumos da economia. Para estimular o consumo, o governo brasileiro adotou medidas de incentivos fiscais, com a redução de alíquotas de IPI, incentivando o consumo de bens duráveis principalmente veículos, material de construção e eletrodomésticos da “linha branca”. Neste período, a Sondagem de Expectativas do Consumidor mostrou que a intenção de compras de bens duráveis começou a reduzir-se a partir de agosto de 2010, mesmo com um cenário favorável em que o mercado de trabalho se manteve aquecido, inflação controlada, melhores condições econômicas e de crédito no país. A hipótese levantada neste estudo é exatamente a de que existem ciclos de consumo e poupança e, deste modo, os consumidores antecipariam consumo, esgotando sua capacidade em antecipar novos gastos e a condição necessária à realização de novas compras seria o reequilíbrio do orçamento familiar. O objetivo consiste então em investigar a possível existência de limites para consumo e poupança no Brasil, utilizando na investigação empírica as variáveis qualitativas da Sondagem de Expectativas do Consumidor da FGV, ao invés de dados agregados tradicionais para o consumo no país. A metodologia para condução do exercício empírico considera a proposta de Caner e Hansen (2001) para analisar a dinâmica dos indicadores para as Compras de Bens Duráveis e Poupança daquela pesquisa. Esta metodologia possui a vantagem de incorporar a possibilidade de mudanças de regime endógenas concomitante à análise do processo estocástico descrito por cada indicador. Assim sendo, além de identificar a estacionaridade, permite-se inferir acerca da existência de efeito limiar em cada indicador. Os resultados sugerem que a dinâmica descrita por cada indicador é não linear, de forma que apresentam reversão à média e raiz unitária global e em um regime, mas com a possibilidade de estacionaridade a partir de um limiar. A combinação dos resultados sugere ainda a saturação das capacidades de consumo de bens duráveis e de poupança, principalmente em períodos de elevada instabilidade econômica.

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O presente trabalho está organizado da seguinte forma. A seção 2 apresenta uma breve descrição da Sondagem de Expectativas do Consumidor, seus indicadores e suas relações com varáveis macroeconômicas. Na seção 3, apresenta uma revisão de literatura sobre teoria do comportamento do consumidor, psicologia econômica e evidência empírica. Na seção 4 apresenta os dados, exercícios preliminares, o modelo econométrico e discute as hipóteses a serem testadas. Na seção 5, os resultados empíricos são apresentados e discutidos e finalmente apresentamos as conclusões e considerações finais.

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2. A SONDAGEM DE EXPECTATIVAS DO CONSUMIDOR, SEUS QUESITOS QUALITATIVOS E SUAS RELAÇÕES COM VARIÁVEIS MACROECONÔMICAS

2.1

SOBRE

PESQUISAS

QUALITATIVAS

E

A

SONDAGEM

DO

CONSUMIDOR

Essa seção discute a importância das pesquisas qualitativas, instrumento de importância e confiabilidade reconhecidas nos países desenvolvidos, no sentido de prover informações sobre os agregados econômicos e as estatísticas oficiais com maior tempestividade. A imprecisão de informações passadas para economia, como a brasileira, nos leva a crer cada vez mais que pesquisas do tipo qualitativas são de fundamental importância haja vista a maior velocidade e contemporaneidade das informações obtidas. Enquanto as estatísticas quantitativas tradicionais como as de produção e emprego são conhecidas com defasagem entre 30 a 60 dias em relação ao fato ocorrido, as sondagens fornecem sinalizações de tendência acuradas para um horizonte de três a seis meses à frente ainda durante o mês de realização da pesquisa. A combinação de qualidades como tempestividade e capacidade de antecipação fizeram com que as sondagens de tendência setorial e do consumidor, a partir da década de 90, passassem a compor o sistema de estatísticas básicas requeridas pela Comunidade Européia aos países-membros. Em países de economia sólida e estável tais pesquisas têm credibilidade reconhecida, cite-se, por exemplo, o impacto dos indicadores do Conference Board (TCB), Instituto IFO e as pesquisas harmonizadas na comunidade européia pela OCDE sobre a economia de seus respectivos países. No Brasil, estudos envolvendo informações de pesquisas qualitativas aplicadas são recentes e escassos, assim como as fontes que provêem informação rica e de qualidade. A literatura econômica nacional ainda conta com poucos estudos voltados para análise desses indicadores de confiança e seu o poder preditivo sobre variáveis macroeconômicas.

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O Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE/FGV) foi pioneiro neste tipo de pesquisa qualitativa com a Sondagem Industrial, implementada na década de 60, buscando caracterizar e antecipar tendências da atividade econômica no Brasil. Desde setembro de 2005 o IBRE apura mensalmente informações qualitativas determinantes sobre consumo, poupança, situação financeira das famílias, mercado de trabalho, expectativa de inflação, taxa de juros e situação econômica. A pesquisa é aplicada em sete das principais capitais do país, com amostra representativa da população e do percentual de consumo de cada capital com aproximadamente 2100 consumidores. O levantamento estatístico de natureza qualitativa possui estratificação por classes de renda familiar mensal, faixas etárias, níveis de escolaridade e gênero do responsável pela família. O monitoramento da confiança do consumidor tem por objetivo produzir indicações sobre as suas decisões de gastos e poupanças futuras. Estas, por sua vez, constituem-se em indicadores úteis na antecipação dos rumos de curto prazo da economia. Dentre os quesitos que utilizaremos em nossa análise referentes à pesquisa está o Indicador de Poupança e o Indicador que mede a Intenção de Compras de Bens Duráveis nos seis meses seguintes. Sua formulação é descrita abaixo: IndicadordePoupançat = 100 + RFt − RDt Onde; RFt é o percentual, medido pela freqüência relativa, de consumidores que estão poupando na comparação entre receitas e despesas da família; RDt é o percentual, medido pela freqüência relativa, dos consumidores que se julgam endividados. O Indicador que mede o ímpeto para comprar bens duráveis nos próximos seis meses é medido pela diferença entre o percentual dos consumidores com intenção de comprar mais, dos que julgam que os gastos serão menores nos seis meses seguintes em relação aos seis meses anteriores. IndicadordeIntençãodeComprasdeBensDuráveist +6 = 100 + RFt +6 − RDt +6

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RFt +6 é o percentual, medido pela freqüência relativa, de consumidores que pretendem comprar mais bens duráveis nos próximos seis meses; RDt +6 é o percentual, medido pela freqüência relativa, dos consumidores que projetam comprar menos bens duráveis nos próximos seis meses. Os quesitos fornecem indicadores com elevado poder de explicação em relação a variáveis macroeconômicas tradicionais, tais como desemprego, consumo das famílias e inadimplência. Esta capacidade é medida pela aderência dos indicadores qualitativos aos agregados macroeconômicos oficiais motivando a utilização destas variáveis em nossa análise. O indicador que mede o ímpeto para compra de bens duráveis é um quesito importante na evolução do Índice de Confiança do Consumidor que pode ser considerado como elemento fundamental na explicação e antecipação direta da evolução do nível de consumo e indiretamente da demanda agregada. Gráfico 1 - ICC e PIB pela ótica do consumo das famílias

10,0 Índice de Confiança do Consumidor

125,0 Consumo das famílias (PIB)

8,0

120,0 6,0 115,0 4,0 110,0 2,0 105,0 0,0 100,0 95,0

-2,0

90,0

-4,0

Consumo das famílias (PIB) - Sem ajuste sazonal Variação % sobre o mesmo trimestr do ano anterior

Índice de Confiança do Consumidor - Com ajuste sazonal Média Móvel Trimestral

130,0

Fonte: FGV/IBRE, elaborado pelo autor.

O Gráfico 1 revela uma forte relação entre as expectativas dos consumidores e o nível de atividade brasileira o que vem estimulando pesquisadores à validação de sua capacidade

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preditiva como proxy do consumo das famílias, que é responsável por quase 60% do PIB segundo a ótica da demanda. A análise da série do Índice de Confiança dos Consumidores com o PIB apresenta alta correlação (0.73) conforme pode ser observado no referido gráfico.

2.2 SOBRE O CONSUMO DE BENS DURÁVEIS

O consumo das famílias é item importante na economia brasileira, sendo, portanto a disposição para compras num horizonte temporal de seis meses fator relevante para decisões de políticas públicas. Esta subseção apresenta um breve histórico sobre as vendas de duráveis para mostrar a aderência da variável que mede a disposição de gastar dos consumidores com Indicador de Vendas de Duráveis extraídos da Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) produzida pelo IBGE. O crescimento da renda vem tornando a classe média o extrato social dominante no país. A expansão do crédito em razão de taxas de juros menores elevou o poder de compra dessa classe entre 2006 e março de 2008 (NERI, 2009), quando atingiu um dos maiores níveis observados de vendas de duráveis. A partir de julho de 2008, os reflexos da crise financeira internacional interromperam a trajetória ascendente do consumo. A partir de setembro de 2008, quando a crise atinge efetivamente o mercado brasileiro, restrições ao crédito e incerteza com relação aos rumos da economia são os principais entraves. No início de 2009, a expansão das vendas decorreu num primeiro momento apenas da recuperação de compras advindas de consumo represado pela falta de crédito e pela diminuição da confiança verificadas durante o quarto trimestre de 2008. A política fiscal expansionista adotada pelo governo através da isenção de IPI dos bens duráveis de “linha branca” teve impacto expressivo sobre as vendas do setor, um dos mais afetados pela crise financeira internacional. Uma parcela crescente das compras passou a ser atribuída à antecipação de consumo para aproveitamento de preços favoráveis ao longo de 2009, tendo em vista a expectativa de proximidade do final do período de isenções fiscais.

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Em fevereiro e março de 2010, os indicadores mais tempestivos de nível de atividade pareciam mostrar uma nova aceleração das vendas e produção, novamente influenciadas pela antecipação de consumo, face à expectativa de retirada dos benefícios remanescentes. A partir de abril de 2010, o IPI reduzido para duráveis foi mantido de forma restrita quase que exclusivamente a produtos que economizam energia ou são pouco poluentes. A expectativa, e posteriormente a retirada de alguns benefícios, provocaram uma primeira rodada de desaceleração de produção e de vendas de duráveis. O gráfico abaixo mostra a evolução do Indicador de Intenção de Compras de Bens Duráveis (Sondagem do Consumidor) e de Venda de Duráveis no Comércio (PMC Duráveis1, IBGE). A desaceleração de produção e vendas de duráveis durou apenas alguns meses. Gráfico 2- Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (Sondagem do ConsumidorFGV) e Índice de Volume de Vendas de Bens Duráveis (PMC-IBGE) - Média Móvel Trimestral

Fonte: FGV/IBRE, elaborado pelo autor.

A hipótese sugerida por alguns economistas para esse fator seria que a retirada gradual dos benefícios distribuiu ao longo do tempo o ajuste orçamentário das famílias. O consumidor brasileiro, relativamente conservador e pouco acostumado a gerenciar níveis de endividamento elevados, aproveitou a contínua melhora do mercado de trabalho e dos rendimentos para recuperar o equilíbrio orçamentário.

1

Indicador combinado de vendas de Veículos, Motos, partes e peças, móveis e eletroeletrônicos, elaborado pelo IBRE/FGV a partir de dados da Pesquisa Mensal do Comércio – PMC, do IBGE.

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Apesar da avaliação favorável do consumidor em relação ao ambiente econômico geral e ao mercado de trabalho, o indicador de ímpeto para compras de duráveis nos meses seguintes não retornou ao patamar verificado ao final de 2007 e início de 2008. Além das condições gerais de crédito, do custo do dinheiro e de crescimento econômico, este indicador vem apresentando um histórico de associação (negativa) com os níveis de inadimplência da pessoa física, conforme se observa no gráfico 5 abaixo em que comparamos a evolução recente da Taxa de Inadimplência de Pessoa Física (BACEN) e do Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (FGV). Gráfico 3- Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (FGV) e Taxa de Inadimplência Pessoa Física (BACEN)

105,0

9,0

100,0

95,0 8,0

90,0

7,5

85,0

80,0

7,0

75,0

Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis 70,0

6,5

Taxa de Inadimplência

Taxa de Inadimplência pessoa física (BACEN) - %

Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis (FGV)

8,5

6,0

65,0

60,0

5,5

Periodo: Set/06 a Abr/11

Fonte:

FGV/IBRE, elaborado pelo autor.

A evolução do Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis, expresso em pontos, no eixo da direita, teve seu melhor momento na virada entre 2007 e 2008, quando as condições de crédito eram favoráveis, a taxa de juros relativamente baixa, a economia crescia fortemente e a Taxa de Inadimplência pessoa física situava-se abaixo dos 7,2% médios do período pós 2003.

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A partir de março daquele ano, o ímpeto de compras começou a perder força, convergindo, para o patamar próximo ao de sua média histórica, em torno de 83 pontos, em agosto de 2008. Este primeiro movimento parecia estar mais relacionado às questões do próprio ciclo de endividamento das famílias do que com as expectativas relacionadas à economia, embora nas faixas de renda mais altas, a crise americana já influenciasse nas expectativas para os meses seguintes. Com a crise internacional e seu reflexo sobre as condições de crédito e o crescimento econômico, o indicador de compras continuou em queda até atingir 72,9 pontos em fevereiro de 2009, nível próximo ao recorde de baixa, registrado em setembro de 2005 (66,5 pontos). Paralelamente, a partir de junho de 2008, a Taxa de Inadimplência iniciou um movimento de alta até atingir 8,5% em maio de 2009, o maior nível registrado a partir de 2003. Com as medidas de isenção do IPI adotadas no primeiro trimestre de 2009, o ímpeto de compras ficou limitado pelo estado geral da economia e pelo nível de inadimplência elevado. A diminuição gradual da inadimplência pessoa física a partir de maio daquele ano não surtiu efeito sobre o ímpeto de compras naquele momento por dois motivos: i) o nível de inadimplência ainda era elevado; ii) a perspectiva do fim do período de IPI reduzido começava a impactar as projeções de compras pelos consumidores. O indicador de compras de duráveis voltou a apresentar tendência de alta gradual em março de 2010 combinando o quadro de inadimplência mais baixa e absorvidos os ajustes ao fim do IPI reduzido (ao menos no terreno das previsões para o horizonte de seis meses). O Gráfico 3 mostra que a inadimplência encontrava-se, em julho de 2010, em 6,5%, nível baixo em termos históricos, tendo ultrapassado, para baixo, a média histórica em fevereiro de 2010. O indicador de compras apresentou recuperação ao longo de 2010. A hipótese de que os indicadores pareciam apontar para um quadro semelhante ao de 20072008, com indicador de compras elevado e inadimplência baixa sendo possível induzir que naquele período o tempo de ajustes ao ciclo de endividamento do consumidor tinha se completado e que as vendas de duráveis retomariam gradualmente o ritmo anterior à crise de 2008.

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2.3 POUPANÇA E ENDIVIDAMENTO DAS FAMÍLIAS

A aderencia ilustrada graficamente entre a série de endividamento das famílias da Sondagem (percentual das famílias dizem estar se endividando) com a taxa de endividamento do Banco Central, que refere-se a inadimplência acima de 90 dias em relação ao total das operações de crédito com recursos livres. possui correlação entre as séries de 0.63 com uma defasagem de 6 meses. Evidencia-se dessa forma que a percepção dos consumidores sobre endividamento ocorre seis meses antes dela de fato se efetivar. Gráfico 4 - Endividamento das Famílias (Sondagem do Consumidor FGV) e Taxa de Inadimplência (BACEN) – Média Móvel Trimestral

9,0

27,0

8,5

Endividamento dos Consumidores Taxa de Inadimplência

25,0

8,0

mar/11

dez/10

set/10

jun/10

mar/10

dez/09

set/09

jun/09

mar/09

dez/08

set/08

jun/08

mar/08

5,5 dez/07

15,0 set/07

6,0

jun/07

17,0

mar/07

6,5

dez/06

19,0

set/06

7,0

jun/06

21,0

mar/06

7,5

dez/05

23,0

Taxa de Inadimplência -BACEN (%)

Endividameno dos Consumidores - FGV (%)

29,0

Periodo: Nov/05 a Abr/11 Fonte: FGV/IBRE, elaborado pelo autor.

Contudo, em 2011 o ambiente que se configura é uma combinação de confiança elevada com baixa disposição para compras de duráveis e aumento da inadimplência. Esta combinação sugere a possibilidade de ocorrência de um novo ciclo para estas componentes de consumo e poupança. A força e a duração dessas desacelerações têm sido difíceis de se prognosticar no Brasil em função das mudanças a que o mercado vem passando recentemente, com a inclusão de novas classes de renda, surgimento de novas modalidades de empréstimo e aumento dos prazos de financiamento. Assim sendo, este estudo se limiatará a analisar as dinâmicas do

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consumo de bens duráveis e de poupança dos indivíduos explicitando se há mudança de comportamento e se esta dinâmica é explosiva ou dá sinais de estagnação.

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3. LITERATURA RELACIONADA AO TEMA

3.1 TEORIA DO COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR

Esta seção faz uma breve análise da teoria do comportamento do consumidor e discute possíveis ligações com a confiança do consumidor. Dentro da literatura econômica, diferentes linhas de pensamento tem se concentrado na análise do comportamento do consumidor em relação a consumo e poupança. Dentre elas: •

A teoria Keynesiana do consumo em função da renda corrente;



A teoria do consumo e da renda permanente (teoria da escolha intertemporal);



A teoria do ciclo de vida do consumo e da poupança (teoria da escolha intertemporal). Keynes (1936) fez a primeira tentativa de descrever o comportamento do consumo e

da poupança baseado na renda familiar. De acordo com sua análise, a renda constitui o principal fator determinante do consumo agregado: quanto maior a renda, maior tende a ser o dispêndio das famílias. Dentre suas principais considerações era que a PMC (propensão marginal a consumir) apresenta comportamento decrescente com elevação da renda disponível e que juros não afeta o consumo. Kuznets (1940) testou empiricamente a hipótese keynesiana de que a propensão média a consumir fosse decrescente em relação à renda com uma série temporal do período de 1869 a 1938. Os resultados mostraram que a renda e o consumo possuem relações proporcionais diferentes em horizontes temporais onde, no longo prazo, a função consumo se comportaria diferentemente da análise keynesiana. O formato da função consumo com base em orçamentos familiares revela que, se a renda se eleva, o consumo também se eleva, mas a taxas decrescentes, já que há uma elevação da propensão a poupar nas classes mais elevadas de renda. Ou seja, a propensão média a consumir seria decrescente, dentro da hipótese keynesiana. Os resultados dos trabalhos empíricos motivaram uma série de novas explicações para o comportamento do consumo, grande parte das quais estão relacionadas à teoria da escolha intertemporal, a idéia de que os agentes privam-se de consumo presente em troca de consumo

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futuro. A hipótese da escolha intertemporal considera que os agentes econômicos tomam suas decisões de consumo e poupança com base nas expectativas de renda futura e na taxa de juros, ao contrário do que sugere a teoria Keynesiana, que considera que os agentes tomam suas decisões com base na renda corrente disponível. A decisão das famílias consiste não entre poupar ou tomar empréstimos, mas em resolver quando poupar e quando tomar empréstimos. Se as famílias poupam enquanto “jovens” (período 1), vão despoupar quando “idosas” (período 2), e, se despouparem quando jovens, vão poupar quando idosas. O acesso ao crédito é variável importante entre as decisões intertemporais de consumo, aumentando o bem estar da família. O uso do termo “renda permanente”, foi desenvolvido por Friedman (1957) sendo definida como o valor presente da riqueza, no sentido de renda média que a família espera num prazo longo ou horizonte estimado de vida, no modelo a família tende a nivelar o consumo mantendo um padrão estável ao longo do tempo. Nesse modelo de dois períodos, uma das principais implicações é que o consumo familiar deve depender não só da renda atual, mas também da renda esperada no futuro, para se proteger contra as flutuações na renda corrente. Além disso, choques temporários, permanentes ou futuros antecipados apresentam efeitos diferentes sobre a sua dinâmica. Friedman denominou como “expectativas adaptativas”, o mecanismo onde os agentes econômicos reajustam (“adaptam”) suas estimativas de renda permanente em cada período, tomando por base as estimativas anteriores e das mudanças reais que ocorrem na produção. Para as décadas de 1950 e 1960 merece destaque a contribuição de Modigliani (1963) sobre o modelo do ciclo de vida, que assim como o modelo da renda permanente, advêm do desejo individual de manter um padrão estável de consumo durante a vida que depende das expectativas de renda da vida toda, e não da renda corrente. A contribuição da hipótese do ciclo de vida está em observar que a renda tende a sofrer flutuações sistemáticas no decorrer da vida de uma pessoa e que, portanto, o comportamento da poupança é determinado fundamentalmente pelo estágio da família no ciclo de vida. Em um modelo de dois períodos, ao considera-se o período 1 como os anos de trabalho e o período 2 como os anos de aposentadoria, chegaremos a mesma conclusão. As pessoas poupam nos anos produtivos visando à aposentadoria, fazem porque a renda do primeiro período é maior do que a do segundo.

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Modigliani (1963) incorporou a possibilidade de endividamento no período inicial do ciclo de vida que representa um mecanismo alternativo de suavização de consumo e bem estar ao longo do ciclo da vida, ocorrendo nas etapas iniciais quando os indivíduos estão entrando no mercado de trabalho e sua renda geralmente é baixa. Nessa fase, os que possuem acesso ao crédito tentarão utilizar recursos futuros via endividamento, suavizando consumo e renda. Na segunda fase, cobrirão dívida anteriormente contraída e assim acumular ativos para a aposentadoria. Os agentes que não possuem acesso ao crédito, caso de restrição por liquidez, são obrigados a consumir toda a sua renda na fase inicial. Na segunda etapa, acumularão ativos para suavizar consumo. A partir da teoria sobre comportamento do consumidor, Campbell e Mankiw (1989) sugerem que existem dois comportamentos relevantes nos indivíduos com relação ao consumo: •

Agentes econômicos que consomem toda a sua renda corrente,

possivelmente devido à falta de credito. Podem ser denominados “consumidores keynesianos”. •

Agentes econômicos que seguem o modelo intertemporal, de acordo

com a Equação de Euler estariam maximizando bem-estar ao longo da vida, escolhendo sua evolução do consumo sujeito a uma restrição orçamentária. São os denominados “consumidores da renda permanente”, sendo definida como valor presente de riqueza; A heterogeneidade presente nos modelos de Campbell e Mankiw (1989) pode ser relevante para a explicação das séries agregadas de consumo brasileiras por ser um país que apresenta ainda grande nível de desigualdade de renda. Por isso incorporar variáveis que captem algumas especificidades, no que se refere à inflação, processo de estabilização, acesso ao crédito e incerteza influenciando o comportamento do consumidor são relevantes. 3.2 PSICOLOGIA ECONÔMICA

Ao abordar a literatura acerca do tema proposto sobre consumo, poupança e endividamento é importante iniciar o estudo do comportamento do consumidor através da psicologia econômica, que visa entender como as pessoas escolhem produtos, serviços e marcas, como gastam seu dinheiro e satisfazem seus desejos (Antonides e Van Raaij, 1998).

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A inclusão de fatores comportamentais e psicológicos nos modelos econômicos (Earl, 1988) tem por objetivo considerar a importância do estudo do comportamento humano, tal como racionalidade, preferências estáveis, conhecimento completo e maximilização da utilidade afetando a confiança e desta forma a disposição para gastar do consumidor. Uma abordagem mais psicológica do consumo foi iniciada por Katona (1975). Na opinião do autor, os gastos dos consumidores são uma função da capacidade e vontade de consumir. Já de acordo com a teoria psicológica, a vontade (capturado pelo sentimento do consumidor através de variáveis qualitativas como indicadores de confiança) de consumir não pode ser apenas explicado pela reação dos consumidores às variáveis econômicas. Nesta visão, uma queda na confiança dos consumidores pode por si só causar uma redução no consumo de maneira não prevista por variáveis econômicas (mesmo sem redução na renda). Por outro lado, pela teoria econômica, no problema de otimização, o consumidor escolhe o seu consumo de bens duráveis sujeito a uma restrição orçamentária (Hall, 1978). Em um modelo semelhante utilizado por Mankiw (1981), o agente decide o gasto em bens duráveis de forma a maximilizar sua utilidade intertemporal, sujeito além das restrições orçamentárias como também o estoque de bens duráveis e suas mudanças ao longo do tempo. De acordo com Acemoglu e Scott (1994), a propensão a consumir é negativamente relacionada com a incerteza. Desta forma, mesmo em casos de equilíbrio financeiro e orçamentário, um aumento da percepção de incerteza pode levar a uma diminuição do consumo, reduzindo a propensão marginal a consumir. Períodos de incerteza econômica ou política de alta são normalmente associados com uma maior volatilidade do sentimento do consumidor, sugerindo que grandes oscilações no sentimento podem influenciar o consumo. A confiança do consumidor é um fator estatisticamente importante do consumo em períodos de elevada incerteza, mesmo depois de controlar outros fatores. Por isso, associação da teoria econômica a variáveis que possam transmitir a avaliação dos consumidores sobre a incerteza tem se tornado cada vez mais importante para previsões sobre consumo e poupança que interferem diretamente no crescimento econômico de um país.

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3.3 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS NA LITERATURA

De acordo com Desroches e Grosselin (2004), poucos estudos têm encontrado nos índices de sentimento poder explicativo significativo em relação aos fatores fundamentais da economia. Alguns pesquisadores, no entanto, têm sugerido que os índices de sentimento podem ser úteis durante grandes eventos econômicos ou políticos, pois eles tendem a apresentar trajetória diferente de outras variáveis macroeconômicas, em tais períodos. Com base nessa hipótese, esses autores construíram um modelo de limiar simples que levou em consideração a magnitude da variação do sentimento do consumidor para previsão dos seus gastos. Testando o modelo de Campbell-Mankiw (1989), aqueles autores descobriram que o limiar do sentimento dos consumidores defasados é um bom preditor para o crescimento do consumo atual, uma vez que os resultados mostraram que as propriedades de uma equação de consumo são melhoradas. A literatura nacional sobre consumo vem crescendo recentemente destacando Issler e Rocha (2000), Gomes, Issler e Salvato (2005) e Gomes (2005). Gomes, Issler e Salvato (2005) investigaram a evolução do consumo de bens duráveis no Brasil a partir da decisão de consumo individual e da possibilidade de existência de restrição de crédito. Realizando testes de separabilidade, os resultados mostraram que o comportamento do consumo de bens duráveis é diferente de bens não duráveis e que existe uma relação de longo prazo (cointegração) entre o consumo de bens duráveis, não duráveis e renda. No curto prazo exibem uma dinâmica comum que podem ser em parte influencia da restrição a liquidez no Brasil. Ou seja, políticas que visam restringir o crédito podem provocar grande impacto sobre o consumo, e por conseqüência sobre o bem estar dos consumidores.

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Além da restrição orçamentária, maximização da utilidade intertemporal, estoque de bens duráveis, a restrição a liquidez foi testada por Campbell em 1987, e replicada no Brasil por Cavalcanti (1993), Reus et. al. (1988) e Issler e Rocha (2000). Issler e Rocha encontraram em seus resultados que 74% da renda no Brasil pertencem a consumidores que estão restritos a consumir apenas a sua renda corrente. Além disso, seus testes evidenciaram cointegração entre consumo e renda. Gomes (2005) analisou a evolução do consumo brasileiro confrontando três teorias distintas sobre decisão de consumo: consumidor otimizador, míope ou restrição de crédito. A primeira propõe que os consumidores otimizam seu bem estar intertemporalmente, sendo o consumo em função da taxa de juros. A segunda, miopia, que os consumidores consomem a renda corrente e a terceira de que os indivíduos não têm acesso a crédito, mas que não há restrições de acúmulo de riqueza, de forma que o consumo reage de forma assimétrica a renda. As estimativas sugeriram que os juros não são significativos, rejeitando a hipótese de comportamento otimizador. Os resultados também não confirmaram a hipótese de miopia e de restrição ao crédito. Podendo apenas observar que existe a suavização do consumo, pois em alguns anos as taxas de crescimento de consumo e renda têm sinais opostos. Bentes (2006) procurou estudar e quantificar a relação entre a confiança do consumidor e o nível de consumo no Brasil investigando a existência de um possível sentido de causalidade dominante na relação entre o consumo e as expectativas do consumidor. Seu objetivo era também verificar se os índices de confiança contêm algum poder explicativo incremental que não pode ser observado a partir apenas da utilização de variáveis macro-fundamentadas. Os resultados da

pesquisa sugerem que comparando em termos relativos que o poder explicativo do ICC sobre o consumo total ao das demais variáveis macro-fundamentadas é válido, uma vez que apenas a capacidade explicativa do crédito se destacou em relação ao poder explicativo do ICC e às demais séries de macroeconômicas. Em resposta à questão levantada por Matsusaka e Sbordone (1995) o pessimismo dos consumidores quanto às perspectivas futuras, mesmo que não fundamentadas economicamente podem provocar impactos significativos sobre o nível de atividade através dos gastos destes agentes.

Testando as hipóteses também de Katona (1975) na estimação da função consumo, Malgarini e Margani (2007) mostraram que o sentimento do consumidor parece desempenhar

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papel importante na explicação de padrões de consumo das famílias italianas mesmo depois de controlar a função da renda disponível e outras variáveis macroeconômicas possivelmente correlacionadas com a despesa. Por outro lado, o significado fraco do Indicador de Confiança para bens duráveis é, aparentemente, contrastante com a visão original de Katona (1975). Uma possível explicação é encontrada na circunstância de que as despesas de serviços podem ter adquirido gradualmente o papel que anteriormente era de bens duráveis, como compras discricionárias não são estritamente necessárias para a vida. Malgarini e Margani (2007) salientaram ainda a possibilidade de aspectos psicológicos influenciarem especialmente as decisões de consumo da "classe média". De acordo com seus resultados eles concluem que cerca de 30% do consumo pode ser explicadas pelas variáveis macroeconômicas confirmando que a confiança do consumidor contém informações que não podem ser extraídos por padrão as variáveis quantitativas. Além disso, acontecimentos políticos e extraordinários influenciam significativamente o Indicador de Confiança dos Consumidores, contudo afetando grupos de famílias de forma heterogênea, confirmando que o papel da psicologia pode ser influenciado por características sócio-demográficas dos consumidores. Em nova abordagem, Malgarini e Margani (2009) isolando o componente de tendência através de filtros de Kalman verificaram a partir do indicador de estresse financeiro criado a partir dos dados da situação financeira das famílias da Sondagem do Consumidor, se a probabilidade das famílias estarem em estresse financeiro mudava em períodos de crises distintos comparando países como Itália, França, Espanha e UK. A idéia inicial que o nível de estresse financeiro entre as famílias européias atingiu nível máximo durante a recessão atual foi confirmado. Contudo, o nível é heterogêneo entre os países com a constatação de que existia influencia de fatores sócio-demográficos como idade, escolaridade, renda e tipo de ocupação. Mais recentemente, Khalifa, Seck e Tobing (2010), avaliaram os efeitos da riqueza financeira sobre o comportamento de consumo das famílias. Utilizando a técnica de estimativa limiar desenvolvido em Hansen (1999) dividiu se a amostra endogenamente por níveis de renda e estimou-se os efeitos de cada categoria de rendimentos. Usando o

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denominado Painel de Estudo da dinâmica da renda em 2001, 2003 e 2005, os resultados sugerem que existe um limiar de nível de renda de quase 130.000 dólares, abaixo do qual o efeito riqueza financeira é insignificante. Os resultados reforçam a noção de que os agregados familiares com baixos níveis de renda tendem a limitar o seu consumo fora da riqueza financeira, diferente daqueles com maiores níveis de renda. A abordagem seguida neste trabalho segue as propostas empíricas e almeja contribuir com esta vasta literatura aplicando dados de pesquisas qualitativas a um modelo econométrico em forma reduzida que permita caracterizar a dinâmica e a natureza do processo estocástico que descreve as trajetórias do consumo de bens duráveis e de poupança do consumidor brasileiro. A técnica proposta permitirá identificar se existe uma mudança de dinâmica no comportamento do consumidor em relação a estas variáveis e identificar de a eventual mudança de dinâmica ou eventual saturação da capacidade de consumir e poupar estão relacionados a momentos de instabilidade económica.

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4. ASPECTOS METODOLÓGICOS

4.1 BASE DE DADOS Dados da Fundação Getulio Vargas2 da Sondagem de Expectativas do Consumidor sobre Intenção de Compras de Bens Duráveis e Poupança dos consumidores brasileiros entre setembro de 2005 e abril de 2011 foram utilizados para condução do exercício empírico fundamentado no modelo auto-regressivo com valor limite endógeno proposto por Caner e Hansen (2001), cujos principais pontos da teoria seguem adiante. Dentre as variáveis que compõem a pesquisa utilizaremos o Indicador que mede a Intenção de Compras de Bens Duráveis para os seis meses seguintes comparado aos seis meses anteriores, mais especificamente se os gastos serão maiores, iguais ou menores. São considerados bens duráveis: eletroeletrônicos, utilidades domésticas e outros, exceto automóveis e imóveis. O indicador mede a diferença percentual entre as respostas favoráveis menos desfavoráveis mais 100. Além deste indicador qualitativo, será utilizado outro que mede a poupança, sob a ótica da situação financeira familiar. Neste caso são comparadas receitas e despesas e inferese se a família está poupando, se mantendo em equilíbrio ou endividando-se. A amostra compreende um total de 65 observações mensais no período descrito. 4.2 EXERCÍCIOS PRELIMINARES

Nessa seção procurou-se fazer uma avaliação preliminar das variáveis escolhidas para nossa análise juntamente com dados macroeconômicos procurando identificar algumas características e especificidades das séries temporais apresentadas. Para esse trabalho foram levantados os dados mensais das seguintes séries: •

ICBD - Indicador de Compras de Bens Duráveis para os próximos seis meses da Sondagem de Expectativas do Consumidor (FGV) entre setembro de 2005 e abril de 2011;

2

www.fgvdados.br

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IPOUP - Indicador de Poupança da Sondagem de Expectativas do Consumidor (FGV) entre setembro de 2005 e abril de 2011;



CREDPIB – Operações de Crédito do sistema financeiro (risco total) destinados a pessoas físicas em percentual do PIB entre setembro de 2005 e março de 2011;



DEFAULT –Inadimplência acima de 90 dias em relação ao total da modalidade - Total pessoa física entre setembro de 2005 e março de 2011;



SELIC - Taxa de juros - Selic acumulada no mês anualizada, entre setembro de 2005 e abril de 2011.

A primeira característica dos dados a ser verificada foi a presença de componentes sazonais nas séries. Recorrendo uma análise dos correlogramas nas duas séries, observamos que o correlograma da variável em nível indica processo autoregressivo AR (1) no IPOUP e media móvel e autoregressivo no ICBD, conforme pode ser observado no Anexo II, tabelas 8 e 9. Essa análise preliminar nos permitiu escolher trabalhar com a série do Indicador de Poupança sem ajuste sazonal e do Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis ajustado sazonalmente conforme metodologia utilizada pela FGV3. O gráfico 5 apresenta a série do ICBDA em nível e sua respectiva diferença (D_ICBDA) mostrando a possibilidade da série conter raiz unitária, dada a demora para reverter a tendência. A série diferenciada (D_ICBDA) flutua ao redor de zero.

3

O ajuste sazonal é realizado pelo método de decomposição estrutural de séries temporais, no qual os componentes estruturais não diretamente observados são estimados pelo filtro de Kalman. A partir de janeiro de 2011, incluindo a revisão da série histórica entre setembro de 2005 e dezembro de 2010, o cálculo passou a levar em consideração os efeitos de quebras estruturais, como mudanças de nível e outliers, detectadas durante o período. O ajuste sazonal não é realizado diretamente para todas as séries da Sondagem do Consumidor. Ao nível de cada quesito da pesquisa contendo opções de resposta de natureza qualitativa, são ajustadas somente as séries correspondentes às opções extremas de resposta (previsões de melhora/piora, avaliações boas/ruins). A opção intermediária (normal/igual) é obtida como o resíduo das duas partes, que devem, por definição, somar cem por cento (100%).

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Gráfico 5 – Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis com ajuste sazonal (Série padrão e diferenciada) 105,0

15

100,0 10 95,0 90,0

5

85,0 0 80,0 75,0

-5

70,0 -10 65,0

ICBDA

mar/11

dez/10

set/10

jun/10

mar/10

dez/09

set/09

jun/09

mar/09

dez/08

set/08

jun/08

mar/08

set/07

dez/07

jun/07

mar/07

set/06

dez/06

jun/06

mar/06

set/05

-15

dez/05

60,0

D_ICBDA

O teste de Dicker Fuller confirma a existência de raiz unitária na série de Compra de Bens Duráveis, conforme tabela 10 do Anexo II. Gráfico 6 – Indicador de Poupança sem ajuste sazonal (Série padrão e diferenciada) 105,0

8 6

100,0

4 2

95,0

0 -2

90,0

-4 -6

85,0

-8

IPOUP

D_IPOUP

mar/11

dez/10

set/10

jun/10

mar/10

dez/09

set/09

jun/09

mar/09

dez/08

set/08

jun/08

mar/08

dez/07

set/07

jun/07

mar/07

dez/06

set/06

jun/06

mar/06

dez/05

-10 set/05

80,0

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Assim como o Indicador de Poupança, a série IPOUP em nível e sua respectiva diferença (D_IPOUP) indicam a possibilidade de presença de raiz unitária, o teste de DickeyFuller confirma tal resultado conforme apresentado na tabela 11 contida no Anexo II. Comparando com dados macroeconômicos foi realizado uma análise de correlação cruzada entre os Indicadores da Sondagem do Consumidor e algumas variáveis relacionadas a evolução do consumo e da poupança. Os resultados apresentados na tabela 1 mostram que a SELIC apresenta forte relação com CREDPIB (-0,84) e IPOUP (-0.74). Existindo também aderência positiva entre elas: CREDPIB e IPOUP (0,79). Tabela 1: Análise de Correlação

Em seguida através do teste de causalidade de Granger procuramos identificar a significância do passado de uma série sobre a outra. A hipótese nula deste teste é de que uma variável não “Granger causa” a outra considerando 1 lag de defasagem. Com um p-valor menor do que o valor crítico (5%) deve-se rejeitar a hipótese nula. No gráfico 7 e também com mais detalhes na tabela 12 do anexo II, analisando a variável Crédito em percentual do PIB (CREDPIB) com Indicador de Poupança (IPOUP) da Sondagem do Consumidor, dado o p-valor, conclui-se que Crédito causa Indicador de Poupança. Da mesma forma, Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis com ajuste sazonal (ICBDA) causa a Taxa de Inadimplência do BACEN (DEFAULT), ou seja, uma elevação da intenção de compras futuras de bens duráveis (ICBDA) apresenta relação de causalidade com aumento das taxas de inadimplência (DEFAULT) criando causalidade na taxa de juros (SELIC). A taxa de juros Selic (SELIC) apresenta também causalidade no Indicador de Inadimplência do BACEN (DEFAULT), o que já era de se esperar pela teoria econômica.

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Importante ressaltar que não foi observada nenhuma relação de causalidade entre os Indicadores de Poupança (IPOUP) e Indicador da Intenção de Compras de Bens Duráveis para os próximos seis meses (ICBDA). Gráfico 7 – Resultados para os Testes de Causalidade de Granger

Taxa Juros Selic

Indicador de Poupança

Indicador de Compras de Bens Duráveis

Taxa de Inadimplência pessoa física

Operações de Crédito a pessoas físicas em % do PIBa

4.3 O MODELO ECONOMÉTRICO O objetivo central da dissertação consiste em captar se existe uma mudança de padrão no consumo e na capacidade de poupança do consumidor brasileiro, para tanto, considera-se plenamente adequada uma adaptação do modelo auto-regressivo com valor limite (Threshold Autoregressive Model). O modelo introduzido por Caner e Hansen (2001), permite, simultaneamente, analisar a estacionaridade e a possibilidade de mudança de regime nas séries temporais de intenção de consumo de bens duráveis e de poupança selecionadas. Para cada uma delas será estimada a seguinte equação:

∆yt = θ 1' xt −1Ι ( Z t −1
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