Continuidade versus ruptura: a tipificação do gaúcho pelo MTG

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RIO GRANDE UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL CURSO DE POS GRADUAÇÃO LATO SENSU “CURSO DE ENSINO DE SOCIOLOGIA NO ENSINO MÉDIO”

Continuidade versus ruptura: a tipificação do gaúcho pelo MTG

Tiago Pereira Leal1

Resumo

O presente artigo pretende traçar um panorama a respeito da questão cultural da figura humana definida como “gaúcho”, no estado do Rio Grande do Sul, no sul do Brasil, procurando por suas motivações históricas, assim como analisar a sua relação de continuidade e/ou ruptura com o passado por intermédio do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), órgão cultural, financiado pelo Governo do Estado, com a prerrogativa de tipificar o elemento gaúcho, enquadrando-o como legítima cultura de Estado. O papel das tradições como amálgama cultural formador do ufanismo também é analisado no presente artigo, em seu papel de formação de identidade do povo sul-rio-grandense, assim como as relações que as tradições do “gaúcho rio-grandense” guardam com o “gaucho castelhano”, dos países do Prata. Partindo da problematização desta relação de ruptura ou continuidade das tradições gaúchas na modernidade, pretendeu-se estabelecer premissas para futuros estudos no tema, bastante presente nas novas perspectivas trazidas pela História Cultural e criticado nas análises teóricas marxistas (economicistas) da História sul-rio-grandense. Tratar de uma figura histórica tão multifacetada como o povo rio-grandense é tarefa de difícil consecução, por isso definiu-se no presente trabalho, no âmbito da Sócio História, uma análise específica da tradição gaúcha, olvidando propositalmente a história dos outros povos que formam o Rio Grande do Sul atual, tão importantes quanto os itálicos, germânicos e eslavos. Utilizando elementos da Sociologia analítica para tratar dos distúrbios identitários em tempos de 1

Bacharel em Direito (Universidade Católica de Pelotas, 2012); Especialista em Sociedade, Política e Cultura do Rio Grande do Sul (Universidade Federal do Rio Grande, 2014). E-mail: [email protected]. Orientador: Prof. MSc. Paulo Sérgio Mansija Pinto. .

globalização, pode-se traçar reflexões sobre os processos culturais contemporâneos, e assim perceber o quanto essa análise é problemática. Uma crítica da identidade cultural, utilizandose de revisão bibliográfica, mas especialmente de fontes atuais, dialogando com alguns sociólogos que tratam de memória e identidade, é o que se pretendeu em resumo, no presente trabalho de conclusão de curso. Palavras-chave: Rio Grande do Sul; Gaúcho; Cultura; MTG; Regionalismo

Abstract:

This article aims to give an overview about the cultural issue of the human figure defined as "gaucho", in the state of Rio Grande do Sul, in southern Brazil, looking for its historical reasons, as well as analyze its relation of continuity and/or break with the past, through the Gaucho Traditionalist Movement (MTG), a cultural body funded by the State Government with the prerogatives to typify the gaucho element, framing it as legitimate culture of state. The role of traditions as cultural amalgam former of jingoism is also analyzed in this article, in its role of formation of the Rio Grande do Sul people identity, as well as the relations between the "riograndense gaucho" and the "Spanish-speaking gaucho" from the River Plate countries. From the questioning about this breaking or continuity relationship of the gaucho traditions in modern times, it was intended to establish premises for future studies on the subject, very present in the new perspectives brought by the Cultural History and the Marxist theoretical analysis of History of the Western peoples. It is not an easy task to treat about a historical figure so multifaceted as is the sul-rio-grandense people, so it was defined in this study, as it is belonging to Social History, a specific analysis of the gaucho tradition, purposely forgetting the history of other peoples of the present Rio Grande do Sul State, as important as Italics, Germanics and Slavics. Using elements of analytical sociology to treat disorders of identity in times of globalization, it is possible to trace reflections on contemporary cultural processes, and thus realize how this analysis is problematic. A critique of cultural identity, utilizing bibliographical revision, but in especial nowadays sources, in dialogue with some Sociologists who deal with memory and identity, is what was summarily intended, in this course conclusion work. Key-words: Rio Grande do Sul; Gaucho; Culture; MTG; Regionalism

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“Se os lusos e espanhóis de longe traçaram planos Nem heranças dividiram e hoje, após tatos anos "hay doble chapa y bandera" que conforme a conveniência Trocam de hino e de pátria, pois esta é uma só querência...” Trecho da música “Doble Chapa”, de autoria de Fábio Vaz Mattos, e gravação do grupo Sonido del Alma Gaucha.

INTRODUÇÃO Desde o final do século XIX, pelo menos, parece ter-se delineado a Revolução Farroupilha como o evento-mor da história do Estado, sendo idealizada como heroica e bravia, assim como realizada pelo povo de uma província humilde e isolada contra um poderoso império que a oprimia. Munida deste símbolo, em 27 de novembro de 1947, fundou-se o Movimento Tradicionalista Gaúcho no Rio Grande do Sul, uma organização de cunho cultural, que viria a apropriar-se do tipo social gaúcho, ressignificando-o como repleto de valores de retidão, coragem, resistência e apego à tradição campesina e, sob o patrocínio do Estado, estenderia esta figura como o “gaúcho padrão” a todos os recônditos do Rio Grande. O trabalho em questão objetiva traçar a relação de ruptura versus continuidade deste gaúcho “tipificado” com a história, e quais os reflexos dista na memória coletiva do habitante do Rio Grande do Sul, haja vista o status social que o tradicionalismo proporciona ao tradicionalista, algo muito diferente do que ocorria com quem adentrasse uma cidade trajando vestimentas tradicionais, em um passado não muito distante. Neste sentido, estabeleceu-se como problema de pesquisa questionar quais parâmetros têm sido utilizados pelo MTG para definir a figura do gaúcho assim como a relação destes elementos com os dados acerca do gaúcho histórico, relacionando estes fenômenos com o da “invenção das tradições”, e desta forma traçando uma crítica da identidade cultural do gaúcho tipificado pelo Movimento. Parte-se da premissa de que estes fenômenos se relacionam com o que Hobsbawm chamou de “invenção das tradições” (2002), gerando uma cultura ressignificada à partir de elementos do passado, e que hoje se encontra fortemente disseminada, e até oficializada, como cultura de estado. Para o desenvolvimento desta pesquisa, utilizou-se de pesquisa .

bibliográfica e documental, priorizando-se fontes atuais. O presente escrito justifica-se por sua importância social, no que tange à influência das tradições no ufanismo do povo gaúcho, cunhando uma identidade regional autônoma que se distancia da identidade cultural disseminada como “brasileira”; o que ganha novas perspectivas com a História Cultural, confrontada com as correntes de interpretação marxista (economicista) da História, bastante populares nos estudos regionalistas gaúchos atuais, e que têm depreciado a cultura gaúcha como elitista e não representativa da realidade cultural do Estado.

1 RETROSPECTO HISTÓRICO DA QUESTÃO CULTURAL DO RIO GRANDE DO SUL

O local onde atualmente se encontra o estado do Rio Grande do Sul, na Região Sul do Brasil, já era habitado por tribos indígenas advindas da Patagônia há pelo menos 9 mil anos atrás. Essas tribos, antepassadas dos charrua/minuano, já utilizavam a boleadeira para caçar e guerrear (MUSEU ANTROPOLÓGICO DO RIO GRANDE DO SUL, página digital, s.d.). Este instrumento de caça e guerra, seria adaptado pelos primeiros gaúchos do Prata, sendo hoje ornamento com significado étnico nas casas de muitos rio-grandenses (VIDAL, [20--]). O Rio Grande do Sul, encontrado provavelmente de forma acidental pelos primeiros europeus em 15302, tem sua história inexoravelmente ligada ao Prata, e deve ao interesse português pela desembocadura deste rio, a sua primeira povoação europeia. Os 97 anos de existência da Colônia do Sacramento, na região da Banda Oriental do Rio Uruguai (que incluía o Uruguai e o Rio Grande do Sul atuais), contaram com a divisão da região entre os Impérios Espanhol e Português. Os últimos, instalando-se a partir do litoral, o faziam se aproveitando do maior interesse espanhol pelos metais preciosos do interior do Continente Americano, enquanto que os castelhanos, permitiam que padres catequizadores da ordem

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O historiador colonial Francisco Varnhagen (1918 apud 2004) é um dos que consideram o descobrimento do Rio Grande do Sul como tendo se dado pela expedição de Martim Afonso de Souza ao Rio da Prata, quando uma das naus de sua esquadra teria naufragado na Barra do Rio Grande. O nome “Rio Grande de São Pedro” seria, ainda, em homenagem a seu irmão, Pero de Souza, que fez o relato da expedição. (História ilustrada do Rio Grande do Sul. Coordenação [de] Elmar Bones da Costa, Rocardo Fonseca [e] Ricardo Schmitt – Porto Alegre: RBS Publicações, 2004, p. 41). .

chamada “Companhia de Jesus” criassem uma verdadeira civilização crioula3 (mestiça) no interior, ligada à Província Jesuítica do Paraguai. Os espanhóis foram os primeiros a mapear e colonizar a Banda Oriental, assim como os primeiros a introduzir bovinos na região. O gado selvagem, multiplicado sem controle, somado à praticamente ausência de Estado na região, foram os principais fatores a permitirem o surgimento de um tipo humano sem identidade política ligada a algum país, nômade, com código de conduta próprio, que seria o embrião do gaúcho. A região limítrofe entre os Impérios espanhol e português, muito propícia ao contrabando de produtos ganadeiros, era o ambiente que sustentava os changadores e gauderios palavras que designaram os “proto-gaúchos4”. Estes primeiros gaúchos eram uma mistura de indígenas remanescentes, guaranis expulsos das Missões, escravos fugidos, açorianos revoltados, mestiços de espanhóis e portugueses pobres que não se encaixavam na sociedade tradicional das cidades coloniais (SLATTA, 1985; FERRAZ, 1980). Este tipo humano, forjado na atividade das vacarias sobre cavalos, foi muito bem utilizado por Rafael Pinto Bandeira (1740 – 1795), o primeiro caudilho rio-grandense, para o tráfico de produtos ganadeiros, com o qual fez fortuna no sul do atual Rio Grande do Sul. Walter Spalding5 tentou chamar Sepé Tiarajú (? – 1756), o líder da resistência dos guarani à expulsão dos Sete Povos, de primeiro caudilho gaúcho (DA COSTA, 2004, p. 65). No entanto, esta colocação não foi bem aceita pelo Instituto Histórico e Geográfico Rio-Grandense, que só aceita o gaúcho como resultado da colonização portuguesa na região (DA COSTA, 2004). Pinto Bandeira teria sido, então, o primeiro de muitos poderosos donos de terras, assemelhados aos senhores feudais da Europa medieval, que barganhavam um imenso poder político como mantenedores das fronteiras, criando uma marca regional. O gaucho6 da América Espanhola foi largamente empregado em guerras de fronteira e conflitos com os nativos, aproveitando-se a Coroa de sua já marcada habilidade na montaria e manejo de armas brancas (GUAZZELLI, 2004, p. 49-59). Os nativos que viviam nas Missões Jezuíticas legaram o hábito do chimarrão não só aos gaúchos, mas a boa parte dos habitantes do Cone Sul (HARTMANN, 2016, p. 187196). O chiripá, principal vestuário de montaria para os membros inferiores do gaúcho até fins 3

Termo não utilizado pelos portugueses, e sim pelos espanhóis, a partir da palavra criollo. No restante do Brasil, a palavra é mais utilizada como designativo de descendentes de cativos africanos trazidos para a região do que como “pertencente ou relativo aos nativos de uma região” (MICHAELIS, 2016) 4 A acepção da palavra gaúcho é muito controversa (ABEJANEDA, 2016), e será tratada adiante neste artigo. 5 Historiador gaúcho, nascido em 1901 e falecido em 1976, autor de “Construtores do Rio Grande”, 1969. 6 Em espanhol, a marca tônica da palavra ocorre na letra “a”, diferentemente do português, onde esta marca se dá no “u”, com a consequente aposição de acento agudo (MICHAELIS, 2016). .

do século XIX desenvolveu-se a partir do chamado “chiripá indígena”, vindo a partir dos povos “missioneiros”, sendo o mesmo um pedaço de tecido triangular, amarrado em torno da cintura (DA SILVA & VIDAL, 2016). Entre as pelas de indumentária “tradicionais” originárias da Europa, cita-se o lenço vermelho, que era usado de modo semelhante ao dos nativos, para aparar o suor da testa durante combates ou nas tarefas do dia a dia. Dos povos charrua e minuano, hábeis ginetes7, o gaúcho parece ter herdado o uso de barbas aparentes e o culto a valores tradicionalmente ligados à “masculinidade”, assim como a valorização das atividades ligadas à equitação (ROSSI, 1921). Uma recente pesquisa genética apontou que os principais ancestrais do povo gaúcho seriam o espanhol, por linhagem materna, e o charrua, por linhagem materna (SANTOS et al, [20--]). A mesma pesquisa apontou que a carga genética indígena é tão grande no gaúcho, que só seria comparável, em nível de Brasil, a algumas regiões mestiças da Amazônia. Historiadores uruguaios (MOLAS, 1964, p. 69-89) traçaram a origem do gaúcho/gaucho no entorno da Lagoa Mirim/Lago Merín8, logo em seguida tendo o mesmo se espalhado por todo o Cone Sul9, a partir das províncias argentinas de Corrientes e Entre Ríos. Durante a guerra de independência argentina, a utilização de contingentes gauchos foi notável, sendo que a guerrilha ocorrida no noroeste argentino é chamada de Guerra Gaucha (1814-1825), na historiografia argentina. A princípios do século XIX, os gaúchos do Conse Sul foram unidos aos indígenas remanescentes pelo caudilho José Artigas (1764 – 1850), na tentativa de formar uma unidade política chamada União dos Povos Livres. A mesma entidade confederava a região das atuais províncias argentinas de Cordoba, Santa Fé, Entre Ríos, Corrientes, mais a antiga região da Banda Oriental, incluindo as Misiones Orientales (região dos Sete Povos das Missões, recém perdidas aos lusos, na época) (GUAZZELLI, 2004). José Gervasio Artigas foi combatido por forças espanholas, portuguesas e unitaristas argentinas, tendo morrido exilado no Paraguai, sem nenhum poder político (CAMOGLI, 2009). A evanescente confederação republicana que formou, porém, inspirou notavelmente movimentos de independência em todo o Cone Sul e é possível que tenha alguma influência ainda no processo de independência rio-grandense.

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Do espanhol “jinete”, significando pessoa que monta o cavalo, ou pessoa mestra em equitação (DLE, 2016). A Lagoa Mirim, no extremo sul do Rio Grande do Sul, é dividida entre Brasil e Uruguai, chamando-se sua parte uruguaia de Lago Merín (TERRITÓRIOS, página virtual, 2016). 9 Região da América do Sul, ligada historicamente ao Mar da Prata, incluindo geralmente os países do Paraguai, Chile, Argentina, Uruguai e sul do Brasil (TOKATLIAN, 2009). . 8

Em 1811, circulou pela Província de São Pedro um panfleto, em cujo os habitantes das Províncias do Rio da Prata faziam um convite aos rio-grandenses, para que constituíssem também uma província livre e independente, a fim de a eles se juntarem (PICCOLO, [20--]). Já durante o período da Província Cisplatina (1817 – 1828), os líderes militares riograndenses tiveram amplo e natural contato com as ideias republicanas da região platina, o que deve ter facilitado o processo político de rompimento com a monarquia brasileira que se deu com a Revolução Farroupilha. Já em 1834, João Manuel de Lima e Silva (c.1805- 1837), juntamente a Bento Gonçalves da Silva (1788 – 1847), foram chamados a prestar esclarecimentos ao Império do Brasil por estarem sendo acusados de proximidade com o caudilho uruguaio Juan Antonio Lavalleja (1784 – 1853), para forjarem a independência da Província do Rio Grande do Sul, da qual foram ambos absolvidos (SPALDING, 1956). Diante do exposto, parece que a proximidade com o ambiente político e cultural do Prata teve influência nas muitas revoltas dos rio-grandenses contra decretos e leis do Império, com relação aos quais, teriam tido opiniões divergentes. A falta de maiores liberdades administrativas da Província, somada ao seu isolamento geográfico do centro de poder brasileiro e ao poder em demasiado que nutriam os caudilhos locais parece terem sido muito propensos aos frequentes levantes armados, que culminariam na Guerra dos Farrapos. A Guerra dos Farrapos parece ser o evento histórico mais presente na historiografia rio-grandense. Há que se discorrer sobre alguns pontos-chave, para dar continuidade à linha de raciocínio do presente trabalho. O papel da maçonaria local, onde muitos dos líderes da Revolução partilhavam suas ideias, também parece ter tido grande influência nas ideias republicanistas e abolicionistas propagadas durante a mesma (SPALDING, 1956). Outro ponto importante é o de que o líder militar David Canabarro, que tomou o controle de fato das tropas rio-grandenses após o afastamento de Bento Gonlalves, parece não ter pretendido levar a guerra até suas últimas consequências, o que fica aparente na ajuda oferecida pelo líder argentino Juan Manoel de Rosas (1793 - 1877), que foi negada por Canabarro (SILVA et al, 2013). Ainda, foi deste episódio histórico que o Rio Grande do Sul herdou a sua bandeira, o seu brasão e o seu primeiro hino, reunindo gaúchos e “não gaúchos” sob a designação de “riograndenses”. O mesmo episódio parece ser considerado “marco fundador” do gaúcho, para grande parte da historiografia (LOPEZ, 1992) e, até mesmo, do Movimento Tradicionalista Gaúcho, que desta forma, parecem obliterar a carga cultural castelhana carregada por este tipo humano. .

É digno de nota o curto espaço temporal de 8 anos que separara o reconhecimento da independência uruguaia pelo Império Brasileiro, da declaração unilateral de independência rio-grandense com relação ao mesmo Império. Ambas as quais, ademais, contaram com a presença de homens tidos como gaúchos, que só utilizavam chiripa e poncho como vestimenta (FLORES, [20--], p. 41). A habilidade do gaúcho com o cavalo parece ter sido muito empregada pelos donos do poder, de ambos os lados da fronteira. Em agosto de 1883, pouco mais de dois anos antes do estalar da Revolução, Charles Darwin (1809 – 1882) fazia uma viagem descritiva pela Banda Oriental, tendo reportado minuciosamente os hábitos e vestimentas dos gauchos das proximidades do Rio Negro, no Uruguai atual (PRIETO, 1992, p. 55-56). A fronteira entre Rio Grande e Uruguai, no interior, só foi demarcada tardiamente (DORFMAN, 2008, p. 241-270). A localidade de Cerro Largo, onde Bento Gonçalves possuía estância, era tradicionalmente habitada por gente rio-grandense e uruguaia, ficando na mesma região descrita por Darwin como gaúcha (DORFMAN, 2008). O pesquisador inglês descreve os gaúchos como seres humanos pitorescos e selvagens, vivendo de um trabalho extremamente árduo, alimentando-se praticamente de churrasco e chimarrão, com o rosto enegrecido pelo sol. Ele também reporta que os gaúchos tinham um código de conduta próprio, onde a dignidade pessoal era o maior bem (MONTEIRO, [20--]). Darwin chega a denominar o homem campeiro das Malvinas da época como gaúcho, além de relatar o uso das boleadeiras para abater emas em plena Patagônia e pumas no Pampa argentino (DARWIN, [20--]). Darwin também descreve os gaúchos como mestiços de espanhóis e indígenas, alguns deles somente indígenas, e alguns negros, com expressões extremamente selvagens. O tipo gaúcho ainda é descrito como pouco afeito aos credos cristãos, algo que mudaria com a sua progressiva sedentarização nas décadas seguintes. Darwin também diz que há um sentimento geral de felicidade no que tange à independência do modo de vida gaúcho, seminômade e a cavalo pelos pampas (DARWIN, [20--]). Após os eventos do “Decênio Heroico”, a reivindicação separatista parece ter ficado esquecida, embora diferenças de pensamento político entre a Província e a Corte continuassem aparentes. Antônio de Souza Netto, o proclamador da independência riograndense, que após o término da Guerra dos Farrapos havia se exilado no Uruguai, voluntariamente voltou a solo rio-grandense no combate aos invasores paraguaios de Solano López (MAESTRI, 2013, p. 23). No contexto da Guerra do Paraguai (1864 – 1870), uma nova geração de caudilhos se formaria na Província, que novamente entrava em amplo contato com .

território argentinos de Corrientes e Entre Ríos, onde distúrbios de poder entre autonomistas e federalistas, no contexto das guerras civis argentinas, se faziam ecoar (MAESTRI, 2013, p. 33-52). A Proclamação da República no por meio de um golpe militar no centro de poder do Brasil, em 1889, parece ter tido pouco impacto no Rio Grande do Sul, onde as ideias de republicanismo e abolicionismo já eram programa de partidos políticos provinciais desde a década de 1870 (DA COSTA et al, 2004). O Positivismo político foi fortemente propagado no Rio Grande do Sul nesta época, conflituando com o liberalismo que norteou a primeira Constituição brasileira republicana (1891), marcando uma Constituição Estadual opositiva (DA COSTA et al, 2004). A tensão política gerada com a questão parece ter sido a principal causa da Revolução Federalista no Rio Grande do Sul (1893-1895). Nesta guerra civil, um dos personagens mais importantes é o Gumercindo Saraiva (1852 – 1894), o qual entrou no Rio Grande do Sul a partir do Uruguai, onde seu irmão, Aparício Saraiva10 é considerado herói gauchesco nacional.

2 ANÁLISE DA QUESTÃO CULTURAL NO RIO GRANDE DO SUL

Até agora, no presente trabalho, fez-se um retrospecto histórico da presença do gaúcho na região do Cone Sul. Sua característica mestiça, sua perícia com o cavalo, sua adaptação ao bioma do Pampa, sua presença em praticamente todas as guerras da região já foram abordadas no mesmo. Cumpre agora fazer um apanhado da sua presença na cultura regional, a começar pela literatura, para melhor compreender sua eleição como símbolo cultural desta área geográfica, e a transformação que este símbolo sofreu até chegar aos nossos dias. Na literatura do Prata, o gaúcho é amplamente retratado como um ser quase mítico, saudosista de seu passado glorioso, de uma época dourada que se perdeu na história (POZENATO, 1974). Este formato foi amplamente empregado no período literário hoje denominado de Romantismo. A obra “O Uraguai” (1769), de Basílio da Gama, já alçava Sepé Tiarajú a herói do povo indígena missioneiro, somente 13 anos após a morte deste personagem histórico, sendo enquadrada no período literário do Arcadismo. 10

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Ou “Saravia”, na grafia hispânica, 1856 – 1904.

Porém, reportes militares do século XVIII designavam os gaúchos de uma outra forma. Os gaúchos desta época eram chamados por eles de “gahuchos”, gauderios, índios vagos, contrabandistas de produtos ganadeiros que preocupavam as autoridades do lado espanhol. Este designativo era dado aos homens que viviam nas imediações da Cuchilla Grande11 e no entorno da Lagoa Mirim12. A origem do designativo “gaúcho” ainda é alvo de debates, nunca tendo sido satisfatoriamente explicada (MOLAS, 1964), derivando provavelmente da palavra “guacho”, ainda usada no interior do Estado, para se referir a um animal órfão (DICIONÁRIO INFORMAL, 2014). Sendo assim, as pessoas reportadas como gaúchos eram, ao que parece, similares a grupos de renegados sociais, que aproveitavam a liberdade de uma vida seminômade, distante das autoridades coloniais. O espaço de atuação do gaúcho começou a diminuir a partir do período de dominação castelhana sobre o Rio Grande do Sul, no final do século XVIII13. Os colonizadores do Prata, fundando cidades a partir deste Mar, assim como os colonizadores portugueses, que vinham cedendo terras no sistema de sesmarias, a partir do norte da Banda Oriental, com a conseguinte divisão e demarcação das mesmas terras, limitavam a liberdade que o gaúcho possuía para percorrer as pradarias da Pampa. Como resultado, ao final do século XIX, já se dizia: "[o] genuíno tipo – crioulo – rio-grandense (hoje tão modificado)” (NETO, 1998), tendo este gaúcho se sedentarizado e empregado como peão de estância (NETO, 1998).. O uso da palavra “gaúcho” como designativo do habitante do Rio Grande do Sul parece ter sido iniciado pelo próprio Império Brasileiro, ainda em seu significado depreciativo, como forma de renegar os habitantes belicosos da fronteira setentrional o Império (KLAFKE, 2011; ABEJANEDA, 2010). Apolinário Porto-Alegre (1844 – 1904), seguindo as tendências da literatura romântica da época, parece ter sido o primeiro a dar uma visão positiva do gaúcho rio-grandense em uma obra de vulto, em seu “O Vaqueano” (1872) 11

Cordilheira formada por coxilhas, que cruza o território do Uruguai do oeste ao leste pelo sul do Rio Negro. O termo “gahucho” é usado em uma comunicação do Comandante de Maldonado, Pablo Carbonell, ao Vicerrei espanhol Juan José Vértiz, datada de 23 de outubro de 1771 (ROCHATOTAL, página virtual, 2016). 13 O jornalista Homero Franco reporta em suas pesquisas que: “De 1870 em diante, desaparece o gaúcho real, com a delimitação dos campos com arame farpado. Os campeiros que vieram depois, na qualidade de peões assalariados ou semi-escravos dos patrões estancieiros, foram apenas a sua sombra. Indevidamente, levam o seu nome, mas não a sua qualidade essencial, a autonomia, a renúncia aos vínculos empregatícios e às ordens superiores, como bem retrataram José Hernández e António Lussich. A literatura produzida sobre o gaúcho assalariado, narra-o como briguento, valente, indómito, telúrico, sentimental, patriota, qualidades do gaúcho vago, mas não a sua ideologia. A cultura que emerge dessa herança, desse conceito de homem e de vida, reproduz os seus valores, mas não reproduz-lhe as atitudes e o comportamento e muito pouco as suas tradições, costumes, crenças e ritos. O gaúcho verdadeiro está morto. Os seus seguidores seguem-no na utopia e não na prática.” (TERRA, s/d). . 12

(MOREIRA, 1991). Domingo Faustino Sarmiento, algumas décadas antes, havia escrito a obra “Facundo” (1845), onde demonstrava uma relação de amor e ódio com o “tipo gaúcho”. Mas foi com a obra Martin Fierro (também de 1872, com continuação em 1879), que o argentino José Hernandez (1834 - 1886) escreveu em Santana do Livramento (no Rio Grande do Sul) (CARLE, 1998), que o gaúcho seria alçado ao símbolo nacional da Argentina. O gaúcho oriental (uruguaio)14 minguava desde a aniquilação dos últimos charruas no episódio de Salsipuedes (1832), sendo interesse do novo Estado uruguaio a europeização do mesmo (ACHUGAR, 1981, p. 7-32). No Rio Grande do Sul, o processo de europeização parece ter se dado em maior medida a partir do fechamento das fronteiras, quando as relações com a Capital do Império (e, posteriormente, da República) foram estreitadas. Como consequência disso, na virada do século, o que se via nas fotografias de aglomerações urbanas riograndenses eram homens e mulheres seguindo a moda de vestir europeia (FAMIGLIA PRATI, página virtual, [20--]; BASTOS, [20--]). O gaúcho, porém, parece ter sobrevivido no interior do Rio Grande do Sul, onde os modismos europeus e do centro de poder brasileiro não chegavam. João Simões Lopes Neto (1865 – 1916), exaltaria o gaúcho em quatro obras principais: Cancioneiro Guasca (1910), Contos Gauchescos (1912), Lendas do Sul (1913) e Casos do Romualdo (1914), onde enfatizava a fala do “guasca” rio-grandense. Ainda há que se rememorar o livro Dom Segundo Sombra (1926), do argentino Ricardo Güiraldes (1886 - 1927) que, da mesma forma, exalta o falar do gaucho argentino, assim como o seu lado mítico. No Uruguai, a poesia gauchesca parece ter-se iniciado nos cielitos e nos Diálogos Patrióticos (1822), de Bartolomé Hidalgo (1788 – 1822). Este escritor é homenageado no Dia Nacional do Pajador, no Uruguai (REPUBLICA, 2012). O uruguaio Antonio Lussich (1848 – 1928), com sua obra “Los Três Gauchos Orientales” (1872), é considerado

um antecessor de

“Martin Fierro”

(BENTANCOR, 2016). Parece ter sido o político gaúcho Júlio de Castilhos (1860 – 1903), o primeiro a trazer a figura do gaúcho para torna-la referência para o Estado. Em seus estudos no centro do Brasil, Castilhos entrou em contato com as ideias do positivismo, do teórico Auguste Comte, que incluíam federalismo radical e a ideia de “pequenas pátrias”, que o levaram a procurar as

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Nos primeiros tempos de colonização, a República Oriental do Uruguai era chamada de “Banda Oriental”, pois ficava a oriente do Rio da Prata, tendo posteriormente se tornado “Província Oriental”, e hoje tendo seu nome oficial como “República Oriental do Uruguai” (BACELAR, 2016). .

raízes culturais do Estado (OLIVEN, 1992). Fundador do Partido Republicano RioGrandense, tendo ficado à frente da política gaúcha por três décadas, usou inclusive seu jornal para defender o 20 de Setembro como “Dia do Gaúcho” (OLIVEN, 1992). A Revista do Partenon Literário, surgida em 1869, tentava “juntar os modelos culturais vigentes na Europa com a visão positivista da oligarquia rio-grandense, através da exaltação da temática regional gaúcha” (OLIVEN, 1992). Outro fato digno de nota foi a aculturação dos imigrantes italianos e alemães, que vieram em larga escala colonizar áreas remotas do Rio Grande do Sul, mormente durante o século XIX: é afirmado que o colono se utilizou da forma de vida gaúcha, perfeitamente adaptada às condições locais, para sobreviver no lugar. A segunda ou terceira geração destes imigrantes parece já ter adotado, em considerável medida, a vestimenta gaúcha, e se identificado como tal (ZATTERA, 1999, p. 317-328). As regiões litorâneas, porém, parecem ter se mantido um tanto afastadas da cultura gaúcha, em parte podendo ser isso explicado pela colonização portuguesa ter sido praticamente a única no litoral, e ao sistema escravagista utilizado pela mesma, que não necessitava da mão de obra gaúcha. Durante a primeira metade do século XX, o “castilhismo” foi a doutrina dominante na política institucional rio-grandense. Seu último grande representante parece ter sido Getúlio Vargas (1882 – 1954). Este, no entanto, apesar de ter poder para empoderar a figura do gaúcho, não tinha nenhum interesse na questão. A ligação das classes dominantes do Rio Grande do Sul agora se dava com os poderes centrais brasileiros, e não com os vizinhos do Prata da época em que a região era isolada, até o século XIX. Getúlio ambicionava o controle do Brasil, e foi no tempo de seu Governo que surgiu a ideia de forjar-se uma identidade nacional brasileira para unir todo o país, tão diversificado em termos culturais. Os símbolos estaduais foram proibidos, incluindo a bandeira e o hino rio-grandenses (RIBEIRO JR., 2016). É neste cenário que surge o movimento criado por Paixão Côrtes (n. 1927) e Barbosa Lessa (1929 – 2002), pretendendo reviver as tradições do gaúcho rio-grandense. Os antecedentes mais remotos do seu “Movimento Tradicionalista Gaúcho”, podem ser encontrados na fundação do Grêmio Gaúcho, de Cezimbra Jaques, em 1889. Esta agremiação, assim como o Partenon Literário, foi importante na divulgação das tradições gaúchas em seu tempo, organizando atividades de cunho artístico e cultural (OLIVEN, 1992, p. 25). A idealização das tradições gaúchas, no entanto, surge com a criação do Departamento de .

Tradições Gaúchas, anexo ao Grêmio Estudantil do Colégio Júlio de Castilhos, em Porto Alegre, no ano de 1947. No próximo ano, foi fundado o primeiro Centro de Tradições Gaúchas (CTG), o “35 CTG”, que serviu de modelo para outros centros, que se espalharam pelo Rio Grande do Sul, pelo Brasil e pelo mundo. A expansão dos centros, ao que parece, iniciou na zona de colonização alemã (CALVI, 2015). A partir do ano de 1954, os Congressos Tradicionalistas, realizados uma vez por ano, vão resultar na criação do Movimento Tradicionalista Gaúcho, no ano de 1966, em plena Ditadura Militar (MTG, 20--). Foi nesta época, inclusive, que o hino, o brasão e a bandeira rio-grandenses foram permitidos como símbolos oficiais do Estado15. A bandeira, permitida em sua integralidade, manteve a inscrição “República Rio-grandense”. Hobsbawm, ao falar sobre a invenção das tradições, aproxima-se do que ocorreu com a fundação do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), onde procura-se dar novas roupagens a formas históricas antigas: A utilização de elementos antigos na elaboração de novas tradições inventadas para fins bastantes originais. Sempre se pode encontrar, no passado de qualquer sociedade, um amplo repertório destes elementos; e sempre há uma abordagem elaborada. Composta de práticas e comunicações simbólicas (HOBSBAWM, 2002, p. 9-23).

Desta forma, estes tradicionalistas parecem ter se apropriado da figura do gaúcho, em parte se justificando tal fato pelo prestígio que o seu Movimento tem perante à sociedade regional. Após instituído, o MTG criou regras e padrões de conduta, de vestimenta e de apetrechos utilizados para atividades consideradas tradicionalistas para seus associados, criando uma cultura muito resistente a ideias exteriores. Esta característica tem origem em seus primeiros tempos, onde o movimento pretendeu ser uma reatividade identitária aos processos de globalização, à penetração de elementos culturais estrangeiros e à transitoriedade de modernidade (CALVI, 2015). Na obra já referida, Hobsbawm acrescenta: Consideramos que a invenção de tradições é essencialmente um processo de formalização e ritualização, caracterizado por referir-se ao passado, mesmo que apenas pela imposição da repetição. Os historiadores ainda não estudaram adequadamente o processo exato pelo qual tais complexos simbólicos e rituais são criados. (...) É mais difícil descobrir essa origem quando as tradições tenham sido em parte inventadas, em parte desenvolvidas em grupos fechados. (...) (HOBSBAWM, 2002, p. 13)

O que o Movimento chama de “culto à tradição” parece ser exatamente isto: uma formalização e ritualização de hábitos culturais campeiros heterogêneos, tomados 15

.

Na Lei estadual nº 5.213, de 5 de Janeiro de 1966.

conscientemente de locais geográficos e períodos de tempo relacionados ao Rio Grande do Sul, que não necessariamente refletem a realidade de qualquer momento histórico. Michel Falando sobre inovações com “ar de retorno” e sobre um retorno identitário, buscando a etnia, Agier comenta: Assistimos então a atitudes que se dão o ar de retornos (“retorno à etnia”) ou de recolhimento (“recolhimento sobre si”, “recolhimento identitário”, busca de “raízes”) quando, ao descodificar os processos e resultados de sua busca, descobrimos antes inovações, invenções, mestiçagens e uma grande abertura para o mundo presente. (AGIER, 2001, p. 10)

E, mais à frente: A ideia do “retorno à etnia”: ela dá a ilusão de um modelo preexistente, a etnia, em direção ao qual se faria uma regressão, quando os movimentos que designamos por essa expressão, se os apreendemos em suas lógicas particulares e atuais, são frequentemente inovações culturais e identitárias. (AGIER, 2001, p. 13)

O Movimento, por meio de seus afiliados, promoveu uma retomada artificial da cultura, evanescida desde o século XIX, talvez só presente nos recônditos mais remotos do Rio Grande do Sul. Seu padrão de vestimenta tende a omitir costumes considerados próprios do “gaúcho castelhano”, como rastras, vinchas, alpargatas e chiripás. Ademais, a mulher tradicionalista é admoestada a utilizar vestidos tradicionais de filhas de estancieiros do século XIX, não sendo permitido o uso de bombachas por mulheres, com exceção das atividades ditas “campeiras”. Hoje, muitos atores sociais utilizam os símbolos apropriados pelo Movimento sem ter consciência de ser seu ato uma expressão cultural, ou de agir sem o objetivo de “cultuar” a tradição conforme os ditames do MTG. Desta forma, chega-se ao século XXI com uma grande confusão sobre quem é o gaúcho. Enquanto escritores partidários de tendências de interpretação marxista da História engajam-se em “desconstruir mitos”, as novas perspectivas trazidas pela História Cultural dizem que os mitos fundadores de um povo também são História, e devem ser respeitados pelo que significam para o determinado povo. De forma similar, a abordagem construtivista da antropologia social também leva em conta estes fenômenos: Esse novo objeto torna particularmente pertinente para a antropologia social a abordagem da identidade que hoje chamamos construtivista e que permite dar conta dos próprios processos identitários, e não apenas de seu contexto ou do que neles está, de maneira mais ou menos oculta, em jogo. Segundo essa abordagem, a realidade é “construída” pelas representações dos atores, e essa construção subjetiva faz parte ela própria da realidade que o olhar do observador deve levar em consideração. (AGIER, 2001, p. 11)

Interessante notar que, ao longo do trabalho de pesquisa dos iniciadores do Movimento, muitas das partes faltantes do “quebra-cabeças” tiveram que ser importadas dos países vizinhos, assim como o foram a maioria dos ritmos musicais “de salão” que cairiam no .

gosto popular dos rio-grandenses nas décadas seguintes (REGIONALISMO, página virtual 2016). O gaúcho do MTG foi ainda forjado como um patriota brasileiro, criado no espírito cristão e na moral ocidental, com um comportamento de gentleman inglês. As tradições gauchescas foram ficando tão deliberadamente regradas que, com o passar do tempo, movimentos artísticos que não se enquadravam nas mesmas foram ficando conhecidos como “nativistas”, ao invés de “tradicionalistas”, sendo uma espécie de oposição. Além das imputações sobre o “abrasileiramento” do tipo humano gaúcho no Rio Grande do Sul, o Movimento Tradicionalista Gaúcho também é acusado de “engessar” a cultura, com suas muitas regras artificiais, e principalmente por ser um organismo patrocinado pelo Estado, obliterando as manifestações culturais “não-gaúchas” que ocorrem no Rio Grande do Sul (UNISINOS, [20--]). Manifestações talvez mais espontâneas e com uma continuidade histórica mais palpável, como tradições (mormente religiosas) de origem africana, tradições indígenas e tradições dos colonos europeus são pouco valorizadas pelo Estado, que anualmente se faz presente em atividades culturais ligadas ao MTG, como a Semana Farroupilha e o desfile da Chama Crioula, na capital do Estado (INFORMATIVO, 2012). A integração social do “ítalo-gaúcho” na região de Encantado/RS foi pesquisada em uma monografia acadêmica de 2015 (CALVI, 2015), relatando que a mesma só pôde se dar por meio do abandono das tradições itálicas e incorporação da cultura gaúcha, por meio de filiação a CTG’s, por exemplo, e este caso ilustra o prestígio social que o tradicionalismo gaúcho carrega, em detrimento das demais culturas sobreviventes no Estado. Ademais, as diferenças regionais dentro do próprio Estado, apesar de reconhecidas pelo Movimento, parecem ser preteridas para uma padronização ou estereotipificação do gaúcho do Rio Grande do Sul, em um modelo a ser “exportado” para fora do Estado, assim como do país. Assim, o gaúcho da Serra possui vestimenta, sotaque e etc., que se constituem em um background cultural que o distingue do gaúcho do litoral, do das Missões, do da Campanha e daquele do Sul do Estado, por exemplo. Apesar da participação de artistas rio-grandenses em festivais de folclore gaucho na Argentina (Festival de Cosquín e Festa Nacional do Chamamé, por exemplo) e no Uruguai (Festa da Pátria Gaúcha de Tacuarembó16), parece que boa parte da população rio-grandense desconhece que os países vizinhos possuem uma tradição, no mínimo, parecida. Após o fechamento 16

.

das

fronteiras,

no

século

XIX,

a

cultura

gaúcha

No original, “Fiesta de la Patria Gaucha”. (PATRIA GAUCHA, página virtual, 2016).

se

desenvolveu

independentemente nos países de fala castelhana e no Brasil, praticamente incógnitas uma para a outra. Essas diferenças sutis podem ser vistas na dança, nos ritmos musicais, nos instrumentos musicais utilizados nas composições de índole folclórica17. Porém, antropologicamente, são visivelmente duas “variações” históricas de uma mesma cultura ancestral. A este respeito, um especial jornalístico comenta: Júlio Ricardo Quevedo dos Santos, pondera que uma das grandes teses do tradicionalismo assenta-se na existência de severas diferenças entre os gauchos e os gaúchos: ‘Moisés Velhinho, intelectual santa-mariense, escreveu, nos anos 50 e 60, textos tentando provar a diferença entre o gaúcho rio-grandense e o gaúcho platino, numa visão que não permite a integração. E conclui esses trabalhos dizendo que o gaúcho rio-grandense é movido por valores nobres e cívicos, e por um sentimento de nacionalidade muito forte. Já o gaúcho platino é o caudilho sanguinário. Ainda hoje, essas ideias são repetidas no Movimento Tradicionalista Gaúcho. (DIAS e APPEL, 2016)

O Movimento Tradicionalista Gaúcho, hoje, porém, encabeça um diálogo com entidades folcloristas argentinas e uruguaias, em um organismo denominado Confederação Internacional da Tradição Gaúcha. No Uruguai, não há um organismo oficial que cuide da tradição gaúcha, havendo as chamadas “Sociedades Criollas”, “Sociedades Nativistas” ou “Sociedades Rurales” espalhadas pelo país. Na Argentina, há um intento de centralizar o cultivo da tradição na Confederação Gaúcha Argentina, organismo recente, que divide o território argentino em regiões tradicionalistas tal qual o MTG divide o Rio Grande do Sul, (e, mais recentemente, o Brasil). Com o advento da revolução das telecomunicações, especialmente por intermédio da rede mundial de computadores (internet), houve uma considerável aceleração no processo de globalização mundial. Entretanto, contrariamente ao que se esperava, ao invés de desaparecerem, vitimadas pela proliferação de elementos exógenos advindos de zonas “produtoras de conteúdo”, no contexto do capitalismo, muitas culturas se reforçaram. Barth argumenta que o contato com outros grupos pode, ao invés da perda identidade, contribui para reforçá-la (BARTH, 1998, p. 185-228). Sobre esse assunto, explica Agier: Se a identidade cultural experimenta hoje tamanha presença — tanto no domínio político global e local, como nos destinos individuais —, isso ocorre porque ela reúne duas exacerbações contemporâneas, na identidade e na cultura, que acabam por se encontrar. Por um lado, a exacerbação do caráter reflexivo da identidade, pois vivemos em meio a uma diversidade cada vez maior em termos de contatos, diferenças e disputas que colocam cada um de nós diante dos outros individualmente 17

Destaque para a gaita (acordeão), instrumento popularizado no Rio Grande do Sul por intermédio dos colonos italianos, tendo se tornado marca da música regional, em contrapartida à música folclórica do gaucho castelhano, marcada pela guitarra criolla (violão) (FIERRO, 2009; PÁGINA DO GAÚCHO, página virtual, 2016) .

e sem comunidade de pertencimento fixo, exclusivo ou definitivo. Por outro lado, e de maneira simétrica, a exacerbação do aspecto declarativo da cultura. (AGIER, 2001, p. 23)

Para este autor, a citada identidade cultural é exposta em face dos outros, ou do Estado, como fonte de legitimação de um determinado grupo. No entanto, todo este processo acaba favorecendo a dinâmica cultural, pois a cultura está em permanente mutação. Sejam quais forem as continuidades históricas ou não envolvidas no conceito moderno de um povo, Hobsbawm diz que estes conceitos sempre irão incluir um componente inventado, e que grande parte dos constituintes subjetivos da “nação” moderna consiste de tais construções. E vai além, dizendo que o fenômeno nacional não pode ser adequadamente investigado sem darse a atenção devida à “invenção das tradições” (HOBSBAWM, 2002, p. 22-23).

3. A QUESTÃO MEMÓRIA E IDENTIDADE NO RIO GRANDE DO SUL

A partir dos elementos expostos, é possível traçar um diálogo entre memória e identidade no tradicionalismo gaúcho, aos olhos da Sociologia. O modelo de gaúcho construído pelo tradicionalismo se baseia em um passado, real ou inventado, localizado na região sudoeste do Rio Grande do Sul, chamada de Campanha. Partindo deste modelo parecem orbitar todos os debates acerca da cultura gaúcha. Os historiadores do século XX descreveram a cultura rio-grandense como tendo se formado na perspectiva de uma fronteira (a do mundo luso-brasileiro) sempre ameaçada pelos vizinhos castelhanos (GUTFREIND, 2000). Conforme Gutfreind, esta historiografia sempre fez oposição entre o gaúcho riograndense e o gaúcho platino, porém, não é o que se revela visível a qualquer um que hoje assista a uma demonstração de danças tradicionais argentinas, por exemplo, quase indistinguíveis das de uma apresentação de CTG. Sendo assim, parece que o tradicionalismo acabou forjando uma imagem de gaúcho muito similar à que hoje integra o mundo dito tradicionalista na Argentina, que é muito similar ao do Uruguai. Cabe perguntar: Seria esta imagem condizente com a memória popular? Seria esta imagem satisfatoriamente representativa da identidade sul-rio-grandense? Apesar da subjetividade das questões, o Brasil moderno tem procurado articular e integrar suas regiões de uma forma efetiva, e este debate acaba por assumir um vulto de importância no que tange ao Estado mais sulino, e .

possivelmente mais isolado do país. Em uma perspectiva visivelmente nacionalista, as influências espanholas na colonização do Rio Grande do Sul parecem ter sido ignoradas ou obliteradas, considerando-se a fronteira como uma muralha cultural, onde trocas não seriam passíveis de ocorrer. Segundo Gutfreind (2000), havia no século XX um “discurso que construía uma identidade brasileira para o Rio Grande do Sul", no qual Othelo Rosa e Moyses Vellinho foram grandes expoentes. Esta oposição seria o reflexo americano de muitos séculos de rivalidades entre os dois maiores entes políticos da Península Ibérica – Portugal e Espanha. Sob a visão do gaúcho como expoente da identidade nacional, surge o Movimento Tradicionalista Gaúcho. Oliven (1998) conta que Barbosa Lessa, um dos fundadores do Movimento, apresentou em 1954 uma tese denominada “O sentido e o valor do Tradicionalismo”, que segundo ele se tornaria a tese-matriz do mesmo. Esta tese se baseava nos livros “Teoria e pesquisa em sociologia” (1945), de Donald Pierson, e “O homem” (1936), de Ralph Linton, ambos norte-americanos, que ainda teriam sido os principais inspiradores de Lessa ao fundamentar o movimento. Na mesma obra, Oliven (1998) conta o seguinte acerca dos sociólogos mencionados: Ambos os autores estavam preocupados com os efeitos do crescimento da população, as consequências da urbanização e as modificações na família e nos grupos locais, problemática recorrente nas ciências sociais da época, fortemente influenciadas pelos trabalhos de Durkheim, escritos na França no século XIX.

Assim, parece ficar delineado o contexto em que surge o tradicionalismo, em meio aos distúrbios sociais causados pelos intercâmbios culturais na primeira metade do século XX, estudados pelos autores que influenciaram Barbosa Lessa, e o surgimento no Brasil de um nacionalismo uniformizador, que buscava uma maior organização social, com mesmos interesses sociais, para uma eficiência do Estado. Assim, é possível compreender o intuito do movimento em padronizar, ou “tipificar”, como informa o título do presente artigo, o gaúcho do Rio Grande do Sul, para todas as regiões do Estado. Por meio deste viés, é possível ainda analisar-se a constituição moral que foi dada a este gaúcho construído pelo Movimento, como repleta de valores de retidão, coragem, resistência e apego à tradição campesina, para que conformassem um tipo ideal construtor da sociedade: “franqueza nas atitudes e nas palavras, o narcisismo, a bravura quixotesca, a instantaneidade impulsiva das resoluções, a veemente vocação cívica, a altanaria, o bom humor, mesclado a irreprimíveis explosões sentimentais e fatalistas” (LESSA, 2008, p.54-55). A valorização da família, pátria e humanidade como pilares da sociedade tinham como fundo o ideário de unificação do povo nacional, mas ironicamente, acabaram por reanimar uma identidade cultural perdida na História, que hoje .

distancia, e por vezes antagoniza, o povo sul-rio-grandense em relação ao restante do Brasil. DaMatta (2003), ao tratar sobre essa particularidade identitárias do Rio Grande do Sul, diz que essa ressignificação acaba ressaltada, por exemplo, quando o brasileiro tem “problema com quem ama a sua terra” (p. 9), dizendo na mesma lauda que “uma identidade é construída em oposição a outras, e é justamente esse oposto que é o ressaltado por quem é ‘estrangeiro’”. Este diálogo entre o local e o global é cada vez mais premente no contexto da globalização, haja vista a maior disponibilidade dos meios de comunicação. Atualmente, existe uma indústria cultural regionalista que reconhece a dificuldade que encontra seus produtos em ultrapassarem as fronteiras do Estado. Tais produtos tendem a se basear em uma época mítica perdida nas plagas da História, de forma saudosista, utilizando vestimentas e vocabulário que remetam e esta época, que é somada a discursos inflamados de supervalorização da terra e de eventos históricos cultuados neste meio. Falando desta cultura, DaMatta (2003, p. 9) ainda diz que a figura masculina é preponderante nos locais que, como o Rio Grande do Sul, têm a identidade forjada por questões políticas. Neste ambiente de globalização, ao fim das contas, parece que o gaúcho utiliza-se de suas raízes, reais ou imaginadas, para sobreviver na vastidão do novo mundo. A uma percepção mais expandida da própria identidade, e também das diferenças. A memória das gerações passadas sobre a identidade do gaúcho perde importância, face a uma caracterização padronizadora construída e adotada de um modo amplo, como defesa contra o mundo moderno, sendo paradoxalmente moderna. O fenômeno interessante do recrudescimento das identidades em face da globalização é comentado ainda por DaMatta, ao dizer que identidades fortes não são facilmente desfeitas neste ambiente: “No fundo, as identidades estão ligadas a experiências elementares e não apenas a experiências intelectuais. A identidade gaúcha, por exemplo, tem uma base muito sólida nos costumes, na realidade, no cheiro, na comida, até no ar que se respira no Sul.” O autor ainda defende que o que motiva as pessoas a irem para a guerra é porque defendem uma identidade: “Se fosse tão fácil mudar a identidade de um povo de uma hora para outra, o mundo seria muito mais manipulável.” Candau (2011 apud MATHEUS, 2011), ao falar da já citada memória social incorporada, tal como se expressa, por exemplo, nos gestos, nas práticas e na linguagem, cujo exercício é realizado quase automaticamente, sem um julgamento prévio de se estar praticando o tradicionalismo ou cultuando tradições elevadas a tal pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho, diz que esta manifestação de identidade é muito mais profunda, .

derivada do que chama de “protomemória”. Neste conceito, protomemória seria o próprio senso prático, pois o passado aí já não seria nem sequer representado, estando presente no agir coloquial. Caberia perguntar se a protomemória que, manifesta no gaúcho comum de hoje a partir de um passado cultural deveras complexo, conformando sua identidade, está alinhada com o gaúcho tipificado pelo Movimento. Isso por que, dos três tipos de memória que trata o autor, o segundo é a evocação voluntária, segundo as crenças, os saberes, que se beneficiam da cultura de memória que promove sua expansão em extensões artificiais. Já o terceiro, que o mesmo chama de “metamemória”, é a memória que é reivindicada a partir de uma filiação ostensiva, que influencia nas construções identitárias. Sendo que as duas primeiras são consideradas por Candau faculdades individuais, somente a metamemória pode ser compartilhada, por se constituir em um conjunto de representações da memória, que por seu turno são formadas por enunciados que um grupo produz sobre uma memória supostamente comum a todos os seus membros. Sendo assim, parece haver uma distinção básica entre a memória espontânea, resultante da continuidade histórica das tradições gaúchas, e a memória enunciada por um determinado grupo com poder social para tanto, mas que não necessariamente se baseie na memória real, talvez por esta não precisar ser enunciada, estando viva. Já outros autores que lidam com a questão da memória e identidade, como Michael Pollak (1992) e Jacques le Goff (1990), veem a memória como um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações, mudanças constantes. Pollak (1992) distingue na memória pontos que foram efetivamente vividos pelo indivíduo ou pela coletividade, e pontos que foram “vividos por tabela”, ou seja, acontecimentos vividos pela coletividade ou grupo ao qual o sujeito se sente pertencer. Este ponto interessa ao presente trabalho, pois tais acontecimentos podem vir a ser enunciados de uma forma distorcida da realidade com que ocorreram, e por influência dos enunciadores virem a ser incorporados como memória “vivida por tabela” em uma grande coletividade, no caso, os interessados em preservar as tradições gaúchas conforme enunciadas pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho. Segundo Pollak, é “perfeitamente possível que, por meio da socialização política, ou da socialização histórica, ocorra um fenômeno de projeção ou de identificação com determinado passado, tão forte que podemos falar numa memória quase que herdada” (1992, p. 2). E mais adiante: “A memória também sofre flutuações que são função do momento em que ela é articulada, em que ela está sendo expressa. As preocupações do momento constituem um .

elemento de estruturação da memória” (1992, p. 4). Para ele, há uma ligação muito estreita entre a memoria e a identidade, embora se trate de um sentimento de identidade muito superficial, que trata da imagem construída e apresentada de si. Ao falar de continuidade versus ruptura, tema deste trabalho, Pollak (1992) recorre à psicanálise para evocar as reações patológicas que podem decorrer de uma ruptura forte do senso de continuidade que constrói a memória e a identidade do indivíduo, e que tais considerações poderiam ser aplicadas também ao coletivo: A memória é um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator extremamente importante do sentimento de continuidade e de coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução de si. (Pollak, 1992, p. 5)

De forma análoga, Jacques le Goff (2000) vai lembrar que a memória coletiva é diferente da memória dos historiadores: A primeira é essencialmente mítica, deformada, anacrônica, mas constitui o vivido desta relação nunca acabada entre o presente e o passado. É desejável que a informação histórica, fornecida pelos historiadores de ofício, vulgarizada pela escola (ou pelo menos deveria sê-lo) e os mass media, corrija esta história tradicional falseada. A história deve esclarecer a memória e ajudá-la a retificar os seus erros.

Escritores populares, apesar de possuírem algumas obras feitas com ampla pesquisa histórica, não costumam ter compromisso com a academia, mas interesse natural em polemizar para vender mais volumes. Talvez se explique, assim, a quantidade de obras antitradicionalismo e “desconstrutoras de mitos”, em geral, que desconsideram particularidades sociológicas do recorte histórico “cultuado” pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho. Adiante, na mesma obra, lembra-se que: “O historiador não tem o direito de prosseguir uma demonstração, de defender uma causa, seja ela qual, for, a despeito dos testemunhos” (LE GOFF, 2000, p. 28). “Se a memória faz parte do jogo do poder, se autoriza manipulações conscientes ou inconscientes, se obedece aos interesses individuais ou coletivos, a história, como todas as ciências, tem como norma a verdade” (idem, p. 32). Como no presente texto trata-se do gaúcho histórico, cabe analisar o fenômeno de sua eventual ruptura com o passado, levando a perturbações identitárias que podem ser aproveitadas por um grupo social interessado em fomentar valores e visões sobre a coletividade em que atua, fragilizada pelo fenômeno, que também pode se dar pela perda da memória coletiva, trabalhada por Le Goff (2000, p. 425): Ainda é mais evidente que as perturbações da memória, que, ao lado da amnésia, se podem manifestar também no nível da linguagem na afasia, devem em numerosos casos esclarecer se se também à luz das ciências sociais. Por outro lado, num nível metafórico, mas significativo, a amnésia é não só uma perturbação no indivíduo, que envolve perturbações mais ou menos graves da presença da personalidade, mas .

também a falta ou a perda, voluntária ou involuntária, da memória coletiva nos povos e nas nações que pode determinar perturbações graves da identidade coletiva.

Conforme já foi dito, no processo de retomada da tradição gauchesca, já muito prejudicada pela europeização do Estado, os fundadores do Movimento realizaram pesquisas de campo, colhendo memórias da tradição oral e da cultura gauchesca remanescente, mas a traduziram como homens de seu tempo, de acordo com as visões políticas do grupo. De certa forma, parece ter havido um distanciamento entre o gaúcho tipificado pelo MTG do gaúcho da época dos seus primeiros congressos e a memória coletiva dos remanescentes gaúchos da Pampa, que se aprofundou com o passar das décadas, muito embora estes também tenham incorporado conceitos dos tradicionalistas devido ao prestígio social do Movimento.

CONCLUSÃO

Com base no que foi exposto, é plausível concluir que, aos olhos da Sociologia, a questão cultural gaúcha gera um ufanismo que ultrapassa o mero “bairrismo”, assemelhandose a um verdadeiro patriotismo em relação ao Rio Grande em si (ou à Republica Riograndense, como preferem os separatistas/independentistas), que a população não sabe ao certo como expressar, em um contexto de pertencimento ao Brasil. Este ufanismo pode ser conferido a cada dia 20 de setembro, feriado estadual, declarado “Dia do Gaúcho”18 onde desfiles e atividades culturais promovidas em sua maior parte pelo MTG, promovem e reforçam o estereótipo do gaúcho criado pelo movimento, não pertencente a nenhuma época ou local específico, mas escolhido como “gaúcho médio”, unindo uma colcha de retalhos que não necessariamente reflete o gaúcho enquanto elemento histórico, muito menos representa o habitante das mais diversas regiões do estado, especialmente onde a cultura teutônica, itálica ou africana são preservadas sem as rupturas que ocorreram na história cultural do gaúcho riograndense. No primeiro capítulo, houve um retrospecto histórico do homem do Rio Grande do Sul; seus indígenas mais antigos, que passaram conhecimento do ambiente natural aos primeiros europeus povoadores. A colonização espanhola a partir das Missões, no oeste, e a

18

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Lei Estadual nº 9.405, de 25 de outubro de 1991.

portuguesa que avançava sobre a primeira, a partir do litoral. Falou-se do ambiente de guerras de fronteira e da fronteira marginalizada e inóspita, que dava origem ao contrabando. Explicou-se como os primeiros gaúchos, usados em guerras de fronteira em ambos os lados, acabaram por desenvolver uma identidade ligada à vida rústica do ambiente e à guerra. Destacou-se a influência dos Estados do Prata sobre o habitante do Rio Grande do Sul, que culminou na tentativa de independência do território, proclamada em 1836, e prosseguiu pelas diversas revoluções e guerras que se seguiram no Cone Sul, onde o gaúcho participou, e que agregou elementos à sua identidade. Se concluiu, dali, que o gaúcho é uma cultura com fala, indumentária, costumes, código de conduta e valores próprios, que se formaram e se modificaram ao longo de vários séculos, antes de sua união efetiva com o Estado brasileiro. Na segunda parte do presente artigo, analisou-se a cultura “gauchesca”, gerada pela junção dos elementos rememorados na primeira parte. Falou-se da visão do gaúcho/gaucho como símbolo do Cone Sul por autores da literatura regionalista da Argentina, Uruguai e Brasil. Enquanto isso, enfatizou-se o desaparecimento do loco de atuação do gaúcho, com o cercamento dos campos e efetivo fechamento da fronteira, fim do ciclo das tropeadas e fim do ciclo do charque, com a abolição da escravidão no Brasil. Tendo o gaúcho se tornado peão assalariado ou estancieiro, seus valores mudaram, e sua integração à sociedade sul-riograndense europeizada refletia a integração cada vez maior do Rio Grande do Sul ao poder central do Brasil. No campo da cultura, dois elementos influenciaram a valorização do gaúcho como símbolo mítico do Rio Grande: o romantismo literário do século XIX e o positivismo, que buscava, em seus ideais políticos, mitos fundadores para a civilização rio-grandense, que unissem um povo tão heterogêneo em torno de um passado idealizado comum. Os reflexos do positivismo castilhista chegariam até o Estado Novo, quando se transferiram do Rio Grande do Sul ao Brasil por meio de Getúlio Vargas, culminando com a queima das bandeiras estaduais e proibição destes símbolos, objetivando a unificação nacional. Nesta época, movimentos de resistência cultural começaram a aparecer, combatendo ainda os primeiros reflexos da globalização no estado, vindo o principal a se oficializar como Movimento Tradicionalista Gaúcho. Destacou-se a apropriação que este Movimento realizou da figura do gaúcho, distorcendo-a e padronizando-a com visões politicas próprias, estendendo esta visão por meio de prestígio social adquirido, a todo o Rio Grande do Sul e além. Foi abordada a problemática do distanciamento deliberado do gaúcho rio-grandense de seu cognato platino, a transformação das particularidades culturais do gaúcho de cada região do estado em um .

padrão único a ser cultuado e o “engessamento” da cultura que não permite revisões e seu desenvolvimento orgânico, resultando no mantenimento de valores retrógrados como machismo e homofobia em alguns casos. Ainda pincelou-se que este fenômeno de retorno às origens foi comum no período do pós-guerra, com o aumento da globalização e industrialização, em diversos locais do mundo ocidental, gerando distúrbios identitários que eventualmente rebentaram em revoluções autonomistas. Neste capítulo, tratou-se das visões de Eric Hobsbawm e Michel Agier a respeito da invenção das tradições e dos distúrbios identitários refletidos na cultura. Concluiu-se, daí, que ao longo do século XX, a figura do gaúcho foi resgatada artificialmente por um movimento que pretendia a criação de um culto cívico a valores e símbolos ditados como verdade histórica e que ganhou prestígio devido ao apelo ao ufanismo e apego à terra herdado pelo povo rio-grandense de processos históricos os mais diversos. Já no último bloco deste estudo, tratou-se da questão sociológica da memória e identidade no contexto rio-grandense, retomando-se a identidade baseada em um passado mítico propagado pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho. Pincelou-se o obliteramento da carga cultural castelhana na cultura local, como resquício histórico da rivalidade peninsular entre Portugal e Espanha. Abordou-se a influência de sociólogos americanos para a criação do Movimento. Destacou-se o conjunto de valores de retidão e civismo propagados pelo tradicionalismo, e seu impacto no distanciamento cultural do Rio Grande do Sul em relação ao Brasil. A oposição da identidade gaúcha à brasileira foi dialogada com Roberto DaMatta, assim como a diminuição da importância da memória sobre o gaúcho frente a um modelo padronizado para a luta contra o mundo moderno, que seria, paradoxalmente, moderno em si. Evocou-se Joël Candau para tratar da memória social incorporada, como no caso do homem do Rio-Grande do Sul que pratica o tradicionalismo (ou tradições elevadas a tal pelo Movimento) sem ter consciência disto. Dialogou-se com Candau em sua teoria trina da memória, onde se verificou que a metamemória é enunciada por um grupo como supostamente comum a todos os membros, em contraposição à protomemória, natural e presente nos atos do cotidiano. Falou-se da memória e identidade em Michael Pollak, que teoriza acerca de memórias vividas “por tabela”, herdadas, não tendo sido realmente vivenciadas pelos sujeitos, mas aceites como parte de sua história, como é o caso da projeção ou identificação a um passado mítico, propagado pelo Movimento. Viu-se como Pollak também admite que a memória possa sofrer flutuações quando é articulada e exposta, em .

razão das preocupações do momento, e dos distúrbios identitários que podem decorrer do rompimento abrupto do senso de continuidade que constrói a memória. Também se recordou as teorias de Jacques Le Goff, sobre a memória coletiva mítica que liga o presente ao passado e sua oposição à memória dos historiadores, que têm o papel de esclarecer e retificar esta memória, embora, no Rio Grande do Sul, alguns historiadores populares ultrapassem este papel, tornando-se verdadeiros militantes contra o tradicionalismo e contra a cultura gauchesca em si. Como Pollak, viu-se como Le Goff também tratou da “ruptura versus continuidade”, quando trata da falta ou da perda, voluntária ou involuntária, da memória coletiva dos povos, ocasionando perturbações graves na sua identidade. Concluiu-se deste capítulo, que teóricos sociais de reconhecida importância já trabalharam com a temática da memória e identidade, assim como do tema ruptura e continuidade destas, alertando sobre os perigos ocasionados pela perda da memória coletiva e da enunciação de uma memória deliberada, com o propósito de obter determinado poder social, propagar valores, etc. Já se disse que, se “o Brasil está de costas para a América Latina e de frente para a África”. Seguindo-se esta lógica, poder-se-ia também dizer que o Rio Grande do Sul está de costas para o Brasil e de frente para seus vizinhos do Prata, em se tratando de cultura regional. Em um contexto de revisão permanente das tradições na era das comunicações, onde um contato como nunca houve entre os povos suscita reflexões sobre a própria identidade, parece factível supor que o tradicionalista gaúcho, assim como o nativista, encontrará um diálogo com seus análogos dos países do Cone Sul, assim como refletirá acerca do “encaixe” que a sua cultura encontra naquela que é exportada como cultura brasileira, pelo centro do país. O repúdio dos mitos fundadores parece ter pouca importância, quando Hobsbawm nos diz que os mesmos são inerentes a qualquer povo ou nação, servindo como elemento diferenciador e aglutinador. O Movimento Tradicionalista Gaúcho, apesar de sua rigidez em regrar uma forma artificial de cultura, tem pouco impacto na cultura real, vivida pelo homem do campo, que se utiliza diariamente de ritos apropriados pelo tradicionalismo sem consciência disto, e no qual a cultura segue o seu ritmo, naturalmente dinâmico. Assim, conclui-se que no caso do gaúcho tipificado pelo MTG, houve um processo de ruptura histórica, onde uma cultura regional já abandonada na sua quase totalidade foi retomada artificialmente, ressignificada e reestruturada, e com o auxílio do Estado foi incorporada como legítimo vínculo com o passado e elemento aglutinador do povo riograndense, preterindo outras culturas que ainda se mantém vivas no estado, com a qualidade .

de “não-gaúchas”. Porém, não é possível definir se houve uma relação de total ruptura ou de total continuidade com o passado no caso do gaúcho comum, sendo que a forma de gaúcho propagada pelo tradicionalismo, apesar de influenciar, não determina, e acaba sendo resultado do dinamismo da cultura do homem do Rio Grande do Sul.

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