Contribuições do tutor e sede para as aprendizagens de alunos na educação modalidade a distância

August 13, 2017 | Autor: Vanice Dos Santos | Categoria: Ead, Redes Sociais, Educação a Distância
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Sobre a possibilidade de uma prática reflexiva na educação modalidade a distância Vanice dos Santos1 Rosane Aragón de Nevado2 RESUMO: Neste trabalho apresentamos algumas reflexões sobre a viabilidade de um pensar e de uma prática reflexiva nos ambientes virtuais de educação. Questionamos se nos modos de trabalhar a educação na modalidade a distância é possível o diálogo. Partimos da compreensão da tese de Heidegger de que o homem é um ser filosofante e da noção piagetiana de que o desenvolvimento acontece da interação do sujeito com o mundo. Assim, defendemos a idéia de que o homem é um ser filosofante, aprendente e que tem a técnica como elemento a considerar. Escolhemos o Curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância – Anos Iniciais do Ensino Fundamental/UFRGS e nele buscamos os pressupostos pedagógicos, didáticos, metodológicos e tecnológicos a fim de identificar a possibilidade de uma formação reflexiva e autônoma. Dentre os agentes do processo de ensino e de aprendizagem no referido Curso escolhemos o tutor de sede e fizemos análises das suas intervenções. Nosso objetivo é verificar as contribuições do tutor de sede na construção do pensamento dos alunos em ambientes virtuais de aprendizagem. Palavras-chave: Filosofar, pensar, educação a distância .

Este trabalho tem origem nas investigações empreendidas no Programa de Pós-Graduação em Educação, linha de pesquisa educação a distância, em curso na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nossa intenção é olhar para o fenômeno da construção do pensamento em ambientes virtuais, especificamente no Curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância – Anos Iniciais do Ensino Fundamental/UFRGS3. Do Curso Pead/Ufrgs destacamos algumas especificidades quanto a sua estrutura e seu projeto pedagógico. Duas principais características4 são identificadas quanto ao tecnológico e quanto ao metodológico. Em relação à primeira é priorizado o uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação, ou seja, reconhecimento das potencialidades dessas tecnologias para um trabalho que deve lidar com a re-significação, em relação aos cursos presenciais, quanto ao espaço e o tempo. De outro modo, um cuidado em como estabelecer as relações previstas para a educação, também através dos ambientes virtuais de aprendizagem.

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Doutoranda em Educação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Mestre e Licenciada em Filosofia pela UNISINOS. Professora de Filosofia da Educação na Faculdade de Educação da UFRGS. Contato: [email protected] 2 Professora no Programa de Pós-Graduação em Educação e coordenadora do Curso de Pedagogia na modalidade a distância da UFRGS. Doutora em Informática na Educação, Mestre em Psicologia da Educação e Graduada em Psicologia pela UFRGS. Contato: [email protected]. 3 Doravante citaremos como Curso Pead/Ufrgs. 4 Apresentadas no Guia do Professor (2006).

Quanto ao metodológico, visto ser um Curso destinado a professores em exercício 5, a orientação (objetivos) é de trabalho de formação acadêmica que vincule a reflexão teórica e a recriação das práticas. O Curso Pead/Ufrgs é organizado em 9 semestres6, sendo que em cada um deles as interdisciplinas7 são desenvolvidas a partir de um eixo temático e organizadas por um Seminário Integrador. Embora haja a organização por semestre, sua estrutura curricular é, no todo, entendida como uma matriz orgânica, concebida na forma de rede. Rede pelas interligações, por exemplo, de um campo de saber com outro (interdisciplinas); do saber acadêmico que contempla as práticas (tópicos desenvolvidos nas interdisciplinas); do saber prática com o saber teórico (alunosprofessores, ou seja, os alunos do Curso já atuam como professores das séries iniciais mas ainda sem formação acadêmica para tal); da reflexão teórica que permite re-criar a prática. Destacamos algumas idéias e conceitos8 prioritários para a efetivação da proposta pedagógica do Curso Pead/Ufrgs: que a formação se dê como processo autônomo; formação profissional orientada para o desenvolvimento da autonomia intelectual e a postura críticoreflexiva; interação; cooperação; cultura de redes cooperativas; metodologia interativa e problematizadora; aprendizagem numa perspectiva investigativa. Investigamos a idéia do humano enquanto filosofante, portanto aprendente (ou vice-versa), compreendendo que a aprendizagem pode acontecer com a imersão do interrogante naquilo que lhe é questão. A imersão na problemática e seus desdobramentos em busca do conhecimento, esse processo, caracteriza a constituição da existência humana. A adesão ao Curso Pead/Ufrgs, a seu projeto pedagógico e acompanhando seu desenvolvimento, evidenciaram a necessidade de investigar e elaborar uma compreensão acerca da extensão do trabalho do tutor de sede 9 na aprendizagem dos alunos nesse ambiente.

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Os alunos são professores da rede pública, do Rio Grande do Sul em exercício e devem atuar na própria cidade ou em cidades circunvizinhas do Pólo a qual pertencem. Há o Pólo de Três Cachoeiras, o Pólo de Alvorada, o Pólo de Gravataí, o Pólo de Sapiranga e o Pólo de São Leopoldo. 6 As aulas do Curso tiveram início em 2006/2; na presente data (2009/2) o Curso está em seu sétimo semestre. 7 O Curso tem como pressuposto a aprendizagem em rede. Para tal concepção fez-se mister re-organizações, dentre elas de disciplinas enquanto componentes curriculares para interdisciplinas. Essa concepção contempla a idéia de interligação dos saberes. 8 Encontradas no Guia do professor (2006) e no Guia do tutor (2006). 9 O Curso conta também com o trabalho de professores, que são responsáveis pela elaboração de materiais e definição das atividades a serem desenvolvidas pelos alunos. Optamos pela ênfase, nesta pesquisa, pela atuação do tutor de sede pois estes, sob a orientação dos professores, em concordância com a orientação pedagógica do Curso, acompanham todo o processo dos alunos e comentam as atividades realizadas por aqueles e acolhem as diversas questões dos alunos.

Os pressupostos teóricos sobre os quais trabalhamos são da fenomenologia hermenêutica heideggeriana e do interacionismo construtivista, de Piaget. Pela Filosofia estaremos orientados pela tese de que o homem é um ser filosofante. Pela educação, pela concepção de que o conhecimento/desenvolvimento do ser humano ocorre pela interação entre o sujeito e o meio. Vislumbramos uma aproximação entre as teorias acima mencionadas no que se refere a necessária relação entre sujeito e mundo para que ocorra o desenvolvimento da cognição ou, o conhecimento, e para que se dê a compreensão de mundo. Adentrar numa investigação sobre o que ocorre com os sujeitos enquanto imersos em ambientes virtuais nos parece relevante dada a profusão dos cursos ofertados na modalidade a distância hoje via internet. Além do fato de que o homem tem lidado com as tecnologias digitais. Sobre a idéia de ciência nosso foco estará no conceito grego de technè retomado por Heidegger. A educação a distância permite um ensino assíncrono (diferentemente do presencial) assim como uma reconfiguração espaço-temporal. Cada participante do processo de ensino e de aprendizagem administra seu tempo, seja ele de acesso aos materiais postados no Curso mas, sobretudo pelo tempo que é necessário para a reflexão e a escrita de seus pensamentos. Isso propicia/permite maturação das idéias, cuidado na leitura dos materiais do Curso e dos escritos dos colegas para que então, após refletir, trabalhe no registro das mesmas. A educação a distância surgiu para complementar o ensino regular e encurtar as distâncias geográficas. No Brasil, com a propagação das mídias eletrônicas e o ingresso a elas, algumas populações residentes em áreas de difícil acesso puderam ingressar em institutos de educação. A demanda gerou a profusão de cursos de educação a distância, sobretudo na década de 90 e início dos anos 200010. Não havendo parâmetros definidos sobre estruturação dos mesmos um novo problema se apresentou para a educação: cursos oferecidos sem a evidência de concepções teóricometodológicas, sem definição dos agentes da educação, sem a previsão e adequação dos recursos tecnológicos necessários, entre outros. Diante disso, a Secretaria de Educação a Distância/MEC publicou o documento Referenciais de Qualidade Para Educação Superior a Distância 11 com o objetivo de qualificar, 10

A implantação dos primeiros cursos se deu amparada na Lei 9.394/96 (LDB) que apenas enunciava a possibilidade da oferta de ensino nesta modalidade. 11 Trata-se da versão mais atualizada de um documento que teve sua origem em 1997, reformulado em 1998 e devido sua grande recepção pela comunidade acadêmica tornando-se referência para as comissões de avaliação de cursos a distância.

reconhecer o orientar os diversos momentos da educação a distância, após consulta a especialistas da área modifica a versão inicial e assinala parâmetros que não podem estar ausentes como: a organização do sistema, as concepções teórico-metodológicas, aspectos pedagógicos, recursos humanos e infra-estrutura. Sendo nosso interesse a efetiva aprendizagem torna-se premente a valorização dos sujeitos envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem. Assim sendo, importa-nos dar a conhecer o que faz-se mister para uma intervenção que contribua para aprendizagens significativas. Se nossa época nos oferece a educação a distância, não podemos nos furtar a tarefa de nos ocuparmos dela, empreendendo na tarefa de aprender, refletir e investigar sobre esse universo da educação. O homem e sua relação com a filosofia, a educação e a ciência Abordaremos aqui a filosofia não através de caracterizações temáticas mas como algo que faz parte do humano. Fazer parte enquanto possibilidade. Sendo assim, interessa-nos observar sobre a possibilidade da prática reflexiva da educação a distância em ambientes virtuais. Heidegger, na Introducción a la filosofía, ao expor sobre tal tarefa (de uma introdução à filosofia) indica-nos que não estamos absolutamente fora da filosofia, e isso não porque acaso contamos já com certos conhecimentos de filosofia. Ainda quando não sabemos nada de filosofia, estamos já na filosofia, porque a filosofia está em nós e nos pertence e, por certo, no sentido de que filosofamos já sempre. Filosofamos inclusive quando não temos nem idéia disso, inclusive quando „não fazemos‟ filosofia. Não é que filosofemos neste momento ou aquele, senão que filosofamos constantemente e necessariamente enquanto que existimos como homens. Existir como homens, ser aí como homens, da sein como homens, significa filosofar. O animal não pode filosofar. Deus não necessita filosofar. Um Deus que filosofasse não seria Deus porque a essência da filosofia consiste em ser uma possibilidade finita de um ente finito. Ser-homem significa já filosofar. A existência humana, o ser-aí humano, o Dasein humano, está já como tal na filosofia, mas por essência, não em ocasiões sim e em ocasiões não, ou umas vezes sim e outras não. Mas porque o ser-homem tem diversas possibilidades, múltiplos níveis e graus de lucidez, pode o homem estar na filosofia de formas diversas (HEIDEGGER, 2001, p. 19).

Isto posto – que a filosofia não é algo que está fora de nós e que a existência humana está ligada ao filosofar, que a educação/o aprender está ligada a existência - é necessário continuar tratando da possibilidade da prática reflexiva na educação a distância em ambientes virtuais, tal qual uma introdução à filosofia. Concordamos com Heidegger que se trata de fazer despertar a filosofia em nós. A filosofia há de ficar livre em nós, quer dizer, há de converter-se em íntima necessidade de nosso ser mais próprio, de nossa mais própria essência, de sorte que dê a esse ser ou a

essa essência sua mais própria dignidade. Agora bem, o que assim há de ficar livre em nós temos de assumi-lo em nossa liberdade, somos nós mesmos os que temos de tomar e despertar livremente o filosofar em nós (HEIDEGGER, 2001, p. 20).

Se filosofar requer a implicação do filosofante, no processo de apropriação do mundo, do conhecimento e da cognição, a prática reflexiva na educação a distância produz na relação com o conhecimento, entre aprendente e saber, efeitos de formação. Não se trata apenas de um apossar-se dos conhecimentos produzidos ao longo da história. Quando Heidegger, ao mostrar a insuficiência do filosofar enquanto apropriação de conhecimentos acumulados, apontando para a pré-compreensão da filosofia, não estava desconsiderando a tradição filosófica, mas sim que a visão puramente historiográfica ou a apreensão de conceitos filosóficos estaria mais para a aquisição de conhecimentos sobre filosofia do que para o fazer filosofia. “Na existência há de colocar-se em marcha o filosofar. [...] Em nossa existência o Dasein mesmo tem que fazer suceder o filosofar” (HEIDEGGER, 2001, p.21). Pôr em marcha o filosofar, quer dizer, quando nos dispomos a tratar de filosofia há o nosso querer, fazer e omitir. Identificamos nessas idéias uma proximidade com aquelas pretendidas no Curso Pead/Ufrgs, sobretudo no que se refere a um trabalho na direção de formação como processo autônomo, de desenvolver a autonomia intelectual. Poderia alguém desenvolver a autonomia sem implicar-se ou, omitindo-se? A pré-compreensão da filosofia se liga à disposição, ao compromisso para com o nosso existir, pois se é em nossa existência aqui e agora que queremos deixar livre a filosofia, liberar o filosofar, e se a tarefa desta introdução é pôr em marcha a filosofia, então é a partir desta nossa situação como haveremos de obter também uma certa compreensão do que significa filosofia (HEIDEGGER, 2001, p. 23).

A interação e a cooperação exigem disposição dos sujeitos. No caso do Curso Pead/Ufrgs há uma mobilização para a interação e para a cooperação através de trabalho em equipes (entre professores; professores-tutores; professores-alunos; tutores-alunos; alunos-alunos). Há ainda provocação para a manifestação dos aprendentes (alunos-professores), de suas reflexões, teorizações e para a construção também a partir do diálogo na sua forma escrita. Em muitas situações de ensino e de aprendizagem é solicitado que um 12 leia o trabalho de outro e registre as 12

Mencionamos “um” de modo genérico pois, em algumas ocasiões pode ser o professor, noutras o tutor, noutras um colega, ou em alguma situação mais de um agente educacional se manifestam.

suas considerações para que aquele, depois de ler, volte e reflita suas próprias considerações e possa re-escrevê-las. Presente está a idéia de pôr em movimento. Aqui não queremos aprender filosofia, não queremos agregar a nossa especialidade uma especialidade mais, nem completar nossa especialidade com outra especialidade mais, e não o queremos porque a filosofia não é „especialidade‟ alguma. Filosofar não é um assunto de habilidade e técnica, muito menos um jogo de ocorrências indisciplinadas. Filosofia é filosofar e nada mais. E do que se trata é de entender algo tão simples. Dizíamos: a existência não está nunca fora da filosofia, senão que esta pertence a essência do existir (da Existenz) da existência do Dasein (HEIDEGGER, 2001, p. 25).

A filosofia aqui compreendida coloca „esse ente [o homem] é excêntrico‟ (26). “Pois isto é precisamente o que o filosofar colocará manifesto, a saber: que é precisamente em virtude dessa sua mais íntima essência que o homem se vê arremessado fora de si mesmo e mais além de si mesmo e não pode ser absolutamente propriedade de si mesmo” (26). Ainda para o esclarecimento do que é o próprio da filosofia, buscamos em Heidegger 13 a expressão filosofia, mais especificamente, os significados gregos da expressão sophía, dentre os quais destacamos: o entender a fundo; o entender com instinto imediato e o entender como saber e poder algo de forma exemplar. Nossa tarefa enquanto investigando a educação a distância e a possibilidade de uma prática reflexiva talvez deva se aproximar do exemplo mencionado anteriormente: “Quanto mais o sophós é um entendido que, em uma relação originalmente livre, em uma relação de familiaridade e confiança com as coisas, luta sem cessar pela compreensão delas, tanto mais se descobre como philósophos” (2001, p. 37). Não há intenção de tornar filósofos os alunos-professores do Curso Pead/Ufrgs mas sim de propiciar situações para o implicar no seu pensar e fazer. Heidegger examinou ainda a composição dos nomes de algumas ciências, como filo-logia. Ao carregar a expressão “logia”, o termo traz a idéia do logos, do tornar manifesto. A filologia significa tornar manifesto (conhecer) a linguagem. Neste “simples” observar reconhecemos que filosofia não é filologia, reconhecemos que filosofia não é conhecimento da sabedoria (39). Nosso entendimento de possibilidade de uma prática reflexiva na modalidade ead, neste esteira, não se refere a um acúmulo dos conhecimento amplamente disponíveis na web, mas que o aprendente produza um saber próprio, singular que confere a sua exsistencia, seu da-sein. Uma das questões presente na educação hoje, ao lado de problemáticas já existentes, é a questão da técnica. Por certo que a técnica e as diversas implicações para o campo da educação não é um fenômeno novo. A técnica enquanto technè pode ser entendida no seu caráter instrumental,

como aquilo que o homem manipula, mas também pode ser tomada como aquilo onde repousa o conhecer. Técnica deriva de technè, termo que em sua origem grega estava ligado a epistemè. Enquanto técnica instrumental refere-se a qualquer coisa, por exemplo aparelho ou instrumento de trabalho que o homem usufrui na perspectiva de uma utilidade. Enquanto ligada a epistemè encontramo-la com o sentido além de um fazer, mas de um saber. Com a técnica, no fato de produzir e ter esse algo, isto possibilita ao homem uma nova abertura para a compreensão. A técnica diz da coisa humana, imaginada, desenvolvida, estabelecida pelo homem e para o homem. O homem se reconhece naquilo que foi criado e é provocado pelo que está disponível, pelo que se manifesta da técnica. Nesse sentido o homem cria a ferramenta e esta o recria. O que do homem se manifesta na technè dos ambientes virtuais de aprendizagem? Mais especificamente, quais as contribuições das intervenções do tutor de sede na construção do pensamento do aluno expressa nos ambientes virtuais de aprendizagem?

Uma análise no fenômeno educação a distância A atual legislação14 contempla e regulamenta a criação e o desenvolvimento de diversos cursos15 na modalidade a distância e a diversidade de concepções teórico-metodológicas possibilita distinção de atribuições para diversos papéis, por exemplo, as atribuições do tutor. No Curso Pead/Ufrgs, encontramos o tutor de sede e o tutor de pólo. Dado que o tutor de sede deve ter formação específica na interdisciplina em que trabalhará e tem em suas atribuições “facilitar e acompanhar o acesso dos estudantes aos enfoques temáticos e às atividades relacionadas” (GUIA DO TUTOR, 2006, p. 27), deverá estar atento se o aluno conseguiu compreender o discurso específico de cada interdisciplina, não estritamente como uma verificação do que lhe foi proposto pelo enfoque temático e sim se o aluno passou a olhar o mundo de maneira diferenciada, é o trabalho dele que nos interessa. Para trabalhar a questão acerca do papel do tutor de sede na aprendizagem dos alunos nos perguntamos: quais as possibilidades da linguagem empregada pelo tutor de sede no processo ensino-aprendizagem e qual pode ser sua contribuição para a apropriação dos conhecimentos 13

Introducción a la filosofia, § 7. Lei 9.39496 (LDB), a Portaria nº 4.361 de 29 de dezembro de 2004, o Decreto 5.622/052 de 20 de dezembro de 2005, a Portaria Normativa nº 2 de 10 de janeiro de 2007 e os Referenciais de Qualidade para Educação Superior a Distância de agosto de 2007 (“elaborado a partir de discussão com especialistas do setor”, atualizando os Referenciais de Qualidade EAD de junho de 2003). 15 De cursos profissionalizantes, de educação de jovens e adultos, de graduação e pós-graduação. 14

propostos e da construção do pensamento através das intervenções, na forma de comentários em materiais postados pelos alunos, enfim, buscar indícios de uma atuação para a aprendizagem significativa. Os ambientes virtuais além dos recursos que são utilizados nas aulas do ensino modalidade presencial, como o texto, contam com os recursos da hipermídia. Mas o que pode haver de tão importante nos elementos agregados e inerentes ao ambiente virtual como a possibilidade da construção coletiva, o estabelecimento de redes de aprendizagem e a interatividade? Dentre as possibilidades de tematização que se apresentam nos ambientes virtuais de aprendizagem escolhemos investigar qual pode ser a contribuição das intervenções do tutor de sede nas atividades postadas pelos alunos e sua implicação como mais um provocador da/na construção do pensamento daqueles que freqüentam os ambientes virtuais de aprendizagem.

O tutor de sede no cenário da educação a distância Nossa escolha pelas possibilidades da linguagem do tutor de sede se dá no intuito de investigar a intensidade e as repercussões da provocação do agente dinamizador - que potencialmente pode o tutor ser/tornar-se - no processo de aprendizagem do aluno. Dentre as funções pedagógica, social e organizativa do tutor de sede, no Curso Pead, destacamos, Função pedagógica: [...] trabalhar a partir da pedagogia da pergunta – propor perguntas que ajudem os alunos a descobrir possíveis contradições ou inconsistências em suas contribuições nos fóruns e webfólio educacional; realizar intervenções diretas [...] acompanhar o entendimento de cada aluno sobre as atividades e o conteúdo dos enfoques temáticos; analisar e sugerir realizações no webfólio educacional a partir das orientações nas Interdisciplinas (Guia do tutor, 2006, p. 27).

Quando investigamos a educação presencial podemos contar com a experiência trazida de longos anos enquanto estudantes e da prática docente, mas para compreender a educação a distância, se trabalhamos com a distinção entre investigar algo e não sobre algo, faz-se mister adentrar nos ambientes virtuais de aprendizagem, experimentá-los, experimentar-se, observar. A educação a distância virtual nos apresenta a possibilidade, senão a exigência, da aprendizagem autônoma e auto-regulada. Mas o faz não somente em relação aos conteúdos apresentados, mas requer o hábito de refletir; nos exercita para a autonomia quando, por exemplo, estando na rede www precisamos decidir onde navegar.

Espanto, admiração e angústia. Quem em suas primeiras imersões no ambiente virtual não experimentou esses pathos16? Esses sentimentos são indicados como os que movem certa espécie de pensar, que movem o aprender e o filosofar. O paradigma filosófico-educacional que nos sustenta é aquele que entende e pretende a educação como formadora do humano. Assim, a educação conseqüente é a que provoca interrogação no aprendente e a tal ponto que este sujeito vê-se compelido a investigar, a querer aprender. E a filosofia só pode se há o reconhecimento de algo a ser investigado. Nossa pesquisa busca a construção de uma base teórica de caráter e abordagem interdisciplinar, visando estabelecer bases conceituais fundamentais que delimitem o conceito de ensino-aprendizagem (agentes educacionais) – linguagem - pensar – educação a distância. A pesquisa buscará o exercício comparativo, de cotejar uma área e outra, como também validar a experiência do ensino a distância a partir de alguns conceitos estabelecidos pela educação e pela filosofia e toma como ponto relevante investigar a tarefa do pensar (construir o pensamento/o conhecimento na comunidade virtual de aprendizagem, colaborativamente). Como fazer tal apreciação? A linguagem nos é o indicador.

Filosofia - linguagem - desenvolvimento A linguagem nos é o indicador porque uma diferença entre o ser humano e o animal é que só o primeiro possui sintaxe. Todo ser humano faz enunciações predicativas, assertivas, enunciados teóricos, enunciados práticos. Se somos capazes de compreender as razões dos outros, de argumentar nossas razões é porque pronunciamos enunciados teóricos e enunciados práticos. O diálogo só é possível porque somos capazes de pronunciar enunciados. O homem opera com a dimensão apofântica e com a dimensão hermenêutica da linguagem. De outro modo, opera com enunciados que podem ser considerados verdadeiros ou falsos e com enunciados que estão num horizonte de compreensão. A fenomenologia descreve o processo de conhecimento, trata dos elementos estruturantes para que aconteça a teoria do conhecimento. Da fenomenologia do conhecimento passamos a compreender o mundo como fenomenologia hermenêutica. Consideramos a interpretação. Esta se dedica a interpretar o modo de ser do humano. O círculo hermenêutico preconiza “eu me compreendo como ser e compreendendo o ser me compreendo...”. 16 Os gregos denominavam pathos como sentimentos.

Apontamos anteriormente as duas dimensões da linguagem. Investigaremos o emprego da linguagem do tutor de sede nas dimensões pragmática e hermenêutica, tendo as duas disciplinas como complementares – não concorrentes. A comunicação entre aluno-tutor-professor no Curso Pead/Ufrgs acontece por diversas ferramentas17, mas como nosso objetivo é a construção da aprendizagem, analisaremos diretamente a realização/apresentação da atividade solicitada em alguma interdisciplina, a intervenção feita pelo tutor e a recepção do aluno. Nos deteremos nas postagens das atividades visto que nelas houve o envolvimento com uma questão colocada pela interdisciplina. Assim estaremos em contato com o processo e o produto da aprendizagem. Nossa pesquisa se desenvolve num curso que conta, em seu organograma com: coordenação de curso, coordenação de eixo, professor articulador, professor colaborador, tutor de sede, coordenação de pólo, tutor de pólo e alunos. E é nessa complexa e dinâmica rede social que o trabalho do tutor de sede está sustentado, interligado. Esse é o ethos onde deve acontecer a metodologia interativa e problematizadora: a orientação do Curso. Tal metodologia “caracteriza-se pela formulação de problemas, levantamento de hipóteses, planejamento de situações experimentais para testagem de hipóteses através do desenvolvimento compartilhado de projetos interdisciplinares” (GUIA DO TUTOR, 2006, p, 23). A existência e a comunicação humana estão essencialmente ligadas à capacidade de fazer uso da linguagem para transmitir as intenções comunicativas e a capacidade de reconhecer tais intenções. Assim procuraremos identificar categorias que primem, por exemplo, pela pedagogia da incerteza, pelo pensar crítico, aprendizagem cooperativa. Selecionamos um exemplo de comentário da tutora de sede que parece-nos revelar as categorias mencionadas acima: - pedagogia da incerteza: “[...] Seu posicionamento é de que ele agiu corretamente em mentir. Mas, ao mesmo tempo, você defende que ele se desminta depois. Nessa nova ação, ele não estaria destruindo a crença local (ainda que com "jeitinho")? Ou melhor, ele não estaria desprezando todo o seu trabalho inicial de manutenção dessa crença?” - pensar crítico/reflexivo: “[...] Você vincula o pensamento/texto dos autores com aspectos da nossa realidade, tais como a violência e a importância da educação na formação dos sujeitos. “

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Correio eletrônico, fórum nos ambientes virtuais, atendimento on-line síncrono (em horário pré-estabelecido), msn, postagem de comentários pelo tutor na atividade do aluno – leitura do aluno.

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aprendizagem cooperativa: “Você além de avaliar as respostas da colega, dialoga com ela, expõe a sua opinião, valoriza a pontualidade da colega, mencionando os aspectos positivos das respostas.” Passos da pesquisa Qual a extensão de um ato comunicativo/educativo? Tratando-se de processo de ensino-

aprendizagem o tempo é imponderável. Para nossa investigação projetamos o ciclo de cada intervenção. Vislumbramos dois ciclos possíveis: 1) o ciclo de cada intervenção na atividade (tarefa) e 2) o ciclo de cada intervenção no transcorrer da interdisciplina. Compreendendo a postagem do trabalho do aluno no espaço apropriado (webfólio), a primeira forma de ciclo se daria pela repercussão da postagem da intervenção do tutor na realização da atividade pelo aluno: da reformulação ou não da atividade pelo aluno. Se reformulada, acompanharemos a nova postagem do aluno e a nova intervenção do tutor. Mesmo que a sugestão/indicação do tutor provoque o refazer da atividade, é possível que na próxima encontremos resquícios da intervenção. Então teremos o ciclo na sua segunda possibilidade. Daremos por encerrado o ciclo da intervenção ao final da interdisciplina. A coleta, já em andamento, busca atingir um grupo que represente 30% do total de alunos (aproximadamente vinte e quatro alunos) do Pólo. Dado que o foco de nossa pesquisa é o trabalho do tutor de sede, o trabalho de investigação transcorrerá no acompanhamento de todos os comentários postados nas atividades de uma interdisciplina no semestre. No confronto com as postagens (materiais em fase de coleta e de análise), na identificação do emprego da linguagem poderá emergir a indicação de melhores intervenções. Perseguindo os procedimentos indicados pretendemos alcançar os objetivos propostos no intuito de efetivamente contribuir no aprimoramento da qualidade da educação a distância. Havendo a necessidade de caracterização das possibilidades da atuação do tutor de sede cabe-nos fazer diligências para definir as categorias nas intervenções feitas por esse e cotejá-las com o modo como elas podem contribuir para a construção do conhecimento dos alunos. Para a definição das categorias consideraremos as intervenções no sentido de: apropriação conceitual; emprego de metodologia interativa e problematizadora; questões; dar a tarefa por encerrada; solicitar que a tarefa ou parte dela seja refeita; indicação de que a resolução da tarefa não passou de reprodução do material trabalhado; reconhecer a trajetória de aprendizagem do aluno.

Os dados estão coletados nas postagens de intervenção do tutor de sede, pois nele está a origem e a conclusão do ciclo que nos interessa. Considerações finais Até o presente momento pesquisamos aproximações entre o filosofar e o aprender, a partir de uma perspectiva teórica que nos permite apontar ambos como algo que confere/autentica a existência humana. Humano enquanto ser finito com possibilidades de adentrar na investigação do que lhe faz questão. Buscamos os pressupostos do Curso Pead/Ufrgs, porque um Curso na modalidade a distância e neste identificamos que há uma preocupação com a existência humana, na observância de aspectos subjetivos, cognitivos, sociais, profissionais, da inter-relação de saberes. Como estamos em fase de coleta e análise de dados (pesquisa qualitativa) temos ainda poucas categorias a identificar e análises a fazer. Indícios nos levam a considerar que, quando são utilizados diversos recursos dos ambientes virtuais de aprendizagem, e quando o trabalho pedagógico está orientado por uma metodologia que também os considera, no sentido de permitir a interação e a cooperação, há espaço para o pensar e para a prática reflexiva. Referências FLEIG, Mario; SANTOS, Vanice dos; PIMENTEL, Felipe G. Heidegger com Husserl: a dupla omissão da Fenomenologia husserliana e a necessidade de um segundo começo. In: OLIVEIRA, Nythamar de; SOUZA, Draiton G. de (Orgs). Hermenêutica e filosofia primeira: festschrift para Ernildo Stein. Ijuí: EDUNIJUÍ, 2006, p. 339-376. GUIA DO PROFESSOR. Curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância. FACED/UFRGS. Marie Jane Soares Carvalho, Rosane Aragon de Nevado, Mérion Campos Bordas. Porto Alegre, 2006. GUIA DO TUTOR. Curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância. FACED/UFRGS. Marie Jane Soares Carvalho, Rosane Aragon de Nevado, Mérion Campos Bordas. Porto Alegre, 2006. HEIDEGGER, Martin. Introducción a la filosofía. Madrid: Cátedra, 2001. ______. Língua de tradição e língua técnica. Lisboa: Passagens, 1995. NEVADO, R. Espaços interativos de construção de possíveis: uma nova modalidade de formação e professores. Tese (Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação) – Universidade do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2001. PIAGET, Jean. A equilibração das estruturas cognitivas: o problema central do conhecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1976.

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