Controle de convencionalidade e a audiência de custódia: alcance, impactos e desafios à luz da experiência judiciária brasileira.

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE DIREITO CURSO DE DIREITO

HENRIQUE DELAVI DAUM

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: ALCANCE, IMPACTOS E DESAFIOS À LUZ DA EXPERIÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA

CURITIBA 2015

HENRIQUE DELAVI DAUM

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: ALCANCE, IMPACTOS E DESAFIOS À LUZ DA EXPERIÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª. Dra. Flávia Cristina Piovesan

CURITIBA 2015

Dados da Catalogação na Publicação Pontifícia Universidade Católica do Paraná Sistema Integrado de Bibliotecas – SIBI/PUCPR Biblioteca Central

D241c 2016

Daum, Henrique Delavi Controle de convencionalidade e a audiência de custódia : alcance, impactos e desafios à luz da experiência judiciária brasileira / Henrique Delavi Daum ; orientadora, Flávia Cristina Piovesan. – 2016. 165 f. ; 30 cm

TCC (Direito) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2016 Bibliografia: f. 77-86

1. Corte Interamericana de Direitos Humanos. 2. Direitos humanos. 3. Controle de convencionalidade. 4. Direito. I. Piovesan, Flávia. II. Pontifícia Católica do Paraná. Escola de Direito. III. Título.

Doris 4. ed. – 340

HENRIQUE DELAVI DAUM

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: ALCANCE, IMPACTOS E DESAFIOS À LUZ DA EXPERIÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________ Profª. Drª. Flávia Cristina Piovesan PUCPR

_____________________________________ Profª. Drª. Melina Girardi Fachin UFPR

_____________________________________ Profª. Drª. Danielle Anne Pamplona PUCPR

Curitiba, 27 de novembro de 2015.

Para Cibele Delavi Daum (in memorian)

AGRADECIMENTOS Agradeço em primeiro a minha família (na linha reta até o infinito, e na colateral também), que me ensinou e ainda me ensina, que é o começo e o fim, a base e o cume.

Agradeço aos meus amigos-irmãos, amigos que são irmãos por escolha, que sempre me oportunizaram o debate e a discussão saudável sobre o mais variado tema, especialmente pelas discussões acaloradas sobre tema tão relevante que é o dos Direitos Humanos.

Agradeço a Deus, não por me dar força, conhecimento ou paciência, mas por me dar muitas oportunidades para ser forte, para adquirir conhecimento, e para ser paciente.

Agradeço a todos que de alguma forma contribuíram para este trabalho, da maneira que o foi, material ou espiritualmente.

Agradeço à minha então namorada, por sempre ser paciente ao me ouvir falar, e por ter me ensinado que existem argumentos contrários que podem ser tão bons quanto os meus.

Meu agradecimento especial a Professora Flávia Piovesan, a quem tive a oportunidade de conhecer ainda cedo no universo da academia, e a quem devo gratidão

pela

atenção

e

carinho

dispensados

desde

desenvolvimento deste trabalho. Figura ímpar e inspiradora.

antes

mesmo

do

Ser humano é ser responsável. É sentir que colocando sua pedra se colabora na construção do mundo.

(SAINT-EXUPÈRY, Antoine de)

RESUMO O controle de convencionalidade é o mais recente tema debatido no âmbito interno brasileiro, oriundo da Corte Interamericana de Direitos Humanos, e afeto ao Direito Internacional dos Direitos Humanos. O tema se relacionada, precipuamente, com a produção normativa interna nos Estados, e diz respeito, especialmente, à verificação da compatibilidade material de uma norma produzida, ou a ser produzida, com os tratados e convenções internacionais de Direitos Humanos, não se esquecendo de que deve ser realizado também o controle de constitucionalidade destas mesmas normas, ou seja, existe um controle em dobro, o que precisa ainda ser explorado com mais propriedade pelo Legislativo brasileiro. Para verificação do que é o controle de convencionalidade, como deve ser feito, e qual a sua finalidade, utilizouse a mais diversa doutrina, fazendo-se um contraponto entre doutrinas que divergem, a fim de que se chegue a uma conceituação adequada do tema. Objetivase também investigar a relação entre o controle de convencionalidade com o que se acordou chamar de audiência de custódia, perpassando pela previsão normativa internacional desta audiência, assim como se verificará a interpretação deste dispositivo presente em tratado internacional feita pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, para tal, vale-se de diversas decisões da Corte Interamericana, assim como da Corte Europeia de Direitos Humanos. São apresentados também os grandes desafios na implementação da audiência de custódia a partir da interpretação feita pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, assim como quais as grandes críticas e dificuldades que já podem ser percebidas na realização destas audiências, e para que fosse possível analisar estas dificuldades, utilizaramse documentos expedidos por organismos internacionais e nacionais, assim como notícias a respeito da implementação da audiência de custódia, além da reprodução da experiência empírica realizada na 14ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. Palavras-chave: Controle de Convencionalidade. Corte Interamericana de Direitos Humanos. Direito Internacional dos Direitos Humanos. Audiência de Custódia. Diálogo Jurisprudencial.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Mapa da Implantação da audiência de custódia no Brasil, em 16/09/2015. .................................................................................................................................. 65 Figura 2 - Mapa da Implantação da audiência de custódia no Brasil, em 19/10/2015. .................................................................................................................................. 66

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CADH

Convenção Americana de Direitos Humanos

CEDH

Convenção Europeia de Direitos Humanos

CIDH

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

CNJ

Conselho Nacional de Justiça

CorteEDH

Corte Europeia de Direitos Humanos

CorteIDH

Corte Interamericana de Direitos Humanos

DH

Direitos Humanos

DIDH

Direito Internacional dos Direitos Humanos

OEA

Organização dos Estados Americanos

ONG

Organização Não Governamental

ONU

Organização das Nações Unidas

PIDCP

Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

SIDH

Sistema Interamericano de Direitos Humanos

STF

Supremo Tribunal Federal

TJPR

Tribunal de Justiça do Estado do Paraná

SUMÁRIO

1

INTRODUÇÃO ............................................................................................. 11

2

ALCANCE DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE .......................... 14

2.1

HISTÓRICO .................................................................................................. 14

2.2

O CONCEITO DE CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE ...................... 16

2.3

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE: “COMO FAZER”? ..................... 19

2.3.1

Controle de convencionalidade vs. controle de constitucionalidade .... 27

2.3.2

Controle de convencionalidade vs. controle de legalidade .................... 28

3

IMPACTO DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE ........................... 30

3.1

SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS .......................... 30

3.2

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS ............................. 37

3.3

JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA E O SEU IMPACTO NA AMÉRICA LATINA .................................................................................. 42

4

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: DESAFIOS À LUZ DA EXPERIÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA ............ 51

4.1

A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA ............................................................................................. 51

4.2

A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E OS SEUS DESAFIOS À LUZ DA EXPERÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA .................................................... 62

5

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 73

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 77 ANEXO A – PARECER DA PGR NA ADI 5.240/SP ................................................. 87 ANEXO B – TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA Nº 007/2015 (ENTRE O CONSELHO NACIONAL DE JUTIÇA E O INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA) ........................................................................................................... 107 ANEXO C – PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 554/2011 ................................... 117 ANEXO D – PROVIMENTO CONJUNTO Nº 03/2015 (PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUTIÇA E CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO) .................................................................................................... 122 ANEXO E – RESOLUÇÃO Nº 144, DE 14 DE SETEMBRO DE 2015, DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ ........................................... 124

ANEXO F – DOCUMENTO APRESENTADO À COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS SOBRE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA ...................... 128 ANEXO G – ATAS DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA NA 14ª VARA CRIMINAL DE CURITIBA ......................................................................................................... 143

11

1

INTRODUÇÃO Este estudo pretende analisar o controle de convencionalidade e sua relação

com a audiência de custódia, verificando-se, para isto, o que é o controle de convencionalidade, qual o seu grau de impacto na ordem doméstica dos Estados, e assim como se relaciona a audiência de custódia com esta doutrina do controle de convencionalidade. Em outras palavras, o que se pretende verificar por meio deste estudo é como os Estados, especialmente o Brasil, devem olhar para o controle de convencionalidade no âmbito normativo interno. Num

primeiro

momento,

será

verificado

o

que

é

o

controle

de

convencionalidade, e para o que serve este controle, assim como de que maneira e quem deve realizá-lo. Convém ressaltar, desde logo, que quando se está falando em proteção dos Direitos Humanos, se está falando em proteção ao indivíduo, de forma que a tradicional soberania estatal vem a ser mitigada pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, isto em razão de o objeto de proteção não ser uma relação, mas sim uma vida. Tradicionalmente um ato de soberania estatal, especialmente no direito internacional, está ligado à sua voluntariedade, porém, em matéria Direitos Humanos, se observe que: The voluntary aspect of international law was defensible when international law pertained exclusively to obligation between States. (…) As the rights of the individual are recognized, this liberalization results in non-governmental organizations and scholars demanding even greater rights for individuals, groups and organizations. More recently, international courts and commentators have gone to the extent of suggesting that the voluntary nature of State obligations, at least in the area of human rights, is 1 inappropriate.

Ainda sobre isso, note-se que quando “os Estados aceitam as obrigações jurídicas decorrentes dos tratados de direitos humanos, passam a se submeter à autoridade das instituições internacionais, no que se refere à tutela e fiscalização desses direitos em seu território”2. Outro aspecto a ser investigado é a forma pela qual a Corte Interamericana interpreta os tratados de Direitos Humanos, no sentido de qual a melhor forma de ler determinado artigo, de lei ou de tratado, a fim de que seja efetivamente protegida a pessoa em sua plenitude. 1

PASQUALUCCI, Jo M. The practice and procedure of the inter-american court on human rights. Cambridge: Cambridge University Press, 2003, p. 327. 2 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 75.

12

Portanto, verificar-se-á como a Corte Interamericana de Direitos Humanos observa essa necessidade

de cumprimento

das obrigações internacionais

assumidas voluntariamente pelos Estados, em face da produção legislativa doméstica destes mesmos Estados, e, para fins metodológicos, demonstra-se também a diferença substancial entre controle de convencionalidade em confronto com o controle de constitucionalidade ou de legalidade, que, como os nomes demonstram, são diferentes em pesos, medidas e extensões. Logo após, num segundo momento, buscar-se-á compreender qual o impacto do controle de convencionalidade no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, considerando esta perspectiva a partir dos Estados integrantes da Organização dos Estados Americanos. Para tanto, será verificada a finalidade do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, e, principalmente, como se dá atuação de seus dois principais órgãos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Não se descuide de que o Sistema Interamericano está marcado por dois períodos Históricos que possuem forte reverberação nos dias atuais: “o período dos regimes ditatoriais e o período da transação política aos regimes democráticos, marcado pelo fim das ditaduras militares, na década de 1980 (…)” 3. Ainda no mesmo tópico, verificar-se-á como a Corte Interamericana de Direitos Humanos se posiciona em face das diversas controvérsias que lhe são apresentadas, sempre se pautando na interpretação de que os tratados internacionais que versem sobre Direitos Humanos são instrumentos vivos 4. Inserese, ainda no segundo momento, uma tipologia de espécies de condenações da Corte Interamericana que tenham por objetivo a adequação legislativa interna dos Estados, para que se dê efetivo cumprimento ao disposto no artigo 2 da Convenção Americana de Direitos Humanos. Na última etapa deste trabalho, será verificado de que forma o projeto lançado pelo Conselho Nacional de Justiça brasileiro atende às necessidades das disposições da Convenção Americana de Direitos Humanos, e atende também à 3

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e justiça internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 137. 4 “The Inter-American Court does not impose a static interpretation of human rights on the American Convention. The concept of the basic rights owing to individuals has expanded over time. These rights have been elaborated in the light of changing societal conditions that have enriched human rights law in the previous fifty years”. PASQUALUCCI, Jo M. The practice and procedure of the interamerican court on human rights. Cambridge: Cambridge University Press, 2003, p. 328.

13

interpretação que dela faz a Corte Interamericana, posto que o controle de convencionalidade demanda esse exame de compatibilidade, sendo fundamental estudar os casos decididos pela Corte. Ademais, para além da interpretação que faz a Corte Interamericana, buscou-se traçar um paralelo, ou melhor, buscou-se exercer um comparativo entre as decisões emanadas na região latino-americana, com as decisões emitidas pela Corte Europeia de Direitos Humanos, que, diga-se de passagem, decide sobre tema análogo desde 19505. Outra análise, sobre o projeto do Conselho Nacional de Justiça, é feita considerando atuação do Judiciário brasileiro no implemento da famigerada audiência de custódia, tema que somente muito recentemente veio a compor o debate em matéria de Direitos Humanos em meio à magistratura nacional 6. São apresentadas as críticas e os avanços resultantes da realização destas audiências, assim como seus principais atores, além de as expectativas para que sejam estas audiências garantidoras, de fato, de tratamento humano às pessoas que são detidas em flagrante delito, tal qual o que se espera a respeito da investigação de prática de tortura por agentes do Estado. Desta forma, com o que será estudado, espera-se poder entender o que é o controle de convencionalidade, suas características e finalidades, além das controvérsias doutrinárias existentes.

5

Considerando que a Convenção Europeia de Direitos Humanos existe desde 1950, e que a Corte Europeia de Direitos Humanos foi criada em conjunto com a referida convenção. COUNCIL OF EUROPE. European Convention on Human Rights. Estrasbourg, France. Disponível em: . Acesso em 01/11/2015. 6 Veja-se que o “projeto audiência de custódia” foi lançado nacionalmente somente no dia 06 de fevereiro de 2015. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Audiência de custódia: histórico. Disponível em: . Acesso em: 01/11/2015.

14

2

ALCANCE DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE

2.1

HISTÓRICO Antes

de

efetivamente

apresentar

o

conceito

de

controle

de

convencionalidade, o qual vai nortear todo o desenvolver deste estudo, traçar um panorama Histórico acerca do tema, ainda que brevemente, não seria fora de propósito. A doutrina do controle de convencionalidade teve sua origem, pode-se assim dizer, na França, em 1975, de forma ainda incipiente, por meio de uma decisão do Conselho Constitucional francês7. Neste sentido, o Conselho Constitucional francês, quando da decisão 74-54 DC, julgou não ser de sua competência a análise da compatibilidade de uma norma de direito interno com uma norma de direito internacional, de tal forma que a função daquela Corte seria, conforme decidido, apenas de verificar a compatibilidade das normas frente à Constituição 8. Em parecer datado de 18 de outubro de 1989 – antes mesmo de ter havido adesão pelo Brasil da CADH, o consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores brasileiro, Antônio Augusto Cançado Trindade, alertou que a adoção dos três tratados gerais internacionais de DH necessitaria de adequação da legislação interna brasileira9. Mais tarde, já no ano 2000, após o Brasil ter ratificado a CADH, a Associação Juízes para a Democracia lançou em seu jornal trimestral uma nota, sem qualquer 7

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 88. 8 Vale acrescentar aqui, entretanto, o trecho da decisão 74-54 DC: “It is therefore not for the Constitutional Council, when a referral is made to it under Article 61 of the Constitution, to consider the consistency of a statute with the provisions of a treaty or an international agreement”. Disponível em: . Acesso em: 11/08/2015. Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 88 9 “Paralelamente, a considerável demora em efetuar a adesão do Brasil – recomendada e decidida em 1985 (cf. supra) – aos três tratados gerais de proteção – os dos Pactos de Direitos Humanos ds Nações Unidas e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – levou o Consultor Jurídico do Ministério das Relações Exteriores (A.A. Cançado Trindade) a emitir outro extenso parecer, de 18.10.1989, sobre a forma ou modalidade de tal adesão, no qual acrescentou outros dados, - que continuam revestir-se de atualidade, - a título de providências adicionais que recomendava fossem prontamente tomadas pelo Brasil, relativas a instrumentos e cláusulas facultativos, com vistas à plenitude do alinhamento à causa da proteção internacional dos direitos humanos. Tais medidas passariam a requerer por vezes a adoção, ou a reforma, da legislação nacional, com vistas a compatibilizá-la com as obrigações convencionais”. (grifos acrescentados). CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Vol. III, 1 ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 623/626.

15

indicação de autoria, acerca da submissão de um caso à CIDH do conflito entre artigos do Código de Processo Penal vigente à época em face de disposições da CADH. Esta é, talvez, a primeira menção no Brasil à necessidade de adequar o ordenamento jurídico interno ao internacional, após a efetiva ratificação do instrumento americano de proteção dos DH. Algum tempo depois, a doutrina do controle de convencionalidade passou a fazer parte da agenda evolutiva da jurisprudência da CorteIDH, mais precisamente a partir do caso Myrna Mack Chang vs. Guatemala (2003), por meio do voto concordante do ex-Presidente da CorteIDH, juiz Sergio García Ramírez. Na sequência, no caso Tibi vs. Equador (2004), o mesmo citado juiz da CorteIDH tratou do tema com mais alguns detalhes. Novamente foi retomada a questão sobre o controle de convencionalidade, agora nos casos López Álvarez vs. Honduras (2006) e Vargas Areco vs. Paraguai (2006)10. Não obstante, o controle de convencionalidade tomou corpo, pode-se assim dizer, a partir da conjugação dos casos Trabajadores Cesados del Congresso vs. Peru e Almonacid Arellano e outros vs. Chile, ambos do ano de 2006. Neste sentido, confira-se a seguinte lição: Na verdade, enquanto, em “Almonacid Arellano vs. Chile”, a Corte expressou, de maneira um tanto genérica, que o Poder Judiciário deve exercer uma espécie de “controle de convencionalidade”, em “Trabajadores Cesados del Congresso” deixou consignado que os órgãos do Poder Judiciário devem exercer não só um controle de constitucionalidade, senão também de convencionalidade. Em síntese, já não se referiu de forma genérica a “uma espécie de controle de convencionalidade”, senão que aludiu, especificamente, à obrigação judicial de levar adiante, ademais do controle de constitucionalidade, o “controle de convencionalidade”.11

Em que pese à importância da conjugação, opta-se, por ser paradigma no SIDH, por se transcrever o trecho da decisão da CorteIDH que referendou, por assim dizer, a doutrina do controle de convencionalidade no caso Almonacid

10

BAZÁN, Victor. O Controle de Covencionalidade e a Necessidade de Intensificar um Adequado Diálogo Jurisprudencial (tradução de Paulo Paiva). Revista de Direito Público do Instituto Brasiliense de Direito Público, vol. 1, nº 41, p. 222/223. Disponível em . Acesso em: 05/09/2015. 11 BAZÁN, Victor. O Controle de Covencionalidade e a Necessidade de Intensificar um Adequado Diálogo Jurisprudencial (tradução de Paulo Paiva). Revista de Direito Público do Instituto Brasiliense de Direito Público, vol. 1, nº 41, p. 224. Disponível em . Acesso em: 05/09/2015.

16

Arellano e outros vs. Chile, tal qual a necessidade de sua efetiva aplicabilidade, vejase: 124. Mas quando um Estado ratifica um tratado internacional como a Convenção Americana, seus juízes, como parte do aparato estatal, também estão submetidos a ela, o que os obriga a velar para que os efeitos das disposições da Convenção não se vejam diminuídos pela aplicação de leis contrárias a seu objeto e a seu fim e que, desde o início, carecem de efeitos jurídicos. Em outras palavras, o Poder Judiciário deve exercer uma espécie de “controle de convencionalidade” entre as normas jurídicas internas aplicadas a casos concretos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos.12

Desde então, diversos doutrinadores passaram a tratar do tema no Brasil. Entretanto, somente em 2009 houve um estudo mais aprofundado sobre o controle de convencionalidade, quando da defesa de uma tese de doutorado pioneira defendida por Valerio de Oliveira Mazzuoli13, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Depois deste breve histórico apresentado, sobre o surgimento da teoria do controle de convencionalidade, faz-se mister analisar o que é e qual é a finalidade do dito controle. 2.2

O CONCEITO DE CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE Assim como os Estados de Direito possuem um controle de, por exemplo,

produção

legislativa

em face

da

Constituição,

chamado

de

controle

de

constitucionalidade, tem a CADH a previsão de que os Estados-partes devem adequar suas normas domésticas às previsões da Convenção, este é o controle de convencionalidade. Neste sentido: [t]al controle diz respeito a um novo dispositivo jurídico fiscalizador das leis infraconstitucionais que possibilita duplo controle de verticalidade, isto é, as normas internas de um país devem estar compatíveis tanto com a Constituição (controle de constitucionalidade) quanto com os tratados

12

BRASIL, Ministério da Justiça. Jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Brasília: Ministério da Justiça, 2014, p. 96. 13 “Como se pode depreender dos textos acima transcritos, não obstante a expressão controle de convencionalidade já ter sido empregada entre nós anteriormente, o certo é que em nenhum dos casos explicou-se ‘como funciona’ ou ‘como se processa’ esse controle no Brasil e quais são os meios de se exercer a advocacia a ele voltada”. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 88

17

internacionais ratificados pelo país onde vigora tais normas (controle de convencionalidade)14.

Vale acrescentar, entretanto, que não se trata de uma nova atribuição da CorteIDH, eis que, “no Continente Americano, a obrigação de controlar a convencionalidade das leis remonta à entrada em vigor da Convenção Americana (em 18 de julho de 1978, nos termos do seu art. 74, 2)”15. O conceito apresentado por Sergio García Ramírez, sobre o controle de convencionalidade, também merece destaque, uma vez que indica com clareza o que vem a ser dito controle. Destaca ele que: [e]l control de convencionalidad es una expresión o verteniente de la recepción nacional, sistemática y organizada, del orden jurídico convencional internacional (o supranacional). Constituye un dato relevante para la construcción y consolidación de ese sistema y ese orden, que en definitiva se traducen en el mejor imperio del Estado de Derecho, la vigencia de los derechos y la armonización del ordenamiento regional interamericano (puesto que me estoy refiriendo al control ejercido con base en instrumentos de esta fuente) con vistas a la formación de un ius commune del mismo alcance geográfico-jurídico.16

Desta forma, verifica-se que o controle de convencionalidade nada mais é do que a recepção da norma internacional pelo ordenamento jurídico interno dos Estados, de sorte a tornar harmônicas as ordens interna e internacional, ou seja, o controle de convencionalidade tem como objetivo “compatibilizar verticalmente as normas domésticas (as espécies de leis, lato sensu, vigentes no país) com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado e em vigor no território nacional”17. Como se não bastasse, além de ser instrumento de compatibilização das normas internas com as internacionais, “[t]rata-se de adaptar ou conformar os atos ou leis internas aos compromissos internacionais assumidos pelo Estado” 18, sendo

14

GUERRA, Sidney. O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos e o Controle de Convencionalidade. São Paulo: Atlas, 2013, p. 179. 15 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 94 16 RAMÍREZ, Sergio García. El control judicial interno de convencionalidad. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 560. 17 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 148. 18 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 149.

18

que a não adaptação pode vir a acarretar na responsabilização internacional do Estado. O controle de convencionalidade tem como finalidade a compatibilização das normas internas com as normas da CADH e a interpretação que dela faz a CorteIDH19. Note-se, entretanto, que não é apenas a CADH paradigma para realização do controle, mas também qualquer outro instrumento interamericano há de servir como elemento apto para compatibilizar as normas domésticas com as normas interamericanas, desde que ratificado o instrumento pelos Estados-partes20. Observa-se, ainda, uma segunda finalidade do controle de convencionalidade que se destaca, sendo ela o diálogo entre as Cortes constitucionais e, no caso, a CorteIDH, de forma a dinamizar e efetivar a proteção dos DH21, parafraseando Flávia Piovesan, para transpor a barreira da pirâmide kelseniana, dogmática, fundada na atuação e poder do Estado, para então abrir espaço e substituí-la por um trapézio poroso que internaliza em sua estrutura, neste caso, especialmente, o DIDH22, para também fortalecer seu empoderamento emancipatório. Nesta seara, objetivando a interpenetração entre direito interno e direito internacional, para que haja um efetivo diálogo entre as Cortes, o controle de convencionalidade vem a conferir vigência, validade e eficácia à produção legislativa

19

“Ademais, foi tão somente a partir de 2006 que a Corte Interamericana passou a entender ser obrigação dos juízes e tribunais internos proceder ao exame de compatibilidade das leis domésticas com a Convenção Americana, levando em conta não somente a Convenção, mas também a interpretação que dela faz a Corte Interamericana, intérprete última e mais autorizada do Pacto de San José”. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 94/95 20 BAZÁN, Victor. O Controle de Covencionalidade e a Necessidade de Intensificar um Adequado Diálogo Jurisprudencial (tradução de Paulo Paiva). Revista de Direito Público do Instituto Brasiliense de Direito Público, vol. 1, nº 41, p. 225. Disponível em . Acesso em: 05/09/2015. 21 “Por outro lado, as Constituições latino-americanas estabelecem cláusulas de abertura constitucional a propiciar o diálogo em matéria de direitos humanos, concernentes à hierarquia, incorporação e impacto dos tratados internacionais de direitos humanos. No sistema interamericano este diálogo é ainda caracterizado pelo fenômeno do ‘controle de convencionalidade’.” (grifos acrescentados) PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 136. 22 “É nesse contexto – marcado pela tendência de Constituições latino-americanas em assegurar um tratamento especial e diferenciado aos direitos e garantias internacionalmente consagrados – que se insere o desafio de encorajar todos os textos constitucionais latino-americanos a incluir cláusulas abertas a conferir aos tratados de direitos humanos status hierárquico constitucional, bem como aplicação automática. Faz-se fundamental transitar da pirâmide hermética fundada no State approach para a permeabilidade do trapézio jurídico fundado no Human rights approach”. PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 147.

19

doméstica, a fim de garantir a realização dos DH no plano não apenas formal, mas também e, sobretudo, no plano material23. 2.3

CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE: “COMO FAZER”? Apresentado o conceito do controle de convencionalidade, assim como sua

finalidade, parte-se então para a verificação do modo pelo qual o controle é exercido. Antes, faz-se necessário verificar a origem normativa, ou seja, de onde deriva o comando referente à necessidade de exercer o controle de convencionalidade. Ao contrário do que normalmente se vê, em se tratando de um comando com reflexo na legislação interna, aqui o preceito normativo é oriundo da CADH24, mais precisamente de seu artigo 2, o qual prevê o “dever de adotar disposições de direito interno”, nestes termos: Se o exercício dos direitos e liberdades mencionados no artigo 1 [da CADH] ainda não estiver garantido por disposições legislativas ou de outra natureza, os Estados-Partes comprometem-se a adotar, de acordo com suas normas constitucionais e com as disposições desta Convenção [Americana], as medidas legislativas ou de outra natureza que forem necessárias para tornar efetivos tais direitos e liberdades. 25

Desta forma, pode-se dizer que um Estado-parte tão logo ratifique a CADH contrai a obrigação de adequação legislativa interna, em razão do conteúdo do 23

A discussão sobre vigência, validade e eficácia das normas é de longa data, porém, na obra referenciada, a seguinte lição merece ser considerada: “Depois de verificada a existência (vigência) da lei é que se vai aferir sua validade, para, em último lugar, perquirir sobre sua eficácia. Esta última (a eficácia legislativa) está ligada à realidade social que a norma almeja regular; conota também um meio de se dar ‘aos jurisdicionados a confiança de que o Estado exige o cumprimento da norma, dispõe para isso de mecanismos e força, e os tribunais vão aplicá-las’. Mas vigência e eficácia não coincidem cronologicamente, uma vez que a lei que existe (que é vigente) e que também é válida (pois de acordo com a Constituição e com os tratados – de direitos humanos ou comuns – em vigor no país) já pode ser aplicada pelo Poder Judiciário, o que não significa que terá eficácia. Não há como dissociar a eficácia das normas à realidade social ou à produção de efeitos concretos no seio da vida social. O distanciamento (ou inadequação) da eficácia das leis com as realidades sociais e com os valores vigentes na sociedade gera a falta de produção de efeitos concretos, levando à falta de efetividade da norma e ao seu consequente desuso social. (…) Esta (a vigência ou existência da norma, sendo ambas as expressões sinônimas) nada tem que ver com a validade das leis, que se afere com o exercício de compatibilidade vertical do texto normativo com os princípios substanciais da Constituição e dos tratados de direitos humanos em vigor no país”. (grifos acrescentados) MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 117/119 24 Internalizada por meio do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Disponível em: . Acesso em: 08/09/2015. 25 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 08/09/2015.

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mencionado artigo 2. Note-se que o dispositivo da CADH transcende a barreira da pirâmide kelseniena para um trapézio jurídico poroso, tal qual leciona Flávia Piovesan, como mencionado anteriormente. Evidenciada a fonte normativa do controle de convencionalidade, importa agora saber quem seria o responsável pelo controle, ou seja, a quem compete realizar o controle. Para tanto, o controle de convencionalidade é analisado de forma analógica ao conhecido controle de constitucionalidade, o qual é realizado em quatro modalidades, segundo Luís Roberto Barroso. Entretanto, para o presente estudo, importa verificar apenas duas delas: quanto ao órgão judicial e quanto ao modo ou forma. O mencionado autor indica que, no que diz respeito ao órgão jurisdicional que exerce o controle de constitucionalidade, existe a divisão entre o controle difuso e o controle concentrado, sendo que o “controle é difuso quando se permite a todo e qualquer juiz ou tribunal o reconhecimento da inconstitucionalidade de uma norma e, consequentemente, sua não aplicação ao caso concreto levado ao conhecimento da corte”26, ao passo que no “sistema concentrado, o controle de constitucionalidade é exercido por um único órgão ou por um número limitado de órgãos criados especificamente para esse fim ou tendo nessa atividade sua função principal” 27. Já no tocante ao modo do controle de constitucionalidade, o mesmo autor indica duas possibilidades: o controle pela via incidental, e o controle pela via principal. No controle pela via incidental “a fiscalização constitucional [é] desempenhada por juízes e tribunais na apreciação de casos concretos submetidos a sua jurisdição”28. Já o controle pela via principal é:

o exercido fora de um caso concreto, independente de uma disputa entre partes, tendo por objeto a discussão acerca da validade da lei em si. Não se cuida de mecanismo de tutela de direitos subjetivos, mas de preservação da

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BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6 ed (e-book). São Paulo: Saraiva, 2012. Capítulo I, item V, subitem 3, 3.1. 27 BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6 ed (e-book). São Paulo: Saraiva, 2012. Capítulo I, item V, subitem 3, tópico 3.2. 28 BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6 ed (e-book). São Paulo: Saraiva, 2012. Capítulo I, item V, subitem 4, tópico 4.1.

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harmonia do sistema jurídico, do qual deverá ser eliminada qualquer norma incompatível com a Constituição.29

Nota-se, desde logo, que a analogia não poderia ser melhor, posto que ambos os instrumentos, Constituição e CADH, são elementos fundantes de ordem jurídica, ainda que distintas, ou seja, “[e]l derecho constitucional indica que la Constitución es la norma superior Del ordenamiento estatal”30, tal qual a CADH é a norma superior dos DH no âmbito da OEA. Porém, ainda que a doutrina adote o controle de convencionalidade difuso e concentrado, remanesce a divergência quanto à qual o órgão que seria competente para exercer o controle concentrado de convencionalidade. Uma das correntes, adotada por Valerio Mazzuoli, admite o controle concentrado de convencionalidade pelo STF, aceitando até mesmo a utilização das ações constitucionais inerentes ao controle concentrado de constitucionalidade (ADIn, ADC, ADPF, etc.), esta corrente indica que é possível se valer da via de ação direta “quando em causa os tratados de direitos humanos ‘equivalentes’ às emendas constitucionais, ou seja, quando se tratar daquelas normas internacionais de direitos humanos incorporadas nos termos do art. 5º, § 3º, da Constituição” 31. Para o presente estudo, opta-se por adotar a corrente que entende diversamente. Na sua linha de raciocínio se encontram Flávia Piovesan 32, André de Carvalho Ramos33, Sergio García Ramírez34, Eduardo Ferrer Mac-Gregor35, dentre outros. 29

BARROSO, Luís Roberto. Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro: exposição sistemática da doutrina e análise crítica da jurisprudência. 6 ed (e-book). São Paulo: Saraiva, 2012. Capítulo I, item V, subitem 4, tópico 4.2. 30 CAVALLO, Gonzalo Aguilar. ¿Quién es el guardián de la Convención Americana sobre Derechos Humanos?.In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 720. 31 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 164. 32 “A Corte Interamericana exerce o controle da convencionalidade na modalidade concentrada, tendo a última palavra sobre a interpretação da Convenção Americana”. PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 131. 33 “O autêntico controle de convencionalidade de tratado internacional é aquele realizado no plano internacional”. RAMOS, André de Carvalho.Teoria geral dos direitos humanos na orden internacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 251. 34 “La existência de uma Corte Interamericana designada como intérprete de la Convención Americana y otros instrumentos, (…) implica uma expresión de control concentrado”. RAMÍREZ, Sergio García. El control judicial interno de convencionalidad. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 581.

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Esta corrente indica que a CorteIDH, por ser intérprete última da CADH, é que detém a competência para controlar de forma concentrada a convencionalidade de dispositivos da legislação interna dos Estados. Assim, separando a atuação do STF da atuação da CorteIDH, é de se reconhecer “a atuação em separado do controle de constitucionalidade (STF e juízos nacionais) e do controle de convencionalidade (Corte de San José e outros órgãos de direitos humanos no plano internacional)” 36. A fim de melhor elucidar a atuação dos juízes nacionais, no controle difuso de convencionalidade, e a atuação da CorteIDH, no controle de concentrado de convencionalidade, as lições de Eduardo Ferrer Mac-Gregor são essenciais, para ele o controle concentrado: [O]bedece a las facultades inherentes de la Corte Interamericana al resolver los casos contenciosos sometidos a su consideración, en cuanto guardián e intérprete final de la Convención Americana. Es en realidad un control “concentrado” de convencionalidad, al encomendarse a dicho órgano jurisdiccional la facultad exclusiva de “garantizar al lesionado en el goce de su derecho o libertad conculcados” y “reparar las consecuencias de la medida o situación que ha configurado la vulneración de esos derechos y el pago de una justa indemnización a la parte lesionada”; todo lo cual, cuando “decida que hubo violación de un derecho o libertad protegidos por esta Convención” (art. 63, CADH), teniendo dicho fallo carácter “definitivo e inapelable” (art. 67, CADH); por lo que los Estados “se comprometen a cumplir con la decisión da la Corte en todo caso de que sean partes” (art. 68.1, CADH). El control de convencionalidad constituye la razón de ser de la Corte Interamericana: realizar un control de compatibilidad entre el acto de violación (en sentido lato) y el Pacto de San José (y sus protocoles adiciones).37

Para o mesmo citado autor, o controle difuso de convencionalidade é aquele que:

35

“El control de convencionalidad tiene dos manifestaciones: una de carácter ‘concentrada’ por parte de la Corte Interamericana, en sede internacional; y otra de carácter ‘difusa’ por los jueces nacionales, en sede interna”. MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer. Interpretación Conforme y Control Difuso de Convencionalidad. El Nuevo Paradigma para el Juez Mexicano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANTONIAZZI, Mariela Morales (Org.), Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 651. 36 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 374. 37 MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer. Interpretación Conforme y Control Difuso de Convencionalidad. El Nuevo Paradigma para el Juez Mexicano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANTONIAZZI, Mariela Morales (Org.), Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 651/652.

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debe realizarse por los jueces y órganos de administración de justicia nacionales o domésticos de los Estados que han suscrito o se han adherido a la CADH y con mayor intensidad a los que han aceptado la jurisdicción de la CorteIDH. (…) El “control difuso de convencionalidad” consiste en el deber de los jueces nacionales en realizar un examen de compatibilidad entre los actos y normas nacionales, y la CADH, sus protocolos adicionales, y la jurisprudencia de la CorteIDH que interpreta ese corpus iuris 38 interamericano.

Portanto, o controle de convencionalidade difuso é aquele realizado pelas Cortes nacionais, independentemente do órgão, posto que do mais baixo ao mais alto grau são todos administradores do Judiciário nacional, se valendo, para exercício do controle, dos dispositivos da CADH e outros instrumentos protetivos de DH, assim como a jurisprudência da CorteIDH. Já o controle de convencionalidade concentrado é exercido apenas pela CorteIDH que, como visto, é a intérprete última da CADH e outros instrumentos protetivos de DH no âmbito da OEA. Ademais do controle concentrado, como visto, a CorteIDH delega a todo juiz nacional, investido na função jurisdicional, o exercício do controle difuso de convencionalidade, e, sobre isto, Sergio García Ramírez pondera: ¿Pueden los tribunales internos, en el desempeño del control de convencionalidad, formular interpretaciones propias acerca de normas de Derecho internacional, cuando venga al caso la aplicación de éstas a los casos de los que estén conociendo? La respuesta es afirmativa, enfáticamente, cuando no exista jurisprudencia de la Corte Interamericana sobre la norma que los juzgadores nacionales examinan y pretenden aplicar. En tales supuestos, si no se llevase adelante una interpretación doméstica, la norma internacional quedaría inaplicada, con todo lo que ello apareja.39

Superado o controle “contencioso” de convencionalidade, importa verificar que não é esta a única forma de controlar as disposições legislativas domésticas dos Estados-partes da CADH. Sobre isto, deve-se verificar o contido no artigo 64 (1) e (2), da CADH:

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MAC-GREGOR, Eduardo Ferrer. Interpretación Conforme y Control Difuso de Convencionalidad. El Nuevo Paradigma para el Juez Mexicano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANTONIAZZI, Mariela Morales (Org.), Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 653. 39 RAMÍREZ, Sergio García. El control judicial interno de convencionalidad. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 571.

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1. Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. 2. A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os 40 mencionados instrumentos internacionais.

A respeito do tema, Flávia Piovesan elucida que a: Corte[IDH] ainda pode opinar sobre a compatibilidade de preceitos da legislação doméstica em face dos instrumentos internacionais, efetuando, assim, o “controle de convencionalidade das leis”. Ressalte-se que a Corte não efetua uma interpretação estática dos direitos humanos enunciados na Convenção Americana, mas, tal como a Corte Europeia, realiza interpretação dinâmica e evolutiva, considerando o contexto temporal e as transformações sociais, o que permite a expansão de direitos.41

Não obstante, a mesma autora, citando Jo M. Pasqualucci, indica, ainda a respeito da competência consultiva da CorteIDH, que: “A Corte Interamericana de Direitos Humanos tem a mais ampla jurisdição em matéria consultiva, se comparada com qualquer outro Tribunal internacional. A Corte tem exercido sua jurisdição no sentido de realizar importantes contribuições conceituais no campo do Direito Internacional dos Direitos Humanos. (…) As opiniões consultivas, enquanto mecanismos com muito menor grau de confronto que os casos contenciosos, não sendo ainda limitadas a fatos específicos lançados à evidência, servem para conferir expressão judicial aos princípios jurídicos. (…) Por meio de sua jurisdição consultiva, a Corte tem contribuído para conferir uniformidade e consistência à interpretação de previsões substantivas e procedimentais da Convenção Americana e de outros tratados de direitos humanos”.42

Este controle de convencionalidade, por meio de emissão de pareceres ou opiniões consultivas, é exercido in abstrato, e antecede a qualquer litígio envolvendo um Estado-parte em uma violação de DH. Ressalta-se, entretanto, que esta consulta prévia pode se dar antes ou depois de entrar em vigor a norma que se pretende

40

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 12/09/2015 41 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 152. 42 PASQUALUCCI, Jo M. The practice and procedure of the Inter-American Court on Human Rights. Cambridge: Cambridge Press, 2003, p. 80, apud PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 152.

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verificar a compatibilidade com as normas da CADH e a interpretação que dela faz a CorteIDH, intérprete última da CADH 43. Convém verificar neste momento, que a interpretação dos dispositivos convencionais, feita pela CorteIDH, parte do princípio norteador da interpretação pro homine, chamado também de pro persona, com expressa disposição no artigo 29, da CADH. A CorteIDH compreende, acerca do referido princípio, que: En este aspecto, me parece que el criterio fundamental es el que impone la naturaleza misma de los derechos humanos, la cual obliga a interpretar extensivamente las normas que los consagran o amplían y restrictivamente las que los limitan o restringen. Ese criterio fundamental –principio pro homine del Derecho de los Derechos Humanos--, conduce a la conclusión de que su exigibilidad inmediata e incondicional es la regla, y su 44 condicionamiento la excepción (...).

Desta forma, toda interpretação que se faça das normas convencionais de DH, deve sempre levar em conta o princípio pro persona45, de forma privilegiar sempre o indivíduo em face do Estado46. Desta forma, é vedado pelo artigo 29 da CADH qualquer interpretação que exclua o exercício de direitos previstos na CADH47, que sejam editadas leis que limitem direitos48, que exclua direitos inerentes 43

MACHADO, Isabel Penido de Campos. Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos: Comissão e Corte Interamericana de Direitos Humanos. In: OLIVEIRA, Bárbara da Costa Pinto (Org.); SILVA, Roberto Luiz (Org.). Manual de direito processual internacional. 1 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 427. 44 Corte IDH. Exigibilidad del Derecho de Rectificación o Respuesta (arts. 14.1, 1.1 y 2 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Opinión Consultiva OC-7/86 de 29 de agosto de 1986 – Voto Separado do Juiz Piza Escalante. Serie A No. 7. Disponível em: . Acessado em 23/10/2015. 45 “Na realização do controle de convencionalidade, a Corte Interamericana guia-se pelo princípio pro persona, conferindo prevalência à norma mais benéfica, destacando, em diversas sentenças, decisões judiciais proferidas pelas Cortes constitucionais latino-americanas, bem como menção as dispositivos das Constituições latino-americanas, como podem revelar os casos Pueblo Indígena Kichwa de Sarayaku vs. Equador (sentença proferida em 27 de junho de 2012), Atala Riffo y niñas vs. Chile (sentença proferia em 24 de fevereiro de 2012) e Gelman vs. Uruguai (sentença proferida em 24 de fevereiro de 2012)”. PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 129. 46 “(...), toda obrigação internacional de respeito aos direitos humanos não pode ser interpretada restritivamente em prol dos Estados, mas sim em prol do destinatário da proteção internacional dos direitos humanos, ou seja, o indivíduo”. RAMOS, André de Carvalho. Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 82 47 Artigo 29, letra a: “permitir a qualquer dos Estados Partes, grupo ou pessoa, suprimir o gozo e exercício dos direitos e liberdades reconhecidos na Convenção ou limitá-los em maior medida do que a nela prevista”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 23/10/2015. 48 Artigo 29, letra b: “limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possam ser reconhecidos de acordo com as leis de qualquer dos Estados Partes ou de acordo com outra convenção em que seja parte um dos referidos Estados”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969.

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à pessoa humana 49, ou que excluam ou limitem os efeitos das garantias previstas na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem50. Assim sendo, quando se fala em interpretação de normas convencionais do DIDH, tem-se sempre que analisá-las do ponto de vista de que os DH acompanham as transformações sociais51, e por isso os tratados que regulam a matéria são chamados de living instrument52, e que esta interpretação deve sempre partir do princípio hermenêutico pro persona53. Em resumo, verificou-se neste tópico que o controle de convencionalidade é exercido de forma concentrado e de forma difusa, a primeira é de competência da CorteIDH através da solução de casos contenciosos ou por meio da emissão das opiniões consultivas, a segunda deve ser exercida por todo juiz nacional, integrante do corpo da administração da Justiça interna dos Estados-partes, sempre com vistas ao fortalecimento e incorporação das fontes do DIDH.

Disponível em: . Acesso em: 23/10/2015. 49 Artigo 29, letra c: “excluir outros direitos e garantias que são inerentes ao ser humano ou que decorrem da forma democrática representativa de governo”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 23/10/2015. 50 Artigo 29, letra d: “excluir ou limitar o efeito que possam produzir a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais da mesma natureza”.ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 23/10/2015. 51 “Assim, a interpretação dos dois tribunais internacionais – Cortes Europeia e Interamericana – de direitos humanos hoje existentes não é estática, mas sim evolutiva, pois, como não poderia deixar de ser, toma em conta as transformações ocorridas no corpus da sociedade”. CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Vol. II, 1 ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, p. 55/56. 52 “The Court has established, as has the European Human Rights Court, that human rights treaties are living instruments, whose interpretation must go hand in hand with evolving times and current living conditions.This evolving interpretation is consistent with the general rules of interpretation set forth in Article 29 of the American Convention, as well as those established in the Vienna Convention on the Law of Treaties”. Caso Atalaya Riffo y Niñas Vs. Chile. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 24 de fevereiro de 2012. Serie C No. 239, Parágrafo 83. 53 “Assim, consolidaram-se na jurisprudência internacional de direitos humanos diversas diretrizes hermenêuticas nascidas desse princípio. A primeira delas impõe interpretação sistemática do conjunto de normas de direitos humanos (...). A segunda diretriz estabelece que a interpretação das eventuais limitações permitidas de direitos contidas nos tratados internacionais deve ser restritiva. (...) A terceira diretriz é relativa ao uso da interpretação pro homine na análise das omissões e lacunas das normas de direitos humanos”. RAMOS, André de Carvalho.Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 82/83.

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2.3.1 Controle de convencionalidade vs. controle de constitucionalidade Verificados os detalhes do controle de convencionalidade, importa agora verificar, ainda que brevemente, as diferenças entre o referido controle e o controle de constitucionalidade, aquele feito em face da Constituição de um Estado. Há que se considerar, de início, que a Constituição é rígida, ou seja, demanda um processo legislativo diverso e mais rigoroso para alteração de seu texto. Sobre isso, Paulo Bonavides leciona que: As Constituições rígidas, sendo Constituições em sentido formal, demandam um processo especial de revisão. Esse processo lhes confere estabilidade ou rigidez bem superior àquela que as leis ordinárias desfrutam. Daqui procede pois a supremacia incontrastável da lei constitucional sobre as demais regras de direito vigente num determinado ordenamento. Compõe-se assim uma hierarquia jurídica, que se estende da norma constitucional às normas inferiores (leis, decretos-leis, regulamentos etc.), e a que corresponde por igual uma hierarquia de órgãos. A consequência dessa hierarquia é o reconhecimento da “superlegalidade constitucional”, que faz da Constituição a lei das leis, a lex legum, ou seja, a mais alta expressão jurídica da soberania.54

Da lição apresentada é possível extrair mais, é possível verificar que toda produção normativa deve respeitar às normas constitucionais, sendo, portanto, a Constituição, limite de atuação do Poder Legislativo infraconstitucional. Não obstante, Hans Kelsen outrora apontou o valor supremo atribuído à Constituição de um Estado, ressalta ele que “levando em conta apenas a ordem jurídica estadual, a Constituição representa o escalão de Direito positivo mais elevado”55. A definição dada por J.J. Gomes Canotilho acerca do controle de constitucionalidade não pode deixar de ser citada, leciona ele que o “controlo de constitucionalidade – [é a] aferição da conformidade ou desconformidade dos actos normativos com o parâmetro constituído pelas normas e princípios da constituição (…)”56. Veja-se, então, que controle de constitucionalidade em nada tem a ver com controle de convencionalidade, a uma porque os fundamentos de validade das

54

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 29 ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 303. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Baptista Machado. 7 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 247. 56 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 7 ed. Coimbra: Almedina, 2003,pg 928, grifos no original. 55

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normas57 são diversos para cada controle, para o primeiro a norma fundamental é a Constituição, ao passo que para o segundo a norma fundamental é a CADH, a duas em razão do órgão que exerce o controle, no caso, concentrado, sendo que o de constitucionalidade

é exercido

somente

pelo

STF,

ao passo que o

de

convencionalidade é de competência da CorteIDH. Ainda que sucintamente, posto que não se pretende esgotar o tema, percebese a diferença existente entre a produção normativa ordinária que deve obediência às normas constitucionais, sujeitas, portanto, ao controle de sua conformidade com o texto da Constituição, bem como àquela mesma produção normativa ordinária que deve obedecer também às normas do DIDH, sujeitando-as, então, ao controle da conformidade do texto legislativo com as disposições, no caso, da CADH. 2.3.2 Controle de convencionalidade vs. controle de legalidade Para além do controle de constitucionalidade e de convencionalidade, há também o controle de legalidade, este último voltado especialmente à atuação da Administração Pública do Estado e dos entes federados, mas não a eles restrito. Se o controle de constitucionalidade verifica a validade da lei em face da Constituição, e se o controle convencionalidade verifica a validade de uma norma em face das normas contidas na CADH, o controle de legalidade verifica a conformidade dos atos praticados em face da lei em sentido estrito. J.J. Gomes Canotilho ensina que o “controlo de legalidade – [é a] aferição da conformidade ou desconformidade de actos normativos com o direito da lei (…)”58. Em outros termos, mas no mesmo sentido, o controle de legalidade não passa da verificação de se determinado ato (por exemplo, decreto, portaria, instrução normativa, etc.) está de acordo com a legislação infraconstitucional. O controle de legalidade tem vinculação direta com o princípio de mesmo nome, inerente à Administração Pública59, e “sucintamente se define como 57

“Como, dado o caráter dinâmico do Direito, uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma determinada maneira, isto é, pela maneira determinada por uma outra norma, esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela”. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Baptista Machado. 7 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 246. 58 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 7 ed. Coimbra: Almedina, 2003,pg 928, grifos no original. 59 “Este princípio (…) nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais

29

a sujeição do agir à lei, como produto da legislação estatal, sendo de especialíssima importância quanto aos órgãos da Administração Pública, como atos da Administração

enfaticamente

o

destacou

o

legislador

constitucional

(art.

37, caput)”60. Sobre este dever de obediência às normas constitucionais pela legislação que está abaixo de si, Norberto Bobbio indica que: Quando se diz que o juiz deve aplicar a lei, [é] no sentido de que o conteúdo da sentença deve corresponder ao conteúdo de uma lei. Se essa correspondência não ocorre, a sentença do juiz pode ser declarada inválida, 61 da mesma maneira que uma lei ordinária não conforme à Constituição.

Importa reforçar que a atuação do Estado deve ser pautada no brocardo de que ao ente particular é permitido fazer tudo o quanto não probido pela lei, enquanto que ao ente público só é permitido atuar dentro dos limites estabelecidos pela lei 62. Conjugando este limite ao fato de a legislação infraconstitucional ter um dever de observar as regras, normas e princípios constitucionais63, e também a necessidade de observância da legalidade pelo Estado, vê-se que o controle de legalidade está intimamente conectado à elaboração de atos infralegais que criem, por exemplo, políticas públicas. Desta forma, o controle de legalidade encontra seu fundamento de validade na lei, aquela mesma que regula a atuação corriqueira da Administração Pública, que regula a atuação do Estado em face da sociedade, sendo, portanto, diferente do controle de convencionalidade, que tem seu fundamento de validade na CADH, e é exercido pela CorteIDH.

direitos em benefício da coletividade”. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella Direito administrativo. 27 ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 64/65. 60 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. 61 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. 1 ed. São Paulo: EDIPRO, 2011, p. 67. 62 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 15 ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 314. 63 Sobre a produção escalonada do ordenamento jurídico: “Há normas superiores e normas inferiores. As normas inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores até aquelas que se encontram mais acima, chega-se enfim a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma suprema é a norma fundamental. Todo ordenamento possui uma norma fundamental. É essa norma fundamental que dá unidade a todas as outras normas; isto é, faz das normas esparsas e de variada proveniência um todo unitário, que se pode chamar, a justo título, de ‘ordenamento’. (…) Em virtude da presença de um ordenamento jurídico de normas superiores e inferiores, este apresenta uma estrutura hierárquica”. BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Solon. 1 ed. São Paulo: EDIPRO, 2011, p. 61.

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3

IMPACTO DO CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE

3.1

SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS O controle de convencionalidade impacta tanto na ordem interna dos Estados-

partes, quanto na ordem internacional. Tal afirmativa é possível considerando que o diálogo entre jurisdições64, como demonstrado, parte do princípio pro persona, o qual tem como baliza intransponível a pessoa humana. Neste sentido, ademais, há a conversa entre as ordens internas com a internacional, e da internacional com as ordens internas65, tendo sempre a finalidade de resguardo da pessoa humana em sua dignidade. Para uma melhor compreensão dos desafios do SIDH relacionados ao controle de convencionalidade, convém analisar o sistema e seus principais instrumentos, sem a pretensão de esgotar o tema. Os instrumentos protetivos dos DH no âmbito americano, tanto do sul, quanto central e do norte, são essencialmente quatro, conforme ressalta André de Carvalho Ramos, sendo eles: “a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, a Carta da Organização dos Estados Americanos, a Convenção Americana de Direitos Humanos e finalmente o Protocolo de San Salvador”66. O mesmo autor ressalta que: Esses diplomas forjaram dois sistemas de proteção, que interagem de modo expresso. O primeiro é o da Organização dos Estados Americanos (OEA), que utiliza os preceitos primários da Carta de criação da própria OEA. O segundo é o sistema da Convenção Americana de Direitos Humanos, criado no bojo da própria OEA.67

64

“Cláusulas de abertura constitucional e o princípio pro ser humano inspirador dos tratados de direitos humanos compõem os dois vértices – nacional e internacional – a fomentar o diálogo em matéria de direitos humanos”, p. 13. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o constitucionalismo regional transformador: o impacto do sistema interamericano. In: Revista dos Tribunais, ano 104, fevereiro de 2015, vol. 952, p.141/166. 65 Neste sentido: “De um lado, despontam Constituições latino-americanas com cláusulas constitucionais abertas, com destaque à hierarquia especial dos tratados de direitos humanos, à sua incorporação automática e às regras interpretativas alicerçadas no princípio pro persona (…), a Corte Interamericana guia-se pelo princípio pro persona, conferido prevalência à norma mais benéfica, destacando, em diversas sentenças, decisões judiciais proferidas pelas Cortes constitucionais latinoamericanas, bem como menção a dispositivos das Constituições latino-americanas”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o constitucionalismo regional transformador: o impacto do sistema interamericano. In: Revista dos Tribunais, ano 104, fevereiro de 2015, vol. 952, p 141/166. 66 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p.185. 67 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 185

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A respeito da CIDH, vale apontar que sua criação é datada antes mesmo da criação da própria CADH, tendo sido criada por ocasião da V Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores da OEA 68, em 1959. E somente a partir da reforma da Carta da OEA, em 1967, por meio do Protocolo de Buenos Aires, em seu artigo 5169, a CIDH foi alçada à categoria de órgão principal da OEA. A principal função da CIDH é “promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão consultivo da Organização em tal matéria” 70, sendo, portanto, um dos mais, senão o mais importante órgão de promoção dos DH da OEA. Porém, a CADH também trata da CIDH, mas não teve adesão da totalidade dos Estados-Partes, o que faz com que a atuação da Comissão deva observar por quais instrumentos deverá se pautar, sendo que: [a] competência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos alcança todos os Estados partes da Convenção Americana, em relação aos direitos humanos nela consagrados. A competência da Comissão alcança ainda todos os Estados membros da Organização dos Estados Americanos, em relação aos direitos consagrados na Declaração Americana de 1948.71

O que se vê é que mesmo tendo os limites de sua atuação em razão da ratificação ou não de ambos os tratados (CADH e Declaração Americana mais a Carta da OEA), a CIDH tem espaço para atuar em todo o continente americano, ora se valendo apenas da Declaração Americana juntamente com a Carta da OEA, ora se valendo do instrumento que institui um piso protetivo mínimo mais denso, com a aplicação direta da CADH. Esta possibilidade de atuação está prevista no Artigo 1 do Estatuto da CIDH, que dispõe exatamente que: Artigo 1

68

“A Comissão de Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), criada por decisão da V Reunião de Consulta dos Ministros as Relações Exteriores da Organização dos Estados Americanos, em Santiago, em 1959, teve, inicialmente, tarefas epans de promoção em sentido estrito – e não de proteção – dos direitos humanos, funcionando como órgão autônomo do sistema da OEA. Suas atribuições e status institucional foram, porém, sucessivamente fortalecidos”. ALVES, José Augusto Lindgren. Os direitos humanos como tema global. 2 ed. São Paulo: Perspectiva, 2003, p. 77/78. 69 “Artigo 51. A Organização dos Estados Americanos realiza os seus fins por intermédio: (…) e) da Comissão Interamericana de Direitos Humanos”.ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Protocolo de Buenos Aires. Buenos Aires, Argentina: 1967. Disponível em: . Acesso em: 06/10/2015. 70 Artigo 112 do Protocolo de Buenos Aires. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Protocolo de Buenos Aires. Buenos Aires, Argentina: 1967. Disponível em: . Acesso em: 06/10/2015. 71 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 143.

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1. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão da Organização dos Estados Americanos criado para promover a observância e a defesa dos direitos humanos e para servir como órgão consultivo da Organização nesta matéria. 2. Para os fins deste Estatuto, entende-se por direitos humanos: a. os direitos definidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos com relação aos Estados Partes da mesma; b. os direitos consagrados na Declaração Americana de Direitos e Deveres 72 do Homem, com relação aos demais Estados membros.

Portanto, a CIDH tem uma ampla atuação na consolidação dos Direitos Humanos no SIDH. Não é fora de propósito apontar que o surgimento do SIDH, e sua luta constante na defesa e na consolidação dos DH na região latino-americana é desafiadora, aponta-se para um duplo desafio: “romper em definitivo com o legado da cultura autoritária ditatorial e consolidar o regime democrático” 73. Parte-se então da premissa de que ao SIDH incumbe o dever de encorajar a manutenção da democracia nos Estados-partes da OEA74, e sobre a democracia é interessante notar que: Democracia é conceito histórico. Não sendo por si um valor-fim, mas meio e instrumento de realização de valores essenciais de convivência humana, que se traduzem basicamente nos direitos fundamentais do homem, compreende-se que a historicidade destes a envolva na mesma medida, enriquecendo lhe o conteúdo a cada etapa do evolver social, mantido sempre o princípio básico de que ela [a democracia] revela um regime político em que o poder repousa na vontade do povo. Sob esse aspecto, a democracia não é um mero conceito político abstrato e estático, mas é um processo de afirmação do povo e de garantia dos direitos fundamentais que o povo vai conquistando no correr da história.75

Denota-se que à CIDH incumbe o dever de zelar pela continuidade das instituições democráticas nos Estados-partes, sendo a democracia indispensável à paz, estabilidade, e o desenvolvimento da região dos Estados americanos 76.

72

ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Estatuto da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. La Paz, Bolívia: 1979. Disponível em: . Acesso em: 05/10/2015. 73 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 138. 74 Em seu preâmbulo: ”Certos de que o verdadeiro sentido da solidariedade americana e da boa vizinhança não pode ser outro senão o de consolidar neste Continente, dentro do quadro das instituições democráticas, um regime de liberdade individual e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do Homem”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Carta da Organização dos Estados Americanos. 1967. 75 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 37 ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 127/128. 76 Em seu preâmbulo: “Seguros de que a democracia representativa é condição indispensável para a estabilidade, a paz e o desenvolvimento da região”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Carta da Organização dos Estados Americanos. 1967.

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Mas, para além do importantíssimo papel desenvolvido pela CIDH, os próprios Estados-partes são responsáveis pela internalização das normas de direito internacional, especialmente as que dizem respeito aos DH no Sistema Interamericano, observando os compromissos internacionalmente assumidos 77. E é nesta internalização que o controle de convencionalidade impacta na ordem interna dos Estados-partes da OEA, no sentido de que há efetiva necessidade de adequação da legislação interna com o quanto disposto nos mais diversos instrumentos internacionais protetivos de DH, especialmente com relação àqueles Estados que ratificaram também a CADH. Neste contexto, vale apontar que, para que haja uma efetividade das normas internacionais de DH, as Constituições latino-americanas têm previsto, em sua maioria, cláusulas de abertura constitucional, ou estatalidade aberta78, aumentando assim, o bloco de constitucionalidade referente a direitos e garantias fundamentais tendo como ponto de partida a dignidade da pessoa humana. Sobre isto, é relevante considerar que: La estatalidad abierta respecto a los derechos humanos tiene lugar tempranamente en el constitucionalismo latinoamericano. (...) En el marco del constitucionalismo democrático, la permeabilidad hacia la aplicación de los tratados y convenciones internacionales de derechos humanos en el ámbito domestico ha recibido amplio tratamiento en la doctrina, básicamente en cuanto a las formas de remisión que hacen las proprias Constituciones, bien mencionando las distintas técnicas, bien categorizando las técnicas de reenvío dentro de la figura del bloque de constitucionalidad.79

77

Sobre isto, vale menção ao artigo 26 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratatdos, internalizado no Brasil por meio do Decreto 7.030, de 14/12/2009: “Todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser cumprido por elas de boa fé”. Em complemento, veja-se que “em suma, o que se extrai do enunciado do art. 26 da Convenção é que a obrigação de respeitar os tratados é um princípio necessário do Direito Internacional; necessário porque sem ele a segurança das relações entre os povos e a paz internacional seriam impossíveis”. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 8 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 278. 78 “Hay distintas denominaciones (como cláusulas de apertura, cláusulas de diálogo, normas de reenvío, habilitaciones constitucionales para la integración)”. Cf. ANTONIAZZI, Mariela Morales. La doble estatlidad aberta: interamericanización y mercusorización de las Constituciones suramericanas. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.).Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 189/190. 79 ANTONIAZZI, Mariela Morales. La doble estatlidad aberta: interamericanización y mercusorización de las Constituciones suramericanas. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.).Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 190.

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A respeito das cláusulas de abertura constitucional, ou seja, de abertura do ordenamento jurídico interno para recebimento de normas internacionais – especialmente em matéria de DH –, vale apontar, no que diz respeito à América Latina, que: A Constituição da Argentina, após a reforma constitucional de 1994, dispõe, no artigo 75, inciso 22, que, enquanto os tratados em geral têm hierarquia infra-constitucional, mas supralegal, os tratados proteção dos direitos humanos têm hierarquia constitucional, complementando os direitos e garantias constitucionalmente reconhecidos. A Constituição Brasileira de 1988, no artigo 5º, parágrafo 2º, consagra que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem os direitos decorrentes dos princípios e do regime a ela aplicável e os direitos enunciados em tratados internacionais ratificados pelo Brasil, permitindo, assim, a expansão do bloco de constitucionalidade. A (…) atual Constituição do Peru de 1993 consagra que os direitos constitucionalmente reconhecidos devem ser interpretados em conformidade com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e com os tratados de direitos humanos ratificados pelo Peru. (…) A Constituição da Colômbia de 1991, reformada em 1997, confere, no artigo 93, hierarquia especial aos tratados de direitos humanos, determinando que estes prevalecem na ordem interna e que os direitos humanos constitucionalmente consagrados serão interpretados em conformidade com os tratados de direitos humanos ratificados pelo país. Também a Constituição do Chile de 1980, em decorrência da reforma constitucional de 1989, passou a consagrar o dever dos órgãos do Estado de respeitar e promover os direitos garantidos pelos tratados internacionais ratificados por aquele país. Acrescente-se a Constituição da Bolívia de 2009, ao estabelecer que os direitos e deveres reconhecidos constitucionalmente serão interpretados em conformidade com os tratados de diretos humanos ratificados pela Bolívia, que prevalecerão em relação à própria Constituição se enunciarem direitos mais favoráveis (artigos 13, IV e 256). Na mesma direção, destaca-se a Constituição do Equador de 2008, ao consgrar que a Constituição e os tratados de direitos humanos ratificados pelo Estado que reconheçam direitos mais favoráveis aos previstos pela Constituição têm prevalência em relação a qualquer outra norma jurídica ou ato do Poder Público (artigo 424), adicionando que serão aplicados os princípios pro ser humano, de não restrição de direitos, de aplicabilidade direita e de cláusula constitucional aberta (artigo 416). A Constituição do México, com a reforma de junho de 2011, passou a contemplar a hierarquia constitucional dos tratados de direitos humanos e a regra interpretativa fundada no princípio pro persona.80

Neste sentido, considerando que os textos constitucionais latino americanos visam a incorporação dos direitos e garantias expressos nos tratados internacionais de DH, não há como se atribuir valor hierárquico inferior ao da Constituição para estes tratados, posto que eles vêm à dar máxima efetividade aos direitos já inseridos

80

PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o constitucionalismo regional transformador: o impacto do sistema interamericano. In: Revista dos Tribunais, ano 104, fevereiro de 2015, vol. 952, 141/166.

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no texto constitucional81. Observe-se ainda que ao prever cláusulas de abertura, bem como, no caso brasileiro, de aplicabilidade imediata das normas que versem sobre direitos e garantias fundamentais82, os tratados de direitos humanos que contenham normas acerca de direitos e garantias fundamentais são passíveis de aplicação direta e imediata83, mais uma vez a fim de ser garantida a máxima proteção da pessoa humana. Em se tratando, especialmente, do trato brasileiro acerca das cláusulas de abertura constitucional, verifica-se que: O art. 5º, § 2º, da Lei Maior estabelece que “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que República Federativa do Brasil seja parte”. O parágrafo em questão dá ensejo a que se afirme que se adotou um sistema aberto de direitos fundamentais no Brasil, não se podendo considerar taxativa a enumeração dos direitos fundamentais no Título II da Constituição. Essa interpretação é sancionada pelo Supremo Tribunal Federal (…). É legítimo, portanto, cogitar direitos fundamentais previstos expressamente no catálogo da Carta e de direitos materialmente fundamentais no que estão fora da lista. (…) A sua fundamentalidade decorre de sua referência a posições jurídicas ligadas ao valor da dignidade humana; em vista de sua importância, não podem ser deixados à disponibilidade do legislador ordinário.84

Portanto, verifica-se que a Constituição da República Federativa do Brasil admite a existência de outros direitos e garantias fundamentais à pessoa que possam advir de textos internacionais, sendo estes os textos dos tratados internacionais, que são também considerados, portanto, fontes de direitos85. 81

“Essa conclusão advém de interpretação sistemática e teleológica do texto, especialmente em face da força expansiva dos valores da dignidade humana e dos direitos fundamentais, como parâmetros axiológicos a orientar a compreensão do fenômeno constitucional. A esse raciocínio se acrescentam o princípio da máxima efetividade das normas constitucionais referentes a direitos e garantias fundamentais, o que justifica estender aos direitos enunciados em tratados o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais”. PIOVESAN, Flávia. Temas de direitos humanos. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p.61/62, 82 “Art. 5º, § 1º: As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Congresso Nacional: 1988. 83 “Vale dizer, torna-se possível a invocação imediata de tratados e convenções de direitos humanos, dos quais o Brasil seja signatário, sem a necessidade de edição de ato com força de lei, voltado à outorga de vigência interna aos acordos internacionais”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 156. 84 BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 170/171. 85 “Daí, as três fontes dos direitos e garantias: (a) os expressos (art. 5º, I a LXXVIII); (b) os decorrentes dos princípios e regime adotados pela Constituição; (c) os decorrentes de tratados e convenções internacionais adotados pelo Brasil”. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 37 ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 184.

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Acrescente-se que a doutrina brasileira ainda não chegou num consenso sobre o grau hierárquico dos tratados de direitos humanos, especialmente em razão do contido nos parágrafos 2º e 3º, ambos do artigo 5º da Constituição da República. Na linha das lições de Flávia Piovesan86, Sergio Arenhart87, Valerio Mazzuoli88, dentre outros autores, os tratados de DH seriam materialmente constitucionais, não sendo de todo relevante que fosse internalizado por procedimento legislativo semelhante à aprovação de emenda constitucional, considerando o disposto no art. 5º, § 2ª, da Constituição da República. Já para Gilmar Mendes, os tratados internacionais de DH têm hierarquia meramente supralegal, se internalizados sem observância do rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição, sendo que se observado o iter procedimental do referido parágrafo, aí serão os tratados equivalentes à emenda constitucional89. A mesma linha segue Alexandre de Moraes, para quem não existe hierarquia entre tratado internacional, de direitos humanos ou não, e lei ordinária90, ressalvado o contido no art. 5º, § 3º, da Constituição da República. Entretanto, considere-se que:

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“A Constituição de 1988 recepciona os direitos enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte, conferindo-lhes natureza de norma constitucional. Isto é, os direitos constantes nos tratados internacionais integram e complementam o catálogo de direitos constitucionalmente previsto, o que justifica estender a esses direitos o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 124. 87 “Melhor seria concluir que as normas sobre direitos humanos têm, independentemente de sua origem ou do regime de sua aprovação, força constitucional, à luz do que prevê o art. 5º, § 2º, da CR, que já autorizava essa orientação”. ARENHART, Sérgio Cruz. O Supremo Tribunal Federal e a prisão civil.In:MARINONI, Luiz Guilherme (coord.); MAZZUOLI, Valerio de Oliveira (coord). Controle de Convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. 1 ed. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 293. 88 “(…) é possível concluir que todos os tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Estado brasileiro e em vigor entre nós têm índole e nível de normas constitucionais, quer seja uma hierarquia somente material (o que chamamos de ‘status de norma constitucional’), quer seja tal hierarquia material e formal (ao que se nomina de ‘equivalência de emenda constitucional’)”. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O Controle Jurisdicional de Convencionalidade das Leis. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: 2013, p. 78. 89 “Em suma, se os tratados de direitos humanos podem ser (a) equivalentes às emendas constitucionais ou, ainda, (b) supralegais, o certo é que estando acima das normas infraconstitucionais, hão de ser também paradigma de controle da produção normativa doméstica”. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 1055. 90 “Dessa forma, não existe hierarquia entre as normas ordinárias de direito interno e as decorrentes de atos ou tratados internacionais. A ocorrência de eventual conflito entre essas normas será resolvida ou pela aplicação do critério cronológico, devendo a norma posterior revogar a norma anterior, ou pelo princípio da especialidade”. MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 394.

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(…) não parece adequada a posição de “supralegalidade” adotada pelo Supremo Tribunal Federal. De um lado, ao criar elemento intermediário na hierarquia das normas, traz problemas desnecessários e complicadores à própria aplicação desses instrumentos de proteção de direitos humanos. De outra banda, parece que essa solução não dá o devido status a esses tratados de direitos humanos, menosprezando seu valor e sua importância para o direito interno e internacional atual.91

Com isto, vê-se que o SIDH tem trilhado, nos dias atuais, o caminho para a pavimentação de um ius commune latino-americano em matéria de DH, que é permeado por muitos desafios92, mas que também é muito promissor em sua tarefa, seja em razão da grande maioria das constituições previrem normas de abertura ao DIDH, seja em razão da atuação da CIDH na defesa e promoção dos DH na região. 3.2

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS Outro importantíssimo órgão internacional regional de proteção dos DH no

âmbito da OEA é a Corte Interamericana de Direitos Humanos, porém, “é uma instituição judicial autônoma, não sendo um órgão da OEA, mas sim da Convenção Americana de Direitos Humanos”93. A atuação da CorteIDH se divide em jurisdição contenciosa e consultiva, sendo a lição de Thomas Buergenthal de que: A Convenção Americana investe a Corte Interamericana em duas atribuições distintas. Uma envolve o poder de adjudicar disputas relativas à denúncia de que um Estado-parte violou a Convenção. Ao realiar tal atribuição, a Corte exerce a chama jurisdição contenciosa. A outra atribuição da Corte é a de interpretar a Convenção Americana e determinados tratados de direitos humanos, em procedimentos que não 91

ARENHART, Sérgio Cruz. O Supremo Tribunal Federal e a prisão civil.In:MARINONI, Luiz Guilherme (coord.); MAZZUOLI, Valerio de Oliveira (coord). Controle de Convencionalidade: um panorama latino-americano: Brasil, Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai. 1 ed. Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 293. 92 A citada autora aponta sete desafios contemporâneos para a formação deste ius commune latinoamericano em direitos humanos: “Promover a ampla ratificação dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos da ONU e da OEA; (…) Fortalecer a incorporação dos tratados de direitos humanos com um status privilegiado na ordem jurídica doméstica; (…) Fomentar uma cultura orientada pelo controle de convencionalidade; (…) Fomentar programas de capacitação para que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário apliquem os parâmetros protetivos internacionais em matéria de direitos humanos; (…) Dinamizar o diálogo entre os sistemas regionais objetivando seu fortalecimento; (…) Aprimorar os mecanismos de implementação das decisões internacionais no âmbito interno; (…) Dinamizar o diálogo horizontal entre as jurisdições constitucionais”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o diálogo jurisdicional no contexto latino-americano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 405/408. 93 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 221.

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envolvem a adjudicação para fins específicos. Esta é a jurisdição consultiva da Corte Interamericana.94

A jurisdição consultiva da CorteIDH pode ser acessada por qualquer Estadoparte da OEA95, tendo ratificado ou não a CADH, havendo disposição expressa sobre isto na CADH96, além de tal matéria ter sido objeto da Opinião Consultiva 01/82, de 24 de setembro de 198297. A emissão de pareceres pela CorteIDH é de suma importância para o exercício do controle de convencionalidade antes de uma violação efetiva de DH, posto que “pode a Corte emitir parecer consultivo a pedido de um Estado em relação a compatibilidade de suas leis internas e à Convenção americana”98, seria então um controle de convencionalidade preventivo. Em que pese haver informação de a CorteIDH ter emitido 20 opiniões consultivas99, é importante que se acrescente a novel Opinião Consultiva nº 21/14, de 09 de agosto de 2014, à respeito dos “direitos e garantias de crianças no contexto da imigração e/ou em necessidade de proteção internacional”, por solicitação da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai 100. 94

BUERGENTHAL, Thomas. The inter-american system for the protection of human rights, p. 460 apud PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 151. 95 “No plano consultivo, qualquer membro da OEA – parte ou não da Convenção – pode solicitar o parecer da Corte relativamente à interpretação da Convenção ou de qualquer outro tratado relativo à proteção dos direitos humanos aplicável aos Estados americanos”. PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 151/152. 96 “Artigo 641. Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. 2. A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 12/09/2015. 97 “LA CORTE ES DE OPINIÓN, Primero, Por unanimidad, que la competencia consultiva de la Corte puede ejercerse, en general, sobre toda disposición, concerniente a la protección de los derechos humanos, de cualquier tratado internacional aplicable en los Estados americanos, con independencia de que sea bilateral o multilateral, de cuál sea su objeto principal o de que sean o puedan ser partes del mismo Estados ajenos al sistema interamericano”. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Parecer Consultivo OC-01/82, de 24 de setembro de 1982. Disponível em: . Acesso em: 14/10/2015. 98 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 242. 99 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 153. 100 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Parecer Consultivo OC-21/14, de 19 de agosto de 2014. Disponível em: . Acesso em: 14/10/2015.

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Vê-se, portanto, que a CorteIDH tem em sua função consultiva aquilo que anteriormente se chamou de controle de convencionalidade concentrado, posto que emite opiniões sem haver um caso de efetiva violação sob julgamento. A outra função da CorteIDH é a contenciosa. E diferentemente do acesso à CIDH, quando for necessário acionar a CorteIDH em sua função contenciosa, somente os Estados-partes da CADH e a CIDH o podem fazer 101. Não obstante, somente podem figurar no polo ativo ou passivo de uma demanda contenciosa, os Estados-partes da CADH que tenha reconhecido a jurisdição contenciosa da CorteIDH, tal como previsto no art. 62 (3) da CADH 102. Este reconhecimento não automático da jurisdição contenciosa da CorteIDH “constitui um anacronismo histórico, que deve ser superado”103. Em que pese a análise do impacto da jurisprudência da CorteIDH seja objeto do próximo item, convém, neste momento, apontar que a interpretação que faz a CorteIDH dos dispositivos convencionais não é estanque, tendo a CorteIDH se manifestado da seguinte forma: Este Tribunal ha señalado en otras oportunidades que los tratados de derechos humanos son instrumentos vivos, cuya interpretación tiene que acompañar la evolución de los tiempos y las condiciones de vida actuales. Tal interpretación evolutiva es consecuente con las reglas generales de interpretación establecidas en el artículo 29 de la Convención Americana, así como en la Convención de Viena sobre el Derecho de los Tratados. Al efectuar una interpretación evolutiva la Corte le ha otorgado especial relevancia al derecho comparado, razón por la cual ha utilizado normativa nacional o jurisprudencia de tribunales internos a la hora de analizar controversias específicas en los casos contenciosos. Por su parte, la Corte Europea ha utilizado el derecho comparado como un mecanismo para identificar la práctica posterior de los Estados, es decir para especificar el contexto de un determinado tratado. Además, el parágrafo tercero del artículo 31 de la Convención de Viena autoriza la utilización para la interpretación de medios tales como los acuerdos o la práctica o reglas relevantes del derecho internacional que los Estados hayan manifestado

101

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 156. 102 “Artigo 62 (…) 3. A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados Partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por declaração especial, como preveem os incisos anteriores, seja por convenção especial”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 16/09/2015. 103 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 155.

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sobre la materia del tratado, lo cual se relaciona con una visión evolutiva de 104 la interpretación del tratado .

Ou seja, quando a CorteIDH profere uma sentença de condenação, para além de apenas condenar um Estado, não apenas limitada ao pagamento de indenizações, faz ela uma interpretação dos dispositivos da CADH, sendo que: As sentenças da Corte Interamericana possuem o efeito de coisa julgada inter partes, vinculando as partes em litígio. Entretanto, cabe considerar o efeito de coisa interpretada de um julgado da Corte, pelo qual os órgãos internos devem se orientar pela interpretação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, sob pena de concretizar a responsabilidade internacional do Estado que representam. Ignorar o efeito de coisa interpretada e enfatizar a vinculação das partes somente em um litígio perante a Corte é atitude, no mínimo, irrealista dos órgãos que representam o Estado e que, por isso mesmo, deveriam se preocupar em evitar sua responsabilização internacional.105

A partir desta breve análise, já que não se pretende esgotar o tema acerca da CorteIDH, verifica-se que ao contrário do sistema utilizado no Brasil, o Civil Law106, a CorteIDH se vale do sistema da Common Law107, em outras palavras, note-se que “para além de decidirem a demanda, [os juízes] fixam conceitos e moldam linhas interpretativas dos direitos previstos no sistema regional, assim como orientam o funcionamento dos mecanismos de proteção e promoção dos direitos humanos” 108.

104

CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso Artavia Murillo e outros (fertilização in vitro) vs. Costa Rica. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Julgamento de 28 de novembro de 2012. Série C, nº 257. Disponível em: . Acesso em: 16/10/2015. 105 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 236. 106 Sobre a Civil Law: “Na ‘civil law’ (…) uma decisão isolada, propriamente, não constituiria jurisprudência; por outro lado, sua eventual força normativa advém não da ‘communisopinio juris’ do povo, mas do prestígio do órgão que permite a formação da jurisprudência, sem, no entanto, apresentar o caráter de obrigatoriedade”. SOARES, Guido Fernando Silva. O que é a “Common Law”, em particular, a dos EUA. Disponível em: . Acesso em: 16/10/2015. 107 Sobre a Common Law: “(…) tem um efeito além das partes ou da questão resolvida (e aqui reside a tipicidade da Common Law), pois cria o precedente, com força obrigatória para casos futuros. O precedente não é uma regra abstrata, mas uma regra intimamente ligada aos fatos que lhe deram origem. (…) Na ‘common-law’, um único julgado é considerado como precedente obrigatório, pois declara a existência de uma norma jurídica, para o ‘fattispecie’, sendo, portanto a jurisprudência, a fonte primeira formal do direito”. SOARES, Guido Fernando Silva. O que é a “Common Law”, em particular, a dos EUA. Disponível em: . Acesso em: 16/10/2015. 108 WEIS, Carlos. Direitos humanos contemporâneos. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 173;

41

Parafraseando Flávia Piovesan, a partir da análise dos casos julgados pela CorteIDH, assim como compreendendo a edição de medidas provisórias, pode-se elencar um rol de violações de DH de 6 categorias diversas: 1) Violações que refletem o legado do regime autoritário ditatorial Esta categoria compreende a maioria significativa das decisões da Corte Interamericana, que tem por objetivo prevenir arbitrariedades e controlar o excessivo uso da força, impondo limites ao poder punitivo do Estado. A título de exemplo, destaca-se o leading case – Velasquez Rodriguez versus Honduras concernente a desaparecimento forçado. (…) 2) Violações que refletem questões da justiça de transição (transitional justice) Nesta Categoria de casos estão as decisões relativas ao combate à impunidade, às leis de anistia e ao direito à verdade. No caso Barrios Altos (massacre que envolveu a execução de 15 pessoas por agentes policiais), em virtude da promulgação e aplicação de leis de anistia (…), o Peru foi condenado a reabrir investigações judiciais sobre os fatos em questão, relativos ao “massacre Barrios Altos”, de forma a derrogar ou a tornar sem efeito as leis de anistia mencionadas. (…) Em 2010, no caso Gomes Lund e outros versus Brasil, a Corte Interamericana condenou o Brasil em virtude do desaparecimento de integrantes da guerrilha do Araguaia durante as operações militares ocorridas na década de 70. (…) 3) Violações que refletem desafios acerca do fortalecimento de instituições e da consolidação do Estado de Direito (rule of law) Esta terceira categoria de casos remete ao desafio do fortalecimento de instituições e da consolidação do rule of law, particularmente no que se refere ao acesso à justiça proteção judicial e fortalecimento e independência do Poder Judiciário. (…) 4) Violações de direitos de grupos vulneráveis Esta quarta categoria de casos atém-se a decisões que afirmam a proteção de direitos de grupos socialmente vulneráveis, como os povos indígenas, as crianças, os migrantes, os presos, dentre outros. (…) 5) Violações a direitos sociais Nesta quinta categoria de casos emergem decisões da Corte que protegem direitos sociais. Importa reiterar que a Convenção Americana de Direitos Humanos estabelece direitos civis e políticos, contemplando apenas a aplicação progressiva dos direitos sociais (artigo 26). Já o Protocolo de San Salvador, ao dispor sobre direitos econômicos, sociais e culturais, prevê que somente os direitos à educação e à liberdade sindical seriam tuteláveis pelo sistema de petições individuais (artigo 19, parágrafo 6º). No caso Acevedo Buendia vs. Peru, a Corte reconheceu que os direitos humanos devem ser interpretados sob a perspectiva de sua integralidade e interdependência, a conjugar direitos civis e políticos e direitos econômicos, sociais e culturais, inexistindo hierarquia entre eles e sendo todos direitos exigíveis. Realçou ser a aplicação progressiva dos direitos sociais suscetível de controle e fiscalização pelas instâncias competentes, destacando o dever dos Estados de não-regressividade em matéria de direitos sociais. (…) 6) Violações a novos direitos da agenda contemporânea (…) [E]sta sexta categoria de casos compreende novos direitos da agenda contemporânea, com especial destaque aos direitos reprodutivos. (…)

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Recorrendo a uma interpretação evolutiva, a Corte observou que o procedimento da fertilização in vitro não existia quando a Convenção foi elaborada, conferido especial relevância ao Direito Comparado, por meio do diálogo com a experiência jurídica latino-americana e de outros países, como os EUA e a Alemanha, a respeito da matéria.109

Sem a pretensão de trabalhar toda a temática do impacto da CorteIDH em sua atuação, pôde-se observar, entretanto, que tal Tribunal Internacional é de relevantíssima importância para a evolução dos DH na região americana, eis que, como verificado, a interpretação das disposições convencionais vincula a atuação interna dos Estados-partes, de sorte a haver o diálogo entre as fontes, considerando a existência de uma “coisa interpretada”110 (à analogia de coisa julgada), e considerando que o sistema da Common Law, utilizado para solução de controvérsias internacionais de eventuais violações de DH. 3.3

JURISPRUDÊNCIA DA CORTE INTERAMERICANA E O SEU IMPACTO NA

AMÉRICA LATINA Em sua atuação, a CorteIDH, como demonstrado, tem função contenciosa e consultiva, e suas decisões se dividem em contenciosas, consultivas e, ainda, cautelares111. Por oportuno, verifique-se que o termo jurisprudência significa “[d]outrina assentada pelas decisões das autoridades competentes, ao interpretarem os textos pouco claros da lei ou ao resolverem casos por esta não previstos”112, ou seja, é o que faz a CorteIDH ao interpretar os dispositivos da CADH quando emite reiteradas decisões acerca de determinado assunto113.

109

PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Constitucionalismo Regional Transformador: o impacto do sistema interamericano. In: Revista dos Tribunais, ano 104, fevereiro de 2015, vol. 952, p.141-166. 110 RAMOS, André de Carvalho. Processo internacional de direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 236. 111 Cf. nota de rodapé nº 15: “(…). Normalmente, esta competência [cautelar] está incluída dentro da contenciosa, entretanto, com sua capacidade [de] conhecer e prescrever resoluções relativas a assuntos que não estão submetidos ainda à jurisdição contenciosa, é possível afastar-se da classificação tradicional e coloca-la de maneira independente (…)”. JUÁREZ, Karlos A. Castilla. Delimitando a força jurídica da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Traduzido por Raul Victor Rodrigues do Nascimento e Thiago Oliveira Moreira. In: Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 2, n.1, jan./jun.2014, p. 103/140. 112 “Jurisprudência”. Dicionário Michaelis. Disponível em: . Acesso em: 21/10/2015. 113 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 147.

43

Convém ressaltar que a jurisprudência, tanto para o direito internacional, quanto para o DIDH, é meio auxiliar de interpretação das normas convencionais114, e neste sentido orientam os tribunais nacionais sobre como a CorteIDH interpreta determinado dispositivo, a fim de que o Estado-parte não venha a ser responsabilizado internacionalmente, ou seja, “a jurisprudência tem como principal função a de servir como elemento de interpretação do Direito Internacional” 115. Notese, porém, que a sentença, ou a condenação, não pode ser imposta a todos os Estados-partes indistintamente, seja por dicção expressa contida na CADH116, seja por uma questão lógica117. A jurisprudência da CorteIDH também considera que os tratados de DH devem ser interpretados de forma evolutiva, e, sobre isso, A. A. Cançado Trindade leciona que: Os tratados de direitos humanos são instrumentos vivos, que acompanham a evolução dos tempos e do meio social em que se exercem os direitos protegidos. Sua interpretação dinâmica ou evolutiva encontra expressão na jurisprudência internacional. (…) A dimensão inter-temporal tem sido igualmente respaldada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos. Assim, em seu décimo Parecer (1989), a Corte ponderou que se deveria analisar o valor e a significação da Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem não à luz do que se pensava em 1948, quando de sua adoção, mas sim “no nomento atual, ante o que é hoje o sistema interamericano” de proteção, levando em consideração a “evolução experimentada desde a adoção da Declaração”.118

114

“Ocorre que, como explica Virally, não somente as decisões da Corte [Internacional de Justiça] são capazes de criar regras particulares de Direito Internacional, pos o mesmo ocorre com ‘as decisões de qualquer tribunal internacional, sem importar sua formação, sendo irrelevante se dito fenômeno foi ou não expressamente estipulado em tratados pelos quais os tribunais foram estabelecidos’”. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de direito internacional público. 8 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 147. 115 JUÁREZ, Karlos A. Castilla. Delimitanto a força jurídica da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Traduzido por Raul Victor Rodrigues do Nascimento e Thiago Oliveira Moreira. In: Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 2, n.1, jan./jun.2014, (ISSN: 23186526), p. 108. 116 “Artigo 68. 1. Os Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”. ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 22/09/2015. 117 “Quando não é parte [no caso contencioso], o Estado só está obrigado a cumprir a CADH, embora deva ter em conta os precedentes e alinhamentos jurisprudenciais da Corte Interamericana, isto é, tomar em consideração as possíveis implicações que as sentenças pronunciadas em outros casos possam ter dentro de seus próprios ordenamentos jurídicos e práticas legais”. JUÁREZ, Karlos A. Castilla. Delimitanto a força jurídica da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Traduzido por Raul Victor Rodrigues do Nascimento e Thiago Oliveira Moreira. In: Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 2, n.1, jan./jun.2014, (ISSN: 2318-6526), p. 115: 118 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Vol. II, 1 ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2003, págs. 53/55.

44

Portanto, não se pode negar que a jurisprudência é de suma importância na região interamericana. Somado à importância da jurisprudência, o diálogo a ser realizado entre jurisprudências nacionais e internacionais pode se dar de três formas, a saber, de cima para baixo, quando as cortes nacionais aplicam a jurisprudência da CorteIDH119; de baixo para cima, quando a CorteIDH se utiliza da jurisprudência dos tribunais nacionais para resolver um caso 120; de forma horizontal, quando um tribunal nacional se vale da jurisprudência de um tribunal de outra nacionalidade121. Para este estudo, verificar-se-á apenas a o diálogo vertical de cima para baixo, ou seja, de como a jurisprudência da CorteIDH é utilizada no âmbito dos tribunais

domésticos.

A

metodologia

empregada

consistira

em

acessar

eletronicamente a base de jurisprudência dos Estados-partes da CADH que reconheceram a competência da CorteIDH122, especialmente dos seguintes Estados: Argentina123,

119

Brasil124,

Chile125,

Colômbia126,

Costa

Rica127,

Equador128,

“Por otra parte, las convergencias de interpretación entre las cortes des sistema se conciben como el resultado de un proceso de interacciones multidireccionales de al menos tres tipos: 1. Convergencia top-down: la corte constitucional nacional adopta estándares fijados por la Corte Interamericana (…)”. GÓNGORA-MERA, Manuel Eduardo. Interacciones y convergências entre la corte interamericana de derechos humanos e os tribunales constitucionales nacionales: um enfoque coevolutivo. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 333. 120 “Por otra parte, las convergencias de interpretación entre las cortes des sistema se conciben como el resultado de un proceso de interacciones multidireccionales de al menos tres tipos: (…) 2. Convergencia bottom-up: la Corte Interamericana adopta estándares judiciales desarollados por una corte constitucional des sistema”. GÓNGORA-MERA, Manuel Eduardo. Interacciones y convergencias entre la corte interamericana de derechos humanos e os tribunales constitucionales nacionales: um enfoque coevolutivo. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 333. 121 “Por otra parte, las convergencias de interpretación entre las cortes des sistema se conciben como el resultado de un proceso de interacciones multidireccionales de al menos tres tipos: (…) 3. Convergencia horizontal: las cortes constitucionales adoptan estándares judiciales de sus pares de otros países del sistema, ya sea directamente o por intermedio de la Corte Interamericana”. GÓNGORA-MERA, Manuel Eduardo. Interacciones y convergencias entre la corte interamericana de derechos humanos e os tribunales constitucionales nacionales: um enfoque coevolutivo. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 333. 122 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos: estado de assinaturas e ratificações. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 22/09/2015 123 ARGENTINA. Corte Suprema de Justicia de La Nación. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015.

45

Guatemala129, México130, Paraguai131, República Dominicana132, Uruguai133. Sendo que nos sistemas de busca, todos das Cortes constitucionais nacionais, utilizou-se o termo "controle de convencionalidade" (quando em português) e "control de convencionalidad" (quando em espanhol). Com o resultado das buscas, obteve-se que: 7 casos utilizaram o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte Suprema da Argentina; nenhum caso utilizou o termo "controle de convencionalidade" em casos decididos no Supremo Tribunal Federal do Brasil; 1 caso utilizou o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte Constitucional do Chile; 13 casos utilizaram o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte Constitucional

da

Colômbia;

50

casos

utilizaram

o

termo

"control

de

convencionalidad" na Corte Suprema da Costa Rica; 1 caso utilizou o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte Constitucional do Equador; 2 casos utilizaram o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte de Constitucionalidade da Guatemala; 63 casos utilizaram o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Suprema Corte do México; 1 caso utilizou o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Corte Suprema do Paraguai; 1 caso utilizou o termo "control de convencionalidad" em casos decididos

124

BRASIL. Supremo Tirbunal Federal. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 125 CHILE. Corte Constituicional do Chile. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 126 COLOMBIA. Corte Constitucional da Colombia.Disponível em:. Acessado em: 23/10/2014. 127 COSTA RICA. Corte Suprema de Justicia. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 128 ECUADOR. Corte Constitucional del Ecuador. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 129 GUATEMALA. Corte de Constitucionalidad de la República de Guatemala.Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 130 MÉXICO. Suprema Corte de Justicia de la Nación. DIsponível em: . Acessado em 23/10/2014. 131 PARAGUAI. Corte Suprema de Justicia da República delParaguay. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 132 REPÚBLICA DOMINICANA. Suprema Corte de Justicia de la República Dominicana. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015. 133 URUGUAI. Poder Judicial de la República Oriental delUruguay. Disponível em: . Acessado em: 23/10/2015.

46

na Suprema Corte da República Dominicana; e, 55 casos utilizaram o termo "control de convencionalidad" em casos decididos na Suprema Corte do Uruguai. Com isto, vê-se que a doutrina do controle de convencionalidade ainda é incipiente quando se trata da compatibilidade das normas internas partindo do diálogo top-down. Cumpre consignar que se escolheu o termo “controle de convencionalidade”/”control de convencionalidad” para a busca em razão de dito controle significar, como já verificado, a análise da legislação interna em face da interpretação que faz a CorteIDH dos tratados e convenções de DH no âmbito da OEA. Há ainda outra possibilidade de verificação do impacto que a jurisprudência da CorteIDH tem no âmbito interno dos Estados, relacionado com a substância do controle de convencionalidade, tal verificação é possível a partir da classificação das sentenças que têm emitido a CorteIDH, a emprestar a denominação apresentada por Flávia Piovesan134, é possível criar uma tipologia de 4 espécies deste impacto, a saber135: i) adotar legislação; ii) modificar legislação; iii) suprimir legislação; iv) controle de convencionalidade. Estão inseridos no item i) (referente à adoção de legislação) os casos: Caso Acosta Calderón Vs. Ecuador, Caso Apitz Barbera y otros ("Corte Primera de lo Contencioso Administrativo") Vs. Venezuela, Caso Artavia Murillo y otros (Fertilización in vitro) Vs. Costa Rica, Caso Baena Ricardo y otros Vs. Panamá, Caso Barreto Leiva Vs. Venezuela, Caso Barrios Altos Vs. Perú, Caso Caesar Vs. Trinidad y Tobago, Caso Cantoral Benavides Vs. Perú, Caso Cantos Vs. Argentina, Caso Castañeda Gutman Vs. Estados Unidos Mexicanos, Caso Castillo Petruzzi y otros Vs. Perú, Caso Chocrón Chocrón Vs. Venezuela, Caso Claude Reyes y otros Vs. Chile, Caso Comunidad Indígena Yakye Axa Vs. Paraguai, Caso Dacosta Cadogan Vs. Barbados, Caso de la "Masacre de Mapiripán" Vs. Colombia, Caso de los

134

“Considerando a atuação da Corte Interamericana, é possível criar uma tipologia de casos baseada em decisões (…)” (grifos acrescentados). PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o diálogo jurisdicional no contexto latino-americano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 397. 135 Tal tipologia segue a forma com que o buscador de jurisprudência interamericana separa e classifica as sentenças emitidas pela CorteIDH de acordo com o conteúdo da sentença relativamente aos artigos da CADH. Este sistema foi criado e é mantido pela Corte Suprema de laJusticia do México. MÉXICO. Corte Suprema de laJusticia. BJDH Sistema Interamericano. Criterios de Classificación: Artículos de laConvención Americana sobre Derechos Humanos. Disponível em: . Acesso em 22/10/2015.

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Pueblos Indígenas Kuna de Madungandí y Emberá de Bayano y sus Miembros Vs. Panamá, Caso de personas dominicanas y haitianas expulsadas Vs. República Dominicana, Caso del Pueblo Saramaka. Vs. Suriname, Caso Durand y Ugarte Vs. Perú, Caso Fermín Ramírez Vs. Guatemala, Caso Furlan y Familiares Vs. Argentina, Caso Gomes Lund y otros (Guerrilha do Araguaia) Vs. Brasil, Caso Gómez Palomino Vs. Perú, Caso González Medina y familiares Vs. República Dominicana, Caso Heliodoro Portugal Vs. Panamá, Caso Hermanos Landaeta Mejías y otros Vs. Venezuela, Caso Hilaire, Constantine y Benjamin y otros Vs. Trinidad y Tobago, Caso J. Vs. Perú, Caso López Mendoza Vs. Venezuela, Caso Mendoza y otros Vs. Argentina, Caso Montero Aranguren y otros (Retén de Catia) Vs. Venezuela, Caso Nadege Dorzema y otros Vs. República Dominicana, Caso Norín Catrimán y otros (Dirigentes, miembros y activista del Pueblo Indígena Mapuche) Vs. Chile, Caso Pueblo Indígena Kichwa de Sarayaku Vs. Ecuador, Caso Raxcacó Reyes Vs. Guatemala, Caso Salvador Chiriboga Vs. Ecuador, Caso Trabajadores Cesados del Congreso (Aguado Alfaro y otros) Vs. Perú, Caso Zambrano Vélez y otros Vs. Ecuador, onde a CorteIDH assentou entendimento de que: En relación con el artículo 2 de la Convención Americana, el Tribunal ha indicado que el mismo obliga a los Estados Parte a adoptar, con arreglo a sus procedimientos constitucionales y a las disposiciones de la Convención, las medidas legislativas o de otro carácter que fueren necesarias para hacer efectivos los derechos y libertades protegidos por la Convención. Es decir, los Estados no sólo tienen la obligación positiva de adoptar las medidas legislativas necesarias para garantizar el ejercicio de los derechos en ella contenidos, sino que también deben evitar promulgar aquellas leyes que impidan el libre ejercicio de estos derechos, y evitar que se supriman o modifiquen las leyes que los protegen136.

No item ii) (referente à modificação de legislação) estão os casos: Caso "La Última Tentación de Cristo" (Olmedo Bustos y otros) Vs. Chile, Caso Barreto Leiva Vs. Venezuela, Caso Caesar Vs. Trinidad y Tobago, Caso Chaparro Álvarez y Lapo Íñiguez. Vs. Ecuador, Caso Chitay Nech y otros Vs. Guatemala, Caso Familia Pacheco Tineo Vs. Bolivia, Caso Fermín Ramírez Vs. Guatemala, Caso Forneron e hija Vs. Argentina, Caso Hilaire, Constantine y Benjamin y otros Vs. Trinidad y Tobago, Caso La Cantuta Vs. Perú, Caso Osorio Rivera y Familiares Vs. Perú, Caso Pacheco Teruel y otros Vs. Honduras, Caso Palamara Iribarne Vs. Chile, Caso Usón 136

CorteIDH. Caso de los Pueblos Indígenas Kuna de Madungandí y Emberá de Bayano y sus Miembros Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 14 de outubro de 2014. Serie C No. 284, Parágrafo 192.

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Ramírez Vs. Venezuela, Caso Vélez Loor Vs. Panamá, Caso Zambrano Vélez y otros Vs. Equador, sendo que o entendimento da CorteIDH a respeito do tema tem sido o de que: El artículo 2 de la Convención Americana obliga a los Estados Partes a adoptar, con arreglo a sus procedimientos constitucionales y a las disposiciones de la Convención, las medidas legislativas o de otro carácter que fueren necesarias para hacer efectivos los derechos y libertades protegidos por aquélla. Es necesario reafirmar que la obligación de adaptar la legislación interna sólo se satisface cuando efectivamente se realiza la reforma y cuando dicha reforma abarca todas las normas que impiden el ejercicio de los referidos derechos y libertades.137

Inseridos no item iii) (referentes à supressão de legislação) se encontram os casos: Caso "La Última Tentación de Cristo" (Olmedo Bustos y otros) Vs. Chile, Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile, Caso Boyce y otros Vs. Barbados, Caso Castillo Petruzzi y otros Vs. Perú, Caso Dacosta Cadogan Vs. Barbados, Caso de la "Masacre de Mapiripán" Vs. Colombia, Caso Escher y otros Vs. Brasil, Caso Familia Pacheco Tineo Vs. Bolivia, Caso Forneron e hija Vs. Argentina, Caso Gelman Vs. Uruguay, Caso Gomes Lund y otros (Guerrilha do Araguaia) Vs. Brasil, Caso Hilaire, Constantine y Benjamin y otros Vs. Trinidad y Tobago, Caso J. Vs. Perú, Caso La Cantuta Vs. Perú, Caso Montero Aranguren y otros (Retén de Catia) Vs. Venezuela, Caso Pacheco Teruel y otros Vs. Honduras, Caso Raxcacó Reyes Vs. Guatemala, Caso Vélez Loor Vs. Panamá, Caso Zambrano Vélez y otros Vs. Equador, nos quais a CorteIDH tem se pronunciado no sentido de que: Asimismo, este Tribunal reitera que, de conformidad con el artículo 2 de la Convención Americana los Estados deben suprimir las normas y prácticas de cualquier naturaleza que entrañen violación a las garantías previstas en la Convención, así como adoptar normas y prácticas conducentes a la 138 efectiva observancia de dichas garantías (…).

Por fim, no item v) (referentes ao controle de convencionalidade) estão os casos: Caso Almonacid Arellano y otros Vs. Chile, Caso Boyce y otros Vs. Barbados, Caso Cabrera García y Montiel Flores Vs. México, Caso Chocrón Chocrón Vs. Venezuela, Caso de personas dominicanas y haitianas expulsadas Vs. República Dominicana, Caso Fernández Ortega y otros Vs. México, Caso Fontevecchia y 137

Corte IDH. Caso Palamara Iribarne Vs. Chile. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 22 de novembro de 2005. Serie C No. 135, Parágrafo 89. 138 Corte IDH. Caso J. Vs. Perú. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de27 de novembro de 2013. Serie C No. 275, Parágrafo 187.

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D`Amico Vs. Argentina, Caso Furlan y Familiares Vs. Argentina, Caso Gelman Vs. Uruguay, Caso Gomes Lund y otros (Guerrilha do Araguaia) Vs. Brasil, Caso Gudiel Álvarez (Diario Militar) Vs. Guatemala, Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña Vs. Bolivia, Caso Liakat Ali Alibux Vs. Suriname, Caso López Mendoza Vs. Venezuela, Caso Masacre de Santo Domingo Vs. Colombia, Caso Masacres de El Mozote y lugares aledaños Vs. El Salvador, Caso Mendoza y otros Vs. Argentina, Caso Norín Catrimán y otros (Dirigentes, miembros y activista del Pueblo Indígena Mapuche) Vs. Chile, Caso Radilla Pachecho vs Estados Unidos Mexicanos, Caso Rosendo Cantú y otra Vs. México, Caso Trabajadores Cesados del Congreso (Aguado Alfaro y otros) Vs. Perú, Caso Vélez Loor Vs. Panamá, onde a CorteIDH tem sedimentado que: Respecto a la sentencia TC/0168/13, es necesario recordar que la Corte Interamericana en su jurisprudencia ha establecido que es consciente de que las autoridades internas están sujetas al imperio de la ley y, por ello, están obligadas a aplicar las disposiciones vigentes en el ordenamiento jurídico. Pero cuando un Estado es parte de un tratado internacional como la Convención Americana, todos sus órganos, incluidos sus jueces, también están sometidos a aquél, lo cual les obliga a velar porque los efectos de las disposiciones de la Convención no se vean mermados por la aplicación de normas contrarias a su objeto y fin. Los jueces y órganos vinculados a la administración de justicia en todos los niveles, están en la obligación de ejercer ex officio un "control de convencionalidad" entre las normas internas y la Convención Americana, evidentemente en el marco de sus respectivas competencias y de las regulaciones procesales correspondientes. En esta tarea, los jueces y órganos vinculados a la administración de justicia deben tener en cuenta no solamente el tratado, sino también la interpretación que del mismo ha hecho la Corte Interamericana, intérprete última de la Convención Americana.139

É visível que o controle de convencionalidade tem impactado na região latinoamericana, sendo que, por meio da jurisprudência da CorteIDH as motivações judiciais, em sentenças, tem se valido do quanto interpretado pela CorteIDH. Assim, no Brasil, em sentença de ação penal assinada pelo juiz e professor Alexandre Morais da Rosa, a pessoa processada fora absolvida do delito de desacato, e para isto, o magistrado se valeu do diálogo para chegar a esta solução, diálogo com a CorteIDH e Cortes constitucionais. Com isto se evidencia o impacto e evolução ainda incipiente do controle de convencionalidade no Brasil, assim como nos países latino-americanos.

139

Corte IDH. Caso de personas dominicanas y haitianas expulsadas Vs. República Dominicana. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 28 de agosto de 2014. Serie C No. 282, Parágrafo 311.

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Desta forma, considerando o quanto visto neste capítulo, é possível concluir que a jurisprudência da CorteIDH, associada ao controle de convencionalidade, tem grande potencialidade no âmbito do SIDH, posto que ao interpretar a CADH, a CorteIDH sempre se manifesta no sentido da prevalência da norma mais benéfica à pessoa humana, em consagração ao princípio pro persona, e no sentido de que o tema relativo aos DH tem caráter evolutivo (tal qual verificado no Capítulo 2, subitem 2.3., desta monografia), devendo, os Estados-partes, adequarem suas legislações internas. Assim, é forte impacto da doutrina do controle de convencionalidade do âmbito do SIDH, posto que muitos dos Estados-partes já foram condenados, por meio das decisões da CorteIDH, a reanalisar suas leis internas para pô-las em conformidade com os parâmetros protetivos mínimos previstos nos tratados internacionais de DH.

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CONTROLE DE CONVENCIONALIDADE E A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA:

DESAFIOS À LUZ DA EXPERIÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA 4.1

A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E A AUDIÊNCIA DE

CUSTÓDIA O tema da audiência de custódia tem sido debatido apenas muito recentemente no judiciário brasileiro, mais precisamente a partir de 06 de fevereiro de 2015, quando o CNJ em parceria com o Tribunal de Justiça de São Paulo lançou um projeto para que em todo o país fossem realizadas audiências de custódia 140. Entretanto, denota-se, desde logo, que novamente há um atraso no país com relação ao tema, posto que já havia previsão para tal evento quando da ratificação e internalização da CADH e do PIDCP em 1992141. O projeto do CNJ parte de disposição da CADH, que dentre os mais diversos direitos e garantias ali previstos142, em seu artigo 7 (5) prevê que: Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo143.

140

BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Disponível em: . Acesso em: 26/10/2015. 141 OLIVEIRA, Gisele Souza de. et al. Audiência de custódia: Dignidade humana, controle de convencionalidade, prisão cautelar (lei 12.403/2011). 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 107. 142 Prevê a CADH os seguintes direitos e garantias: direito ao reconhecimento da personalidade jurídica (artigo 3), direito à vida (artigo 4), direito à integridade pessoal (artigo 5), proibição da escravidão e da servidão (artigo 6), direito à liberdade pessoal (artigo 7), garantias judiciais (artigo 8), princípio da legalidade e da retroatividade (artigo 9), direito a indenização (artigo 10), proteção da honra e da dignidade (artigo 11), liberdade de consciência e de religião (artigo 12), liberdade de pensamento e de expressão (artigo 13), direito de retificação ou resposta (artigo 14), direito de reunião (artigo 15), liberdade de associação (artigo 16), proteção da família (artigo 17), direito ao nome (artigo 18), direitos da criança (artigo 19), direito à nacionalidade (artigo 20), direito à propriedade privada (artigo 21), direito de circulação e de residência (artigo 22), direitos políticos (artigo 23), igualdade perante à lei (artigo 24), proteção judicial (artigo 25). ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 25/09/2015 143 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 26/09/2015

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E no mesmo sentido é a disposição do artigo 9 (3) do PIDCP144, e apenas a título comparativo, o artigo 5 (3) da Convenção Europeia de Direitos Humanos também prevê que toda pessoa detida deve ser prontamente apresentada à uma autoridade judiciária que tenha poderes para verificar a legalidade de sua prisão 145. Antes de se prosseguir no tema, convém verificar o que, na doutrina e na prática, convencionou-se chamar de audiência de custódia, ainda que o termo possa ser diverso em outros países146. A audiência de custódia é um instrumento que antecede a fase processual, e pode-se defini-la como sendo, em primeiro, um ato judicial destinado a verificar a legalidade e condições da prisão em flagrante de determinada pessoa, assim como a sua efetiva necessidade, e, sobretudo, em segundo, para verificar se a pessoa presa não acabou se tornando vítima de tortura por parte de agentes estatais 147. Observe-se que a segunda finalidade da audiência de custódia, a de prevenir a prática de tortura, constou, inclusive, do recente relatório da Comissão Nacional da Verdade, sendo a instituição da audiência de custódia uma recomendação legislativa, a qual direciona para a: Criação da audiência de custódia no ordenamento jurídico brasileiro para garantia da apresentação pessoal do preso à autoridade judiciária em até 24 horas após o ato da prisão em flagrante, em consonância com o artigo 7º da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José de 148 Costa Rica), à qual o Brasil se vinculou em 1992.

144

BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Promulgação. Diário Oficial da União, Brasília, de 7 de julho de 1992. Disponível em: . Acesso em: 27/10/2015. 145 “3. Everyone arrested or detained in accordance with the provisions of paragraph 1 (c) of this Article shall be brought promptly before a judge or other officer authorised by law to exercise judicial power and shall be entitled to trial within a reasonable time or to release pending trial. Release may be conditioned by guarantees to appear for trial”. COUNCIL OF EUROPE. European Convention on Human Rights. Estrasbourg, France. Disponível em: . Acesso em 27/10/2015. 146 “A designação de tal procedimento como ‘audiência de custódia’ não encontra correspondência no Direito Comparado. Há, inclusive, quem prefira a expressão ‘audiência de garantia’. Aqui utilizarei o termo ‘audiência de custódia’ em razão de sua ampla acolhida não somente pela impresna brasileira, mas também pelos instrumentos (judiciais e legislativos) que visam a sua implementação no Brasil”. PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro. 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 31. 147 OLIVEIRA, G. S. D. et al. Audiência de custódia: Dignidade humana, controle de convencionalidade, prisão cautelar (lei 12.403/2011). 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 106. 148 BRASIL. Relatório da Comissão Nacional da Verdade. V. 1. Brasília: CNV, 2014, p. 972.

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Ora, trata-se de relevantíssimo tema para o DIDH, especialmente se considerarmos que a população carcerária brasileira é composta por 715.655149 pessoas privadas de sua liberdade, sendo que, deste total, 32% representam presos provisórios150, ou seja, há mais de 228.000 pessoas presas sem que um processo judicial tenha iniciado, ou que um processo moroso esteja em trâmite perante o Judiciário nacional, em flagrante violação à garantia de um processo judicial célere, como também previsto na CADH151. Em que pese o atraso legislativo brasileiro, é preciso louvar o legislador quando no art. 236, § 2º, da Lei 4.737 (Código Eleitoral), previu que toda pessoa detida cometendo algum dos delitos específicos daquela lei deveria ser imediatamente conduzida à presença de um juiz152. Assim, também é preciso reconhecer o interesse do legislador em resguardar a integridade e saúde de crianças e adolescentes quando detidas por ordem de juiz, de sorte a constar do artigo 171, da Lei 8.069 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que tão logo tenham sido detidas deverão ser encaminhados à presença de autoridade judicial 153.

149

BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil. Brasília: Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF, 2014, p. 17. Disponível em: . Acesso em: 27/10/2014. 150 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil. Brasília: Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF, 2014, p. 4. Disponível em: . Acesso em: 27/10/2014. 151 “Artigo 8 (1): Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. (…) Artigo 25 (1): Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercício de suas funções oficiais”. Convenção Americana de Direitos Humanos. San Jose da Costa Rica: 1969. Disponível em: . Acesso em: 27/09/2015 152 “§ 2º Ocorrendo qualquer prisão o preso será imediatamente conduzido à presença do juiz competente que, se verificar a ilegalidade da detenção, a relaxará e promoverá a responsabilidade do coator”. BRASIL. Lei 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. Brasília: Diário Oficial da União, de 19 de julho de 1965, retificado em 30 de julho de 1965. Disponível em: . Acesso em: 27/10/2015. 153 “Art. 171. O adolescente apreendido por força de ordem judicial será, desde logo, encaminhado à autoridade judiciária”. BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, de 16 de julho de 1990, retificado em 27 de setembro de 1990. Disponível em: . Acesso em: 27/10/2015.

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Porém, norma semelhante, de caráter geral, não é encontrada quando procurada a partir de uma incidência geral, e não específica como as anteriores citadas. Para além de esvaziar o sistema carcerário, o qual sabidamente não atinge a finalidade da imposição de penas de restrição de liberdade 154, a audiência de custódia vem para fazer com que o Estado brasileiro cumpra com suas obrigações internacionais, especialmente as decorrentes do artigo 2 da CADH, o qual diz respeito ao controle de convencionalidade e adequação legislativa interna. Considerando que se verificou que o controle de convencionalidade pressupõe não somente a internalização de norma geral prevista na CADH, mas principalmente a adequação de acordo com a interpretação que a CorteIDH faz da CADH, faz-se necessário, então, analisar como a CorteIDH visualiza o artigo 7 (5) da CADH, a fim de que se verifique, também, a efetividade do controle de convencionalidade exercido por meio do projeto do CNJ. Constata-se que a finalidade da audiência de custódia é a verificação da legalidade da prisão em flagrante de determinada pessoa, e, nesta linha, o entendimento da CorteIDH, partindo do Caso Cabrera García e Montiel-Flores vs. México, de 2010, é de que toda detenção deve ser remetida a um controle judicial de legalidade, com a finalidade de que se evite qualquer detenção ilegal ou arbitrária155. Entretanto, desvelada a finalidade da audiência de custódia, e reconhecendo que o grande dilema da ciência do direito é o significado que se empregam às palavras156, precisa-se verificar qual o significado que atribui a CorteIDH às palavras constantes do artigo 7 (5) da CADH.

154

“Escopo da pena aqui é a ressocialização do condenado, ou seja, a finalidade de reincorporá-lo à sociedade. (…) A pena não visa sofrer o condenado. A ressocialização pretendida, no entanto, não se pode fazer sem respeitar a dignidade [do condenado]”. FRAGOSO, Heleno Claudio. Lições de direito penal: parte geral. 1 ed – revisada por Fernando Fragoso. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 278. 155 “(...) el Tribunal recuerda que la parte inicial del artículo 7.5 de la Convención dispone que la detención de una persona debe ser sometida sin demora a revisión judicial. En este sentido, la Corte ha señalado que el control judicial inmediato es una medida tendiente a evitar la arbitrariedad o ilegalidad de las detenciones (...)”. Corte IDH. Caso Cabrera García y Montiel Flores Vs. México. Excreção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2010. Série C No. 220, Parágrafo 93. 156 “Às vezes, as expressões correntes, de uso comum do povo, adquirem, no mundo jurídico, um sentido técnico especial. Vejam, por exemplo, o que ocorre com a palavra ‘competência’ - adjetivo: competente. Quando dizemos que o juiz dos Feitos da Fazenda Municipal é competente para julgar as causas em que a Prefeitura é autora ou ré, não estamos absolutamente apreciando a ‘competência’ ou preparo cultural do magistrado. Competente é o juiz que, por força de dispositivos legais da organização judiciária, tem poder para examinar e resolver determinados casos, porque competência, juridicamente, é ‘a medida ou a extensão da jurisdição’”. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 8.

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Para tanto, esmiuçando o mencionado artigo, terá de ser verificado qual o conceito de “pessoa detida ou retida”, de “ser conduzida”, de “sem demora”, de “à presença de um juiz ou autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”, de “tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo”, e, por fim, de “sua liberdade ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo”. No que diz respeito à “pessoa detida ou retida”, a análise partirá do sentido inverso, ou seja, verificar-se-á como é encarada a liberdade, posto que toda detenção ou retenção tem por finalidade exatamente restringir a liberdade, e sobre ela a CorteIDH já se pronunciou no sentido de que é possibilidade de fazer tudo aquilo que não está proibido pela lei157. Esta liberdade a que se refere, e a que se refere a CorteIDH, é a “física (pessoal), que consiste no direito de ir, vir e permanecer”158, e isto “sem interferência do Estado ou de particulares”159. Portanto, toda pessoa retida ou detida tem sua liberdade de ir, vir e permanecer, afetada por uma imposição legal que restringe o exercício desta liberdade. É interessante notar, por oportuno, que a CorteEDH aponta que a diferença entre privação e restrição de liberdade diz respeito ao grau de intensidade da limitação da liberdade, e não à natureza ou substância desta mesma limitação160. Analisando o termo “ser conduzida”, a doutrina indica que há clareza no comando previsto na CADH, no sentido de que a pessoa presa deve estar fisicamente presente no ato161. E sobre o tema, até mesmo a ONU, por meio de seu Comitê de Direitos Humanos, se manifestou, no sentido de que: The individual must be brought to appear physically before the judge or other officer authorized by law to exercise judicial power. The physical presence of detainees at the hearing gives the opportunity for inquiry into the 157

Corte IDH. Caso Chaparro Álvarez y Lapo Íñiguez. Vs. Ecuador. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 21 de novembro de 2007. Serie C No. 170, Parágrafo 52. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2015. 158 GOMES, Luiz Flávio; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Comentários à convenção americana sobre direitos humanos. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 62. 159 RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 1 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 558. 160 “The difference between deprivation of and restriction upon liberty is nonetheless merely one of degree of intensity, and not one of nature or substance”. Corte EDH. Case Guzzardi v. Italy. Merits and Just Satisfaction. Judgment in November 6, 1980, Paragraph 93, in: BRADLEY, Anthony W.; JANIS, Mark W.; KAY, Richard S. European Human Rights Law: text and materials. 2 ed. New York (EUA): Oxford University Press, 2000, p. 316. 161 PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro. 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 53.

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treatment that they received in custody and facilitates immediate transfer to a remand detention centre if continued detention is ordered. It thus serves as a safeguard for the right to security of person and the prohibition against torture and cruel, inhuman or degrading treatment. In the hearing that ensues, and in subsequent hearings at which the judge assesses the legality or necessity of the detention, the individual is entitled to legal assistance, which should in principle be by counsel of choice.162

Portanto, toda pessoa que seja presa deve ser levada fisicamente perante um juiz ou qualquer pessoa investida em poderes jurisdicionais, a fim de ser verificada a legalidade e necessidade de sua prisão, não bastando o mero envio de papéis que deem conta da prisão (auto de prisão em flagrante) 163. Assim, ainda que no Brasil apenas um juiz natural164 possa efetivamente decidir sobre a legalidade de uma prisão165, se faz necessário verificar que: a apresentação do preso cumpre finalidades relacionadas à prevenção da tortura e de repressão a prisões arbitrárias, ilegais ou desnecessárias, a autoridade responsável pela audiência de custódia deve ter independência, imparcialidade e, sobretudo, poder para fazer cessar imediatamente qualquer tipo de ilegalidade. (…) Desta forma, se a apresentação do preso ao juiz cumpre a finalidade precípua de promover um controle judicial imediato da prisão, a autoridade que deve presidir as audiências de custódia no Brasil somente pode ser o magistrado, sob pena de esvaziar ou reduzir em demasia a potencialidade normativa da garantia prevista no art. 7.5 da CADH.166

Porém, a discussão é válida quando observados casos fora do Brasil, tendo a CorteIDH já firmado entendimento de que membro do Ministério Público não possui 162

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. General comment No. 35: article 9 (liberty and security of person), de 16 de dezembro de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2014. 163 “El hecho de que un juez tenga conocimiento de la causa o le sea remitido el informe policial correspondiente, como lo alegó el Estado, no satisface esa garantía, ya que el detenido debe comparecer personalmente ante el juez o autoridad competente”. Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 7 de setembro de 2004. Série C No. 114, Parágrafo 118. 164 “Entende-se que o juiz natural é aquele regular e legitimamente investido de poderes da jurisdição, dotado de todas as garantias inerentes ao exercício de seu cargo (…), que decide segundo regras de competência fixadas com base em critérios gerais vigentes ao tempo do fato”. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2015. 165 Neste sentido, se a apresentação do auto de prisão em flagrante, que é mero papel, deve ser feito a um juiz, quem dirá sobre a apresentação de uma pessoa presa, assim veja-se que: “O inciso LXII [do art. 5º, da Constituição] impõe uma importante formalidade, que é a dupla comunicação da prisão, que deverá ser imediatamente levada ao conhecimento do juiz competente e também à família do preso (ou pessoa por ele indicada)” (grifo acrescentado). LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 821 p 166 PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro. 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 47.

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atribuições para exercício de funções judiciais167. Entretanto, ainda que não seja objeto primordial deste estudo, a título de demonstração de efetiva relevância da discussão acerca de quem é a autoridade competente para o controle da legalidade de uma prisão, verifica-se que em razão de o Ministério Público na Europa possuir funções diversas das desempenhadas na região da América latina 168, a CorteEDH já se manifestou no sentido de que há possibilidade de um membro do Ministério Público decidir acerca de uma prisão, desde que ele haja com completa independência169, e que mais tarde este mesmo membro não venha atuar no processo criminal, sob pena de ser duvidosa sua imparcialidade170. Seguindo com a verificação dos conceitos acerca das palavras, verifica-se que a expressão “sem demora” possui entendimentos variáveis. A CorteIDH considera que a apresentação da pessoa presa perante uma autoridade com poderes judiciais, após quase uma semana da data sua prisão não cumpre com a exigência do disposto no artigo 7 (5)171, da CADH, assim como após quase 5 dias

167

“En las circunstancias del presente caso, la Corte entiende que el Agente Fiscal del Ministerio Público que recibió la declaración preprocesal del señor Tibi, de conformidad con el artículo 116 de la Ley de Sustancias Estupefacientes y Psicotrópicas, no estaba dotado de atribuciones para ser considerado “funcionario autorizado para ejercer funciones judiciales”, en el sentido del artículo 7.5 de la Convención, ya que que la propia Constitución Política del Ecuador, en ese entonces vigente, establecía en su artículo 98, cuáles eran los órganos que tenían facultades para ejercer funciones judiciales y no otorgaba esa competencia a los agentes fiscales”. Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 7 de setembro de 2004. Serie C No. 114, Parágrafo 119 168 “Na Europa, (…), a instituição do Ministério Público possui ligações mais estreitas com a magistratura e dispõe de poderes mais acentuados na condução do processo penal (…)”.PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro. 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 48. 169 “Amongst the essential conditions were that the officer must be independent of the executive and of the parties; that the officer must hear the individual; and that the officer must review the substantive grounds relied on that should determine whether or not the detainee could be released”. Corte EDH. Case Schiesser v. Switzerland. Merits. Judgment in December 4, 1979, in: BRADLEY, Anthony W.; JANIS, Mark W.; KAY, Richard S. European Human Rights Law: text and materials. 2 ed. New York (EUA): Oxford University Press, 2000, p. 368. 170 “The Court sees no grounds for reaching a different conclusion in this case as regards criminal justice under the ordinary law. Clearly the Convention does not rule out the possibility of the judicial officer who orders the detention carrying out the other duties, but his impartiality is capable of appearing open to doubt if he is entitled to intervene in the subsequent criminal proceedings as a representative of the prosecuting authority”. Corte EDH. Case Huber v. Switzerland. Merits and Just Satisfaction. Judgment in October 23, 1980, in: BRADLEY, Anthony W.; JANIS, Mark W.; KAY, Richard S. European Human Rights Law: text and materials. 2 ed. New York (EUA): Oxford University Press, 2000, p. 369. 171 “Posteriormente, el 24 de noviembre de 1991 Juan Carlos Bayarri fue trasladado al Palacio de Justicia de la Capital Federal para rendir declaración indagatoria ante el Juzgado de Instrucción No. 2553. Dicha actuación además de no ajustarse a lo establecido en la legislación argentina, vulnerándose así el artículo 7.2 de la Convención (supra párrs. 56 y 64), fue realizada casi una semana después del acto de detención y por lo mismo no satisfizo la exigencia de presentación del detenido ‘sin demora’ ante la autoridad judicial del artículo 7.5 de la Convención Americana”. Corte

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após a prisão172, e também há violação quando a apresentação se dá em aproximadamente trinta e seis dias173, vinte e seis dias174, dezessete dias175, e ainda mais quando a pessoa é apresentada quase seis meses 176 ou quase dois anos após sua prisão177. O Comitê de Direitos Humanos da ONU, ao interpretar disposições do PIDCP, entende que a disposição do artigo 9 (3), referentemente à expressão “sem demora”, não pode ultrapassar 48 horas, período em que tudo o quanto necessário pode ser

IDH. Caso Bayarri vs. Argentina. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 30 de outubro de 2008. Série C No. 187, Parágrafo 66. 172 “Siguiendo la jurisprudencia del Tribunal (supra párr. 93) en lo que concierne a la autoridad competente para la remisión sin demora, este Tribunal reitera que los señores Cabrera y Montiel debieron ser llevados ante el juez lo más pronto posible y, en este caso, ello no ocurrió sino hasta casi 5 días después de su detención. En ese sentido, el Tribunal observa que los señores Cabrera y Montiel fueron puestos a disposición de la autoridade competente excediendo el término establecido en la Convención Americana, que claramente exige la remisión “sin demora” ante el juez o funcionario autorizado por la ley para ejercer funciones judiciales sobre control de la libertad”.Corte IDH. Caso Cabrera García y Montiel Flores vs. México. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2010. Série C No. 220, Parágrafo 102. 173 “Esta Corte considera que el período de aproximadamente 36 días transcurrido desde la detención y hasta la fecha en que fueron puestos a disposición judicial es excesivo y contradice lo dispuesto en la Convención”.Corte IDH. Caso Castillo Petruzzi y otros Vs. Perú. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 30 de maio de 1999. Série C No. 52, Parágrafo 111. 174 “De la prueba aportada se desprende que las víctimas realizaron una primera declaración ante un fiscal el 19 de noviembre de 1997, esto es, 4 días después de su detención, y una declaración ante la Jueza el 11 de diciembre de 1997, 26 días después de ser detenidos. (...)Por todo lo anterior, el Tribunal declara que el Estado violó el derecho consagrado en el artículo 7.2, 7.4 y 7.5 de la Convención en perjuicio del señor Chaparro, y el derecho consagrado en el artículo 7.2 y 7.5 del mismo instrumento internacional en perjuicio del señor Lapo”. Corte IDH. Caso Chaparro Álvarez y Lapo Íñiguez. Vs. Ecuador. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 21 de novembro de 2007. Série C No. 170, Parágrafos 83 e 88. 175 “Por lo anterior, tomando en cuenta el reconocimiento parcial de hechos por parte del Estado, la falta de flagrancia y de orden judicial para llevar a cabo la detención del señor Wilson García Asto, el hecho de que no fue puesto a disposición de autoridad judicial competente sino recién 17 días después de su detención, y que se vio privado a recurrir ante un juez o tribunal competente a fin de que este decidiera sin demora, sobre la legalidad de su arresto o detención, así como la falta de protección judicial, este Tribunal declara que el Perú violó en su perjuicio los artículos 7.1, 7.2, 7.3, 7.5, 7.6 y 25 de la Convención, en relación con el artículo 1.1 de la misma, al momento de su detención y durante el primer proceso judicial al que fue sometido”. Corte IDH. Caso García Asto y Ramírez Rojas Vs. Perú. Sentença de 25 de novembro de 2005. Série C No. 137, Parágrafo 115. 176 “(...) En el caso en análisis, el señor Tibi manifestó que rindió declaración ante un “escribano público” el 21 de marzo de 1996, casi seis meses después de su detención (supra párr. 90.22). En el expediente no hay prueba alguna para llegar a una conclusión diferente. (...)Por ello, la Corte considera que el Estado no cumplió con su obligación de hacer comparecer al señor Daniel Tibi, sin demora, ante una autoridad judicial competente, como lo requiere el artículo 7.5 de la Convención”. Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 7 de setembro de 2004. Série C No. 114, Parágrafos 118 e 121. 177 “(...) No consta en el expediente que el señor Acosta Calderón haya rendido declaración alguna ante un juez, sino hasta transcurridos casi dos años de su detención. (...) Por ello, la Corte considera que el Estado violó en perjuicio del señor Acosta Calderón el derecho a ser llevado, sin demora, ante un juez u otro funcionario autorizado por la ley para ejercer funciones judiciales, como lo requiere el artículo 7.5 de la Convención, en conexión con el artículo 1.1 de la misma”. Corte IDH. Caso Acosta Calderón Vs. Ecuador. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 24 de junho de 2005. Série C No. 129, Parágrafo 79 e 81.

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providenciado para realização da audiência de custódia, devendo qualquer período superior ser devidamente justificado178. Verificando a jurisprudência da CorteEDH, percebe-se que, ainda que também variável, o prazo para apresentação da pessoa fisicamente sem demora perante uma autoridade com possibilidade de exercer funções jurisdicionais não destoa da interpretação feita pela CorteIDH, sendo a interpretação da CorteEDH de que a não apresentação da pessoa presa em prazo superior a 6 dias já viola as disposições da CEDH179. À respeito da expressão “tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo”, verifica-se que: A Corte Interamericana de Direitos Humanos utiliza o seguinte critério para, caso a caso, determinar se houve violação do devido processo legal em um prazo razoável: (i) complexidade da causa; (ii) atividade das partes (ou seja, se uma das Partes contribuiu, com medidas procrastinatórias); e (iii) atividade do juiz.180

Sobre esta duração razoável para a espera de um julgamento, o Comitê de Direitos Humanos da ONU e considera que esta agilidade de julgamento dever ser aplicada especialmente em se tratando de presos provisórios, ainda que não preveja qualquer prazo para ser considerado como razoável, sendo que a eventual demora 178

“While the exact meaning of “promptly” may vary depending on objective circumstances, delays should not exceed a few days from the time of arrest. In the view of the Committee, 48 hours is ordinarily sufficient to transport the individual and to prepare for the judicial hearing; any delay longer than 48 hours must remain absolutely exceptional and be justified under the circumstances. Longer detention in the custody of law enforcement officials without judicial control unnecessarily increases the risk of ill-treatment. Laws in most States parties fix precise time limits, sometimes shorter than 48 hours, and those limits should also not be exceeded”. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. General comment No. 35: article 9 (liberty and security of person), de 16 de dezembro de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2014. 179 “The Court, like the Commission, notes that the Stockholm District Court did not hear Mr. McGoff in person when it issued a warrant for his arrest in October 1977 and that his detention began more than two years later. This being so, the arrest warrant did not preclude the subsequent application of the guarantees in Article 5 para. 3 (art. 5-3). However, fifteen days elapsed between the time when Mr. McGoff was placed in custody in Sweden (24 January 1980) and when he was brought before the District Court (8 February 1980). An interval of this length cannot be regarded as consistent with the required "promptness". By way of comparison, reference may be made to the de Jong, Baljet and van den Brink judgment of 22 May 1984 where the Court held that, six days after arrest, the limits laid down by the Convention had already been exceeded (Series A no. 77, p. 25, para. 53). Accordingly, there has been a breach of Article 5 para. 3 (art. 5-3)”. Corte EDH. Case McGoff v. Sweden. Merits and Just Satisfaction. Judgment in October 26, 1984, in: BRADLEY, Anthony W.; JANIS, Mark W.; KAY, Richard S. European Human Rights Law: text and materials. 2 ed. New York (EUA): Oxford University Press, 2000, p. 372. 180 RAMOS, André De Carvalho. Curso de direitos humanos: 1. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 622.

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no julgamento deve conduzir ao juiz a considerar a aplicação de medidas diversas ao encarceramento181. Considerando a expressão “sua liberdade ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo”, verifica que se está diante das possibilidades constantes do artigo 319, do Código de Processo Penal brasileiro, que dispõe que: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:. I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica. § 1º (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011). § 2º (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011). § 3º (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011). § 4º A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. 181

“The second requirement expressed in the first sentence of paragraph 3 is that the person detained is entitled to trial within a reasonable time or to release. That requirement applies specifically to periods of pretrial detention, that is, detention between the time of arrest and the time of judgment at first instance. Extremely prolonged pretrial detention may also jeopardize the presumption of innocence under article 14, paragraph 2. Persons who are not released pending trial must be tried as expeditiously as possible, to the extent consistent with their rights of defence. The reasonableness of any delay in bringing the case to trial has to be assessed in the circumstances of each case, taking into account the complexity of the case, the conduct of the accused during the proceeding and the manner in which the matter was dealt with by the executive and judicial authorities. Impediments to the completion of the investigation may justify additional time, but general conditions of understaffing or budgetary constraint do not. When delays become necessary, the judge must reconsider alternatives to pretrial detention. Pretrial detention of juveniles should be avoided, but when it occurs they are entitled to be brought to trial in especially speedy fashion under article 10, paragraph 2 (b)”. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. General comment No. 35: article 9 (liberty and security of person), de 16 de dezembro de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2014.

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Sobre estas medidas, deve-se considerar que “conta o juiz agora, portanto, com um amplo leque de medidas cautelares diversas da prisão preventiva e que podem ser adotadas como providência mais justa ao caso concreto” 182. Neste sentido, o Comitê de Direitos Humanos da ONU afirma que em não havendo base legal para a privação de liberdade de qualquer pessoa, ela deve ser posta então em liberdade, com ou sem a imposição de determinadas condições, e, da mesma forma, aponta que em caso de necessidade efetiva da manutenção da prisão de qualquer pessoa de forma preventiva, esta deve ser encaminhada para um local adequado, e não retornar para as carceragens policiais183. Desta forma, verificadas as interpretações acerca das expressões constantes do artigo 7 (5), da CADH, têm-se que toda pessoa que sofra privação de sua liberdade, em razão do cometimento de um ilícito, deve ser conduzida fisicamente à presença, no caso brasileiro, de um juiz, a fim de que seja verificada a legalidade da prisão desta pessoa, sendo que é aconselhável que tal condução não supere o prazo de 48 horas, contados da privação, isto em razão de que toda pessoa tem a garantia de ser julgado em prazo razoável, considerando as peculiaridades de cada caso, podendo ainda sua liberdade ser condicionada ao cumprimento das garantias legais previstas nas legislações domésticas, sendo que no caso brasileiro tais disposições estão contidas no art. 319, do Código de Processo Penal.

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BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; MENDES, Gilmaer Ferreira. Curso de direito constitucional. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 588. 183 “Once the individual has been brought before the judge, the judge must decide whether the individual should be released or remanded in custody for additional investigation or to await trial. If there is no lawful basis for continuing the detention, the judge must order release. If additional investigation or trial is justified, the judge must decide whether the individual should be released (with or without conditions) pending further proceedings because detention is not necessary, an issue addressed more fully by the second sentence of paragraph 3. In the view of the Committee, detention on remand should not involve a return to police custody, but rather to a separate facility under different authority, where risks to the rights of the detainee can be more easily mitigated”. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. General comment No. 35: article 9 (liberty and security of person), de 16 de dezembro de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2014.

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4.2

A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E OS SEUS DESAFIOS À LUZ DA

EXPERÊNCIA JUDICIÁRIA BRASILEIRA Conceituada a audiência de custódia, a partir do entendimento da jurisprudência internacional sobre o tema, faz-se relevante verificar as suas nuances quando aplicada de forma prática. É importante rever os números acerca do encarceramento no Brasil, sendo que, consta do último relatório publicado pelo CNJ, que 563.526 pessoas estão presas no sistema carcerário penal brasileiro184, destes, 41% são presos provisórios185, ou seja, presos que não tem contra si uma sentença penal condenatória transitada em julgado, recaindo sobre estas pessoas a qualidade de presumidamente inocentes, o que é garantia constitucional expressa 186. Observa-se que uma das primeiras barreiras que terão de ser ultrapassadas é a da superação do papel para a realidade, no sentido de que atualmente o processo penal no Brasil não passa de mero procedimento cartorial 187, genérico e padrão188. E neste sentido, a disposição do artigo 5º, inciso LXII189, vai de encontro à necessidade de apresentação física da pessoa em frente a um juiz, sendo necessário hoje, constitucionalmente analisando, a mera comunicação, o que não é suficiente de acordo com o artigo 7 (5), da CADH. Assim, a audiência de custódia

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BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil. Brasília: Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF, 2014, p. 5. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2014. 185 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil. Brasília: Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas – DMF, 2014, p. 8. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2014 186 “Art. 5º (…) LXVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 5 de outubro de 1988. 187 PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro: 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 56. 188 “Na hipótese, a decisão de primeira instância, que converteu o flagrante em prisão preventiva, constitui mero formulário pré-formatado, um modelo contendo fórmulas vazias e desvinculadas de qualquer base empírica. Cingiu-se a apontar a presença dos pressupostos da custódia cautelar, discorrendo acerca dos malefícios que o tráfico de drogas traz à sociedade. Tanto é evidente se tratar de modelo pré-pronto que, ao proferir a decisão ora sob comento, o magistrado de origem nem ao menos adaptou ao caso concreto o gênero dos substantivos e flexões gramaticais constantes do texto”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 128.880 MC/SP, Relator Ministro Gilmar Mendes, julgado em 19/06/2015, publicado no DJe-121, Divulgado em 22/06/2015, Publicado em 23/06/2015. 189 “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 5 de outubro de 1988.

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vem a humanizar o procedimento de decisão acerca da liberdade de uma pessoa, a fim de realizar um julgamento “olho no olho”190. Outro ponto de relevância a ser combatido com o implemento das audiências de custódia é a prática cultural da tortura, que, de acordo com o delegado de polícia Marcelo Barros Correia, em entrevista à revista Carta Capital, a tortura praticada por policais seria vinculada à uma legitimidade moral no combate ao crime 191. E este combate já foi estopim de tensões entre a polícia militar e a polícia civil do estado de São Paulo, tendo sido noticiado que um delegado da polícia civil deu voz de prisão em flagrante a um sargento da polícia militar que teria praticado tortura em uma pessoa presa em flagrante, tendo sido ambos mantidos presos após a realização da audiência de custódia192. Veja-se, conforme demonstrado no item anterior, que somente em 6 de fevereiro de 2015 se iniciou um movimento para a implantação efetiva da audiência de custódia193, e em que pese possa ser considerado um avanço, trata-se, na realidade, como já abordado, um atraso do Brasil em face das obrigações internacionais assumidas, posto que a CADH e o PIDCP foram, ambos, internalizados no ano de 1992194. Entretanto, o projeto do CNJ não foi bem recebido pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL-Brasil), que ajuizou no STF a Ação Direta de Inconstitucionalidade, autuada sob o número 5.240/SP, alegando que não poderiam os Tribunais de Justiça legislar sobre direito processual penal, por ser

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WEINGARTNER NETO, Jayme. Audiência de Custódia. 2015. 60 slides. Apresentado no I Simpósio de Direitos Humanos, da Escola da Magistratura do Estado de Santa Catarina, em 22 de agosto de 2015. 191 PELLEGRINI, Marcelo. A tortura no Brasil é uma política de Estado: Má formação policial e omissão do poder público e da sociedade são a base da cultura de violência, afirma delegado e autor de livro sobre tortura. Carta Capital, publicado em 02 de setembro de 2015. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015. 192 BURNIER, José Roberto. Duas prisões detonam crise entre policiais civis e militares em SP: Um rapaz que foi preso por roubo disse na delegacia que foi torturado por um sargento da PM. Policial também acabou detido pelo delegado. Jornal Nacional, edição do dia 21 de outubro de 2015. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015. 193 BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015. 194 OLIVEIRA, G. S. D. et al. Audiência de custódia: Dignidade humana, controle de convencionalidade, prisão cautelar (lei 12.403/2011). 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2015, p. 107.

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competência privativa da União195. Porém, a Procuradoria-Geral da República, emitiu parecer no sentido de que: Dessa forma, não cabe falar em usurpação da competência privativa da União para legislar sobre Direito Processual, tampouco se vislumbra violação aos princípios da legalidade e da divisão funcional de poder. O Provimento Conjunto 3/2015 visa apenas a regulamentar tratados internacionais de direitos humanos devidamente incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro, que passaram pela apreciação e aprovação do Congresso Nacional e da Presidência da República. A realização da audiência de custódia, portanto, é norma de nível legal vigente e (ao menos potencial mente) eficaz no Direito brasileiro. Não foi o provimento atacado que inovou no ordenamento jurídico.196

Vê-se, portanto, que apesar de haver quem seja contra a instituição da audiência de custódia no país, a exemplo da ADEPOL-Brasil, as instituições essenciais à Justiça têm entendido o contrário197. E, sobre isto, especialmente no estado do Paraná, a Defensoria Pública tem protagonizado a inclusão da audiência de custódia na pauta das audiências da magistratura198. Ademais, de acordo com o sistema de busca de jurisprudência do TJPR199, o primeiro acórdão que tratou da audiência de custódia foi impetrado por um defensor público200. Outrossim, o mesmo sistema de busca de jurisprudência do TJPR, retornou 639 resultados quando procuradas decisões que contivessem exatamente o termo “audiência de custódia”. É interessante notar, a respeito da implementação do projeto audiência de custódia, capitaneado pelo CNJ, que em curto período de tempo houve adesão do 195

WEINGARTNER NETO, Jayme. Audiência de Custódia. 2015. 60 slides. Apresentado no I Simpósio de Direitos Humanos, da Escola da Magistratura do Estado de Santa Catarina, em 22 de agosto de 2015 196 BRASIL. Ministério Público Federal. Procuradoria-Geral da República. Parecer nº 139.937/2015AsJConst/SAJ/PGR. P. 15/16. 197 “A realização de audiência de custódia, com apresentação da pessoa presa a juiz até 24 horas após a prisão e participação do Ministério Público, da Defensoria Pública (quando necessário) e de advogado, é prática salutar no contexto do sistema criminal e da segurança pública brasileira e possibilita tratamento humanizado do preso, de acordo com a metanorma da dignidade do ser humano. Cumpre, ademais, compromisso internacional antigo do país, que até hoje não foi honrado pelas instituições do sistema de justiça”. BRASIL. Ministério Público Federal. Procuradoria-Geral da República. Parecer nº 139.937/2015-AsJConst/SAJ/PGR. P. 17. 198 Audiência de custódia é assegurada em dois casos atendidos pela DPPR. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015. 199 PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Sistema de busca de jurisprudência. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015. 200 PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. HC 1.177.044-4. Relator Desembargador José Mauricio Pinto de Almeida. 2ª Câmara Criminal. Julgado em 20/02/2014. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015.

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projeto por parte de todos os Estados da Federação. Veja-se que, em pouco mais de um mês, todos os Estados já haviam aderido ao projeto audiência de custódia: 201

Figura 1 - Mapa da Implantação da audiência de custódia no Brasil, em 16/09/2015

201

.

Nesta primeira imagem, vê-se que os Estados do Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte, Pará e Amapá ainda não haviam aderido ao projeto, muito embora já tivesse havido a visita do CNJ nos referidos Estados. Disponível em: . Acesso em: 16/09/2015.

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Figura 2 - Mapa da Implantação da audiência de custódia no Brasil, em 19/10/2015202.

O projeto do CNJ envolveu a celebração de 3 acordos de cooperação técnica com o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD): (i) “O primeiro acordo de cooperação técnica estabelece a ‘conjugação de esforços’ para a implantação da audiência de custódia nos estados”; (ii) “O segundo acordo firmado pretende ampliar o uso de medidas alternativas à prisão, como a aplicação de penas restritivas de direitos, o uso de medidas protetivas de urgência, o uso de medidas cautelares diversas da prisão, a conciliação e mediação”; (iii) “O terceiro acordo tem por objetivo elaborar diretrizes e promover a política de monitoração eletrônica”203. Com isso, os Tribunais de Justiça país a fora passaram a regulamentar o procedimento referente à audiência de custódia. Assim, considerando o primeiro ato 202

Na data de 19/10/2015, todos os Estados já haviam aderido ao projeto audiência de custódia, do CNJ. Disponível em: . Acesso em: 19/10/2015. 203 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Audiência de custódia: Histórico. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015.

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regulamentador, oriundo do Tribunal de Justiça de São Paulo, vê-se que a intenção é a de que seja o preso apresentado fisicamente perante um juiz no prazo de 24 horas204, porém, de forma consideravelmente diversa, o TJPR deixou ao arbítrio dos magistrados o prazo para marcar e realizar a audiência de custódia205. Veja-se que, apenas após o CNJ tomar partido na implantação das audiências de custódia, diversos estados emitiram resoluções a fim de regulamentar a audiência de custódia, cite-se, a título de exemplo, os Tribunais de Justiça dos estados do Maranhão, de Minas Gerais e do Espírito Santo206. Além dos Tribunais de Justiça, os Tribunais Regionais Federais assinaram, todos, os mesmos termos de cooperação técnica para implantação da audiência de custódia no âmbito da Justiça Federal. Com isto, consolidou-se no Brasil o interesse na efetividade da audiência de custódia, e, acima de tudo, na efetividade de uma norma oriunda de um tratado internacional de DH. Porém, ainda que o impulso dado pelo CNJ seja merecedor de aplausos, o que realmente se espera é que seja aprovado o Projeto de Lei do Senado nº 554/2011, de autoria do Senador Antônio Carlos Valadares207. Dito projeto regulamenta a audiência de custódia para todo o país de forma homogênea, e cumpre com as obrigações internacionais assumidas pelo Brasil, especialmente no que diz respeito à apresentação do preso sem demora perante a autoridade judicial208. A implantação da audiência de custódia no Brasil vem ainda a contribuir para a formação de um ius commune latino americano209, no sentido de que pode ser o 204

“Art. 3º A autoridade policial providenciará a apresentação da pessoa detida, até 24 horas após sua prisão, ao juiz competente, para participar da audiência de custódia”. SÃO PAULO. Poder Judiciário do Estado de São Paulo. Provimento Conjunto nº 03/2015: (Presidência do Tribunal de Justiça e Corregedoria Geral da Justiça). Diário de Justiça Eletrônico, ed. 1814, publicado em 27 de janeiro de 2015. 205 “Art. 4º. As Autoridades Policiais remeterão os autos de prisão em flagrante delito à Central de Audiências de Custódia em até 24 (vinte e quatro) horas, devendo apresentar os detidos em Juízo conforme pauta elaborada pela Central de Audiências de Custódia”. PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Resolução nº 144/2015. Diário de Justiça nº 1651, publicado em 117 de setembro de 2015. 206 PAIVA, Caio. Audiência de custódia e o processo penal brasileiro: 1 ed. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, págs. 66/84. 207 BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado nº 554/2011. Disponível em: . Acesso em 30/10/2015. 208 Cf. art. 2º, do PLS 554/2011. BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado nº 554/2011. Disponível em: . Acesso em 30/10/2015. 209 “A abertura da ordem local ao diálogo horizontal com outras jurisdições e ao diálogo vertical com jurisdições supranacionais é condição, requisito e pressuposto para a formação de um ius commune em matéria de direitos sociais. (…) Para a criação de um ius commune fundamental é avançar na

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projeto considerado uma best practice em matéria de DH210. Com isto, outros Estados-partes podem vir a cumprir com suas obrigações internacionais a partir da experiência judiciária brasileira, o que já vem se tornando realidade211. Entretanto, ainda que possa ser vista como uma best practice, há muito para ser superado. Sobre isto, a ONG Rede de Justiça Criminal e a Clínica Internacional de Direitos Humanos da Universidade de Harvard emitiram, em conjunto, um documento apresentado na audiência requerida pelo Brasil durante o 156º período de sessões ordinárias da CIDH212. Neste documento, os signatários apontam que o projeto piloto lançado pelo CNJ carece de força, especialmente por ter inserido a audiência de custódia apenas nas capitais estaduais, de forma que, diversamente, uma lei federal poderia sanar tal debilidade do projeto 213. Ainda abordando o documento apresentado à CIDH, as instituições signatárias apontam que “[d]esde o início do projeto de audiências de custódia em São Paulo, em fevereiro do corrente ano, o Tribunal de Justiça local identificou 277 relatos de tortura dos presos apresentados ao juiz”214. Tal documento analisa ainda a participação do Ministério Público nas audiências, que ao invés de ser protagonista na defesa dos direitos das pessoas, especialmente no combate à tortura, tem se colocado contrário à sua interação entre as esferas global, regional e local, potencializando o impacto entre elas, mediante o fortalecimento do controlo de convencionalidade e do diálogo entre as jurisdições, sob a perspectiva emancipatória dos direitos humanos”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o diálogo jurisdicional no contexto latino-americano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 409. 210 “Identificar as best practices regionais organizando e sistematizando um repertório de decisões emblemáticas em matéria de direitos humanos no âmbito latino-americano surge como relevante medida para fortalecer o controle de convencionalidade e o ius commune regional em matéria de direitos humanos”. PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o diálogo jurisdicional no contexto latino-americano. In: BOGDANDY, Armin Von (Org.); PIOVESAN, Flávia (Org.); ANOTNIAZZI, Mariela Morales (Org.). Estudos Avançados de Direitos Humanos: Democracia e Integração Jurídica: Emergência de um novo Direito Público. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013, p. 408. 211 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Ministro Lewandowski leva à CIDH a experiência das audiências de custódia. Disponível em: . Acesso em: 29 out. 2015. 212 CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Falha grave: Projeto de audiências de custódia perde sentido sem investigação de tortura, afirmam ONGs na CIDH. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015. 213 “Para contornar a evidente falta de estabilidade e segurança jurídica que uma proposta de política pública com essas características gera, o único caminho possível é a aprovação de projeto de lei que regulamente em nível nacional a matéria”. CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015. 214 CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015.

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implementação215, e, ainda mais, o documento também indica que somente em 3 casos, durante a audiência de custódia, o Ministério Público fez alguma pergunta sobre a ocorrência de tortura. As organizações em conjunto apresentaram medidas a serem adotadas pelo Estado brasileiro, a fim de serem atendidos, de fato, os standards internacionais de proteção dos DH, são as recomendações: a) Aprovação do PLS 554/2011 em termos condizentes com o entendimento exarado pelo Sistema Interamericano de Direitos Humanos; b) Adequar a aplicação da prisão provisória como excepcional, de acordo com os standards internacionais; c) Ação articulada entre os três poderes para a efetivação de uma política carcerária que respeite os direitos básicos; d) Seja entendida a Audiência de Custódia como instrumento primordial de combate à tortura e à violência policial, contando com as seguintes medidas: i) Criação de banco de dados nacional transparente, contendo todas as denúncias de tortura e seu trâmite; ii) Catalogação das denúncias locais, focando na descrição da violência e no agente público denunciado, a fim de detectar possíveis padrões de comportamento; iii) Fortalecimento do protagonismo do Ministério Público enquanto constitucionalmente responsável pela supervisão da ação policial; iv) Garantia de independência do exame pericial em todos os casos de intervenção policial; v) Retirada da força policial das audiências, em especial da consulta prévia entre defensores e acusados; e) Que se leve em conta a atual situação do sistema carcerário para a formulação de políticas públicas a respeito do sistema carcerário e justiça 216 criminal, e não apenas as leis em hipótese.

Poucos dias antes da audiência realizada no 156º período de sessões ordinárias da CIDH, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) emitiu uma recomendação, a qual assevera que: Considerando que ao Ministério Público, na apresentação do custodiado no ato judicial, compete, ainda, adotar as medidas necessárias e pertinentes em eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos, entre outras irregularidades. RESOLVE, respeitada a autonomia dos Ministérios Públicos, recomendar que: 215

“Embora louvável, essa política pública padece de vícios que vem sendo apontados pela sociedade civil desde o início de sua elaboração, como a necessidade de aprimoramento no combate aos maus-tratos e à tortura, e o descaso por parte de atores do sistema de justiça como o Ministério Público que muitas vezes se coloca contrário à sua realização”. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015. 216 CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015.

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O Ministério Público brasileiro, observadas as disposições constitucionais e legais, adote as medidas administrativas necessárias para assegurar a efetiva participação de seus membros nas audiências de custódia, objetivando garantir os direitos individuais do custodiado e promover os interesses da sociedade, aderindo, ainda, aos termos de cooperação técnica firmados pelos respectivos tribunais.217

Portanto, observa-se que é ainda incipiente o movimento pela implantação da audiência de custódia, havendo erros e acertos, porém, a continuação do projeto demonstra ser promissor no cumprimento das obrigações internacionalmente assumidas, especialmente as contidas no artigo 7 (5), da CADH. A fim de ser verificada a efetividade da audiência de custódia, realizou-se uma pesquisa de campo, empírica, e, neste momento, se apresentarão os resultados obtidos das audiências realizadas na 14ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, a qual realiza atualmente as audiências de custódia das pessoas presas em flagrante delito na circunscrição do 1º Distrito Policial de Curitiba218. São apenas 5 casos analisados, os quais possuem riqueza em diversidade de solução, assim como por meio deles é possível verificar que, de fato, na prática, as exigências da CADH não são devidamente cumpridas. Todas as audiências que serão apontadas ocorreram no dia 16 de outubro de 2015, nas dependências do Fórum Criminal do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba. No primeiro caso, a pessoa foi detida na data de 08 de outubro de 2015, pela suposta prática do delito de furto na modalidade tentada. A solução para este caso foi a de substituição da prisão preventiva com imposição de medida cautelar de monitoramento eletrônico. Não há na ata da audiência, qualquer informação sobre sequer perguntas a respeito da ocorrência ou inocorrência de tortura. No segundo caso, a pessoa foi detida na data de 10 de outubro de 2015, pela suposta prática do delito de roubo. A solução para este caso foi a de manutenção da prisão preventiva, assim como decidido pelo plantão Judiciário. O defensor público arguiu a impossibilidade de manutenção da prisão pelo não preenchimento dos 217

BRASIL. Diário Oficial da União. Recomendação nº 28, de 22 de setembro de 2015, do Conselho Nacional do Ministério Público. Publicado em 14 de outubro de 2015. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015. 218 PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. 14ª Vara Criminal da Capital realiza Audiências de Custódia. Disponível em: . Acesso em: 30/10/2015.

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requisitos legais, o que foi rejeitado pela magistrada. Não consta na ata de audiência qualquer informação acerca de ocorrência ou não de prática de tortura, sequer consta se houve pergunta sobre isto. No terceiro caso se tratam de duas pessoas, as quais foram detidas no dia 12 de outubro de 2015, pela suposta prática do delito de roubo majorado pelo concurso de agentes e emprego de arma. O resultado deste caso foi o de homologação do auto de prisão em flagrante e conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Na ata de audiência não consta qualquer informação sobre sequer ter havido perguntas acerca da ocorrência de tortura. No quarto caso, trata-se da prisão de uma pessoa pela suposta prática do delito de roubo majorado pelo emprego de arma, tendo a pessoa sito detida na data de 14 de outubro de 2015. A solução para o presente caso foi a de homologação do auto de prisão em flagrante e substituição da prisão preventiva pela medida cautelar de monitoramento eletrônico por meio de tornozeleira. Da leitura da ata de audiência não se extrai que houve qualquer interesse sobre a ocorrência ou não de tortura. Por fim, o quinto caso trata da prisão em flagrante, na data de 15/10/2015, pela suposta prática do delito de tráfico de drogas. O resultado neste caso foi o de arquivamento do inquérito policial, com a consequente soltura da pessoa detida. Na ata da audiência não há qualquer informação sobre a ocorrência ou não de tortura. Da análise dos casos acima apresentados, verifica-se que haveria violação do disposto no artigo 7 (5), da CADH, segundo o entendimento da CorteIDH, em pelo menos dois casos, sendo eles os dois primeiros, onde as detenções superaram 5 dias sem que fossem as pessoas detidas conduzidas fisicamente à presença de um juiz para verificação da necessidade e legalidade da prisão, assim como para verificar se houve ou não prática de tortura contra estas pessoas. Considerando o estudado e analisado neste tópico, pode-se verificar que o Brasil ainda tem muito a avançar na proteção, efetivação e consolidação dos DH. E para tal, a participação de membros da sociedade civil, por meio das ONGs, é fundamental para que o Estado brasileiro cumpra, com maestria, suas obrigações internacionalmente assumidas. Dentre os grandes desafios, destaca-se um que se sobressai, qual seja o de superar a barreira do papel, da ideologia, para a materialidade, o dia a dia, ou seja, não basta haver legislação sem que haja efetiva atuação.

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Portanto, o projeto do CNJ para implantação da audiência custódia no território brasileiro deve ser a alavanca para a consagração da proteção à pessoa humana, em toda a sua dignidade, porquanto fundamento da República Federativa do Brasil219, a fim de que seja consolidado o movimento do human rights approach no âmbito interno, com primazia da interpretação das leis, lato sensu, em conformidade com o princípio pro persona, ou seja, a atuação do Estado deve sempre pautar sua atuação com o fim de consagrar a proteção da pessoa.

219

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III - a dignidade da pessoa humana”. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, 5 de outubro de 1988.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Após as análises feitas, as doutrinas apresentadas, os casos analisados e as

experiências empíricas serem postas no papel, faz-se necessário apresentar o que se pôde verificar com tudo isso, e o que se espera do Brasil com relação ao cumprimento de suas obrigações internacionais, especialmente aquelas assumidas com os tratados de Direitos Humanos. Em primeiro lugar, mas sem querer apresentar uma ordem de importância, sendo apenas uma ordem metodológica adotada, pode-se verificar que o controle de convencionalidade é a doutrina mais recente a ser estudada no que tange à matéria dos Direitos Humanos, ainda que não seja um conceito tão recente assim, posto que assumido pelo Brasil em 1992, e constante do texto original da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969. Perceba-se, no entanto, que o controle de convencionalidade não consta de texto expresso do artigo 2 da Convenção Americana, mas surgiu ele a partir da interpretação que a Corte Interamericana faz das expressões nele contidas, tendo como marco de partida o Caso Almonacid Arellano vs. Chile, e desde então o controle de convencionalidade vem sendo desenvolvido na região latino-americana, o que dá aos Direitos Humanos ainda mais força emancipatória aos indivíduos enquanto sujeitos do direito internacional dos direitos humanos. Com o estudo foi possível observar que o órgão a quem compete a interpretação final do quanto estatuído pela Convenção America é a Corte Interamericana de Direitos Humanos, tal qual para a Constituição da República brasileira se tem o Supremo Tribunal Federal. Ademais, a despeito da divergência doutrinária, acredita-se que o controle concentrado de convencionalidade é atribuição privativa da Corte Interamericana, isto porque é este o órgão que dita às palavras finais sobre a interpretação que deve ser feita da Convenção Americana. Nesta seara, o controle de convencionalidade vem a fomentar o diálogo, tão importante em matéria de Direitos Humanos, o qual pode ser realizado de diversas formas,

entre

Interamericana

Corte e

Interamericana

Corte

Europeia

e Cortes constitucionais, de

Direitos

Humanos,

e

entre entre

Corte Cortes

constitucionais, sempre com vistas a desenvolver o que se evidenciou chamar ius commune, que é a construção de decisões e legislações que venham sempre a proteger a pessoa, proteção de forma homogênea nos Estados, e com a

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consagração do estudado princípio pro persona. Esta tendenciosa prática traz à tona a discussão acerca das responsabilidades dos Estados no cenário internacional, fazendo constar das agendas estatais a discussão acerca da melhor forma de atender estas obrigações e evitar as responsabilizações. E no âmbito desta fiscalização do cumprimento das obrigações assumidas, se encontram os dois importantes órgãos do Sistema Interamericano de proteção e promoção dos Direitos Humanos na região, a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, os quais estão em constante atuação para consolidação da proteção dos indivíduos em face das atuações dos Estados. Além desse importante dever dos dois órgãos, à Comissão incumbe o dever de garantir a manutenção do sistema democrático no âmbito da Organização dos Estados Americanos, sistema este que relega às pessoas igualdade, soberania, e participação social. Já a Corte Interamericana, em suas sentenças, tem condenado aos Estados, que ratificaram a Convenção Americana, e que aceitaram sua competência contenciosa, a adotar, reformar ou revogar legislações que visem o cumprimento do disposto no artigo 2 da Convenção, este é um grande avanço em controle de convencionalidade, na sua modalidade concentrada. Assim como verificado neste estudo, o Estado, quando ratifica um tratado internacional em matéria de Direitos Humanos, deve ter sempre em vista a satisfação dos direitos inerentes às pessoas e sua dignidade, isto se traduz também no abrir mão da soberania intocável do Estado em face do agora sujeito de direitos internacionais que pode vir a ser protagonista da responsabilidade internacional deste mesmo Estado. E neste ínterim, o controle de convencionalidade surge no Brasil para trazer mais um forte elemento à proteção da pessoa humana, especialmente para as pessoas presas em flagrante em razão da prática de um delito, se insere, neste contexto, a audiência de custódia. Sobre a referida audiência, é salutar para o instituto considerar sua finalidade a partir do texto da Convenção Americana associada à interpretação feita pela Corte Interamericana, sendo que, conforme verificado, a apontada audiência serve para ser verificada a legalidade de uma prisão preventiva, assim como verificar se a pessoa presa acabou por ser tornar vítima de tortura policial. Analisando o texto do artigo 2, da Convenção Americana, somando à interpretação que dele faz a Corte Interamericana, a audiência de custódia pode ser conceituada como “a audiência que visa garantir a condução da pessoa presa

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fisicamente à presença de um juiz, que deverá verificar a legalidade e necessidade da manutenção da prisão, assim como deverá verificar se houve ou não prática de tortura em face da pessoa presa, isto sem demora, sendo adequado a apresentação da pessoa presa em, no máximo, 48 horas após sua prisão, para que seja garantido o direito à razoável duração do processo, podendo ser condicionada, sua liberdade, ao cumprimento das medidas diversas ao cárcere previstas em lei”. O conceito proposto parte da análise feita da jurisprudência da Corte Interamericana a respeito das expressões contidas no artigo 2 da Convenção, assim como parte da experiência Europeia sobre o tema, que é bastante avançada com relação às decisões da Corte Interamericana nesta matéria. Esta interpretação em conjunto, da jurisprudência da Corte Interamericana com a da Corte Europeia de Direitos Humanos, pode-se chamar de diálogo entre Cortes internacionais regionais, ainda que tal conversa se dê apenas a partir da efetiva utilização das decisões pelas Cortes. E com este diálogo entre as Cortes, faz-se imprescindível que os Estados estejam atentos às decisões, especialmente, da Corte Interamericana, pois é a partir daí que deve ser adequado o quanto necessário

internamente

para

não

serem

os

Estados

responsabilizados

internacionalmente. Com esta possibilidade de responsabilização, e atento ao drama da população carcerária brasileira, o Conselho Nacional de Justiça lançou o “projeto audiência de custódia”, pois se sabe, conforme dados apresentados anteriormente, que mais de 700.000 pessoas compõem o sistema prisional brasileiro, e muitas delas estão presas provisoriamente, ou seja, sem que tenha sido considerada culpada em definitivo, com o trânsito em julgado de uma sentença condenatória. A audiência de custódia surge como efetiva implantação da interpretação do artigo 2 da Convenção Americana de Direitos Humanos feita pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, ou seja, há aqui um controle

de

convencionalidade difuso, realizado pelo Estado no âmbito doméstico. No dito popular, a audiência de custódia surge “aos trancos e barrancos”, isto porque muito há que ser aprimorado, tal qual apontou a Rede de Justiça Criminal em conjunto com a Clínica Internacional de Direitos Humanos da Universidade de Harvard quando da apresentação da audiência de custódia perante a Comissão Interamericana, e neste sentido, a ponderação que fizeram as organizações foi no sentido de que a audiência de custódia deve ser instrumento de repressão à tortura,

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prática nefasta e enraizada na cultura da polícia militar brasileira. Sobre isto, os dados apontados no tópico 4.2, levam a crer que de fato é necessária maior investigação sobre a prática de tortura em pessoas presas em flagrante, a fim de extirpar esta tão comum, porém abominável, violência estatal. Nos dias atuais, verificou-se que a audiência custódia já está implantada em todos os Tribunais, de Justiça e Regionais Federais, pelo país, ainda que se tenham notícias apenas das capitais das unidades federativas. Em se tratando especialmente da cidade de Curitiba, onde se teve a oportunidade de assistir durante toda uma tarde algumas audiências de custódia, a impressão que se leva é de que pouco se sabe sobre como conduzir uma audiência de custódia, o que dizer então sobre a real finalidade a que se presta esta audiência, sem mencionar profundamente que há uma barreira entre a cultura do encarceramento e a concessão da liberdade a uma pessoa, sendo que a liberdade é a regra no ordenamento jurídico nacional. Por fim, espera-se que o controle de convencionalidade, que é uma ferramenta poderosa na proteção do indivíduo, seja usado com muita sabedoria por aqueles que a possuem ao seu dispor, posto que os maiores estudiosos dos Direitos Humanos compõem, já compuseram e virão a compor o corpo de juízes da Corte Interamericana de Diretos Humanos, órgão este que dita a forma como devem ser lidos os Direitos Humanos na região latino-americana, órgão que dá mais do que orientações para a efetivação de tais direitos, dá, em verdade, um norte, um caminho a ser trilhado por aqueles que devem proteger as pessoas, ou melhor dizendo, por aqueles que devem proteger seus nacionais: o Estado. E para arrematar, lembremo-nos sempre que “justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”220, e assim o é também com a proteção e efetivação dos Direitos Humanos.

220

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Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 21 de novembro de 2007. Serie C No. 170. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso de los Pueblos Indígenas Kuna de Madungandí y Emberá de Bayano y sus Miembros Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 14 de outubro de 2014. Serie C No. 284, Parágrafo 192. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso de personas dominicanas y haitianas expulsadas Vs. República Dominicana. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 28 de agosto de 2014. Serie C No. 282, Parágrafo 311. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso García Asto y Ramírez Rojas Vs. Perú. Sentença de 25 de novembro de 2005. Série C No. 137, Parágrafo 115. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso J. Vs. Perú. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de27 de novembro de 2013. Serie C No. 275, Parágrafo 187. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Caso Palamara Iribarne Vs. Chile. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 22 de novembro de 2005. Serie C No. 135, Parágrafo 89. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica.Corte IDH. Caso Tibi Vs. Ecuador. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 7 de setembro de 2004. Série C No. 114, Parágrafos 118 e 121. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Parecer Consultivo OC-01/82, de 24 de setembro de 1982. Disponível em: . Acesso em: 14/10/2015. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Exigibilidad del Derecho de Rectificación o Respuesta (arts. 14.1, 1.1 y 2 Convención Americana sobre Derechos Humanos). Parecer Consultivo OC-7/86 de 29 de agosto de 1986 - Voto Separado do Juiz Piza Escalante. Serie A No. 7. Disponível em: . Acessado em 23/10/2015. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. San José da Costa Rica, Costa Rica. Parecer Consultivo OC-21/14, de 19 de agosto de 2014. Disponível em: . Acesso em: 14/10/2015. FRANÇA. Conseil Constitutionnel. Decisão 74/54-DC. Disponível em: . Acesso em: 11/08/2015.

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ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. General comment No. 35: article 9 (liberty and security of person), de 16 de dezembro de 2014. Disponível em: . Acesso em: 28/10/2014. PARANÁ. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. HC 1.177.044-4. Relator Desembargador José Mauricio Pinto de Almeida. 2ª Câmara Criminal. Julgado em 20/02/2014. Disponível em: . Acesso em: 29/10/2015.

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ANEXO A – PARECER DA PGR NA ADI 5.240/SP

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ANEXO B – TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA Nº 007/2015 (ENTRE O CONSELHO NACIONAL DE JUTIÇA E O INSTITUTO DE DEFESA DO DIREITO DE DEFESA)

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ANEXO C – PROJETO DE LEI DO SENADO Nº 554/2011

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ANEXO D – PROVIMENTO CONJUNTO Nº 03/2015 (PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUTIÇA E CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO)

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ANEXO E – RESOLUÇÃO Nº 144, DE 14 DE SETEMBRO DE 2015, DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ

Cria a CENTRAL DE AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA no âmbito do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba O ÓRGÃO ESPECIAL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, com fundamento nos artigos 223, § 2º, 225, caput, e 238 da Lei Estadual 14.277/2003, no artigo 83, inciso XVII, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Paraná, na Resolução 93/2011 do Órgão Especial e, CONSIDERANDO que o art. 7º, item 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), promulgada por meio do Decreto Presidencial nº 678, de 06 de novembro de 1992, garante a toda pessoa detida ou retida a apresentação, sem demora, à presença de um Magistrado; CONSIDERANDO a iniciativa do Conselho Nacional de Justiça de implantar projetos pilotos de audiência de custódia, com o intuito de controlar a legalidade e necessidade da prisão cautelar; CONSIDERANDO as conclusões do Grupo de Trabalho multidisciplinar instituído com o fito de trazer subsídios à consecução do projeto; CONSIDERANDO que com a audiência de custódia o juiz terá maiores subsídios para proferir a decisão de que trata o art. 310 do Código de Processo Penal; CONSIDERANDO a medida cautelar concedida pelo Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347; CONSIDERANDO, finalmente, o contido no protocolo digital nº 000965073.2015.8.16.6000. RESOLVE

Art. 1º. Criar a Central de Audiências de Custódia no âmbito do Poder Judiciário do Paraná, com competência exclusiva para a análise dos autos de prisão em flagrante provenientes das Delegacias e Departamentos de Polícia Judiciária do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, na forma do art. 310 do Código de Processo Penal, bem como para realização das audiências de custódia. Art. 2º. A implantação da Central de Audiências de Custódia ficará a cargo da Presidência do Tribunal. Art. 3º. As atividades atinentes à Central de Audiências de Custódia serão levadas a efeito por um grupo de juízes designados pela Presidência do

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Tribunal de Justiça, preferencialmente dentre aqueles constantes de lista de interessados, que atuarão em sistema de escala de rodízio. Parágrafo único. Haverá, no mínimo, um juiz designado para cada dia, sem prejuízo do funcionamento regular da respectiva unidade judiciária, para a qual a Presidência poderá designar um Juiz colaborador. Art. 4º. As Autoridades Policiais remeterão os autos de prisão em flagrante delito à Central de Audiências de Custódia em até 24 (vinte e quatro) horas, devendo apresentar os detidos em Juízo conforme pauta elaborada pela Central de Audiências de Custódia. Parágrafo único. Enquanto não houver integração dos sistemas informatizados do Poder Judiciário e da Secretaria de Estado de Segurança Pública para a remessa eletrônica dos comunicados de prisão em flagrante por meio de webservice, o encaminhamento dar-se-á por meio físico, ficando a cargo da Secretaria do Central de Audiências de Custódia a digitalização e inclusão dos comunicados recebidos no sistema informatizado do Poder Judiciário. Art. 5º. Será proporcionado ao autuado, antes da audiência de custódia, entrevista prévia e por tempo razoável com seu advogado ou com Defensor Público. Art. 6º. Na audiência de custódia, o juiz entrevistará objetivamente o autuado, questionando sobre a sua qualificação, condições pessoais, tais como, estado civil, nível de escolaridade, profissão ou meio de vida, fontes de renda, local de residência e trabalho e ainda, sobre as circunstâncias objetivas de sua prisão. § 1º. Não serão admitidas perguntas que antecipem a instrução probatória de eventual processo de conhecimento, mas apenas aquelas relacionadas aos fundamentos e requisitos da prisão preventiva ou necessárias à análise das providências cautelares. § 2º. Após a entrevista do autuado, o Juiz ouvirá o Ministério Público, se presente, que poderá se manifestar pelo relaxamento da prisão em flagrante, sua conversão em prisão preventiva, pela concessão de liberdade provisória com ou sem a imposição das medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, ou, ainda, pelo arquivamento do inquérito policial. § 3º. Em seguida, o Juiz dará a palavra ao advogado ou Defensor Público para manifestação e decidirá na própria audiência, fundamentadamente, nos termos do art. 310 do Código de Processo Penal. § 4º. A audiência poderá ser gravada em sistema audiovisual adequado, lavrando-se termo sucinto que conterá o inteiro teor da decisão proferida pelo juiz. § 5º. O termo da audiência, instruído, se for o caso, com a mídia, será anexado ao auto de prisão em flagrante delito, seguindo-se a sua remessa, via Serviço Distribuidor, a uma das Varas Criminais competentes, observadas as disposições normativas da CorregedoriaGeral da Justiça. § 6º. Havendo a conversão da prisão em flagrante em preventiva, o mandado de prisão será expedido eletronicamente pelo Central de Audiências de Custódia, observadas as disposições normativas da Corregedoria-Geral da Justiça. § 7º. Os alvarás serão expedidos de forma eletrônica e cumpridos na

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Central de Audiências de Custódia, observadas as disposições normativas da Corregedoria-Geral da Justiça. Art. 7º. O Juiz, diante das informações colhidas na audiência de custódia, e ouvido o Ministério Público, poderá encaminhar o autuado para a realização de exame de corpo de delito, a fim de apurar eventuais abusos por ele sofridos. Art. 8º. As Audiências de Custódia realizar-se-ão no horário de expediente forense, no período de 12h00 às 18h00, ficando a critério da Presidência do Tribunal de Justiça a extensão do horário de funcionamento aos finais de semana e feriados. Parágrafo único. A realização das audiências de custódia não exclui o regime de Plantão Judiciário no âmbito do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba fora do horário de expediente forense, inclusive no regime de sobreaviso, nos moldes da Resolução nº 06/2005 do Órgão Especial. Art. 9º. A Presidência designará servidores para atuar exclusivamente na Central de Audiências de Custódia, os quais deverão praticar todos os atos necessários à realização das audiências de custódia. Art. 10. Caberá à Presidência elaborar a escala de rodízio, publicando-a no Diário da Justiça e no site do Tribunal de Justiça, com antecedência mínima de 30 dias, solicitando a designação de membros do Ministério Público Estadual, da Defensoria Pública Estadual, do Instituto Médico Legal e do Instituto de Identificação para atuarem na Central de Audiências de Custódia. Art. 11. A Central de Custódia funcionará no Prédio do Poder Judiciário situado na Av. Anita Garibaldi, nº 750, Curitiba - Paraná. Art. 12. A Secretaria do Estado da Segurança Pública garantirá a segurança das autoridades judiciárias e demais pessoas envolvidas na realização das audiências de custódia, por meio de escala permanente que assegure a presença ininterrupta de policiais militares e de agentes penitenciários no local. Art. 13. Os casos omissos serão decididos pela Presidência do Tribunal de Justiça. Art. 14. Esta resolução entrará em vigor no prazo de 30 (trinta) dias de sua publicação.

Curitiba, 14 de setembro de 2015. PAULO ROBERTO VASCONCELOS Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná

Estiveram presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Paulo Roberto Vasconcelos, Telmo Cherem, Regina Afonso Portes, Ruy Cunha Sobrinho, Irajá Romeo Hilgenberg Prestes Mattar, Rogério Coelho, Antônio Loyola Vieira (substituindo o Des. Eduardo Lino Bueno Fagundes), Francisco Eduardo Gonzaga de Oliveira

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(substituindo a Desª. Maria José de Toledo Marcondes Teixeira), Jorge Wagih Massad, Sonia Regina de Castro, Rogério Kanayama, Lauro Laertes de Oliveira, Eugênio Achille Grandinetti, Cláudio de Andrade, D'Artagnan Serpa Sá, Luís Carlos Xavier, Luiz Osório Moraes Panza, Renato Lopes de Paiva, José Augusto Gomes Aniceto (substituindo o Des. Luís César de Paula Espíndola) e Guilherme Freire de Barros Teixeira.

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ANEXO F – DOCUMENTO APRESENTADO À COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS SOBRE A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA

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ANEXO G – ATAS DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA NA 14ª VARA CRIMINAL DE CURITIBA

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