CONTROVÉRSIAS SOBRE A BUSCA DA VERDADE CIENTÍFICA

May 22, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Philosophy, Scientific Method
Share Embed


Descrição do Produto

CONTROVÉRSIAS SOBRE A BUSCA DA VERDADE CIENTÍFICA Fernando Alcoforado* Em grego, a verdade (aletheia) significa aquilo que não está oculto, o não escondido, manifestando-se aos olhos e ao espírito, tal como é, ficando evidente à razão. Em latim, a verdade (veritas) é aquilo que pode ser demonstrado com precisão, referindo-se ao rigor e à exatidão. Em princípio, a verdade é o objetivo genuíno da investigação científica. A busca pela verdade passa necessariamente pelo combate ao dogmatismo, à crença de que o mundo é tal como observado e percebido inicialmente, sem possibilidade de contestação (RAMOS, Fábio Pestana. Concepção filosófica da verdade. Disponível no website , 2011). Segundo Ramos (2011), Doutor em História Social, a verdade é uma interpretação mental da realidade transmitida pelos sentidos, confirmada por outros seres humanos despidos de preconceitos e confirmada por equações matemáticas e linguísticas formando um modelo capaz de prever acontecimentos futuros diante das mesmas coordenadas. Verdade material é a adequação entre o que é e o que é dito. O grande problema é que a verdade não possui um significado único, tampouco estático e definitivo, sendo influenciada por inúmeros fatores. A concepção de verdade foi objeto de estudo de diversos pensadores ao longo da história da filosofia, mas, três particularmente exerceram forte influência: Leibniz, Kant e Husserl. Para Leibniz seria necessário distinguir dois tipos de verdade: de um lado as verdades de razão e de outro as verdades de fato. As verdades de razão enunciam que uma coisa é, necessariamente e universalmente, não podendo ser diferente do que é, tal como as ideias matemáticas, sendo inatas. As verdades de fato, ao contrário, são aquelas que dependem da experiência, expressando ideias obtidas através das sensações, percepção e memória, sendo, portanto, empíricas. Segundo Leibniz, a relação entre verdades de razão e de fato, julgadas pela racionalização das informações, permite conhecer a realidade. Para Kant, a verdade surge a partir da relação entre juízos analíticos e sintéticos, expressando, o primeiro, operações intelectuais e, o segundo, as estruturas ou fenômenos analisados. Em outras palavras, a realidade que conhecemos não corresponde aquilo que é, mas sim ao que a razão interpreta. Husserl, por sua vez, criou a fenomenologia, um ramo da filosofia que estuda a leitura dos fenômenos pela razão, já que a realidade seria relativa e subordinada à manifestação para consciência. O entendimento sofreria influencia dos sentidos e da razão, além dos conhecimentos previamente presentes na mente e do contexto (RAMOS, 2011). Segundo Ramos (2011), há três tendências que dizem respeito à forma de conhecer e encarar a verdade: 1) Dogmatismo- Baseada no racionalismo de Descartes, afirma que o conhecimento adquirido é seguro e universal, alguns inclusive inatos, conferindo certeza absoluta às decisões; 2) Ceticismo- Oposta ao dogmatismo, originado a partir do empirismo, afirma que o verdadeiro conhecimento é fornecido pelos sentidos e pela experiência, sendo impossível construir uma verdade segura; portanto toda decisão é provisória e sujeita a constantes reajustes; e, 3) Relativismo- Atitude filosófica originada a partir do criticismo kantiano, a qual defende a ideia de que cada indivíduo possui uma verdade, um ponto de vista e uma perspectiva, para qual as decisões só 1

podem ser tomadas em conjunto, analisando os diversos ângulos e pontos de vista. Chegar à verdade pode ser mais complexo do que aparente, talvez mesmo impossível dentro da limitada capacidade humana de racionalização. No artigo A verdade como um problema fundamental em Kant de Adriano Perin () é apresentada a resposta de Kant para o problema da verdade. Kant apresenta a definição de verdade como a "concordância do conhecimento com seu objeto". A "concordância do conhecimento com o objeto" significa "a concordância do entendimento com o objeto que é apreendido por ele, a saber, o fenômeno". Segundo Kant, verdade e ilusão não estão no objeto, enquanto é intuído, mas no juízo sobre ele, enquanto é pensado. Consequentemente, tanto a verdade quanto o erro, portanto, também a ilusão, enquanto induz ao último, podem encontrar-se somente no juízo, isto é, na relação do objeto com o nosso entendimento. No artigo de Peter Kreeft Kant: a verdade subjetiva (http://blog.quadrante.com.br/kanta-verdade-subjetiva/), a questão básica de Kant era: Como podemos conhecer a verdade? Na sua juventude, Kant aceitava a resposta racionalista de que conhecemos a verdade pelo intelecto, não pelos sentidos, e de que o intelecto possuía as suas próprias “ideias inatas”. Mais tarde, leu o empirista David Hume, que, em palavras do próprio Kant, o “despertou do sono dogmático”. Como outros empiristas, Hume acreditava que o homem só pode conhecer a verdade mediante os sentidos e que não existem “ideias inatas”. Mas as premissas de Hume conduziram-no ao ceticismo, à negação de que seja possível conhecer a verdade com certeza. Kant considerou inaceitáveis tanto o “dogmatismo” racionalista como o ceticismo empirista e procurou uma terceira via. Peter Kreeft afirma que havia uma terceira teoria disponível desde os tempos de Aristóteles: a filosofia do senso comum, que é o realismo. De acordo com o realismo, podemos conhecer a verdade por meio do intelecto e dos sentidos, desde que ambos trabalhem corretamente em conjunto, como as lâminas de uma tesoura. Em vez de voltar-se para o realismo tradicional, Kant inventou toda uma nova teoria do conhecimento, geralmente chamada idealismo. Considerava-a sua “revolução copernicana na filosofia”. Mas o nome mais simples para ela é subjetivismo, pois o que pretende é redefinir a própria verdade como subjetiva, não objetiva. Todos os filósofos anteriores tinham dado por assente que a verdade é objetiva. Aliás, de acordo com o senso comum, é simplesmente isso o que queremos dizer ao falar de “verdade”: conhecer o que realmente é, conformando a mente segundo a realidade objetiva. Alguns filósofos (os racionalistas) julgavam ser capazes de atingir essa meta apenas com a razão. Os primeiros empiristas (como Locke) julgavam que podiam atingi-la através dos sentidos. O empirista cético Hume, posterior, julgava que não havia maneira alguma de atingir com certeza a verdade. Kant negou a premissa comum a essas três filosofias concorrentes, ou seja, negou que a verdade devesse ser atingida, que a verdade significasse conformidade com a realidade objetiva. A “revolução copernicana” de Kant redefine o próprio conceito de verdade como realidade que se conforma segundo as nossas ideias. “Até hoje, sustentava-se que o nosso conhecimento devia adequar-se aos objetos […]. Haverá mais progresso se assumirmos a hipótese contrária, de que são os objetos de pensamento que devem

2

adequar-se ao nosso conhecimento”. Kant afirmou que todo o nosso conhecimento é subjetivo. Na obra de Roger G. Newton, A Verdade da Ciência: Teorias Físicas e Realidade (Lisboa: Dinalivro, 1999, 302 pp.), é apresentada uma defesa da objetividade científica. Newton empenha-se na tarefa construtiva de mostrar como as teorias físicas nos permitem efetivamente compreender a realidade. Investigando o contraste entre a física clássica e a física quântica, Newton mostra como esta última afetou as noções tradicionais de causalidade, realidade e verdade. O último capítulo, dedicado à verdade científica, retoma as preocupações iniciais do livro. Será a verdade relativa? Muitos dos que negam a objetividade da ciência pensam que sim, declarando que a verdade de uma afirmação consiste na sua aceitação consensual no interior de uma comunidade. Contra esta teoria da verdade como consenso, Newton faz notar que, “se a concordância fosse a definição de verdade, as afirmações científicas consensuais não seriam tão exatas como costumam ser, antes teriam a tendência para ser tão vagas quanto possível”. Em sua obra Contra o método (São Paulo: Editora UNESP,2003), Paul Feyerabend, que nasceu em Viena, em 1924, e viveu nos Estados Unidos e na Europa, afirma que não existe um método científico universal a – histórico criticando abertamente o método científico. De acordo com a sua epistemologia, a ciência é uma empresa anárquica. Rejeita a existência de regras universais e defende a violação dessas regras metodológicas. Afirma que o avanço da ciência se dá ao se violar as regras metodológicas impostas. O anarquismo epistemológico que ele defende deve ser entendido como uma defesa a um pluralismo epistemológico, ou seja, contra um método único de se fazer ciência. Defende um “tudo-vale”, ou seja, um radical pluralismo metodológico. Sua epistemologia afirma que nenhuma teoria pode ser consistente com todos os fatos e que não pode existir um conjunto de regras que conduzirão ao progresso científico. Feyerabend defende abertamente a contra-regra, ou seja, se a regra é a indução, deve-se usar a contra-indução, a qual incide na aceitação de hipóteses alternativas. De acordo com a visão de Feyerabend, todas as teorias são falíveis por natureza. Propõe as seguintes contra-regras: (a) introduzir hipóteses que conflitem com as observações; (b) introduzir hipóteses que não se ajustem às teorias estabelecidas. Teorias devem sempre ser vistas como aproximações, e jamais como definições. Não se pode atingir a verdade, mas apenas se aproximar dela. *Fernando Alcoforado, 77, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia SustentávelPara o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015) e As Grandes Revoluções Científicas,

3

Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016). Possui blog na Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail: [email protected].

4

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.