Copula drop em Karitiana: uma instância de sluicing

May 20, 2017 | Autor: Tarcisio Dias | Categoria: Syntax, Ellipsis, Cleft Sentence, Copular Sentences, Sluicing
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Copula drop em Karitiana: uma instˆancia de sluicing ∗ Tarcisio Antonio Dias† 2017

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Introdu¸ c˜ ao

O prop´osito deste trabalho consiste na discuss˜ao acerca de senten¸cas copulares da l´ıngua ind´ıgena brasileira Karitiana (Tupi), tendo-se em vista o fenˆomeno da elipse de c´opula, tamb´em referido na literatura como copula drop. Nesta l´ıngua, o verbo copular pode ser omitido ao menos em dois tipos de constru¸c˜ oes com c´opula, a saber, nas constru¸c˜oes de c´opula stricto sensu 1 (ver 1-4), bem como nas constru¸c˜ oes clivadas (ver 5-7). Buscaremos, aqui, motivar uma an´alise de sluicing (Merchant, 2001) para a possibilidade de omiss˜ao do verbo copular nas senten¸cas ´ importante notar que a elis˜ao da c´opula n˜ao ´e poss´ıvel em contextos de tempo apresentadas. E futuro, sendo apenas permitida no tempo n˜ao-futuro (NFUT)2 . (1)

byyty1 ( ø-na-aka-t ) t1 kinda’o-t mam˜ ao 3-DECL-COP-NFUT fruta-CONC.ABS. ‘O mam˜ ao ´e uma fruta’

(2)

taso1 ( ø-na-aka-t ) t1 i-se’a-t homem 3-DECL-COP-NFUT PART-bom/bonito-CONC.ABS. ‘O homem ´e bom/bonito’

(3)

taso1 ( ø-na-aka-t ) t1 i-kat-ø homem 3-DECL-COP-NFUT PART-dormir-CONC.ABS. ‘O homem est´ a dormindo’

(4)

taso1 * ( ø-na-aka-j ) t1 i-kat-ø homem 3-DECL-COP-FUT PART-dormir-CONC.ABS.

∗ Squib desenvolvido para a disciplina “T´ opicos de Teoria Sint´ atica” (LL218A) ministrada pela Profa . Dra . Ruth Elizabeth Vasconcellos Lopes (Unicamp) no 1o semestre de 2017 no Instituto de Estudos da Linguagem/Universidade Estadual de Campinas. † Atual mestrando do programa de p´ os-gradua¸ca ˜o em Lingu´ıstica da Universidade de S˜ ao Paulo. 1 Estamos, aqui, utilizando a express˜ ao “constru¸co ˜es com c´ opula” para nos referir a quaisquer senten¸cas que contenham um verbo copular, independentemente da forma que ele assuma. J´ a a express˜ ao “constru¸co ˜es de c´ opula” ser´ a usada para se referir apenas a `s senten¸cas copulares do tipo (1) a (4), a serem caracterizadas na sequˆencia. 2 A l´ıngua Karitiana n˜ ao faz distin¸ca ˜o morfol´ ogica entre os tempos passado e presente (Cf. Storto 1999).

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‘O homem ir´ a dormir’ (5)

Jo˜ao ( ø-na-aka-t ) yn ti-i-hit-ø ta˜j-ty 3-DECL-COP-NFUT eu CFO-PART-dar-CONC.ABS. faca-OBL. ‘Foi para o Jo˜ ao que eu dei a faca’

(6)

˜jonso ti-i-amang˜a-t erery ( ø-na-aka-t ) keerep algod˜ ao 3-DECL-COP-NFUT antigamente mulher CFO-PART-plantar-CONC.ABS. ‘Era algod˜ ao que a mulher plantava antigamente’

(7)

˜jonso ti-i-ahoj-ø Manoel * ( ø-na-aka-j ) 3-DECL-COP-FUT mulher CFO-PART-rir-CONC.ABS. ‘Ser´a do Manoel que a mulher ir´a rir’

Segundo Storto (2010), de onde os dados acima foram retirados, as constru¸c˜oes de c´opula em Karitiana s˜ ao estruturas bioracionais em que o verbo copular aka seleciona uma small clause como complemento. Os complementos de natureza minioracional podem ter como n´ ucleo um predical nominal (ver 1), um predicado adjetival (ver 2), ou um predicado verbal (ver 3 e 4). Predicados n˜ ao-nominais requerem, obrigatoriamente, a prefixa¸c˜ao do nominalizador {i-}, glosado como “part´ıcipio” (PART) pela autora. As constru¸c˜oes clivadas (5-7), por sua vez, s˜ao estruturas bioracionais formadas pelo movimento de um argumento do interior da ora¸c˜ao subordinada para a posi¸c˜ ao pr´e-copular da ora¸c˜ao matriz. Nas clivadas, o movimento ´e evidenciado pela presen¸ca do prefixo {ti-}, um marcador de constru¸c˜ao de foco do objeto (CFO). Nas constru¸c˜ oes de c´ opula, o movimento ´e de mesma natureza. Storto (2010) argumenta que o elemento pr´e-copular encontra-se focalizado, tendo-se em vista que tais constru¸c˜oes s˜ ao utilizadas como respostas a perguntas-Qu. O fato de que a atribui¸c˜ao de caso em Karitiana n˜ ao 3 parece requerer movimento tamb´em favorece uma an´alise em que o elemento pr´e-verbal nas constru¸c˜oes com c´ opula ocupa uma posi¸c˜ao A-barra, e n˜ao uma posi¸c˜ao de caso como Spec,TP. Sendo assim, iremos assumir, junto ` a autora, que o elemento pr´e-copular nas senten¸cas de 1 a 7 acima ocupa uma posi¸c˜ ao de Foco, mais especificamente Spec,FocP4 , uma proje¸c˜ao de foco cujo n´ ucleo c-seleciona um TP como complemento.

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Sluicing

O termo sluicing refere-se a um tipo espec´ıfico de elipse em que o material omitido corresponde a um IP5 . Neste trabalho, iremos nos basear na proposta de Merchant (2001) no que se refere `as condi¸c˜ oes de licenciamento do sluicing, ou seja, as condi¸c˜oes estruturais e os tra¸cos das 3 Storto (1999) prop˜ oe uma an´ alise de atribui¸ca ˜o de caso para o Karitiana, uma l´ıngua ergativo-absolutiva, tendo como base o sistema de Bittner & Hale (1996a, 1996b apud Storto 1999), em que caso ergativo ´e atribu´ıdo in situ sob regˆencia de I e caso absolutivo ´e atribu´ıdo in situ sob regˆencia de C. 4 “Spec,CP is a position associated with focus semantics. The idea is that phrases must move to Spec,CP to be syntactically focused (wh-movement, focus, etc.). In these cases the relationship between C and its specifier is clear: a focus feature in C attracts the focused phrase to its specifier.”(Storto, 1999: 150). 5 Aqui, usaremos os r´ otulos IP e TP intercambiavelmente.

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categoriais envolvidas em tal fenˆ omeno (Merchant, 2001: 02). Segundo o autor, o sluicing ´e a elis˜ ao do IP sob as condi¸c˜oes apresentadas em (8)6 , em que a ausˆencia de pron´ uncia da parte sentencial de um CP interrogativo ´e permitida. O fenˆomeno decorre de dois mecanismos, a saber, o movimento de um elemento-Qu do s´ıtio da elis˜ao para Spec,CP, seguido de um apagamento em PF (Phonological Form) instru´ıdo pelo tra¸co E presente no n´ ucleo C7 .

(8) [CP XP[+wh] [C’ C[+Q] IP]]

A proposta de Merchant (2001) tem como alvo dados em que elementos-Qu s˜ao os itens remanescentes do sluicing, como em (9)8 . Sendo assim, o tratamento que o autor d´a a este fenˆomeno parte n˜ ao s´ o da ideia de que h´a estrutura no s´ıtio da elipse, mas tamb´em de que tal estrutura est´ a ativa na Sintaxe, visto que o movimento-Qu tem no IP elidido a sua posi¸c˜ao de ´ origem. E uma opera¸c˜ ao em PF, instru´ıda pelo tra¸co E comentado acima, a respons´avel pela ausˆencia da contraparte sonora da estrutura.

(9)

a. Jack bought something, but I don’t know what. b. Someone called, but I can’t tell you who. c. Beth was there, but you’ll never guess who else.

No entanto, os elementos-Qu n˜ ao s˜ao os u ´nicos itens capazes de “sobreviver” ao sluicing. 9 Fragmentos de respostas (ver 10-12) , conforme apontado por Merchant (2004), tamb´em o s˜ao. Segundo o autor, os DPs nos exemplos em (b) abaixo n˜ao seriam instˆancias da mera proje¸c˜ ao de um elemento nominal ([DP John]), mas sim a instˆancia de um elemento originado em uma senten¸ca ([CP (she saw) [DP John]]), e movido para a sua periferia esquerda, a qual o autor nomeia FP, uma proje¸c˜ ao de foco. Uma vez movido, o tra¸co E em F seria capaz de ativar o apagamento do material restante em TP (“she saw”). Desta forma, n˜ao apenas os tra¸cos [+wh, +Q] seriam capazes de checar E – tra¸cos de foco ([+focus]) tamb´em o seriam.

(10)

a. Who did she see? b. John. c. She saw John.

(11)

a. What’s that?

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Cf. Merchant, 2001: 03. O n´ odulo I cont´em um tra¸co E que s´ o pode ser checado por um n´ ucleo C com tra¸cos [+wh, +Q]. Sendo assim, E move-se de I para C a fim de ser checado. Em C, E instrui PF de que o seu complemento n˜ ao precisar´ a ser fonologicamente realizado (Cf. Merchant, 2001: 60). 8 Dados de Merchant, 2001: 03. 9 Dados de Merchant, 2004: 673. 7

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b. A dish. c. It’s a dish.

(12)

a. What’s left for me to eat? b. Some turkey. c. There’s some turkey.

Conforme anunciamos na Introdu¸c˜ao, buscaremos propor uma an´alise de sluicing para a elipse de c´opula evidenciada nos dados da l´ıngua Karitiana. Se a omiss˜ao de c´opula aqui investigada ´e, de fato, uma instˆ ancia do fenˆomeno estudado por Merchant (2001, 2004), nada al´em do verbo copular poder´ a estar presente no s´ıtio da elis˜ao. Na pr´oxima se¸c˜ao, traremos algumas evidˆencias de que o material situado `a direita da c´opula, assim como o elemento pr´ecopular, n˜ao est´ a em TP.

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Em favor de uma c´ opula isolada em TP

3.1

O caso do Portuguˆ es Brasileiro

O que ser´ a desenvolvido aqui teve como influˆencia a an´alise de Barros (2010) para a elipse da c´opula no Portuguˆes Brasileiro (PB) em senten¸cas de perguntas-Qu especificacionais como (13)10 . O autor prop˜ oe que a omiss˜ ao da c´opula neste contexto decorre de sluicing, tendo em vista que a estrutura na qual o verbo copular se encontra equipara-se `aquela em (8). Como ´e poss´ıvel notar, a posi¸c˜ ao que o DP interrogativo ocupa em (13) decorre de movimento-Qu. Barros (2010) argumenta que o DP p´ os-verbal, por sua vez, ´e o sujeito sentencial deslocado ` a direita (uma instˆ ancia de rightward movement).

(13) [CP [DP Qual1 ] [C [TP t1 ´e t2 ]] [DP o seu tipo de sorvete favorito]2 ]?

Uma senten¸ca especificacional declarativa ´e uma constru¸c˜ao de c´opula em que o verbo copular se encontra flanqueado por dois DPs (“DP ´e DP”), sendo o primeiro um DP predicativo e o segundo um DP referencial, como em The teacher of this class is Bill 11 . O autor argumenta que em perguntas especificacionais como (13) o sujeito ´e o DP2 . Baseando-se em Mikkelsen’s (2004 apud Barros (2010)), o autor mostra que DPs predicativos com semˆantica de t´opico em constru¸c˜oes de c´ opula flanqueada s˜ ao os sujeitos da senten¸ca. Caso o DP predicativo n˜ao esteja saliente no discurso, o DP referencial ser´a preferencialmente o sujeito, derivando-se, assim, uma senten¸ca predicacional (ver nota 11). Para evidenciar a rela¸c˜ao entre semˆantica de t´opico e posi¸c˜ao de sujeito, o autor traz o exemplo em (14)12 . 10

Em Barros (2010), trata-se do dado em (5). Na situa¸c˜ ao inversa em que o primeiro DP ´e referencial e o segundo DP ´e predicativo, temos um outro tipo de senten¸ca, a que o autor denomina “senten¸ca predicacional”, como Bill is the teacher of this class. Vale ressaltar que o autor est´ a fazendo referˆencia ` a taxonomia de Higgins’ (1973 apud Barros (2010)). 12 Dado (10) em Barros (2010). 11

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(14)

A: Who is the teacher of this class? B: The teacher of this class is Bill. #Bill is the teacher of this class.

Sendo o sujeito da senten¸ca especificacional, o DP predicativo pode ter o seu posicionamento p´os-verbal em interrogativas explicado em termos de um deslocamento `a direita, uma adjun¸c˜ao, tendo-se em vista que esta n˜ ao ´e a posi¸c˜ao canˆonica para o sujeito no PB, uma l´ıngua SVO.

3.2

O caso do Karitiana

Conforme vimos na Introdu¸c˜ ao, o elemento pr´e-verbal nas constru¸c˜oes com c´opula do Karitiana est´a em Spec,FocP, fora, portanto, do s´ıtio da elis˜ao (TP). Vimos, ainda, que tra¸cos de foco, e n˜ao somente tra¸cos-Qu ([+wh,+Q]), s˜ao capazes de licenciar elipse de TP, tendo-se em vista os dados de fragmentos de respostas analisados por Merchant (2004) como instˆancias de sluicing. Assim sendo, para que o fenˆ omeno de copula drop no Karitiana possa ser apreendido em uma an´ alise de sluicing, o verbo copular deve ser o u ´nico elemento presente em TP no momento da elis˜ ao. Nesta subse¸c˜ ao, traremos uma evidˆencia independente de que este ´e o caso. Storto (2010) glosa o sufixo {-t/-ø} presente nos dados (1-7) como concordˆancia absolutiva (CONC.ABS.), argumentando que este morfema est´a presente sempre que um argumento absolutivo ´e extra´ıdo. Rocha (2016), por sua vez, reanalisa tal sufixo como um adverbializador, tendo-se em vista o paralelo por ele observado entre as constru¸c˜oes com c´opula e as constru¸c˜oes adverbiais do Karitiana. Segundo o autor, ora¸c˜oes adverbiais s˜ao obrigatoriamente marcadas por -t/-ø, como ´e poss´ıvel ver em (15). O sufixo em quest˜ao tamb´em participa da forma¸c˜ao dos adv´erbios na l´ıngua, como kandat (‘muito’) e pitat (‘muito’)13 . ˜jonso amang˜ (15) [ gok a tyka ]-*(t) ø-na-oky-t him [ macaxeira mulher plantar IMPF.movimento ]-ADVZR 3-DECL-matar-NFUT ca¸ca taso homem ‘Enquanto a mulher estava plantando macaxeira, o homem matou a ca¸ca’

A rean´alise de Rocha (2016) n˜ ao coloca em xeque apenas o estatuto do sufixo {-t/-ø}, mas a pr´opria an´alise de Storto (2010) a respeito da deriva¸c˜ao das constru¸c˜oes de c´opula. Isto porque seria bastante complicado manter o estatuto de complemento para a small clause, visto que ela seria, agora, um elemento adverbial, e n˜ao mais argumental. Talvez seja, inclusive, complicado dizer que h´a uma small clause adverbializada presente em tais constru¸c˜oes, na medida em que um movimento extrairia um elemento do interior de um adjunto para a posi¸c˜ao pr´e-copular. N˜ao entraremos, aqui, nesta discuss˜ ao. Iremos, contudo, assumir que o predicado (elemento p´os-copular) n˜ ao forma um constituinte minioracional com o elemento pr´e-copular, a fim de que poss´ıveis problemas de extra¸c˜ ao sejam evitados. O u ´nico elemento selecionado pela c´opula seria o argumento focalizado, portanto. Assumiremos, tamb´em, que o sufixo glosado como 13

Dados de adv´erbios Karitiana est˜ ao presentes na tese de Sanchez-Mendes (2014, apud Rocha (2016)).

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“concordˆancia absolutiva” em (1-7) seja, na verdade, uma marca adverbial. Permanece um mist´erio, contudo, de que forma a Sintaxe capturaria a rela¸c˜ao de predica¸c˜ao estabelecida entre os elementos presentes nas constru¸c˜ oes de c´opula. Se o elemento p´ os-verbal nas constru¸c˜oes com c´opula (1-7) – seja o DP em (1-4)14 , seja a ora¸c˜ao em (5-7) – ´e adverbial, ele pode ser considerado uma adjun¸c˜ao a FocP, o que o elimina do s´ıtio do sluicing. Ter´ıamos, assim, uma elipse de TP nas constru¸c˜oes com c´opula do Karitiana, cujo efeito aparente de copula drop decorre do fato de os itens remanescentes da opera¸c˜ao de apagamento flanquearem o verbo copular.

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Quest˜ oes remanescentes I Condi¸c˜ oes de Identidade

A elipse de c´ opula em Karitiana, tal como vista neste squib, seria uma instˆancia do chamado “sluicing sem antecedente” (antecedentless sluicing), em que a identifica¸c˜ao (recuperabilidade semˆantica) do material omitido n˜ ao se daria pela presen¸ca de um antecedente tal como ´e necess´ario para a identifica¸c˜ ao do sluicing em casos como (9), para os quais Merchant (2001) prop˜ oe 15 a condi¸c˜ao semˆ antica de e-GIVENness , em que apenas IPs que atendam a tal condi¸c˜ao poderiam ser elididos. De acordo com Barros (2010), o sluicing sem antecedente ´e poss´ıvel quando o material elidido ´e discursivamente recuper´avel. No caso das perguntas especificacionais do PB, os itens remanescentes, segundo o autor, tˆem de estar D-ligados (D-linked ), ou seja, ligados a um contexto que os identifique como pertencentes a um conjunto saliente no discurso. Em uma pergunta como Qual (´e) o seu cachorro?, por exemplo, deve haver um conjunto de cachorros saliente no discurso a partir do qual o DP possa estabelecer a sua referˆencia. Haveria alguma propriedade semelhante presente nos dados de constru¸c˜oes com c´opula do Karitiana? O fato de haver uma restri¸c˜ ao temporal `a elipse de c´opula em Karitiana estaria associado a alguma quest˜ ao referente ` a sua identifica¸c˜ao? Por que o tempo n˜ao marcado da l´ıngua (n˜ao´ interessante notar que futuro) pode ocorrer sob sluicing, ao passo em que o tempo futuro n˜ao? E no PB a elipse de c´ opula parece tamb´em ser poss´ıvel apenas no tempo n˜ao marcado (presente), tendo-se em vista a dificuldade de se recuperar uma c´opula com tra¸cos de passado ou de futuro em contextos out-of-the-blue. Uma senten¸ca como Qual o seu tipo de sorvete favorito? provavavelmente n˜ ao seria interpretada como sinˆonima de Qual foi/era/ser´ a o seu tipo de sorvete favorito?, mas sim como sinˆ onima de Qual ´ e o seu tipo de sorvete de favorito?. Parece-nos, portanto, que h´ a mais por ser investigado no que se refere `a intera¸c˜ao entre tempo e as condi¸c˜oes de licenciamento e de identidade do sluicing. 14

Iremos, aqui, considerar que nas constru¸co ˜es de c´ opula o verbo em Karitiana, tal como a c´ opula em senten¸cas especificacionais do PB, ´e flanqueado por dois elementos de natureza nominal, estando numa estrutura do tipo “DP c´ opula DP”. A evidˆencia para esta assun¸ca ˜o est´ a na obrigatoriedade de nominaliza¸ca ˜o dos predicados adjetivais e verbais conforme vimos em (2-4) via prefixo participial. Tal prefixo ´e considerado um nominalizador por n˜ ao poder co-ocorrer com o nominalizador {-pa} em Karitiana (Cf. Storto 2010). 15 Em termos muito gerais, tal condi¸c˜ ao identifica o material elidido com um antecedente lingu´ıstico que implique uma pressuposi¸c˜ ao da quest˜ ao sob sluicing. Lembrar que em Merchant (2001) sluicing ´e um fenˆ omeno pr´ oprio de CPs interrogativos.

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II O fenˆomeno V-2 em Karitiana De acordo com Storto (1999), o Karitiana pode ser caracterizado como uma l´ıngua V-2. O fenˆomeno V-2 ´e tipicamente associado a l´ınguas germˆanicas, nas quais ´e poss´ıvel notar que o verbo finito sempre ocupa a segunda posi¸c˜ao estrutural da ora¸c˜ao. Uma outra caracter´ıstica de l´ınguas V-2 ´e a presen¸ca obrigat´ oria de um constituinte na posi¸c˜ao inicial, ou seja, no especificador da projec˜ ao para a qual o verbo se move. A autora adota a an´alise de Den Besten (1977 apud Storto (1999)), em que a segunda posi¸c˜ao ´e C e a primeira posi¸c˜ao ´e Spec,CP. Sendo assim, o verbo em Karitiana move-se de T para em C em ora¸c˜oes matriz. Evidentemente, temos, agora, um problema associado ` a an´ alise aqui desenvolvida. Se a elipse de c´opula em Karitiana ´e uma instˆancia do fenˆ omeno de sluicing, por qual motivo a c´opula, que estaria em C conforme o exposto acima, poderia ser elidida em TP? Merchant (2001), ao tratar das condi¸c˜oes de licenciamento da elipse de IP, lida com dados de l´ınguas que apresentam o fenˆ omeno V-2, em que o verbo auxiliar, mesmo aparecendo em C na vers˜ao n˜ao elidida da estrutura (ver 16)16 , n˜ao ´e um item remanescente do sluicing, como ´e poss´ıvel perceber em (17)17 .

(16) [CP who2 [C’ C [I has] IP [Max thas (17)

[VP invited t2 ]] ]]?

A: Max has invited someone. B: Really? Who (*has)?

A solu¸c˜ao encontrada pelo autor ´e dizer que h´a uma ordem de aplica¸c˜ao entre as opera¸c˜oes de movimento de n´ ucleo e de apagamento em casos de sluicing. O apagamento do material em IP precederia o movimento de n´ ucleo evidenciado em (15). Uma consequˆencia desta proposta ´e a assun¸c˜ao de que o movimento de I para C t´ıpico das l´ınguas V-2 ocorreria em PF. Tal movimento ´e comumente entendido na literatura18 como decorrˆencia da necessidade de um tra¸co forte em C de ser checado por um tra¸co correspondente em I. Quando um tra¸co forte ´e checado, PF requer um movimento aberto em que todos os tra¸cos presentes em I sejam movidos para C19 . Em casos de sluicing, Merchant (2001) sugere que nem todos os tra¸cos presentes em I seriam movidos para C em l´ınguas V-2. Sendo assim, o movimento dos tra¸cos daria-se na Sintaxe coberta, o que justificaria a ausˆencia da contraparte sonora de C. Outra possibilidade, tal como apontado pelo autor, seria dizer que ´e um tra¸co forte em I (e n˜ao em C) que desencadeia movimento aberto de I para C, um n´ odulo capaz de chec´a-lo. Em casos de sluicing, por´em, tal tra¸co ´e apagado antes de ser movido, n˜ao chegando em PF, evitando, assim, a deriva¸c˜ao de uma senten¸ca mal formada. Entretanto, conforme aponta Merchant (2001), ´e ainda necess´ario 16

Estrutura (73) em Merchant (2001: 63). Item (74a) em Merchant (2001). O autor ainda traz as vers˜ oes alem˜ a, holandesa e dinamarquesa deste dado (Cf. p.63). 18 Cf. Holmberg and Platzack (1995) apud Merchant (2001). 19 “PF requirements force ‘pied-piping’ when a strong feature is checked.” (Merchant, 2001: 73). 17

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investigar melhor qual a motiva¸c˜ ao para a ordena¸c˜ao proposta para as opera¸c˜oes de apagamento e de movimento de n´ ucleo. Acreditamos que elucidar tal motiva¸c˜ao ´e importante para que possamos entender melhor a sintaxe do tra¸co E, visto que, pela proposta do autor, o movimento de tal tra¸co de I para C teria de ocorrer antes da checagem de tra¸cos fortes (ver nota 7).

III Adjun¸c˜ ao sob sluicing Por fim, uma considera¸c˜ ao sobre a proposta de que o elemento p´os-copular em Karitiana estaria adjungido a FocP. Tal assun¸c˜ ao ´e necess´aria tendo-se em vista que, se o elemento adverbializado estiver adjungido a TP, teremos um problema, visto que ele seria c-comandado ´ necess´ario, por Foc, e estaria, portanto, no s´ıtio do sluicing, justamente o que n˜ao queremos. E contudo, maiores evidˆencias de que o elemento adverbial esteja adjungido a proje¸c˜oes mais altas do que TP. Estando fora do dom´ınio de TP, a an´alise de sluicing para a elipse de c´opula do Karitiana estaria salva. No entanto, se a adjun¸c˜ao a TP for a mais prov´avel, deveremos estipular algum mecanismo que torne o tra¸co E checado em Foc insens´ıvel a estruturas n˜ao inclusas na proje¸c˜ao a ser elidida, a saber, o complemento de Foc (ou C). Vale ressaltar que uma estrutura adjunta a TP estaria contida, por´em n˜ao inclu´ıda, em TP.

Referˆ encias Barros, M. Sluicing and the Brazilian Portuguese Null Copula. In Rutgers working papers in Linguistics, ed. Peter Starovevov, Daniel Altshuler, Aaron Braver, Carlos Fasola, and Sarah Murray. Volume 3, 64-91, Linguistics Graduate Student Association: New Jersey. 2010. Merchant, J. The Syntax of Silence: Sluicing, Islands and The Theory of Ellipsis. Oxford University Press: Oxford. 2001. Merchant, J. Fragments and Ellipsis. Linguistics and Philosophy 27, 6:661-738. 2004. Rocha, I. N˜ ao-finitude em Karitiana: subordina¸c˜ ao versus nominaliza¸c˜ ao. Tese de doutorado. S˜ao Paulo: USP. 2016. Storto, L. Aspects of a Karitiana Grammar. Ph.D. Dissertation. Cambridge: Massachussetts Institute of Technology. 1999. Storto, L. Copular constructions in Karitiana: a case against Case Movement.. In University of Massachussetts Occasional Papers 41. Amherst: GLSA/The University of Massachussets. 205-226. 2010.

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