COSME, Susana Rodrigues (2014) - \"A necrópole de incineração romana da Herdade do Vale 6, freguesia e concelho de Cuba”

June 9, 2017 | Autor: Susana Cosme | Categoria: Alentejo, Roman Archaeology
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Descrição do Produto

4.º COLÓQUIO DE ARQUEOLOGIA DO ALQUEVA O Plano de Rega (2002-2010)

MEMÓRIAS d’ODIANA 2.ª Série Estudos Arqueológicos do Alqueva

FICHA TÉCNICA MEMÓRIAS d’ODIANA - 2.ª Série TÍTULO

4.º COLÓQUIO DE ARQUEOLOGIA DO ALQUEVA O Plano de Rega (2002 – 2010) EDIÇÃO

EDIA - Empresa de desenvolvimento e infra-estruturas do Alqueva DRCALEN - Direcção Regional de Cultura do Alentejo COORDENAÇÃO EDITORIAL

António Carlos Silva Frederico Tátá Regala Miguel Martinho DESIGN GRÁFICO

Luisa Castelo dos Reis / VMCdesign PRODUÇÃO GRÁFICA, IMPRESSÃO E ACABAMENTO

VMCdesign / Ligação Visual TIRAGEM

500 exemplares ISBN

978-989-98805-7-3 DEPÓSITO LEGAL

356 090/13

Memórias d’Odiana • 2ª série

FINANCIAMENTO

EDIA - Empresa de desenvolvimento e infra-estruturas do Alqueva INALENTEJO QREN - Quadro de Referência Estratégico Nacional FEDER - Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional Évora, 2014

ÍNDICE 9

INTRODUÇÃO

11

PROGRAMA

15

LISTAGEM DOS PÓSTERES APRESENTADOS

17

CONFERÊNCIAS

19

“Alqueva – Quatro Encontros de Arqueologia depois...”. António Carlos Silva

34

“O património cultural no Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva: caracterizar, avaliar, minimizar, valorizar …”. Miguel Martinho

45

“O Acompanhamento no terreno do Projecto EFMA na área da Extensão de Castro Verde do IGESPAR”. Samuel Melro, Manuela de Deus

53

COMUNICAÇÕES

55

“Um mundo em negativo: fossos, fossas e hipogeus entre o Neolítico Final e a Idade do Bronze na margem esquerda do Guadiana (Brinches, Serpa)”. António Carlos Valera, Ricardo Godinho, Ever Calvo, F. Javier Moro Berraquero, Victor Filipe e Helena Santos

74

“Intervenção arqueológica em Porto Torrão, Ferreira do Alentejo (2008-2010): resultados preliminares e programa de estudos”. Raquel Santos, Paulo Rebelo, Nuno Neto, Ana Vieira, João Rebuje, Filipa Rodrigues, António Faustino Carvalho

83

“Contextos funerários na periferia do Porto Torrão: Cardim 6 e Carrascal 2”. António Carlos Valera, Helena Santos, Margarida Figueiredo e Raquel Granja

96

“Intervenção Arqueológica no sítio de Alto de Brinches 3 (Reservatório Serpa – Norte): Resultados Preliminares”. Catarina Alves, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra

103

“Caracterização preliminar da ocupação pré-histórica da Torre Velha 3 (Barragem da Laje, Serpa)”. Catarina Alves, Catarina Costeira, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra, António M. Monge Soares, Marta Moreno-Garcia

112

“Questões e problemas suscitados pela intervenção no Casarão da Mesquita 4 (S. Manços, Évora): da análise intra-sítio à integração e comparação regional”. Susana Nunes, Miguel Almeida, Maria Teresa Ferreira, Lília Basílio

119

“Um habitat em fossas da Idade do Ferro em Casa Branca 11, na freguesia de Santa Maria, concelho de Serpa”. Susana Rodrigues Cosme

125

“Poço da Gontinha 1 (Ferreira do Alentejo): resultados preliminares”. Margarida Figueiredo

132

“Currais 5 (S. Manços, Évora): diacronia e diversidade no registo arqueoestratigráfico”. Susana Nunes,; Mónica Corga, Miguel Almeida, Lília Basílio ÍNDICE

Memórias d’Odiana • 2ª série

5

Memórias d’Odiana • 2ª série

6

137

“A villa romana do Monte da Salsa (Brinches, Serpa): uma aproximação à sua sequência ocupacional”. Javier Larrazabal Galarza

145

“Dados para a compreensão da diacronia e diversidade do registo arqueológico na villa romana de Santa Maria”. Mónica Corga, Maria João Neves, Gina Dias, Catarina Mendes

155

“A pars rústica da villa da Insuínha 2, freguesia de Pedrógão, concelho da Vidigueira”. Susana Rodrigues Cosme

162

“A villa da Herdade dos Alfares (São Matias, Beja) no contexto do povoamento romano rural do interior Alentejano”. Mónica Corga, Miguel Almeida, Gina Dias, Catarina Mendes

171

“A necrópole de incineração romana da Herdade do Vale 6, freguesia e concelho de Cuba”. Susana Rodrigues Cosme

178

“Necrópole romana do Monte do Outeiro (Cuba)”. Helena Barranhão

185

“O conjunto sepulcral do Monte da Loja (Serpa, Beja)”. Sónia Cravo e Marina Lourenço

191

“O sítio de São Faraústo na transição da Época Romana para o Período Alto-Medieval, freguesia de Oriola, concelho de Portel”. Susana Rodrigues Cosme

197

“O sítio romano da Torre Velha 1. Trabalhos de 2008-09 (Barragem da Laje, Serpa)”. Adriaan De Man, Eduardo Porfírio, Miguel Serra

203

“Análise preliminar dos contextos da Antiguidade Tardia do sitio Torre Velha 3 (Barragem da Laje - Serpa)”. Catarina Alves, Catarina Costeira, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra

212

“A Necrópole de São Matias, freguesia de São Matias, concelho de Beja”. Susana Rodrigues Cosme

219

“Xancra II (Cuba, Beja): resultados preliminares da necrópole islâmica”. Sandra Brazuna, Ricardo Godinho

225

“Funchais 6 (Beringel, Beja) – resultados preliminares”. Manuela Dias Coelho, Sandra Brazuna

231

PÓSTERES

233

“Primeiros resultados da intervenção arqueológica no sítio Torre Velha 7 (Barragem da Laje - Serpa)”. Adriaan De Man, André Gregório, Eduardo Porfírio, Miguel Serra

237

“A Torre Velha 3 (Serpa) no espaço geográfico. Uma abordagem morfológica de um “sítio” arqueológico”. Miguel Costa, Eduardo Porfírio, Miguel Serra

242

“O contributo da Antropologia para o conhecimento das práticas funerárias pré e proto -históricas do sítio de Monte da Cabida 3 (São Manços, Évora)”. Maria Teresa Ferreira

246

“Villa Romana da Mesquita do Morgado (S. Manços, Évora): considerações acerca das práticas funerárias”. Maria Teresa Ferreira

ÍNDICE

“Monte da Palheta (Cuba, Beja): dados para a caracterização arqueológica e integração do sítio à escala regional”. Mónica Corga, Gina Dias

256

“Aldeia do Grilo (Serpa): contributos para o estudo do povoamento romano na margem esquerda do Guadiana”. Carlos Ferreira, Mónica Corga, Gina Dias, Catarina Mendes

261

“Resultados preliminares de uma intervenção realizada no sítio Parreirinha 4 (Serpa)”. Carlos Ferreira, Susana Nunes, Lília Basílio

267

“Depósitos cinerários em Alpendres de Lagares 3”. Maria Teresa Ferreira, Mónica Corga, Marta Furtado

271

“Workshop Dryas’09: Estruturas negativas da Pré e Proto-história peninsulares – estado actual dos nossos conhecimentos... e interrogações”. Miguel Almeida, Susana Nunes, Maria João Neves, Maria Teresa Ferreira

276

“Intervenção arqueológica na Horta dos Quarteirões 1, Brinches, Serpa”. Helena Santos

280

“A Intervenção Arqueológica no Monte das Covas 3 (S. Matias, Beja): Os contextos romanos de época republicana”. Lúcia Miguel

284

“O Sítio do Neolítico antigo da Malhada da Orada 2 (Serpa): resultados preliminares”. Ângela Guilherme Ferreira

289

“Intervenção arqueológica nas necrópoles do Monte da Pecena 1 e Cabida da Raposa 2”. Andrea Martins, Gonçalo Lopes, Marisa Cardoso

7

ÍNDICE

Memórias d’Odiana • 2ª série

250

“A NECRÓPOLE DE INCINERAÇÃO ROMANA DA HERDADE DO VALE 6, FREGUESIA E CONCELHO DE CUBA”. SUSANA RODRIGUES COSME91 Resumo Localizado na Herdade do Vale, na freguesia e concelho de Cuba, distrito de Beja, o sítio da Herdade do Vale 6 veio a caracterizar-se como uma necrópole de incineração de finais do séc. I e inícios do séc. II d.C., com 54 interfaces de sepulturas em covachos ou covas onde as cinzas são colocadas no fundo da cova aberta no solo natural e as oferendas funerárias são colocadas sobre as cinzas, no centro da cova. Tratam-se essencialmente de sepulturas de incineração secundária, classificámos duas sepulturas como primárias devido à terra rubfactada que circunda estas sepulturas.

Abstrat Located in the Herdade do Vale, Cuba, Beja, the site of Herdade do Vale 6 came to characterize itself as a necropolis of incineration of ends of séc. I and beginnings of séc. II d.C., with 54 interfaces of sepulchres in hollows where the leached ashes are placed in deep of the hollow opened in the ground natural and funerary offerings is placed on leached ashes, in the center of the hollow. They are essentially about sepulchres of secondary incineration; we classified two sepulchres as primary due to burning soil land that surrounds these sepulchres.

1. Introdução No âmbito da empreitada de execução do Aproveitamento Hidroagrícola de Alvito/Pisão no Sub-Bloco Cuba Oeste e na sequência dos trabalhos de beneficiação do Caminho 7 do Bloco de Faro foram identificadas, em acompanhamento, manchas de terra negra com algumas peças de cerâmica comum de época romana e material de construção da mesma época. Os trabalhos de beneficiação do caminho foram interrompidos numa faixa de 25m de comprimento, com o objectivo de minimizar impactes, caracterizar a estação arqueológica quanto à sua funcionalidade e cronologia e compreender a estratigrafia do sítio, realizando todos os registos possíveis para o melhor estudo da estação que naquele troço ia ser destruída. Foi nessa faixa de 25m que se realizaram os trabalhos arqueológicos, adjudicados à empresa de arqueologia Archeo’Estudos, Lda, com início a 16 de Fevereiro de 2009 e conclusão a 6 de Março de 2009, tendo sido realizados 17 dias de trabalho efectivo.

2. Descrição do Local

91

Arqueóloga, direcção de intervenção arqueológica para a empresa Archeo’Estudos, Lda. e investigadora do CITCEM. [email protected]

COMUNICAÇÕES

171

Memórias d’Odiana • 2ª série

Localizado na planície alentejana, em terrenos de agricultura cerealífera de sequeiro, o terreno onde se situa a estação arqueológica caracteriza-se por um solo argiloso de cor castanha a castanha avermelhada, com alguns barros siltosos, sem grandes linhas de água proximidades, apenas o Barranco da Bica, uma pequena linha de água lhe passa a Nordeste. Localizado na Herdade do Vale, na freguesia e concelho de Cuba, distrito de Beja. O sítio arqueológico encontra-se localizado na Carta Militar de Portugal, n.º 510 dos Serviços Cartográficos do Exército. As sondagens foram implantadas entre as coordenadas M 221667.352 P -130824.968 e M 221683.912 P -130804.973, com uma altitude média de 153m.

3. Intervenção Arqueológica

Beja.

Foi marcada a sondagem 1 na zona a afectar pelo beneficiamento do Caminho 7, com 7m por 25m. A implantação topográfica esteve a cargo da empresa de topografia, Gabinete de Engenharia Topográfica, de

Os elementos osteológicos e cerâmicos com possíveis restos osteológicos foram levantados e ficaram a cargo da antropóloga Margarida Figueiredo, para estudo, no Laboratório de Antropologia da Universidade de Coimbra. Devido ao facto da sondagem se encontrar inundada, pelas águas da chuva das semanas anteriores, decidiu-se iniciar a intervenção arqueológica pela zona central da sondagem que se encontrava mais seca. Após estes trabalhos, podemos afirmar estar perante uma necrópole de incineração de finais do séc. I e inícios do séc. II d.C., com 54 interfaces de sepulturas (correspondendo a 53 covachos, visto que a sepultura 16.1 e a sepultura 46 são a mesma), mais duas: uma não intervencionada pois ficava no corte Norte e outra que se tratava apenas de um pote, possível urna. A datação é reforçada pela presença de vidros, lucernas e numismas que corroboram esta datação. Tratam-se essencialmente de sepulturas de incineração secundárias (32), classificámos duas sepulturas como primárias devido à terra rubfactada que circunda estas sepulturas, como é o caso da Sepultura 1.2 (Fig. 1). Quanto aos covachos sem espólio arqueológico, poderão tratar-se de depósitos de cinzas resultantes da limpeza de ustrinum ou então serem resultado de sepulturas violadas. De salientar a sepultura 8, que sobre uma cobertura de material de construção apresenta uma grande quantidade de espólio votivo muito fragmentado, combinado com material osteológico e carvões, numa tipologia oblonga. Nas incinerações primárias encontram-se por vezes, vestígios de objectos fragmentados, essencialmente pedaços de cerâmica e fragmentos de vidro, o que se verifica em algumas das sepulturas desta necrópole. Tratam-se dos vestígios dos objectos colocados na pira funerária e que se quebram durante todo o processo de cremação do corpo do defunto. Na maior parte das vezes não se consegue saber se a fragmentação das peças se deve à acção das práticas funerárias ou à violação das sepulturas. Quanto à forma predominam as sepulturas, ovaladas (22) secundadas pelas oblongas (16), em menor número surgem as formas sub-rectangular (7), circular (4) e indefinida (6). Algumas encontram-se estruturadas com tegulae fragmentadas como é o caso da sepultura 22 (Fig. 2), poucas são as que apresentam tampa, a maioria trata-se apenas de um covacho aberto no solo, algumas são assinaladas com algum material de construção cerâmico e em dois casos considerámos que tinham tampa, o caso das sepulturas 9 e 19. A presença de material osteológico dentro das sepulturas está relacionado com a presença de espólio arqueológico, em poucos casos surgem dissociados, quando tal acontece surge apenas espólio funerário sem material osteológico, em 34 sepulturas surge espólio funerário, na maioria dos casos apresenta-se muito fragmentado o que na opinião de João Abreu91 sugere sepulturas secundárias.

Memórias d’Odiana • 2ª série

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91

ABREU: 2002.

COMUNICAÇÕES

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A localização do espólio difere de sepultura para sepultura, em alguns casos encontra-se centrado, junto a uma das paredes da sepultura como é o caso da Sepultura 34.2 (Fig. 3) ou centrado na sepultura junto à cabeceira como é o caso da Sepultura 4 (Fig. 4). Neste tipo de sepulturas a orientação é difícil de aferir já que não estamos na presença de restos osteológicos completos, assim, optámos por tirar a orientação da parte mais larga da sepultura para a parte mais estreita. Estamos, pois, perante 38 sepulturas com orientação Sul/Norte, 6 com orientação Este/Oeste, 4 com orientação Norte/Sul, 4 com orientação Oeste/Este e 1 com orientação Sudoeste/Nordeste. Estas sepulturas apresentam como medidas médias, cerca de 1m de comprimento por 30cm de largura e cerca de 30cm de altura. A necrópole estende-se para Norte e para Sul da sondagem, para Este e para Oeste não podemos confirmar pois para estas direcções os trabalhos de beneficiação do caminho 7, já tinham avançado até aos limites da intervenção. Sabemos que para Este foram destruídas algumas, antes da máquina parar com o acompanhamento arqueológico, mas para Oeste não temos qualquer informação a não ser que as sepulturas chegam quase ao corte Oeste.

4. O espólio funerário O espólio exumado nesta intervenção baseia-se essencialmente em espólio votivo e dentro dele, destaca-se a cerâmica comum por se apresentar em maior número. Foram exumados 13 potes mais 1541 fragmentos de peças em cerâmica comum, mais alguns muito pequenos não contabilizados. As peças mais representadas são as taças, os potes, as panelas e as jarras (Fig. 5 e Fig, 7). Apesar de surgirem algumas formas inteiras, estas apresentam-se muito fragmentadas, carecendo de um trabalho de colagem. De salientar que algumas formas não apresentam fundo sendo difícil a sua estabilidade. Apresentamos as imagens de algumas peças das quais destacamos uma taça que imita uma forma de taça em sigillata (Herm.23 datável entre 70 e 120 d.C. – (Fig. 6)). Foram ainda exumados 30 fragmentos de dolium, 107 fragmentos de sigillata. Estas encontram-se em reduzido número muito fragmentadas, sem decorações e sem engobe, trata-se de material de fraca qualidade, talvez de produção local.

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COMUNICAÇÕES

Memórias d’Odiana • 2ª série

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Foram também exumada 6 lucernas, duas delas com decoração com motivos eróticos (Fig. 8) e uma com motivos teatrais e a inscrição [GABINI(A)] com cronologia de 25 a 100 d.C. (Fig. 9). Estas peças estão relacionadas com a luz necessária para iluminar as trevas. Foram exumados 11 fragmentos de cerâmica cinzenta fina, não sendo possível reconstituir a forma destas peças. De paredes finas foram exumados 43 fragmentos. Destaca-

mos um pote decorado com puncionamentos no colo e pança. Quanto à cerâmica de construção ficou, na sua maioria, no campo. Tratava-se essencialmente de tegula e tijolos, foram exumados 10 baldes e 681 fragmentos. Dentro do espólio votivo exumado, grande parte é em vidro, foram contabilizados em gabinete 1107 fragmentos de peças em vidro. As peças surgem muito fragmentadas e no campo nem sempre nos é possível ver a sua forma, tal é o estado de fragmentação. Pode pôr-se a hipótese de estarmos em presença de sepulturas de incineração secundária pela fragmentação das peças em vidro e por não termos muitas peças inteiras. Das formas completas, apenas uma jarra na sepultura 8; uma jarra de cor azul e com asa em fita na sepultura 22; uma jarra e uma taça na sepultura 34.2. Surgem ainda fragmentos de unguentários (para conter perfumes e essências) na sepultura 8 e na sepultura 12, fragmentos de um fundo quadrado de uma garrafa em vidro azul na sepultura 13. Apresentamos aqui uma tabela com os fragmentos em vidro por unidade estratigráfica e por sepultura:  8(  8(      

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)UDJPHQWRGHYLGUREUDQFR )UDJPHQWRGHYLGURD]XOIRUWHIUDJPHQWRGHYLGURHPD]XOFRPYHVWtJLRVGDDFomRGRIRJR e 1 fragmento de vidro verde. )UDJPHQWRVGHYLGURD]XO )UDJPHQWRVGHSRWHERLmRHPYLGURD]XO )UDJPHQWRGHYLGURYHUGHHEUDQFR )UDJPHQWRVGHYLGUREUDQFRURVDGRHIUDJPHQWRGHYLGURYHUGH )UDJPHQWRVGHYLGURHEUDQFRURVDGRHIUDJPHQWRVGHYLGUREUDQFRHVYHUGHDGR )UDJPHQWRVGHIXQGRGHXQJXHQWiULRGHIRUPDWXEXODUHPYLGURD]XO )RUPD,6,1*692), e 203 fragmentos de jarra em vidro verde. )UDJPHQWRVGHWDoDHPYLGURYHUGHFODURIUDJPHQWRVGHYLGURD]XODOJXQVGRVTXDLV com vestígios de ter sofrido a acção do fogo. )UDJPHQWRVGHYLGUREUDQFRFRPOLQKDVLQFLVDVKRUL]RQWDLVQDSDQoD6HPIRUPDV 0LFURIUDJPHQWRVGHXQJXHQWiULRHPYLGURD]XO )UDJPHQWRGHXQJXHQWiULRHPYLGURD]XO )UDJPHQWRVGHYLGURYHUGHVHPIRUPDVHIUDJPHQWRGHYLGURD]XO )UDJPHQWRVGHIXQGRTXDGUDGRGHJDUUDIDHPYLGURD]XO )RUPDE,6,1*693) com datações ente o século I d. C. e o séc. III d.C.; 2 fragmentos de vidro verde e 1 fragmento de vidro castanho. )UDJPHQWRVGHMDUUDFRPDVDGHÀWD )RUPD,6,1*694) em vidro azul com asa em tons esverdeados, apresenta um fundo arredondado sem base plana. )UDJPHQWRVGHGXDVSHoDV SRWHHMDUUD XPDGHODVFRPDVDVHPYLGUREUDQFRFUHPH )UDJPHQWRVGHJDUUDIDRXMDUUDHPYLGURD]XOIUDJPHQWRVGHYLGUREUDQFR HIUDJPHQWRGHYLGURYHUGHJDUUDID

,6,1*6(VWDIRUPDVXUJHQRVLQtFLRVGRVpF,G&HGLIXQGHVHDSDUWLUGHPHDGRVGRPHVPRVpFXORSRUWRGRRLP SpULRVHQGRTXHDVIRUPDVPDLVWDUGLDVGDWDPGRVpFXOR,,G&7UDWDQGRVHSRUWDQWRGHSHoDVEHPEDOL]DGDVFURQRORJLFDPHQWH 93 ISINGS: 1957, 68. 94 ISINGS: 1957, 31. 92

COMUNICAÇÕES

Fig. 10 – Implantação da necrópole da Herdade do Vale 6.

Foram ainda exumados 4 fragmentos de escória de ferro, 12 pregos, 41 fragmentos de objectos em ferro. Foram exumados 16 fragmentos de material lítico em quartzo não talhado, foram recolhidos pois não são material geológico típico da zona. Embora em muitas das necrópoles de incineração deste período cronológico seja usual a colocação de uma moeda como óbolo para Caronte, nesta necrópole apenas foram exumados dois numismas. COMUNICAÇÕES

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Em 33 unidades estratigráficas foram exumados fragmentos osteológicos muito fragmentados e calcinados. Foram exumados 61 sacos com amostras de terra para serem peneiradas, tentando recuperar, assim, mais alguma esquírola de material osteológico. Foram recolhidas 3 amostras de carvão, para possíveis análises posteriores. A não presença de armas ou utensílios agrícolas, leva-nos a por a hipótese da não existência de muitos homens nesta necrópole, o espólio votivo é essencialmente cerâmico e vítreo, mobiliário de cozinha ou unguentários de limpeza e perfume dos corpos. Por outro lado a quase inexistência de peças em terra sigillata e materiais mais nobres, leva-nos a pensar estarmos perante uma necrópole de gente com poucos recursos, apesar das peças em vidro e das lucernas, peças claramente de importação.

&RQVLGHUDo}HVÀQDLV O rito incineratório ou crematório é uma das mais antigas tradições romanas, caracterizada pela escassez de ocupação de espaço de cada sepultura, por ser limpa e higiénica. O funus é considerado uma celebração da morte, com a auto-representação social no momento da morte e dada a sua aparotosidade e complexidade do ritual. A cremação era realizada em bustum – fossas escavadas no solo cheias de madeira sobre a qual se colocavam os cadáveres que aí eram queimados, depois de cremados os vestígios eram cobertos com sedimentos, não existindo distinção entre o local de cremação e o local de deposição das cinzas. A cremação em ustrinum ou em pira (rogus), pilha de madeira colocada sobre uma laje ou sobre terra e sobre a madeira era colocado o cadáver, depois de cremados eram recolhidos e colocados numa fossa secundária com espólio votivo associado. Nesta situação há diferenciação entre o local de cremação (ustrinum) e o local onde se colocam as cinzas do cadáver, a que vários autores chamam de covas, covachos, mas que resolvemos chamar de sepulturas. A quantidade de cinzas não é elemento suficiente para definir uma cremação em bustum, dado que um pequeno covacho pode estar repleto de cinzas mas ser apenas o local onde foram depositadas as cinzas recolhidas do ustrinum, o que parece acontecer na maioria das sepulturas intervencionadas nesta necrópole. O mobiliário funerário era colocado sobre as cinzas. Nesta situação o espólio não se encontra partido nem queimado, se bem que podem surgir fragmentos de espólio votivo colocado no ustrinum e que foi queimado e fragmentado sendo recolhido com as cinzas e os fragmentos osteológicos. Este tipo de ritual perdura do séc. I ao séc. IV, embora a partir de meados do séc. II, perca importância em relação à inumação, a partir do séc. III a inumação estabelece-se como ritual predominante, embora surjam sepulturas de incineração esporádicas nos séc. III e IV. Podemos então concluir estar perante, na Herdade do Vale 6, de uma necrópole de incineração, com 54 interfaces de sepulturas, essencialmente de incineração secundária, embora existem sepulturas que considerámos como de incineração primária, com datação entre o séc. I e o II d.C. (Fig. 10).

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COMUNICAÇÕES

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Memórias d’Odiana • 2ª série

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