COSTA-RENDERS, Elizabete Cristina. A inclusão na universidade: as pessoas com deficiência e novos caminhos pedagógicos. Curitiba: Prismas, 2016.

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APRESENTAÇÃO

A inclusão nos remete a um paradigma educacional que rompe com a seleção e segregação de sujeitos em espaços educacionais limitantes e que, amparado nos direitos humanos, busca a garantia do direito à convivência com as diferenças e à educação com qualidade para todos os estudantes. Exige, portanto, provocação ao sistema educacional vigente nos termos de um paradigma educacional emergente. Neste cenário, insere-se o objetivo deste livro que, numa inversão, pretende narrar os processos de construção de um espaço educacional inclusivo reconhecendo como protagonistas de tais processos os próprios estudantes com deficiência. O presente texto é resultante dos meus tempos de trabalho com a construção de um espaço educacional inclusivo, quando me percebia diariamente imersa num movimento ambivalente. Ora as pessoas com deficiência eram reconhecidas e respeitadas em seus caminhos alternativos para a construção do conhecimento.

Ora estas mesmas pessoas eram

capturadas pela determinação social de um jeito só de viver ou aprender. Fui percebendo, então, que a construção de um espaço educacional inclusivo exigiria discussão e revisão pedagógica, sendo que estas deveriam ser fundamentadas na escuta e na aprendizagem com as pessoas com deficiência. Este livro resulta, exatamente, deste movimento que aproximou as práticas inclusivas cotidianas da pergunta por novos saberes e fazeres na universidade. Rotas, desvios, sujeitos, trivialidades, práticas, representações, rupturas, processos imersos numa temporalidade cíclica. Memórias, rotinas e imprevistos. Enfim, tudo isto foi dando corpo ao texto na forma de quinze crônicas comentadas, quando inúmeros registros e memórias juntam-se na tessitura de uma rede de ações cotidianas, onde é possível perceber um movimento cheio de conflitos, conciliações, avanços e retrocessos. Considerando a complexidade do processo educacional inclusivo, assumo uma abordagem pedagógica fundamentada no modelo social de deficiência, o qual relaciona a deficiência aos conceitos de funcionalidade e impedimentos sociais. Neste cenário, o conceito acessibilidade ganha relevância

para a operacionalização da proposta educacional inclusiva. As crônicas testemunham esta relevância quando todas apontam que os eixos de acessibilidade (física, comunicacional e atitudinal) tanto possibilitam um novo entendimento do que seja a incapacidade quanto ganham um valor pedagógico na comunidade acadêmica. Rompidas as barreiras, na convivência cotidiana, foi mais fácil perceber que a incapacidade (ou a capacidade) também é uma resultante da relação entre as pessoas (com e sem deficiência) e o meio ambiente. Considerando as muitas e diferentes barreiras impostas às pessoas com deficiência nas instituições educacionais no decorrer da história, a pesquisa de doutoramento, que fundamenta este livro, constatou que a presença das pessoas com deficiência numa instituição educacional é mais que presença, é reivindicação. Reivindicação esta que transita, da invisibilidade à emergência, pelos caminhos do atendimento educacional especializado na educação superior conforme disposto pela Política nacional de educação especial na perspectiva da educação inclusiva (MEC, 2008) em nosso país. Tal presença/reivindicação na universidade pode, portanto, pode impulsionar as ecologias de saberes, temporalidade e reconhecimentos neste momento historio.

O movimento das diferenças promovido pela presença das pessoas com deficiência na educação superior aponta para uma necessária revisão epistemológica nesta contemporaneidade. Nestes termos, apresento quatro argumentos a favor desta contribuição. Primeiro, as pessoas com deficiência nos revelam as corporeidades desviantes que confrontam o sujeito universal e exigem a superação da monocultura do ser e do saber também no campo educacional. Segundo, as diferentes formas de sensoriamento do mundo, advindas da singular corporeidade das pessoas com deficiência, promovem o alargamento dos espaços pedagógicos na instituição educacional. Terceiro, esta presença/reivindicação contribui para a revisão epistemológica porque o modelo social de deficiência visibiliza a necessária revisão dos critérios meritocráticos fundamentados estritamente no indivíduo. Ou seja, se capacidades e incapacidades também são construídas socialmente por que insistimos na supremacia do mérito individual? Por fim, o quarto argumento dimensiona a

tonalidade utópica do movimento inclusivo nos termos do seu campo de imanência, da possibilidade das ecologias, dos saberes, das temporalidades e dos reconhecimentos no campo educacional. Ou seja, a inclusão carrega uma tonalidade utópica e necessita da mesma no sentido da antecipação dos processos educacionais inclusivos numa instituição.

Enfim, entendo que por meio das crônicas, aqui narradas, é possível perceber que a inclusão ocorre em efeito dominó. Começa em determinado local ou grupo, mas não se fixa ali. Como movimento, provoca e é provocada, dilata, invade territórios desconhecidos e alarga tempos e espaços pedagógicos no sentido da escola e da universidade para todos!

Elizabete Cristina Costa-Renders

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