CRENÇAS DOS ALUNOS DE ENSINO MÉDIO EM RELAÇÃO À ATIVIDADE EXPERIMENTAL: UM ESTUDO INICIAL

August 31, 2017 | Autor: B. Simões | Categoria: Crenças, Laboratório de Física, Atividade Experimental
Share Embed


Descrição do Produto

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

1

CRENÇAS DOS ALUNOS DE ENSINO MÉDIO EM RELAÇÃO À ATIVIDADE EXPERIMENTAL: UM ESTUDO INICIAL Elizabeth Cristine Adam Trindade1, Bruno dos Santos Simões2, José Francisco Custódio3 1 2

3

Instituto Federal de Santa Catarina/[email protected]

Universidade Federal de Santa Catarina/Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica/[email protected]

Universidade Federal de Santa Catarina/Departamento de Física/Programa de Pós-Graduação em Educação Científica e Tecnológica/[email protected]

Resumo O enfoque deste trabalho foi discutir a visão dos estudantes quanto à realização de uma atividade experimental em laboratório na disciplina de Física. Em geral, os estudantes trabalham em pequenos grupos e seguem instruções de um roteiro. A atividade em laboratório, muitas vezes, tem como premissa testar uma lei científica, ilustrar ideias e conceitos aprendidos nas aulas teóricas, descobrir ou formular uma lei acerca de um fenômeno específico, relacionar a teoria com a prática, ou aprender a utilizar algum instrumento ou técnica de laboratório específica. Para tanto, aplicamos um questionário a 65 estudantes do segundo ano do Ensino Médio em um colégio particular no município de Itajaí-SC, onde se realiza tradicionalmente atividades práticas de laboratório. Esse questionário tinha por objetivo identificar as impressões dos estudantes em relação às atividades experimentais que foram realizadas, como suas crenças em relação aos procedimentos realizados em laboratório; ao trabalho em grupo e ao professor influenciavam as atitudes dos estudantes no laboratório. Percebemos que a maioria dos alunos sente insegurança quando o experimento não fornece o resultado esperado e a importância do professor para solucionar problemas. Os resultados mostram a necessidade de repensar os objetivos das atividades experimentais, a fim de favorecer aprendizagem não centrada apenas nos resultados.

Palavras-chave: Atividade experimental; Laboratório de Física; Crenças Introdução A ideia deste trabalho surge do interesse sobre a visão dos estudantes a cerca da atividade desenvolvida em laboratório e sobre suas crenças em relação a sua aprendizagem, ao trabalho em grupo, o papel do professor e qual suas expectativas quando um experimento não apresenta o resultado esperado. Alguns pesquisadores discutem a viabilidade o uso de laboratório de Física nas escolas (WHITE, 1996; BORGES, 2002; REISS, 2005). Borges discute em seu trabalho as atividades práticas realizadas no ensino de Ciências e como o laboratório didático tem sido usado nas escolas. Afirma que os professores têm como objetivo o laboratório tradicional, que consiste em atividades práticas realizadas pelos alunos, envolvendo observações e medidas acerca de fenômenos previamente determinados pelo professor. Destaca que, em geral, os estudantes trabalham em pequenos grupos e seguem instruções de um roteiro. A atividade prática, muitas vezes, tem como premissa testar uma lei científica, ilustrar ideias e conceitos aprendidos nas aulas teóricas, descobrir ou formular uma lei acerca de um ____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

2

fenômeno específico, relacionar a teoria com a prática, ou aprender a utilizar algum instrumento ou técnica de laboratório específica. Muitas vezes o uso da atividade em laboratório seria para comprovação da teoria, antes vista em sala de aula, não favorecendo a discussão sobre o erro no experimento. De acordo com o autor: Outro aspecto é que o estudante logo percebe que sua 'experiência' deve produzir o resultado previsto pela teoria, ou que alguma regularidade deve ser encontrada. Quando ele não obtém a resposta esperada, fica desconcertado com seu erro, mas, se percebe que o 'erro' pode afetar suas notas, ele intencionalmente 'corrige' suas observações e dados para obter a 'resposta correta', e as atividades experimentais passam a ter o caráter de um jogo viciado. Infelizmente este é daquele tipo de jogo que se aprende a jogar muito rapidamente. Muitas vezes, os próprios professores são vítimas desse raciocínio, e sentem-se inseguros quando as atividades que propõem não funcionam como esperavam, passando a evitá-las no futuro porque 'não dão certo'. As causas do erro não são investigadas e uma situação potencialmente valiosa de aprendizagem se perde, muitas vezes, por falta de tempo. Nesse sentido, o que se consegue no laboratório é similar ao que se aprende na sala de aula, onde o resultado se torna mais importante que o processo, em detrimento da aprendizagem (BORGES, 2002, p.222).

Há vários motivos para que não ocorram mudanças significativas na educação científica, tais como professores que normalmente reproduzem os conteúdos da mesma forma que ensinados (REISS, 2005). Segundo o autor, estes motivos tornando o trabalho em laboratório praticamente inviável e, o possível receio por parte dos professores ao realizar estas atividades, sendo esta prática muitas vezes deixada de lado por considerarem demasiadamente trabalhosas e pela falta de condições apropriadas. Há também a dificuldade das escolas na estruturação e obtenção dos materiais necessários para realização das aulas em laboratório juntamente com turmas com grande número de alunos. Pinho Alves (2000) discute o uso do laboratório didático como um instrumento que oferece objetos concretos de mediação entre a realidade e as teorias científicas, opondo-se aos exercícios comprovatórios do laboratório convencional. O aluno será desafiado a investigar uma situação real, formulando deliberadamente hipóteses teóricas para a resolução de um problema científico, tendo a liberdade de testá-las, permitindo assim sugerir diferentes formas de se obter o resultado desejado. Com isso, o aluno pode desenvolver habilidades e estratégias que possam correlacionar com situações no seu cotidiano. Araújo e Abib (2003) reafirmam posições já estabelecidas para o importante papel da experimentação no Ensino de Física e sinalizam novas direções para a sua utilização em sala de aula, que revelam as tendências das propostas formuladas pelos pesquisadores da área. As autoras afirmam haver grande necessidade de novos estudos, que visem melhorar as articulações das atividades experimentais com Ensino de Física nas escolas. Há, também, a necessidade propiciar um aprofundamento da temática, buscando a efetiva implementação dessas propostas nos diversos ambientes escolares. Neste sentido diversos estudos analisam o benefício de um experimento em termos dos resultados das atitudes dos alunos frente a um ensino aberto e questionador, comparado a um ensino expositivo buscando identificar as dimensões do interesse (MARTINEZ; HAERTEL, 1991). Também há trabalhos que investigam a questão da dinâmica de grupo de estudantes no trabalho de laboratório por meio de referenciais psicanalíticos (BAROLLI; VILLANI, 2000) e pesquisa concentrada nos ____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

3

motivos para a escolha de determinados experimentos pelos professores (Laburú, 2005). No entanto, Barberá e Valdes (1996) afirmam há controvérsias sobre a eficácia do uso da atividade em laboratório e estas já foram mencionadas no final do século XIX. Hodson (1994) acrescenta que existem poucas investigações sobre os ganhos das atividades experimentais para justificar o seu uso rotineiro. Em um dos trabalhos realizados pelo o autor, feita na década de 90, realizada com alunos com idades entre 13 a 16 anos, pertencentes a escolas da Nova Zelândia, na qual 57% dos alunos afirmaram boa disposição para o trabalho prático e 40% expressam seu entusiasmo com comentário do tipo “gosto quando sei o que estou fazendo”, “gosto quando fazemos nossos próprios experimentos” e “não gosto quando saem ruins”. Hodson (1994) considera que os professores devem planejar métodos de aprendizagens mais ativos e se adeque ao gosto do educando.

Procedimento As perguntas apresentadas são provenientes de um questionário aplicado em uma escola particular na cidade de Itajaí - SC que busca identificar as impressões dos estudantes em relação à atividade experimental, como suas crenças em relação: aos procedimentos realizados em laboratório; ao trabalho em grupo; ao professor. Estas questões foram respondidas pelos alunos de duas turmas do ensino médio, totalizando 65 alunos participantes, com idades entre 14 a 16. Utilizamos a ferramenta google formulário. Neste trabalho trazemos três perguntas para discussão: Tabela 01: Questões aplicadas

1 - Na montagem e execução de um experimento no laboratório de Física, você geralmente:

2 - Quando você obtém em um experimento um resultado inesperado, você considera:

a. Segue os procedimentos descritos no roteiro; b. Segue o que os colegas fazem; c. Segue a explicação do professor.

a. O grupo errou algum procedimento;

3 - O que você faz quando a atividade em laboratório não fornece o resultado previsto:

em a. Refaz o experimento; b. Formula hipóteses para justificar; b. O roteiro não estava c. Chama o professor claro na explicação; para que ele possa auxiliar; c. Que o professor não foi d. Pede ajuda aos claro na explicação do colegas de outros experimento. grupos; e. Outros. d. Outros

____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

4

Discussão Em um primeiro momento tínhamos o propósito de analisar quais estratégias eram utilizadas pelos alunos para o desenvolvimento das atividades em laboratório. Para isso perguntamos para eles: na montagem e execução de um experimento no laboratório de Física, você geralmente. Tabela 02: Respostas dos alunos à questão 01

Turma/alunos

a)

b)

c)

2ªA (38 Alunos)

15

02

21

2ªB (27 Alunos)

08

Nenhum

19

02 (3%)

40 (61%)

Total (65 alunos) 23 (35%)

A maioria dos alunos (61%) afirma que segue a explicação do professor. Vemos a necessidade do acompanhamento do docente para realização da atividade em laboratório. Percebemos que nas práticas em laboratório os alunos sentem dificuldades na organização dos grupos e realização dos procedimentos, utilizando muitas vezes estratégias de tentativa e erro. Isto pode evidenciar que o aluno não consegue compreender os procedimentos descritos no roteiro da atividade proposta e, por isso necessita a constante afirmação do professor tanto no desenvolvimento quanto a análise de resultados. Os demais 35% dos alunos que seguem os procedimentos, podem demonstrar o reflexo do tipo de ensino da instituição, na qual o foco do ensino é construir um profissional técnico, tendo a formação operacional como enfoque de ensino. Os estudantes acreditam na inexistência do erro no material didático fornecido pelo professor, corroborando a relação de confiança que os alunos possuem com o professor. Por fim, podemos perceber que a minoria segue o que seus colegas fazem, demonstrando assim que na relação de trabalho em grupo não há interação entre seus pares, podendo ser uma das causas para desorganização enquanto grupo ao realizar alguma atividade em laboratório. Em uma segunda etapa, objetivo foi de verificar o se os estudantes consideram o resultado imprevisto como uma consequência de um erro do grupo ou de outros fatores externos como: o roteiro não está bem elaborado, ou que o professor não foi claro na explicação. Para isso foi perguntado: quando você obtém em um experimento um resultado inesperado, você considera: Tabela 03: Respostas dos alunos à questão 02

Turma/alunos

a)

b)

c)

d)

2ªA (38 Alunos)

27

3

3

5

____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

2ªB (27 Alunos)

24

1

5

1

1

Total (65 alunos) 51 (78%) 04 (6%) 04 (6%) 06 (10%) Seis alunos responderam a opção de outros, totalizando 10 % das respostas. Dessas, surgiram respostas “Eu fiz o procedimento incorreto”, “O professor não entende a resposta, sendo que eu entendi, mas não soube explicar”, “Que eu errei no seguimento do roteiro”, “e o professor não explicou direito e o grupo errou em algum procedimento” e “porque o resultado é algo inesperado”. A maioria dos alunos afirma que o grupo é responsável pelo “erro” que ocasiona o resultado inesperado em uma atividade experimental. A insegurança dos alunos resulta da ideia de que a Física é uma ciência exata, livre de questionamentos e incertezas. Por outro lado, consideram que o roteiro já foi possivelmente testado e, portanto, preciso. A crença que a Ciência é algo acabada e exata faz-se presente na percepção dos alunos, o que reafirma posições muitas vezes discutidas em relação à atividade em laboratório que tem por finalidade apenas comprovação da teoria. Podemos perceber, também, que o resultado apresentado corrobora com a questão anterior, na qual a maioria dos alunos afirma que segue a explicação do professor. Vemos que o aluno é dependente das orientações passadas pelo professor. Por fim, os questionamos sobre: o que você faz quando a atividade em laboratório não fornece o resultado previsto. Essa seria a verificação da questão anterior, onde os alunos deveriam expor qual foi o procedimento adotado em uma situação não esperada. Foram apresentadas cinco alternativas, sendo que a última alternativa possibilitou ao aluno expressar outra atitude não contemplada nas opções. Apenas dois alunos utilizaram esta opção “outra situação não mencionada” e responderam que não sabiam a resposta, representando 3% da pesquisa. Tabela 04: Respostas dos alunos à questão 03

Turma/alunos

a)

b)

c)

d)

e)

2ªA (38 Alunos)

11

6

16

3

2

2ªB (27 Alunos)

10

3

13

1

0

Total (65 alunos) 21 (32%) 09 (14%) 29(45%) 04 (6%) 02 (2%)

Nesta questão, 45% dos alunos não sentem confiança e necessitam do auxílio do professor para responder ou até mesmo mostrar o que o grupo fez de “errado”. Para 32% a meta de realização em desenvolver e finalizar a atividade em laboratório proposta foi considerada alta e podemos avaliar que o aluno responde bem a desafios. Do total, 14% dos alunos que formulam hipóteses para justificar o ____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

6

resultado imprevisto, vemos a necessidade de uma maior profundidade da teoria para justificar suas hipóteses. Conclusão Percebemos que um grande número dos alunos sente insegurança quando o experimento não fornece o resultado esperado e a importância do professor para solucionar problemas. Os resultados mostram a necessidade de repensar os objetivos das atividades experimentais, a fim de favorecer aprendizagem não centrada apenas nos resultados, conforme indica Borges (2002). De acordo com Laburú (2002), a investigação da motivação de uma atividade experimental não deve se resumir somente o papel do professor ao realizar práticas interessantes para uma aprendizagem significativa e prazerosa. Destacamos dentre algumas possibilidades, a atividade realizada em grupo, o ambiente diferenciado e atividade empírica são apresentados pelos alunos como fatores motivadores apresentados. No entanto, a crença em relação à Física, tornase evidenciada quanto à expectativa de resultados exatos e experimentos precisos. Há, também, a crença dos alunos quanto o papel do professor para o sucesso/fracasso da atividade experimental foi evidenciada. É importante destacar a necessidade de mais pesquisas no âmbito nacional que discutam o papel das atividades experimentais nas atitudes e emoções dos estudantes, particularmente nesse caso, com a disciplina de Física. A pergunta que se faz é: as aulas de laboratório podem potencializar ou gerar atitudes positivas em relação à disciplina de Física? Independente de qual seja a resposta para essa pergunta, pois nós ainda não temos indicativos para ela, vale destacar que o tipo de atividade influencia nas atitudes dos alunos, conforme exposto nesse trabalho.

Referências ARAÚJO, M. S. T.; ABIB, M. L. V. S. Atividades experimentais no ensino de Física: diferentes enfoques, diferentes finalidades. Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 176 – 194, jun. 2003. BARBERÁ, O.; VALDÉS, P. Investigación y Experiencias Didácticas: El trabajo práctico en la enseñanza de las ciencias: una revisión. Enseñanza de las Ciencias. v. 14, n. 3, p. 365-379, 1996. BAROLLI, E. & VILLANI, A. O trabalho em grupos no laboratório didático: reflexões a partir de um referencial psicanalítico. Ciência & Educação. [online]. 2000, vol.06, n.01, pp. 01-10. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v6n1/01.pdf. Acesso em 04 de maio de 2012. BORGES, A.T. Novos rumos para o laboratório escolar de ciências. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, v19, n.3: p.291-313, dez. 2002. GIORDAN, M. O Papel da Experimentação no Ensino de Ciências. Química Nova na Escola. Experimentação e ensino de Ciências, n. 10, nov. 1999, p. 43-49.

____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

XXI Simpósio Nacional de Ensino de Física – SNEF 2015

7

HODSON, D. Hacia un enfoque más crítico del trabajo de laboratório. Enseñanza de las Ciencias, 12, 3, 299-313, 1994. LABURÚ, C. E. Fundamentos para um experimento cativante. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, 23, 3, 382-404, 2006. ________. Seleção de experimentos de física no ensino médio: uma Investigação a partir da fala de professores. Investigações em Ensino de Ciências – V10(2), pp. 161-178, 2005. MARTINEZ, M. E.; HAERTEL, E. Components of interesting science experiments, Science Education, v. 75, n. 4, p. 471-479, 1991. PINHO ALVES, J. Atividades experimentais: do método à prática construtivista. Tese de Doutorado. CED/ UFSC. Florianópolis. 2000. REISS, M.J. The importance of affect in science education. Em: ALSOP, S. (Ed.) Beyond Cartesian Dualism: Encoutering Affect in the Teaching and Learning of Science. Netherlands: Springer, 2005. p. 17-26.

____________________________________________________________________________________________________ 26 a 30 de janeiro de 2015

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.