CRIAÇÃO DE UM ÍNDICE DE CAMINHABILIDADE PARA PRIORIZAR O INVESTIMENTO NA MELHORIA NAS CALÇADAS

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Apresentação Oral: Mobilidade Sustentável

757 CRIAÇÃO DE UM ÍNDICE DE CAMINHABILIDADE PARA PRIORIZAR O INVESTIMENTO NA MELHORIA NAS CALÇADAS Fábio Lúcio Lopes Zampieri [email protected]

Vanessa Goulart Dorneles

Décio Rigatti

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ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA: Fábio Lúcio Lopes Zampieri Universidade Federal do Rio Grande do Sul Rua Sarmento Leite, 320 90.050-170 Porto Alegre - RS - Brasil

RESUMO Este trabalho pretende apresentar a pesquisa de caminhabilidade desenvolvida na área central da cidade de Criciúma/SC e surgiu da necessidade do poder público municipal apresentar soluções de acessibilidade para as calçadas da cidade. Avaliou-se 402 calçadas em relação ao seu índice de caminhabilidade (IC) três aspectos primordiais: avaliação técnica, preferência dos pedestres e comportamento e, pôde-se ainda, desenvolver um índice de prioridades (IP) de investimentos para melhorias das condições dos passeios, através do IC e da quantidade de fluxo de pedestres existente em cada passeio. O comportamento foi estimado utilizado um modelo do fluxo de pedestres, que se baseia nas variáveis morfológicas e da qualidade do passeio e foram processados com redes neurais artificiais. O resultado da pesquisa teve como escopo embasar as decisões de acessibilidade tomadas pelo poder público em relação à melhoria da infra-estrutura viária da cidade.

CRIAÇÃO DE UM ÍNDICE DE CAMINHABILIDADE PARA PRIORIZAR O INVESTIMENTO NA MELHORIA NAS CALÇADAS F. L. Zampieri, V. G. Dorneles e D. Rigatti

RESUMO Este trabalho pretende apresentar a pesquisa sobre a criação de um índice de caminhabilidade para priorizar o investimento na melhoria nas calçadas que foi desenvolvido na área central da cidade de Criciúma/SC e surgiu da necessidade do poder público municipal apresentar soluções de acessibilidade para as calçadas da cidade. Avaliou-se 402 calçadas em relação ao seu índice de caminhabilidade (IC) três aspectos primordiais: avaliação técnica, preferência dos pedestres e comportamento e, pôde-se ainda, desenvolver um índice de prioridades (IP) de investimentos para melhorias das condições dos passeios, através do IC e da quantidade de fluxo de pedestres existente em cada passeio. O comportamento foi estimado utilizado um modelo do fluxo de pedestres, que se baseia nas variáveis morfológicas e da qualidade do passeio e foram processados com redes neurais artificiais. O resultado da pesquisa teve como escopo embasar as decisões de acessibilidade tomadas pelo poder público em relação à melhoria da infraestrutura viária da cidade.

1 INTRODUÇÃO Caminhar é o único modo de transporte indispensável à população das cidades, pois está presente em qualquer viagem curta, bem como no início e término das viagens que utilizam veículos automotores. Nas ruas, o pedestre está muito vulnerável a riscos por competir com outros meios de transporte que circulam pelos mesmos lugares. Além desse fator, na maioria das vezes, as calçadas não são adequadas aos pedestres por terem uma capacidade de fluxo e condições físicas insuficientes ao seu deslocamento, como por exemplo: pisos escorregadios, desníveis no passeio, calçada com largura inferior à mínima recomendada, falta de semáforos específicos e faixas elevadas para pedestres. Os pedestres necessitam que os espaços públicos destinados a eles ofereçam um nível de serviço no mínimo adequado. Assim, a presente pesquisa originou-se de uma parceria entre a Universidade do Extremo Sul Catarinense e a Prefeitura Municipal de Criciúma com o objetivo de avaliar o desempenho das calçadas da cidade criando um Índice de Caminhabilidade (IC). Do mesmo modo, para servir como base de dados obtidos com a pesquisa, o poder público pode analisar os principais problemas e procurar soluções e mecanismos para implementar adequações nos passeios, tornando-os mais acessíveis para toda a população. A acessibilidade pode ser definida como a possibilidade de integração entre as pessoas e os ambientes, sem segregá-las e permitindo que as atividades sejam realizadas com êxito por diferentes usuários. As pessoas têm peculiaridades e, por isso, garantir a acessibilidade

para todos é uma tarefa difícil, pois deve-se abranger as necessidades espaciais de pessoas com as mais diferentes restrições, ou seja, pessoas com limitações em desempenhar atividades devido as suas condições físicas associadas às características dos ambientes (DISCHINGER et al, 2004). Em relação à acessibilidade, as calçadas representam um elemento importante para o deslocamento e estão relacionadas à qualidade de vida. Calçadas inadequadas restringem o movimento de pedestres e impedem que pessoas com restrições transitem normalmente por diferentes espaços. Além de serem utilizadas como infra-estrutura de deslocamento, as calçadas também são um espaço de convívio entre diferentes usuários, permitindo uma apropriação pelos moradores que podem utilizá-las também para atividades de lazer. A metodologia utilizada distinguiu-se da demais por apoiar-se em três pilares básicos: a avaliação técnica, a opinião e o comportamento dos pedestres. A origem dos estudos de caminhabilidade está na avaliação das características físicas dos passeios, enquadrando-as num índice de adequação, onde técnicos atribuem notas de “A”, a melhor, a “F”, a pior, para determinar a performance do passeio. Para evidenciar os atributos preferidos pelos pedestres um dos fatores de ponderação é onde, em uma pesquisa de opinião, o usuário declara quais dos atributos avaliados pelos técnicos que considera mais importante. Mas para o índice IC fazer jus as expectativas e necessidades do usuário, ele também deve ser ponderado pelo comportamento dos pedestres, que foi adquirido através da metodologia desenvolvida por Zampieri (2006). Ela consiste num modelo para estimar o fluxo de pedestres que avalia o efeito produzido pelas variáveis de sintaxe espacial e medidas de desempenho, sendo processados por redes neurais artificiais. A partir desse modelo, podese entender como os atributos do ambiente urbano produzem e modificam relações sociais, reproduzindo seus efeitos no deslocamento dos pedestres. Mesmo com a ponderação pelas preferências dos pedestres e pelo modelo estimativo, o índice de caminhabilidade não considera o efetivo uso dos passeios pelos pedestres, hierarquizando numa mesma posição, calçadas muito movimentadas juntamente com outras que possuem pouco fluxo. Para criar uma maneira eficiente de dar preferência às calçadas mais utilizadas desenvolveu-se o Índice de Prioridades (IP) que relaciona a qualidade com o fluxo de pedestres medido. Desta forma, a metodologia utilizada nesse trabalho defende que mesmo com avaliações similares, as calçadas com menor fluxo são claramente menos prioritárias, admitindo níveis aceitáveis como ‘C’ e ‘D’. No entanto, calçadas com alto fluxo de pedestres – como as encontradas junto a grandes atratores comerciais – ou atratores especiais – como escolas e centros culturais – devem possuir níveis de performance mais altos, como ‘A’ e ‘B’, assim como, nenhuma calçada deve possuir ‘E’ e ‘F’, por apresentar qualidade muito baixa que inviabilizam o tráfego de pedestres. Recorrentemente, pesquisadores têm avaliado os passeios de acordo com suas expectativas, dando importância para fatores através da avaliação dos pedestres ou de técnicos. Esse modo de avaliação desconsidera a participação da cidade com suas ruas e edificações, já que se sabe o quanto as mudanças na malha urbana e no uso do solo podem alterar o movimento de pedestres. Nessa pesquisa não se quer desprezar as avaliações técnicas, tampouco a opinião dos usuários. A intenção é somar a elas um diagnóstico preciso do sistema de circulação peatonal através do desenvolvimento de um modelo matemático do fluxo de pedestres baseado em redes neurais artificiais, para medir a importância de cada variável do sistema e avaliar as correlações existentes entre elas.

2 REFERENCIAL Para avaliar as calçadas é necessário entender o fenômeno que ocorre nelas: o fluxo de pedestres. Sempre houve a necessidade de entender os fatores responsáveis pelo movimento das pessoas nas cidades por diversos estudiosos do fenômeno urbano (BATTY, 2003; HILLIER et al., 1993; DIXON, 1996; KHISTY, 1994; HELBING, 1992; entre outros). Esses esforços foram realizados em diferentes áreas do conhecimento para tentar determinar, entre outras coisas, as características do passeio, ou seja, como a posição hierárquica em que ele está inserido na malha urbana, sua qualidade e dimensões podem restringir/promover o movimento e modificar o comportamento dos pedestres ao escolherem suas rotas de deslocamento. Segundo Stanton et al. (1985), o movimento de pedestres ocorre em locais distintos, como calçadas, praças, passagem entre modais de transporte e é realizado para alcançar edificações, espaços públicos e outros mais. Os deslocamentos de pedestres são realizados em espaços específicos para esse fim, que podem ser públicos ou privados. Os espaços privados ocorrem dentro de edificações ou lotes particulares e possuem restrições ao livre movimento de pedestres. Foram considerados espaços públicos destinados aos pedestres, aqueles com acesso irrestrito nas 24 horas do dia, compartilhados ou não com outros tipos de transporte. No entanto, o trânsito de pedestre deve ter preferência em relação aos demais tipos de transportes, principalmente em locais como calçadas, passeios públicos, praças, parques, vias para pedestres e demais espaços destinados aos pedestres. O limite desses espaços acaba onde a prioridade do pedestre termina e outras formas de deslocamento têm a preferência. A ligação entre todos esses espaços cria o ambiente peatonal urbano (ZACHARIAS, 2001). Segundo o código brasileiro de trânsito (CTB Anexo I, 1997 p.94), a calçada é: “parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada à circulação de veículos, reservada ao trânsito de pedestres e, quando possível, à implantação de mobiliário urbano, sinalização, vegetação e outros fins”. A calçada faz parte do sistema viário das cidades e possui um papel que vai além do trânsito de pedestres e disposição de mobiliário, serve como interface entre as edificações e seu entorno. Os habitantes e moradores se apropriam da cidade e, mais especificamente, dos passeios públicos, transformando uma circulação em algo muito mais complexo e dinâmico. O fato de que cada morador ou proprietário ser responsável pela pavimentação em frente ao seu lote, faz com que não haja uma padronização das calçadas, e desta forma, diferentes pavimentos em diferentes níveis, além de objetos em locais impróprios, tornam as calçadas um local inseguro e desconfortável, impedindo que pessoas com alguma dificuldade de locomoção transitem normalmente (fig. 1). São raras as calçadas que apresentam boas condições, principalmente nas áreas de intenso fluxo de pedestres.

Fig. 1 Problemas nos passeios impedem a circulação de pedestres em geral

A calçada é uma forma de circulação urbana, mas também é muito mais que isso. O modo como a sociedade se apropria dos passeios constitui uma forma de representação espacial dos arranjos sociais no nível local da calçada. Entender as causas geradoras do movimento de pedestres é muito importante para o planejamento urbano de nossas cidades a fim de inferir se as medidas tomadas usualmente, a concepção e manutenção dos espaços estão de fato contribuindo para o fortalecimento da dinâmica social. A criação de um índice de caminhabilidade, neste caso para a cidade de Criciúma, permite não apenas medir os atributos das calçadas, mas também entender o comportamento do pedestre que se locomove sobre elas. Desse modo, compreende-se como as implicações sociais da comunidade que constrói a cidade também potencializa os fluxos de pedestres para qualificar os passeios. Esse modo de avaliação permite perceber a necessidade de cada calçada, criando metas que assegurem aos pedestres um mínimo de conforto e segurança, o que depende também da importância da calçada no tecido urbano, de seu fluxo e as necessidades do entorno. 2.1. O Índice de Caminhabilidade: produzindo um método de avaliação O índice de caminhabilidade que se pretende atingir é aquele que avalia a importância das variáveis para o sistema urbano através da sintaxe espacial e, ainda assim, considera a opinião dos usuários e o diagnóstico dos técnicos utilizando as medidas de desempenho. Esse modelo de avaliação do sistema peatonal propõe a discussão uma nova gama de possibilidades, pois permite descobrir o comportamento dos pedestres que juntamente com a opinião dos usuários pode ponderar a avaliação dos técnicos. O modelo utilizado demonstrou resultados adequados, com mais de 90% de coeficiente de correlação e erros quadráticos médios inferiores a 0,01 (ZAMPIERI, 2006). Nele utilizam-se teorias referentes a duas linhas de pesquisa diferentes que de certo modo se complementam para criar um modelo de análise do movimento peatonal, são elas: as medidas de desempenho e a sintaxe espacial. As medidas de desempenho trabalham com o nível local do passeio para compreender como, quais e de que forma as variáveis do ambiente condicionam o deslocamento do pedestre, no sentido de sentir-se confortável e seguro por onde anda. A relação entre o pedestre e seu meio ambiente, as calçadas e as ruas, é vital para a circulação, e avaliar suas condições é muito mais complexo em comparação aos veículos automotores. Diferente de outros meios de transporte, uma via para pedestres deve ser projetada para suprir as necessidades dos indivíduos com menores habilidades, como idosos, crianças e portadores de necessidades especiais, pois assim, são adequadas a toda população (DIXON, 1996). Dan Burden (2001) trabalha em transformar as cidades, tornando-as mais habitáveis e acessíveis a pé. Ele afirma que múltiplos fatores afetam o pedestre e definiu-os em capacidade da calçada, qualidade do ambiente para pedestres e percepção de segurança com respeito aos veículos automotores. Diferentemente da anterior, a sintaxe espacial, parte da afirmação que as cidades são mecanismos para geração de um campo potencial de probabilísticos encontros sociais e copresença (HILLIER et al., 1993), ou seja, não é o efeito da cidade, mas sim, o efeito social que potencializa o fluxo de pedestres. Com isso, a sintaxe permite interpretar os atributos do espaço, a partir das definições de que os assentamentos constituem-se basicamente por uma seqüência de espaços abertos, definidos por uma seqüência de barreiras, as edificações. Ao estudar os métodos quantitativos que visam à predição do fluxo de

pedestres, Hillier et al., (1993) descobriram que muitos deles eram simplesmente adaptações de modelos empregados em estudos veiculares. O que ficava implícito nessas teorias é que a movimentação das pessoas estava somente ligada à atração exercida pelos atratores, ou seja, a população se deslocaria simplesmente para entrar nas edificações. Essas teorias parecem desconsiderar quase totalmente o desenho urbano. Um modelo urbano que pretenda entender o fluxo de pedestres deve levar em consideração além das edificações o lugar aonde o movimento acontece abrangendo as características morfológicas da cidade. Os planejadores urbanos entendem o valor do desenho da cidade, pois ela é construída pelas tensões existentes entre as forças sociais e econômicas existentes na cidade. 3. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE INTERVENÇÃO A cidade de Criciúma está localizada no extremo sul do estado de Santa Catarina (fig. 2a). A área estudada compreende o anel viário central da cidade, e abrange parte dos bairros Centro e Comerciário, onde estão localizados alguns dos principais equipamentos da cidade, como o terminal central de ônibus urbano, as praças do Congresso e Nereu Ramos, o estádio Heriberto Hulse, além de várias escolas e espaços de esporte e lazer. Este recorte compreende, também, as ruas de maior importância viária para a cidade, como a Avenida Centenário, que é a principal via estruturadora da cidade; o anel viário central da cidade; a rua Henrique Lage, principal rua de comércio de vestuário popular; a rua Desembargador Pedro Silva, importante na ligação com outras localidades próximas (fig. 2b). Estas ruas apresentam um grande fluxo de veículos e pedestres, condicionando a escolha da área de estudo. O pedestre que se locomove por essa área percebe uma grande variação no entorno entre as ruas, característica encontrada também em muitas outras cidades de tecido tradicional. A área de estudo conta com uma grande diversidade de usos do solo. O comércio varejista desenvolve suas formas a partir do raio de abrangência dos grandes empreendimentos comerciais, bem como pequenas lojas ao longo do caminho. Alguns segmentos possuem edifícios de escritórios e outros serviços profissionais. Nas porções residenciais afastadas do centro é comum encontrar zonas de vizinhança bem definidas por aglomerados de casas unifamiliares. Em toda a área do trabalho existem residências conformadas por apartamentos e unidades condominiais. Os outros usos encontrados nessa área são: igrejas, bancos, delegacias, concessionárias, restaurantes, bares, escolas, entre outros. Além de incluir as principais ruas da cidade, na área englobada pela pesquisa estão localizados os calçadões da cidade, com intenso fluxo de pedestres. No total, foram avaliadas 402 calçadas na cidade de Criciúma e, para isso, contou-se com a participação de 4 professores e quinze alunos de graduação da UNESC e 1 pesquisador externo da UFRGS para o levantamento e compilação dos dados.

(a)

(b)

Fig. 2 Mapa identificando a localização da cidade de Criciúma (a) e mapa da área de estudos (b). 4 PROCEDIMENTOS DE PESQUISA 4.1 Avaliação técnica dos passeios Dixon (1996) afirma que existe um grande número de variáveis associadas à atração de viagens não-motorizadas, e a valoração destas pode influir na propensão de pedestres que utilizam a calçada. O nível de serviço pode avaliar uma calçada tanto quantitativa quanto qualitativamente. No primeiro caso, as variáveis físicas do passeio, largura e comprimento, podem ser mensuráveis, e sua coleta é facilmente realizada através de medições in loco ou a partir de bases de dados cartográficas. No segundo caso, são determinados quais os atributos de análise qualitativa do espaço são aplicáveis à área de estudo. Eles são agrupados por semelhança de características em medidas de desempenho (MD), variando entre a melhor e a pior qualidade da MD. Desse modo, são criadas fichas de avaliação que variam de 5 pontos, a melhor avaliação, até 0, a pior. Um passeio terá seu desempenho avaliado de acordo com a média das notas de dois avaliadores para cada MD, gerando um índice. Através deste índice, estabelece-se o nível de serviço das calçadas avaliadas que pode variar entre ‘A’, o melhor, até ‘F’, o pior. No presente estudo, as medidas de desempenho qualitativas utilizadas foram: atratividade, conforto, manutenção, segurança e segurança pública. 4.2 Preferência dos pedestres Para avaliar a preferência dos pedestres foi aplicado um questionário com 10 questões, com uma dupla de alternativas. O entrevistado deveria escolher qual a característica mais importante para ele entre as alternativas, ou marcar as duas caso considerasse que ambas possuem a mesma importância. Ele escolheria qual o atributo do espaço prefere, entre: atratividade, conforto, manutenção, segurança e segurança pública para responder à

pergunta: qual a característica que mais influencia sua decisão ao escolher uma calçada? O questionário aplicado mostrou qual a preferência dos pedestres na escolha de uma calçada, definindo a prioridade de cada um. Observando-se a figura 3, percebe-se que o item ‘Segurança Pública’ foi o tópico preferido entre os pedestres com 23%, seguido de ‘Manutenção’ com 22%, ‘Segurança’ com 20%, ‘Atratividade’ com 19% e ‘Conforto’ com 16%. Ao analisar os itens mais apontados - ‘Segurança Pública’ e ‘Manutenção’- percebese que a maioria dos pedestres questionados prefere uma calçada onde haja policiamento, pessoas circulando e boa visibilidade entre os pontos. Além disso, é relevante a escolha por calçadas com qualidade por onde possam transitar sem o risco de acidentes.

Fig. 3 Indicação da preferência das qualidades avaliadas pelos pedestres 4.3 Ponderação do modelo de pedestres Um modelo urbano que pretenda entender o comportamento dos pedestres deve considerar além das características físicas do passeio, deve abranger também as características morfológicas da cidade onde os passeios estão inseridos. Desta forma, o modelo deve ser capaz de explicar os fluxos de pedestres com alto nível de confiabilidade e representar uma metodologia de fácil aplicação (Zampieri, 2006). A primeira etapa no desenvolvimento do modelo foi a escolha das bases teóricas para a caracterização do modelo e deve ser suficientemente relevante para explicar o fenômeno. Desta forma, foram escolhidas duas bases teóricas agregadas, a sintaxe espacial e o nível de serviço dos passeios, este último já utilizado para avaliar os passeios pelos técnicos. Essas bases foram selecionadas por apresentarem características adequadas à análise das relações entre o fluxo de pedestres e as propriedades do espaço urbano e por sua simplicidade (Hillier et al., 1993; Landis et al., 2001). A metodologia de desenvolvimento do presente modelo compreendeu cinco etapas: i. Criação e processamento do mapa axial de toda a cidade; ii. Medição e contagem das constituições que ligam os passeios às edificações; iii. Obtenção da base de dados das edificações existentes na área; iv. Escolha dos atributos quantitativos e qualitativos; v. Coleta do output do modelo, o fluxo de pedestres por calçada na área de estudos. A primeira etapa envolve o traçado do mapa axial da cidade de Criciúma, pois segundo Hillier et al. (1993), a representação através do mapa axial tem mostrado um desempenho melhor do que outros métodos de sintaxe espacial em modelos de predição de pedestres. Para fazer um mapa axial, são traçadas linhas retas que atravessam a maior quantidade de possível de espaços abertos. Depois de traçado, o mapa é processado pelo programa

Axman, que analisa as relações entre as linhas axiais através de algoritmos matemáticos que calculam as medidas sintáticas que o desenho urbano possui. Com essas informações, compreende-se as características configuracionais do sistema urbano como um todo, e como as diversas partes dele interagem. Diversas variáveis quantitativas foram geradas como resultado dessa etapa, das quais apenas cinco foram selecionadas: (i) a integração global (Rn), (ii) integração local de raio 3 (R3), (iii) controle, (iv) conectividade, e (v) profundidade. Essas variáveis foram escolhidas por serem facilmente comparáveis entre si, característica necessária à pesquisa, que procura avaliar as diferenças entre os atributos das vias. O sistema de espaços públicos é carregado de pessoas de duas maneiras: pelas transições com o espaço privado e a partir das interfaces dos espaços públicos entre si. O arranjo entre as calçadas e entradas das edificações controlam o acesso ao movimento e determinam a ligação aos espaços fora das edificações. A sintaxe espacial dá o nome de constituição para estas transições entre os espaços. Assim, mesmo que uma calçada tenha muitas edificações se ela não for bem constituída, as edificações não são capazes de “alimentar” os espaços públicos, e o movimento de pedestres se torna independente das edificações existentes. Os atratores formam a parte privada do sistema urbano e, desse modo, são implementados pela sociedade para suprir as suas necessidades. Para a sintaxe espacial, as edificações ou atratores funcionam como multiplicadores das propriedades da malha urbana, aumentando sua capacidade de gerar encontros e movimento de pedestres e pode ser superior àquela resultante das características da configuração urbana (Hillier et al., 1993). Desta forma, aplicou-se os carregamentos potenciais de cada um dos atratores diretamente no passeio em que se encontrava a interface de ligação. Quando existiam portas para mais de uma calçada, o valor do atrator foi igualmente distribuído para cada calçada de acordo com a medida do vão. O peso dos atratores foi aplicado pela quantidade de área existente diretamente ao passeio no qual existia a constituição e originaram as variáveis: atratores residenciais, atratores comerciais, atratores de serviço e outros atratores. As variáveis do nível de serviço foram obtidas na avaliação dos técnicos das medidas de desempenho dos passeios e contaram com variáveis quantitativas - largura e comprimento - e qualitativas - atratividade, conforto, manutenção, segurança e segurança pública. No modelo ela foi utilizada apenas com a nota do técnico sem nenhuma ponderação. Para o processamento dos dados optou-se por utilizar as Redes Neurais Artificiais (RNA), pois os atributos incorporados nessas são relacionados na estrutura interna do modelo e não apoiam-se em regras específicas, mas sim em um conjunto de dados treinados em paralelo. Desse modo, parte-se do princípio que não existem regras definindo o comportamento das variáveis, somente a base teórica da qual elas se originaram aplicadas no modelo. Os atributos obtidos, de sintaxe espacial e de medidas de desempenho, funcionam como variáveis de entradas (inputs), tendo como saída o fluxo de pedestres (output) e foram relacionadas com a calçada (unidade básica). Após a realização de todas as etapas metodológicas, estruturou-se as variáveis e processouse o modelo com as RNAs. A estrutura do modelo compreendeu 17 variáveis, das quais dez referentes à configuração urbana, sendo quatro atratores, e sete às condições dos passeios. Para o processamento do modelo com as RNAs foi adotada a seguinte abordagem: 75% os dados coletados em campo foram utilizados para realizar o

treinamento do modelo (calibragem e elaboração), que visou determinar os pesos das variáveis do modelo; os outros 25% foram utilizados para a fase de teste do modelo, que o validou. De posse dos resultados, pode-se descobrir como cada uma das variáveis da qualidade do passeio interfere com o fluxo de pedestres, ou melhor, como elas “condicionam o fluxo” fazendo com que os pedestres utilizem as rotas que considerem de melhor qualidade na cidade de Criciúma. Para classificar as variáveis utiliza-se o método de Garson (1991) que retira o peso das conexões entre cada um dos neurônios artificiais para obter a importância que cada uma tem no modelo como um todo. Classificar a importância pode ser uma maneira efetiva de qualificar as variáveis no modelo e determinar como cada uma atua no comportamento dos pedestres. Nesse caso as redes neurais descobriram que a preferência dos pedestres não refletiu o seu comportamento ao escolher uma rota (fig. 4). O modelo classificou, por exemplo, a segurança que é a medida que identifica a conflito entre pedestres e automóveis com a maior importância. Isso denota que ao invés do pedestre utilizar uma calçada com possibilidade risco maior ele prefere mudar a rota e utilizar as mais seguras. Também mostra que mesmo preferindo caminhar por ruas mais agradáveis (da MD atratividade) os pedestres não levam em conta esses atributos, ao contrário da segurança pública que é preferida pelos pedestres e tem uma grande relevância para a escolha de sua rota.

Fig. 4 Indicação da preferência das qualidades a partir da análise do comportamento dos pedestres 5 DESENVOLVIMENTO DOS ÍNDICES Este trabalho diferencia-se dos demais pelo tipo da abordagem utilizada. Ao invés de apoiar-se inteiramente na opinião dos técnicos para avaliar os passeios, preferiu-se utilizar ponderações externas para aproximar as notas dos técnicos às necessidades da população. Essa dificuldade de avaliação reside em dois aspectos básicos: opinião e comportamento. Quando o pedestre declara sua opinião ele está afirmando sua preferência, do que gosta do espaço urbano e quais os atributos que mais o interessam, o que é muito relevante pra qualquer pesquisa, mas não consiste na informação completa. Infelizmente, muitas vezes os pedestres não têm escolha, pois as rotas possíveis para a realização de uma viagem (ida até um equipamento ou atrator) pode não contemplar os atributos preferidos. Se um pedestre preferir, por exemplo, caminhar ao lado de uma praça, existe grande possibilidade que a escolha de rota não forneça essa opção. Dessa diferença surgiu a necessidade de caracterizar o desempenho oferecido pelas calçadas mais utilizadas pelos pedestres. Como existem muitas variáveis envolvidas as redes neurais artificiais servem para abstrair a informação e fazer essa avaliação. O modelo processado por RNAs e classificado em importância pelo método de Garson (1991) que ordena as variáveis em ordem de importância para o modelo e, conseqüentemente, apresenta como as qualidades do passeio influenciam no movimento de pedestres.

O índice de caminhabilidade (IC) resultante foi obtido pela avaliação dos técnicos ponderada pela opinião dos pedestres e pelo seu comportamento que foi descoberto pelo modelo (Fig. 5a). Essa abordagem apresenta uma vantagem em apresentar duas formas de ponderação: o que o pedestre espera que a calçada seja, em termos de qualidade, e o que ele prefere utilizar no seu movimento diário, obtidos da utilização da infra-estrutura existente. Os passeios tiveram as seguintes notas de IC: 8 com ‘A’, 14 ‘B’, 179 ‘C’, 170 ‘D’, 28 ‘E’ e 3 ‘E’. Ou seja, a maioria das calçadas teve índices adequados e somente 31 inadequadas. Infelizmente apenas 22 calçadas tiveram notas ‘A’ e ‘B’ que são consideradas excelentes. Para descobrir quais calçadas deveriam ter prioridade de manutenção correlacionou-se o IC com o fluxo de pedestres criando o Índice de Prioridades (IP). Ele é obtido através de um cálculo que pondera as calçadas com as piores notas e que possuem a maior utilização por parte dos pedestres, pois as com maior fluxo precisam necessariamente de qualidade melhor. Deste modo é possível descobrir como aplicar os recursos existentes nas calçadas mais utilizadas e com desempenho pior. Deixa-se claro que as calçadas com IC entre E e F são consideradas inadequadas com ou sem fluxo. A seguir apresenta-se os mapas do IC e do IP (fig. 5a e 5b, respectivamente).

(a)

(b)

Fig. 5 Mapa com os índices de caminhabilidade - IC (a) e de prioridades - IP (b) Observando os índices obtidos (IC e IP), pode-se notar que ambos têm ligação direta com o fluxo de pedestres. As ruas que possuem maior índice de prioridade são também aquelas onde o índice de caminhabilidade é maior. Isto se deve ao fato de que os pedestres necessitam de uma qualidade maior nas calçadas por onde circulam mais pedestres, e por

conseqüência, as calçadas com menor fluxo acabam tendo prioridade menor. As ruas com maior índice de prioridade (IP) correspondem aos calçadões centrais, área cujo fluxo de pedestres é intenso durante o dia todo. As ruas com menor índice de prioridade são aquelas onde poucos pedestres transitam, e que se localizam não muito próximas aos principais eixos de ligação da cidade e, assim, ficando longe dos estabelecimentos de comércio e serviços. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS Para a realização desse projeto o papel da Universidade do Extremo Sul Catarinense foi vital, pois colaborou na produção do conhecimento técnico e permitiu a seus acadêmicos a iniciação científica que resultou em práticas em prol da acessibilidade espacial para a melhoria dos espaços públicos e, consequentemente, da sociedade. Os dados dessa pesquisa foram apresentados no 2º Seminário Catarinense de Calçadas que ocorreu no dia 19 de dezembro de 2007 no Teatro Elias Angeloni. Este seminário envolveu a comunidade com a intenção de demonstrar à população a importância da qualidade das calçadas para evitar acidentes e que é fundamental sua participação nas atividades da cidade. A pesquisa também teve como resultado a confecção de uma cartilha de caminhabilidade e acessibilidade na área central de Criciúma, que reuniu a coletânea dos dados obtidos, apresentando os levantamentos, as análises e as soluções propostas de uma maneira didática de fácil leitura e entendimento para a população. Esta pesquisa aplicou um método cujo objetivo é entender as características urbanas partindo da estrutura de toda a cidade (nível global), para a calçada em si (nível local) com o auxílio de um modelo urbano de análise baseado em redes neurais artificiais (RNAs). Assim, pode-se compreender a dinâmica da cidade, agindo diretamente onde a necessidade dos pedestres se faz presente. As cidades não possuem mais condições de investir qualificando calçadas que são subutilizadas, mas de outra forma, mesmo sendo dever do proprietário do lote dar manutenção, é obrigação do poder público fiscalizar e criar alternativas para melhorar os passeios. Ao criar um modelo urbano essa avaliação fica amparada em uma ferramenta lógica de decisão. Deste modo, a aplicação do índice de caminhabilidade é posterior ao conhecimento das características existentes que fazem com que os pedestres escolham cada calçada, ou seja, descobre-se o motivo que leva o pedestre a andar pela calçada, e a partir das prioridades do usuário se organiza esse índice. Para o índice de prioridade, justamente se “prioriza” as calçadas que precisam uma qualidade maior, tanto pela quantidade de pedestres presentes no passeio, quanto na utilidade pública existente neles. Desenvolver, juntamente ao índice de caminhabilidade, o IP é essencial para priorizar investimentos, pois cria uma maneira de diferenciar os passeios pelo seu uso. Com esse tipo de abordagem, os técnicos podem basear suas ações no desempenho obtidos das variáveis urbanas, bem como sua importância para a população e a necessidade do ambiente peatonal urbano. Além dos diagnósticos serem mais precisos, as decisões técnicas ficam balizadas em dados estatísticos, de opinião pública e do comportamento dos pedestres, o que facilita o trabalho dos grupos técnicos. Nesse trabalho, verificou-se que calçadas com maior índice de prioridades são aquelas que possuem um IC baixo, mas também, que possuem grande demanda por parte de seus usuários ficando nas áreas centrais. No entanto, para garantir acesso a todos os usuários, além da melhoria prioritariamente nessas calçadas, deve-se definir rotas acessíveis ao

longo de toda a área, ou seja, as ruas devem possuir ao menos um dos lados do passeio com faixa de circulação livre e desobstacularizada, com rebaixos de meio fio e todas as informações podotáteis necessárias. 6 REFERÊNCIAS Batty, M. (2003) Agent-based pedestrian modelling. Working Papers 61, Center for Advanced Spatial Analysis (CASA), Londres. Adquirido online em: http://www.casa.ucl.ac.uk/working_papers/paper61.pdf. Brasil (1997) Lei federal Nº 9.503. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO - CTB (DOU 24.09.1997 – Retif. DOU 25.09.97). Brasília: Diário Oficial. Dischinger, M. e Bins Ely, V. H. (2004) Desenho universal nas escolas: acessibilidade na rede municipal de ensino de Florianópolis. Florianópolis: UFSC, Prefeitura Municipal de Florianópolis. Dixon, L. B. (1996) Bicycle and Pedestrian Level-of-Service Performance Measures and Standards for Congestion Management Systems. In Transportation Research Record 1538, TRB, National Research Council, Washington, D.C., p. 1 - 9. Garson, D. G. (1991) Interpreting neural-network connection weights. AI Experts, abril p. 47-51. Helbing, D. (1992) Models for Pedestrian Behavior. in: Natural Structures. Principles, Strategies, and Models in Architecture and Nature, Part II p. 93-98. Hillier, B. Hanson, J. Penn, A. Grajewski, T e XU, J. (1993) Natural movement: or configuration and attraction in urban pedestrian movement. Environment and Planning B: Planning and Design, Vol. 20. Khisty, C. J. (1994) Evaluation of Pedestrian Facilities: Beyond the Level of Service Concept. Transportation Research Record 1438. TRB, National Research Council, Washington D.C. Landis, B. W. Vattikuti, V. R. Ottenberg, R. M. McLeod, D. S. e Guttenplan, M. (2001) Modeling the Roadside Walking Environment: Pedestrian Level of Service. Transportation Research Record 1773. Stanton, R. J. C. Wanless, G. K. (1985) Pedestrian Movement. Safety Science, Vol. 18 Issue 4, Feb. p. 291-300. Transportation Research Board, p. 82-88. Zacharias, J. (2001) Pedestrian Behavior and Perception in the Urban Walking Environments. Journal of Planning Literature, Vol. 16 No 1 p. 3-18. Zampieri, F. L. (2006) Modelo Estimativo de Pedestres Baseado em Sintaxe Espacial, Medidas de Desempenho e Redes Neurais Artificiais. Dissertação de mestrado. UFRGS, Porto Alegre.

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