Criando e-picturebooks: Experiências de storytelling digital produzidas por alunos do Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design da UFJF (2016)

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GT | LITERATURA E DESIGN CRIANDO E-PICTUREBOOKS: EXPERIÊNCIAS DE STORYTELLING DIGITAL PRODUZIDAS POR ALUNOS DO BACHARELADO INTERDISCIPLINAR EM ARTES E DESIGN DA UFJF Thales Estefani1 Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF

RESUMO: O aumento consistente da informatização em diversas atividades cotidianas nos coloca constantemente diante de dispositivos computacionais interativos, como tablets e smartphones, que acessam a uma multiplicidade de mídias (áudio, vídeo, texto, etc) e à internet. O storytelling digital localiza-se, então, no centro dessa nova configuração, representando uma alternativa para contar histórias, adaptando-as a essa ubiquidade multimídia/interativa em que vivemos. O objetivo deste trabalho é apresentar a experiência de produção de e-picturebooks (correspondentes digitais dos livros ilustrados impressos) por alunos do primeiro semestre do Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design da UFJF, no período 2016-1. A atividade foi desenvolvida na disciplina Seminário de Atualidade Cultural I, como parte do estágio em docência do então mestrando Thales Estefani, sob orientação do prof. Dr. João Queiroz. A importância das mudanças atuais no mercado editorial foi preponderante para a escolha de aplicar essa experiência prática em uma disciplina que se propõe a tratar de atualidades culturais. Palavras-chave: e-book; e-picturebook; digital storytelling; docência; ensino superior

CONTANDO HISTÓRIAS EM MEIOS DIGITAIS Histórias têm sido partilhadas ao redor do mundo com objetivos de entretenimento, educação, preservação cultural, entre outros, durante muito tempo. Uma das formas mais bem-sucedidas de se fazer isso é por meio do livro, que considerando seu formato – o códice – é um artefato que data da Antiguidade (ARAÚJO, 1995). Durante toda sua história o livro não deixou de passar por mudanças e, hoje, a “explosão dos modos eletrônicos de comunicação é tão revolucionária quanto a invenção da impressão com tipos móveis” foi no século XV (DARNTON, 2010, p. 14). O Projeto Gutenberg – primeiro grande projeto de digitalização, arquivamento e distribuição de livros – foi criado por Michael Hart, estudante da Universidade de Ilinois, em 1971, quando ocorria um rápido desenvolvimento da eletrônica e dos processos e ferramentas computacionais. Esse fato marca o nascimento do primeiro e-book (livro digital), uma versão da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, lançada em julho daquele mesmo ano (FLATSCHART, 2014, 17%). Na década seguinte, autores passariam a experimentar a criação de histórias contendo elementos muito diversos, como diferentes categorias de imagem e áudio. Em 1987, o lançamento do software de computador chamado Hypercard, deu um passo adiante no movimento da hipermídia, possibilitando a criação de experiências de storytelling digital como Inigo gets out (Goodenough, 1987), história infantil que possuía “uma série de palavras com hiperlinks, imagens e efeitos sonoros relacionados” (SARGEANT, 2015, p.456, tradução nossa).

1 Mestrando do PPG-ACL, Instituto de Artes e Design – UFJF. E-mail: [email protected]

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GT | LITERATURA E DESIGN No final do século XX, eram muito populares os CD-ROMs com conteúdos variados, incluindo desde jogos educativos e enciclopédias, a narrativas multimídias: o desktop (computador de mesa) apresentava-se também como uma nova alternativa para apreciar histórias. De acordo com a pesquisadora de narrativas digitais para crianças Krystina Madej, quando usamos um computador, temos diante de nós, “combinadas, todas as mídias de storytelling do passado transformadas numa só. [...] É parte tradição oral, parte tradição impressa, parte tradição televisiva, tudo integrado para criar um todo fascinante” (MADEJ, 2003, p.2, tradução nossa). O primeiro e-reader, dispositivo inteiramente dedicado à leitura de livros digitais, chamado The Rocket eBook, foi lançado em 1999 (LEBERT, 2010, 37%). O desenvolvimento das tecnologias computacionais tornou – e o processo continua – os dispositivos digitais cada vez menores, mais eficientes em processamento e capazes de englobar funções cada vez mais diversas. Em 2010, quando o Projeto Gutenberg já oferecia mais de 33 mil e-books baixados por milhares de pessoas todos os dias, a Apple lançava o iPad, um tablet multifuncional com oferta de cerca de 60 mil e-books (LEBERT, 2010, 81%). Novas configurações de storytellings digitais tornaram-se possíveis graças à disseminação de dispositivos computacionais portáteis como esse – tablets e também smartphones. Esses dispositivos têm influenciado a concepção, produção e difusão de livros digitais nos últimos anos, principalmente, por meio da aplicação de novas tecnologias, a introdução de novos profissionais na cadeia produtiva, novas formas de interação com os leitores, novas modalidades de relação com o ambiente físico, e a criação de novas redes de comercialização e acesso a experiências de storytelling digital. O aumento consistente da informatização em diversas atividades cotidianas nos coloca constantemente diante de dispositivos computacionais, com multiplicidade de mídias (áudio, vídeo, texto escrito, etc), formas de interação e acesso à internet. Seguindo uma lógica de mercado que intenciona o acesso ao entretenimento a qualquer hora e em qualquer lugar, “os padrões de consumo de mídia estão cada vez mais móveis, digitais e multi-plataforma [...] uma forma de consumo ‘multitarefa’” (SHOUP, 2016, online, tradução nossa). Contudo, conforme enfatiza Eric Shoup, “uma coisa permaneceu constante para os seres humanos ao longo do tempo: o desejo de uma grande narrativa. Narrativas persistem através de cada revolução tecnológica” (SHOUP, loc. cit). As formas de storytelling digital localiza-se, então, no centro dessa nova configuração, representando uma alternativa para contar histórias, adaptando-as a essa ubiquidade multimídia/interativa em que vivemos. A importância das mudanças atuais nesse mundo da arte cooperou para a escolha de aplicar uma experiência prática de produção de storytelling digital em uma disciplina que se propõe a tratar de atualidades culturais, no curso de Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design da UFJF. De um universo amplo de experiências de storytelling digitais possíveis, optou-se por enfatizar uma categoria específica de e-books, os e-picturebooks. Os pesquisadores Ana Lúcia Pinto, Nelson Zagalo e Eduarda Coquet sugerem o termo e-picturebook para designar os novos livros ilustrados digitais interativos para crianças. Eles propuseram “a designação de e-picturebook para estes artefatos, estabelecendo ligações com o artefato original, do qual ele herda suas principais características”, o picturebook, ou livro ilustrado impresso (PINTO; ZAGALO; COQUET, 2012, p.225, tradução nossa). Os pesquisadores analisaram quatro tipos de experiências digitais de leitura, especificamente: adaptação de livro ilustrado impresso para digital; adaptação de animação para livro digital; livro ilustrado digital com sequência linear; e livro ilustrado digital com sequência não-linear da narrativa. [...] foi confirmado que os e-picturebooks são fiéis aos livros ilustrados, em como eles usam a imagem e o texto verbal e na maneira que ambos estabelecem, entre as mídias utilizadas, as

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GT | LITERATURA E DESIGN relações semânticas. Nós também observamos que a imagem – estática e animada – assume prevalência na comunicação sobre outras mídias utilizadas nos e-picturebooks. (Ibid., p.227, tradução nossa)

Os e-picturebooks analisados pelos pesquisadores supracitados, definidos quanto ao seu formato digital, são o que se denomina book-app. Os book-apps são aplicativos, programas de computador adaptados para fornecer altos níveis de conteúdo interativo e ricos em mídia, desenvolvidos para aproveitar todo o potencial dos sistemas operacionais (iOS ou Android, principalmente) dos dispositivos móveis para os quais são programados. A tecnologia e o conhecimento específico necessários para a produção de aplicativos para tablets e smartphones não poderia ser pré-condição em uma turma do primeiro período do Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design. Dessa forma, os resultados pretendidos com a experiência prática que viria a ser adotada eram de simulações desse tipo de storytelling digital. Informações mais detalhadas do processo são relatadas mais adiante neste artigo. O que falta esclarecer são as características específicas dos e-picturebooks. Em um trabalho recente, buscou-se produzir um levantamento de suas especificidades a partir dos estudos de alguns pesquisadores que se ocuparam de definir o formato digital (book-app, como supracitado) mais associado a essa categoria. As principais características encontradas foram: (i) presença de recursos multimídia; (ii) múltiplas formas de apresentação do texto; (iii) interatividade em tempo real; (iv) gamificação; (v) novas formas de organização do conteúdo (ESTEFANI; QUEIROZ, 2016, no prelo).

O PROJETO DA DISCIPLINA A proposta sugerida para a disciplina Seminário de Atualidade Cultural I (SACI), no primeiro semestre de 2016, foi a de estimular e coordenar os alunos para produzirem experiências de storytelling digital similares a e-picturebooks. A atividade foi desenvolvida como parte do estágio em docência do então mestrando Thales Estefani, sob orientação do prof. Dr. João Queiroz, que ministra a disciplina. Como o próprio nome sugere, a disciplina em questão se propõe a tratar de atualidades culturais em diversos campos, e por sua característica de inovação, possui uma ementa fluida que pode se modificar para incorporar qualquer questão atual dos mundos da arte. A disciplina SACI é parte integrante do currículo dos graduandos do primeiro período do Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design da UFJF. Neste curso de graduação, a formação é dividida em dois ciclos. No primeiro deles, todos os alunos ingressantes devem cursar as mesmas disciplinas. No segundo ciclo, eles ingressam em uma modalidade específica: Bacharelados de Artes Visuais, Design, Moda, Cinema e Audiovisual ou Licenciatura em Artes Visuais. Essa organização permite que as turmas do primeiro ciclo sejam formadas por estudantes com habilidades e interesses bastante diferentes. A interdisciplinaridade presente nas turmas foi bastante importante porque os e-picturebooks que a proposta do SACI pretendia produzir como resultados da disciplina são artefatos que necessitam dos mais diversos recursos artísticos (texto verbal, ilustração, efeitos sonoros, música, animação, etc). Por tratar-se de uma disciplina de primeiro período, o SACI recebe alunos interessados em absorver informações novas, além do desejo de demonstrar suas melhores habilidades num ambiente artístico no qual eles acabam de ser admitidos; ou, até mesmo testar diversos campos da arte ao mesmo tempo para ajudar a tomar uma decisão com relação ao segundo ciclo. Isso representa um

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GT | LITERATURA E DESIGN fator positivo para a proposta apresentada para a disciplina e possível apenas graças ao caráter interdisciplinar do bacharelado em Artes e Design da UFJF.

BASES TEÓRICAS Para que o projeto idealizado para a disciplina funcionasse, nas primeiras aulas, foi necessário introduzir bases teóricas que auxiliassem a prática que os alunos iriam aplicar. Primeiramente, a partir do trabalho de Maria Nikolajeva e Carole Scott, foi apresentado aos alunos o que se convencionou a chamar de picturebook theory. É o campo de estudo dos livros ilustrados impressos, de onde os pesquisadores citados anteriormente se basearam para definir o e-picturebook (PINTO; ZAGALO; COQUET, 2012). Na picturebook theory, os livros ilustrados são definidos como artefatos formados essencialmente por textos verbais e ilustrações, elementos que se organizam no espaço da página dupla (conjunto de páginas par e ímpar justapostas) e que mantém, entre eles, uma relação dialética que os reforça e os modifica mutuamente, criando diversas funções narrativas (NIKOLAJEVA; SCOTT, 2011). Para investigar como as convenções do livro ilustrado podem ser estendidas para o design dos book-apps, originando os e-picturebooks, além de compreender melhor as características desse tipo de livro digital, as pesquisas de Betty Sargeant foram essenciais (SARGEANT, B., 2013; 2015). Uma das principais preocupações ao investigar esses aplicativos com experiências de storytelling para dispositivos móveis é compreender como se dá o uso dos diferentes recursos multimídia e interativos na construção das narrativas. Outro ponto crítico do projeto do SACI era definir que tipo de histórias os alunos contariam por meio dos seus e-picturebooks. Para isso, recorreu-se à pesquisa de Marie-Laure Ryan sobre narrativas (RYAN, 2013). A pesquisadora identifica três tipos de enredos que podem ajudar a contar uma história. O enredo épico corresponde aos enredos arquetípicos dos contos de fadas, que se concentram na jornada de um herói para atingir um objetivo, enfatizando suas ações e motivações. O enredo epistêmico também se concentra na busca de um objetivo, mas, nesse caso, trata-se de desvendar um mistério, como nas histórias de detetive; portanto, explora a criação de pistas em fatos acidentais. O terceiro tipo de enredo é o dramático, que é estabelecido no desenvolvimento de redes de relações humanas e sua progressão no tempo da história (RYAN, 2013, pp. 24-25). Ao identificar esses tipos de enredos, M. L. Ryan argumenta que os mais compatíveis com o recurso da interatividade em narrativas digitais são os épicos e epistêmicos, por conta de suas orientações a um objetivo específico, assim como ocorre nos jogos de videogame (RYAN, 2013, pp. 2728). Esses tipos de histórias podem se aproveitar também dos recursos multimídia dos dispositivos computacionais móveis, em atividades como, por exemplo, visualizar cenas animadas em busca de pistas, ou ouvir efeitos sonoros que contextualizem a sequência da história que se aproxima, etc. Em histórias com enredos dramáticos a implementação desses recursos é mais problemática. Por se apoiar em recursos que pretendem influenciar as emoções e reações do espectador, ao criar rotinas interativas, o designer deveria tentar prever todas as ações e reações possíveis do usuário (RYAN, 2013, p. 29). Portanto, foi escolhido trabalhar com contos de fadas na prática da disciplina SACI, visto que, além de serem histórias bastante compatíveis com recursos multimídia e interativos, em geral, são curtas, demandando um tempo de trabalho um pouco menor.

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GT | LITERATURA E DESIGN FERRAMENTAS E MÉTODOS O plano de trabalho desenvolvido para a disciplina SACI foi organizado da seguinte maneira: 20% das aulas destinadas a apresentações teóricas que balizaram a prática dos alunos; 20% destinadas à apresentação das ferramentas e instruções sobre a utilização delas; 60% dos encontros destinados a monitoria do trabalho e apresentações dos resultados parciais. Os alunos deveriam se organizar em grupos heterogêneos com relação aos interesses pessoais (ilustração, música, audiovisual, design gráfico, etc), de no máximo três integrantes. Para alcançar o objetivo da disciplina, que era transformar contos de fadas em experiências digitais multimídia interativas que simulassem e-picturebooks, foi sugerido aos alunos um conjunto de ferramentas de trabalho. A ideia não era exigir determinadas ferramentas, mas antes, apresentar possibilidades diferentes, que estivessem de acordo com as condições materiais da universidade e econômicas de todos os alunos. Primeiramente, foram apresentados aplicativos para dispositivos computacionais móveis – tablets e smartphones – que têm como propósito produzir experiências de leitura multimídia interativas. São eles: Book Creator, Creative Book Builder e Story2Go. Apenas o primeiro deles, Book Creator, possui uma versão gratuita; e o último, Story2Go, é exclusivo para dispositivos com sistema operacional iOS (produzidos pela Apple). Para explicar o funcionamento dos aplicativos, foram produzidos exemplos de histórias em cada um deles [figuras 01, 02, 03].

Figuras 01, 02. Produção de storytelling digital no Book Creator e no Creative Book Builder, respectivamente.

Figura 03. Produção de storytelling digital no Story2Go.

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GT | LITERATURA E DESIGN Contudo, uma alternativa se mostrou mais proveitosa para a produção das experiências de storytelling: o Power Point. Esse é um software tradicionalmente usado para produzir apresentações em slides, contudo, com a devida instrução, ele pôde se tornar uma ferramenta eficiente para a atividade proposta. O principal motivo para a sua escolha foi a compatibilidade. Enquanto os tablets ou smartphones dos alunos variavam muito no que diz respeito às marcas, aplicativos disponíveis e capacidade de processamento, computadores pessoais, laptops e os computadores do Infocentro do Instituto de Artes e Design, todos compartilhavam da presença do Power Point. Portanto, esse software foi adotado por todos os grupos do SACI. Para evitar problemas com as versões do software, foi estipulada a versão de 2010 como o parâmetro de salvamento dos arquivos finais dos e-picturebooks. Para auxiliar na utilização satisfatória dos recursos do software, um exemplo também foi produzido no Power Point e apresentado aos alunos [figura 04].

Figura 04. Produção de storytelling digital no Power Point.

Como citado anteriormente, para produzir um e-picturebook são necessários diversos recursos artísticos. Portanto, outros aplicativos e recursos online foram sugeridos aos alunos para auxiliar na produção dos elementos multimídia do storytelling. Contudo, foi enfatizado que eles deveriam utilizar suas habilidades artísticas pessoais, bem como os equipamentos e recursos com os quais estavam mais acostumados [figuras 05, 06]. O principal desafio da proposta do SACI era fazer com que histórias fossem transmitidas a partir da significação articulada entre as diversas mídias e suas formas de interação, assim como enfatizaram os pesquisadores que definiram o e-picturebook. Para alcançar esse objetivo, alguns métodos foram empregados. Em um dos encontros, foi apresentada aos alunos a versão de Charles Perrault para Cinderela (Zahar, 2010). Um trecho, em especial, foi destacado. Então, foi apresentado também o e-picturebook da mesma história, produzido pela Nosy Crow (2011). Aos alunos, foi demonstrado como a empresa que produz book-apps transformou certas passagens do texto verbal original em experiências multimídias ou possibilidades de interação. A passagem em que a Fada-Madrinha transforma abóbora e ratos em carruagem e cavalos para levar Cinderela ao baile foi transformada em um mini-desafio no e-picturebook. Cinderela está no jardim e a Fada-Madrinha solicita uma abóbora, ratos e outros objetos que não estavam na história original. O leitor deve procurar em meio as plantas do jardim por cada item que a fada pede, completando o desafio e fazendo a história prosseguir. III SEMINÁRIO DE PESQUISAS EM ARTE CULTURA E LINGUAGENS

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Figuras 05, 06. Exemplos de utilização de habilidades diversas na produção dos e-picturebooks (desenho e fotografia, nos casos acima).

Após a atividade de análise, foi desenvolvida uma experiência prática de projeto. Ela consistia em duas etapas. Primeiro, a leitura minuciosa de um texto (Chapeuzinho Vermelho – versão de Charles Perrault) a fim de identificar os acontecimentos chaves, as ações sequenciais que Marie-Laure Ryan argumenta serem as características principais do tipo de enredo dos contos de fadas (RYAN, 2013). Na segunda etapa, os alunos simularam o projeto dos e-picturebooks, apresentando esquemas de como tratariam aquele trecho da história utilizando elementos multimídias e interações [figura 07].

Figura 07. Alunos do SACI executando as atividades descritas acima.

RESULTADOS Na disciplina SACI, não foi exigido que os e-picturebooks dos grupos estivessem totalmente finalizados, mas que pelo menos cinco slides (usando o termo do Power Point, já que foi a principal ferramenta empregada) estivessem prontos. Na prática desenvolvida nessa disciplina privilegiou-se o processo de aprendizagem e a atividade criativa. Esses fatores foram avaliados através da apresentação que os grupos fizeram dos seus projetos, tendo que explicar e defender inclusive as escolhas

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GT | LITERATURA E DESIGN de recursos que aplicariam nas partes não finalizadas dos seus e-picturebooks. Além disso, um relatório de atividades foi exigido de cada aluno, explicitando suas experiências pessoais. Abaixo, alguns dos trabalhos apresentados pelos alunos. O conto da “Vitória Régia” foi utilizado como fonte para o e-picturebook das alunas Alyne Rocha, Ana Luiza Monteiro e Vivian Fregulia, que projetaram formas muito claras de sugerir interações. Nas figuras abaixo, o ícone da mão, que aparece na frente da árvore, sugere o toque que, executado pelo leitor, faz com que os pássaros fujam [figuras 08, 09].

Figuras 08, 09. “Vitória Régia” e os indicadores de interação.

A versão de “A Pequena Sereia” – de Carolina Lemonge, Juliana Evangelista e Juliana Eros – utilizou variações de cores para trabalhar a carga emocional da história. O e-picturebook, a princípio, é todo em tons de cinza, contendo muitos elementos animados. A partir do momento em que a protagonista passa a se apaixonar, as cores começam a aparecer [figuras 10, 11].

Figuras 10, 11. “A Pequena Sereia”, elementos animados e o trabalho com as cores.

“A galinha ruiva”, de Marcelo Barros, utilizou um conjunto de mídias diferentes – inclusive resgatando um áudio da história, produzido na década de 1960 – para criar um projeto bastante interativo e cativante. Na passagem abaixo, o leitor ajuda a galinha a fazer farinha a partir do milho que ela colheu, mostrando a ela o caminho para o moinho [figuras 12, 13]. III SEMINÁRIO DE PESQUISAS EM ARTE CULTURA E LINGUAGENS

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Figuras 12, 13. “A galinha ruiva”, e-picturebook cheio de efeitos animados, música e narração.

A apresentação dos projetos dos alunos no contexto deste artigo, por motivos de especificidades do meio, claramente não privilegia a experiência de leitura desses e-picturebooks, que trouxeram diferentes contribuições à tarefa de contar histórias em meios digitais. Ao todo, foram produzidas 18 experiências de storytelling digital diferentes. A partir da apresentação dos conceitos trabalhados na disciplina, dos métodos de desenvolvimento e dos resultados apresentados pelos alunos, buscou-se demonstrar as potencialidades do storytelling digital interativo como paradigma bastante específico para contar histórias, o que reestrutura a maneira de pensar a própria história e como coordenar habilidades e demandas artísticas bastante diversas nesse novo campo explorável para os profissionais de artes e design.

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GT | LITERATURA E DESIGN LEBERT, M. Booknology: the ebook (1971-2010). Project Gutenberg, 2010. (ePUB) MADEJ, K. Towards digital narrative for children: from education to entertainment, a historical perspective. In: “Computers in Entertainment (CIE)”, v. 1 (1), pp. 1–17, 2003. NIKOLAJEVA, M.; SCOTT, C. Livro Ilustrado: palavras e imagens. São Paulo: Cosac Naify, 2011. PINTO, A. L.; ZAGALO, N.; COQUET, E. From a click to a gesture: a contribution to defining the concept of children’s e-picturebooks. In: BARBOSA, H.; QUENTAL, J. “2nd International Conference Art, Illustration and Visual Culture in Infant and Primary Education - Creative processes and childhood-oriented cultural discourses”. Aveiro, Portugal: Universidade de Aveiro, v. 1, pp. 223-228, 2012. RYAN, M-L. Interactive narrative, plot types, and interpersonal relations. In: “Intersemiose - Revista Digital”, v. 4 (2), pp. 23-34, 2013. SARGEANT, B. Interactive storytelling: how picture book conventions inform multimedia book app narratives. In: “Australian Journal of Intelligent Information Processing Systems”, v. 13 (3), pp. 29-35, 2013. _____________. What is an ebook? What is a book app? And why should we care? An analysis of contemporary digital picture books. In: “Children’s Literature in Education”, v. 46, pp. 454–466, 2015. SHOUP, E. How to make reading relevant to today’s consumer. In: “Digital Book World”, online, 2016. Link de acesso: Acessado em 05 de junho de 2016, às 15h38.

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