Crimes Digitais: do que estamos falando?

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CRIMES DIGITAIS: DO QUE ESTAMOS FALANDO? A tecnologia impacta em diversos aspectos da nossa vida, de modo que não haveria como não repercutir, também, no Direito Penal. Não há dúvidas, portanto, que a disseminação da tecnologia implica na prática de condutas ilícitas com grande frequência em face do uso mais constante da Internet especialmente em dispositivos móveis, tais como aparelhos celulares e tablets. O incremento da criminalidade no meio digital naturalmente faz crescer o interesse social por conhecimento sobre estes ilícitos e, é igualmente natural que muitos se aventurem a discorrer sobre o tema. Apesar da maior exposição, na mídia, de notícias sobre crimes digitais e de “especialistas” comentando o assunto, fato é que, na doutrina nacional, não há muitos trabalhos e estudos técnicos sobre o tema. De fato, alguma parcela dos que se aventuram nesta temática – inclusive alguns com bom destaque no meio jurídico – não são criminalistas e, portanto, nem sempre a abordagem praticada é tecnicamente adequada ao ramo do Direito envolvido, verificando-se, por vezes, certa superficialidade no trato de questões com repercutem de forma importante para o direito penal e processo penal. Nestes casos, invariavelmente, há prejuízos (de timing e até mesmo financeiros com honorários e perícias) para a apuração do delito porque a estratégia e o assessoramento quanto a produção das provas ignora as particularidades dos ramos penal e processual penal. Mas esta questão sobre a condução da produção das provas será alvo de artigo específico. Vamos, por hora, nos concentrar em definir e explicar o que são os crimes digitais e as razões pelas quais assim são – ou deveriam ser – denominados. Neste sentido, as dificuldades conceituais iniciam-se já quanto à nomenclatura usada para a eles se referir dada a variedade de denominações encontradas em textos técnicos e na mídia: “crimes virtuais”, “crimes eletrônicos”, “crimes cibernéticos”, “crimes de Internet”, “crimes de computador”, “crimes por meio da informática”, “crimes digitais”, entre outros. Considerando-se que “virtual” é algo que não existe em realidade, sendo algo potencial; que “cibernético” refere-se à teoria das mensagens e dos sistemas de processamento de mensagens (em um estudo comparativo entre o funcionamento do cérebro humano e dos computadores) que se encontra em desuso há décadas; e,  

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considerando-se, ainda, que os crimes não são necessariamente cometidos por computadores ou pela Internet, os termos acima não parecem corretos ou precisos, à exceção de uma delas. Assim, a expressão que adotamos como a mais adequada é “crimes digitais” em razão do que se pretende referir: os dados que decorrem da eletrônica digital. Note-se que “digital” deriva do inglês digit, que, por seu turno, deriva do latim, digitus e que significa a forma mais primitiva de exprimir os número (com os dedos da mãos). A eletrônica digital é aquela em que os dados são convertidos nos números “0” e “1”, que formam o sistema binário, base para o armazenamento de dados, mais moderna e atualizada que a eletrônica analógica. Mas, afinal, que são os crimes digitais? São todas as condutas previstas em lei que sejam punidas com pena criminal e cuja prática envolva aparatos tecnológicos, seja porque a conduta destina-se contra os sistemas informatizados e contra dados, seja porque o meio utilizado é tecnológico, embora o crime pudesse ser praticado de outra forma. Há, portanto, basicamente dois tipos de crimes digitais, a saber: a)

crimes digitais próprios ou puros (condutas proibidas por lei, sujeitas a pena criminal e que se voltam contra os sistemas informáticos e os dados. São também chamados de delitos de risco informático. São exemplos de crimes digitais próprios o acesso não autorizado (hacking), a disseminação de vírus e o embaraçamento ao funcionamento de sistemas.

b)

crimes digitais impróprios ou mistos (condutas proibidas por lei, sujeitas a pena criminal e que se voltam contra os bens jurídicos que não sejam tecnológicos já tradicionais e protegidos pela legislação, como a vida, a liberdade, o patrimônio, etc). São exemplos de crimes digitais impróprios os contra a honra praticados na Internet, as condutas que envolvam trocas ou armazenamento de imagens com conteúdo de pornografia infantil, o estelionato e até mesmo o homicídio.

Simplificando, pode-se dizer que os crimes digitais são tanto os crimes tradicionais, já previstos na legislação, contra os valores que tradicionalmente reconhecemos como merecedores de proteção, praticados com auxílio da mais moderna

 

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tecnologia, bem como as condutas ilícitas passíveis de penas que se voltem contra os sistemas informatizados e os dados. Para maior detalhamento, vide o nosso “Crimes Digitais” (Saraiva: São Paulo, 2011). Feitos tais esclarecimentos, cremos ter desfeito um antigo equívoco que vinha sendo mencionado como um verdadeiro mantra até, pelo menos, dezembro de 2012. O equívoco mencionado decorre das afirmações então feitas de que em razão da inexistência de normas específicas, a persecução penal de ilícitos praticados no âmbito tecnológico era inviável senão impossível. Mas, como vimos, sob a ótica da classificação dos crimes digitais próprios (ou puros) e dos crimes digitais impróprios (ou mistos), tal ideia mostrava-se equivocada. Fato é que quanto aos crimes digitais próprios o cenário foi alterado em 2012 com a edição das leis nº 12.735 e 12.737 que ficaram conhecidas, respectivamente, como “Lei Azeredo” e “Lei Carolina Dieckmann” em alusões ao relator do projeto que se tornou lei e, também, à atriz protagonista de episódio em que teve fotos com conteúdo de nudez divulgadas por toda Internet. Com a edição das leis acima, os crimes digitais, cada vez mais comuns no nosso cotidiano, passaram a contar com mais algumas normas que tipificam condutas antes irrelevantes para o Direito Penal. Mas isso é assunto para o próximo artigo, onde esclareceremos o conteúdo das leis 12.735 e 12.737 de 2012.

Publicado

em

http://canalcienciascriminais.com.br/artigo/crimes-digitais-do-

que-estamos-falando/

 

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