CRISE ECONÓMICA E DESENVOLVIMENTO: Desafios para a Gestão Local

July 17, 2017 | Autor: Lodovico Passo | Categoria: Development Economics
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CRISE ECONÓMICA E DESENVOLVIMENTO: Desafios para a Gestão Local

Lodovico Sidónio Passo[1]

RESUMO


A palavra crise nunca foi tão difundida como nos últimos tempos. Cenários
actuais mostram como a estrutura do mundo ficou abalada e por consequência
as estruturas financeiras que afectaram o processo de desenvolvimento nos
países em desenvolvimento. O presente artigo discute as implicações das
crises nos programas de Desenvolvimento Econômico Local (DEL) e analisa o
papel das Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPMEs) na contenção dos
efeitos das crises e na geração do dinamismo econômico. A nossa hipótese de
trabalho se fundamenta na importâcia do DEL não como uma panaceia em meio
às crises mas, sobretudo como uma ferramenta de gestão local que funciona
no seu contexto e que traz melhorias significativas nas condições de vida
das populações e no desenvolvimento dos territórios por ele subscritos.
Partindo de cenários descritos pela crise (desemprego, falências e
desinvestimentos, etc.), muitos dados apontam que ela afecta a dinâmica da
gestão local através da perda do dinamismo econômico na medida em que
contribui para diminuição de postos de trabalho, gerando uma situação de
crise social. O trabalho é resultado de uma sistematização de dados que
traz um cruzamento transversal de teorias socioeconômicas para explicar os
efeitos das crises na gestão local dos programas de desenvolvimento. O que
me parece, em particular, relevante na transformação económica das últimas
décadas, é a aparição progressiva, em todas as escalas observavéis de
pequenos empreendimentos, a inversão das trajectórias do desenvolvimento
territorial e a incapacidade dos velhos modelos teóricos para interpretar
as novas mudanças da realidade dinâmica.


Palavras chave: Gestão Local; Crise Económica; Desenvolvimento Econômico;
Moçambique.


Código JEL: H76; O18; R11


ABSTRACT


The article discusses the implications of the crisis in the Local Economic
Development (LED) and examines the role of micro, small and medium
enterprises (SMEs) in the effects of crises and generation economic
dynamism. Our hypothesis is based on the importance of LED not as a panacea
in crises scenarios, but as a local management tool that works in their
context and which brings significant improvements in the conditions of life
(through employment and income) and in the development of the territories
signed by him. Staring in the scenarios described by crisis (unemployment,
bankruptcies and divestitures, etc.), many figures appoint that it affects
the local management dynamics, the loss of economic dynamism in helping to
decrease jobs (mainly on transnational corporations), generating a
situation of social crisis. The work is the result of data systematization,
associated with my master's dissertation, which brings a transverse across
of socioeconomic theories to explain the effects of the crisis in the local
management of development programs. I think that, in particular, relevant
in the economic transformation in recent decades, is the gradually
appearance, in all seeks scale of small businesses, the inversion of
territorial development paths and the inability of old theoretical models
to interpret the new changes through the dynamic reality.























Key Words: Local Management; Economic Crisis; Economic Development;
Mozambique.


JEL Code: H76; O18; R11

1. INTRODUÇÃO


A dinâmica da gestão local em meio às crises é parte de um estudo que não
procura esgotar a discussão em torno do assunto por duas questões
aparentemente óbvias: a primeira se relaciona com a dúvida de se saber se a
crise chegou verdadeiramente ao fim; e a segunda, pelo facto de ela afectar
profundamente os sectores que em nada contribuem para sua eclusão. Para
isso, Dowbor (2003 & 2008) assim como Magaia (2009) convidam-nos a fazer
bem as contas sobre os números assustadores contabilizando que, 55 milhões
de pessoas passaram para a condição de pobreza absoluta no mundo. O
crescente desemprego e o colapso das redes de protecção social ligadas a
áreas como educação e saúde estão na rota de colisão com os mais nobres
valores da ética económica.


Considero oportuno começar por fazer uma contextualização das dinâmicas da
gestão local enfantizando o papel relevante das Micro, Pequenas e Médias
Empresas (MPMEs) como elementos endógenos e principais actores na geração
do dinamismo económico. No segundo ponto do trabalho fazemos referência a
avaliação do contexto moçambicano. Pode parecer uma posição bastante
estranha fazer esta avaliação pela insuficiência de dados. Não obstante,
constitui um desafio no qual devemos considerar os seguintes fenómenos:
antes de tudo, as crises afectam mais aos países dependentes da ajuda
externa onde lhes são exigidos reformas nas leis gerais (Política Económica
e Monetária, Trabalhista, cambiais e regulamentos sociais); por outro lado,
as políticas de gestão local (geração de emprego e renda) programadas pelos
governos dependem de um conjunto amplo de aspectos económicos e sociais que
dependem do financiamento externo e reduzem o papel do Governo. Na terceira
parte debruçamo-nos sobre os cenários pós-crise para aferir se ela
verdadeiramente chegou ao fim, uma vez que os sectores e os países que em
nada contribuem para a sua eclosão serem os que mais sofrem. Como com os
novos modelos de desenvolvimento estão a surgir novos actores (instituições
locais, administração local, actores privados, colectivos, etc.) que
permitem influenciar o processo de transformação económica e social, e que
os modelos teóricos anteriores haviam esquecido relembramos alguns
aspectos para melhor nos direccionarmos na actual conjuntura. Por fim, e
pela dificuldade de fazer afirmações concludentes trazemos as considerações
finais que espelham a nossa observação como académicos e pesquisadores.


2. CRISE ECONÓMICA E DESENVOLVIMENTO LOCAL


O termo desenvolvimento local tem vindo a ser cada vez mais usado nas
políticas públicas durante a última década, a diferentes níveis. Este uso
alargado do termo é partilhado por alguns países ocidentais, como os EUA e
outros da União Européia (UE), frequentemente associado a uma solução
organizacional: as "Agências de Desenvolvimento Económico Local" tornaram-
se dispositivos comuns para combater uma vasta gama de problemas que
afectam os territórios, com principal enfoque para a pobreza. Por outro
lado, esta abordagem tem origem em estratégias definidas por instituições
internacionais - como o Banco Mundial - como forma de aumentar a eficácia
dos programas nos países em desenvolvimento. O desenvolvimento económico
local é encarado, nesta perspetiva, como uma alternativa à tradicional
abordagem vertical, do topo para a base, adotada por estas instituições,
com resultados amplamente criticados.


2.1. Contextualização dos Cenários de Crises


O conceito de desenvolvimento local abriga as noções de inclusão política
(por meio de participação popular em discussões e decisões sobre
iniciativas em uma região); inclusão produtiva (independência económica da
população) e integração com o meio ambiente. A crise financeira mundial
pode trazer, a oportunidade de se "ter um enfoque de desenvolvimento mais
de baixo para cima". Essa visão, voltada para o pequeno produtor, daria
mais espaço a alternativas como bancos comunitários (geridos pelas próprias
comunidades) e maior oferta de microcrédito (direccionado a pessoas de
baixa renda).


A idéia também é defendida pelo economista Ladislau Dowbor, em seu texto
Desenvolvimento Local: crise e oportunidade, no qual afirma que as
iniciativas locais têm de buscar "transformar a crise em oportunidade". O
texto ainda defende: "[o desenvolvimento local deve] buscar uma dinâmica de
desenvolvimento cujo eixo é bastante evidente: expandir as políticas
distributivas, aprofundar o mercado interno, permitindo que as pessoas da
base da pirâmide tenham acesso a bens que lhes são necessários, e
dinamizando ao mesmo tempo a conjuntura para ajudar as empresas. As
soluções do global nem sempre estão lá em cima".


Não tenhamos ilusões. A instabilidade financeira, acarreta desilusões,
brigas e confusões a todo instante. Trás transtornos que afectam de tal
modo a economia e a sociedade, que ela perde todas as estruturas que vinham
sendo construídas ao longo dos tempos[2]. A crise económica que
atravessaram os países centrais desde o final dos anos 60, como
consequência da falência do modelo de desenvolvimento fordista, se
manifestou em situações de estancamento com inflação, queda da
produtitividade e esgotamento dos sectores industriais "maduros". Isto tudo
levou as entidades bancárias a explorar as possíveis situações financeiras
em outros mercados externos para reciclar seus excendentes de eurodólares e
petrodólares. A crise actual iniciada nos EUA que entraram em recessão em
2001, após o estouro da bolha das empresas da chamada Nova Economia (as
empresas "ponto com"). Os juros foram baixados para apenas 1% ao ano em
junho de 2003. A consequência do corte de juros foi o reaquecimento da
economia americana, o que gerou o "boom" no mercado imobiliário dos Estados
Unidos[3].


As empresas hipotecárias focaram no grupo de clientes chamado "subprime".
Estes clientes representam um risco maior de pagamento, mas trazem taxas de
retorno mais altas. Gestores e fundos bancários se interessaram nessas
dívidas hipotecárias. Essas instituições compraram os títulos hipotecários
do grupo "subprime" e parte da quantia foi emprestada, antes da primeira
dívida ser quitada. Investidores passaram a recomprar esses títulos,
criando uma cadeia de venda de títulos baseada na confiança da compra do
consumidor.


Em 2006 surgiram os problemas perceptíveis. Os preços das casas, as taxas
de juros não pararam de subir e os proprietários ficaram em dificuldades de
manter as prestações das hipotecas, já que os contratos previam correcções
e, neste caso, o aumento da inadimplência[4] foi inevitável. As
instituições financeiras que revenderam derivativos dos títulos "subprime"
ficaram em situação problemática. Gerando uma cascata de inadimplências,
que resultou numa crise de liquidez e, consequentemente, retracção de
crédito.


Como as crises afectam a gestão local? Quais sectores e de que forma?


As crises afectam a gestão local na medida em que criam limitações de
crédito e financiamentos de acções de desenvolvimento trazendo
consequências desastrosas para a população, principalmente a de baixa
renda. Neste caso, quando falamos da gestão local, falamos de uma
engenharia socioeconômica que desempenha um papel de pivôt no
fortalecimento da inclusão e participação das populações pobres e
vulneráveis nas decisões que tenham algum impacto nas suas vidas; na
mobilização de recursos para promover o desenvolvimento económico e reduzir
as assimetrias regionais através de investimentos em sectores-chave do
desenvolvimento económico local (por exemplo, saúde, educação, transportes
e infra-estruturas das comunicações), que são os mais significantes
condutores do crescimento económico e do desenvolvimento socioeconómico bem
como da redução da pobreza.


A importância dessa engenharia se encontra no seu contexto que leva consigo
todo processo de inovação e desenvolvimento. É um fenômeno mundial que nos
seus conteúdos ajuda na melhoria dos programas de contenção das crises nos
sectores mais afectados e aos governos na melhoria de políticas públicas de
apóio ao desenvolvimento local. Ademais, outro ponto importante a sublinhar
é que o mecanismo global de desenvolvimento e de rupturas económicas não
consiste num jogo cerrado entre o global e o local ou recessão e expansão,
é dizer, que a relação entre os fenómenos económicos podem basear-se
exclusivamente numa articulação de contenção de crises através acções de
cooperação e luta competitiva.


Portanto, o crescente papel das economias externas e as vantagens da
aglomeração, assim como a internacionalização da produção, a reaglomeração
marcada da produção, por um lado, e a globalização de fluxos económicos,
por outro, explicariam o puzzle teórico actual (SCOTT & STORPER: 1990). Por
sua vez, Alburquerque (1998: pp. 13), traz também a inovação tecnológica
como elemento explicativo da dinâmica econômica, principalmente na
concertação dos sectores, actores e políticas envolvidas; para além de
visualizar os aspectos básicos na análise de uma estratégia de
desenvolvimento, destacando que os principais desafios na actual fase
histórica de transição correspondem ao nível "micro" da mudança de
paradigma técnico-econômico e organizativo da produção, e ao nivel "meso"
das necessárias adaptações sociais, culturais e institucionais dentre as
quais cabe citar a reforma e descentralização do Estado.


2.2. Dinamismo Económico e Inovação Tecnológica


Sobre este ponto, vale a pena relembrar Keynes que, quanto ao dinamismo
económico, defendia um programa político que combinasse eficiência
económica, justiça social e liberdade individual. Mas essa combinação
dependia de um avanço civilizatório e tecnológico [grifo meu]. Além de
defender uma política deliberada de promoção de emprego por parte do
Estado, Keynes combateu as supostas virtudes de desigualdade na
distribuição de renda como via de acesso à criação de poupança. O jogo de
criar fortunas deveria ser submetido a regras e limitações, sem ser
eliminado. O principal limite deveria se concretizar na "eutanásia do
rentista", onde o especulador sem função produtiva cria uma falsa escassez,
manipulando os títulos de propriedades em seu poder – que uma vez
eliminados, o caminho em direcção à satisfação das necessidades humanas
estaria livre.


Albuquerque (1998: pp. 15) coloca a inovação tecnológica (nesta acepção,
importa referir também o papel das Micro, Pequenas e Médias Empresas –
MPMEs)[5] como principal gerador da dinâmica económica e a tecnologia como
elemento chave da competitividade. Na mesma abordagem Bueno & Morcillo
(1993) citados por Alburquerque opinam que, as inovações tecnológicas
sempre estiveram presentes na origem das revoluções industriais. Assim, a
incorporação de novas técnicas supõe modificar os sistemas de fabricação, o
que conduz a aumentos de produtividade e reduções de custos que, por sua
vez, repercutem favoravelmente no potencial da demanda. Por outro lado, a
incorporação de novas tecnologias permite melhorar os sistemas de
transporte e comunicações, assim como elevar os níveis de qualidade e
variedade da oferta de produtos e serviços.


Não obstante, importa salientar que todas estas inovações tecnológicas
requerem mudanças ou melhorias no funcionamento, assim como diferentes
tipos de interacção entre agentes sócio-económicos e institucionais em
nível local, às vezes como pre-condição para que as melhorias tecnológicas
possam ser introduzidas. Na realidade, segundo Albuquerque (1998), cabe
destacar que as inovações técnicas nunca se dão no vazio, senão como parte
das transformações sociais e institucionais assinaladas. É por isso que a
inovação tecnológica terá de ser entendida no seu sentido mais amplo, quer
dizer, vinculada aos processos de mudança e inovação social que a
viabilizam.


São inovações sociais, por exemplo, as novas alternativas e métodos de
gestão de pessoal, tais como a racionalização das jornadas de trabalho, a
melhoria das condições de trabalho, o aperfeiçoamento dos sistemas de
motivação e a delegação de responsabilidades e competências pessoais,
dentre outras. Assim, em muitas ocasiões, o êxito competitivo não depende
tanto da aquisição de novas máquinas como de melhorias organizativas e
mudanças sociais e culturais que permitam o estabelecimento de redes de
comunicação mediante as quais seja possível unir esforços e gerar sinergias
positivas com vista em: i) aumentar a qualidade dos serviços prestados
pelas empresas (o que implica melhorar as relações pessoais no seio do
grupo de trabalho como requisito para incrementar a produtividade); ii)
manter e dinamiizar o potencial de criatividade, inovação e solução de
problemas (para o qual se requer um ambiente propício à expressão e
ampliação dos talentos pessoais; e iii) satisfazer às necessidades e
exigências que surgem das constantes mudanças da demanda (Ibid.).


Do mesmo modo, e como parte desse contexto social de inovação, deve-se
considerar as mudanças insititucionais necessárias nos diferentes planos
territoriais e funcionais da administração pública, a fim de facilitar tais
processos de adaptação em suas dimensões económicas, sociais, ambientais e
culturais. Sobre este ponto (ver esquema 1) importa destacar a importância
da escola francesa[6] da regulação que nos chama atenção sobre os três
elementos principais que devem ser considerados na análise de todo modelo
de desenvolvimento: o paradigma técnico-económico, o regime de acumulação e
o modo de regulação. De acordo com os ensinamentos da escola francesa, o
paradigma técnico-económico enfoca essencialmente os aspectos substantivos
em nível microeconómico, tais como a base tecnológica e energética, a
estrutura produtiva sectorial e territorial, o tecido empresarial, a
organização do trabalho e a relação salarial, a gestão empresarial e
outros. Trata-se, precisamente, dos elementos que estão sendo questionados
na actual fase de transformação produtiva e tecnológica, aos quais as
intervenções dirigidas à inovação ou modernização produtiva devem dedicar
uma atenção especial ou prioritária.


Deste modo, afirma-se que o tipo de políticas que se centra exclusivamente
na correcção dos desequilíbrios macroeconómicos é insuficiente para
garantir a inovação do tecido económico e empresarial e, portanto, é
incapaz de assegurar o desenvolvimento produtivo (ALBUQUERQUE: 1998).
Esquema 1: Elementos Principais para Análise de um Modelo de
Desenvolvimento












































Fonte: Albuquerque (1998: pp. 16). Elaboração própria.

O regime de acumulação se refere à inter-relação e à conquista dos grandes
equilíbrios macroeconômicos entre as diversas fases do processo económico
(produção, financiamento, distribuição, intercâmbio e consumo), com a
finalidade de garantir o processo de acumulação ou reinversão produtiva,
isto é, a reprodução ampliada do capital. Finalmente, o modo de regulação
aponta para o marco social, institucional e de negociação entre actores que
busca facilitar o funcionamento do modelo de desenvolvimento a partir do
âmbito sociopolítico.


A inserção externa da economia será, em grande medida, uma resultante de
ações relacionadas com estes três principais níveis de análise. Como se
pode ver, o desenvolvimento não exige somente acções para o êxito dos
equilíbrios macroeconómicos, mas também, e fundamentalmente, melhorias e
modificações no plano microeconómico, quer dizer, no seio da actividade
produtiva, trabalhista e de gestão empresarial, além de reformas e mudanças
de conteúdo no nível mesoeconômico (ou intermediário) da atuação das
administrações públicas e a negociação estratégica com os agentes sócio-
económicos.


2.3. Desenvolvimento Económico Local e Mudança Tecnológica


O contexto de desenvolvimento económico local mudou radicalmente desde 1980
nos países de baixa renda. Em Moçambique, até um pouco antes de 1990 as
condições de desenvolvimento local eram moldadas por instituições do
governo central que, através de instituições paraestatais, forneciam apoios
chaves como sementes, fertilizantes e serviços de extensão. A noção de
desesenvolvimento econômico local está mudando e isto também representa um
novo desafio para os âmbitos locais. Estamos a passar de uma concepção de
desenvolvimento como algo adquirido, através da dotação de capital físico,
conhecimento, recursos, para chegar à concepção de desenvolvimento como
algo gerado a partir das capacidades dos actores locais.


Em Moçambique como em vários países, o desenvolvimento é visto
tradicionalmente como um conjunto de atributos adquiridos, tais como o
crescimento do PIB percapita, a industrialização da estrutura económica, a
democratização e modernização da sociedade, em geral a partir de impulsos
provenientes de fora de fronteiras nacionais (via a ajuda ao
desenvolvimento dos organismos internacionais), como exógenos às regiões
subnacionais (via a planificação centralizada ou a renúncia territorial de
recursos).


O DEL é um processo ou ferramenta que implica a introdução constante de
inovações tecnológicas e organizativas na base produtiva que constitui, um
elemento determinante do incremento da produtividade e da competitividade.
Na realidade, segundo Abulquerque (1998), os principais desafios da
revolução tecnológica e organizativa se encontram hoje nos níveis
microeconómicos e mesoeconómicos. A crescente globalização económica, o
grau de exposição externa das diversas economias e as maiores exigências
que impõe a disputa competitiva nos distintos mercados não fazem senão
acentuar a necessidade de inovações ou adaptações nestes níveis.


Assim, a literatura corrente associa o desenvolvimento económico local à
mudança tecnológica. No actual contexto da globalização, os países tendem
cada vez mais a alinhar suas taxas de juros com as das economias mais
importantes, numa tentativa de conter as saídas de capitais. Por outro
lado, seguir impulsionando uma estratégia de crescimento económico baseada
em baixos salários ou na exploração de recursos naturais baratos constitui
uma aposta extremamente vulnerável que, na falta de alternativas de curto
prazo, só pode justificar-se como uma etapa meramente provisória, dentro de
um processo que deve ir incorporando, de forma progressiva, as inovações
tecnológicas, organizativas e sociais já mencionadas, as quais podem
permitir a criação de novas actividades, manter maiores níveis de valor
acrescentado na produção, abrir mercados, revitalizar sectores
"amadurecidos" e, em resumo, reforçar o tecido empresarial. Neste caso, ao
conceder prioridade à inovação tecnológica possiblita-se a passagem das
vantagens comparativas de carácter estático, baseadas na dotação de
factores, às vantagens competitivas dinâmicas, que se sustentam em
melhorias de produtivdade e qualidade e na maior diversificação de bens e
serviços – dinamismo económico: promoção do desenvolvimento económico
local.


De acordo com Abulquerque (1998), a sequência em que se incorporam as
inovações tecnológicas radicais é também fundamental para explicar a
dinâmica económica a longo prazo. Com efeito, a análise das "ondas largas"
da acumulação capitalista permite distinguir os diversos momentos
históricos em que se produziram transformações substanciais na base
tecnológica e energética dos processos de transformação económica, os
quais, ao abrir novos horizontes de maiores lucros empresariais, acabam
estimulando os investimentos produtivos.


Nesta sequência, Abulquerque escreve que em determinados momentos
históricos e durante períodos prolongados, produzem-se restruturações de
grande profundidade nos planos económico, social, institucional e cultural,
que implicam uma verdadeira ruptura com as formas de produzir e pensar, com
os valores básicos e as instituições preexistentes, com o tipo de relações
entre actores sociais e politicos, e outras. Tratam-se de longos períodos
de transformação produtiva, organizativa e social, que supõem uma
verdadeira fase de transição, durante a qual, de forma multidimensional,
vão-se acumulando disfunções entre o velho e o novo e sobrepondo-se aos
anteriores os modelos emergentes de funcionamento, tudo o que cria
fricções, confusão e, sobretudo, maiores dificuldades para perceber o
sentido e a profundidade das mudanças. Em todo caso, é útil uma breve
reflexão sobre as principais forças dinâmicas que nos conduziram até esta
fase do capitalismo transformado, hegemônico no mundo actual.


3. AVALIAÇÃO DO CONTEXTO MOÇAMBICANO


3.1. Pressupostos


O pensar no desenvolvimento local em Moçambique visa consolidar a
planificação participativa pelo desenvolvimento integrado do território.
Com a finalidade de assegurar que as políticas e programas nacionais
assumam uma natureza explicitamente pró-rural, e gerar mudanças no atual
padrão de acumulação de capital na economia nacional, o Governo prosseguiu
com a implementação da Estratégia de Desenvolvimento Rural (EDR),
orientando a sua ação para o aumento da competitividade e acumulação da
economia rural, o reforço da atividade financeira rural, aumento do acesso
a tecnologias e a eficácia institucional e de governação (MOÇAMBIQUE: 2008;
pp. 122).


Não obstante, o avanço da globalização económica e os desafios da nova
revolução tecnológica e organizativa destacam hoje em dia a necessidade de
que nos países em desenvolvimento se explore a complexidade de aspectos
interrelacionais, a fim de sondar a viabilidade das diferentes propostas de
desenvolvimento económico, assim como as linhas de actuações mais
apropriadas em tal sentido. Contudo, as grandes potências buscaram ou ainda
buscam aplicar fórmulas combinadas de controle dos grandes equilíbrios
macroeconómicos para o país. Sem dúvida, dada a insuficiência das medidas
macroeconómicas globais no momento em que os principais desafios da
reestruturação tecnológica e organizativa apontavam aos níveis micro e
macroeconómicos, a crise colocou em causa a validade dos enfoques teóricos
e a natureza das políticas de desenvolvimento produtivo e industrial
nacional.


Neste contexto se retoma a reflexão sobre as experiências de
desenvolvimento local como formas diferenciadas de ajuste produtivo no
espaço, que não se sustentam no desenvolvimento concentrador e
hierarquizado, baseado na grande empresa industrial e com viés urbano, mas
buscam aplicar os recursos potenciais de carácter endógeno para assim
recriar um "ambiente" institucional político e cultural que fomente as
actividades produtivas e de geração de emprego nos diversos âmbitos
territoriais. Neste sentido, o avanço da descentralização político-
territorial constitui uma ferramenta poderosa para identificar com maior
segurança os recursos locais existentes e facilitar a negociação
estratégica entre os diferentes actores sociais no território.


3.2. Micro, Pequenas e Médias Empresas como Factores Decisivos para o DEL


Um elemento que caracteriza o papel das MPME's como factor decisivo para o
Desenvolvimento Económico Local em Moçambique foi sem dúvida o processo de
descentralização. Sobre isso, Passo (2009) escreve que, a descentralização
de competências às Administrações Locais visou estimular novas iniciativas
por parte dos actores territoriais acerca da melhor utilização do potencial
local para o desenvolvimento económico. Na mesma linha Osborne & Gaebler
(1994) e Alburquerque (2004) analisam o avanço e o conteúdo dos diferentes
processos de descentralização e democratização, como elementos que
facilitam a libertação de potencialidades de desenvolvimento de pequenos
empreendimentos locais.


Nesta ordem Dowbor (2008) escreve que:


Ao se deslocar boa parte das iniciativas do
desenvolvimento para o nível local, aproximam-se à decisão
do espaço onde o cidadão pode efetivamente participar,
enfrentando em particular a "marginalidade urbana" que se
tornou à forma dominante de manifestação da nossa tragédia
social (pp. 76).


Assim, o sucesso do Desenvolvimento Económico Local, e o desenvolvimento em
geral requerem a participação dos actores interessados nas diferentes
iniciativas locais e no (re)desenho, (re)formulação e execução de
diferentes linhas de actuação (ALBURQUERQUE: 2004; DOWBOR: 2008). Para
isso, Alburquerque (2004) sublinha que, é necessária a criação de
instituições (organizações, normas e regras de conduta entre os actores,
confiança mútua) apropriadas para o desenvolvimento local, o qual forma
parte do nível intermédio ou "mesoeconômico". O nível mesoeconômico
determina o exercício de concertação entre os diferentes actores
territoriais, assim como o pacto social resultante entre os mesmos,
orientando a construção de entornos inovadores locais, os quais podem ter
formas diferentes em cada caso, segundo a problemática mais destacada ou
urgente, ou, segundo o perfil produtivo e empresarial do território. Em
todo o caso, as "melhores práticas" existentes a nível internacional
mostram um universo interessante de "Agências de Desenvolvimento Económico
Local ou Regional", "Centros de Empresas e Inovação", "Institutos
Tecnológicos", "Observatórios Locais de Emprego", entre outras figuras, que
tratam de apoiar as micro, pequenas e médias empresas locais, dando conta
com ele, do distinto grau em que se pode determinar dessa construção ou
"acondicionamento" do território para o Desenvolvimento Económico Local.


O exemplo da Província de Nampula mostra que o processo de integração do
DEL na Planificação estratégica e operacional com ênfase na Potencialidade
(vetores de desenvolvimento e respectivas cadeias de valor) conduziu aos
seguintes resultados:


Constituídas 31 micro empresas (MERAS) de produção de material local e
construção civil e 1 em fase de constituição de gestão de recursos
naturais. Realizaram-se 3 módulos de capacitação em organizações
associativas de produção de material local;


Assistência Técnica à ADEL de Nampula (ADELNA) com a colocação de um
UNV e reforço da sua capacidade de assistência produtiva às
iniciativas emergentes;


Em processo a constituição da Rede do DEL Provincial e distritais.


Normalmente, quando se fala de estratégias de desenvolvimento económico,
com frequência se é levado a pensar em processos vinculados à
industrialização, terceirização e urbanização, os quais são assimilados à
"modernização". Deste modo, a estratégia de desenvolvimento, "desde cima",
de carácter concentrador e baseada na grande empresa, passa a ser
considerada (a título de uma grande "idéia força") como a via fundamental
para conquistar o objectivo traçado. A fortaleza das convicções
ideológicas, reiteradas de forma acrítica através das instituições de
ensino da economia ou dos principais meios de comunicação, ajuda a explicar
a persistência de uma percepção incompleta sobre o desenvolvimento. Porém,
é preciso destacar que a estratégia de desenvolvimento concentrador não é a
única existente nem a única possível, já que igualmente têm decisiva
importância, sobretudo, em termos de emprego e espaço territorial, outras
estratégias de desenvolvimento "desde baixo", de carácter mais difuso e
sustentadas por factores não somente económicos, mas também sociais,
culturais e territoriais.


Geralmente, este tipo de desenvolvimento económico de corte local ou
regional, baseado na utilização de recursos endógenos e geralmente levado
adiante por pequenas empresas, tem surgido com pouco (ou nenhum) apoio
político ou administrativo por parte das instâncias centrais da
adminstração pública. O surgimento de tais iniciativas de desenvolvimento
local tem dependido essencialmente dos agentes territoriais, os quais têm
articulado diversos esforços em tal sentido (VÁZQUES BAQUERO: 1988).


Deste modo, o pensar no desenvolvimento local em Moçambique visa consolidar
a planificação participativa pelo desenvolvimento integrado do território.
Com a finalidade de assegurar que as políticas e programas nacionais
assumam uma natureza explicitamente pró-rural, e gerar mudanças no actual
padrão de acumulação de capital na economia nacional, o Governo prosseguiu
com a implementação da Estratégia de Desenvolvimento Rural (EDR),
orientando a sua acção para o aumento da competitividade e acumulação da
economia rural, o reforço da actividade financeira rural, aumento do acesso
a tecnologias e a eficácia institucional e de governação (MOÇAMBIQUE: 2008;
pp. 122).


Naturalmente, o apoio político e administrativo que venham a prestar os
sectores públicos locais e a convicção de que devem desempenhar um papel no
fomento económico territorial são factores decisivos nestas iniciativas de
desenvolvimento local, para as quais é também fundamental a negociação
estratégica entre atores sócio-económicos locais (associações de
empresários, entidades financeiras, centros de consultoria para empresa,
universidades e institutos de pesquisa e desenvolvimento, dentre outros),
com o objectivo de incorporar inovações tecnológicas e organizativas no
tecido empresarial e produtivo local (ver figura abaixo).








Gráfico 1: Factores Decisivos para o Desenvolvimento Local












Fonte: Abulquerque (1998). Elaboração própria.

Como se sabe, a conquista dos equilíbrios macroeconómicos não garantem por
si só o desenvolvimento económico. Este depende, fundamentalmente, da
contínua capacidade para introduzir inovações tecnológicas, gerenciais e
organizativas no nível microeconómico da actividade produtiva e do tecido
empresarial territoriais. Igualmente, faz-se necessário efectuar uma série
de intervenções em nível meso-económico, âmbito no qual tanto o sector
público como os agentes privados empresariais devem ser capazes de abrir
espaços de negociação estratégica e construir uma institucionalidade
político-adminstrativa que apoie o desenvolvimento.


O avanço dos processos de descentralização política deve facilitar a
identificação e o fomento de iniciativas de carácter produtivo e
empresarial, já que precisamente disto dependem a mais ampla difusão do
crescimento económico e a maior geração de emprego produtivo (factores
decisivos para conseguir o objectivo da equidade social), assim como a
aquisição de um conhecimento mais cabal sobre as características concretas
do meio ambiente territorial. Em resumo, para impulsionar o desenvolvimento
económico com equidade social e sustentabilidade ambiental é imperativo
formular políticas mistas nas quais as medidas encaminhadas para alcançar
os principais equilíbrios macroeconômicos sejam acompanhadas de outras que
busquem fomentar as potencialidades existentes no território, tarefa na
qual tanto os governos regionais como locais devem desempenhar um decisivo
papel como animadores e facilitadores da criação de instituições de
desenvolvimento produtivo e empresarial.


3. CENÁRIOS PÓS-CRISE


3.1. Moldando um mundo pós-crise[7]


O que o mundo está experimentando actualmente com a crise financeira e suas
consequências é o nascimento de uma nova era – um despertar para reformas
instituicionais, nossos sistemas e, acima de tudo, nosso modo de pensar. É
um chamado para nos lembrar da necessidade de ajustar nossos valores às
necessidades de um mundo que espera, com razão, um maior grau de
responsabilidade e responsabilização.


Se reconhecermos a crise como sendo realmente transformadora, poderemos
estabelecer os alicerces para um mundo mais estável, mais sustentável e até
mesmo mais próspero após a crise. Dado o contexto dos eventos recentes, o
Encontro Anual do Fórum Económico Mundial provavelmente é um dos mais
sérios em anos. Se nos concentrarmos em nossos objectivos, Davos pode ter
um papel em um processo global para colocar a crise sob controle, procurar
soluções para um relançamento da economia e instilar nova direcção e
esperança.


3.2. Apoio aos Governos


Schwab (2009), colocou cinco objectivos específicos para a reunião do Fórum
Económico Mundial:


O primeiro centra-se no apoio aos governos, e particularmente o G-20.
Para Schwab, os governos têm um papel crucial no tratamento dos riscos
sistêmicos nos sistemas financeiros para estabilizar e relançar a
economia. A negação de verdades politicamente inconvenientes combinada
com o instinto de "manada" fez com que nos apoiássemos por muito tempo
em sistemas ultrapassados, insustentáveis, que sofreram abusos por
algumas pessoas que agiram de modo fraudulento e sem ética. De acordo
com o autor, é preciso fazer uma ampla avaliação dos fracassos do
sistema e dos erros que cometemos. Mas é ainda mais importante olhar
para frente e mobilizar as pessoas com um só foco: a reconstrução da
confiança, baseada não apenas em mais liquidez no sistema, mas no que
é mais importante, na honestidade, transparência e previsibilidade.
Para fornecer uma oportunidade concreta para os governos demonstrarem
a vontade de uma cooperação global, o enfoque local se mostra um
elemento mais unificador que distanciador. Este é o desafio.


O segundo objectivo é assegurar que olhemos para nosso mundo de uma
forma holística, sistemática e dinâmica. A crise financeira não é a
única questão que exige uma resposta global – a resposta no nível
local começou a ganhar importância relevante nesse contexto. A
comunidade global, enfrenta vários riscos que precisam ser tratados
simultaneamente se quisermos evitar um futuro onde tropeçaremos em uma
crise após a outra. Não podemos olhar para os problemas de maneira
isolada – tudo está conectado e precisamos de respostas que também
estejam conectadas.


O terceiro objectivo é iniciar um processo que durará um ano para
ajudar a projetar as instituições que o mundo precisa para confrontar
os desafios globais. Hoje, temos que enfrentar um maior grau de
complexidade e pressão do que na era do pós-Segunda Guerra Mundial,
quando a maioria de nossas instituições originais foi fundada. Temos
que reconhecer os deslocamentos de poder político do Ocidente para o
Oriente e do Norte para o Sul; temos que incorporar muito mais perícia
nos processos de tomada de decisão; temos que usar as redes sociais
como uma ferramenta de "empoderamento"; temos que escutar mais
intensamente a próxima geração.


O quarto objectivo é melhorar a base ética para as empresas como um
agente social construtivo. Precisamos diferenciar entre todas as
empresas industriais, financeiras e de serviços que fornecem
verdadeiro valor à sociedade e aquelas que ganham dinheiro por meio de
transações de papel e especulação. O lucro é o principal motor dos
negócios, mas está claro que não pode ser um lucro a qualquer custo.
Desde a fundação do Fórum Económico Mundial em 1971, as actividades
foram baseadas na premissa de que as empresas no final têm que servir
não apenas aos accionistas, mas também à sociedade como um todo.
Precisamos de ampliar a nossa mentalidade para que as motivações de
curto prazo não sejam substituídas por objectivos de longo prazo, em
que passaremos de um "ego" capitalismo para um "eco" capitalismo.


Moldar o mundo pós-crise significa acima de tudo incorporar
responsabilidade ecológica, global e inter-gerações em todas as nossas
realizações individuais e colectivas. Precisamos reflectir sobre como
queremos que o mundo seja em 10, 20 ou 30 anos e imaginar o que o mundo
deixará para trás para a próxima geração.


O quinto objectivo é reconstruir a economia global. Precisamos
restaurar a confiança em nosso futuro. Estamos no meio de um grande
desafio – colocar a economia global de volta em seus trilhos. Existe
uma grande oportunidade de gerar uma nova onda de crescimento
económico com base nas tecnologias, produtos e serviços que atendem
directamente as necessidades da sociedade em eco-eficiência,
atendimento de saúde, transporte e empoderamento do povo. Não vamos
nos esquecer de que o empreendedorismo continua sendo um propulsor
chave de geração de riqueza e que a economia de mercado é um pilar
fundamental de uma sociedade livre e democrática. Mas as forças de
mercado precisam estar inseridas em uma estrutura regulatória mais
coordenada localmente e reforçada globalmente.


O que nos resta agora é mudar ou enfrentar um contínuo declínio e miséria.
As pessoas em todos os cantos do mundo estão confusas, assustadas e
enfurecidas. Elas se perguntam: como foi possível decisões serem tomadas
sem supervisão eficaz, decisões que tiveram consequências terríveis não
apenas para a economia global, mas para as pessoas de verdade, que perderam
suas pensões, seus lares ou seus empregos.


As pessoas sentem que seus líderes as deixaram na mão. Elas agora querem
que esses líderes - corporativos, políticos e sociais – reparem os danos. O
mundo não pode se esconder da sua responsabilidade de trabalhar em cojunto
para reconstruir as economias e instituições despedaçadas. Apenas com os
cinco objetivos firmemente em mente poderemos moldar juntos um mundo
melhor, pós-crise.



4. CONSIDERAÇÕES FINAIS


Cada um dos pontos do trabalho procurou destacar, quer as boas práticas,
quer alguns princípios empíricos, recomendados a todas as políticas de
desenvolvimento. Contudo, regra geral, este trabalho procurou não ser
demasiado prescritivo. Isto se deve em parte ao facto de, em muitos casos,
não haver uma única forma correcta de abordar os elementos da gestão local
e estudar as dinâmicas do desenvolvimento econômico local em tempos de
crise, e cada uma das diferentes abordagens possuírem as suas forças e as
suas limitações em diferentes contextos. Também em termos pragmáticos, as
condições ideais prévias de avaliação não existem na maioria dos casos –
seja devido à falta de dados ou disponibilidade de capacidades. Fazer o
melhor que se pode enquanto se procura melhorar as capacidades de abordagem
da gestão e do desenvolvimento econômico local no futuro de Moçambique é um
tema transversal a este trabalho.


Ao longo do trabalho foi possível destacar que, o cenário actual é
caracterizado não só por uma crise financeira mas sim, de uma crise que
transcende a dimensão financeira se transformando em económica e no seu
extremo mais acentuado em crise social. Aquí, colocamos duas razões que
consideramos aceitáveis: a primeira constitui a sua influência nos
processos de gestão local afectando directamente a dinâmica do
desenvolvimento económico local gerado pela ineficiência económica. Por
outro lado, em um cenário de crise económica mundial, a reflexão sobre o
desenvolvimento local como forma de promover a inclusão social e o
fortalecimento da economia torna-se ainda maior. O conceito de
desenvolvimento económico local discutido no trabalho abriga as noções de
inclusão política (por meio de participação popular em discussões e
decisões sobre iniciativas em uma região); inclusão produtiva
(independência económica da população) e integração com o meio ambiente.


É simetricamente importante, reparar que a crise também constitui uma
oportunidade para o desenvolvimento económico local. Alguns dados revelam
que, a crise financeira mundial pode trazer, a oportunidade de se ter um
enfoque de desenvolvimento mais de baixo para cima quebrando a dicotomia
top/down clássica. Essa visão, voltada para o pequeno produtor, daria mais
espaço a alternativas como bancos comunitários (geridos pelas próprias
comunidades) e maior oferecimento de microcrédito (direcionado a pessoas de
baixa renda).


Sobre os possíveis efeitos negativos da actual crise para o desenvolvimento
em pequena escala, é preciso lembrar que ela é um momento específico,
enquanto os processos locais são permanentes, estruturais e "transcendem os
ciclos económicos". "Os locais que têm algum trabalho de desenvolvimento
acabam sendo menos vulneráveis do que os que dependem, por exemplo, de
commodities" (SANTOS: 2008)[8]. O trabalho de desenvolvimento local, nesse
contexto, pode possibilitar que a economia de uma região se diversifique,
criando um comércio de produtos entre os habitantes menos vinculados a
apenas um tipo de negociação com fins internacionais. Em algumas situações,
essa diversificação em pequena escala reforça as defesas da comunidade
contra abalos económicos vindos de fora.


Contudo, a introdução de inovações tecnológicas cria, pois, novas condições
competitivas que influem directamente no desenvolvimento das empresas.
Quando o tecido empresarial se compõe fundamentalmente de pequenas e médias
empresas (PME) ou microempresas (formais ou informais). Assim, a negociação
estratégica entre os níveis local e regional da administração pública, o
sector privado empresarial e as entidades que prestam serviços às empresas
(consultorias tecnológicas; laboratórios de certificação, normatização e
homologação; pesquisa de mercados e outros) é decisiva para garantir o
acesso a estes serviços avançados de apoio à produção e facilitar a
cooperação inter-empresarial.


Numa época de grandes mutações tecnológicas e sociais, as organizações
devem adquirir maior flexibilidade de funcionamento para adaptar-se às
progressivas mudanças. Esta flexibilidade incide em todos os aspectos da
"cadeia de valor" da empresa e não somente nas questões salariais ou no
nível de emprego da força de trabalho. As empresas devem ter como
referencial as inovações tecnológicas, organizativas, sociais e
institucionais correspondentes às "melhores práticas" do contexto
internacional nos seus sectores correspondentes, como um meio para gerar a
necessária tensão modernizadora no conjunto do sistema produtivo e do
tecido empresarial. Por outro lado, o domínio tecnológico e a capacidade de
utilizá-lo e difundí-lo são a principal fonte de vantagens competitivas
dinâmicas, o que implica que se deve dar atenção prioritária à formação do
capital humano. Diante disso, precisamos entender que deverá ser convocado
todo um esforço humano no sentido de reverter a situação onde a crise
económica já está instalada. Para crises importadas devemos criar
estratégias antropofágicas de filtragem. Devemos reunir energias e
sinergias que, a contraponto, nos distanciem dos efeitos perversos da crise
mundial.



5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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Técnico: uma resposta às exigências do ajuste estrutural. Traduzido por
Antonio Rubens Pompeu Braga. Fortaleza – Ceará: BNB, 1998,151p.


BARQUERO, A. Vázquez. Desarrollo Económico: flexibilidad en la acumulación
y regulación del capital. BARQUERO. A. Vázquez y G. Garofoli (eds.)
Desarrollo económico local en Europa. Colégio de Economistas de Madrid.
Madrid: España, 2001.


BARQUERO, A. Vázquez. Desarrollo Endógeno y Globalización. Eure/Vol. XXVI,
№ 079. Pontifícia Universidade Católica de Chile. Santiago, Dezembro de
2000.


BOYER, R. La teoría de la regulación. Valencia: Ed. Alfons el Magnánim,
1992.


BUENO, E. MORCILLO P. Fundamentos de economía y organización industrial.
Madrid: McGraw Hill, 1993.


DOWBOR, L. Democracia Econômica: um passeio pelas teorias. Fortaleza – CE:
Banco do Nordeste do Brasil, 2007.


DOWBOR, Ladislau. Desenvolvimento local: crise e oportunidade. 7ª Expo
Brasil Desenvolvimento Local, Cuiabá – Mato Grosso, 2008.


EVALSED. A Avaliação do Desenvolvimento Socioeconómico – O GUIA. União
Europeia: 2007-2013. Disponível em: www.observatorio.pt.


MAGAIA, Leonel. Crise Financeira sinónimo de crise familiar em África?
Jornal Notícias, Quinta-Feira, 31 de Dezembro de 2009.


MOÇAMBIQUE. Agências de Desenvolvimento Econômico Local – ADELs de
Moçambique: sistematização de uma experiência. Maputo: MAE, Maio de 2003.


MOÇAMBIQUE. Estratégia de Desenvolvimento Rural (EDR). Aprovada pelo
Conselho de Ministros. Maputo, 11 de Setembro de 2007.


OSBORNE D & GAEBLER T. Reinventando o Governo: Como o Espírito empreendedor
está Transformando o Setor Público. Brasília: MH Comunicação, 1994.


PÉREZ, Carlota. Cambio técnico, reestructuración competitiva y reforma
institucional en los países en desarrollo. El trimestre económico, Nº 233,
enero -mar-zo, 1992.


SCHWAB, Klaus. Moldando um mundo pós-crise. International Herald Tribune,
2009.
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/herald/2009/01/28/ult2680u786.jhtm.
Acesso em 08 de Dezembro de 2009.


SCOTT, A. J. & STORPER, M. Regional Development Reconsidered. The Lewis
Center for regional Policies Studies, University of California - L.A.
Working paper nº 1, Los Angeles, December, 1990.


SOROS, George. The Crash of 2008 and what it means: The new paradigm for
the financial markets.


SOROS, George. The New Paradigm for Financial Markets: The Credit Crisis of
2008 and What It Means. Nova York: PublicAffairs, 2008.
(http://www.georgesoros.com/Introduction) ISBN 9781586486839.


VÁZQUEZ BARQUERO, A. Desarrollo local: una estrategia de creación de
empleo, Madrid: Ed. Piránúde, 1988.


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[1] Mestre em Economia pela PUC/SP e Docente nos Cursos de Relações
Internacionais e Administração Pública no Instituto Superior de Relações
Internacionais – ISRI, Docente de Economia Empresarial e Economia e
Finanças Públicas na Universidade Politécnica – APOLITÉCNICA.
[2] Esta visão é compartilhada por Magaia (2009). Este autor faz uma
análise muito interessante ao associar a crise financeira à crise familiar
e por fim a crise social.
[3] Ver mais detalhes em www.duplipensar.net/dossier/crise-economia-
mundial.
[4] Sandroni (1987: pp. 148), descreve o termo como o incumprimento das
cláusulas contratuais em determinado prazo. Além de permanecer em débito, a
parte inadimplente fica sujeita ao pagamento de juros de mora, multa
contratual ou outros encargos.
[5] Os itálicos são do autor e não dos originais.
[6] A contribuição teórica da escola francesa da regulação, representada
por Robert Boyer, Alan Lipietz e Michel
Aglietta pode ser vista em Boyer (1992).
[7] Este item é baseado nas notas de Klaus Schwab (INTERNATIONAL HERALD
TRIBUNE: 2009). Klaus Schwab é o fundador e presidente executivo do Fórum
Económico Mundial. Disponivel em:
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/herald/2009/01/28/ult2680u786.jhtm.
Acesso em 08 de Dezembro de 2009.




[8] Carlos Alberto dos Santos, Director Financeiro do SEBRAE – Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.


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NÍVEL MESOECONÓMICO



Modo de Regulação



Marco Social e Institucional Regulatório;
Tipo de Intervenção do Estado;
Descentralização Regional e Local;
Políticas Educativas e de Saúde;
Participação Cidadã;
Negociação Estratégica entre Actores.


NÍVEL MICROECONÓMICO



Tipo de Inserção Externa



Paradigma Técnico-Económico
e Estrutura Produtiva


Base Tecnológica e Energética;
Estrutura Produtiva Sectorial e Territorial;
Articulação Produtiva;
Áreas e Sectores Industriais Motrizes;
Tecido Empresarial (Tamanho e Localização);
Organização do Trabalho (Relação Salarial);
Gestão Empresarial;
Gestão Ambiental;
Políticas Sectoriais (Rural, Industrial, Serviços, etc.);
$*/13@VWX^_in°³¼½ãX Y n
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fra-Estruturas Básicas (Energia, Água, Transporte, etc.);
Telecomunicações.


NÍVEL MACROECONÓMICO



Regime de Acumulação



Equilíbrios Macroeconómicos básicos (Inter-relação do Processo
Económico);
Políticas Macroeconómicas (Monetária, Cambial, Fiscal);
Distribuição de Renda e Padrão de Consumo.


NEGOCIAÇÃO ESTRATÉGICA
DE AGENTES TERRITORIAIS



APOIO POLÍTICO E
ADMINISTRATIVO DOS
GESTORES PÚBLICOS
LOCAIS



INCORPORAÇÃO DE INOVAÇÕES TECNOLÓGICAS
E INOVATIVAS NO TECIDO EMPRESARIAL E
PRODUTIVO LOCAL
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