Crise, Reestruturação Produtiva e Precarização do Trabalho. UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE DIREITO

Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE FACULDADE DE DIREITO

MELISSA CAROLINE CAMBUHY

CRISE, REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: A TERCEIRIZAÇÃO NO BRASIL

São Paulo 2016

MELISSA CAROLINE CAMBUHY

CRISE, REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: A TERCEIRIZAÇÃO NO BRASIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: Prof. Dr. José Francisco Siqueira Neto

São Paulo 2016

MELISSA CAROLINE CAMBUHY

CRISE, REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: A TERCEIRIZAÇÃO NO BRASIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

ORIENTADOR: Prof. Dr. José Francisco Siqueira Neto Aprovada em

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________ Prof. Dr. José Francisco Siqueira Neto Universidade Presbiteriana Mackenzie __________________________________________ Prof. Universidade Presbiteriana Mackenzie __________________________________________ Prof. Universidade Presbiteriana Mackenzie

AGRADECIMENTOS A minha família, pelo constante amor, carinho e suporte. Em especial a minha mãe, Márcia, ao meu pai Ricardo e ao meu segundo pai, André. Sem vocês nada disso seria possível. Aos meus irmãos, Felipe e Laura, meus pequenos grandes amores, que me inspiram a luta por um mundo melhor. As minhas amigas e amigos, família que escolhi, pelo carinho e companheirismo. As minhas colegas e aos meus colegas de trabalho do Roberto Caldas e Mauro Menezes Advogados Associados, que me inspiram e me mostram diariamente, que apesar das grandes contradições, é possível se lutar e alcançar vitórias pelo povo usando o Direito como ferramenta. Ao meu orientador, Prof. Siqueira, pelo comprometimento, paciência e compreensão, a quem dedico grande consideração, admiração e respeito. Às companheiras e companheiros de militância no Movimento Estudantil do Mackenzie, do Levante Popular da Juventude e do Campo Popular, que inflamam em mim e compartilham comigo os mais bonitos sentimentos de solidariedade, esperança e luta pela terra sem amos. Pátria livre, venceremos!

RESUMO Localizado em um contexto neoliberal e assim, de processo produtivo mais flexível, se concebeu a necessidade de flexibilizar também o trabalho e consequentemente sua regulamentação. Deste modo, a terceirização tem sido sinônimo do imperativo de expansão e autovalorização do capital e assim, da acumulação flexível neoliberal e do agravamento da precarização do trabalho. Neste sentido, para compreensão deste fenômeno é imprescindível localizá-lo e contextualizá-lo histórica e economicamente. Assim, este trabalho busca analisar e demonstrar a dinâmica entre o modo de produção capitalista, os processos de crise e os de reestruturação produtiva no capitalismo central e periférico. Palavras-Chave: Capitalismo; crise; reestruturação produtiva; precarização do trabalho.

ABSTRACT Located in a context of neoliberalism and, therefore, a context of a more flexible production process, the need to lighten labor and its regulation was conceived as well. In this sense, the outsourcing has been a synonym of mandatory expansion and selfvaluation of money and therefore of the aggregation of neoliberalism's flexibility and worsening of labor's deterioration. In light of this, for the comprehension of this phenomenon it is vital to locate it and contextualize it in a historical and economical way. In this sense, this essay aims to analyse and demonstrate the dynamics of capitalism's production resources, the crisis' process and the productive reorganization of the central and peripheral capitalism.

Key words: Capitalism, crisis, productive reorganization, labor deterioration

"Quando se enfatiza a necessidade de uma mudança estrutural radical deve-se tornar claro desde o início que isso não é um apelo a uma Utopia não realizável. Ao contrário, a característica definidora primária das teorias utópicas modernas era precisamente a projeção de que a melhoria pretendida nas condições de vida dos trabalhadores poderia ser alcançada no âmbito da base estrutural existente das sociedades criticadas." (István Mészáros)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9 1. CAPITALISMO E CRISE .................................................................................... 12 1.1. “Capitalismo é crise?” Algumas questões de ordem teórica ........................... 16 2. REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E O MUNDO DO TRABALHO .................... 22 Capitalismo, Trabalho e Reestruturação produtiva. ............................................... 22 2.1 Paradigma Taylor – Ford: da ascensão à decadência ..................................... 27 2.2 Crises (s) do Século XX e Teoria da Regulação .............................................. 31 2.3 Pós – Fordismo: Toyotismo, acumulação flexível e precarização do trabalho . 36 3. REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO CAPITALISMO PERIFÉRICO ............................................................................ 44 3.1 Terceirização e Precarização do Trabalho: atual panorama brasileiro ............ 51 CONCLUSÃO. .......................................................................................................... 58 REFERÊNCIAS. ........................................................................................................ 60

9

INTRODUÇÃO

Para real compreensão

do fenômeno mundial de flexibilização e

desregulamentação do trabalho é imprescindível localizá-lo e contextualizá-lo histórica e economicamente. Neste sentido, este trabalho busca demonstrar a relação entre o modo de produção capitalista e os processos de crise que, historicamente, também verificam relação direta com os de reestruturação produtiva, os quais tem sido sinônimo do imperativo de expansão e autovalorização do capital e assim, do agravamento das taxas de exploração meio à flexibilização e desregulamentação. Algumas são as contradições internas, do próprio funcionamento do modo de produção capitalista que resultam em processos de crise. No caso da crise secular da década de 70, ou ainda, a chamada Crise do Petróleo, as contradições se deram entre a desproporção entre oferta e demanda, resultante do imperativo capitalista expansionista

da

autovalorização

do

valor,

superficialmente

dizendo.

Desdobrou-se assim o colapso do capitalismo fordista do “pós 2ª Guerra Mundial” e forjou-se uma ofensiva neoliberal, ou seja, a referida crise propiciou uma mudança drástica no regime de acumulação de capital vigente, sendo que segundo a Teoria da Regulamentação:

A Sociedade capitalista é, em razão de seus antagonismos e conflitos estruturais, fundamentalmente portadora de crise, e por isso, só pode ser estável em suas respectivas estruturas sociais, políticas e institucionais por períodos limitados. Seu desenvolvimento não transcorre nem linear, nem continuamente; as fases de relativa estabilidade são sempre interrompidas por grandes crises.1

A Crise de 1973 foi agente importante na viabilização do transformar de técnicas de produção e da organização do trabalho, fato esse que demonstra que compreender as dinâmicas das crises é condição relevante para se compreender também os processos de reestruturação produtiva e seus desdobramentos, ponto central desta pesquisa. Superado o paradigma Taylor-Ford iniciou-se um processo de transição e reestruturação no interior do modo de acumulação de capital ora vigente. A chamada HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010. 1

10

“especialização flexível” transformou a estrutura produtiva fordista durantes os séculos XX e

XI

e

é

marcada pela

intensificação

da

exploração

do

trabalho,

desregulamentação e flexibilização dos direitos trabalhista impulsionada pela busca incessante da maximização de lucros. Pertinente contextualizar aqui o instituto da terceirização, o qual gera um aumento de lucro ao diminuir salários e aumentar a jornada de trabalho, porém totalmente desvinculado do ganho na produtividade, uma vez que traço diferenciador da “especialização flexível” é o trabalho não qualificado. Atualmente no Brasil vive-se os reflexos da crise de 2008 materializada em uma crise econômica e política, a qual tem aberto espaço para ataques incansáveis contra toda a classe trabalhadora e seus direitos em busca de retomar as taxas de lucro. 26,8% do mercado formal de trabalho, ou seja, 12,7 milhões de assalariados, são trabalhadores terceirizados, sendo que este número na realidade pode ser muito maior, pois parte considerável desses trabalhadores encontram-se alocados na informalidade. Importante destacar que os terceirizados têm remuneração cerca de 30% menor apesar de trabalharem em torno de 7,5 horas a mais que os trabalhadores em setores diretamente contratantes, o que demonstra o caráter precarizante ao qual a terceirização e outras modalidades de subcontratação condenam as relações de trabalho2. Através do exposto, é possível notar a profunda ligação entre o atual panorama da terceirização no Brasil e as tentativas cada vez mais recorrentes de flexibilização e até extinção da legislação trabalhista com o contexto econômico e histórico marcado pela crise e pelos processos de reestruturação produtiva a partir do século XX, fazendo-se necessária a análise desses. Deste modo, para executar tal análise, esse trabalho foi divido em 3 capítulos, sendo que em seu primeiro se examina e desenvolve as questões teóricas referentes ao capitalismo e às crises sob um referencial teórico marxista, buscando demonstrar a ligação existente entre ambos os temas.

CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES. Secretaria Nacional de Relações de Trabalho e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha. Dossiê acerca do impacto da terceirização sobre os trabalhadores e propostas para garantir a igualdade de direitos. São Paulo: Central Única dos Trabalhadores, 2014. p. 13. 2

11

Seu segundo capítulo, que conta com quatro partes, busca demonstrar o desenvolvimento do capitalismo central no século XX, processo esse eivado pelas crises e pela reestruturação produtiva. Nele se analisa o paradigma Taylor-Ford, as crises do século XX, o pós-fordismo e a precarização do trabalho, após se examinar e desenvolver questões teóricas quanto ao trabalho e a reestruturação produtiva sob uma ótica marxista. Em seu terceiro e último capítulo busca-se analisar a reestruturação produtiva e a precarização do trabalho no Brasil, na figura da terceirização, partindo do acúmulo teórico propiciado pelos capítulos anteriores.

12

1.

CAPITALISMO E CRISE

O capitalismo, que se forjou da decomposição da estrutura medieval, ou ainda, sobre os ombros do gigante feudal, tem como suas principais estruturas a propriedade privada dos meios de produção e o trabalho assalariado. Essas, apesar de terem um cunho prioritariamente econômico embasadas no acúmulo primitivo de capital e na exploração de mais-valia se derivam em todas as relações da sociedade uma vez que forjam um modo específico de se viver e pensar, recriando e reafirmando constante e dialeticamente as relações burguesas de produção. Entretanto, a história da humanidade é muito mais extensa e anterior à história do capitalismo e nela invariavelmente estiveram presentes as contradições e conflitos entre as classes oprimidas e que oprimiam, dados os interesses antagônicos de classe, os quais sempre desembocaram em processos de crises, guardadas as suas respectivas especificidades para cada modo de produção em que ocorriam como elucidam Engels e Marx:

A história de todas as sociedades até agora tem sido a história das lutas de classe. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, membro das corporações e aprendiz, em suma, opressores e oprimidos, estiveram em contraposição uns aos outros e envolvidos em uma luta ininterrupta, ora disfarçada, ora aberta, que terminou sempre com a transformação revolucionária da sociedade inteira ou com o declínio conjunto das classes em conflito.3 (grifo nosso)

No limiar do século XV, a Revolução Comercial, materializando o processo que nascia de superação do modo de produção feudal, meio a expansão do comércio ultramarino e consequente constituição de um mercado mundial dirigida pela burguesia comercial europeia emergente, associada à monarquia que ambicionava por novas fontes de riqueza4, possibilitou grande concentração dessas na Europa ocidental, a chamada “acumulação primitiva de capitais”. Esse acúmulo permitiu a apropriação dos meios de produção pela classe burguesa, fato crucial posteriormente MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 8, 4 MELLO, Alex Fiúza de. Crise Mundial e reestruturação produtiva: algumas questões de ordem teórica. Novos Cadernos NAEA. Belém, v. 7, n. 1, p. 5-30, jun. 2004. Disponível em: http://www.periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/view/34. Acesso em 01 out. 2016. 3

13

possibilitou o triunfo dela que truculentamente tentava se ver livre das amarras feudais:

Seja como for. Deu-se, assim, que os primeiros acumularam riquezas e os últimos acabaram sem ter nada para vender, a não ser sua própria pele. E desse pecado original datam a pobreza da grande massa, que ainda hoje, apesar de todo seu trabalho, continua a não possuir nada para vender a não ser a si mesma, (...) 5

Assim as caravelas foram difundindo aquela nova sociabilidade que se forjava sobre a velha forma de exploração feudal que ruía. Alicerçava-se ideologicamente na racionalidade da acumulação, do lucro e da produtividade máxima e materialmente na acumulação primitiva de capital, na disponibilidade de mão de obra e no avanço tecnológico, em um processo paulatino de constituição do sistema capitalista enquanto

um

modo

de

produção

mundial.

Sintomaticamente e fiel aos mandamentos do capitalismo, os mercados continuavam junto das necessidades, crescendo e a manufatura, processo produtivo ora vigente, já não comportava tamanha demanda trazendo à tona crises de sub-produção.

Então, o vapor e a maquinaria revolucionaram a produção industrial. No lugar da manufatura surgiu a grande indústria moderna; no lugar dos pequenos produtores, os industriais milionários, os chefes de exércitos industriais inteiros, os burgueses modernos. A grande indústria criou o mercado mundial preparado pela descoberta da América. O mercado mundial promoveu um desenvolvimento incomensurável do comércio, da navegação e das comunicações. Esse desenvolvimento por sua vez, voltou a impulsionar a indústria. E na mesma medida em que indústria, comércio, navegação e estradas de ferro se expandiam, desenvolvia-se a burguesia, os capitais se multiplicavam e, com isso, todas as classes da Idade Média passavam a um segundo plano. Vemos, assim, como a burguesia moderna é ela mesma produto de um longo processo, moldado por uma série de transformações nas formas de produção e circulação.6

Esse revolucionário, e de reflexos mundiais, processo de reestruturação produtiva descrito no excerto acima, se deu em meados do século XVIII e foi nomeado Revolução Industrial. Mesmo em seus iniciais passos a caminho da consolidação, o capitalismo já expunha seus traços que, cruciais, permitiriam seu desenvolvimento e sua MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 960. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 10-11. 5 6

14

manutenção: a história do modo de produção capitalista é permeada incessantemente por processos de crises e reestruturação produtiva como já expusera Engels e Marx: “A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os instrumentos de produção, portanto as relações de produção, e por conseguinte todas as relações sociais.” E completam, “A transformação contínua da produção, o abalo incessante de todo o sistema social, a insegurança e o movimento permanentes distinguem a época burguesa de todas as demais”.7 Vale ressaltar que para além do êxito no setor econômico, a burguesia com o desenvolvimento do capitalismo vinha ampliando também seu domínio e centralização do poder político. Expressão desse domínio se deu em 1789 com a Revolução Francesa, na qual a classe imprimiu sua hegemonia ideológica com a tríade "Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, enterrando os dogmas religiosos e a servidão do mundo medieval sobre os quais triunfaram os imperativos do capitalismo liberal burguês.

Marx vai relevar que "os que se emanciparam só se tornaram vendedores de si mesmos depois que lhes roubaram todos os seus meios de produção e os privaram de todas as garantias que as velhas instituições feudais asseguravam à sua existência". Assim, a luta burguesa contra o poder feudal e seus privilégios, em verdade, se deu para eliminar "os embaraços que elas criavam ao livre desenvolvimento da produção e à livre exploração do homem pelo homem", tida como essencial para que o capital acumulado pudesse se reproduzir. Em suas palavras: "O capital dinheiro, formado por meio da usura e do comércio, era impedido de se transformar em capital industrial pelo sistema feudal no campo e pela organização corporativa na cidade. " Como explica Marx, "o processo que produz o assalariado e o capitalista tem suas raízes na sujeição do trabalhador. O progresso consistiu numa metamorfose dessa sujeição, na transformação da exploração feudal em exploração capitalista8 (grifo nosso)

Hobsbawm expõe no excerto abaixo a clara relação entre a Revolução Industrial e Francesa ao chamá-las de “levante gêmeo” e, ainda, a real faceta da última enquanto triunfo dos ideais burgueses:

MARX, Karl. ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 13. 8 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho, volume I: Parte I. São Paulo: LTr, 2011, p. 125. 7

15 A grande revolução de 1789-1848 foi o triunfo não da "indústria" como tal, mas da indústria capitalista; não da liberdade e da igualdade em geral, mas da classe média ou da sociedade "burguesa" liberal; não da "economia moderna" ou do "Estado moderno", mas das economias e Estados com uma determinada região geográfica do mundo (parte da Europa e alguns trechos da América do Norte) (...) A transformação de 1789-1848 é essencialmente o levante gêmeo que se deu naqueles dois países [Inglaterra e França, se referindo à Revolução Industrial e Francesa] que dali se propagou por todo o mundo.9 (grifo nosso)

Na segunda metade do século XIX o capitalismo produtivo atinge escala global e junto crescem suas contradições que se expressam entre períodos de crescimento econômico e de crise generalizada. Vale enfatizar que com o desenvolvimento da burguesia desenvolve-se também o proletariado, sujeito fundamental na expansão do processo produtivo industrial. Assim “A indústria moderna transformou a pequena oficina do mestre patriarcal na grande fábrica do capitalista industrial”10 condenando o proletariado à total alienação11 e viabilizando o ápice da exploração do homem, mulheres e crianças pelo homem. É certo que “a velocidade imprimida pelas máquinas a vapor no processo produtivo”12 foi proporcional ao agravamento das contradições que se expunham entre as classes burguesa e proletária acelerando “os problemas quanto à coesão social”.13 Ou seja, para além do fator das crises econômicas que despontavam, a luta de classes, fruto dos interesses essencialmente antagônicos dessas, começou a se

HOBSBWAWM, Eric. A era das revoluções: 1780-1848. Tradução de Maria Tereza Lopes Teixeira e Marcos Penchel. São Paulo: Paz e Terra, 2005. 10 MARX, Karl. ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 20. 11 “Pela primeira vez, a alienação era vista enquanto processo da vida econômica. O processo por meio do qual a essência humana dos operários se objetivava nos produtos do seu trabalho e se contrapunha a eles por serem produtos alienados e convertidos em capital”. GORENDER, Jacob. Apresentação. In: MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013. “Processo histórico-social no qual o produto do trabalho humano torna-se independente, se autonomiza, escapando ao controle racional e virando-se contra seu criador. Apesar de, etimologicamente, ―alienação‖ possuir uma origem psicológica, Marx utilizou o termo também no seu aspecto econômico, ao se referir à alienação no trabalho e suas consequências no cotidiano das pessoas. Marx também observou a alienação da sociedade burguesa – o fetichismo (ver adiante). Hegel define ―alienação‖ como ―o outro distinto de si mesmo‖. Em Hegel, seu conteúdo não é negativo. Em Marx, sim. Expressa o estranhamento, a separação e a fragmentação do ser humano. Algo está alienado quando já não mais nos pertence.” KOHAN, Nestor. Dicionário básico de categorias marxistas. Disponível em: https://pcb.org.br/portal/docs1/texto3.pdf. Acesso em 01 out. 2016. 12 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho, volume I: Parte I. São Paulo: LTr, 2011, p. 134. 13 Idem Ibidem, p. 135 9

16

materializar na insatisfação das trabalhadoras e trabalhadores que reagiam às péssimas condições de trabalho e ao agravamento das taxas de exploração. Deste modo, se o século XIX foi palco da passagem do capitalismo comercial ao capitalismo industrial, pode-se dizer que o século XX e XXI presenciam o imperialismo, sendo que este de início se deu pela mundialização do processo produtivo levando a uma nova fase do processo de acumulação de capital no século XX e posteriormente, a mundialização financeira neoliberal. Ou seja, as bases produtivas que antes eram localizadas, nacionais gradualmente passaram à inter/transnacionalização na busca constante pela expansão do mercado de consumo e criação de mais-valia. Ao explorar locais com mão de obra mais abundante e menos qualificada viabilizou-se o agravamento das taxas de exploração, logo o aumento dos lucros e ainda a exploração de países subdesenvolvidos, os condenando unicamente ao papel de exportadores de commodities e mão de obra barata, como exposto abaixo:

Com o advento da revolução industrial, o agigantamento das empresas e as novas necessidades de acumulação capitalista, a mundialização da produção (que veio também por etapas) passou então a impor-se como tarefa inadiável ao grande capital formado, tendo em vista a necessidade de expansão da produção para o mercado e do próprio mercado consumidor, o que ocasionou inicialmente a exportação de inteiros setores fabris para países periféricos a partir do final do século XIX e início do XX. O imperialismo clássico (até a II Guerra Mundial) representou o primeiro movimento de expansão do grande capital industrial por via da exportação extensiva de suas bases produtivas originariamente européias (e depois americanas e japonesas) para o resto do mundo, traduzindo os primeiros esforços de superação da relativa imobilidade internacional do capital produtivo herdada da era da livre concorrência, quando a concentração se dera basicamente nas esferas nacionais. A transferência em massa do capital oligopólico para antigas zonas de colonização – ao que Lênin chamava de cartelização do mercado mundial por gigantescas “empresas combinadas” (LÊNIN, 1977) –levou o sistema capitalista mundial a ingressar numa nova fase do processo de concentração do capital, agora escalonado em nível internacional (...) (grifo nosso)14

1.1. “Capitalismo é crise?” Algumas questões de ordem teórica

MELLO, Alex Fiúza de. Crise Mundial e reestruturação produtiva: algumas questões de ordem teórica. Novos Cadernos NAEA. Belém, v. 7, n. 1, p. 5-30, jun. 2004. Disponível em: http://www.periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/view/34. Acesso em 01 out. 2016. 14

17

Como já fora mencionado inicialmente, as crises existiram em todas as velhas formas de exploração pré-capitalistas, se destacando enquanto crises de subprodução. Entretanto, essas nunca haviam se tornado cíclicas e posteriormente estruturais, logo intrínsecas e próprias do funcionamento do modo de produção em que operassem, como ocorrera no capitalismo e como explicitou Engels e Marx no Manifesto, de 1848:

As relações de produção e de circulação burguesas, as relações burguesas de propriedade, a sociedade burguesa moderna – que, como por encanto, criou meios de produção e circulação tão espetaculares – mais parecem o feiticeiro que não consegue controlar os poderes subterrâneos que ele mesmo invocou. Há décadas a história da indústria e do comércio se restringe à revolta das modernas forças produtivas contra as modernas relações de produção, contra as relações de propriedade que constituem as condições vitais da burguesia e de seu domínio. (...) Como a burguesia consegue superar as crises? Por um lado, pela destruição forçada de grande quantidade de forças produtivas; por outro, por meio da conquista de novos mercados e da exploração mais intensa de mercados antigos. Através de quê, portanto? Da preparação de crises mais gerais e violentas e da limitação dos meios que contribuem para evitá-las. (grifo nosso)15

Sendo assim, é possível notar a faceta dúbia que as crises interpretam no modo de produção capitalista e que devem ser demonstradas neste Capítulo. Elas se mostram como reflexos do modus operandi das relações de produção no capitalismo, logo intrínsecas. E se mostram também necessárias ao viabilizar a manutenção do modo de produção capitalista, expondo que mais do que fruto das contradições do capital, as crises são também contraditórias em si mesmas ao serem processos de desorganização com a finalidade de reorganizar e conservar. Quanto ao caráter cíclico das crises, o analisaremos e demonstraremos aqui segundo a Lei do Valor, de Karl Marx.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008, p. 17-19. 15

18

Para ele, o imperativo que orienta o modo de produção capitalista seria o da busca pela valorização do valor16 meio a criação de mais-valia17, o que se desdobra e tem por meta, a super acumulação de capital. Ou seja, esse processo de criação de mais-valia nada mais é do que a força de trabalho trabalhando mais que seria necessário para suprir necessidades, para o sustento, criando então um sobrevalor que fica ao dispor do capitalista que a explora. Importante salientar que a ânsia pela criação de mais-valia se verte no constante agravamento das taxas de exploração como expõe Marx: “a força motriz da produção capitalista é a valorização do capital, ou a seja, a criação de mais-valia, sem nenhuma consideração para com o trabalhador”18 e também no movimento contraditório de acumulação e expansão contínua das forças produtivas capitalistas, ou ainda, a contradição entre o desenvolvimento das forças produtivas versus as relações de produção capitalistas, a qual se desdobra nas crises de superprodução de mercadorias. Ou seja, a massa de valor gerado na busca pela valorização do valor depende da contínua absorção do mercado para satisfazer a sua finalidade natural no processo de acumulação, o lucro, logo o acúmulo de capital. Entretanto, ocasionalmente o modo de produção capitalista, dado o seu caráter incontornavelmente expansivo, cria uma desproporção entre oferta e procura, entre a necessidade de expansão da produção e a capacidade social de consumo resultando então, em crises de superprodução, como elucidado a seguir:

Na caça a maiores lucros, os capitalistas ampliam a produção, aperfeiçoam a técnica, introduzem novas máquinas e lançam enormes massas de produtos no mercado. Nesta mesma direção atua a tendência constante a baixa da taxa de lucro, condicionada pelo aumento da composição orgânica do capital. Os empresários se esforçam por compensar a queda da taxa de lucro com o aumento da massa de lucros “Valor: Não é uma coisa, nem uma propriedade intrínseca das coisas. É uma relação social de produção. Em ambos os polos da relação, vincula-se aos possuidores de mercadorias. Quando os produtos do trabalho são gerados dentro de relações de valor, são produzidos para serem vendidos no mercado. Marx distingue historicamente diversas relações de valor, desde a mais simples (a permuta) até a mais desenvolvida (o dinheiro)”. KOHAN, Nestor. Dicionário básico de categorias marxistas. Disponível em: https://pcb.org.br/portal/docs1/texto3.pdf. Acesso em 01 out. 2016. 17 “Mais-valor ou mais-valia: Fração do valor produzido pela força de trabalho que é apropriada gratuitamente pelo capitalista. Constitui a origem da exploração. Representa um trabalho não pago. É a fonte de vida do capital. É o excedente repartido entre diferentes capitalistas, na forma de juros (para os banqueiros); lucros (empresários industriais) e rendas da terra (proprietários)”. Idem ibidem. 18 MARX, Karl. Capítulo inédito D’O Capital: resultado do processo de produção imediato. Escorpião, 1975, p. 20 16

19 por meio da ampliação da produção, da elevação da quantidade de mercadorias fabricadas. Desse modo, é inerente ao capitalismo a tendência a ampliação da produção, ao enorme crescimento da capacidade produtiva. Mas, como resultado do empobrecimento da classe operária e dos camponeses, a procura solvente dos trabalhadores atrasa-se em relação ao crescimento da produção, reduz-se de modo relativo. Em consequência disso, a ampliação da produção capitalista choca-se inevitavelmente com os marcos estreitos do consumo das massas fundamentais da população.19 Desde já, é evidente que o trabalhador, durante toda sua vida, não é senão força de trabalho, razão pela qual todo o seu tempo disponível é, por natureza e por direito, tempo de trabalho, que pertence, portanto, à autovalorização do capital. Ou seja, as crises de superprodução são tendências do próprio processo de acumulação e circulação de capital. (grifo nosso)20 O verdadeiro limite da produção capitalista é o próprio capital. É o fato de que nela são o capital e sua própria valorização o que constitui o ponto de partida e a meta, o motivo e o fim da produção. O fato de que aqui a produção só é produção para o capital, e os meios de produção não são simples meios para ampliar cada vez mais a estrutura do processo de vida da sociedade dos produtores. Daí que os limites dentro dos quais têm de se mover a conservação e a valorização do valor-capital, que depende da expropriação e do empobrecimento das grandes massas de produtores, choquem-se constantemente com os métodos de produção que o capital se vê obrigado a empregar para conseguir seus fins, que tendem ao aumento ilimitado da produção, à produção pela produção mesma, ao desenvolvimento incondicional das forças sociais produtivas do trabalho. O meio empregado – desenvolvimento incondicional das forças produtivas do trabalho social – choca-se constantemente com o fim perseguido, que é um fim limitado: a valorização do capital existente. Por conseguinte, se o regime capitalista de produção constitui um meio histórico para desenvolver a capacidade produtiva material e criar o mercado mundial correspondente, envolve ao mesmo tempo uma contradição constante entre esta missão histórica e as condições sociais próprias deste regime21 (grifo nosso)

Assim, o século XIX testemunhou a passagem do capitalismo comercial ao capitalismo industrial, processo eivado por sucessivas crises cíclicas. Resultantes dessas, considerando a queda na demanda, havia a queda dos preços para baixo do preço de custo e assim, a diminuição da produção, consequente dispensa da mão de obra e o aumento do exército de reserva de trabalhadores22. Sendo que esses, à

ACADEMIA DE CIÊNCIAS DA URSS. Instituto de Economia. Manual de Economia Política. Tradução de Jacob Gorender. Rio de janeiro. Editorial Vitória, 1961. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/manual/index.htm. Acesso em 01 jul. 2016. 20 MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 427. 21 Idem. El Capital. Vol. III. Cidade do México: FCE, 1973, p. 248. 22 “Grosso modo, os movimentos gerais do salário são regulados exclusivamente pela expansão e contração do exército industrial de reserva, que se regem, por sua vez, pela alternância periódica do ciclo industrial. Não se determinam, portanto, pelo movimento do número absoluto da população trabalhadora, mas pela proporção variável em que a classe trabalhadora se divide em exército ativo e exército de reserva, pelo aumento ou redução do tamanho relativo da superpopulação, pelo grau em que ela é ora absorvida, ora liberada” (MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 865). 19

20

disposição do capital, aceitavam a exploração vendendo sua força de trabalho por cada vez menos. Havendo a queda no valor dos salários, aumentavam-se os lucros dos capitalistas, mas subsequente havia a queda do poder de consumo, que levaria a um novo ciclo de desproporção entre oferta e demanda de mercadorias, como demonstra o Manual de Economia Política:

O período entre o começo de uma crise e o começo de outra crise denominase ciclo. O ciclo consiste de quatro fases: crise, depressão, reanimação e ascenso. A fase fundamental do ciclo é a crise, que constitui o ponto de partida do novo ciclo. A crise é a fase do ciclo em que a contradição entre o crescimento das possibilidades produtivas e a redução relativa da procura solvente manifesta-se de forma tempestuosa e destruidora. Nesta fase do ciclo, revela-se a superprodução de mercadorias que não encontram saída; ocorre uma queda brusca nos preços; a carência aguda de meios de pagamento é seguida pelo “crack” da bolsa, que provoca bancarrotas em massa; tudo isto conduz a diminuição brusca da produção, ao crescimento do desemprego, a redução dos salários. A depreciação de mercadorias, o desemprego, a destruição direta de máquinas, de equipamentos e de empresas inteiras significam uma enorme devastação das forças produtivas da sociedade. Por meio do arruinamento e da liquidação de muitas empresas, por meio da destruição de parte das forças produtivas, a crise adapta violentamente, e num prazo certo, as proporções da produção as proporções da procura solvente.23

O fenômeno das crises de superprodução é resultado de um segmento específico de contradições fruto do próprio funcionamento do sistema capitalista, no caso, a desproporção entre a necessidade de expansão do capital e a demanda conjuntural. Entretanto, outras contradições existem e desembocam em processos de crises para além do fenômeno da superprodução, como por exemplo, a tendência de queda da taxa de lucro. Em 17 contradições e o fim do capitalismo, David Harvey se debruça sobre as principais contradições internas do capital demonstrando que o ponto em comum entre todos esses processos é justamente o seu ponto de partida, que são as contradições do próprio modus operandi deste modo de produção. Tal fato nos permite concluir que crises são, então, inerentes à existência do capitalismo, mas não só, uma vez que se colocam também enquanto necessárias para sua reprodução, como ele explicita:

ACADEMIA DE CIÊNCIAS DA URSS. Instituto de Economia. Manual de Economia Política. Tradução de Jacob Gorender. Rio de janeiro. Editorial Vitória, 1961. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/manual/index.htm. Acesso em 01 jul. 2016. 23

21

Crises são essenciais para a reprodução do capitalismo. É no desenrolar das crises que as instabilidades capitalistas são confrontadas, remodeladas e reformuladas para criar uma nova versão daquilo em que consiste o capitalismo. Muita coisa é derrubada e destruída para dar lugar ao novo. Terras produtivas são transformadas em desertos industriais, velhas fábricas são demolidas ou usadas para novas finalidades, bairros onde mora a classe trabalhadora são gentrificados.24 (grifo nosso)

E ainda, ratificando a tese exposta até aqui, expõe Giovanni Alves:

É importante salientar que a idéia de crise é complexa. Na perspectiva da lógica do capital, as crises do sistema não possuem apenas sentido de negatividade. Pelo contrário, é por meio delas que o sistema produtor de mercadorias cresce e se expande, recompondo suas estruturas de acumulação de valor. Em sua dimensão objetiva, a crise decorre da própria expansividade sistêmica do capital, mesclando, em si, momentos intensamente contraditórios de desenvolvimento ampliado das forças produtivas do trabalho social por meio das Revoluções Científico- Tecnológicas, que criam novos meios de produção, de comunicação e de transporte e que marcam os períodos mais críticos de desenvolvimento do capitalismo industrial; e momentos de aguda exacerbação da expropriação, exploração e exclusão social do trabalho vivo.25 (grifo nosso)

HARVEY, David. 17 contradições e o fim do capitalismo. Tradução: Rogério Bettoni. São Paulo: Boitempo, 2016 25 ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007, p. 144. 24

22

2. REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E O MUNDO DO TRABALHO

Capitalismo, Trabalho e Reestruturação produtiva.

Sedimentado sobre a acumulação primitiva de capital, a alta disponibilidade de mão de obra nas cidades e o avanço tecnológico, o capitalismo industrial revolucionou e criou todo um novo processo produtivo dentro das fábricas. Meio a tal avanço das forças produtivas, segundo Alves26 o escopo do trabalho já não é a satisfação das necessidades humanas, mas um processo de produção de valor27, diferenciando-se assim de todos os outros modos de produção pré-capitalista uma vez que mercantiliza a força de trabalho, como expõe também David Harvey:

Mas aquilo que é negociado como mercadoria pelo capital, e distingue esse modo de produção, é a força de trabalho. O trabalhador dispõe e vende essa mercadoria para o capitalista em um mercado de trabalho supostamente “livre”. O comércio da prestação de serviços antecede o advento do capitalismo, é claro, e é bem possível que esse tipo de atividade continue existindo muito depois de o capital deixar de existir como modo viável de produção e consumo. Mas o capital entendeu que poderia criar a base para sua própria reprodução – com a esperança que fosse permanente - pelo uso sistemático e contínuo da força de trabalho para produzir um mais-valor sobre aquilo que trabalhador precisava para sobreviver com dado padrão de vida. Esse excedente está na raiz do lucro monetário.28

Assim o processo produtivo capitalista se apropria do trabalho tornando esse mero processo de valorização, ou seja, um processo de trabalho que se volta para a produção de mercadorias sob o imperativo da maximização dos lucros. O trabalho fora definido por Marx29 como atividade vital, um processo entre o humano e a natureza, no qual aquele com seu próprio impulso regula e controla seu ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007. 27 “Assim, destacamos dois momentos cruciais. Primeiro, o processo de trabalho que se constitui com o modo de produção capitalista não se volta à produção de objetos que satisfaçam a necessidades humanas, valores de uso, mas sim a produção de valores e, mais especificamente, mais-valia. Segundo, no interior deste próprio processo de trabalho capitalista ocorrem mudanças significativas, por conta do desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social, que alteram sua própria natureza intrínseca” (ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007) (grifo nosso). 28 HAREY, David. 17 contradições e o fim do capitalismo. Tradução: Rogério Bettoni. São Paulo: Boitempo, 2016. 29 “O trabalho é, antes de tudo, um processo entre o homem e a natureza, processo este em que o homem, por sua própria ação, medeia, regula e controla seu metabolismo com a natureza. Ele se 26

23

intercâmbio material com a natureza a tornando uma de suas forças. E ainda, como primeiramente uma atividade voltada a um fim que ao modificar a natureza, modifica também ao humano. Ou seja, como meio pelo qual o humano torna-se ser social. Partindo de tal definição de trabalho é possível concluir que a centralidade do trabalho na sociabilidade da humanidade não se dá só em um nível econômico, mas psíquico também, sendo que esse não é apenas meio de satisfação de necessidade humanas, mas também fonte de identificação, autoestima e de desenvolvimento das potencialidades humanas.30 Assim, ao trabalho tornar-se mera mercadoria no modo de produção capitalista, como Saramago trouxe em “A caverna”, há o afastamento do humano de sua essência, colocando em cheque a própria existência do trabalhador: “... pensou em muitas coisas, pensou que seu trabalho se tornara definitivamente inútil, que a existência de sua pessoa deixara de ter justificação suficiente...”. E ainda, desenvolve Navarro31 que o capitalismo traz consigo uma série de contradições, muitas delas relacionadas ao mundo do trabalho. Ao mesmo tempo em que o trabalho é a fonte de humanização e é o fundador do ser social, sob a

confronta com a matéria natural como com uma potência natural [Naturmacht]. A fim de se apropriar da matéria natural de uma forma útil para sua própria vida, ele põe em movimento as forças naturais pertencentes a sua corporeidade: seus braços e pernas, cabeça e mãos. Agindo sobre a natureza externa e modificando-a por meio desse movimento, ele modifica, ao mesmo tempo, sua própria natureza. Ele desenvolve as potências que nela jazem latentes e submete o jogo de suas forças a seu próprio domínio. Não se trata, aqui, das primeiras formas instintivas, animalescas [tierartig], do trabalho. Um incomensurável intervalo de tempo separa o estágio em que o trabalhador se apresenta no mercado como vendedor de sua própria força de trabalho daquele em que o trabalho humano ainda não se desvencilhou de sua forma instintiva. Pressupomos o trabalho numa forma em que ele diz respeito unicamente ao homem. Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e uma abelha envergonha muitos arquitetos com a estrutura de sua colmeia. Porém, o que desde o início distingue o pior arquiteto da melhor abelha é o fato de que o primeiro tem a colmeia em sua mente antes de construí-la com a cera. No final do processo de trabalho, chega-se a um resultado que já estava presente na representação do trabalhador no início do processo, portanto, um resultado que já existia idealmente. Isso não significa que ele se limite a uma alteração da forma do elemento natural; ele realiza neste último, ao mesmo tempo, seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, o tipo e o modo de sua atividade e ao qual ele tem de subordinar sua vontade. E essa subordinação não é um ato isolado. Além do esforço dos órgãos que trabalham, a atividade laboral exige a vontade orientada a um fim, que se manifesta como atenção do trabalhador durante a realização de sua tarefa, e isso tanto mais quanto menos esse trabalho, pelo seu próprio conteúdo e pelo modo de sua execução, atrai o trabalhador, portanto, quanto menos este último usufrui dele como jogo de suas próprias forças físicas e mentais. Os momentos simples do processo de trabalho são, em primeiro lugar, a atividade orientada a um fim, ou o trabalho propriamente dito; em segundo lugar, seu objeto e, em terceiro, seus meios.” (MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 326) (grifo nosso) 30 NAVARRO, Vera Lucia; PADILHA, Valquíria. Dilemas do trabalho no capitalismo contemporâneo. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 19, n. spe, p. 14-20, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822007000400004&lng=en&nrm=iso. Acesso em 11 mar. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822007000400004. 31 Idem ibidem.

24

lógica do capital se torna degradado, alienado, estranhado. O trabalho perde a dimensão original e indispensável ao homem de produzir coisas úteis (que visariam satisfazer as necessidades humanas) para atender as necessidades do capital. Sob o capitalismo, explicou Marx, o trabalhador decai à condição de mercadoria e a sua miséria está na razão inversa da magnitude de sua produção. (grifo nosso) Nessa esteira, importante salientar dois aspectos da natureza do processo de trabalho capitalista que surgem já na manufatura e se generalizam com o processo de cientificização do processo produtivo, sendo eles a i) desqualificação técnica do trabalhador e sua ii) alienação frente ao processo produtivo resultando no trabalho sem conteúdo, como mera mercadoria, chamado por Marx de “trabalho abstrato”. Quanto à desqualificação, a ausência de qualquer formação se generaliza com a introdução da maquinaria, a qual toma do trabalhador a tarefa de transformar a matéria-prima em produto e assim, o trabalho vivo torna-se mero apêndice da máquina, fenômeno esse que foi chamado por Marx de “superação da barreira orgânica”, uma vez que o humano restou como mero instrumento de produção. Desdobramento da desqualificação do trabalho também é a amplificação do controle do trabalho que será definido por David Harvey como “a disciplinação da força de trabalho para os propósitos de acumulação do capital”32 Segundo Benedito R. de Moraes Neto em “O século XX e a teoria marxista do processo de trabalho”, o processo de trabalho sob o domínio do capital faz com que as bases técnicas se ajustem às necessidades do capitalismo, ou seja, o processo de trabalho passa por uma adequação de sua forma técnica à forma econômica. Ademais, para além de tornar o trabalho vivo mero intermediário subsumido à máquina,33 o capitalismo industrial ao transformar o mundo do trabalho, transformou profundamente a vida dos trabalhadores impondo também sutis mecanismos de controle sociais a estes, como demonstra o excerto:

Decca (1988) afirma que é preciso encontrar a fábrica em todos os lugares em que se teve a intenção de disciplinar e assujeitar o trabalhador. Isso HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010. 33 ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007. 32

25 quer dizer que o sucesso da fábrica não foi, como se pode pensar, a mecanização e o desenvolvimento tecnológico, mas sim o fato de ela ter sido um locus privilegiado da disciplinarização dos trabalhadores que acabaram por introjetar dentro de cada um o relógio moral do desenvolvimento capitalista. (...) A tecnologia é vista, então, como mais uma forma de controle social. A imposição da noção de “tempo útil” parece ser um bom exemplo disso, na medida em que prevalece, cada vez mais, a idéia “moralizante” de que não se pode perder tempo, de que tempo é dinheiro. Esta introjeção definitiva da imagem e do valor do tempo como moeda de mercado é uma ilustração de que são dominantes as idéias da classe dominante. Marglin (1989, p. 41) afirma: ... a origem e o sucesso da fábrica não se explicam por uma superioridade tecnológica, mas pelo fato dela despojar o operário de qualquer controle e de dar ao capitalista o poder de prescrever a natureza do trabalho e a quantidade a produzir. A partir disso, o operário não é livre para decidir como e quanto quer trabalhar para produzir o que lhe é necessário; mas é preciso que ele escolha trabalhar nas condições do patrão ou não trabalhar, o que não lhe deixa nenhuma escolha. Os capitalistas reuniram os trabalhadores em fábricas muito mais por uma questão organizacional que tecnológica. No entanto, a técnica não deve ser entendida como neutra: ela serviu e continua servindo aos interesses de controle e hierarquia do capital. O capital conseguiu que a ciência se colocasse a seu serviço, o que se deu num processo de “docilização” da mão-de-obra (Decca, 1988).34

Ou seja, é possível se concluir que a indústria cumpriu papel crucial à reprodução do capitalismo, uma vez que possibilitou a produção em larga escala e, considerando a elevada disponibilidade de mão de obra, a qual viabilizou o agravamento da exploração dos trabalhadores, fez com que os industriais colhessem altos lucros, ao contrário dos explorados. Fato esse que expõe que a ideia de lucro baseada em baixo custo da mão de obra é da própria essência da industrialização.35 Além disso, cumpriu também papel crucial ao cooperar na construção da hegemonia ideológica burguesa que naturaliza e reforça que a força de trabalho é mercadoria, logo passível de compra e venda. Sendo que, assim, o comprador passa a ter controle sobre sua compra podendo então decidir como e o quanto aquele que

NAVARRO, Vera Lucia; PADILHA, Valquíria. Dilemas do trabalho no capitalismo contemporâneo. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 19, n. spe, p. 14-20, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822007000400004&lng=en&nrm=iso. Acesso em 11 mar. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822007000400004. 35 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho, volume I: Parte I. São Paulo: LTr, 2011, p. 111. 34

26

não tem nada para vender, a não ser sua própria pele36 deverá trabalhar, consequentemente o disciplinando e assujeitando sob seus mandos. Deste modo é possível notar a deturpação a qual o modo de produção capitalista condenou o trabalho e, consequentemente, o processo produtivo em que se insere, uma vez que ““o capital precisa criar o processo de trabalho capitalista. Ele necessita ter poder no verdadeiro coração da produção de forma a conseguir uma sólida base material para seu objetivo dominante: valorização no comando!.”37. Ou seja, adequação da forma técnica às necessidades da forma social capitalista. Entretanto, considerando a incessante busca do capital pela maximização dos lucros, em muitos momentos da História do modo de produção capitalista houve mudanças, maiores e menores, no processo produtivo. Tais mudanças são chamadas de reestruturação produtiva, sendo que segundo Mello (2004, p.6), a história do capitalismo é a história da constante e permanente reestruturação produtiva. Já em 1848, Marx e Engels no “Manifesto do Partido Comunista”, já denunciavam a natureza evolucionária do capitalismo, ao afirmarem que a burguesia não poderia sequer existir sem revolucionar continuamente os instrumentos de produção e, por conseguinte, as relações de produção, portanto todo conjunto das relações sociais. E como bem retratou, no capitalismo, tudo que é sólido se desmancha no ar. Vale destacar aqui a contribuição de Schumpeter, que alicerçado em Marx, atestou a imprescindibilidade da reestruturação produtiva para a reprodução do sistema capitalista criando, na obra “Capitalismo, Socialismo e Democracia” o conceito de “destruição criativa”. Segundo ele, os novos bens de consumo, os novos métodos de produção ou transporte, os novos mercados e as novas formas de organização industrial seriam impulso fundamental que põe e mantém em funcionamento a máquina capitalista.38 Como é possível concluir também com suas palavras:

MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 960. BRIGHTON LABOUR PROCESS GROUP. The Capitalist Labour Process. Capital & Class. Londres, v, 1, 1977, p. 9. 38 SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Editado por George Allen e Unwin Ltd. Tradução de Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961, capítulo 7. 36 37

27 os itens do orçamento do operário, digamos de 1760 a 1940, não cresceram de maneira simples ao longo de linhas invariáveis, mas sofreram também um processo de transformação qualitativa. Similarmente, a história da aparelhagem produtiva de uma fazenda típica, desde os princípios da racionalização da rotação das colheitas, da lavra e da engorda do gado até a agricultura mecanizada dos nossos dias — juntamente com os silos e as estradas-de-ferro — é uma história de revoluções, como o é a história da indústria de ferro e aço, desde o forno de carvão vegetal até os tipos que hoje conhecemos, a história da produção da eletricidade, da roda acionada pela água à instalação moderna, ou a história dos meios de transporte, que se estende da antiga carruagem ao avião que hoje corta os céus. A abertura de novos mercados, estrangeiros e domésticos, e a organização da produção, da oficina do artesão a firmas, como a U.S. Steel, servem de exemplo do mesmo processo (106) de mutação industrial — se é que podemos usar esse termo biológico — que revoluciona incessantemente * a estrutura econômica a partir de dentro, destruindo incessantemente o antigo e criando elementos novos. (*Essas revoluções não são permanentes, num sentido estrito; ocorrem em explosões discretas, separadas por períodos de calma relativa. O processo, como um todo, no entanto, jamais pára, no sentido de que há sempre uma revolução ou absorção dos resultados da revolução, ambos formando o que é conhecido como ciclos econômicos.) Este processo de destruição criadora é básico para se entender o capitalismo.39

Tais assertivas quanto às especificidades do trabalho e da reestruturação produtiva no capitalismo são fundamentais para compreender o processo produtivo que permeou a virada do século XIX e o século XX.

2.1 Paradigma Taylor – Ford: da ascensão à decadência

Sob a égide do capitalismo industrial, já na passagem do século XIX o processo produtivo das fábricas teve um salto “qualitativo” nos Estados Unidos com o Taylorismo, ou ainda, “administração científica do trabalho” que preocupou-se prioritariamente com a organização do trabalho aprofundando a divisão desse. Tal organização já existia no sistema fabril porém foi levada a outros níveis por Taylor com a decomposição de cada processo de trabalho, níveis esses que agravaram a alienação do trabalhador e o controle sobre o trabalho com a separação extrema entre a concepção e a execução, com a expropriação do saber dos trabalhadores e buscando transformá-los em meros instrumentos de produção. Sendo

SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Editado por George Allen e Unwin Ltd. Tradução de Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961, capítulo 7. 39

28

que, segundo a análise de Coriat, o Taylorismo ilustrara a essencialidade do processo de trabalho capitalista:

Tudo o que Marx anuncia em relação às características especificamente capitalistas do processo de trabalho (parcelamento de tarefas, incorporação do saber técnico no maquinismo, caráter despótico da direção), o realiza Taylor, ou mais exatamente, lhe dá uma extensão que até então não havia tido. 40

Entretanto, em 1930 uma crise mundial, ou ainda, a “Grande Depressão” e outras rupturas ocorrem desestabilizando todo modo de produção capitalista. O “New Deal”, de Roosevelt, o fascismo europeu, a dominação nazista na Alemanha, a Revolução Russa de Outubro e finalmente, a II Guerra Mundial, Hirsch (2010, p. 138), sendo que para enfrentar a crise surgiram instrumentos de política econômica destacadamente intervencionistas traduzidos no “New Deal”, ou seja, na busca da expansão do mercado de trabalho e de consumo, a qual se embasou na doutrina econômica de Keynes. Hirsch41 elucida que a teoria macroeconômica de Keynes defendia a necessidade de instrumentos estatais-administrativos para viabilizar e consolidar os processos de crescimento e para a diminuição das crises conjunturais. Assim, o “Estado keynesiano” ficou retratado como aquele que centralizava e intermediava os antagonismos capitalistas de classe meio à política social, de crescimento, de pesquisa, industrial e conjuntural. Vale ressaltar aqui que a crise de 1930 foi um dos agentes que criou as condições políticas e sociais para tal processo de reestruturação produtiva que desaguou no fordismo e assim, esse se aliou firmemente ao keynesianismo, como ratifica o excerto:

a partir da década de 1930, para enfrentar a dinâmica cíclica da economia capitalista, surgem instrumentos de política econômica. O keynesianismo significará maior intervenção do Estado na economia de mercado através de políticas anticíclicas. É uma inovação da teoria econômica burguesa (J.M. Keynes é seu principal arauto científico). Por meio de mecanismos de política monetária e fiscal no âmbito da gestão macroeconômica do Estado-nação, buscou-se regular o ciclo da economia

CORIAT, Benjamin. Ciencia, técnica y capital. Madrid: H.Blume, 1976, p. 107. HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 143. 40 41

29 capitalista, impedindo as grandes depressões, como a que ocorreu em 1929-1932 nos EUA. (...) O que se chamou fordismo-keynesianismo é um momento histórico de regulação do ciclo capitalista, que impediu, nas condições da crise orgânica, que a dinâmica cíclica do capital implicasse em consequências nefastas para a reprodução capitalista no plano da economia nacional.42

Baseado na produção fabril em grande escala e em série, o fordismo coletivizou o taylorismo, ou ainda, segundo Michel Aglietta, em “A Theory of Capitalist Regulation – the US Experience”, o fordismo teria aprofundado o taylorismo no processo de trabalho.43 Para Hirsch (2010, p. 139), o fordismo surge na implementação da produção taylorista em massa nas fábricas de automóveis de Henry Ford no início do século XX, sendo que sua característica básica seria a implementação da organização do trabalho taylorista na produção massiva de bens de consumos estandartizados, marcada pela forte racionalização e intensificação do trabalho. A introdução da cadeia de montagem e o trabalho subdividido em operações mínimas intensificou os traços de desqualificação técnica, meio ao emprego intensivo de mão de obra não qualificada, e da alienação, já presentes nos processos produtivos passados. A linha de montagem possibilitou, segundo Moraes Neto, a fabricação em massa de produtos padronizados com produtividade crescente, fato esse que permitiu a queda nos preços dos bens, a elevação dos salários reais e a intensificação do consumo. Ainda definindo o fordismo, João Batista Pamplona:

conjunto de métodos de produção fundamentado em sequências lineares de trabalho fragmentado e simplificado; em linha de montagem; em longas horas de trabalho manual rotinizado; em controle inexistente do trabalhador sobre o projeto, ritmo e organização do processo de produção; em equipamentos especializados com baixa flexibilidade; em comando fortemente hierarquizado do processo de trabalho; em produção em

ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007, p. 145. 43 AGLIETTA, Michel. A Theory of Capitalist Regulation: the US Experience. Londres, NLB, 1979, p. 117-8. 42

30 massa, buscando ganhos de escala; em mercado de consumo de massa.44 (grifo nosso)

No que concerne à gerência científica enquanto forma de administração, ou ainda, enquanto forma de gerir a força de trabalho utilizada no Taylorismo, Navarro (2007, p. 17) traz importante destaque ao aumento dos níveis salariais dos trabalhadores que acabaram se tornando grandes incentivos para estes, como um dos traços do Taylorismo aperfeiçoado por Ford. Aumentos esses que, segundo Hirsch (2010, p. 140), foram viabilizados pelo aumento da produtividade do trabalho que deu base para um crescimento econômico sólido e constante, sendo que os aumentos salariais para além de incentivos aos trabalhadores também eram base do consumo em massa que se desenvolvia. Quanto à faceta de incentivo, da questão do aumento salarial, Maria da Graça Duck em “Terceirização: (des)Fordizando a Fábrica”45 destaca que a forma de gerência proposta por Taylor tinha forte conteúdo autoritário e se dava muito mais na forma de coerção que de convencimento dos trabalhadores. Tal ponto também é aperfeiçoado por Ford e como demonstrado por Gramsci em “Americanismo e Fordismo”, o Fordismo se explicita como um processo todo articulado que traz um novo modo de produzir, de trabalhar e consequentemente, de viver. Assim, segundo Druck (1999, p. 45) o fordismo – enquanto novo padrão de gestão do trabalho e da sociedade (ou do Estado) – sintetiza as novas condições históricas, constituídas pelas mudanças tecnológicas, pelo novo modelo de industrialização caracterizado pela produção e consumo em massa. Na segunda metade do século XX, no contexto de consolidação do fordismokeynesiano, da Revolução Socialista, na Rússia e após a II Guerra Mundial, se deu o auge do Estado de Bem-Estar social, ou ainda, “Welfare State” que se caracterizara basicamente como um “pacto pós-guerra”. Druck (1999, p. 45) demonstra o caráter reativo à vitória socialista que este tem afirmando que o modo americano de trabalhar e de viver, no pós- II Guerra, precisou fazer frente ao modo socialista de trabalhar e viver, e assim, expõe que, na realidade,

PAMPLONA, João Batista. Inserção brasileira no novo padrão capitalista. Pesquisa & Debate. São Paulo: PUCSP, v. 7, n. 2, 1996, p. 140. 45 DRUCK, Maria da Graça. Terceirização (des)Fordizando a Fábrica. Salvador: Edufa,1999. 44

31

a proteção social do Estado concedida ao povo era uma arma na defesa da hegemonia ideológica do modo de produção capitalista. Apesar de ser mera maneira pela qual o modo de produção capitalista pôde prosseguir com sua reprodução e não uma real mudança nos já mencionados imperativos do capital, o fordismo-keynesiano propiciou meio à política de conciliação de classes, 30 anos gloriosos ao capitalismo no período de 1945 a 1973. Entretanto a partir de 1965 o processo produtivo taylorista-fordista já dava sinais de esgotamento meio à crise estrutural que se instalava nas entranhas do capital, segundo Hirsch (2010, p. 135), este período tornou cada vez mais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições inerentes ao capitalismo.

2.2 Crises (s) do Século XX e Teoria da Regulação

Em meados dos anos 60 a recuperação da II Guerra Mundial já se apresentava consolidada no Japão e da Europa Ocidental fato que iniciava um processo de perda de hegemonia dos Estados Unidos. Harvey46 afirma que após a recuperação, com o mercado interno saturado surge o impulso para criar mercados de exportação para os excedentes, fato esse que se desdobraria posteriormente no agravamento da competição internacional chegando ao ápice de produzir a desvalorização do dólar. Importante salientar que apesar de todo deterioramento e deturpação que o processo produtivo capitalista industrial impôs ao trabalho, dentro da indústria sempre habitou grande potencial político. Ao capital exigir o emprego de grandes quantidades de trabalhadores para, assim, extrair grande volume de mais-valia, viabilizava e explicitava também o desenvolvimento do conflito capital x trabalho, fortalecendo então a atividade política, como Gramsci demonstrou em “Americanismo e Fordismo”. Deste modo, narra Druck (1999, p. 64), que apesar da crise que na década de 60 já imprimia seus efeitos sobre a classes trabalhadora, os sindicatos exigiam a continuação dos ganhos de produtividade incorporados aos salários e se recusavam

HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010, p. 135. 46

32

a continuar contribuindo com a gestão taylorista-fordista, a qual impunha um trabalho parcelizado, repetitivo, fragmentado, rotinizado, expondo, ainda segundo a autora, um manifesto esgotamento também de tal forma de controle do capital sobre o trabalho. Tais fatos expõem a resistência, logo contradições e conflitos sociais naquele contexto, que segundo Mészáros, em “Para além do Capital”, intensificam e caracterizam o caráter estrutural da crise do capitalismo. Em 1973 a situação dos Estados Unidos se agrava com a alta do preço do petróleo imposta pela OPEP e a crise do capitalismo fordista se instala. Importante ressaltar que apesar da Crise do Petróleo ser conhecida como o fenômeno que levou à derrocada do modo de acumulação fordista, segundo Hirsch (2010, p. 150) em essência, a crise do fordismo foi causada por um retrocesso estrutural na rentabilidade do capital em todas as metrópoles capitalista, consequência de uma forte diminuição da taxa de lucro. Como já fora desenvolvido neste trabalho, as crises para além de intrínsecas ao funcionamento do capitalismo dadas suas contradições, também tem papel crucial na sua reprodução ao criar condições para um novo processo de acumulação de capital. No caso em tela, a crise do capitalismo fordista foi crucial para a reorganização das forças produtivas, logo da reestruturação produtiva que será tratada no próximo capítulo, na qual a “acumulação flexível’ ascendeu com a derrocada do fordismo retomando as taxas de lucro. Ainda quanto à crise, Flávio Ferreira de Miranda, em “Marx e as crises cíclicas do capitalismo: aspectos teóricos”, ratifica a tese exposta:

Nas crises os aspectos contraditórios dos dois polos de uma mesma relação dialética se manifestam violentamente e essa é a única forma possível de restabelecer-se a unidade necessária entre esses polos. As crises, portanto, são soluções bruscas que restabelecem transitoriamente a normalidade, ou seja, não são terminais – consideradas em si mesmas –, não se deve esperar o fim do capitalismo como mera consequência de uma crise econômica, que pelo contrário o restaura, recolocando-o em seu curso normal (contraditório) de desenvolvimento. Isto significa dizer que as crises criam as condições para um novo processo de acumulação de capital, o que denota o caráter cíclico do mesmo. (grifo nosso)

33

A crise de 1973 não foi diferente e fato é que o fordismo-keynesiano que por anos se caracterizou como sustentáculo para o acúmulo de capital, tornou-se sua trava com a queda das taxas de crescimento e o endividamento estatal crescente.47 Assim, a profunda recessão imposta pela crise, segundo Harvey48 movimentou um conjunto de processos que solaparam o compromisso fordista e viabilizou todo um período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político abrindo espaço ideológica e materialmente para a ofensiva neoliberal. Neste cenário, de crise econômica e crise da teoria keynesiana, desenvolve-se a Teoria da Regulação, a qual, segundo Hirsch49 tenta resolver as inseguranças teóricas vinculadas à segunda crise econômica mundial do século vinte [“Crise do Petróleo” de 1973]. Sendo que seu central questionamento é quanto às condições de persistência e desenvolvimento de uma sociedade capitalista atravessada por antinomias estruturais,50 ou seja, busca entender a dinâmica da sociedade capitalista, suas crises e processos de transformações. Hirsch51 leciona que com a crise da teoria keynesiana foi refutado o pressuposto imperante de que era possível, meio a intervenções estatais, o desenvolvimento do capitalismo livre de crises. Provado o contrário, se tornou possível que a Teoria da Regulação partisse de um padrão de análise na qual as crises figuram como desfecho próprio do capitalismo, uma vez que o processo de acumulação do capital é impulsionando por um incontornável caráter expansionista que visa a maximização de lucros. Tal nível de dinamicidade deste regime de acumulação tende a se chocar com a certa rigidez que os modos de regulação tendem a apresentar. Nas palavras de Alysson Mascaro: “O padrão de análise da dinâmica do capitalismo deve ser pautado na crise como seu corolário necessário, compreendendo as eventuais estabilidades como excepcionais”.52 Assim, segundo a Teoria da Regulação, um regime de acumulação estável só pode formar-se quando se impõe simultaneamente um contexto de regulação HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 151. 48 HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010, p. 140. 49 HIRSCH, Joachim. Op. cit., p. 101. 50 Loc. cit., p. 101. 51 Idem ibidem, p. 103. 52 MASCARO, Alysson Leandro. Estado e forma política. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 126. 47

34

correspondente.53 O que nos permite concluir que as grandes crises capitalistas não são simplesmente crises econômicas.54 Para melhor compreensão da assertiva acima, insta explicitar que, segundo Lipietz, o regime de acumulação designa-se em um modo de produção determinado que garanta por períodos mais extensos, as relações de correspondência entre as condições materiais de produção e o seu desenvolvimento, com o seu consumo social.55 Já o modo de regulação, seria para os regulacionistas, o conjunto de instituições, formas organizacionais, redes sociais, normas (explícitas ou Implícitas), leis, padrões de conduta, que asseguram a compatibilidade dos diversos comportamentos no quadro de um regime de acumulação, em conformidade com o estado das relações sociais existentes. Nas palavras de Althusser e Marx:

Como dizia Marx, até mesmo uma criança sabe que, se uma formação social não reproduzir as condições da produção ao mesmo tempo que produz, não conseguirá sobreviver um ano. A condição última da produção é, portanto, a reprodução das condições de produção. [...] A produção (que se efetua nas empresas) é dominada e regulada pelas relações de produção capitalistas. Essas relações de produção são, ao mesmo tempo, relações de exploração capitalista.56 (grifo nosso)

O capitalismo fordista materializa perfeitamente todo o descrito acima ao conjugar um regime de acumulação e um modo de regulação. Ou seja, como é possível se depreender no desenvolver deste trabalho: um regime de acumulação caracterizado pela expansão do trabalho assalariado regular, pela produção e consumo massivo, meio a um processo produtivo que fora denominado taylorista-fordista, articuladas com uma política econômica e social de Estado intervencionista que fora cunhada como Estado de Bem-Estar Social. Vale rememorar a contribuição de Gramsci em “Americanismo e Fordismo”, no qual há o desenvolvimento do conceito de “americanismo”, que se caracterizaria por mais do que a hegemonia do processo produtivo americano e o regime de acumulação que o fordismo se tornou, mas pela transcendência do capital da esfera produtiva para HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 108. 54 Idem ibidem, p. 132. 55 LIPIETZ, Alain. Akkumulation, krisen und auswege aus der krise. Prokla, nº 58, 1985, p. 120 56 ALTHUSSER, Louis. Sobre a reprodução. Petrópolis: Vozes, 2008. 53

35

as esferas de reprodução da vida humana com o surgimento de um “novo tipo humano”, em consonância com o “novo tipo de trabalho e de produção”, se desdobrando na hegemonia daquele processo produtivo em uma padronização dos trabalhadores:

[...] é possível, com a pressão material e moral da sociedade e do Estado, conduzir os operários como massa para passar por todo o processo de transformação psicofísica a fim de conseguir que o tipo médio do operário de Ford se torne o tipo médio do operário moderno,57

Entretanto, como fora exposto, são necessários ao modo de produção capitalista processos de crise para que se reorganizem as forças produtivas e se retome as das taxas de lucro. Em dado momento a consonância vigente entre o regime de acumulação e o modo de regulação fordista-keynesiano se desfez: o fordismo, frente à competição inter-capitalista, já não era tão produtivo, e assim, as taxas de lucro caíram; o keynesianismo, que antes era combustível ao motor do fordismo, virou um fardo ao capital e já não mais cumpria seu papel. A dissonância concebeu a Crise de 1973. Nas palavras de Hirsch:

A “crise do Petróleo” de meados dos anos sessenta não foi de modo algum a causa da crise econômica mundial, mas uma consequência da estratégia de preços da OPEP e das grandes companhias petrolíferas, mas ela teve uma considerável dimensão simbólica ao deixar claro o limite dos recursos naturais. As manifestações de crise econômica, o desmonte do Estado de bem-estar social e o fim do crescimento econômico, que havia sido considerado como infinito, se conjugaram no quadro de uma reorientação de valores e movimentos de protesto até a convicção, com difusão paulatina, de que o modelo de sociedade fordista, suas estruturas econômicas e as condições de vida que determina, não ofereciam mais perspectiva. Assim, a crise do fordismo não havia sido unicamente uma crise de valorização do capital, mas esteve vinculada a uma crise de hegemonia, que se fazia notar em todas as suas dimensões: ideologicamente, através da desintegração das representações de valores até então dominantes; politicamente, pela erosão da dominação estadunidense; e, institucionalmente, pela transformação dos Estados e das organizações internacionais colocadas em questão.58

GRAMSCI, Antonio. Americanismo e fordismo. São Paulo: Hedra, 2008, p. 81 HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010, p. 156. 57 58

36

2.3 Pós – Fordismo: Toyotismo, acumulação flexível e precarização do trabalho

A década de 80, nos países de capitalismo avançado, foi palco de um notável salto tecnológico que inseriu a automação, a robótica e a microeletrônica no universo fabril influenciando diretamente o processo produtivo vigente. Concomitantemente, dada a crise do fordismo-keynesianismo, se dava um espaço social que vinha sendo disputado por outras formas de organização social e política. Surgia a ofensiva neoliberal em total contraponto à teoria keynesiana. Nas palavras de Moraes Neto:

O ajuste pleno da teoria marxista do processo de trabalho aos acontecimentos produtivos do Século XX necessitam todavia de um teste adicional, representado pelo revolucionamento tecnológico fundamental na esfera produtiva verificado nos anos 80: a nova automação, de base microeletrônica. Ora, é recorrente na literatura que essa nova automação representa o fim do taylorismo-fordismo. É claro que existe grande confusão a respeito, pois é bastante comum a visão equivocada do ohnoísmo (ou toyotismo) como responsável pela superação histórica do taylorismofordismo, em direção a um regime de “acumulação flexível”. Para nós, considerando ser o ohnoísmo não uma superação, mas uma trilha possível a partir do fordismo original, o aspecto fundamental para efeito da superação histórica do taylorismo-fordismo localiza-se na automação de base microeletrônica, possibilitadora, pela primeira vez na história, de aliança entre elevado nível de automação e flexibilidade produtiva. É fato inquestionável que essa nova automação tem levado as plantas fordistas em direção à “unmanned factory”, ou seja, uma fábrica dotada de elevado grau de prescindibilidade do trabalho vivo imediatamente aplicado à produção. (Moraes Neto, p.9) (grifo nosso)

Assim, o paradigma Taylor- Ford foi substituído, ou ainda, historicamente superado pela “especialização flexível”, a qual foi teorizada pioneiramente por Charles Sabel e Michael Piore. Segundo eles a “especialização flexível” seria uma nova forma produtiva que articula desenvolvimento tecnológico e desconcentração produtiva, ou seja, a superação das unidades fabris concentradas e verticalizadas do fordismo e assim, da produção em massa, sendo substituída por empresas médias e pequenas com um processo produtivo mais flexível, “artesanal”. Ademais, segundo os teóricos, o que teria causado a crise capitalista de 1973 teria sido os excessos da produção em massa fordista.

37

Em contrapartida, Sabel e Piore foram muito criticados, uma vez que segundo Simon Clarke, a “especialização flexível” traria na realidade o agravamento da exploração do trabalho, o desqualificando e desorganizando, e quanto à crise do fordismo, afirma que esta é apenas mais uma manifestação da crise permanente e intrínseca ao funcionamento do sistema capitalista. David Harvey cunhará esse processo de acumulação de capital que começa a se desenvolver de “acumulação flexível”. Segundo ele, essa fase do processo produtivo é marcada pelo confronto direto com a rigidez do fordismo, sendo que ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Ademais, afirma que a “acumulação flexível” envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, desencadeando um desenvolvimento no “setor de serviços”, bem como conjuntos industriais em regiões até então subdesenvolvidas.59 Para Ricardo Antunes, em “Adeus ao Trabalho?”, Harvey se diferenciará dos teóricos à época ao reconhecer a existência de uma combinação de processos produtivos articulando o fordismo com processos flexíveis, artesanais, mas que não se deve ignorar a acentuação da flexibilidade nas técnicas de produção e nas relações de trabalho, a desindustrialização e a transferências geográficas de fábricas que se impõem. Ressalta ainda que o desenvolvimento de novas tecnologias aumentou o exército de reserva aumentando o excedente de força de trabalho, viabilizando e retornando, assim, a superexploração. Nessa esteira, emergiram em várias partes do mundo alternativas que se fundiam ou superavam as características centrais do fordismo, sendo que segundo Navarro60 “o taylorismo e o fordismo passam a conviver ou mesmo a ser substituídos por outros modelos considerados mais “enxutos” e “flexíveis”, melhor adequados às novas exigências capitalistas de um mercado cada vez mais globalizado. É a partir dos anos 1980 que se observa o acirramento da chamada reestruturação produtiva. Em um cenário de maior competitividade as empresas, visando a redução dos custos

HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010, p. 148. 60 NAVARRO, Vera Lucia; PADILHA, Valquíria. Dilemas do trabalho no capitalismo contemporâneo. Psicol. Soc., Porto Alegre, v. 19, n. spe, p. 14-20, 2007 . Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-71822007000400004&lng=en&nrm=iso. Acesso em 11 mar. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822007000400004, p. 17. 59

38

de produção, a maior variabilidade de suas mercadorias, a melhoria da qualidade de seus produtos e serviços e de sua produtividade, investiram em mudanças de ordem tecnológica e organizacionais, que repercutiram negativamente nas relações e condições de trabalho.” E ainda que “alguns estudos chegam mesmo a afirmar a existência de um novo paradigma de produção industrial alternativo ao fordismo. São exemplos destas novas experiências o modelo sueco, o modelo italiano e o modelo japonês. No entanto, foi este último que conseguiu maior capacidade de propagação. ” Ou seja, em um contexto de crise econômica, política e ideológica em que meio ao emergir do neoliberalismo se acreditava que a liberalização da economia seria o caminho para se superar a crise, se adicionou o progresso tecnológico que então abriu espaço ao modelo japonês, enquanto processo produtivo com os imperativos da acumulação flexível61. Como já se depreendera da Teoria da Regulação, para se ter alguma estabilidade no capitalismo se faz necessário articular um regime de acumulação com um modo de regulação, no caso, respectivamente se tem o neoliberalismo e a acumulação flexível/toyotismo, como o fordismo se uniu ao keynesianismo, sempre visando o aumento das taxas de lucro e assim a reprodução do modo de produção capitalista. Sendo que Teixeira caracteriza o atual contexto do capital no excerto:

O atual momento de expansão da acumulação capitalista encontra barreiras estruturais intransponíveis, o capital “bateu no teto”, e tal evidência empírica pode ser encontrada em alguns fenômenos como a Centralização do capital; Financeirização da riqueza; Predomínio crescente da produção de descartáveis; Elevação das taxas de desemprego; Precarização da força de trabalho62

Tais fatos ratificam a tese exposta até então nesse trabalho, deixando clara a relação entre crises e reestruturação produtiva, e ainda, a submissão do processo produtivo à forma econômica. “A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional”. (HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010, p. 140.) 62 TEIXEIRA, Francisco José Soares. A Cooperação Complexa. Tese (Doutorado em Educação). Universidade Federal do Ceará, 2005. 61

39

Vale ressaltar que consequência de toda processualidade narrada foi o desemprego estrutural, uma flexibilização nos contratos de trabalho meio a mecanismos de subcontratação e um retrocesso na ação sindical, fatos que golpearam diretamente os trabalhadores e os direitos que haviam conquistado durante o

fordismo

e

o

Estado

de

bem-estar

social.

Assim desenha-se conduta típica da acumulação flexível que por meio de ataques aos direitos dos trabalhadores, flexibilizando e desregulamentando direitos, busca aumentar as taxas de lucros dos capitalistas. Nas palavras de Ricardo Antunes, em “Trabalho e precarização numa ordem neoliberal”:

A sociedade contemporânea, particularmente nas últimas duas décadas, presenciou fortes transformações. O neoliberalismo e a reestruturação produtiva da era da acumulação flexível, dotadas de forte caráter destrutivo, têm acarretado, entre tantos aspectos nefastos, um monumental desemprego, uma enorme precarização do trabalho e uma degradação crescente, na relação metabólica entre homem e natureza, conduzida pela lógica societal voltada prioritariamente para a produção de mercadorias, que destrói o meio ambiente em escala globalizada. (grifo nosso)

No que tange ao modelo japonês, cunhado de toyotismo ou ainda, ohnismo, insta demonstrar alguns traços constitutivos dele para que possamos nos debruçar sobre suas consequências no mundo do trabalho. Coriat contextualiza o advento do modelo em quatro fases, sendo elas: i) dada a necessidade do trabalhador operar várias máquinas simultaneamente, o que posteriormente seria conceituado como trabalhador polivalente, se introduziu à indústria automobilística japonesa técnicas da indústria têxtil; ii) graças à crise, aumento da produção sem o aumento do número de trabalhadores; iii) produzir somente o necessário, no melhor tempo possível, para isso baseou-se na técnica dos supermercados, no sentido de só se repor produtos após sua venda; iv) expansão do último método, que ficou conhecido como kanban, às empresas fornecedoras e subcontratadas.63

63

CORIAT, Benjamin. Ciencia, técnica y capital. Madrid: H.Blume, 1976, p. 27-30.

40

O teórico acrescenta ainda a necessidade de atender o respectivo mercado interno com condições limitadas dado o contexto de pós-guerra do Japão, que então solicitava pedidos pequenos de produtos diferenciados.64 Desta forma, pode se dizer que os traços constitutivos do toyotismo são basicamente uma produção conduzida e voltada diretamente pela demanda, sendo ela flexível e em pequenos lotes de uma variedade de tipos de produtos para satisfazer o consumo. E é o consumo que dita o que é produzido, fato que contraria totalmente a lógica que se aplicava ao processo produtivo fordista. Para que seja possível a satisfação das variadas demandas do consumo é necessário que a produção se sustente em um processo produtivo flexível, ou seja, necessário que haja uma flexibilidade da organização do trabalho. No caso do toyotismo isso se desenvolveu com o que foi chamado de “polivalência do trabalhador japonês” já que os operários se desespecializavam, tendo capacidade de operar variadas máquinas. Segundo Antunes (2015, p.46), Gounet nos mostra ainda que o sistema toyotista supõe uma intensificação da exploração do trabalho, quer pelo fato de que os operários atuam simultaneamente com várias máquinas diversificadas, quer através do sistema de luzes que possibilitam ao capital intensificar – sem estrangular – o ritmo produtivo do trabalho. Ainda nas palavras de Antunes65 outro ponto essencial do toyotismo é que, para a efetiva flexibilização do aparato produtivo, é também imprescindível a flexibilização dos trabalhadores. Direitos flexíveis, de modo a dispor desta força de trabalho em função direta das necessidades do mercado consumidor. O toyotismo estrutura-se a partir de um número mínimo de trabalhadores, ampliando-se através das horas extras, trabalhadores temporários ou subcontratados, dependendo das condições de mercado. O ponto de partida básico é um número reduzido de trabalhadores e a realização de horas extras. Levando em consideração os temas tratados nos parágrafos acima é imprescindível para compreensão do fenômeno toyotista desenvolvermos os

CORIAT, Benjamin. Ciencia, técnica y capital. Madrid: H.Blume, 1976, p. 33-34. ANTUNES, Ricardo. A nova morfologia do trabalho e as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil dos anos 1990. Sociologia. Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Vol. XXVII, 2014, p. 47. 64 65

41

conceitos acerca do processo de precarização, de flexibilização e desregulamentação que recaíram sobre a classe trabalhadora no século XX. Segundo Alves66 uma das determinações estruturais do modo de produção e reprodução capitalista é a constituição sistêmica, a partir de processos de precarização do trabalho vivo, de formas históricas de precariedade social. A principal forma histórica de precariedade social é o sistema do trabalho assalariado que predomina nas sociedades burguesas há séculos. Ou seja, como já se expôs neste trabalho, a criação de mais-valia é necessária para que aconteça a valorização do valor, processo que visa o lucro e consequentemente, o acúmulo de capital. Como se é sabido, a mais-valia depende do trabalho assalariado para se realizar, assim, se fez necessário um processo de proletarização do trabalho. E esse trabalho deturpado em sua essência pelo modo de produção capitalista, isto é, ao trabalho tornar-se mera mercadoria e tornar-se trabalho assalariado, este se caracteriza em uma precariedade social. Nas palavras de Giovanni Alves:

Deste modo, ao dizermos precariedade, tratamos de uma condição sócio estrutural que caracteriza o trabalho vivo e a força de trabalho como mercadoria, atingindo aqueles que são despossuídos do controle dos meios de produção das condições objetivas e subjetivas da vida social. A precariedade do mundo do trabalho é uma condição histórico-ontológica da força de trabalho como mercadoria. Desde que a força de trabalho se constitui como mercadoria, o trabalho vivo carrega o estigma da precariedade social (grifo nosso).67

Nessa esteira, para tratar do conceito de precarização, o localizaremos no século XX, durante o qual o conflito capital versus trabalho galgou conquistas políticas a favor do trabalho. Segundo Alves,68 o Estado Social constituiu-se no período histórico de ascensão histórica do capital no século XX, garantindo, a partir da luta de classe do proletariado organizado, uma ampla margem de concessão às reivindicações do mundo do trabalho. Por exemplo, as leis trabalhistas e a previdência e seguridade social universal, ou o Welfare State, são produtos históricos das lutas sociais e políticas do mundo do trabalho no século passado,

ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007, p. 112. 67 Idem ibidem, p. 113. 68 Idem ibidem, p. 114. 66

42

que ao constituírem obstáculos à sanha de valorização do capital, alteraram a dinâmica de desenvolvimento do capitalismo no século XX. (grifo nosso) Deste modo, o processo de precarização do trabalho é a diluição dessas conquistas, o derrubar dos obstáculos que outrora se conseguira construir, apesar de que em nenhum momento tais ganhos aboliram o caráter de precariedade do trabalho assalariado e ainda, segundo Alves,69 enquanto existir precariedade haverá a possibilidade objetiva de precarização que pode assumir dimensões objetivas e subjetivas. O processo de precarização do trabalho, ou ainda, “flexibilização do trabalho”, como aduzido acima, se impõe pela perda de direitos e pelo aumento da exploração do trabalho.70 Ou seja, tal processo se dá, basicamente, na busca por retomar as taxas de lucro e, ou sob o argumento da competitividade empresarial. Assim, o capitalista sacrifica o já muito pouco que o trabalhador dispõe, em seu favor, impondo maior produtividade, maiores ou menores jornadas, menores salários e muitas vezes, condenando à subcontratação ou mesmo ao desemprego. Fato é que desde que o trabalho se tornou emprego e que os operários por meio de lutas históricas, conquistaram o Direito do Trabalho (que surgiu como uma tentativa de limitar o poder econômico e também pacificar a contradição própria do capital, capital x trabalho) este tem sido alvo de ataques e designado enquanto rígido, inflexível. Entretanto tal questionamento quanto à flexibilidade, coincidentemente, não alcança a rigidez do capital que nega qualquer “retrocesso” em sua conduta de incontornável defesa da majoração de seus lucros, seja como for, a qualquer preço. Deste modo, o discurso de flexibilizar os direitos conquistados pelos trabalhadores basicamente significa torná-los maleáveis e moldáveis conforme o interesse, mas sempre do capital. Mesmo que se queira fazer acreditar que o trabalhador tem legitimidade para mitigar seus próprios direitos, tal assertiva é injusta

ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007, p. 115. 70“O processo de precarização do trabalho, que aparece sob o neologismo da flexibilização do trabalho, impõe-se não apenas por meio da perda de direitos e do aumento da exploração da força de trabalho, por meio do alto grau de extração de sobretrabalho de contingentes operários e empregados da produção social. A precarização do trabalho se explicita por meio através do crescente contingente de trabalhadores desempregados supérfluos à produção do capital”. ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007, p. 126. 69

43

e desigual em sua própria essência, pois claramente a relação de trabalho tem no trabalhador o lado mais fraco, dado que sua sobrevivência depende dele.

A flexibilização abarca uma série de aspectos jurídicos, de acordo com o Direito de cada país, compreendendo fatores econômicos, políticos etc. Existem várias formas de flexibilização do Direito do Trabalho, em decorrência de cada sistema. Do ponto de vista sociológico, a flexibilização é a capacidade de renúncia a determinados costumes e de adaptação a novas situações. Prefiro dizer que a flexibilização das condições de trabalho é o conjunto de regras que tem por objetivo instituir mecanismos tendentes a compatibilizar as mudanças de ordem econômica, tecnológica, política ou social existentes na relação entre o capital e o trabalho. (grifo nosso)71

Como é possível concluir, conjulgam-se aqui o ideário neoliberal de liberalização da economia e consequente desmanche dos direitos sociais próprios do Estado de bem estar social keynesiano, junto da acumulação flexível e o processo produtivo toyotista que corrobora na epidêmica técnica de subcontratação que impera em seu interior. Ou

seja,

para

além

da

tentativa

de

flexibilização

por

meio

da

desregulamentação dos direitos trabalhistas, fazendo com que a recessão econômica prevaleça

sobre tais direitos,

também se experimenta novas formas de

subcontratação e setor informal e de serviços crescente, tópicos que serão desenvolvidos no próximo capítulo.

MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das Condições de Trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 13. 71

44

3. REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO NO CAPITALISMO PERIFÉRICO

O acúmulo primitivo de capital na Europa coroado pela sua expansão ultramarina, lhe deu condições materiais para que submetesse todo um mundo novo aos seus interesses durante o período colonial (1500-1850). Nessa lógica se fundou boa parte do desenvolvimento das nações do capitalismo central. Chamaremos aqui de países de capitalismo periférico aqueles que não centralizam os grandes fluxos econômicos, que encontram-se historicamente submetidos aos mandos e desmandos do colonialismo e imperialismo e que assim, se fizeram dependentes tecnológica, econômica e militarmente, sendo eles basicamente os países da América Latina, Ásia e África, respeitando suas respectivas especificidades. Neste capítulo trataremos da América Latina e posteriormente das atuais especificidades do Brasil. Vale salientar que o modo de produção capitalista em si necessita das disparidades regionais para se reproduzir e manter, sendo que para o desenvolvimento deste capítulo partiremos de uma análise das economias periféricas sob a ótica da Teoria marxista da Dependência, a qual entende a dependência como uma relação de subordinação entre nações periféricas e centrais. Nas palavras de Marisa Silva Amaral72:

a teoria da dependência numa tentativa de demonstrar que, na verdade, o modo de produção capitalista é intrinsecamente desigual e excludente e que desenvolvimento e subdesenvolvimento são fenômenos antagônicos – por se tratarem de situações distintas dentro de uma mesma lógica de acumulação – e, ao mesmo tempo, complementares. Isto se justifica pelo fato de que a lógica mundial de acumulação capitalista possui características que produzem o desenvolvimento de determinadas economias na mesma medida em que produzem o subdesenvolvimento de outras, de tal forma que a dependência é uma característica estruturante das economias periféricas. (grifo nosso)

AMARAL, Marisa Silva. A Investida Neoliberal na América Latina e as Novas Determinações da Dependência. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006, p. 14. 72

45

Ainda segundo Amaral73 é possível distinguir três formas históricas de dependência, as quais se contextualizam também com as mudanças no processo produtivo mundial, ao qual o capitalismo periférico encontra-se subordinado. Inicialmente caracterizou-se a dependência colonial, na qual havia a dominância da Europa sobre suas colônias, das quais a metrópole explorava a exportação de produtos naturais. Em um segundo momento caracterizou-se a dependência financeiro-industrial, quando da passagem do capitalismo comercial para o industrial no capitalismo central, a produção dos países dependentes ficou condenada à exportação e assim determinada de acordo com a demanda dos centros hegemônicos, assim como seu desenvolvimento. E a terceira forma história de dependência seria a tecnológica-financeira, a qual durante a década de 50 se baseou nas corporações multinacionais que investem na indústria voltada para o mercado interno dos países subdesenvolvidos. Sendo que conclui Amaral74:

Cada uma destas formas de dependência corresponde a uma situação que condiciona não somente as relações internacionais desses países, mas também suas estruturas internas: a orientação da produção, as formas de acumulação de capital, a reprodução da economia e, simultaneamente, sua estrutura social e política.

Quanto à dependência colonial, Caio Prado Jr.75 traz importante contribuição quanto aos seus desdobramentos no processo de (sub)desenvolvimento da América

“Desenvolvendo melhor estes aspectos, é possível distinguir três formas históricas da dependência. A primeira delas seria a dependência colonial, com tradição na exportação de produtos in natura e na qual o capital comercial e financeiro, em aliança com os estados colonialistas, domina as relações entre a Europa e as colônias. A segunda seria a dependência “financeiro-industrial” que se consolida ao final do século XIX, sendo caracterizada pela dominação do grande capital nos centros hegemônicos, cuja expansão se dá por meio de investimentos na produção de matérias-primas e produtos agrícolas para seu próprio consumo. Consequentemente, a produção nos países dependentes é destinada à exportação, isto é, a produção é determinada pela demanda por parte dos centros hegemônicos. A estrutura produtiva interna é caracterizada pela rígida especialização e pela monocultura em algumas regiões”. AMARAL, Marisa Silva. A Investida Neoliberal na América Latina e as Novas Determinações da Dependência. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006, p. 31. 74 Idem ibidem, p. 32 75 PRADO JUNIOR, Caio. História econômica do Brasil. 26 ed. São Paulo: Brasiliense, 1974, p. 14. 73

46

Latina ao expor ao que os colonizadores condenaram às colônias tropicais, como o Brasil:

Se vamos à essência da nossa formação, veremos que na realidade nos constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros; mais tarde, ouro e diamante; depois algodão, e em seguida café, para o comércio europeu. Nada mais que isto. É com tal objetivo, objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a economia brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura social, bem como as atividades do país. Virá o branco europeu para especular, realizar um negócio; inverterá seus cabedais e recrutará a mão-de-obra de que precisa: indígenas ou negros importados. Com tais elementos, articulados numa organização puramente produtora, mercantil, constituir-seá a colônia brasileira. Este início, cujo caráter manter-se-á dominante através dos séculos da formação brasileira, gravar-se-á profunda e totalmente nas feições e na vida do país. Particularmente na sua estrutura econômica. E prolongar-se-á até nossos dias, em que apenas começamos a livrar-nos deste longo passado colonial. (grifo nosso)

Deste modo, para real compreensão do processo de formação socioeconômico da sociedade brasileira se faz necessário partir das relações de submissão aos interesses econômicos externos a que fomos castigados desde o período colonial e que perpassam nossa história até hoje nos condenando ao lugar periférico e dependente do capitalismo:

Marini [teórico da vertente marxista da Teoria da Dependência] busca na expansão comercial do capitalismo nascente no século XVI, e na forma como a economia latino-americana se desenvolve em estreita consonância com essa dinâmica, a configuração da situação de dependência, que viria a determinar todo o posterior desenvolvimento da região, definida a partir de uma bem estruturada divisão internacional do trabalho. Desde cedo, a condição para que a América Latina se inserisse na economia internacional esteve relacionada com a capacidade para criar uma oferta mundial de alimentos. Tão logo, a essa função foi acrescentada a de contribuir para a formação de um mercado de matérias-primas industriais, cuja importância crescia em função do próprio desenvolvimento industrial.76 (grifo nosso)

É possível então se depreender que há uma relação desigual de controle hegemônico dos mercados por parte dos países dominantes e uma perda de controle dos dependentes sobre seus recursos, o que leva à transferência de renda – tanto na forma de lucros como na forma de juros e dividendos – dos segundos para os DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub)desenvolvimento na américa latina. Anais do V Colóquio CEMARX. Campinas: Unicamp, 2007, p. 8. 76

47

primeiros. Ou seja, essa relação é desigual em sua essência porque o desenvolvimento de certas partes do sistema ocorre às custas do subdesenvolvimento de outras.77 Ponto pertinente que a Teoria marxista da Dependência desenvolve é à Superexploração da Força de Trabalho, análise que se funda na Lei Geral da Acumulação Capitalista78, de Marx e que delineia as especificidades da precariedade e do processo de precarização do trabalho no Capitalismo Periférico.

Com a Lei Geral da Acumulação Capitalista, Marx tenta mostrar que se mantida constante a quantidade de trabalhadores necessária para por em funcionamento determinada quantidade de meios de produção – ou dito de outra forma, se mantida constante a composição do capital - quando se aumenta o capital, a demanda por força de trabalho deve aumentar na mesma proporção deste. Como a ampliação da procura por força de trabalho leva a um ponto no qual a demanda por trabalho supera sua oferta, os salários também crescem de acordo com o ritmo de crescimento do capital. No entanto, o sistema capitalista de produção tem como lei geral uma produtividade crescente, de tal forma que a composição do capital possui uma tendência a aumentar progressivamente. Nesse sentido, e como a expansão do capital depende que a força de trabalho seja continuamente incorporada a ele, acumular capital significa necessariamente aumentar a massa de trabalhadores, na medida mesmo em que o trabalho vivo por ele exercido é o único capaz de criar valor adicional. Ao ser o motor principal da reprodução no sistema capitalista – dado sua capacidade de criar valor adicional - e conseqüentemente, ao permitir e garantir a ampliação da riqueza, a classe trabalhadora acaba produzindo as condições que a tornam relativamente irrisória a este mesmo processo. Isso porque, quando ocorre um incremento na composição do capital, a produtividade do trabalho deve ser ampliada através da intensificação do processo acumulativo, e não através da contratação de trabalhadores a serem incluídos no processo produtivo, o que quer dizer que amplia-se a quantidade de máquinas e equipamentos, mas a contratação de trabalhadores não acompanha essa ampliação. A partir disso, forma-se o exército industrial de reserva, fator de vital importância para o funcionamento do sistema capitalista. Tal importância se dá na medida em que a classe trabalhadora desempregada que forma esse exército pressiona constantemente a parte dessa mesma classe que está empregada, deixando estes em uma situação de instabilidade e incerteza. Como a parte desempregada está disposta a trabalhar a salários inferiores aos vigentes (já que querem de toda forma se ver livres do desemprego), os que se encontram empregados ficam sujeitos a trabalho excessivo, de modo que a exploração a que são

DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub)desenvolvimento na américa latina. Anais do V Colóquio CEMARX. Campinas: Unicamp, 2007, p. 6. 78 MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, capítulo XXIII. 77

48 submetidos é a fonte de enriquecimento da classe capitalista como um todo. Esse processo se amplia à medida que o capitalismo se desenvolve e a estrutura produtiva vai se modificando e se modernizando. Vale dizer, à medida que o capitalismo se desenvolve, amplia-se a relação capital constante/capital variável e conseqüentemente a produtividade e o excedente produzido, ao mesmo tempo em que se amplia a exploração sobre a massa de trabalhadores.79

Ou seja, considerando que o imperativo que rege o capital é o da autovalorização do valor na busca do lucro e assim, da acumulação de capital, e essa valorização se dá pela mais-valia: “Acumulação do capital é, portanto, multiplicação do proletariado”80, o que levaria a uma maior oferta de trabalho e assim, ao aumento salarial. Entretanto, nas palavras de David Harvey81, o modelo de Marx sugere que, onde quer que enfrente problemas de oferta de trabalho, a acumulação do capital expulsa as pessoas de seus postos de trabalho, recorrendo a inovações tecnológicas e organizacionais, e o resultado é a queda dos salários abaixo de seu valor ou o aumento da jornada e da intensidade de trabalho para aqueles que permanecem empregados. (grifo nosso) Partindo de tais pressupostos passaremos a analisar, a partir da configuração da situação de dependência da América Latina, sua inserção na economia internacional e na divisão internacional do trabalho. Considerando seu papel de prover uma oferta mundial de alimentos e, posteriormente em função do desenvolvimento industrial no capitalismo central, prover matérias primas industriais, forja-se um intercâmbio desigual82 entre as economias

DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub)desenvolvimento na américa latina. Anais do V Colóquio CEMARX. Campinas: Unicamp, 2007, p. 7. 80 MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 837 81 HARVEY, David. Para entender O capital. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013, p. 265 82 “Na medida em que aumentam a oferta mundial de alimentos (que são bens-salário), os países latino-americanos acabam induzindo a uma redução dos preços dos produtos primários no mercado mundial. O resultado direto disso é uma redução do valor real da força de trabalho nos países industriais, permitindo que o incremento da produtividade se traduza em ampliação da mais-valia. “Em outras palavras, mediante sua incorporação ao mercado mundial de bens-salário, a América Latina desempenha um papel significativo no aumento da mais-valia nos países industrializados” (Ibidem, p. 116). Como o preço dos produtos industriais se mantém relativamente estável, a depreciação dos bens primários acaba sendo refletida na deterioração dos termos de troca. Nesses termos, a deterioração dos termos de troca acaba sendo a expressão da realização de um intercâmbio desigual de mercadorias entre nações industriais e não industriais, dentro da imposta divisão 79

49

periféricas e centrais, redundando na transferência de valor da periferia em direção ao centro. Deste modo, para suprir tal intercâmbio desigual, o capitalista da nação dependente tenta compensar tal transferência de valor indevida no plano da própria produção interna ampliando a produção de excedente pelo agravamento da exploração de mais-valia, pelo aumento da intensidade do trabalho, pelo prolongamento da jornada de trabalho ou ainda, pela redução do consumo do operário. Tais mecanismos de tentativa de compensação fazem com que o trabalho na América Latina seja remunerado por baixo de seu valor, explicitando uma superexploração da força de trabalho que decorre da condição de dependência das nações que a compõe. Ou seja, se no modo de produção capitalista o trabalho ao tornar-se mera mercadoria já é dotado de uma precariedade intrínseca, no Sul do mundo tal precariedade se exacerba com a superexploração. Nas palavras de Amaral83:

Haveria três formas históricas iniciais de dependência, quais sejam, a dependência colonial, a dependência “financeiro-industrial” e a dependência “tecnológico-industrial”, caracterizadas pela existência de um intercâmbio desigual entre as economias periféricas e centrais, o que redunda na transferência de valor da periferia em direção ao centro. Isto implica numa forte saída estrutural de recursos, que traz consigo graves problemas de estrangulamento externo e restrições externas ao crescimento. Diante disto, a única atitude que torna possível às economias periféricas garantir sua dinâmica interna de acumulação de capital é o aumento da produção de excedente através da superexploração da força de trabalho internacional do trabalho. Tal intercâmbio, ao contrário de exprimir uma troca de equivalentes, conformam uma série de mecanismos que permitem realizar transferências de valor. Seriam dois os principais mecanismos através dos quais se realizaria a transferência de valor. O primeiro opera em nível da esfera de produção interna. Como as mercadorias tendem a ser vendidas pelo preço de mercado (valor das condições médias de produção), os países centrais acabam realizando suas mercadorias por um valor superior ao custo de produção, na medida em que possuem padrões de produção superiores aos países periféricos. A conseqüência disso é a transferência de valor do centro para a periferia, por conta do processo de concorrência entre capitais internos e externos dentro de uma mesma esfera de produção. O segundo opera no âmbito da concorrência entre distintas esferas que se interrelacionam. A existência de monopólio na produção de bens de alto valor agregado por parte dos países centrais permite que estes vendam seus produtos a preços superiores àqueles que prevaleceriam com iguais taxas de lucro, o que implica que as nações periféricas sejam obrigadas a ceder gratuitamente parte do valor que produzem.” DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub)desenvolvimento na américa latina. Anais do V Colóquio CEMARX. Campinas: Unicamp, 2007, p. 8 (grifo nosso). 83 AMARAL, Marisa Silva. A Investida Neoliberal na América Latina e as Novas Determinações da Dependência. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006, p. 20-21.

50 – e este é o eixo principal através do qual se constrói a teoria marxista da dependência (...) (grifo nosso) dado o comércio internacional, há uma tendência permanente à deterioração dos termos de troca que desfavorece os países exportadores de produtos primários – ao contrário do que apregoa a teoria tradicional das vantagens comparativas –, fazendo com que haja transferência de renda da periferia em direção ao centro. Esta deterioração se dá porque, como as economias primário-exportadoras não desenvolvem seu setor industrial, elas são incapazes de promover uma elevação em seus níveis de produtividade e são também incapazes de incorporar maior quantidade de mão-deobra ao processo produtivo. Ambos os aspectos levam a que se tenha um excedente de força de trabalho e uma redução salarial generalizada para toda a economia, o que promove uma redução nos custos e, por conseguinte, nos preços das mercadorias produzidas. Contrariamente, o componente salarial nos custos das firmas dos países centrais é muito maior do que o que prevalece na periferia. (grifo nosso)84

Ademais, Amaral85 expõe ainda que com a consolidação do neoliberalismo e consequente novo regime de acumulação e modo de regulação, teria se forjado uma nova forma de dependência. “Num período mais recente – mais propriamente, em tempos neoliberais –, tem se firmado uma nova fase do capitalismo, que representaria uma nova forma histórica da dependência – a quarta forma histórica –, caracterizada, principalmente, pela transferência de recursos (valor, nos termos marxistas) na forma financeira, através do pagamento de juros e amortizações em razão de endividamentos externos crescentes. Destacando que esta é uma nova fase da dependência porque aprofunda as condições estruturais da dependência e, por outro lado, assume uma maior face na valorização do capital fictício, que é um tipo de capital que se desdobra tendo como base o capital portador de juros financiador do investimento produtivo,” No Brasil, em um contexto neoliberal, o mecanismo de compensação do capitalista, ou ainda, a superexploração do trabalho como processo de precarização do trabalho tem se materializado no crescente fenômeno da terceirização, que partindo das assertivas acima será analisado no próximo tópico.

AMARAL, Marisa Silva. A Investida Neoliberal na América Latina e as Novas Determinações da Dependência. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006, p. 20. 85 Idem ibidem, p. 32. 84

51

3.1 Terceirização e Precarização do Trabalho: atual panorama brasileiro

Coincidência, ou não, de acordo com Maurício Godinho Delgado os contornos da terceirização começam a ganhar maior clareza no ordenamento jurídico brasileiro no fim da década de 60.86 Vale ressaltar que a Consolidação das Leis do Trabalho, que data de 1940, não versou à época sobre o tema. Naquela oportunidade se previra e definira apenas as figuras do empregado e do empregador em seus artigos 2º e 3º, sendo que estes figurariam em uma relação de emprego caso os critérios da pessoalidade, habitualidade, subordinação e a bilateralidade da relação jurídica fossem atendidos. Suas únicas exceções eram as previstas no artigo 455 do mesmo diploma, o qual previa as figuras da empreitada e subempreitada. Fato é que o processo produtivo vigente à época não requeria ainda tal modo triangular de contratação, já que o contexto histórico-econômico brasileiro que “coincidia”, ou melhor dizendo, (dada sua característica de dependência) encontravase submetido a do capitalismo central, ainda forjava-se sobre o fordismo. Como Ricardo Antunes contextualiza no excerto abaixo:

O capitalismo brasileiro, de desenvolvimento hipertardio quanto ao seu modo de ser, vivenciou, ao longo do século XX, um verdadeiro processo de acumulação industrial, especialmente a partir do getulismo. Pôde, então, efetivar seu primeiro salto verdadeiramente industrializante, uma vez que as formas anteriores de indústria eram prisioneiras de um processo de acumulação que se realizava dentro dos marcos da exportação do café, no qual a indústria tinha o papel de apêndice. De corte fortemente estatal e feição nacionalista, a industrialização brasileira somente deslanchou a partir de 1930 e, posteriormente, com Juscelino Kubitschek, em meados da década de 1950, quando o padrão de acumulação industrial deu seu segundo salto. O terceiro salto foi experimentado a partir do golpe de 1964, quando se aceleraram fortemente a industrialização e a internacionalização do Brasil (Antunes, 1982 e 1992). O país estruturava-se, então, com base em um desenho produtivo bifronte: de um lado, voltado para a produção de bens de consumo duráveis, como automóveis, eletrodomésticos etc., visando um mercado interno restrito e seletivo; de outro, prisioneiro que era de uma dependência estrutural ontogenética, o Brasil continuava também a desenvolver sua produção voltada para a exportação, tanto de produtos primários quanto de produtos industrializados. No que concerne à dinâmica interna do padrão de acumulação industrial, estruturava- se pela vigência de um processo de superexploração da força

86

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015, p. 488.

52 de trabalho, dado pela articulação entre baixos salários, jornada de trabalho prolongada e fortíssima intensidade em seus ritmos, dentro de um patamar industrial significativo para um país que, apesar de sua inserção subordinada, chegou a alinhar-se, em dado momento, entre as oito grandes potências industriais.87 (grifo nosso)

Deste modo, segundo Delgado88 já no fim da década de 1960 e início dos anos 70 é que a ordem jurídica instituiu referência normativa mais destacada ao fenômeno da Terceirização (ainda não designado por tal epíteto nessa época, esclareça‐se). Mesmo assim tal referência dizia respeito apenas ao segmento público (melhor definindo: segmento estatal) do mercado de trabalho – administração direta e indireta da União, Estados e Municípios. É o que se passou com o Decreto‐Lei n. 200/67 (art. 10) e Lei n. 5.645/70. Após o Decreto‐Lei nº 200/67 adotar a terceirização no segmento estatal foi publicada a Lei 5.645/70 que disciplinava quais atividades poderiam ser terceirizadas na Administração direta e indireta, sendo que eram: “as atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas”. Valendo destacar que o Decreto citado fora editado em plena Ditadura Militar brasileira, o que denuncia o caráter autoritário e a função economicamente liberal do ato. Posteriormente foram publicadas as Leis que versavam sobre trabalho temporário (Lei 6.019/74); serviços de vigilância bancária (Lei 7.102/83); serviços de telefonia (Lei 9.472/97) e a Lei 8.863/94 que acrescentou a possibilidade de se terceirizar toda a área de vigilância patrimonial, sendo ela pública ou privada. Segundo Delgado (2015, p.489) a partir da década de 70, apesar da inexistência de texto legal que permitisse e regulamentasse a terceirização, a prática já era uma realidade. Tal fato ratifica a “coincidência” entre a crise do fordismo no capitalismo central e o nascer de um novo processo produtivo em um regime de acumulação flexível que requeria contratos mais flexíveis e que já refletia tais imperativos no capitalismo periférico. E também se expressa a submissão ou ainda, articulação (rememorando a

ANTUNES, Ricardo. A nova morfologia do trabalho e as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil dos anos 1990. Sociologia. Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Vol. XXVII, 2014, p. 11-25. 88 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015. 87

53

Teoria da Regulação) da legislação, no caso do Direito, à forma econômica, que no respectivo contexto histórico-econômico se viu tendo que adequar-se às demandas do novo regime de acumulação. Nas palavras de Ricardo Antunes89:

Foi durante a década de 1980, que ocorreram os primeiros impulsos do nosso processo de reestruturação produtiva, levando as empresas a adotar, no início de modo restrito, novos padrões organizacionais e tecnológicos, novas formas de organização social do trabalho. Iniciouse a utilização da informatização produtiva e do sistema just-in-time; germinou a produção baseada em team work, alicerçada nos programas de qualidade total, ampliando também o processo de difusão da microeletrônica. Deu-se, também, o início da implantação dos métodos denominados “participativos”, mecanismos que procuram o “envolvimento” (na verdade, a adesão e a sujeição) dos trabalhadores com os planos das empresas. (grifo nosso)

Como é possível depreender, o processo produtivo brasileiro passa por grande transformação a partir da década de 80, a qual fora impulsionada pela competição internacional e pela imposição de “novos” processos de produção pelas transnacionais. Essa reestruturação produtiva caracterizou-se então pela busca da redução de custo pela redução da força de trabalho, despendendo um desemprego estrutural. Sendo que, segundo Ricardo Antunes, os setores que foram principalmente expostos a tais mudanças foram os automobilísticos, têxtil e bancário. Entretanto havia ainda a necessidade da elevação da produtividade, que ficou a cargo então da reorganização da produção que conseguia diminuir a quantidade de trabalhadores, mas em compensação elevava a jornada de trabalho resultando na superexploração. De modo sintético pode-se dizer que a necessidade de elevação da produtividade ocorreu através de reorganização da produção, redução do número de trabalhadores, intensificação da jornada de trabalho dos empregados, surgimento dos CCQ’s (Círculos de Controle de Qualidade) e dos sistemas de produção just-in-time e kanban, dentre os principais elementos.90

ANTUNES, Ricardo. A nova morfologia do trabalho e as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil dos anos 1990. Sociologia. Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Vol. XXVII, 2014, p. 11-25. 90 ANTUNES,, Ricardo. Os caminhos da liofilização organizacional: as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil. Idéias 2002/2003; 9/10:13-24. p. 17 89

54

Em 1985 frente ao crescente número de fraudes que ocorriam no setor bancário, o TST se posiciona pela primeira vez quanto ao tema e edita a Súmula nº 293, cujo conteúdo era: “É bancário o empregado de empresa de processamento de dados que presta serviço a banco integrante do mesmo grupo econômico”. Deste modo, passou a ser considerada atividade própria do banco o processamento de dados, entendendo-se então ilícita a terceirização do que, se entendeu por “atividadefim”, no artigo 581, § 2º, da CLT. Posteriormente, em 1994, foi editada a Lei 8.949 que introduziu na CLT o parágrafo único do artigo 442 que determinava que: “qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela”. Tal disposição ensejou uma série de fraudes que fizeram com que os números de reclamações trabalhistas disparassem e em consequência disso, buscando uniformizar a jurisprudência da Corte, o TST, em 1986, editasse a Súmula nº 256 declarando expressamente que a terceirização só seria lícita nos dois casos já previstos em lei, sob pena de se caracterizar o vínculo empregatício: “Salvo nos casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previsto nas leis 6.019 e 7.102, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando‐se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.” (grifo nosso) Entretanto, tais esforços não obteram êxito e em 1993 o TST editou nova Súmula, a nº 331, que passou a abranger também a temática no campo da Administração Pública, e que até a atualidade é a que regulamenta o instituto da terceirização no Brasil:

I ‐ A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando‐se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário. (Lei n. 6.019, de 03.01.1974). II ‐ A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional. (art. 37, II, da CF/1988). III ‐ Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20‐06‐1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade‐meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

55 IV ‐ O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).” (Alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000)

Como é possível notar, a S. 331 acrescentou às exceções passíveis de terceirização as chamadas atividades-meio das empresas, as ampliando. Porquanto, vale contextualizar, nas palavras de Marcio Pochmann91, o fato de que não fora mera coincidência sua edição em plenos anos 90, restando novamente clara a articulação daquele novo regime de acumulação neoliberal e o modo de regulação:

No regime democrático iniciado em 1985, a regressão na regulação do trabalho se deu na década de 1990, com a flexibilização dos contratos impulsionada pelos governos neoliberais dos fernandos (Collor, 1990‐92, e Cardoso, 1995‐2002). O avanço na precarização nas relações de trabalho se mostrou inquestionável, com agravamento da informalidade e do desemprego. (grifo nosso)

Ademais, ainda quanto à edição da Súmula nº 331, se faz claro que o enunciado transcendeu os limites do Poder Judiciário ao possibilitar a terceirização também das atividades-meio sem haver previsão legal para tal. Ao interpretarmos os artigos 2º e 3º, da CLT resta óbvio que a relação bilateral se impõe como regra e que assim, as exceções deveriam vir a sê-las por mais que mera arbitrariedade de um Tribunal. Quanto aos argumentos usados pelo empresariado que defende a terceirização indiscriminada, segundo Giorgio, Lopes e Cozero92 para legitimar o processo de terceirização utiliza-se do argumento de que esta prática diminuiria os custos da produção possibilitando que as empresas contratem mais, havendo aumento dos postos de trabalho, maior dinamismo e crescimento econômico.

POCHMANN, Márcio. A terceirização e a UBERização do trabalho no Brasil. 2016. Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2016/08/24/aterceirizacaoeauberizacaodotrabalhonobrasil/. Acesso em 01 jul. 2016. 92 LOPES, João Gabriel; COZERO, Paula; GIORGI, Fernanda. O que está em jogo em matéria de terceirização trabalhista no Supremo Tribunal Federal?. In: Wilson Ramos Filho; José Eymard Loguércio; Mauro de Azevedo Menezes. (Org.). Terceirização no STF: elementos do debate constitucional. Bauru: Canal 6, 2015, v. 1, p. 13-38. 91

56

Contudo, contrariamente a este ciclo, a terceirização tem consolidado um encadeamento perverso de fatores que causa desequilíbrios econômicos e sociais: a diminuição dos custos da produção se dá através dos baixos salários e da precariedade a que estes empregos estão ligados. O rebaixamento massivo dos salários dos trabalhadores desencadeará o empobrecimento da população, diminuição do consumo e redução da produtividade com impacto negativo sobre o número e empregos. O artigo ainda cita o impacto da terceirização no papel que o Brasil desempenha na divisão internacional do trabalho, ponto também tratado por Ricardo Antunes que caracteriza o “discreto charme do capitalismo brasileiro” que seria justamente oferecer “superexploração da força de trabalho com padrões produtivos tecnologicamente

mais

avançados”

ao

capital

estrangeiro,

reinventando

e

consolidando nosso papel de economia dependente, praticamente colonial. Para além da superexploração, a terceirização manifesta e viabiliza outros processos de precarização do trabalho como a maior rotatividade entre empregos, maior índice de acidentes de trabalho, maiores riscos de trabalho análogo ao de escravo e ainda, agravamento da dificuldade de receber as verbas trabalhistas devidas na Justiça do Trabalho em decorrência de reclamação trabalhista. Valendo ressaltar que cerca de 80% dos acidentes de trabalho no Brasil estão ligadas à prestação de trabalho terceirizado e a análise dos 10 maiores resgates de trabalhadores em condições análogas a de escravos entre 2010 e 2013 indica que 85% deles eram terceirizados.93 Enfim, a terceirização, após o trabalho escravo, é, talvez, a maior expressão da mercantilização da força de trabalho humana. A terceirização rompe a estrutura binária – empregador/empregador – que ainda hoje marca a relação de emprego e retira o trabalhador da posição de protagonista dessa relação, tornando-o objeto de uma negociação comercial entre duas empresas – a prestadora e a tomadora. Nesses termos, terceirização nada mais é do que a mais ampla expropriação do ser humano, que deixa de ser proprietário de sua própria força de trabalho. O bem colocado à disposição do mercado

LOPES, João Gabriel; COZERO, Paula ; GIORGI, Fernanda . O que está em jogo em matéria de terceirização trabalhista no Supremo Tribunal Federal?. In: Wilson Ramos Filho; José Eymard Loguércio; Mauro de Azevedo Menezes. (Org.). Terceirização no STF: elementos do debate constitucional. 1ed.Bauru: Canal 6, 2015, v. 1, p. 13-38. 93

57 pela terceirização é a energia vital dos trabalhadores terceirizados, que, reificados, tornam-se passíveis de alienação.94 (grifo nosso)

Deste modo, analisando todo o contexto de crise e reestruturação produtiva que encontram-se por trás da defesa indefensável da terceirização, resta claro que a saída da flexibilização e desregulamentação das relações empregatícias só atende aos interesses de uma elite, que sequer existiria não fossem as trabalhadoras e trabalhadores que levam há mais de cinco séculos, este país nas costas.

TRINDADE, Pedro Mahin Araujo. O golpe de 2016 e a terceirização: um programa governamental de domínio do capital sobre a classe trabalhadora. 94

58

CONCLUSÃO.

Partindo de um referencial teórico marxista buscou-se neste trabalho analisar o modo de produção capitalista, os processos de crise, reestruturação produtiva, precarização do trabalho e suas conexões. Ao observar o modo de produção capitalista sobre o prisma de seu incontornável caráter expansivo foi possível concluir que há contradições internas, de seu próprio funcionamento que o levam a processos de crises. Sendo que, partindo do pressuposto de que o capitalismo precisa a todo momento se reorganizar para que sua continuidade seja possível, os processos de crise ao permitirem isso, verificam papel crucial em sua existência. Historicamente foi possível demonstrar que contextos de crise propiciaram grandes

mudanças

nos

processos

produtivos.

Esse

fenômeno

nomeado

reestruturação produtiva, que se caracteriza basicamente pela reorganização do trabalho na constante busca da retomada e aumento das taxas de lucro, a qualquer custo. Nesse sentido, vale destacar o caráter de mercadoria que o capitalismo impôs à concepção e função do trabalho. Sendo que, ao deturpar completamente a concepção de trabalho e impor a ela a lógica da busca incessante do lucro, o capital tornou ainda, o homem mera ferramenta de todo o processo produtivo. Deste modo, analisando o processo de reestruturação do processo produtivo a partir do século XIX, do Taylorismo ao Toyotismo, e as crises que o permearam, foi possível depreender que tanto quanto as crises, o processo de precarização do trabalho também se mostrou intrínseco ao capitalismo. Tal fato, restou mais claro ainda ao observarmos a dinâmica do capitalismo periférico, no qual o processo de precarização do trabalho é exacerbado pela superexploração da força de trabalho, a que a condição de dependente o condena. Nesta esteira, foi contextualizado o instituto da terceirização no Brasil, o qual materializa os imperativos do neoliberalismo e da acumulação flexível no processo produtivo brasileiro. Vale ressaltar que tal fato expõe a necessidade do Direito do Trabalho de se adequar às “novas formas” econômicas. Ou seja, expõe o que a Teoria da Regulação já demonstrara: a necessidade de articulação entre o regime de

59

acumulação de capital e modos de regulação, que no caso se materializam em uma faceta jurídica. Vale rememorar e ressaltar que não foram as mínimas garantias trabalhistas que levaram, e levam, à crise econômica, e muito menos a retirada delas provocará a recuperação da economia, como já comprovou a História em outros momentos em que se deu o aprofundamento do liberalismo. Deste modo, foi possível concluir que se os processos de crise são imanentes das contradições do capital, tanto quanto o processo de precarização do trabalho também o é, somente a superação do modo de produção capitalista se apresenta como saída real para as mazelas que castigam a classe trabalhadora. Neste sentido: A juventude trabalhadora, sobretudo, é chamada para esta grande tarefa. Como geração futura, ela formará com toda certeza o verdadeiro fundamento da economia socialista. Ela tem que mostrar já, como portadora do futuro da humanidade, que está à altura dessa grande tarefa. Há todo um velho mundo ainda por destruir e todo um novo mundo a construir. Mas nós conseguiremos, jovens amigos, não é verdade? Nós conseguiremos!95

LUXEMBURGO, Rosa. A Socialização da Sociedade. Gesammelte Werke, Vol. 4, p 431-34, RDA, Berlin, 1970-75. 95

60

REFERÊNCIAS.

ACADEMIA DE CIÊNCIAS DA URSS. Instituto de Economia. Manual de Economia Política. Tradução de Jacob Gorender. Rio de janeiro. Editorial Vitória, 1961. Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/manual/index.htm. Acesso em 01 jul. 2016. AGLIETTA, Michel. A Theory of Capitalist Regulation: the US Experience. Londres, NLB, 1979. ALTHUSSER, Louis. Sobre a reprodução. Petrópolis: Vozes, 2008. ALVES, Giovanni. Dimensões da Reestruturação Produtiva: ensaios de sociologia do trabalho. 2.ed. Londrina/Bauru: Praxis/Canal 6, 2007. AMARAL, Marisa Silva. A Investida Neoliberal na América Latina e as Novas Determinações da Dependência. Dissertação (Mestrado em Economia) – Instituto de Economia. Uberlândia: Universidade Federal de Uberlândia, 2006. ANTUNES, Ricardo. A nova morfologia do trabalho e as formas diferenciadas da reestruturação produtiva no Brasil dos anos 1990. Sociologia. Revista da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Vol. XXVII, 2014, p. 11-25. BRIGHTON LABOUR PROCESS GROUP. The Capitalist Labour Process. Capital & Class. Londres, v, 1, 1977. CENTRAL ÚNICA DOS TRABALHADORES. Secretaria Nacional de Relações de Trabalho e Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos. Terceirização e desenvolvimento: uma conta que não fecha. Dossiê acerca do impacto da terceirização sobre os trabalhadores e propostas para garantir a igualdade de direitos / - São Paulo: Central Única dos Trabalhadores, 2014. CORIAT, Benjamin. Ciencia, técnica y capital. Madrid: H.Blume, 1976. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2015. DUARTE, Pedro Henrique Evangelista; GRACIOLLI, Edílson José. A teoria da dependência: interpretações sobre o (sub)desenvolvimento na américa latina. Anais do V Colóquio CEMARX. Campinas: Unicamp, 2007. DRUCK, Maria da Graça. Terceirização (des)Fordizando a Fábrica. Salvador: Edufa,1999. GORENDER, Jacob. Apresentação. In: MARX, Karl. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013.

61

GRAMSCI, Antonio. Americanismo e fordismo. São Paulo: Hedra, 2008. HARVEY, David. Condição Pós-Moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 20.ed. São Paulo: Loyola, 2010. ______. 17 contradições e o fim do capitalismo. Tradução: Rogério Bettoni. 1 ed. – São Paulo: Boitempo, 2016. ______. Para entender O capital. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013. HIRSCH, Joachim. Teoria Materialista do Estado: processos de transformação do sistema capitalista de Estados. Tradução de Luciano Carvini Martorano. Rio de Janeiro: Revan, 2010. HOBSBWAWM, Eric. A era das revoluções: 1780-1848. Tradução de Maria Tereza Lopes Teixeira e Marcos Penchel. São Paulo: Paz e Terra, 2005. KOHAN, Nestor. Dicionário básico de categorias marxistas. Disponível em: https://pcb.org.br/portal/docs1/texto3.pdf. Acesso em 01 out. 2016. LIPIETZ, Alain. Akkumulation, krisen und auswege aus der krise. Prokla, nº 58, 1985. LOPES, João Gabriel; COZERO, Paula; GIORGI, Fernanda. O que está em jogo em matéria de terceirização trabalhista no Supremo Tribunal Federal?. In: Wilson Ramos Filho; José Eymard Loguércio; Mauro de Azevedo Menezes. (Org.). Terceirização no STF: elementos do debate constitucional. Bauru: Canal 6, 2015, v. 1, p. 13-38. LUXEMBURGO, Rosa. A Socialização da Sociedade. Gesammelte Werke. Vol. 4, p 431-34, RDA, Berlin, 1970-75. MARX, Karl. Capítulo inédito D’O Capital: resultado do processo de produção imediato. Escorpião, 1975. ______. El Capital. Vol. III. Cidade do México: FCE, 1973. ______. O capital. Vol. I. Tradução de Rubens Enderle. São Paulo: Boitempo, 2013. ______. ENGELS, Friedrich. Manifesto do partido comunista. São Paulo: Expressão Popular, 2008. MARTINS, Sergio Pinto. Flexibilização das Condições de Trabalho. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009 MASCARO, Alysson Leandro. Estado e forma política. São Paulo: Boitempo, 2013.

62

MELLO, Alex Fiúza de. Crise Mundial e reestruturação produtiva: algumas questões de ordem teórica. Novos Cadernos NAEA. Belém, v. 7, n. 1, p. 5-30, jun. 2004. Disponível em: http://www.periodicos.ufpa.br/index.php/ncn/article/view/34. Acesso em 01 out. 2016. NAVARRO, Vera Lucia; PADILHA, Valquíria. Dilemas do trabalho no capitalismo contemporâneo. Psicol. Soc., Porto Alegre , v. 19, n. spe, p. 14-20, 2007 . Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010271822007000400004&lng=en&nrm=iso. Acesso em 11 mar. 2016. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-71822007000400004. PAMPLONA, João Batista. Inserção brasileira no novo padrão capitalista. Pesquisa & Debate. São Paulo: PUCSP, v. 7, n. 2, 1996. POCHMANN, Márcio. A terceirização e a UBERização do trabalho no Brasil. 2016. Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2016/08/24/aterceirizacaoeauberizacaodotrabalhonob rasil/. Acesso em 01 jul. 2016. PRADO JUNIOR, Caio. História econômica do Brasil. 26 ed. São Paulo: Brasiliense, 1974. SCHUMPETER, Joseph A. Capitalismo, socialismo e democracia. Editado por George Allen e Unwin Ltd. Tradução de Ruy Jungmann. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de direito do trabalho: teoria geral do direito do trabalho, volume I: Parte I. São Paulo: LTr, 2011. TEIXEIRA, Francisco José Soares. A Cooperação Complexa. Tese (Doutorado em Educação). Universidade Federal do Ceará, 2005.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.