DA CASA DE FAZENDA À CASA DA RUA: A CONSOLIDAÇÃO URBANA DE ACARI-RN (1850-1890

May 22, 2017 | Autor: Cicero Jose | Categoria: Historia, Patrimonio Cultural, História Da Arquitetura E Do Urbanismo
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DA CASA DE FAZENDA À CASA DA RUA: A CONSOLIDAÇÃO URBANA DE ACARI-RN (1850-1890) Cícero José de Araújo Silva1

RESUMO

O objetivo deste trabalho é entender como se deu o processo de consolidação do espaço urbano acariense, atentando para as várias nuances que foram engendradas dentro desse contexto histórico. Foram realizadas pesquisas acerca da formação histórica da cidade, e a análise procura entender os diversos estágios de transformações ocorridos a partir da instauração da vila onde as posturas municipais tiveram papel importante no controle dos aspectos estéticos-formais do espaço. Palavras-chave: História. Acari. Urbano.

1 INTRODUÇÃO

Acari foi uma das povoações que surgiram no sertão da Capitania do Rio Grande do Norte, ainda na primeira metade do século XVIII. Sua gênese está ligada à expansão das fazendas de gado, cujos proprietários, geralmente, mantinham a chamada “casa da rua” 2, situada na povoação. Referimo-nos à Povoação do Acari, que, a partir de 1738, passou a contar com a Capela de Nossa Senhora da Guia, no derredor da qual o tecido “urbano” desenvolveu-se de forma gradativa.3 A partir do momento em que a povoação foi elevada à Vila do Acari (1833), as edificações urbanas proliferaram-se, obedecendo aos ditames do Código de Posturas Municipal. O espaço urbano aos poucos foi sendo regulado e moldado sofrendo transformações em variados níveis de intensidade, vivendo seu ápice de melhorias posterior a 1850, onde a localidade passou a se reconfigurar. (APMA, 1850-1900)

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Discente do Curso de Licenciatura em História – UFRN-CERES-Campus de Caicó. E-mail para contato: [email protected] 2 O termo casa da rua é usado aqui para nomear a residência que os fazendeiros mantinham no Acary, pois em sua maioria residiam em suas fazendas, nos arredores da povoação e depois vila, fazendo uso de casa da rua apenas em ocasiões de festas religiosas ou em dias de feiras. 3 Sintetizamos, neste parágrafo, o conteúdo encontrado na historiografia tradicional de e sobre Acari (SANTA ROSA, 1974; MEDEIROS, 1985; CASCUDO, 1968) acerca do processo sócio histórico de produção do espaço, cujo marco principal, apontado, é a “fundação” do povoado, nas primeiras décadas do século XVIII.

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O território do Acari foi desmembrado de Caicó4·, com o desenvolvimento urbano pela qual passava a Província, a vila do Acari foi sofrendo fragmentações, fazendo emergir novas municipalidades, como Jardim do Seridó5 e a atual Currais Novos6 – As tímidas manchas urbanas nascidas no contexto da guerra dos “bárbaros” e no repovoamento, davam seus frutos, originando novas localidades. (SANTA ROSA, 1974) No contato com autores da historiografia local e regional que mencionam Acari em seus escritos, como por exemplo, Santa Rosa (1974), percebemos que ao tratar de aspectos da aglomeração, o autor aponta para a existência de uma “casa da rua” onde os fazendeiros passavam apenas os finais de semana, vindo para a realização da feira e de suas obrigações religiosas. O contato com a documentação encontrada nos arquivos municipais também nos foi deixando pistas e indícios para formular nosso questionamento7. Neste sentido questionamos: Como a Villa do Acari se configurou urbanisticamente, isto é, quando deixou de ser uma localidade semi-rural, para concentrar em si a vida social e econômica? Através de que fatores ou indícios podemos visualizar seu processo de consolidação urbana? Nosso recorte espacial abarca o espaço citadino como um todo, no entanto esta ligada a ideia do núcleo que deu origem a cidade, e hoje é conhecido por centro histórico e como sendo este um produto do século XIX, mereceu nosso enfoque uma vez que nasceu justamente das melhorias na forma urbana vividas pela municipalidade nesse período. Nosso recorte temporal é essencialmente o século XIX, mesmo que apresentemos em nossa pesquisa dados e fatos do século XVIII e XX, estes aparecem como suporte e complemento para conectar nossa escrita.

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A origem de Caicó está ligada ao Arraial do Queiquó, “fundado” em 1700 por Manuel de Souza Forte, no lugar onde havia, no fim do século XVII, a Casa Forte do Cuó e Capela da Senhora Santana do Vale do Acauã. Esse arraial foi elevado a Povoação do Caicó em 1735, em cuja sede foi instalada a Freguesia da Gloriosa Senhora Santa Ana do Seridó no ano de 1748. A povoação foi elevada ao status de Vila Nova do Príncipe em 1788, tendo sido transformada em cidade em 1868 (com o título de Cidade do Príncipe). Em 1890 essa cidade teve seu nome alterado para Seridó e, poucos meses depois, para Caicó, denominação que guarda ainda hoje (MEDEIROS FILHO, 1988). 5 Por volta de 1790, Antonio de Azevedo Maia erigiu uma capela em sua fazenda Conçeição, essa iniciativa atraiu para a orbita do templo, a construção de casinhas que aos poucos foi dando alguma importância a localidade, dando origem ao aglomerado Conçeição do Azevedo. A povoação cresceu, tendo sido criada sua freguesia em 1856, e logo dois anos depois em 1858, recebeu foros de vila. 6 O atual território de Currais Novos teve sua gênese ligada ao ciclo do algodão, quando em 1754, Cipriano Lopes Galvão fixou-se no Totoró. Em 1808, foi erigida uma Capela e consagrada a Sant´anna, onde o aglomerado começou a se expandir. Em 1884, surge a freguesia da Senhora Sant´anna de Currais Novos, desmembrada da freguesia de Nossa Senhora da Guia do Acari, em 1890 receberia o titulo de vila ao se emancipar da referida cidade. 7 A documentação mencionada trata-se de livros de atas, encontrados no arquivo da prefeitura municipal de Acari bem como documentos digitalizados e disponíveis na internet.

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Nosso objetivo neste trabalho é desenvolver um estudo sobre a consolidação urbana pelo qual passou Acari, analisando desde sua emergência como um município/vila em1833 até a obtenção de foros de cidade, em 1898. Do ponto de vista acadêmico, o trabalho segue uma linha de estudos desenvolvidos no âmbito da História do Urbanismo e da Arquitetura, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), que enfocam o espaço urbano e relacionam a temática ao município de Acari. Em se tratando de pesquisas desenvolvidas no âmbito da Arquitetura, 8 registramos a dissertação de mestrado de Paulo Heider Forte Feijó, que procede a um estudo comparativo entre a arquitetura tradicional de Acari no decurso do século XIX, a partir de exemplos do mundo rural e do urbano (FEIJÓ, 2002). No mesmo ano do estudo de Feijó (2002), na Ecole des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), Rubenilson Brazão Teixeira defendeu sua tese de doutorado em Estudos Urbanos, que, no Brasil, foi publicada somente em 2009 com o título de Da cidade de Deus à cidade dos homens: a secularização do uso, da forma e da função urbana. Dentre as doze aglomerações urbanas escolhidas pelo autor como seu recorte espacial de análise encontra-se Acari, que é historicizada a partir dos aspectos ligados ao surgimento e expansão do tecido urbano (TEIXEIRA, 2009). A cidade de Acari voltou a ser objeto de atenção de Rubenilson Brazão Teixeira no ano de 2012, figurando entre as treze cidades do Rio Grande do Norte analisadas, em perspectiva comparativa, no livro O poder municipal e as casas de câmara e cadeia: semelhanças e especificidades do caso potiguar (TEIXEIRA, 2012). As fontes históricas, por assim dizer, podem ser apontadas como o suprassumo do metier do historiador. É através desses fragmentos que emergem do passado que o pesquisador pode formular respostas para suas inquietações. Lançando mão de variados tipos de fontes, escritas, visuais, arqueológicas e entre elas matérias, é que o historiador produz o resultado de suas incursões ao passado. Dito isso é afirmar que sem fontes não existe produção historiográfica, sem elas se torna impossível visualizar respostas para nossas inquietações. Em nossa pesquisa tal elemento imprescindível esta presente. As fontes históricas usadas para problematizar nosso objeto de estudos compõem um escopo documental de 8

Publicações acadêmicas resultantes de esforços de investigação de arquitetos incluem, igualmente, Acari dentre as cidades que detém importante conjunto arquitetônico. Estamos nos referindo a Arquitetura no Rio Grande do Norte: uma introdução, de Pedro de Lima (LIMA, 2002) e ao capítulo “Arquitetura no Rio Grande do Norte”, de autoria de Jeanne Fonseca Leite Nesi, que integra o Caminhos da Arte no Rio Grande do Norte (NESI, OLIVEIRA e ALMEIDA, 2001).

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caráter administrativo. Especificamente os livros de atas que compõem o acervo documental do Arquivo da Prefeitura Municipal de Acari. Tais livros são em número de seis e estão dispostos nas seguintes pastas: pasta nº 36 1833-1834, pasta nº 37 1833-1844, pasta nº 38 1845-1864, pasta nº 40 1875-1887 pasta nº 41 1890-1900. O acesso à documentação não é restrito, mas depende da disponibilidade de um funcionário ir abrir o arquivo que funciona em um prédio anexo à prefeitura. A autorização pode ser conseguida informalmente, falando-se com um secretário do setor administrativo. É permitida a fotografia sem flash. Esse conjunto documental já foi utilizado por alguns estudiosos e pesquisadores da historia local e regional, entre eles podemos citar Jayme da Nobrega Santa Rosa, que bebeu largamente desse conjunto documental para escrever seu livro Acari: Fundação, História e Desenvolvimento em 1974. No decorrer de sua obra encontramos várias referências claras quanto ao uso desses documentos. Outro a utilizar essas fontes históricas foi Rubenilson Teixeira Brazão, que em principio dos anos 2000, consultou esses documentos e que seriam referenciados e citados em duas importantes obras de sua autoria: Da cidade de Deus a cidade dos homens: a secularização do uso, da forma e da função urbana (2009) e O poder municipal e as casas de câmara e cadeia: semelhanças e especificidades do caso potiguar (2012). A execução do trabalho, em um primeiro momento teve por base a leitura, fichamento e análise de obras da historiografia regional e local9 (Velhas famílias e Velhos Inventários de Olavo de Medeiros Filho, Acari Fundação História e Desenvolvimento de Jayme Santa Rosa, Paróquia do Acari e Relembrando Momentos de Fé de Bianor Medeiros), a partir das quais vislumbramos a localização das fontes documentais, ensejando a ida aos acervos. Foi feita uma revisão historiográfica tendo como base os trabalhos de pesquisadores como Helder Macedo, Muirakytan Kennedy, Alcineia Rodrigues dos Santos e Ione Morais, com um enfoque para as questões do urbano do século XVIII, que nesse caso trata-se de pequenas machas populacionais com características semi-rurais. A etapa de pesquisa foi realizada nos arquivos da Prefeitura Municipal de Acari, onde efetuamos a consulta aos mananciais de documentos, sua leitura e fichamento daqueles que interessam, principalmente, ao nosso objetivo de analisar os diversos estágios de ocupação e mudanças na morfologia urbana da cidade de Acari entre os séculos XIX e XX. Nos referidos

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Consideramos, para fins deste trabalho, como historiografia o conjunto da produção de obras de cunho histórico-historiográfico, seja de natureza acadêmica ou não acadêmica. A historiografia regional compreende as obras cuja finalidade foi abordar a região do Seridó, enquanto a local corresponde aos livros que tratam, especificamente, da realidade de Acari.

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Arquivos entramos em contato com documentação de caráter administrativo, como: pasta nº 36 1833-1834, pasta nº 37 1833-1844, pasta nº 38 1845-1864, pasta nº 41 1890-1900. Do ponto de vista do aporte teórico, este estudo se insere no campo da História da Cultura Material, dimensão que analisa os objetos materiais e sua comunicação com as faces mais sólidas da vida humana (BARROS, 2009, p. 30-3). Neste sentido estamos admitindo o espaço urbano de Acari enquanto produto da cultura humana, ou seja, artefatos revestidos de materialidade que podemos compreender, inclusive, como fontes, ao passo que nos revelam os modos de vida de quem os construiu, habitou e deles fez uso.10 Para facilitar a escrita e melhor compreensão o artigo esta divido em três sessões. Na primeira: A vila e o poder municipal, discutimos a ascensão do município de Acari e sua elevação aos foros de Vila, momento esse em que passou a ter uma administração municipal através da Casa de Câmara e Cadeia. Na segunda sessão: O espaço urbano e as posturas, elencamos as transformações estéticas e formais impostas pelas leis do código de Posturas. Na terceira e ultima sessão: (re)configurações urbanas voltamos nosso olhar para as modificações e transformações na forma urbana em Acari a partir de 1850.

2 A ASCENSÃO DE UMA MUNICIPALIDADE E SUAS (RE) CONFIGURAÇÕES URBANAS

2.1 O status de vila e o poder municipal

O século XIX pode ser considerado como o da urbanização na Província do Rio Grande do Norte. A frágil rede urbana, que perdurou até meados do século XVIII, agora dava sinais e indícios de um crescimento considerável. Se até 1750, a capitania possuía apenas uma cidade, Natal, nos anos 1800 essa situação começou a mudar. Até o fim do século XIX, a província possui 14 municípios, sendo 03 cidades e 11 vilas. Esse panorama permite-nos afirmar que, de maneira geral, o Rio Grande do Norte passava por um processo de desenvolvimento e urbanização uma vez que o município é desmembrado em outras unidades territoriais, quando essas alcançam certo grau de povoamento e ocupação (TEIXEIRA, 2012, p. 67-9). A fundação de vilas fazia parte do projeto de urbanização do período provincial, expandir o território por meio da atração das pessoas e centralização do comércio. 10

Sobre a História da Cultura Material, enquanto dimensão do conhecimento histórico, ver, também, as contribuições de MENEZES (1983) e REDE (2012).

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O município de Acari foi criado pelo Presidente da Província em de 11 de abril de 1833. (SANTA ROSA, 1974, p. 68). Esta criação foi aprovada pela Lei Provincial de 18 de março de 183511. Sobre as denominações das aglomerações urbanas referentes à municipalidade, que vigoravam na colônia e império, podemos citar a povoação, a vila e, por último, a cidade. O termo vila refere-se ao centro de uma jurisdição territorial, sendo a sede do município, com implicações político-administrativas (BLUTEAU, 2000, p. 489). Nos dias atuais, o termo vila é normalmente usado para nomear pequenas localidades geralmente ocupadas por pessoas de baixa renda (TEIXEIRA, 2012, p. 39.). Recebido o título de vila, uma das primeiras medidas impostas por lei foi a construção da Casa de Câmara e Cadeia. Este edifício era geralmente de dois andares, o térreo servia como prisão local e o superior, como o conselho da Câmara. (TEIXEIRA, 2012, p. 117) A vila era o núcleo de um território, a sede do município, exigindo como prerrogativas possuir uma sede para o poder municipal, ou a Casa de Câmara e Cadeia. Em 1838, a sede da administração local do Acari já estava de pé, construída em pedra e barro por Tomaz de Araújo. Em um discurso, do mesmo ano, o presidente da província João Valentino Dantas Pinajé diz que, “[...] A Cadeia da Villa do Acari posso afirmar-vos, que he nova, e ainda não apresenta ruina [...]” (HARTNESS, 1838, p. 32). Não encontramos fontes documentais que forneçam informações sobre o local da primeira Cadeia. Em fins dos anos 1860 o prédio estava em ruínas e abandonado12. É possível que a construção tenha sido usada somente como cadeia, já que as laterais da Igreja do Rosário, construídas em 1840 por Tomaz de Araújo, aparecem como sendo lugar de reuniões para tratar de assuntos políticos e da administração pública, nos anos 1840 e 1850 (SANTA ROSA, 1974, p. 69). A nova Casa de Câmara e Cadeia de Acari começou a ser construída em 1878 e foi concluída em 1887. Sua fachada foi inspirada na arquitetura neoclássica. Pedra e tijolos foram os materiais usados nas paredes, denotando maior apuro técnico-construtivo, estilístico e melhoria no setor da construção civil. Na fase final da construção do edifício, por volta de 1885, um arquiteto aparece sendo contratado pela Câmara para trabalhar na obra, podemos imaginar que o mesmo foi o encarregado das questões estilísticas da fachada do prédio. (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI, 1885-1908) 11

A bandeira do município exibe a data da confirmação, no entanto a emancipação política do município é comemorada em 11 de abril. Na documentação escrita e disponível no Arquivo da prefeitura Municipal, os documentos já fazem menção à Vila do Acari, mesmo aqueles datados de 1833 e 1834. 12 LABORDOC/FCC/1ºCJ/DIV/CAIXA 481 Municipio do Acary – Obras publicas, cota atual.

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Durante todo o período colonial e no império, edifícios como a Casa de Câmara e Cadeia ocupavam lugar privilegiado no espaço das aglomerações. Eram o símbolo do poder secular e sempre se localizavam na praça central, o que nos leva a crer que a primeira sede de Acari tenha sido erguida em algum lugar no centro da vila. A segunda sede, como já mencionado, foi construída já em fins do século XIX, próximo ao alvorecer da República. A segunda Casa de Câmara e Cadeia foi certamente construída fora dos limites urbanos e logo se transformaria em intendência.

2.2 O espaço urbano e as posturas municipais O visual da “urbe” brasileira é gerado por normas urbanísticas, que regulam a largura das ruas, a altura das construções e a exemplos os impostos sobre o solo. Essas orientações refletem ideais estéticos, higiênicos e morais, onde a forma urbana e as edificações refletem os valores sociais vivenciados no espaço público (MARTINS, 2010). Essa situação pode ser observada nos dias atuais, mas, neste estudo, lançamos nosso olhar para o período imperial, época em que as Posturas tiveram grande influência na concepção formal do espaço urbano. No Brasil Colonial, e com mais vigor no Império, as Câmaras Municipais eram responsáveis pela realização das obras públicas e pelo estabelecimento das Posturas municipais, que podem ser compreendidas como uma legislação inicial na tentativa de organizar o espaço urbano. As Posturas padronizavam e uniformizavam as construções das casas, com o objetivo de garantir uma melhor estética visual das vilas e aglomerações urbanas. A Altura, a largura, o alinhamento e até a cor da fachada eram impostos por lei. Foi durante a administração do Marquês de Pombal que as Províncias do norte receberam maior atenção no sentido de ordenar e organizar os seus núcleos urbanos, principalmente os que ficavam no interior. A estética das edificações e do espaço público era das preocupações vigentes. Sebastião José de Carvalho Melo, Marquês de Pombal, foi Primeiro-ministro do Rei Dom José I, entre 1750 e 1777. No período em que se manteve no cargo, deu muita atenção as questões relativas ao espaço urbano, especificamente, aos aspectos estéticos das aglomerações. No Rio Grande do Norte, as atuais cidades de Portalegre, Vila Flor e São José de Mipibu são exemplos da intervenção Pombalina. Seus projetos urbanos foram resultantes de uma série de ideais, que tinha a regularidade do espaço como premissa. O traçado urbano das localidades se expressava em forma xadrez e também circular. (TEIXEIRA, 2005, p. 189-

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206). A particularidade dessas três aglomerações é que tiveram suas origens em aldeamentos indígenas. Depois de termos verificado aspectos da organização e instalação do poder municipal na Vila do Acari, é necessário acompanhar suas atribuições e ações no que diz respeito à organização e controle do espaço urbano. Em 1835, com a confirmação do título de Vila, a localidade recebe seu primeiro Código de Posturas Municipais, e no artigo nº 8 chama atenção para o cuidado com o asseio das ruas bem como as casas da aglomeração. “Em todo o cabeça de casal será obrigado a ter limpas as frentes de suas casas nas povoações, nas quatro festas principais, de cada hum ano, sob pena de pagar por cada vez que faltar a limpeza, duzentos réis para as despesas da Câmara” (ACARI, Lei nº 7, de 04 de março de 1835). Esse artigo nos mostra uma preocupação com a higiene da aglomeração, não deveria haver mato, sujeira ou entulho, nem em via pública nem nos quintais das construções, onde até as formigas deveriam ser eliminadas, tudo isso para garantir a salubridade da vila. As Posturas municipais eram abrangentes, davam conta de vários aspectos do espaço urbano. Além da limpeza, as leis cobriam também os aspectos estéticos e formais das ruas. No artigo nº 13 há uma preocupação com o alinhamento das construções, caso fosse desobedecido a casa seria derrubada à custa do proprietário (ACARI, 1835). As questões higiênicas também são cobertas pelas Posturas municipais. O espaço urbano insalubre e propício a doenças precisava ser saneado, havia preocupações com os enterramentos nas igrejas, que deveriam ser feitos em cemitérios fora dos limites urbanos. As ruas seriam mais largas para facilitar a circulação do vento, as casas com maiores janelas, de modo que o sol pudesse dissipar a umidade, os dejetos humanos e animais teriam que ficar longe das fontes de água. Essas características aliadas ao aspecto retilíneo, são expressões de uma evolução na forma urbana das vilas e cidades, esse processo acentuou-se principalmente no decorrer do século XIX. As epidemias eram constantes, varíola, febre e cólera apareciam em surtos, e melhorar a higiene seria fator decisivo para conter tais situações. A Câmara Municipal mostrou, em algumas oportunidades, certa preocupação com as fontes de água e as latrinas, por medo de contaminação13. Em 1833, a Câmara da Vila do Acari recebeu 40 exemplares da Sociedade

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Como, por exemplo, visto em ata do dia 10/01/1844, onde o fiscal foi orientado a fazer a correção das fontes de água, dos muros das casas, e punisse aqueles que acumulassem lixo e entulho em seus respectivos quintais, sendo assim também proibido, jogar dejetos animais mortos e imundícies próximo as fontes de água.

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Médica do Rio de janeiro, com o parecer sobre questões ligadas à higiene pública e principalmente a cólera. À medida que o espaço da municipalidade ia se transformando, o governo provincial precisou elaborar planos e políticas de higiene para o espaço público. O pensamento social no século XIX foi fortemente influenciado pelo olhar médico, era preciso diagnosticar os males urbanos e encontrar soluções para erradicá-los. A teoria dos miasmas tinha uma explicação para essas epidemias: eram causadas pelos odores exalados de cadáveres em decomposição, espalhando a pestilência através do ar respirado. Os ideais sanitaristas tiveram reflexo direto no espaço da vila, uma vez que os enterramentos nas igrejas deveriam ser proibidos, como visto em carta do governo provincial à Câmara da Vila do Acari em 1855.

E reconhecendo a urgente necessidade de se tomarem medidas para fazer cessar o abuso que se tem admitido de fazerem-se enterramentos dentro das igrejas, recomendo a V. cias a expedição das ordens necessárias e enérgicas previdências para que não consinta semelhante costume, hoje geralmente reprovado e sempre nocivo a salubridade publica. (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI (1842-1860), 1855)

A epidemia de cólera, que assolou o Seridó em 1856, preocupou as autoridades municipais e a população, para a necessidade de se tomar uma atitude que objetivasse melhorar as condições higiênicas. Como consequência, os enterramentos nas igrejas cessaram e um novo cemitério foi construído fora dos limites urbanos em 185614. O trabalho de Silva (2003), intitulado Seridó em Tempos de Cólera, trata especificamente dessas epidemias e doenças que solaparam, por exemplo, as Vilas do Acari e Príncipe na segunda metade do século XIX. A estética foi uma preocupação evidente das autoridades municipais. O alinhamento nascente de uma rua e sua continuação deveriam ser respeitados. Essa regularidade das construções garantiria o aformoseamento da estética e forma urbana (ACARI, 1835). O artigo adicionado às leis de Acari em 16 de junho de 1849, ilustra preocupações estéticas das autoridades locais no que respeita à forma urbana:

Art. 15. Os proprietários que vivem nesta vila e povoações do município são obrigados a manterem caiadas (limpas) e pintar as fachadas de suas casas, e caiar (limpar) 5 m de extensão de largura na parte frontal e lateral [...] dentro dos próximos 11 meses a partir da data que esta lei for aprovada. Devem mantê-los em bom estado. Os transgressores irão pagar uma multa vale 5.000 réis, e no caso de não ter dinheiro será preso a uma taxa de 1.000 réis por dia15. 14 15

Documento obras publicas do município de Acari. LABORDOC/FCC/1ºCJ/DIV/CAIXA 481. APMA, Documentos antigos, Pasta nº 38, 1845 a 1864.

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A aplicação dessas leis era feita pelo fiscal que, se necessário, recebia auxílio de um Inspetor de Quarteirão. As principais funções deste estavam ligadas à fiscalização e execução das orientações legais, alertando e multando os que não cumprissem as determinações da Câmara, além de ter que apresentar um relatório de suas atividades. Como agente muito importante do espaço urbano nesse período, o fiscal devia prestar conta de seu trabalho, a fim de melhorar a atuação do poder municipal, como visto a seguir:

[...] Compareceu o fiscal do termo desta vila Manoel Severiano, o qual prestou contas das correições que tinha feito, e pedindo a Câmara que lhe mandasse satisfazer a quantia de 6.000 réis, que tinha sido despendido com dois serventes, o que sendo ouvido pela Câmara ordenou ao procurador para mandar satisfazer o fiscal [...] (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI, 1851).

Todos os moradores deviam pedir licença para poderem construir suas casas, mas essa situação poderia se aplicar a outras construções. Alinhamento das casas, limpeza, extensão e largura/abertura de ruas/viela era o foco principal das orientações. Em algumas ocasiões, como por exemplo, a registrada em ata de 30/10/1858 os vereadores discutiram sobre casas que não respeitavam o alinhamento proposto e convocavam seus donos para que as derrubassem. Em ata ordinária datada de 25/10/1858, a discussão era sobre a abertura de um beco de nove palmos de largura. As casas eram obrigadas a ter suas frentes caiadas (limpas), rebocadas e possuírem calçadas com 5 palmos de largura. (Pasta Nº 37, 1833-1849, artigo nº 15, 16/08/1849) A principal função dessas leis era controlar o espaço urbano em seus aspectos estéticoformais. Acompanhando os artigos adicionados a esse instrumento legal de controle na Vila do Acari e cruzando com as atas e circulares16, podemos evidenciar duas situações: nem sempre as orientações do referido código eram cumpridas, ou por parte do fiscal ou por parte da população, e, em certas ocasiões, as construções se davam de maneira espontânea. É possível observar que em algumas oportunidades, o Governo provincial pediu à Câmara da Vila do Acari que cumprisse suas posturas. Mesmo que as Câmaras Municipais não fossem dotadas de um plano urbanístico para as aglomerações como um todo, parece-nos claro que “a estética e a forma urbana das vilas

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As atas de reunião da Câmara da Vila do Acari nos revelam que em algumas ocasiões existiram conflitos e violência entre moradores e o fiscal encarregado de executar as leis municipais. Por vezes, os vereadores apontam negligência por partes dos fiscais, cobrando-lhes um relatório de suas atividades. O governo provincial, por várias vezes, demonstrou preocupação com o cumprimento das Posturas e enviou várias circulares às autoridades políticas do Acari, pedindo que as recomendações fossem seguidas, mesmo que fosse preciso usar a força policial. Essa documentação encontra-se no Arquivo da prefeitura Municipal.

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foram moldadas pelas posturas municipais, e que estas acabaram por ser, ainda que de maneira embrionária, uma espécie de pré-urbanismo” (TEIXEIRA, 2012, p. 58). No caso de Acari, essa forma urbana perdura até hoje, principalmente no centro histórico, produto do século XIX. O alinhamento, a largura, a extensão e as fachadas das ruas ainda mostram os efeitos e a importância que essas orientações tiveram para a urbanização da cidade.

2.3 (Re)configurações urbanas em curso

A partir de meados do século XIX, Acari começou a passar por importantes modificações em seu espaço urbano, o que revela certa prosperidade, inicialmente vinda da pecuária e que depois viria a ser do algodão. Essa situação permitiu que outro templo fosse erguido para ser a matriz de Nossa Senhora da Guia. A construção, de fato, teve início em 1857, mediante doze contos de réis, conseguidos com a venda de duas fazendas de gado pertencentes às irmandades religiosas do Santíssimo e de Nossa Senhora da Guia. O custo total da obra foi aproximadamente 100 contos de réis 17. Alguns nomes da elite política e econômica da vila aparecem como doadores de dinheiro, entre eles, o Tenente Coronel Manoel Gomes da Silva e o Capitão Cypriano Bezerra Galvão. Cada um deu 100$ de oferta. Foi construída de pedra e cal e com tijolos de adobe18. O tempo, que levou para ser concluída, as proporções e o material humano e financeiro revela que Acari passava por um momento de prosperidade econômica e por um desenvolvimento urbano, já que o templo deu novos limites espaciais à aglomeração, fazendo surgir a partir de si uma fileira ulterior de casas. É verdade que nesse período, o espaço urbano de Acari vivia uma evolução em sua forma, com maiores e melhores casas, de alvenaria e algumas em pavimentos, no entanto, a vila não tinha casas suficientes para abrigar as oito mil pessoas, que estiveram acompanhando o translado da padroeira em 1867. À medida que o século XIX avançava, surgiu uma forte preocupação com a aparência estética das ruas e edifícios, especialmente com as fachadas, cujas dimensões, número e tamanho das aberturas e, até mesmo, as cores foram, às vezes, impostas por lei. As autoridades locais tentavam controlar o comportamento dos habitantes. A partir de meados do século XIX, novas casas foram sendo construídas no lugar de casas precárias. 17

Valor equivalente a 89,650 kg de ouro ou o preço de cinco mil vacas na época. (MEDEIROS FILHO, 1981, p. 177) 18 Termo de origem árabe, que se aplica ao tijolo de terra ou barro, no qual se mistura frequentemente estrume ou fibra vegetal para lhe dar maior consistência. O adobe difere do tijolo principalmente por não ser cozido, apenas secado ao sol. (TEIXEIRA, 2012, p. 263)

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No contexto provincial, a atividade comercial começou dar indícios de crescimento. Na Vila do Acari, a regulamentação do comércio e o mercado público, por parte da Câmara Municipal, além da inauguração da feira, em 1846, são sinais importantes do início das melhorias em curso (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI, 1846). O Mercado Público da vila que foi construído em 1890, considerado o melhor do Seridó naquela época19. A Praça, designada para a “feira semanal", abriu-se em frente à Casa do Mercado. Atualmente, é conhecida como praça dos taxistas, mas, oficialmente, chama-se Coronel Silvino Bezerra. A importância desempenhada pela atividade comercial no espaço urbano é revelada pela nomenclatura dos logradouros públicos. Atrás do mercado, nesse sentido, surgiu a Rua do Comércio (SANTA ROSA, 1974, p. 78). Uma nova via de abertura se estendia desde o centro antigo da cidade, onde se desenvolvera o núcleo urbano inicial da povoação, sobretudo nos lados e na frente da Igreja do Rosário. O parcelamento urbano, que inicialmente se mostrava irregular, sobretudo na praça central, agora dava claras demonstrações que assumiria um plano xadrez como visto na seguinte orientação registrada em Ata.

O alinhamento do novo edifício se abrirá em direção a rua grande, e dali um alinhamento para o poente, para o sul, para o nascente, formando quatro frentes, ficando entre as novas ruas e as existentes o espaço de 50 palmos nos lugares mais estreitos. (APMA, Pasta nº 7, 1865 a 1873).

Segundo Nobre (1971, p. 151), Acari “[...] tem boa casaria. É ornada de dois templos sobressaindo o da padroeira da freguesia, para a construção e elegância do qual muito concorreu o respeitável Vigário Tomaz Pereira de Araújo”. Observando essa descrição, podemos concluir que o casario urbano de Acari já apresentava a alvenaria como técnicaconstrutiva, em duas águas inspirado no estilo colonial20. Nobre era funcionário do governo provincial e viajou pelo interior fazendo descrições de vilas e cidades no ano de 1877. As transformações da forma urbana no espaço de Acari não escaparam da secularização, que estava em curso nos demais lugares, Natal, Caicó, Assu. Para analisar essa situação, observamos em um primeiro momento, uma petição de 05 de julho de 1886, 19

APMA, documentos antigos, pasta nº 4, 1890 a 1900. A casa em estilo colonial se caracteriza em linhas geras por não possuir recuo lateral nem frontal, ser germinada, ou seja, colada a outra. O pé direito e cumeeira muito altos, telhado em duas águas (LIMA, 2002, p. 39-47). Além dessa tipologia, existia também o sobrado, elemento de certa distinção de classe. No Seridó, o primeiro sobrado foi construído em 1810, pertencente ao padre Francisco de Brito Guerra (MACÊDO, 2007, p. 151) Em Acari, esse tipo de edifício seria construído por volta de 1880, de propriedade do também Padre José Modesto Pereira de Brito, sobrinho de Brito Guerra (SANTA ROSA, 1974, p. 77). 20

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encaminhada pelo vigário Tomaz Pereira de Araújo. Nela, o mesmo pede à Câmara dos Vereadores que retire a feira semanal do domingo e transfira para outro dia, por este ser dia santo. Os vereadores responderam dizendo que não possuíam competência e, tão pouco, justificativa para atender tal desejo. O texto da ata contem o seguinte teor:

Na feira estabelecida aos domingos, costume esse reprovado, tanto do ponto de vista físico, pois não se pode consumir todo tipo de alimento, e moral pois trata-se de um dia santo, onde o senhor nosso Deus descansou depois de ter criado céus e terra, então venho em nome da moral e do progresso espiritual dessa vila pedir que a feira seja estabelecida na segunda.

“O outro elemento que evidencia esse espaço urbano cada vez mais laico, foi a secularização do cemitério público local, em 6 de dezembro 1898.” (CÂMARA MUNICIPAL DA VILA DO ACARI 1885-1908). Sobre a secularização dos cemitérios em específico, podemos citar a tese de Santos (2011). O Processo de Dessacralização da Morte e a Instalação dos Cemitérios no Seridó (XIX-XX). Na festa de translado da padroeira esse uso sagrado e profano do solo é visível, ao passo que se estima que 8 mil pessoas e 18 sacerdotes tenham assistido a cerimônia, 60 mesas de jogos foram vistas espalhadas pela vila. De acordo com o censo de 1890, o total da população dentro dos limites municipais de Acari foi de mais de 9.000 habitantes. A vila continha 198 prédios e 10 ruas. (SANTA ROSA, 1974, p. 87). O título de cidade foi concedido em 1898, uma boa evidência do desenvolvimento urbano local. Em1899, as lideranças políticas de Acari viam claramente a necessidade de organizar as ruas e praças e adotar uma nova malha urbana 21, também mostravam preocupações estéticas no que diz respeito às paredes que se destacavam nas artérias da cidade. Ao consultar um corpus documental22 disponível no Arquivo da Prefeitura Municipal, ficou claro que esse Código de Posturas de 1899 já apresenta um discurso em função da modernidade. A “modernização” da malha urbana se expressava no surgimento das novas ruas largas e retilíneas. A necessidade de modernizar o meio urbano da cidade se deu por uma forte

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Essas ideias foram postas na pauta de discussão pelos vereadores, quando discutiam sobre o novo código de postura da cidade em 1899 em reunião no Conselho da Câmara. As orientações que pautavam o discurso eram ideias de modernidade e progresso, corroborando o positivismo vivido pelo alvorecer da República. 22 Os artigos, adicionados às Posturas municipais da Vila do Acari em 1896, exibem uma considerável preocupação com a expansão e alargamento das vias urbanas, como o tamanho, a forma e até a posição das ruas, que ficavam principalmente no centro da vila.

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remodelação na parte mais antiga do aglomerado urbano, sobretudo, no largo que se abria em frente à antiga matriz, onde várias construções da fase inicial da povoação foram destruídas23. É das reuniões da Câmara e das Posturas Municipais de 1896 que se pode detectar o desejo de reconfigurar o espaço urbano de Acari, pois as preocupações com as questões estético-formais continuavam. Contudo, paulatinamente, vai se percebendo que as orientações apontam agora para a criação de novas ruas grandes e largas, e para efeito disso, as casas pequenas e de técnicas construtivas frágeis seriam substituídas, sucessivamente, por construções de maiores proporções, mas sem fugir do trinômio fachada/limpeza/alinhamento. É também desse período a demolição da Casa de Caridade erguida pelo Padre Ibiapina24. Os valores de uma cidade republicana são vários: as praças, os nomes dos locais públicos, das ruas, e, principalmente, a regularidade dos espaços urbanos, valores que são vistos na cidade do Acari. O primeiro capítulo das Posturas municipais de 1899 é voltado completamente para seus aspectos urbanos, nomes de ruas, dos espaços, numeração das casas e pela primeira vez a necessidade de plantar de árvores. O primeiro artigo diz o seguinte:

As ruas que de agora em diante se abrirem dentro do perímetro desta cidade, terão, pelo menos, a largura de 10 metros, salvo obstáculo invencível, e serão cortadas por outras em ângulo reto e na distancia de 25 metros de uma para a outra [...] (ACARI, Lei nº 1, de 14 de março de 1899, 1899).

Os ideais de progresso e de modernidade passaram a aparecer de maneira mais evidente no discurso das lideranças políticas locais dos últimos dez anos do século XIX, podemos perceber os anseios de modernização da urbe, traduzido na vontade de ajardinar as ruas, construir praças e embelezar a cidade. É preciso seguir um horizonte norteador para modernizar a saúde, a higiene e o aspecto urbano. A cultura do algodão foi o principal catalisador dessa prosperidade de fins do século XIX e primeira metade do XX.

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Nessa onda avassaladora de modernização/demolição, subsidiada mediante a prosperidade trazida pela economia algodoeira e o gado, muitas construções de pouco valor venal, como cita Santa Rosa (1974, p. 77) foram destruídas, a exemplo de uma casa, considerada a primeira de Acari, que ficava à direita da Igreja do Rosário, e veio abaixo em 1908 para dar lugar ao moderno prédio do Grupo Escolar Tomaz de Araújo. 24 A Casa de Caridade foi construída em junho de 1864 pelo Padre Mestre José Antonio de Maria Ibiapina. Na casa, ficavam freiras, aleijados, cegos, paralíticos. Com boas provisões, abrigava entre 40 e 50 pessoas, o edifício tinha dois hospitais, salas de jantar, no pavimento térreo, no primeiro andar, sala de dormida e muitos quartos. Certamente, a casa foi construída em pedra e cal, ou, embora não seja mencionada por Manuel Ferreira Nobre, a construção devia ter boas proporções e um apuro construtivo acompanhando o momento de melhorias no meio urbano pelo qual Acari passava. (SANTA ROSA, 1974, p. 79)

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Acari viveu a partir de meados do século XIX, uma evolução e melhorias em seu seio, mas nos fica claro que essa situação se deu de maneira menos intensa que em outras partes da província. A pecuária e o algodão forneceram capital parar alavancar essas melhorias, fazendo surgir novas tipologias arquitetônicas que transpareciam o bom momento vivido. O prédio de mercado publico, a Casa de Câmara e Cadeia, são sem duvidas representantes da prosperidade que o aglomerado viveu. No século XX a cidade continuou a crescer em um bom ritmo, a “modernidade” aparecia nas fachadas das casas e nas transformações vividas na parte “antiga” da cidade, o embelezamento e ajardinamento, a preocupação com as artérias da urbs mostram esse desejo de progresso. Em linhas gerais acreditamos que conseguimos dar contar de responder as questões por nos mesmos propostas, é obvio que há pontos que precisam e devem ser mais explorados e problematizados em ocasião futura, por nos ou pôr outro pesquisador interessado na temática.

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REFERÊNCIAS

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