Da emergência da Linguística Queer

June 22, 2017 | Autor: I. Santos Filho | Categoria: Teoría Queer, Linguistica, Queer Linguistics, Linguística Queer
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (MESTRADO E DOUTORADO)

ÁREAS DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS

DA EMERGÊNCIA DA LINGUÍSTICA QUEER

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ara refletirmos acerca da emergência de uma Linguística Queer, retomarei alguns pontos da discussão anterior1, no sentido de que esses sirvam de ganchos de continuidade. Assim, ao estudarmos sobre língua(gem) na perspectiva da performatividade, faz-se importante entender que consideramos que os sujeitos não estão a priori dados, não sendo, portanto, sujeitos anteriores aos discursos, gestados como verdades morfofisiológicas, soberanos de suas enunciações, livres, de escolhas deliberadas. Logo, não há uma identidade primária a ser constatada, e descrita, representada. Mas não são assujeitados. Interessa-nos aqui pensar acerca do sujeito que fala, aqui assumido como um sujeito que age (com possibilidades), entendido como um efeito de poder, isto é, implicado em esquemas normalizadores de inteligibilidade e suas subversões, em cenas discursivas, cenas de interpelação. Se estamos desse modo compreendendo, as enunciações não são expressões de si, de um suposto lugar do falante, tampouco descrições de si ou do outro. São, na verdade, “decisões” sobre corpos, no sentido de que desencadeiam um processo de “fazer” um corpo, de fazer um sujeito, dentro das convenções culturais. É importante considerar que ao afirmarmos que a mulher feijoada só ganha vida a partir do ato linguístico de autonomeação, como disse na aula anterior, estamos falando que a identidade (social) é condição de um ato linguístico-discursivo de performatividade (ou atos?), entendendo que esse ato não é um ato linguístico em si. Nessas considerações, toda nossa fala ordinária é um ato performativo, uma ação pela língua(gem), na qual nos situamos em alguns “processos de fazer” e ou nos “afastamos” de outros. Entendemos, dessa maneira porque, mesmo que as enunciações sejam tomadas como projetos de representação, a representação linguístico-discursiva é impossível, já que não há possibilidade direta entre a língua(gem) e um possível referente. Nas ideias de Judith Butler, 1

“Preâmbulo para uma linguística queer – gêneros, sexualidades e desejos na cultura heteronormativa e aspectos linguistico-discursivos”, de Ismar Inácio dos Santos Filho (2015d).

Seminário de Pesquisa: “Introdução à Linguística Queer” – Maringá (PR), 05 e 06 de outubro de 2015.

Prof. Dr. Ismar Inácio dos Santos Filho UFAL-Campus do Sertão; GELASAL; LIAPI [email protected] https://www.facebook.com/ismar.inacio

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a linguagem falha ao representar. Dessa maneira, os supostos projetos de representação são na verdade exercícios performativos, na busca de autorizar sentidos e sujeitos. Butler (2003), ao fazer a crítica aos “problemas de gênero”, faz-nos entender que a mulher “representada” pelo feminismo era, na verdade, um sujeito desse movimento, no sentido de que “o domínio da representação política e linguística estabelece a priori o critério segundo o qual os próprios sujeitos são formados, como o resultado de a representação só se estender ao que pode ser reconhecido como sujeito” (BUTLER, 2003, p. 18). Por esse aspecto, as enunciações não podem ser consideradas como representações de si ou de outros, pois são, ao contrário, atos performativos, que têm função normativa de na língua(gem) construir, “revelando” ou “distorcendo” o que é nas normas de inteligibilidade considerado verdadeiro sobre determinados sujeitos e ou aspectos de suas vidas (BUTLER, 2003). Comungando dessas ideias, ao pesquisar sobre os fôlderes da “Marcha das Vadias”, o mestrado Erinaldo da Silva Santos2 (UFRN), que tem como objetivo geral de sua pesquisa “investigar e analisar quais/como processos de linguagem (linguísticos/semióticos/textuais/discursivos) nos fôlderes da Marcha das Vadias construíram/constroem performances de (outra(s)) feminilidade(s) e de (novos) direitos das mulheres na atual sociedade”, recentemente me apresentou uma “problemática” em sua pesquisa, qual seja, a de que parece que, nesses atos performativos, o sentido de mulher construído está ligado ao de possuir um corpo feminino, no sentido de um corpo biológico de mulher, sendo esse corpo branco e heterossexual – logo um sentido estreito para a palavra e para as “vadias” “representadas”; performatividade em forte relação com as normas de inteligibilidade. Com essa compreensão, entendemos que mesmo que o projeto de representação de “mulheres livres” tenha propósitos emancipatórios, o exercício de representação pode falhar em seus propósitos de uma identidade primária, podendo autorizar outros sentidos que se afastam dos pretendidos, já que esses se realizam dentro da cultural heteronormativa, sob suas normas de inteligibilidade. Nessa discussão, sobre uma Linguística Queer, interessa-nos refletir acerca da performatividade, problematizando a respeito dessa na dimensão da estrutura do discurso (BUTLER, 2011) e como a autoridade moral se faz presente, assumindo, desse modo, esse estudo como posicionamento crítico em relação aos saberes linguísticos, à cultura heteronormativa e aos corpos viáveis e 2

“Fazer gênero por meio da linguagem”: a subversão da identidade da mulher em textos de divulgação da marcha das vadias, projeto de pesquisa de Erinaldo da Silva Santos, mestrando em “Linguística Aplicada”, no Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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matáveis. Para tal, inicialmente vamos compreender o movimento e os estudos queer a partir de um ato performativo insurgente.

Se formos ao dicionário, veremos que a palavra queer possui em suas acepções ser adjetivo e ser verbo. Como adjetivo, tem sentido de estranho, esquisito, suspeito – aquele que causa desconfiança, indisposto; em seu sentido de gíria, é homossexual. Sendo verbo, é estragar, prejudicar. Nessas acepções não conhecemos a palavra queer em sentido de agressão, injúria, ofensa. Mas foi (é) em sentido de agressão que ela é usada em referenciação aos nãoheterossexuais, em sentido negativo desses, como degradados. A esse respeito, nas ideias de Butler (2002), a palavra queer, seja como adjetivo ou como substantivo, foi sempre usada como sentido de estigma paralisante, a partir do qual se fazia a interpretação de uma sexualidade patologizada. Logo, aquele que a pronunciava, em relação ao outro, para nomeação, constituía-se num emblema e veiculo de normalização, pois sua enunciação se efetivava como regulação discursiva dos limites da legitimidade sexual. Apontar o outro como queer era um ato de repudiá-lo. Sobre isso, a colunista Helena Vieira diz, em “Teoria Queer, o que é isso?3”, que essa palavra é usada há mais de 400 anos e que na Inglaterra havia uma “Queer Street”, onde viviam os vagabundos, as prostitutas, os pervertidos e devassos – fato que nos dá a dimensão de seus significados, às margens. Ainda segundo essa colunista, “o termo ganhou o sentido de ‘viadinho, sapatão, mariconha (sic), mari-macho’ com a prisão de Oscar Wilde, o primeiro ilustre a ser chamado de “queer”. Conforme nos explica Butler (2002), o propósito dos usos linguísticos da palavra queer eram os de operar uma prática linguística para envergonhar o sujeito de sua nomeação, produzindo um sujeito através da humilhação. Louro (2008) explica-nos que, nessa dimensão semântica, queer é o sujeito da sexualidade desviante, é o corpo estranho, abjeto, a vida matável. Misckolci (2014) confirma queer como uso de uma injúria dirigida a homossexuais e a dissidentes de gênero. Nas palavras de Carla Rodrigues, editora do dossiê “Teoria Queer – o gênero sexual em discussão”, publicado na revista Cult (edição 193, ano 17), de agosto de 2014, queer é “designação pejorativa para gay, queer poderia ser traduzido por ‘bicha’ ou ‘viado’, carregados de 3

Disponível em < http://zip.net/bvsb3D >. Acesso em setembro de 2015.

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Queer – ato performativo insurgente “We’re queer, we’re here!”

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Muitas vezes escutamos uma criança insultando outro de “bicha” ou de “sapatão”. Ela provavelmente não sabe nada sobre o que significa estes termos, mas entende que é uma coisa feia, e chega a esta conclusão pelas fisionomias de nojo e de ódio dos seus pais ao proferirem estas palavras. A bicha, o sapatão, a trava, o traveco, a coisa esquisita, a mulher-macho, devem ser eliminados. Isso faz com que haja um horror, um medo profundo de ser reconhecido como aquilo que retiraria de si qualquer possibilidade de ser amado/a [inserções minhas] (BENTO, 2014, p. 45).

No entanto, com o movimento contracultural, no final dos anos 1960 e início dos anos 1970, tivemos um ensaio de uma revolução sexual, um enfretamento a esse contexto adverso, no qual podemos citar “A Revolta de StoneWall”, de 1969, nos Estados Unidos, na qual os gays reagiram contra seus opressores, resistindo, provocando-os. Houve também a retirada, em 1973, da homossexualidade da lista de doenças mentais. Porém, na década de 1980, com a epidemia HIV/Aids, forjou-se um pânico sexual, no qual a doença passou a ser considerada um perigo que ameaçava a sobrevivência da sociedade, conforme explica Misckolci (2015), pois essa era vista em condição/ameaça de contágio, repatologizando, desse modo, a homossexualidade por uma dimensão epidemiológica. Nesse contexto, de um refluxo conservador, também por governos conservadores, visava-se “disciplinar os poros e as paixões” dissidentes (PERLONGER, 1985), pois a Aids era considerada uma peste e sua vítima culpabilizada, carregando a doença como um castigo divino. A argumentação homofóbica era a de que o queer era a causa e a manifestação da enfermidade (BUTERL, 2002). 1.1 Movimento queer Com essa “crise”, comentada anteriormente, conforme explica Butler (2009), houve resistência dos queers, no sentido de questionar como pode alguém viver uma vida não reconhecível, na qual o que é e o amor que sente

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preconceito e da violência contra os homossexuais” (2015, p. 31). Nesse uno lugar de significados, podemos entender, a partir das ideias de Bento (2014), os usos da palavra queer como um insulto, um ato performativo que calava(cala?) e produzia (produz?) vergonha e medo entre os gays, as lésbicas e as pessoas trans. Dessa maneira, para essa pesquisadora, queer poderia ser traduzido como “transviado”, podendo ser “uma bicha louca”, “um viado”, “um[a] travesti”, “um[a] traveco”, “um sapatão”, no contexto brasileiro. Nesse sentido,

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não têm existência. Dessa maneira, na década de 1990, desse contexto de forte preconceito, mas também de resistência, e de estudos gays, lésbicos, feministas, que passaram da defesa das identidades à crítica das normas sociais, no que se refere a gênero e a sexualidade, tivemos o ato performativo queer, como insurgente: o grito daqueles e daquelas que mantinham o espírito da transformação social, através da crítica, com enunciações como “We’re queer, we’re here! Get used to it!”. Assim, a criação de movimentos como ACT-UP e Queer Nation, com seus atos enunciativos performativos recontextualizaram os sentidos de queer, autorizando novos outros sentidos à palavra e aos sujeitos por ela nomeados, possibilitando que sua semântica fosse da degradação consolidada a uma série de novas ressignificações afirmativas, conforme esclarece Butler (2002) e como é possível ler na série de panfletos ao abaixo:

Figura 01: Série de panfletos do Queer Nation. Fonte: Disponível em < http://queermusicheritage.com/mar2010qn.html >.

Acerca desse, consideramos que foi um “grande” ato performativo, coletivo, construído a partir de gritos, panfletos e atuação teatral, no qual o queer, conforme Louro (2008, p. 07-08), foi performatizado como “o excêntrico que não deseja ser ‘integrado’ e muito menos ‘tolerado’ (...) um corpo estranho, que incomoda, perturba, provoca e fascina”. A respeito dessa atitude queer, Butler (2002) questiona como os significados podem dar giros que não sejam meras inversões de valores, levando-nos, dessa maneira, a entender que a mudança se efetiva por reapropriações, como oportunidades discursivas, nas quais os expulsos, os abjetos, pleiteiam a reinvindicação de si através e do modo contrário do discurso que repudiava.

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A respeito da palavra queer e essa recontextualização, seu uso como “local” de oposição coletiva, Butler (2002) faz alguns questionamentos, tais como i) quais são os limites dessa ressignificação e se ela supera a história constitutiva do termo e ii) “o que ocorre ao enunciado performativo [tal como os gritos, os fôlderes e a atuação teatral] quando seu propósito é precisamente anular a força alegada da cerimônia heterossexual?” [inserção minha] (BUTLER, 2002, p. 315), questões que se efetivam porque entende que a possibilidade da língua(gem) realizar não é garantia e que por isso os esforços performativos nem sempre logram êxito. Contudo, a filósofa política alerta para o fato de que não há uma ressignificação radical, na qual haveria renovação por completo. Tal ato performativo insurgente teria os mesmos limites e possibilidades que a nomeação “mulher feijoada”, comentada na aula anterior? Dessas inquietações, questiono: que recursos e processos linguístico-discursivos foram agenciados para os atos performativos de reapropriação da palavra queer e de onde vem a força performativa para a ressignificação? Mais adiante discutiremos mais a esse respeito, a respeito da estrutura da performatividade, indagando também se a cena discursiva, cena interpelativa, se configura nos contextos macro e micro social. Agora, é importante relembramos, como já abordamos na aula anterior, que, em condição de ato performativo, os “gritos”, os panfletos e as atuações teatrais de resistência queer não conferiram reconhecimento a um sujeito queer, já-lá; de modo diferente, o “reconhecimento” formou esse sujeito queer, mas não de uma vez por todas, tampouco de um único modo. Nesse sentido, a palavra tem que se abrir a outros sujeitos que por ela sintam-se “interpelados”. Em nosso contexto brasileiro, podemos, por exemplo, citar dois modos de compreensão do queer. No “#[SSEX BBOX4]”, Perfil Queer, Razec Edardna, na figura que segue, performer e artista visual, fala de si como queer, entendendo-se como aquele que questiona, como possibilidade de se perceber como humano, os padrões normativos (em seu caso desde a mais terna idade – aos 6 anos – já usava o cabelo pintado), tais como a separação entre meninos e meninas, através de cores, de espaços, de objetos, de acessórios etc. Diz que, como queer, gosta de experimentar, fora dos limites normativos e que, por isso, assume um visual excêntrico e recusa papeis de gênero, pois não quer nem ser homem, nem ser mulher.

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Disponível em < https://vimeo.com/106737435 >. Acesso em maio de 2015.

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Figura 02: Imagem de Razec. Fonte: Disponível em < https://vimeo.com/106737435 >. Acesso em maio de 2015.

No programa televisivo “Esquenta5”, da TV Globo, em 03 de maio de 2015, Rico Dalasam, na imagem que segue, é apresentado como o primeiro rapper reconhecido no Brasil como representante do “queer rap”, movimento traduzido pela apresentadora Regina Casé como “rap gay”. A apresentadora ainda explicou aos seus telespectadores que Queer era até uma palavra depreciativa, como uma maneira de chamar gay, mas com preconceito. E o que é que eles fazem? Eles pegam aquela palavra e passa a ser usada dentro do próprio movimento pra fortalecer.

Figura 03: Imagem de Rico Dalasam Fonte: Disponível em < http://gshow.globo.com/programas/ esquenta/videos/t/programa/v/ricodalasam-explica-o-movimento-queerrap/4152233/ >. Acesso em maio de 2015. 5

Disponível em http://gshow.globo.com/programas/esquenta/videos/t/programa/v/rico-dalasamexplica-o-movimento-queer-rap/4152233/ >. Acesso em maio de 2015.

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Seguindo nosso raciocínio, o “relato de si”, de Razec, e a apresentação do rapper Rico, por Regina Casé, bem como a própria explicação dos significados da palavra queer e do movimento “queer rap” são (ou podem ser) atos performativos de resistências, interpelados pelo movimento queer, reiterando-o, ao mesmo tempo em que novos (e diferentes) modos de ser queer ganham existência em terras brasileiras. Cada um desse atos de fala de resistência se constitui como “prática ressignificante pela qual se inverte o poder condenatório da palavra ‘queer’ para sancionar uma oposição aos termos de legitimidade sexual” (BUTLER, 2002, p. 326). Nessas considerações, a reapropriação da palavra queer possibilitou interrogar as relações de poder constitutivas e excludentes das normas de inteligibilidade, na cultura heteronormativa, exigindo-se, conforme Butler (2002), que essa palavra seja vista em sua história constitutiva, configurando, desse modo, uma política queer, seja nos movimentos coletivos ou nos estudos que assumem essa perspectiva crítica. 1.2 Estudos Queer Em sua reinterpretação, a nomeação queer e as vidas a partir dela construídas realizam uma deformação das declarações “É uma menina!”, “É um menino!” e “Eu vos declaro marido e mulher”, pois se constituem como uma crítica à incorporação das normas de inteligibilidade, a exemplo do performer Razec. Com base nessa recontextualização da palavra queer, muitos estudos sobre sexualidade e gênero assumiram a irreverência e a disposição antinormalizadora, como explica Louro (2008), como críticas subversivas, no sentido de “arriscar o impensável, fazer balançar estabilidades e certezas” (LOURO, 2008, p. 07). Por essa postura, “queer é um jeito de pensar e de ser que não aspira o centro nem o quer como referência; um jeito de pensar e de ser que desafia as normas reguladoras da sociedade, que assume o desconforto da ambiguidade, do ‘entre lugares’, do indecidível” (LOURO, 2008, p. 08). Portanto, o que de modo amplo é denominado de “teoria queer” é um movimento político-acadêmico que, de acordo com Misckolci (2014), teve origem após o fim da chamada revolução sexual e do curto período de despatologização da homossexualidade, conforme já aprendemos anteriormente. Um dos grandes influenciadores desses estudos foi Michel Foucault, com a publicação de “História da Sexualidade”. Para uma genealogia desses estudos, Misckolci (2015) nega uma origem nos Estados Unidos e cita a obra “O que é AIDS?”, de Néstor Perlonger, que “denunciava os intentos biopolíticos que ganhavam força e passavam a moldar até mesmo a área de

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pesquisa em sexualidade” (MISCKOLCI, 2014, p. 33), como uma obra que também dá base a esses estudos, no sentido de que um conjunto mais ou menos articulado, mas não coeso, de autores e autoras colaboraram para a criação do que passou a ser chamado de “teoria queer”. De acordo com esse pesquisador, tais estudos têm em comum a perspectiva construcionista da sexualidade, não mais reconhecendo essa como da esfera do biológico, o conceito de heterossexualidade compulsória, como crítica à heterossexualidade como a ordem natural do sexo, e o pósestruturalismo como base epistemológica, que revisa as noções de sujeito e apresenta a postura desconstrucionista, estratégia para a qual não se faz estudos para explicar como as pessoas são, mas sim compreender como se tornam o que são. Nesses estudos, Judith Butler, “mulher, lésbica, feminista, queer, hegeliana, pós-estruturalista, judia, norte-americana, filósofa, eclética...”, como foi nomeada em sua apresentação no “Especial Queer” (Cult, nº 205, 2015, p. 21), tornou-se uma referência, a partir da publicação de “Problemas de Gênero – feminismo e subversão da identidade”, em 1990, mas apenas publicado no Brasil em 2003, livro que, para Spargo (2006, p. 48), “é talvez o texto mais influente da teoria queer”. Para Misckolci (2015), Esse é um livro que explora a possibilidade de um feminismo que engloba o desejo e a sexualidade, para se contrapor a uma matriz heterossexual, que ele tão bem descreve, analisa, e que estava sendo reforçada em termos históricos naquele período de escrita.6

Para Saéz e Preciado (1997), Judith Butler é uma das autoras fundamentais da teoria queer, visto que o livro “Problemas de Gênero” tornou-se um marco nos estudos de gênero e na história do feminismo, por questionar a naturalização que sofreram as categorias de “mulher” e de “homossexual” nas políticas de identidade nas décadas de 1970 e 1980, que focalizam identidade como uma verdade natural. Para esses pesquisadores, essa filósofa, inspirada em Foucault, Derrida, Austin e Althusser, provocou uma inversão quase copernicana, a partir da noção de performatividade, para a qual gênero é uma “temporalidade social constituída”. Para eles, “Butler põe relevo no estatuto performativo e não somente descritivo das enunciações de sexo e de gênero” (SAÉZ e PRECIADO, 1997, p. 10). 6

Assistir “O que é queer?”, com Richard Misckolci. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=uB8Yd53x51M >. Acesso em 09 de setembro de 2015.

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Beatriz Preciado7 é também um grande nome dos estudos queer. No documentário “Pienso, luego existo”, sobre essx filósofa e a teoria queer, entendemos que para elx os estudos queer é teoria dos perversos, dos que não têm teoria, dos despossuídos, dos anormais, nos quais interessa pensar sobre gêneros e sexualidades e o conjunto de mediações que a normalizam e que também permitem pontos de fuga sobre esses. No tocante a uma genealogia dos estudos queer, Misckolci (2015) ainda comenta que com o texto “A epistemologia do armário”, de 1993, publicado aqui no Brasil em 2007, a autora Eve Sedgwick é vista, nos Estados Unidos, como a criadora da teoria queer. Sobre esses estudos, aqui no Brasil Guacira Lopes Louro é citada como a primeira pesquisadora a incorporar a teoria queer na educação. Acerca desses estudos em nosso país, é possível dizer que há uma disseminação, progressiva e transversal em diversas áreas, incluindo aí a Linguística, a partir de meus estudos, em Santos Filho (2012; 2015b), por exemplo. Entretanto, a preocupação, expressada por Pereira (2012), é que a teoria queer não seja, aqui, simplesmente importada e aplicada, mas que se preste a reconfigurações por outras experiências. Certamente esse movimento de não sermos apenas colonizados pela teoria queer fica mais evidente com o “I Seminário Queer – Cultura e Subversões de Identidades”, realizado pelo Sesc Vila Mariana, em parceria com a revista Cult, o qual, segundo Misckolci (2015), teve o objetivo de, considerando que todos nós fomos criados/construídos/adestrados a olhar o mundo de maneira heterossexual, generificada, de uma forma supostamente correta, introduzir as pessoas a um novo olhar e ao questionamento do olhar antigo, desconstruindo aquele que foi construído por nossa ordem social, pela nossa experiência social. Logo, a teoria queer visa dar visibilidade às dissidências, na possibilidade de torcer o olhar, enxergando, assim, o mundo de maneira não normativa. Esse objetivo é também da Linguística Queer. 2 Emergência de uma Linguística Queer Mas o que é uma Linguística Queer? No contexto da teoria queer, uma linguística queer foi compreendida como um campo a ser construído, de modo a abordar a intersecção na teia da linguagem, gênero e sexualidade, favorecendo a 7

Beatriz Preciado faz ressalvas à noção de performatividade de gênero e sexualidade. No entanto, preferimos entender que é possível produzir aproximações entre suas ideias e as de Judith Butler.

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compreensão desde o valor indicial da língua ao elo crítico entre linguagem e poder, refletindo, dessa maneira, sobre a linguagem na vida dos seres humanos e sua integração dentro dos grupos sociais, menos demográficos, aspectos que são tradicionalmente tratados por estudos de variação, objetivando com isso influenciar a agenda para a Linguística do século 21, conforme nos expõe Finegan (1997), no prefácio de Queerly Phrased.

Perseguindo o propósito acima mencionado, foi publicado em 1997 o livro “Queerly Phrased: Language, Gender and Sexuality”, um volume de estudos sociolinguísticos, organizado por Anna Livia e Kira Hall, que visou enfrentar os desenvolvimentos recentes da teoria queer e sua relação com o feminismo e, da mesma maneira, a problemática nos estudos envolvendo linguagem e “gênero”. Essas pesquisadoras comentam no ensaio introdutório que, naquele contexto, a quantidade de pesquisas com esse caráter era substancial, mas que poucos estudos consideravam questões de sexualidade ou orientação sexual e que quando abordavam “gênero” esse era tomado como uma categoria não problemática, ligada ao sexo do falante. Observemos na sequência um breve panorama de tais estudos, organizado por mim, a partir das descrições de Livia e Hall (1997; 2010):

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2.1 A volta da performatividade à Linguística

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Figura 04: Breve panorama dos estudos que correlacionam linguagem, gênero e sexualidade. Fonte: O autor.

A partir do panorama mostrado anteriormente, é possível visualizarmos que em mais de meio século, entre as décadas de 1940 e 1990, tais estudos foram estreitos, não sendo a área fortalecida certamente porque as discussões acerca de linguagem, “gênero” e sexualidade ficaram presas à ideia de verborragia, conforme explico em Santos Filho (2015b), para quem Nesse conhecimento, e dessa maneira, a língua(gem) não é problematizada, não são problematizados os sujeitos e suas identidades. No bojo desse saber, estudos de linguagem que se atrelaram às questões de gênero (não de sexualidade) estiveram interessados na verbosidade, na parolagem, na verborragia, isto é, estiveram interessados no (suposto) estilo particular de fala de homens e mulheres, sendo esses percebidos a partir da noção de papel de sexo. É a noção de língua(gem) como expressão do lugar de seu falante: a mulher fala “X” porque é mulher, o homem fala “Y” porque é homem, e o gay fala “X” porque se compreende como mulher, por exemplo (SANTOS FILHO, 2015b, p. 18).

Enfrentando esse problemática, superando em grande medida o olhar sobre o “estilo”, o livro organizado por Livia e Hall (1997; 2010) tornou-se marco dos estudos linguísticos a partir da perspectiva queer, segundo Rodrigo

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Borba e Cristiane Maria Schnack, tradutores do capítulo introdutório “‘É uma menina!’: a volta da performatividade à linguística”, publicado aqui no Brasil em 2010, na coletânea “Linguagem, gênero e sexualidade – clássicos traduzidos”, organizado por Ana Cristina Ostermann e Beatriz Fontana. Esse título do capítulo é bastante indicativo da abordagem conceitual com a qual a linguagem é focalizada, qual seja, a noção de performatividade, com base nas ideias de Judith Butler, na consideração de que a teoria queer fornece ferramentas uteis à pesquisa linguística. Dentre esses principais conceitos, uteis à linguística, Livia e Hall (1997; 2010) citam: i) a noção de “eu” como sujeito não pré-discursivo, ii) a ideia de que o significado não é transcendental, de modo que pudesse prender um referente a um significante – o significante não pode adquirir autoridade representacional, iii) a iterabilidade infinita do discurso, o aspecto reportado do discurso – a importância de discursos preexistentes e sua autoridade como ato de fala, iv) a ideia de que os dêiticos não são mais um conjunto limitado – a noção de que as palavras não estão significadas em si e por si, mas que o significado é construído no discurso, e v) o conceito de performatividade, ato de fala, frente às noções de constatação, descrição e representação linguísticas, ferramenta conceitual importante no enfretamento/problematização da noção de “construcionismo linguístico”. Acerca desse último aspecto, discutiremos em capítulo dessa aula, mais adiante. “Queerly Phrased” está dividido em três sessões, quais sejam, i) Lexicalidade liminar, que tem como objeto de estudo itens lexicais de identidades sexuais alternativas, ii) Fala queer, na qual focaliza estratégias discursivas como características de fala gay ou lésbica, por uma abordagem multissemiótica, e iii) Manipulação de gênero linguístico, estudo de usos do sistema linguístico de sujeitos queer, sujeitos sexualmente ambíguos, transexuais e hermafroditas. Ainda sobre esse marco na Linguística Queer, Borba (2006), em seu artigo “Linguística Queer: uma perspectiva pós-identitária para os estudos da linguagem”, uma reflexão teórica sobre a área a partir do livro de Anna Livia e Kiria Hall (1997), comenta que esse campo de estudos se faz importante devido à explosão discursiva sobre sexualidade, um reflexo das mudanças sociais, e que apresenta uma diversidade instável e multifacetada de significados e categorias sexuais, aspecto que se tornou preocupação para as Ciências Sociais, devido a interpretações limitadas e limitadoras. Explica que a Linguística Queer, como área dos estudos em linguagem que vem seguindo os preceitos da teoria queer, deu vozes a novos sujeitos, tais como drag queen, transexuais, gays e lésbicas, por exemplo. No entanto, como bem observa o pesquisador, “não se pode dizer que a LQ seja o estudo de uma categoria prédefinida e bem delimitada, como gays e lésbicas” (BORBA, 2006, p. 04). Para

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ele (2006), os principais constructos teórico-metodológicos da teoria queer que são uteis aos estudos em linguagem são “desnaturalização” do que é considerado normal, a noção de performatividade e a desconstrução e contestação, como constructos metodológicos. Para Borba (2006), a coletânea de ensaios versa sobre construção discursiva de identidades sexuais a partir de uma perspectiva performativa, focalizando, portanto, práticas discursivas. Contudo, conforme Livia e Hall (1997; 2010), citadas por esse linguista, “embora Butler tenha derivado o conceito de teorias linguísticas, ela não está interessada em analisar como a sexualidade emerge em contextos sociolinguísticos” (BORBA, 2006, p. 05). Assim, a Linguística Queer visa preencher essa lacuna. Ainda sobre a LQ, o pesquisador argumenta que tal estudo deve ser feito através de estudos etnográficos através de uma descrição densa, na intersecção entre os níveis micro e macrossocial. Para ele, “quer-se, ao cravejar os estudos linguísticos com ideias queer, criar inteligibilidades sobre como construímos, negociamos e estruturamos nossas identidades dentro de sociedades heteronormativas que impõem determinadas maneiras de ser aprioristicamente (BORBA, 2006, 05). Em suas considerações acerca do livro, Borba (2006) acredita que uma outra contribuição da LQ é a desessencialização da relação entre linguagem e identidades sociais. Para ele, Queerificar os estudos linguísticos significa produzir uma visão mais nuançada e multifacetada de como queer – gays, lésbicas, travestis, transexuais, heterossexuais e todos/as aqueles/as que, em suas performances que, de alguma forma, desestabilizam dicotomias identitárias – utilizam a linguagem para construir-se dentro das limitações heteronormativas dos discursos que impõem posições de sujeito naturalizadas. Essa queerificação pode ter efeitos decisivos no escopo do campo dos estudos linguísticos que têm por muito tempo reduzido seus sujeitos de pesquisa a indivíduos brancos, de classe média, heterossexuais e ocidentais como se todos/as falantes assim o fossem e como se a linguagem utilizada por esses indivíduos fosse a única que merecesse ser investigada (BORBA, 2006, p. 07).

O artigo de Borba (2006) foi de extrema importância para que aqui no Brasil a área tivesse visibilidade e passasse a figurar como uma possibilidade dentre os estudos linguísticos. No entanto, a respeito de “Queerly Phrased” e das considerações de Borba (2006), compreendo que a LQ não focaliza apenas a relação linguagem e sexualidade, mas a relação língua(gem), gênero e sex(o)ualidade, não apenas de sujeitos queer, mas de todo e qualquer sujeito, já que compreendemos, com Misckolci (2015), que gênero, desejo e sexualidade não são questões de uma minoria, mas centrais, pois atingem a toda ordem

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institucional, política e cultural, no intuito de criar inteligibilidades sobre a vida em sociedade, por uma perspectiva subversiva de estudos sociais e linguísticos. Outro aspecto que gostaria de mencionar é que a abordagem metodológica não pode apenas se restringir à etnografia densa, mas se ampliar a outros procedimentos metodológicas, tal como a “etnolinguística da fala viva”, em perspectiva de estudos enunciativo-discursivos, como tenho proposto em SANTOS FILHO (2012; 2015b). Sugiro a leitura de “A construção discursiva de masculinidades bissexuais: um estudo em Linguística Queer”, de Santos Filho (2012), tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Letras, na Universidade Federal de Pernambuco, sob a orientação da professora doutora Judith Hoffnagel, e “Linguística Queer – para além da língua(gem) como expressão do lugar do falante”, de Santos Filho (2015b), capítulo do livro “Escrit@s sobre gênero e sexualidades, organizado por Antônio de Pádua Dias da Silva, os quais constroem teoricamente, e com pesquisas efetivas, uma Linguística Queer em forte diálogo com os estudos enunciativo-discursivos, tomando as enunciações como atos performativos. Motschenbacher (2010), em “Language, gender and sexual identity: poststructuralist perpsectives”, comenta que nessa abordagem, esses estudos em linguagem têm como objetivo central realizar pesquisas críticas acerca da heteronormatividade, conforme já entendemos com Butler (2003), e a respeito do sistema linguístico, podendo abordagens acerca da estrutura linguística ser beneficiadas com essa postura acadêmica, assumindo relevância nas pesquisas. Para esse pesquisador, faz-se importante construir pontes entre as discussões teóricas em Linguística Queer e domínios linguísticos concretos de aplicação empírica. No entanto, isso não significa o “aterramento” da teoria na realidade, conforme sua crítica ao discurso positivista dominante nas ciências em geral. A esse respeito, comenta que a Linguística Queer questiona a redução da interferência do pesquisador e o “poder” da estatística da quantificação. Porém, ressalta que isso não significa que abordagens quantitativas não devam ser usadas em enquadramentos pós-estruturalista, ao contrário podem oferecer perspectiva particular, não a final. Tal como já nos posicionamos antes, Motschenbacher (2010) entende que a Linguística Queer não é uma linguística gay ou uma linguística lésbica, pois não tem como foco promover os interesses de homens gays ou mulheres lésbicas, concentrando-se na descrição de suas experiências, pois se assim fosse teria sua relevância restrita. Argumenta que “para a Linguística Queer todas as categorias identitárias são problemáticas porque elas normativamente regulam e excluem aqueles que não satisfaçam plenamente as suas exigências normativas” (MOTSCHENBACHER, 2010, p. 10). Nesse sentido, os estudos em Linguística Queer dizem respeito a todos os mecanismos linguísticos que levam à heterossexualidade, percebida não como uma norma naturalizada,

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mas como resultado de processos de materialização discursiva, questionando as práticas normalizadoras. Por essa dimensão, compartilha aspectos motivacionais com, por exemplo, a Linguística Pós-Moderna, pensando, dessa maneira, estruturas linguísticas como discursos. E, assim, faz-se importante, se não para a Sociolinguística, mas para o entendimento de práticas sociolinguísticas, no sentido de “entender o papel da linguagem na sociedade, sem simplesmente reproduzir a ideologia cultural, e do preconceito, práticas de exclusão e os métodos de dominação social inerentes a essa ideologia” (MOTSCHENBACHER, 2010, p. 19). Logo, é possível pelos posicionamentos anteriormente comentados, em Livia e Hall (1997; 2010), Borba (2006), Motschenbacher (2010) e Santos Filho (2012; 2015b), sustentar que a Linguística Queer se configura como a volta da performatividade aos estudos linguísticos. Como já afirmei, é um estudo em língua(gem) no qual seu objeto é a relação entre sujeito, linguagem, significado e identidade, em nossa cultura heteronormativa, relação que precisa ser estranhada e problematizada. Logo, se faz importante saber o que é a performatividade e sua estrutura, como já solicitou Butler (2011). 2.2 Performatividade Na aula anterior, no capítulo “Insurgências”, questionamos se a primeira página do jornal “Estado de Minas” enxergava o Outro, no sentido de saber se problematizava a heteronormativa, ao questionar se faz diferença se o casal de namorados é formado pelo par homem x homem, ou mulher x mulher, ou homem x mulher, ao mesmo tempo em que afirmava que o amor é igual, e se com essa publicação o periódico tornava as vidas dos homossexuais e lésbicas, por exemplo, reconhecíveis. Na sequência, mostramos a autodenominação da “mulher feijoada”, em um “relato de si”, na busca de se tornar uma vida não matável. Nesse capítulo da aula interessa-nos entender que o questionamento e as afirmações sobre esses dois enunciados e sobre os sujeitos por eles tomados como “objetos de discurso” (KOCH, 2002) só são possíveis porque estamos considerando que os corpos (gênero, sexualidade, desejo) são mediados pelas práticas discursivas, tomadas por nós como “atos de fala”. Ao longo dessas aulas, entendemos, portanto, que tais atos de fala podem sucumbir às exigências de nosso script cultural inteligível (que funciona como uma autoridade moral) ou ser dele dissidentes. Essa noção de corpos mediados por práticas discursivas é sustentada porque entendemos que os corpos, os sujeitos, não são substantivos, isto é, não são portadores de atributos essenciais, grudados à morfofisiologia. Logo,

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não são substantivos gênero, sexualidade e desejos. Nesse raciocínio, pósestruturalista, a vida, que nunca está decidida de uma vez por todas, é animada pela língua(gem), sendo a língua(gem) compreendida como “prescrição” acerca de seus “objetos de discurso”, pois interpela os sujeitos, “convida”-os a aceitar (ou rejeitar) a vida ali “falada”. Dessa maneira, o ato de fala inicia um processo de tessitura sobre o(s) sujeito(s) ali “representado(s)”, para si, para ele(s) “representado(s)” e para os demais interlocutores. Logo, os enunciados são constituídos em diálogo com a autoridade moral cultural, reiterando-a ou negando-a. Nos exemplos: o jornal reitera; a travesti nega. Mas é importante saber que ao reafirmar “um”, nega-se “outro”; ao negar “um”, afirma-se “outro” sentido, outro sujeito. Desse modo, não sendo o sujeito substantivo e sendo a língua(gem) uma nebulosa, não um legissigno, não transparente, a língua(gem) não constata, não descreve, não expressa, não representa; ela é ação. Ou seja, aprendemos que a representação é impossível. Com isso, toda fala ordinária é um exercício performativo. Agora, para avançarmos, precisamos entender a estrutura do ato performativo (linguístico), para pensarmos a performatividade dos corpos e do político. 2.2.1 Estrutura do ato performativo Ao falarmos de estrutura do ato performativo, estamos interessados em entender as “engrenagens” de um ato de fala, de uma enunciação, dentro dos parâmetros propostos/gestados por Judith Butler em seus estudos. Em relação a esse aspecto, a filósofa está interessada grandemente em compreender como a autoridade moral se faz presente na ação, isto é, como essa é introduzida e sustentada como performatividade. A esse respeito, inicialmente é relevante considerarmos que o ato performativo não é um ato linguístico em si. Isto é, ao discutirmos sobre ato de fala não estamos simplesmente nos reportando, apenas, à materialidade semiótica de um enunciado. Ao contrário, estamos entendendo que esse é uma cena discursiva, constituída em sua dimensão micro e macrossocial, na qual os sujeitos discursivos “interagem” e se constroem; constroem seus corpos e suas vidas. Isso implica que cada ato performativo está imerso numa cultura (e a constrói) – em nosso caso, na cultura heteronormativa, sustentada por scripts de significados que postulam a essência dos corpos e da língua(gem), mas

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também nos scripts culturais dissidentes, em tensão8. É a guerra cultural a respeito da qual discutimos na aula anterior. Nesse sentido, cada ato performativo se configura como uma cena de interpelação, de convocação ao outro, o interlocutor, de convocação também para o “eu” do discurso, a identificar-se com os sentidos e os sujeitos ali forjados – identificação não como (re)modelagem, mas como “paixão”, “sabor”, num processo através do qual as experiências discursivas são (literalmente) incorporadas a esquemas de ação, como é possível ponderar com base nas argumentações de Butler (2010). Sobre a interpelação, expliquei em Santos Filho (2010), acerca do episódio em 2008 que envolveu o jogador de futebol Ronaldo e uma travesti, que (...) quando Ronaldo assegura “sou completamente heterossexual” está preservando a sua face, no mesmo momento em que se interpela (como também interpela a outros) para seguir a matriz de inteligibilidade de gênero, sendo regulado pela perspectiva da heterossexualidade como norma/regra para a prática sexual. Ao declarar-se heterossexual, estabelece e regula a heteronormatividade (...) a “fala” de Ronaldo é uma interpelação, uma reiteração; um chamado a vivenciar o mesmo traço (...) [itálico meu] (SANTOS FILHO, 2010, p. 71).

Por esse sentido, “os atos de fala são formas de fala que autorizam (...) são enunciados que ao serem pronunciados também realizam certa ação e exercem certo poder vinculante” (BUTLER, 2002, p. 316). Ou seja, “ato performativo é aquela prática discursiva que efetua ou produz aquilo que nomeia” (BULTER, 2010, p. 167). Contudo, o mais importante é compreender onde e em que momento a enunciação adquire força performativa, isto é, em que momento consegue interpelar os sujeitos aos significados autorizados, como questiona Butler (2002), pois, para ela, não é certo dizer que a língua(gem) performatiza, pois essa não é em si um conjunto de atos. Sobre isso, Butler (2002, 2010) explica que o ato performativo não é um evento singular, pois participa de uma “cadeia de citações”, isto é, é uma reiteração de atos anteriores ou crítica a esses, portanto, implicado em uma rede de autorização, punição e, diríamos, também insurgências. Por essa dimensão, e como já discutimos em capítulos de aula passados, a força do ato de fala não está no sujeito enunciativo, mas no nexo entre poder e discurso, 8

Outro aspecto dessa estrutura é que a performatividade não é pontual, ao contrário, se realiza em uma rede de atos performativos que autorizem sentidos e sujeitos, dentro de significados culturais sempre reiterados. Assim, pensar em performatividade é pensar em um processo performativo.

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questão para a qual a filósofa política argumenta que tal força do ato de fala está na “frase anterior”, no ato reiterado, pois é a “citação” que dá (ou pode dar) expressão performativa e força vinculante, dando assim o poder de autorização à enunciação e aos sujeitos. Interessada nesse aspecto, Butler (2002) recusa-se a seguir o pensamento de que os sentidos das palavras, por exemplo, se dão numa ininterrupta “cadeia de signos”, na qual é a descontinuidade histórica que provoca derivações de sentido, de maneira fortuita. De modo diferente, prefere compreender que “todo ato é um eco ou uma cadeia de citação e essa apelação às citações é o que dá a força performativa” (BUTLER, 2002, p. 317), a força que realiza a ação, no sentido de que um ato contemporâneo emerge de uma cadeia de convenções vinculantes. Logo, para ela, com base em Jacques Derrida, a força de um ato é uma força citacional, pois é na citação que se estabelece a autoridade do ato de fala. Isso é possível porque a citação se constitui no poder vinculante e se constitui poder vinculante. Ou seja, conforme Butler (2002, 2010), um ato linguístico transformase em um ato performativo com êxito quando as citações têm poder vinculante, isto é, quando têm a capacidade de “passar a valer”, a capacidade de não meramente orientar, mas de produzir um efeito “obrigatório”, no entendimento de que devem ser acompanhadas, devem ser seguidas. Esse poder vinculante dá força ao enunciado, transformando-o, assim, em ato, em ação, via sua capacidade de interpelação, que se dá justamente através desse caráter vinculante das citações. Por essa razão, nenhum enunciado funciona performativamente sem a historicidade acumulada (e dissimulada) de sua força. Dessa maneira, a performatividade “consiste em uma reiteração de normas que precedem, obrigam e excedem ao ato” (BUTLER, 2002, p. 328). Mas quando os discursos têm capacidade vinculante? Possivelmente quando os significados são tomados como necessários, válidos, através da identificação. No entanto, a esse respeito, é importante ponderarmos que a interpelação repete, como em um eco, interpelações passadas, mas que “as reiterações nunca são meras réplicas do mesmo”, pois “o ‘ato’ mediante o qual um nome autoriza ou desautoriza uma série de relações sociais ou sexuais é, necessariamente, uma repetição9” (BUTLER, 2002, p. 318). Para ela, a 9

É possível que não façamos muita distinção nas acepções entre as palavras “réplica” e “repetição”, em seus sentidos de “fazer ou dizer novamente o fato ou o dito”. No entanto, nessa discussão teórica, precisamos entender que a distinção entre replicar e repetir uma citação se daria no sentido de que replicar é, como já aponta Butler (2002), fazer uma cópia

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repetição da citação não é governada pela escolha do falante, mas por sua identificação com os sentidos, produzida pela força de autoridade acumulada. Na imagem que segue, fotografias de outdoors, podemos, “analisando” esses outdoors, refletir sobre ato performativo e sua estrutura, questionando: Qual seria a cena discursiva e como essa se configura? Qual o “objeto de discurso” nessa cena? Sobre o que é e sobre quem é esse “projeto de representação”? Que corpo/vida é autorizado(a) e qual é desautorizado(a)? É possível compreendermos que em cada outdoor se realiza um ato performativo? A quem o ato performativo está endereçado? Que autoridade moral é reiterada e sustentada? Como a autoridade moral é introduzida? Que “citações” são repetidas, no sentido de trazer determinado sabor de volta à boca?

do original, “do mesmo”, reproduzindo-o com igualdade, ao ponto que repetir é “dizer de novo”, mas não necessariamente como apenas “cópia”; ao contrário, metaforicamente, “trazer à boca o gosto da comida ou da bebida”.

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Figura 05: Homenagem ao dia internacional das mulheres em outdoors. Fonte: Fotografias pessoais.

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A respeito desses outdoors, em Santos Filho (2015a), opinei que, neste ano, em Paulo Afonso, cidade baiana, situada no quadrilátero sertanejo, em virtude do dia internacional das mulheres, comemorando no 08 de maio, muitas empresas, públicas ou particulares, divulgaram homenagem às mulheres. Dentre os textos utilizados, os outdoors chamavam a atenção. Por isso, a partir de alguns deles, questionei que mulher nessas enunciações foi homenageada, se todas, e que homenagem a ela foi feita. Antes, comentei que homenagear é uma atitude de dar reconhecimento às mulheres, dar visibilidade, sendo essas entendidas, numa postura insurgente, como múltiplas e de muitas competências e habilidades, ou seja, diversas em seus modos de ser e viver. Destarte, na leitura, o interesse foi o de responder às seguintes problematizações: a) que sentidos foram nos outdoors autorizados?, b) que sujeitos foram nessas enunciações autorizados? e c) que “citações” foram repetidas? Será que tais “frases anteriores” têm poder vinculante? Conseguem os outdoors se constituir em atos performativos, com êxito? No tocante à cadeia de citações, conforme nos orienta Butler (2002), é preciso ver a língua(gem) e seus sentidos na temporalidade, pois só assim é possível entendermos as reiterações agenciadas e que sentidos são por elas autorizados na cena discursiva. Então, nos outdoors, temos, a partir de uma ligeira leitura na temporalidade, a recorrência do uso da cor rosa, em diversos tons, seja no pano de fundo dos textos propagandísticos, seja na fonte do uso do sistema linguístico (agora também semiótico) e a florata. Mas não só! Citam os sentidos de “mãe”, “educadora”, “protetora” e “justa”, o modelo de “justiça”. Nunca “mulheres”, sempre “mulher”. Pouco ou quase nenhuma outra citação. São esses os sentidos considerados válidos acerca do objeto de discurso, a mulher, sendo nesses “parâmetros” aceita como corpo/vida viável, humana. A esse respeito, disse: Por tais escolhas, seja da cor, das flores, da singularização (...) da denominação ou da qualificação, parece-me que as mulheres, em sua pluralização, foram apagadas, negligenciadas nesses outdoors, dando lugar apenas à ideia de uma mulher universal e a partir da noção de papel de sexo, quando entendemos que o ser mulher sendo generalizado é apenas um, de um único modo, e, sendo assim, teria seu corpo determinado biologicamente, assim como seu comportamento e suas escolhas, inclusive de cores – o rosa, que estaria relacionado e daria vida a uma mulher dócil, delicada e feminina. Sensível. Bela! Seria, então, ainda a dona de casa, com mãos para cozer e cozinhar? Possivelmente. Essa mulher é também branca, como as retratadas nesses grandes textos. Dessa inteligibilidade construída acerca das “homenagens” às mulheres em outdoors no quadrilátero sertanejo, consideramos que apenas duas empresas mencionaram a submissão pela qual as mulheres têm passado, por sua condição de gênero, e citaram as conquistas, as lutas, que essas tem realizado, no intuito de que as mulheres

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No que tange aos outdoors10 como atos performativos, é interessante rememorarmos que cada um se constitui um ato performativo e o conjunto deles se configura como uma grande ação de validação de sentidos sobre a mulher, compreendida como feminina, dentre outros aspectos, nos termos que o feminino ainda é visto no senso comum dominante. Logo, a autoridade moral vinculante é inserida (e sustentada) pela iterabilidade, pela citação desses significados sobre o que é ser mulher, como mecanismo de sua produção e articulação (BUTLER, 2010). É certo, como comentei na fala acima, que outros scripts culturais foram também reiterados, como críticas à inteligibilidade, tal como a condição de submissão da sujeita mulher. Entretanto, o conjunto dos atos performativos pareceu-me figurar a mulher como branca, mãe, dócil, possivelmente heterossexual, já que pelo processo de apagamento outros sentidos sobre ser mulher praticamente não foram construídos. De todo modo, esse jogo entre sentidos válidos nos dá a dimensão da negociação de sentidos que se efetiva numa enunciação, num ato de fala e na materialização dos corpos. Porém, é certo que para mim como o leitor dos outdoors o ato performativo não logrou êxito, já que, numa atitude de estranhamento11 da relação linguagem, sentidos, significado e identidades, assumi uma postura de responsabilidade, a de problematizar os sentidos e as vidas inscritas como 10

Acredito que compreender a relação entre gêneros discursivos (e sua função social) e a performatividade pode ser algo bastante produtivo nos meandros das discussões que travamos aqui. 11 Nesse estranhamento, assumo uma atitude crítica, na qual me utilizo da análise enunciativa do discurso, considerando o ato enunciativo e seus recursos linguísticos discursivos na construção dos sentidos propostos, em diálogo com a noção de ato performativo e sua relação com a autoridade moral vinculante, de modo a ler de maneira não subjetiva a configuração da cena discursiva, sua proposta de interpelação e o êxito ou não da ação realizada.

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precisam ser vistas, ouvidas e consideradas. Parabéns para essas empresas, que trazem a visibilidade para esses sujeitos (ou “sujeitas”?), historicizando sua condição e participação em um mundo de relação ainda gritantemente patriarcal, machista e etnocêntrica (...) Precisamos mais! Cadê a mulher negra? Cadê a sertaneja de lenço na cabeça? Cadê a mulher transgênera? Cadê a prostituta? (...) tais textos propagandísticos construíram a mulher naturalizando o conceito que impera no senso comum dominante, o de que todas são iguais: branca, mãe, sensível. Heterossexual? Deixo a dica, para a próxima homenagem, de que as mulheres precisam ser vistas e compreendidas em seus diversos “tons” (de “cinza”?), menos em seus “tons de rosa” [destaque e negritos meus] (SANTOS FILHO, 2015a).

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viáveis, entendendo que, por oposição e negação, outras vidas são consideradas não viáveis. Nesse raciocínio, o sucesso do ato performativo está diretamente relacionado com o outro/Outro do endereçamento e sua identificação ou não com as citações, visto que essas podem falhar em sua autoridade moral vinculante, abrindo, dessa maneira, outras possibilidades de significação. Nesse sentido, apenas nos meandros do ato performativo compreendemos a função do projeto de representação que é planejado em nossas falas ordinárias, entendendo também os agenciamentos semióticos, de recursos e estratégias discursivas, tais a denominação, a qualificação, a interpelação vocativa e a retratação de pessoa (depict people), por exemplo, nas cenas discursivas antes problematizadas. Mas, e quando o ato performativo é insurgente, como o ato queer, como se institui sua força performativa? Ao olharmos para o contexto macrossocial das últimas décadas do século 20, percebemos que outros scripts de sentidos ganharam vida, naquelas cenas discursivas, advindos ainda da contrarrevolução sexual e potencializados pelas experiências de morte vividas – no contexto da homossexualidade repatologizada pelo advento do HIV/Aids – como crítica às normas de inteligibilidade e à autoridade moral vinculante dessas, em contraponto às vidas forjadas como menos humanas. Com isso, foi possível produzir desidentificação com a matriz discursiva reiterada pela palavra queer – um desamor – e em processo de reapropriação dessa e de seus sentidos, aceitá-la, em parte, mas a recontextualizando, construindo sentidos de um corpo viável, um corpo humano, produzindo, assim, reconhecibilidade, pela interrogação do poder vinculante da heteronormatividade. Através dos folders do Queer Nation (volte à página 05), mostrados em capítulo anterior, é possível afirmarmos que a reapropriação da palavra queer e seus significados como oportunidade discursiva se realizaram através de algumas estratégias linguístico/semiótico-discursivas, tais como: a) Dar a si outros modos de estar, afirmativamente; adverbalizando-se positivamente, contrapondo-se à condição de precariedade a que foi sempre colocado; b) Construir sentidos de si, para o coletivo, na condição de pessoa do convívio de todos, parentes e amigos, tal como a condição de ser mães, irmãos, irmãs, pais, filhas, filhos, tios, tias, amigos e amores, em diálogo direto com seu interlocutor; c) Escancarar a atitude de preconceito da inteligibilidade como doença, colocando o outro (devolvendo-lhe) na precariedade d) Visibilizar-se pela visualização dos inscritos nos folders, através de recursos multimodais, tais como fonte maior, negritos etc.

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Por meio desses recursos e dessas estratégias semiótico-discursivas outros scripts de sentido foram reorganizados/forjados, de modo subversivo, retirando os queers da condição de precariedade, sem pedir ou precisar de autorização das normas de inteligibilidade para isso. Constrói-se “como gente”, como diríamos aqui em terras nordestinas; “gente indecente”, que é feliz assim, não de outro modo, e que tampouco o almeja. Todavia, ao rejeitar a sexualidade patologizada inscrita em si, o queer não se afasta por completo dessa significação, ao contrário, é através de sua citação que a reapropriação é operada. Outras acepções são construídas para o “queer” como válidas, tornando-se vinculantes, sendo, então, por muitos e muitas reiteradas. Em tais considerações, sobre a estrutura do ato performativo, a noção de condições de felicidade, em Austin (1990), pode ser compreendida como reconfigurada em Judith Butler, pois, se para ele é preciso que certas condições sejam atendidas para que o ato de fala se realize, tais como a) procedimento convencionalmente aceito e pessoas adequadas, b) procedimento que seja realizado por todos os participantes de modo correto e completo, e c) pensamentos e sentimentos sinceros entre os envolvidos, agora, com essa filósofa, entendemos que as “condições de felicidade” devem ser consideradas nos parâmetros antes discutidos, que perpassam pela cena discursiva, pela cadeia de convenções vinculantes, pelo endereçamento e pelos processos de identificação/desidentificação, nos quais se situa o agenciamento, não uma escolha altamente reflexiva, mas, conforme Butler (2010) uma prática reiterativa ou rearticulatória. Portanto, encerrando esse capítulo de aula, devemos ponderar também outro aspecto acerca do ato performativo, qual seja, o de entender que ao afirmarmos que o ato de fala constrói não estamos colocando-o em condições deterministas. Assim, um corpo generificado e sexualizado não é escolha de discursos, tampouco determinação discursiva, fato que nos obriga a pensar sobre o construcionismo linguístico-discursivo, na sequência. 2.2.2 Problematizando a noção de construção – para além da expressão, da representação e do determinismo linguísticos Nesse tópico da discussão, gostaria de destacar alguns pontos, por considerá-los relevantes na reflexão acerca da língua(gem) como ato performativo. Na fundamentação em Santos Filho (2012), entendemos que os sujeitos são interpelados pelas normas vinculantes e na enunciação marcam significados a respeito de si, de seu(s) modo(s) de ser, de viver, realizam marcações sobre as atividades que desenvolvem, sobre ações propostas, entendendo que o significado não é referencial, tampouco com base em uma

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significação lógica. Ao contrário, entendemos que os sentidos são contextualizados, nos quais os usos linguísticos/semióticos funcionam como “dêixis”, indiciando fenômenos socioculturais, possibilitando assim a ativação ou reativação de conhecimentos no “eu” discursivo e nos interlocutores. A noção útil nesse estudo acerca da construção discursiva de masculinidades bissexuais é a de que, conforme explica-nos Livia e Hall (2010), as palavras não estão significadas em si e por si mesmas, mas tem seus significados construídos no discurso. Logo, ao aceitarmos o conceito de ato de fala, e a noção de dêiticos, como aqui comentamos, afastamo-nos da ideia de que a língua(gem) é expressão do lugar do falante, conforme problematizamos em Santos Filho (2015b). Tal qual abordamos, não entendemos que há língua(gem) específica para homem e linguagem específica para mulher, bem como não há linguagem específica para gays ou lésbicas, por exemplo, pois recusamos os fundamentos de que os usos linguísticos e seus sentidos estejam condicionados a uma (suposta) substância dos falantes, a um (suposta) essência de sexo, derivando daí a essencialidade de seus usos linguísticos, chegando a linguagem a ser considerada como construída por uma essência biológica. Nessa dimensão, existiria um corpo como substância a partir do qual desencadearia a língua(gem), emotiva para as mulheres e objetiva para os homens, dimensão na qual a língua(gem) não é problematizada, assim como também não são problematizados os sujeitos e suas “identidades”. Por outra perspectiva, conforme nos explica Loureiro (2014), a partir das ideias de Deborah Tannen, na ideia de língua(gem) como expressão do lugar do falante, os papeis de sexo/gênero seriam refletidos no uso da linguagem, configurando, assim, usos linguísticos diferentes em homens e mulheres, forjando um “estilo de gênero”. Desse modo, as especificidades consideradas seriam fruto do processo de socialização, e produziram confrontos entre homens e mulheres. No entanto, pelo aspecto do ato de fala, recusamos essa noção de “estilo de gênero”, a menos que essa possa ser relida como ato performativo dentro das normas de inteligibilidade. Nessa reflexão, quando pensamos a língua em sua relação com as noções de gênero e sexualidade, para além da recusa da ideia de língua como expressão do lugar do falante e como “estilo de gênero”, secundarizamos do mesmo modo o conceito de “referente”, preferindo que esse passe agora a ser tomado pelo caráter de “referenciação”, no sentido de que “‘referentes’ não são ‘coisas’ do mundo real, mas objetos de discurso, construídos no decorrer dessa atividade” (KOCH, 2002, p. 29). Ou seja, em diálogo com os estudos de processamento de texto, referenciação é uma atividade de construção de “objetos-de-discurso” – é uma atividade discursiva – noção útil para compreendermos que a língua não é capaz de representar, visto que os objetos

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Nessa construção, a revista informa (e publiciza), função social do gênero capa de revista, sobre o relacionamento das duas mulheres a partir do sintagma “história de amor”, fazendo referenciação (KOCH, 2002) ao que está acontecendo entre as duas, preferindo também definir tal história – não é “uma história”, mas “a história de amor”. Tal referenciação, na construção do objeto de discurso, tal como a entendemos com Koch (2002), é útil em sentido duplo, já que se refere ao que acontece entre as mulheres mencionadas, e também à imediata referenciação às mulheres retratadas na manchete de capa, femininas e felizes, tecendo, dessa maneira, a coesão textual, remetendo-se ao exterior do texto e ao co-texto, ao seu interior. Nessa informação e publicidade, o objeto de discurso é, na sequência, retomado pela escolha lexical “paixão”, reforçando os sentidos propostos com o sintagma anterior, aqui comentado, “a história de amor”. Ou seja, o que está acontecendo entre Daniela Mercury e Malu Verçosa é história de amor, é paixão, sobre a qual é possível contar detalhes. Considerando os recursos semióticos destacadas e as inferências realizadas, a revista constrói um modo de ser lésbica para as duas mulheres, qual seja, feminina e feliz, em história de amor. Assim, o relacionamento entre mulheres é construído através do amor e da paixão, remetendo talvez à afeição, à amizade e à simpatia, e, desse modo, secundarizando, ou mesmo negligenciando, o sentir prazer, o desejo e a atração sexual, aspectos do relacionamento não passíveis de referenciação nessa enunciação. Tais escolhas linguístico-discursivas são felizes, isto é, estão em condições de felicidade, no sentido de que “nascem” quando em nosso roteiro cultural a homossexualidade é “aceita”, desde que dentro dos padrões considerados “normais” para a heteronormatividade. Por esse parâmetro, a identidade lésbica é performatizada de outro modo, diferente daquele que recorrentemente estávamos acostumados a ver na grande mídia. Mas, que lugar “novo” é esse? Para a construção desse, há a preferência, na construção das artistas lésbicas, pelo não enfoque da sexualidade, mas pela “apresentação” (informe e publicização) da

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do discurso não preexistem à atividade discursiva e que, por isso, devem ser encarados como resultados dessa atividade. Nesse raciocínio, não há relação direta entre linguagem e coisa, mas elaboração de versões do mundo, em processos interpelativos. Nesse sentido, o conceito de referenciação pode ser bastante produtivo na análise de atos performativos, especialmente quando abordamos a apropriação e a repropriação da iterabilidade em sua dimensão linguístico-enunciativa, no processamente textual. Com esse conceito, o de “referenciação”, ao realizar um rascunho de uma leitura queer, tomando uma capa da revista Contigo! como ato performativo, argumentei:

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Dessa maneira, recusamos a noção de representação, na qual há o referente. Entretanto, acreditamos que a ideia de referenciação cabe bem nos estudos enunciativos quando falarmos em processos linguístico-textuais, ajudando-nos na compreensão de que o ato performativo não mostra, não constata; realiza, constrói. Todavia, a noção de construção não perpassa pelos conceitos de relativismo ou determinismo linguísticos, visto que ao falarmos em construção através do ato de fala estamos nos referindo à interpelação e à mediação de corpos, de gêneros e sexualidades, pela citacionalidade. Ou, de outro modo, não estamos acreditando em uma performatividade divina, tal como no texto bíblico: No princípio, Deus criou os céus e a terra. A terra estava informe e vazia; as trevas cobriam o abismo e o Espírito de Deus pairava sobre as aguas. Deus disse: “Faça-se a luz!” E a luz foi feita. Deus viu que a luz era boa, e separou a luz das trevas. Deus chamou a luz DIA, e as trevas NOITE. Sobreveio a tarde e depois a manhã: foi o primeiro dia [negrito meu].

Assim, ao falarmos em construção não estamos entendendo nem que a língua exerce influência sobre a percepção da realidade, numa noção do relativismo linguístico, tampouco que, ao nomear, a língua institua a existência, por exemplo, conforme expõe Livia e Hall (1997; 2010), quando mencionam o afastamento de Judith Butler dessa compreensão do construcionismo (social), já que, para Butler (2010), ao pensarmos em gênero e sexualidade como performatividade não entendemos que a cultura/o social influencia ou determina uma dada natureza, de modo unilateral. Ou seja, a noção de performatividade não está para a noção de “monismo linguístico” (BUTLER, 2010). Logo, não há um corpo em branco, nem uma língua(gem) e ou um sujeito que assumam o lugar de Deus, realizando uma performatividade divina, mágica, ato que aconteceria de uma vez e de modo fixo, como em “e a luz foi feita!”. De modo diferente, o gênero, a sexualidade e o desejo (os

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lesbianidade por outro aspecto, qual seja, o amor. Essa suposta descrição, relega, dessa maneira, a mulher lésbica como uma “mulher-macho” e com desejos sexuais, ainda significação recorrente em nosso senso comum e, quase de modo oposto, coloca-a num outro extremo, feminina e em relação afetivo-amorosa. Logo, é necessário questionarmos se essa performatização não seria uma higienização da lesbianidade, sem taras, sem desejos e não masculinizada. Estaria a revista performatizando as lésbicas como femininas e sem sexualidade por que se assim não o fizesse essas seriam sujeitos abjetos, em nossa sociedade? Seriam desviantes? Anormais? (SANTOS FILHO, 2015b, p. 23-24).

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2.2.2.1 “Ideologia de gênero”: construção como determinismo linguístico

Figura 06: Campanha “Venha dizer não” à ideologia de gênero. Fonte: Disponível em < http://zip.net/bgsbrc >. Acesso em setembro de 2015.

Na campanha “Venha dizer não” à ideologia de gênero, no cartaz acima, como parte da petição pela retirada da ideologia de gênero do plano estadual de educação do Rio Grande do Sul, a ser entregue à Assembleia Legislativa daquele Estado, a afirmativa é a de que “a ideologia de gênero é um processo de desconstrução da família”, aspecto que justificaria fazer oposição a essa noção. Mas, o que é “ideologia de gênero”? Como se daria a destruição da família? Aqui, é importante saber que os fundamentos dessa compreensão estão diretamente ligados à ideia de língua(gem) sustentada, pautada no determinismo linguístico.

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corpos) como performatividade acontecem em “uma sequência de atos” (LOURO, 2014). Com esses aspectos discutidos, esperamos ter conseguido reafirmar que a noção de língua(gem), bem como a de gênero, sexualidade e desejo, como ato de fala, não está para o construcionismo social, e que se afasta também das noções de língua como expressão do lugar da fala, como estilo de gênero e como representação. Nessas bases conceituais, afastamo-nos também da noção de “ideologia de gênero” e sua compreensão de construção da língua(gem), tão popular nos últimos anos.

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Nessa lógica, os opositores da ideologia de gênero (que são também seus “propositores”) compreendem – em caráter conservador, situado numa perspectiva de niilismo moral – a noção de gênero, sex(o)ualidade e desejo como ato performativo numa dimensão de totalitarismo, denominado, então, de “ideologia de gênero”, conforme podemos entender nas explicações de Trillo-Figueroa (2009), que assim acredita. Para ele, a principal tarefa da ideologia de gênero12 é, então, manipular os sentidos das palavras, isto é, “descontruir a linguagem”, para alterar a sociedade. Na compreensão dos muitos antifeministas (propositores da noção de ideologia de gênero), a linguagem teria uma relação direta com mundo, sendo o sentido entendido praticamente como natural. Assim, existiriam formas “corretas” de linguagem, de sentidos, e, dessa maneira, a desconstrução da linguagem passa a ser encarada como um modo totalitário de agir, visto que, para esses conversadores, a grande questão é quem é o senhor dessa ação. Nessa visão, a desconstrução da linguagem se daria através da renomeação das coisas, das relações sociais e do mundo, objetivando construir novos significados a partir de novos significantes ou empregar antigos significantes de modo “purificados”, como alerta Trillo-Figueroa (2009). E, assim, o pensamento e a realidade seriam criados pela linguagem, que teria, por esse olhar, o poder criador de Deus. Ou seja, aqui, a noção de construção está fundada no determinismo linguístico (ou no relativismo linguístico), para o qual não existiria mais realidade senão pela linguagem, na ideia de que essa configuraria a realidade, não a expressaria, simplesmente. Por esse fundamento, os usos de “menines” “todes”, “mulher feijoada” e “vadia”, por exemplo, bem como os usos linguísticos nos quais o “-x” aparece 12

Mas, em nossa compreensão, “Ideologia de gênero” é a noção “cristã” de que os “novos valores” morais e sexuais criariam (ou estão criando) uma “cristofobia” e uma “deusfobia” e destruiriam (ou já estão destruindo), assim, o modelo de família heterossexual, que é natural (e, portanto, divino), gerando, dessa maneira, o início da destruição da humanidade. Nesse entendimento, esses "novos valores" excitariam também à pedofilia e a legalizariam, usurpando, desse modo, a infância e adolescência de muitos meninos e meninas. No entanto, é importante saber que essa noção de ideia de "ideologia de gênero" está construída sob falácias, e falsas verdades, na tentativa de negar, ou até mesmo satanizar, os conceitos de gênero e de sexualidade (re)formulados nas últimas décadas, a partir de estudos socioculturais e discursivos de bases construcionista e queer, pois entende que esses propagam os "novos valores" morais e sexuais (porém, uma rápida olhada na história nos permitirá entender que os estudos de gêneros e sexualidades não têm a intenção de propagar modos de ser e de viver, mas de interpretar e compreender os modos de ser e de viver, não apenas de sexualidades e gêneros dissidentes, mas de sexualidades e gêneros de modo geral) (SANTOS FILHO, 2015c).

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Figura 06: Fotografia de cartaz publicado em mural na UFAL, Campus do Sertão. Fonte: Fotografia pessoal.

Considerando as explicações de Trillo-Figueroa (2009), o uso do “-x” como morfema de gênero, em “dxs calourxs” seria desconstrução da linguagem e, assim, teria duplo objetivo, quais sejam, o de fornecer um modo de expressão de uma nova ideologia, a ideologia de gênero, e tornar impossível qualquer outro modo de pensamento. Tais usos e sentidos seriam, então, impositivos, porque deterministas, pois se constituiriam pela desconstrução de outros, assumindo, portanto, seu lugar. Além desses objetivos, as estratégias de ressignificação ofereceriam aparência racional e eticamente digna aos sujeitos por elas construídos. Por esse modo de pensar, diríamos que nas ideias desse “filósofo”, o queer, a partir de seu ato performativo insurgente, só tem aparência “aceitável” e “digna”, não o é. Trillo-Figueroa (2009) acusa que esse tipo de ato performativo indecente, construído a partir de rearranjos linguístico-discursivos, configurase ao “(...) criar novas palavras ou mudar o sentido das anteriores com o objetivo de erradicar o sentido tradicional daquelas palavras de nossa linguagem e, ao final, alterar nossa cultura ou modelo de sociedade” (TRILLO-FIGUEROA, 2009, p. 196). Ou seja, para ele, na ideologia de gênero, a ressignificação é algo negativo e não está sendo percebido. Portanto,

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como morfema gramatical de gênero, marcando neutralização de gêneros, no cartaz na sequência, seriam “desconstrução da linguagem”:

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podemos entender que, para ele, os genéricos gramaticais ou desdobramentos linguísticos, com são denominados os rearranjos linguístico-discursivos, em geral visam criar novas palavras ou realizar eufemismos, pois a primeira mudança na ideologia de gênero é sempre das palavras. Assim, a noção de construção compreendida através de um princípio determinista tem causado medo e histeria pela possibilidade de, na linguagem, outros gêneros, sexualidades e desejos serem “construídos”, levando muitos à necessidade de também através da linguagem afirmar que “menino já nasce menino e menina já nasce menina”, construindo/determinando essa certeza, a certeza dos corpos como substâncias. O medo também é em relação à própria palavra “gênero”, que, nessa percepção, seria útil à ideologia de gênero porque substituiria as palavras “homem” e “mulher”, construindo/determinando outros sujeitos que não são nem homens nem mulheres, pois os corpos seriam, agora, de “sexo neutro13”. Por conta disso é que houve a caça à e a retira da palavra “gênero” de muitos planos educacionais brasileiros. Observações sobre a Linguística Queer Acerca de uma Linguística Queer, entendemos que essa situa-se em ligação com o ato performativo queer, seja dos movimentos sociais e ou dos estudos queer, em sentido de subversão, em sentido de problematização das normas de inteligibilidade na cultura heteronormativa. Tal área de conhecimento se estrutura a partir da noção de performatividade, enfrentando a estreiteza dos estudos antes realizados acerca da relação língua(gem), gênero e sexualidade, passando, agora, a problematizar essa tessitura tríade. Com isso, visa compreender a estrutura do ato performativo e de que modo a autoridade moral vinculante se realiza nos enunciados, sendo o estranhamento o processo de leitura viável, através da análise enunciativo-discursivo. A esse respeito, cabe pensar nas especificidades de um ato performativo insurgente, de modo a compreender a linha tênue entre os sentidos estabilizados na cultura e a recontextualização desses de modo subversivo. A Linguística Queer, nessas bases conceituais, ao assumir a noção de performatividade assume do mesmo modo a noção de construção, mas se afasta do construcionismo linguistico-social, em seu caráter de “monismo linguistico”, pois entende que a língua(gem) não determina seu objeto de discurso. Afasta-se, assim, da performatividade em seu caráter divino, 13

Sugiro a leitura da reportagem “Educados no sexo neutro”, Revista Veja, 19 de dezembro de 2012.

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distanciando-se, também, da noção de ideologia de gênero, que vê a variação e a mudança linguísticas como “desconstrução” da realidade, visto que essa ideia assume que há usos linguistico-discursivos naturais, verdadeiros; que há uma realidade verdadeira. Nesse arcabouço, acreditamos fornecer um lugar na linguística para a teoria queer e ao mesmo tempo olhar para os fundamentos linguísticos desses estudos, assumindo uma postura subversiva nos estudos linguísticodiscursivos, possibilitando uma queerização desses. Essa linguística indecente nos possibilita, nos parâmetros aqui discutidos, refletir sobre a performatividade de gênero, sexualidade e desejo (performatividade identitárias de modo geral), refletindo, da mesma maneira, da performatividade desses como ato político. Bibliografia AUSTIN. J. L. Quando dizer é fazer: palavras e ação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. BENTO, Berenice. QueeIr o quê? Ativismo e estudos transviados. Revista Cult – Dossiê Teoria Queer – o gênero sexual em discussão, nº 193, ano 17, p.42-46, agosto de 2014. BORBA, Rodrigo. Linguística Queer: uma perspectiva pós-identitária para os estudos da linguagem. Entrelinhas, Ano 3, nº 2, jul./dez., 2006, p. 1-10. BULTER, Judith. Vida precária. Contemporânea – Revista de Sociologia da UFSCar. São Paulo, Departamento e Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFSCar, 2011, nº 01, p. 13-33. BUTLER, Judith. Acerca del término “queer”. In Judith Butler. Cuerpos que importam – sobre los limites materiales y discursivos del “sexo”. Buenos Aires: Paidós, 2002, p. 313-339. BUTLER, Judith. Corpos que pesam: sobre os limites discursivos do “sexo”. In. Guacira Lopes Louro (Org.). O corpo educado – pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2010, p. 151-172. BUTLER, Judith. Performatividad, precarieadad y politicas sexuales. AIBR. Revista de Antropologia Iberoamericana, vol. 04, nº 03, set/dez 2009, p. 321-336.

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BUTLER, Judith. Problemas de gênero - feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização, 2003, p. 16-60.

KOCH, Ingedore. Linguagem e cognição: a construção e reconstrução de objeto-de-discurso. Veredas – revista de estudos linguísticos. Juiz de Fora, vol. 06, nº 01, p. 29-42, 2002. LIVIA, Anna e HALL, Kira. “É uma menina!”: a volta da performatividade à linguística. In. Ana Cristina Ostermann e Beatriz Fontana (Org.). Linguagem, gênero e sexualidade – clássicos traduzidos. São Paulo: Parábola Editorial, 2010, p. 100-127. LOUREIRO, Marlene. Diferenças comunicativas. In. Marlene Loureiro. O género no discurso de opinião na imprensa portuguesa. Covilhã: LivroLabCom, 2014, p. 45-158. LOURO, Guacira Lopes. Um corpo estranho – ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica, 2008, p. 11-25. LOURO, Guacira Lopes. Uma sequência de atos. Revista Cult, ano 17, nº 185, jan./2014. MISCKOLCI, Richard. Crítica à hegemonia heterossexual. Revista Cult – Dossiê Teoria Queer – o gênero sexual em discussão, nº 193, ano 17, p.33-35, agosto de 2014. MISCKOLCI, Richard. O que é o queer? I Seminário Queer – Sesc São Paulo. Disponível em < https://www.youtube.com/watch?v=uB8Yd53x51M >. Acesso em 09 de setembro de 2015. MOTSCHENBACHER Heiko. Poststructuralist perspectives on language, gender and sexual identity. In. Motschenbacher Heiko. Language, gender and sexual identity: poststructuralist perspectives. Filadélfia-USA: John Benjamins B. V., 2010, p. 01-04.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (MESTRADO E DOUTORADO)

ÁREAS DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS

Como citar:

Seminário de Pesquisa: “Introdução à Linguística Queer” – Maringá (PR), 05 e 06 de outubro de 2015.

SANTOS FILHO, Ismar Inácio dos. Da emergência da Linguística Queer. In. Seminário de Pesquisa: Introdução à Linguística Queer. Programa de Pós-Graduação em Letras. Maringá: UEM, 2015.

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