Da história as telas do cinema: revisitando a Revolução dos Cravos

Share Embed


Descrição do Produto

Universidade Federal do Rio de Janeiro
Rio de Janeiro, 13 de Março de 2013.
Aluno: Daniele Moreira e Pablo Baptista
Matéria: Cultura Portuguesa
Professor: Monica Fagundes

Da história as telas do cinema: revisitando a Revolução dos Cravos

Ao se pensar em revolução a mente humana, quase que automaticamente, se remete a mudança, luta, conquista. Logo, entende-se que esse vocábulo de apenas quatro sílabas traz consigo todo um valor semântico surpreendente. Tratar de revolução é lidar com mudanças profundas nas instituições políticas, econômicas, culturais e morais. É lembrar-se de toda a história do homem, e desde já apontar que esse frágil ser é capaz de se unir com seus semelhantes e escrever sua história de forma antes não imaginada. Somente as gerações futuras saberão de fato os resultados de um ato revolucionário. Sendo assim, o homem não é somente um animal político, e, portanto revolucionário.
Observa-se em Portugal um uma revolução particular. Não é feita pelo uso da força dos blindados, das granadas ou de bombardeiros. É feita pelos militares, pelo povo, para o povo, e tendo como símbolo o cravo, devido sua ocorrência ter sido na primavera, época em que as floristas saiam para as ruas vendendo essa espécie de flor. Denominou-se então, de Revolução dos Cravos. Revolução essa, que ocorreu em solo português, no ano 1974, no dia 25 de Abril, tendo como objetivo a mudança da situação precária de Portugal, tanto externamente como internamente. Frutos de uma ditadura que se instalou em terras lusitanas.
Sob o governo de Oliveira Salazar e posteriormente ao de Marcelo Caetano, época ao qual pode ser denominada de salazarismo, a nação portuguesa se encontrou em uma fase de grande repressão política. Em fins da Segunda Guerra Mundial diversas colônias ao redor do mundo se tornaram independentes, porém contrariando o que ocorria, Portugal intensificou no ano de 1960 a repressão as suas ainda colônias, Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. Tudo isso, juntamente com o desgaste oriundo dos a esses conflitos em África e a crise econômica que se instala em Portugal, culminaram para o ocorrido em abril de 1974.
Essa Revolução tem um caráter particular, pois foi feita por oficiais de baixa patente, os capitães, e apoiada inteiramente pelo povo, registrando apenas quatro mortos. Tinha como objetivo a derrubada do regime de inspiração fascista que se instalou em Portugal. Buscava-se então, a mudança do cenário politico e econômico. E fim dos conflitos na África.
É interessante salientar que essa Revolução não permaneceu apenas nos livros de história, mas na manifestação artística do povo português. O cinema teve grande papel em demostrar os flagrantes da Revolução dos Cravos. Toda essa manifestação é encontrada então, pelas imagens em movimento da sétima arte. Com a Revolução de Abril tem-se o fim da censura e isso gera uma expansão do cinema português, inicialmente, claro, sendo mecanismo para influenciar as decisões, ou modificar a mentalidade adormecida. O Portugal de Abril retratado em filme tinha como tema manifestações urbanas, reivindicações sindicais, crises em fábricas, marginalidade juvenil, emancipação feminina entre outros temas. Ficou conhecido como cinema de intervenção, tento um caráter militante ou de conscientização.
Com o 25 de Abril o cinema português conquistou novas dimensões, se tornando mais organizado como também apresentando o surgimento de grandes cineastas como Maria de Medeiros. Uma das mais atrizes portuguesas mais renomadas, nascida em Lisboa no ano de1965. Atuou em diversos filmes entre eles Henry e June (1990), Pulp Fiction (1994), de origem americana. Em Portugal Silvestre (1981), Retrato de Família (1991), Paraíso Perdido (1992), Idade Maior (1990), Três Irmãos (1993), esse último premiado a Coppa Volpi. Porém, foi com Capitães de Abril (1999) que se realizou como diretora.
Em especial no filme que retrata a Revolução dos Cravos, Capitães de Abril (2000), observa-se a representação histórica em filme. E sendo assim, percebe-se não apenas a transposição da história para as telas de um cinema, mas todo um trabalho de repassar de modo peculiar as características da Revolução. No filme enxergam-se temas como ironia, emancipação da mulher, o ideal de democracia que permeia a Revolução, os conflitos locais e ultramarinos e também o posterior silencio a Revolução dos Cravos.
Um dos temas presente no filme é a ironia, e neste caso temos a apresentação de contrastes inteligentes para criar ou ressaltar certos efeitos humorísticos. Assim sendo, na cena em que o Capitão Maia (Stefano Accorsi), um dos principais personagens do filme, convoca a tropa para a Revolução e esse espera uma resposta de seus soldados, o que recebe inicialmente é um silencio e manifestações posteriores. Não há uma reação de imediato, mas sim uma demora. Outro momento é a escolha das armas, sendo essas poucas e velhas. Os automóveis quebram no caminho e uma das afirmações é "Tudo que funciona está em África". Critica então, a situação de Portugal, ou seja, é comparada a sucata, e desgastado pelos combates colônias.
Tem-se ainda, o momento diante do sinal vermelho, a afirmação é feita por um militar: "Que raios de revolução é essa para em sinal vermelho?", outro militar responde: "E a segurança dos civis?". Este tema sempre esteve associado à Revolução, a questão de fazê-la não por armas de fogo, mas sim pela calma, pela segurança da população. E é essa a orientação, base da revolução, que faz com que a tropa para diante do sinal vermelho e tenha apenas quatro mortes, que perderam a vida não pela as armas dos revolucionários, mas por armas do governo opressor. Outros temas ainda podem ser levantados como o tratamento dado à tropa a após ter conquistado o ministério, sendo confundidos como seguranças do governo português. Já após o domínio do ministério temos o telefonema que o Capitão Maia realiza e o oficial no outro lado diz: "Tenho que desligar. Há uma ligação urgente. Por enquanto é só". Tudo isso bem construído, faz com que o espectador se pergunte sobre o real papel e força desse movimento.
Um aspecto que deve, também, ser ressaltado é a estruturação da tropa, tanto em discurso como em aparato físico e militar. O discurso é duplo. Há a ideia de democracia com a liberdade de expressão e escolha, feita pelo Capitão Maia, e a oposição representada pelo Major (Joaquim de Almeida) que sempre, demonstra certa negatividade a respeito dos ideais de Maia. Vemos, portanto, a oposição de pensamentos e ideais de como poderia se estabelecer um futuro governo. Temos também momentos como a indefinição de serem revolucionários ou de serem reacionários. Indagação feita pelos soldados logo no inicio do filme, levantando a questão sobre a solidez dos que formam o movimento. Já na sala, na cena com o presidente deposto, o Capitão Maia, questionado sobre a real liderança do Movimento das Forças Armadas afirma:

"–Capitão Maia, comandante das forças que ocupam o Largo do Carmo. As ordens que recebi são um ultimato. Ou se entrega, ou atacaremos o quartel.
–Quem dá as ordens? [Marcelo Caetano]
–OSCAR!
–Quem é OSCAR?
–A Comissão coordenadora do Movimento das Forças Armadas.
–Quem é o chefe?
–São vários… oficiais, generais. Não só capitães."
- Uma pergunta. Qual é seu programa político?
- Não estou autorizado a dar detalhes. Alguém o fará hoje mesmo.

Neste momento, ainda que Maia consiga se desvencilhar das perguntas do presidente deposto Marcelo Caetano (Ricardo Pais), fica claro por sua fisionomia tensa, que não havia um plano sólido após a derrubad
Bibliografia
CAPITAES de Abirl. Direção: Maria de Medeiros. [S.l.]: [s.n.]. 2000.
MATOS-CRUZ, J. D. 25 de Abril: o cinema e o mundo. Camões. Revista de letras e cultura lusófonas, Lisboa, Março 1999. Revista 5º.
SEABRA, Z. As mulheres na clandestinidade. A minha experiência. Camões. Revista de letras e cultura lusófonas, Lisboa, p. 26-30, Março 1999. Revista nº 5.

a do governo ditatorial. Somente se sabe que o poder, contrariando os interesses de Caetano, já esta nas mãos do povo.
A queda desse regime gera, portanto, a queda da mordaça que prendia os portugueses. O inicio do despertar para novos tempos. É presente ainda a repressão forte ao movimento estudantil, sendo considerado o mais vulnerável, principalmente nos anos de 1960. Representava as mais visíveis lutas, e por consequências os que mais eram presos. No filme essa característica paradoxal da juventude, fragilidade e força, é vista na frase da professora universitária Antônia (Maria de Medeiros) sobre seu aluno: "É um jovem tão frágil. Não suporta a dor. Não suporta. Antes fosse eu em seu lugar". Aqui se percebe que o papel de Maria de Medeiros é de uma professora universitária independente, deixada pelo marido devido a guerra colonial, apontado, portanto, o espirito feminino português de 24 de abril.
Muitas foram às mulheres que participaram de forma clandestina contra o regime. Mulheres que tiveram que se separar de seus filhos, e que no fim foram até mesmo obras de uma luta que as esqueceu. Mulheres que se relacionam com os conflitos de sua nação, como também de seus sentimentos. Observa-se que as cenas de manifestações femininas presentes em Capitães de Abril, sempre estão associadas a libertação feminina, e conquista de direitos. "Homens na Cozinha! Homens na cozinha". Refletindo a luta por igualdade de gênero e liberdade de expressão. Elas dão a Revolução um caráter todo feminino, seja com os cravos, sejam com nos casos de amor.
Porém, era cedo para afirmar os verdadeiros frutos da Revolução. Ainda hoje é presente a melodia de Grândola Vila Morena em solo português. Chegando ao final do filme, na libertação dos presos políticos, o estudante universitário apos ser livre diz: "Ainda é cedo para dizer, mas é uma esperança fantástica". É certo afirmar que muito se alcançou com o 24 de Abril, entretanto, muitas outras realidades não foram modificadas profundamente. Assim sendo, o diálogo com esse espirito revolucionário, com o atual Portugal que sofre com a austeridade politica, é possível demostrando que o passado se faz presente. Tanto ele, com o espirito revolucionário português.







Bibliografia
CAPITAES de Abril. Direção: Maria de Medeiros. [S.l.]: [s.n.]. 2000.
MATOS-CRUZ, J. D. 25 de Abril: o cinema e o mundo. Camões. Revista de letras e cultura lusófonas, Lisboa, Março 1999. Revista 5º.
SEABRA, Z. As mulheres na clandestinidade. A minha experiência. Camões. Revista de letras e cultura lusófonas, Lisboa, p. 26-30, Março 1999. Revista nº 5.



Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.