Da Legalidade da Estipulação de Carência por parte dos Planos de Saúde para os Casos de Doenças Preexistentes.

August 6, 2017 | Autor: Henrick Bezerra | Categoria: Direito à Saúde
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Da Legalidade da Estipulação de Carência por parte dos Planos de Saúde para os Casos de Doenças Preexistentes.

Com o advento da Lei n.º 9.656, de 3 de junho de 1998, houve a regulação dos planos e seguros privados de assistência à saúde. A partir deste marco, novos direitos e obrigações foram estipulados, tanto no que diz respeito aos beneficiários quanto às operadoras de plano de saúde.

Passou-se, assim, a ser permitido às operadoras de plano de saúde a cobrança de prazos de carência nos casos de novos usuários, buscando-se, com tal prática, uma compensação por custos oriundos de eventuais sinistros.

Desta feita, uma vez a imputação de carência ser o cerne do presente artigo, imprescindível se faz discorrer acerca do aludido termo, de modo a, então, elucidar a presente questão.

carência: é o período ininterrupto, contado a partir da data de início da vigência do contrato do plano privado de assistência à saúde, durante o qual o contratante paga as mensalidades, mas ainda não tem acesso a determinadas coberturas previstas no contrato, conforme previsto no inciso V do artigo 12 da Lei nº 9656, de 1998, nos termos desta Resolução1

O dispositivo legal mencionado na definição acima transcrita, vale dizer, artigo 12, inciso V, da Lei nº 9.656/98, dispõe o seguinte:

Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas: (...) V - quando fixar períodos de carência: a) prazo máximo de trezentos dias para partos a termo; b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos; c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência;

Pela simples leitura do conceito acima discriminado, verifica-se ser plenamente lícito às operadoras de plano de saúde, desde que haja expressa previsão contratual, imputar ao contratante do plano um período no qual o pagamento da mensalidade é efetuado integralmente, porém com algumas 1

Artigo 1°, III, da Resolução Normativa – RN 186, de 14 de janeiro de 2009.

coberturas suspensas.

O principal fundamento para a exigência de prazos de carência é a necessidade de a operadora arrecadar valores do consumidor ingresso ao plano durante certo período, com o fim de obter a devida capitalização.

Sem isso, o sistema não se sustentaria, haja vista que alguns consumidores se utilizariam dos serviços somente enquanto precisassem, gerando, por vezes, enormes custos à operadora, ante a ínfima contribuição ao fundo financeiro gerido por esta.

No caso específico de doenças preexistentes, a carência faz-se ainda mais imprescindível, em virtude da maior chance de os sinistros provenientes da patologia portada pelo beneficiário virem a ocorrer.

Justamente em razão deste potencial de ocorrência, é que nos casos de o beneficiário possuir alguma doença ou lesão preexistente, permite-se às operadoras de plano de saúde excluir, por um período de 24 meses, coberturas para procedimentos de alta complexidade, leitos de alta tecnologia e procedimentos cirúrgicos relacionados à doenças e lesões preexistentes, consoante estabelece o artigo 2º, inciso II, da Resolução Normativa ANS nº 162/2007.

O supracitado prazo possui seu devido respaldo legal também no artigo 11, da Lei n.º 9.656/98, senão vejamos:

Art. 11. É vedada a exclusão de cobertura às doenças e lesões preexistentes à data de contratação dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei após vinte e quatro meses de vigência do aludido instrumento contratual, cabendo à respectiva operadora o ônus da prova e da demonstração do conhecimento prévio do consumidor ou beneficiário.

Sendo assim, no ato da contratação de planos individuais, faz-se necessário o preenchimento de um documento denominado declaração de saúde, por meio do qual, o consumidor informa se possui ou não alguma das doenças nela listadas.

Nesta oportunidade, à operadora de saúde é facultado o direito de exigir do contratante o preenchimento do aludido documento, mediante entrevista assistida por um médico pertencente à rede de profissionais credenciados, desde que, para tanto, ao beneficiário não seja imposto qualquer ônus.

Todavia, uma vez o contratante opte por orientação de médico não pertencente à lista de profissionais da rede cooperada, terá de assumir o custo da entrevista.

Importante se faz ressaltar, neste ponto, que caso o plano de saúde não efetue a entrevista qualificada, estará consentindo com as informações constantes da declaração de saúde elaborada pelo usuário, o que ensejará a curto prazo a oneração do contrato, caso o usuário seja, com efeito, portador de uma doença preexistente.

Deste modo, vale aqui o alerta às operadoras que, não obstante toda a regulamentação acerca do tema em comento, as operadoras de plano de saúde necessitam ter o devido zelo pela correta aplicação do período de carência, uma vez que, os tribunais pátrios têm decidido por meio de decisões dissonantes com a legislação específica ao caso, determinando aos planos de saúde que prestem cobertura de tratamentos de doenças preexistentes, ainda que não cobertas contratualmente, salvo a comprovação de má-fé do beneficiário.

Aliás, é o entendimento esposado por Tribunais como o do Estado do Rio Grande do Sul, que na Apelação n.° 751738615, de relatoria da Des. Isabel Dias Almeida, entendeu pela não cobertura do tratamento pleiteado, visto que o autor da demanda omitiu, quando da assinatura do contrato, doença que, inclusive, o levou a óbito posteriormente, restando comprovado, portanto, a ausência de boa-fé enquanto contratante.

Por isso, havendo eventual suspeita por parte da operadora do plano de saúde quanto à ocorrência de fraude contratual, poderá estabelecer contato com o usuário, com o intuito de sugerir-lhe uma retificação da declaração de saúde efetuada anteriormente e, assim, passar a enquadrá-lo para o tempo remanescente, em cobertura parcial temporária (CPT).

Na hipótese de não haver ajuste das vontades, presumir-se-á configurada a fraude contratual no preenchimento da declaração de saúde, devendo, por conseguinte, a operadora instaurar um processo administrativo junto à Agência Nacional de Saúde - ANS, com o escopo de resolver o conflito. Vale salientar, neste sentido, que enquanto perdurar o processo administrativo, a suposição de fraude contratual não poderá dar ensejo à negativas de cobertura e, tampouco, rescisão unilateral do contrato.

Destarte, conclui-se que, às operadoras de plano de saúde é totalmente lícito estipular cláusulas contratuais estabelecendo período de carência, inclusive, nos casos de doenças preexistentes, desde que, no entanto, aquelas estejam devidamente expressas no instrumento particular de contrato, devendo a empresa, desta sorte, sempre zelar pela sua correta aplicação, sob pena de haver oneração excessiva do contrato.

Henrick Lôbo Bezerra Advogado – Especializando em Direito Civil e Processual Civil – Andrade GC Advogados

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