Da Liberdade e o \"cheque-ensino\"...

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A Liberdade e o "cheque-ensino"
por João Titta Maurício

Quando leio alguns dos textos e comentários sobre a temática do "cheque-ensino" ficam, para mim, evidentes alguns dos "grandes" e "positivos" resultados do actual estado de coisas no ensino, em especial o desconfiado desprezo que, nalguma "escola pública" aprenderam a sentir pela Liberdade, pela Democracia e pelo Transcendente… Tudo isto caldeado em certezas do "valor" absoluto do reino da filodoxia, feito de imensa e arrogante ignorância cheia de wikipédia, manchetes de tablóides e "opiniões à moda taxista".
É uma pena que, por medo, comodismo ou simplesmente por incapacidade, as pessoas em vez da Liberdade (algo de absoluto e essencial ao Homem - até para o ser) julguem ser preferível uma solução contingente e imperfeita, a escola pública obrigatória e monopolista, cujos "feitos" maiores são, hoje em dia e como produto final quase necessário, a massificação e a possibilidade de uniformização... do erro.
Algum dos elementos do argumentário usado são deveras muito preocupantes. Pela pobreza de conteúdo. E pelo uso excessivo das falácias que tanto engordam as propostas demagógicas e projectos políticos anti-democráticos.

Primeiro, seria bom que todos concordássemos que a Liberdade e a Democracia não são conceitos e realidades de que os portugueses possam ser excluídos por princípio: que me é-me insuportável esse conceito snob (da autoria de alguns que assumem posturas de pseudo-superioridade intelectual ou moral) segundo o qual haveria povos que as podem ter e outros não. E, principalmente (e em consequência natural dessa forma "especial" e menor de encarar a Liberdade e a Democracia… e a própria natureza humana – a qual até rejeitam como conceito), que não as merecem aqueles que votam diferente do que esses "canhotos" (e "manetas") desejam e lhes convém.

Segundo, é manifesto que quem se opõe ao modelo do "cheque-ensino" não conhece, nem as variantes que são propostas em Portugal. Usam comentar uma "caricatura" (construída a partir da cartilha que, para o efeito, lhes foi fornecida) que lhes convinha que fosse real: é falso que o modelo do "cheque-ensino" coloque em causa a gratuitidade e a universalidade do ensino. Pelo contrário, garante-os e acrescenta o elemento Liberdade, assente na possibilidade da diversidade, alternativa e concorrência de escolas e projectos educativos, que assim se apresentam a uma escolha livre. E, portanto, com consequências. Para os mais competentes. E para os que o não foram.
Esta é a primeira e a maior das falácias (donde as seguintes derivam e assentam):
a de que há uma sinonímia absoluta e necessária entre "escola pública" e universalidade e gratuitidade do ensino: só por profunda desonestidade intelectual se pode fazer tal afirmação;
ou a de que a "escola pública" é garantia necessária de qualidade e neutralidade (como se houvesse uma única percepção da verdade e a escola fosse uma coisa e não pessoas que, com as suas circunstâncias e subjectividades pessoais, se comunicam aos outros: mais do que uma falácia, a teoria da neutralidade é uma mentira!);
ou que do "cheque-ensino" resulta a guethização da "escola pública", a pioria das condições de ensino e, portanto, uma ataque aos interesses e à mobilidade social daqueles que mais precisam. (como se, da situação presente de quase monopólio deste modelo de "escola pública" que tantos, interesseira e descaradamente, defendem, não haja resultado uma evidente pioria nos conteúdos ministrados, nas matérias aprendidas e nas capacidades finais adquiridas);
ou que surgiria um problema que resultaria de as escolas em certos "sítios difíceis" (ou no interior) não possuírem capacidade para atraírem professores – e bons professores (como se o problema não existisse independentemente de o modelo ser o actual ou o "cheque-ensino"... claro, com a excepção daquele "modelo alternativo" em que os professores fossem compulsivamente distribuídos. Como, felizmente e bem! – não o são, observa-se que só eles têm a liberdade de escolher a escola... e assim querem continuar: o que é bom para eles é, para os outros, pais e alunos, um "retrocesso civilizacional", um ataque aos direitos dos mais desfavorecidos…!)
Até aqui, os únicos que puderam beneficiar da liberdade de escolha (uns por poderem escolher o que ensinar outros por poderem escolher onde aprender) foram os com dinheiro para o fazer (ou por pertencerem a grupos formais ou informais que lhes permitiram organizar cooperativas de pais e até criar a oferta que pretendem). Porém, com o "cheque-ensino", com a entrega de um voto (com "recheio") aos pais, caber-lhes-á o poder da decisão… e às escolas, o desafio de merecer a escolha, a tarefa de fazer bem e melhor.
Não compreendo como é que os pais poderiam estar contra isto!
Já os profs., que tanto defendem a "escola pública" ("porque sim" ou porque elas são "muita boas" e eles também são "bués bons", percebo porque recusam sequer o debate sobre o "cheque-ensino"... Mas não seria de lhes propormos que, através de cooperativas (e sem financiamento garantido apenas porque existem), passassem a ser eles a governar a sua própria escola, e assim a "deslumbrarem-nos" com a sua fabulosa "excelência" e "competência"... atrevendo-se a "permitir" que sejam os pais a escolhê-los.
Porque será que não acontece assim? Porque será que, a este modelo, eles preferem aquele em que o "cheque-ensino" é emitido à ordem... dos professores?!?
Bem sei que, ao propor esta comparação, alguém vai achar que "estou a pedi-las", mas creio que esta faz sentido e é bem elucidativa: alguém se imagina capaz de defender que entre um hipermercado (supermercado ou mesmo uma mercearia de bairro), uma cooperativa de produtores (ou mesmo de consumidores) e uma rede de "armazéns do governo", é este último aquele que deve ser o preferido?!? Alguém acha que (quer ao nível da qualidade, da diversidade ou do preço… além do controle da legalidade ou licitude dos actos) o consumidor, o cidadão fica desta forma melhor servido?!?
Então como suportar a ideia de "escola pública" como uma proposta perfeita, excludente e indiscutível, uma inevitabilidade ou o – e não, quanto muito, um possível… – "pináculo civilizacional" de excelência?!?
O resultado da introdução do "cheque-ensino" pode ser, dizem os opositores, o surgimento de "escolas (privadas) de elite" e a "ghettização" da escola pública. Qual é a novidade: (justa ou injustamente) não é já essa a ideia geral que se tem? A diferença é que, com o "cheque-ensino" (bem regulamentado, aplicado e vigiado), as crianças com origem nos bairros servidos por essas escolas não estão condenadas a frequentá-lo "porque sim" ou porque não tem recursos para ousar tentar uma escola melhor. Quanto às "escolas de elite", que existam, ainda bem. Só que (usando um adequado jargão "marxiano") deixam de ser um "privilégio das classes dominantes e abastadas"…

Terceiro, o que se defende é a manutenção – com melhoria e Liberdade! - do ensino como prestação percebida de modo universal e gratuito... mas em que a resposta do Estado (como prestador) é sempre subsidiária, sempre presente e nunca faltando quando for preciso. No actual modelo o Estado "dá-se ao luxo" de poder sair sempre que economicamente entende que é "custoso".

Quarto, o "cheque-ensino" não consiste num «financiamento aos privados» (isso é o que existe agora através dos "contratos de associação"), antes sendo o entregar aos pais a decisão, e não retira alunos à pública. Paradoxalmente é mais certo dizer-se que o Estado, ao financiar directamente a Escola pública e tornando-a quase compulsiva (nomeadamente, a escolha da escola), distorce as regras da oferta e está a retirar, pela força do dinheiro, aos pais o direito e a liberdade de educarem os seus filhos. Mas isso, é claro, não interessa mesmo nada… O que é bom é deixá-los exclusivamente nas mãos (ou nos pés) dos "excelentes", "esclarecidos" e "iluminados" pedagogos da "5 de Outubro", que decidem exclusiva, uniforme e inapelavelmente para todo o território… não cuidando de saber que existem enormes diferenças e idiossincrasias locais.
Além disso, se a escola pública é assim tão excelente, o "cheque-ensino" não lhe retiraria uma única criança. Porque, ao contrário do que agora se passa, sendo uma escolha, não há uma determinação. Ora, se agora que não há escolha e, havendo-a, alguns concluem que ela vai ficar deserta... será, então, razoável que se diga que a solução é impedir essa escolha?!?

(no entanto, duvido que houvesse essa debandada que "adivinham")

Qual seria o problema se os papás acharem que o privado é melhor: será que podem?!? Qual é o facto que o leva a criticar essa opção?!? Ou sequer o direito a terem-na?!?
Fico deveras preocupado quando alguém porque, por exemplo, defende a baixa de impostos, recebe como riposta a pergunta: «e quem é que compensa o Estado pela perda desse dinheiro e como?»... como se os impostos fossem um direito do Estado e não um dever variável, que resulta de uma anual autorização (pelos cidadãos) de cobrança para financiamento das actividades que se quer e autoriza o Estado prestar, em função das necessidades colectivamente sentidas e da actividade económica das famílias e empresas desse País. E que, havendo uma redução da arrecadação, é aquele terá de ajustar-se aos recursos disponibilizados pelos contribuintes e não o contrário. E muito menos dedicar-se a contrair débitos por empréstimos…
Porém, mais preocupado fico quando, falando de ensino e de Liberdade, o comentário é: «então e o Estado e a escola pública?!? Sem ela teremos um retrocesso civilizacional!!!» Mas compreende-se: tal estranheza é consequência da uniformização forçada produto da escola pública obrigatória e monopolista... e, por isso e naturalmente, é muito difícil ver para lá dos muros dessa construída "prisão intelectual".

Quinto, todavia, porque o futuro não é instantâneo, mesmo com a escola pública, muita coisa há a mudar, nomeadamente, o modelo de gestão, um modo mais interventivo e consequente de participação dos pais e a governança a ser, democrática e efectivamente, assumida pela comunidade local (não estou a falar nas autarquias, mas nas pessoas).

Finalmente, o curioso é que, independentemente das áreas políticas, há sempre quem encontre objecções para defender a estatização, o monopólio,... enfim a desresponsabilização individual, deixando nas mãos de outros (ai, ai, o mito do Estado... como se ele não fosse uma ficção jurídica) as decisões que podem ser nossas. Nalguns casos, pessoas que se julgam de direita, são contra porque assim, com o "cheque-ensino" e a chamada dos pais e da comunidade local à determinação das orientações escolares e de gestão, estaríamos a condenar a escola ao mando dos "comunas"! Como vê... está bem acompanhado na versão consequencial-catastrofista do "cheque-ensino".
São diferenças.
Uns querem que tudo fique como está porque está bem.
Outros acreditam em Portugal e nos portugueses. Em Liberdade!

Este é um assunto muito sério. Bem mais sério do parece e pelo modo como tem sido tratado. Estudei, reflecti e reflicto há muito tempo – e muito! – sobre este assunto (e não apenas quando surgem leads noticiosos altamente tendenciosos e ignaros, ao serviço de uma agenda mediático-política ditada pelas agências de comunicação operantes no "sector canhoto" (e bem "canhestro") do mercado político português. Por isso, sei lá,… se humildemente o solicitássemos, será que seria possível que, com lisura e seriedade intelectual, concedessem o privilégio (já que se percebe que para eles tal não é um direito) de se defenderem os motivos e a bondade do modelo do "cheque-ensino"?!?
Compreende-se assim porque é que a esmagadora maioria dos seus opositores não percebe nem acha importante o ganho em Liberdade...

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