DA PENA À PELÍCULA - AS PERSONAGENS DE CARANDIRU

June 1, 2017 | Autor: Melody Pablos | Categoria: Literature and cinema, Literary Adaptation
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MELODY PABLOS SOUZA

DA PENA À PELÍCULA: AS PERSONAGENS DE CARANDIRU

Universidade Metodista de São Paulo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social São Bernardo do Campo – SP, 2009

MELODY PABLOS SOUZA

DA PENA À PELÍCULA: AS PERSONAGENS DE CARANDIRU Dissertação apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de PósGraduação em Comunicação Social da Universidade Metodista de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre. Orientadora: Profª Drª Sandra Lúcia Amaral de Assis Reimão.

Universidade Metodista de São Paulo Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social São Bernardo do Campo – SP, 2009

Que há num simples nome? O que chamamos rosa, sob uma outra designação teria igual perfume. Assim Romeu, se não tivesse o nome de Romeu, conservara a tão preciosa perfeição que dele é sem esse título. William Shakespeare

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos professores da Metodista, pelos ensinamentos e conselhos, em especial à Sandra Reimão, que me orientou nesta jornada.

Agradeço aos meus pais e ao Maicon, pelo apoio e, principalmente, pela paciência neste período.

LISTA DE TABELAS

§ Tabela 1 – INDÚSTRIAS CRIATIVAS VERSUS INDÚSTRIAS CULTURAIS ......................................................................................................................... 24 § Tabela 2 – TIPOS DE FONTES PARA ADAPTAÇÃO CINEMATOGRÁFICA ......................................................................................................................... 38 §

Tabela 3 – RELAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO ............................................. 54

§ Tabela 4 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR IDADE E SEXO ......................................................................................................................... 97 § Tabela 5 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR SITUAÇÃO ......................................................................................................................... 98 § Tabela 6 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO PELA FORMA COMO ERAM CONHECIDAS PELAS DEMAIS PERSONAGENS ......................................................................................................................... 99 § Tabela 7 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO PELA RAÇA ....................................................................................................................... 100 § Tabela 8 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR DEPENDÊNCIA ÀS DROGAS ................................................................................................ 101 § Tabela 9 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR ENFERMIDADE ....................................................................................................................... 102 § Tabela 10 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR CRIME COMETIDO .............................................................................................. 103 § Tabela 11 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR FUNÇÃO DENTRO DO PRESÍDIO ......................................................................... 104 § Tabela 12 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR RELAÇÃO COM AS PERSONAGENS EM SITUAÇÃO DE CÁRCERE OU COM A CASA DE DETENÇÃO ............................................................................ 104

§

Tabela 13 – RELAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME ......................................... 110

§ Tabela 14 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR IDADE E SEXO ......................................................................................................... 115 § Tabela 15 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR SITUAÇÃO .................................................................................................................... 116 § Tabela 16 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME PELA FORMA COMO ERAM CONHECIDAS PELAS DEMAIS PERSONAGENS .................................................................................................................... 116 § Tabela 17 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME PELA RAÇA .................................................................................................................... 117 § Tabela 18 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR DEPENDÊNCIA ÀS DROGAS ............................................................... 118 § Tabela 19 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR ENFERMIDADE ...................................................................................... 119 § Tabela 20 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR CRIME COMETIDO .............................................................................................. 120 § Tabela 21 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR FUNÇÃO DENTRO DO PRESÍDIO ......................................................................... 121 § Tabela 22 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR RELAÇÃO COM AS PERSONAGENS EM SITUAÇÃO DE CÁRCERE OU A CASA DE DETENÇÃO ....................................................................................... 122 §

Tabela 23 – PERSONAGENS PRINCIPAIS ................................................................ 134

§

Tabela 24 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS ...................................... 176

§ Tabela 25 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELAS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS ............................................................... 181 § Tabela 26 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELAS CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS ................................................. 182 § Tabela 27 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELA HISTÓRIA .................................................................................................................... 183

§ Tabela 28 – ORIGEM DOS NOMES DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS .................................................................................................................... 185 § Tabela 29 – ORIGEM DE SEU PIRES ......................................................................... 187 § Tabela 30 – ORIGEM DE DALVA .............................................................................. 190 § Tabela 31 – ORIGEM DE ROSIRENE ......................................................................... 191 § Tabela 32 – ORIGEM DE DINA .................................................................................. 193 § Tabela 33 – ORIGEM DE CLAUDIOMIRO ............................................................... 194 § Tabela 34 – ORIGEM DE ANTÔNIO CARLOS ......................................................... 195 § Tabela 35 – ORIGEM DE CÉLIA ................................................................................ 196 § Tabela 36 – ORIGEM DE FRANCINEIDE ................................................................. 197 § Tabela 37 – ORIGEM DE CATARINA ....................................................................... 198 § Tabela 38 – ORIGEM DOS NOMES DAS PERSONAGENS SECUNDÁRIAS .................................................................................................................... 199

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

§

Figura 1 - ESTRUTURA DA ECONOMIA INDUSTRIAL .................................. 28

§

Figura 2 - ESTRUTURA DA INDÚSTRIA CRIATIVA ....................................... 28

§

Figura 3 – A ECONOMIA INDUSTRIAL CRIATIVA ......................................... 29

LISTA DE SIGLAS

§ ABC ..................................... Região de Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, no estado de São Paulo § AIDS .................................... Acquired Immunodeficiency Syndrome (em português, Síndrome da Imunodeficiência Adquirida) §

ALE ..................................... Alemanha

§

AUS ..................................... Austrália

§

CBL ..................................... Câmara Brasileira do Livro

§

DCMS ................................. Departme nt for Culture, Media and Sport

§

DM ...................................... Doente Mental

§ DVD .................................... Digital Video Disc (em português, Disco Digital de Vídeo) §

EUA ...................................

§

FRA .................................... França

Estados Unidos da América

§ HIV ..................................... Human Imunodeficiency Virus (em português, Vírus da Imunodeficiência Humana) §

HQ ...................................... História em quadrinhos

§

IBGE ..................................

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

§

ING ....................................

Inglaterra

§

ITA ..................................... Itália

§

JAP ..................................... Japão

§

PIB......................................

Produto Interno Bruto

§

PM .....................................

Policial Militar

§

SEBRAE ............................

Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

§

SNEL .................................

Sindicato Nacional dos Editores de Livros

§ UNESCO............................

Organização das Nações Unidas para a Educação, a C iência e a Cultura

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 15 Acerca deste estudo ........................................................................................... 16 Carandiru pelos olhos da crítica ....................................................................... 18

CAPÍTULO I – A ECONOMIA CRIATIVA ..................................................................... 20 1. Criatividade versus Inovação ........................................................................ 21 2. As Indústrias Criativas .................................................................................. 22 3. As Indústrias Culturais .................................................................................. 23 4. Clusters Criativos .......................................................................................... 25 5. Propriedade Intelectual .................................................................................. 26 6. A Economia da Cultura e da Criatividade ..................................................... 27 7. A Indústria Editorial ...................................................................................... 31 8. A Indústria Cinematográfica ......................................................................... 34

CAPÍTULO II – ADAPTAÇÃO ................................................................................ 37 1. Acerca da Adaptação Fílmica ..................................................................... 37 2. Acerca da Adaptação Literária para o Cinema ............................................ 46 3. Acerca das Personagens .............................................................................. 48 4. Acerca das Obras Analisadas ...................................................................... 49 4.1. Estação Carandiru ............................................................................... 49 4.2. Carandiru ............................................................................................. 50

CAPÍTULO III – O LIVRO ESTAÇÃO CARANDIRU: suas personagens ........... 51 1. Estação Carandiru : O Livro ....................................................................... 51 2. Estação Carandiru : Suas Personagens ....................................................... 53

CAPÍTULO IV – O FILME CARANDIRU: suas personagens ............................. 106 1. Carandiru: O Filme ................................................................................... 106 2. Carandiru: Suas Personagens ................................................................... 109

CAPÍTULO V – AS PERSONAGENS DE CARANDIRU: uma análise .............. 123 1. As Personagens Principais ........................................................................ 123 1.1. As Personagens Principais de Estação Carandiru ........................... 124 1.2. As Personagens Principais de Carandiru ......................................... 124 1.2.1. Deusdete ............................................................................... 125 1.2.2. Zico ...................................................................................... 126 1.2.3. Majestade ............................................................................. 127 1.2.4. Sem Chance .......................................................................... 128 1.2.5. Lady Di ................................................................................. 129 1.2.6. Nego Preto ............................................................................ 130 1.2.7. Seu Chico ............................................................................. 130 1.2.8. Ezequiel ................................................................................ 131 1.2.9. Peixeira ................................................................................. 132 1.2.10. Médico .................................................................................. 133 2. A Origem das Personagens Principais ...................................................... 137 2.1. Deusdete ........................................................................................... 137 2.2. Zico .................................................................................................. 141 2.3. Majestade ......................................................................................... 145 2.4. Sem Chance ...................................................................................... 154 2.5. Lady Di ............................................................................................. 156 2.6. Nego Preto ........................................................................................ 158 2.7. Seu Chico ......................................................................................... 165 2.8. Ezequiel ............................................................................................ 168 2.9. Peixeira ............................................................................................. 170 2.10. Médico .............................................................................................. 172

3. As Personagens Secundárias ..................................................................... 186 3.1. Núcleo Seu Pires .............................................................................. 186 3.2. Núcleo Majestade ............................................................................. 188 3.3. Núcleo Claudiomiro ......................................................................... 192 3.4. Núcleo Deusdete .............................................................................. 196

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 200

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CITADAS ....................................................... 205

RESUMO

Este estudo enfoca a transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella, para o cinema, no que tange à construção de suas personagens. Para tanto, fez-se um levantamento das personagens e de suas características, de ambas as obras. O objetivo maior é compreender as escolhas feitas durante este diálogo entre mídias, que originou o filme Carandiru, de Hector Babenco, visto que houve uma grande redução no número de personagens. Para esta análise, adotou-se a pesquisa descritiva como procedimento metodológico. Constatouse que a maior parte das origens das personagens cinematográficas vem de fusões de personagens literárias. Mas também foram encontradas personagens literárias que foram desmembradas e algumas que foram eliminadas. Não se encontrou nenhuma personagem acrescentada.

Palavras-chave: Adaptação literária, cinema, transposição, personagens, Carandiru.

ABSTRACT

This study focuses the adaptation of the book Estação Carandiru, written by Drauzio Varella, to the movies, concerning the construction of the characters. Therefore, a listing of the characters and their characteristics was made, from both the book and the movie. The main objective is to understand the choices made in this dialog between medias, from where the movie Carandiru, by Hector Babenco, originated, considering that the re was a great reduction in the number of characters. For this analysis, the methodological process adopted was the descriptive research. It was verified that most part of the characters’ origins come from the fusion of literary characters. But it was also found that literary characters were dismembered and some of them were eliminated. No new character was found .

Key-words: literary adaptation, cinema, characters, Carandiru.

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INTRODUÇÃO

As adaptações da literatura para o cinema têm apresentado uma boa quantidade de público, como se pode ver em exemplos como as grandes produções de Harry Potter (que arrecadou cerca de 140 milhões de dólares nos Estados Unidos 1 , com o último filme da série Harry Potter e a Ordem da Fênix e cerca de 23 milhões de reais em 10 dias de exibição no Brasil 2 ), O Senhor dos Anéis (A Sociedade do Anel, arrecadou 47 milhões de dólares em 2001, e O Retorno do Rei, arrecadou 72,6 milhões de dólares em três dias, em 2003 3 .) e As Crônicas de Nárnia (O Leão, a Feiticeira e o Guarda-roupa arrecadou 67 milhões de dólares na estréia nos Estados Unidos 3 .). A transposição de uma obra literária, em muitos casos, atrai enorme público, tanto para as salas de cinema como para as livrarias. Em seu artigo Os Best-sellers de ficção no Brasil – 1990/2000 (2001), Sandra Reimão verifica aspectos positivos com relação à adaptação, demonstrando um aumento na vendagem de livros que foram adaptados para a televisão. A autora pontua um aspecto importante destas adaptações: No incentivo à leitura, quer pelo fato de o autor ser uma personalidade midiática quer pela adaptação da trama de uma obra de ficção, em qualquer um dos dois casos, a televisão estaria ajudando a romper o círculo de desinformação que isola o potencial leitor do universo da literatura. (REIMÃO, 2001, p.14)

Muitos vão buscar referências no livro após assistir aos filmes ou vice- versa: procuram primeiramente o livro para, posteriormente, assistir à película. Um caso que pode servir de exemplo é a obra literária Os Maias, de Eça de Queirós, estudado por Juliana Salum Ferreira Silva, em seu artigo Imagens na literatura: adaptação de Os Maias para a televisão (2007). Ela afirma que “muitos telespectadores só têm acesso a algum conteúdo literário através das versões televisivas e outros compram a obra porque esta foi adaptada” (p. 9). Segundo seu artigo, o livro Os Maias vendeu 12 mil exemplares em 20 dias após sua adaptação para a televisão, além de quase causar esgotamento no estoque de todos os outros livros do autor do catálogo da editora. 1

Dado do New York Times. Disponível em: . Acesso em: 25 de agosto de 2007. 2 Dado do portal O Globo. Disponível em: . Acesso em: 18 de agosto de 2007. 3 Dados do site UOL Cinema. Disponível em: . Acesso em: 14 de janeiro de 2007.

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Como se vê, a adaptação nem sempre é um desserviço para a obra original. Ela pode contribuir para disseminar a obra primária, aumentando, assim, o rol de leitores. Nesse sentido, podemos afirmar também que uma linguagem ao se apoderar de uma outra, como a cinematográfica o faz da literária, acaba provocando um círculo de interesse, já que muitos, após ter contato com uma obra, vão verificar a sua transposição, resultando em ganhos culturais e sociais para todas as linguagens. É um processo simbiótico cultural. A adaptação de uma obra, principalmente da linguagem literária para a cinematográfica ou televisiva, porém, nem sempre tem uma recepção positiva de público e crítica. Neste âmbito, se insere o filme Carandiru, de Hector Babenco, adaptação cinematográfica do livro Estação Carandiru, de Drauzio Varella, o objeto de estudo deste trabalho, que também serve como exemplo destas críticas negativas: O rompimento, de filmes como Carandiru, com o projeto estético cinemanovista é lamentado, criticado e, por vezes, mal interpretado, pela crítica de cinema no Brasil. (GOMES, 2007, p. 12).

No entanto, o processo de transposição de uma obra para outra linguagem é um processo complexo, que passa por formatos diferentes que determinam limitações, que necessitam ser compreendidas para analisar uma obra adaptada.

ACERCA DESTE ESTUDO Fruto deste diálogo entre mídias que é o processo de transposição, as 206 personagens presentes no livro Estação Carandiru transformaram-se em apenas 50 em sua versão cinematográfica. Desta constatação, surge uma questão, que será a pergunta norteadora da investigação neste estudo : Houve eliminações, acréscimos, fusões – seja de traços característicos e/ou de ações – na transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varela, para a obra cinematográfica Carandiru, de Hector Babenco, quanto aos aspectos construtivos das personagens neste diálogo entre mídias? O objetivo principal é compreender a transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella, para a obra cinematográfica Carandiru, de Hector Babenco, quanto aos aspectos construtivos das personagens neste diálogo entre mídias, tendo como objetivo também analisar

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comparativamente as características de construção de determinados personagens existentes tanto no livro como na obra cinematográfica citados. Para responder à questão levantada a partir da reflexão apresentada e visando o objetivo deste estudo, propõe-se uma hipótese de inicial sobre esta questão, que poderá se confirmar, ou não, ao final das análises: Na transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella, para o cinema, houve fusão de personagens literárias, que se deu por suas características, resultando em uma única personagem cinematográfica. Toda pesquisa “é um processo de investigação” e a ciência é descritiva, já que procura entender os fatos através da observação da configuração deles. Ela é “um modo de ordenar os eventos; o que ela busca são leis nas quais basear as previsões isoladas” (VIÁ, 2001, p. 40). Tendo em vista esse objetivo de investigar e observar como ocorre a transposição de uma obra literária para uma cinematográfica, este estudo adotará como metodologia o método de pesquisa qualitativa, que tem como característica não empregar um instrumental estatístico como base do processo de análise do problema. Os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a complexidade de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais, contribuir no processo de mudança de determinado grupo e possibilitar, em maior nível de profundidade, o entendimento das particularidades do comportamento dos indivíduos. (RICHARDSON, 1989, p. 39)

Será realizada uma comparação entre a obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella (Edição de 2005) e sua adaptação para a obra cinematográfica, Carandiru, de Hector Babenco, no que diz respeito às suas personagens. A versão do filme que será analisada é a edição dupla em DVD, lançada em 2003, distribuída em parceria pelas produtoras Globo Filmes, HB Filmes e Columbia Tristar. E a versão do livro é a 2ª edição e 4ª reimpressão, lançada em 2005 pela editora Companhia das Letras. Ao tentar sistematizar as observações, há de se lembrar que é quase impossível descrever tudo que se observa. De acordo com Viá, o principal critério orientador da observação deve ser “a relevância do fato ante a finalidade proposta para a observação” (2001, p.40). Para Rose, na análise, “o que deixar fora é tão importante quanto o que vai se incluir, e irá afetar o restante da análise” (2002, p. 346). O enfoque deste estudo será a análise das personagens cinematográficas adaptadas a partir do livro Estação Carandiru, procurando encontrar similaridades ou disparidades. Para tanto,

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inicialmente será feito um levantamento descritivo das personagens de ambas as obras, com a finalidade de identificar estas personagens e suas características, para, em um segundo momento, confrontar estes dados na análise da construção e/ou fusão das personagens que compõem o filme Carandiru. Sendo assim, a metodologia adotada para este estudo será a pesquisa descritiva. A respeito deste tipo de pesquisa, Gil diz que “tem como objetivo primordial a descrição de determinadas características de determinada população ou fenômeno” (1999, p. 44), ou seja, ela visa observar, registrar, analisar, classificar, interpretar e correlacionar fatos ou fenômenos sem a interferência do pesquisador.

CARANDIRU PELOS OLHOS DA CRÍTICA A partir do trabalho de Regina Gome s, A Crítica de Cinema Como Objeto Histórico e Retórico: o Caso do Filme Carandiru de Hector Babenco (2007), que analisa as críticas acerca do filme Carandiru de Hector Babenco, pôde-se verificar um fator interessante: o filme Carandiru recebeu muitas críticas, na sua maioria negativas, na época de seu lançamento, no entanto, é curioso perceber que as personagens eram apresentadas de forma positiva, quando mencionadas. Como nesta observação de Maria do Rosário Caetano, citada no referido trabalho :

[Carandiru] contém muitos dos ingredientes que costumam mobilizar multidões: personagens densos e críveis, diálogos crus, iguais aos que a gente ouve na rua, olhar terno, cúmplice (mas sem pieguice) sobre os marginalizados. (Caetano, 2003). (GOMES, 2007, p. 10)

Este fato se mostra interessante por ter sido este um filme baseado no livro, Estação Carandiru, de Drauzio Varella, e apresentar menos de 25% das personagens presentes no livro que o inspirou. Isto não foi prejudicial aos olhos da crítica, segundo o trabalho de Gomes. É importante, porém, notar que a apresentação das personagens deu-se de maneira diferente em ambas as obras e este estudo pretende investigar este processo, podendo assim, contribuir para o entendimento do papel da personagem dentro de uma obra, seja ela literária, seja cinematográfica.

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Assim, pretende-se com este trabalho, de certa forma, mostrar características que ajudam a entender outros fenômenos mais amplos de adaptação de linguagem. Richardson (1989) aponta para a importância de se estudar os diversos meios de comunicação, enquanto veículos direcionados a diferentes grupos da população, para que se perceba as diferenças quanto ao estilo e conteúdo da comunicação.

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CAPÍTULO I – A ECONOMIA CRIATIVA

Imagem obtida na web. [As pessoas] estão comprando e vendendo palavras, músicas, quadros; dispositivos, programas de computador, genes; direitos autorais, marcas registradas, patentes, propostas, formatos, fama, rostos, reputação, marcas, cores. Os itens à venda neste mercado barulhento são os direitos de uso (...) da propriedade intelectual.1 John Howkins

O mundo vem enfrentando uma mudança recente no panorama da economia. As atividades artísticas e culturais, previamente não consideradas economicamente significativas, agora, estão sendo consideradas como o futuro da economia global, através dos assets criativos 2 . As idéias, que estão no centro desta nova “Economia da Cultura”, são garantidas pela propriedade intelectual. Esta nova situação econômica faz com que seja necessário repensar a criatividade – o que ela de fato significa e o que ela representa no mundo atual –, portanto, também leva-se a pensar sobre o papel das Indústrias Criativas, das Indústrias Culturais, dos clusters criativos e o que um país pode fazer para aperfeiçoar o pensamento criativo e a habilidade de inovar de seu povo.

1

Tradução da autora. O termo assets criativos usado por Steven Jay Tepper refere-se tanto aos bens e serviços que são o produto principal de uma arte expressiva quanto aos trabalhadores que produzem tais bens e serviços. O termo faz referência ao valor econômico que pode ser medido e calculado destes bens, serviços e trabalhadores criativos. Ver: TEPPER, Steven Jay. Creative Assets and the Changing Economy. Princeton University: Jornals of Arts, Management and Law, 2002. 2

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1. Criatividade versus Inovação

Imagem obtida na web. Acredito que a criatividade é essencial não só nas chamadas indústrias criativas, mas em quase todo lugar – planejamento urbano, transporte urbano, gerenciamento de hotel, e todo tipo de coisas. Isso se trata do reconhecimento do ext raordinário talento individual e de capacitá-lo a desenvolvê-lo de forma corporativa.3 – John Howkins

A primeira coisa para começar a entender como esta “nova economia” funciona é deixar bem claro o que criatividade e inovação significam e a diferença entre elas. Enquanto ambas podem ser vistas como a habilidade de gerar algo novo, elas têm uma diferença significativa no conceito. De acordo com o dicionário Houaiss, criatividade se define como “inventividade, inteligência e talento, natos ou adquiridos, para criar, inventar, inovar, quer no campo artístico, quer no científico, esportivo etc.” (p. 868, 2004). O termo inovação é descrito como “aquilo que é novo, coisa nova, novidade” (p. 1622, 2004). Inovar tem por definição “introduzir novidade, fazer algo como não era feito antes” (p. 1622, 2004). Segundo o economista John Howkins, criatividade é ter novas idéias. Ela é individual e subjetiva, enquanto a inovação é baseada em um grupo e é objetiva. “A criatividade pode virar inovação; a criatividade pode impulsionar a inovação; a criatividade pode resultar em inovação. A inovação nunca causa criatividade”4 (GHELFI, 2005, p. 4) . A inovação está sujeita à aprovação de um grupo, é algo bem mais extenso. “A inovação é um processo social. Tem muito mais a ver com desenvolver uma nova maneira, um novo método, uma nova metodologia de fazer algo para o mercado”5 (GHELFI, 2005, p. 5). Ainda segundo Howkins, as pessoas criativas estão sempre aprendendo. “Quando paramos de aprender, paramos de ser criativos”6 (HOWKINS, 2005, p.3).

3

Tradução da autora. Tradução da autora. 5 Tradução da autora. 6 Tradução da autora. 4

22

2. As Indústrias Criativas

Imagem obtida na web.

As chamadas Indústrias Criativas são, de acordo com o Department for Culture, Med ia and Sport (DCMS), do Reino Unido, aquelas que “caracterizam-se por terem origem na criatividade, competência e talento individuais e o potencial para criarem riqueza e emprego gerando e explorando a propriedade intelectual” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 4). Sua base são indivíduos com habilidades artísticas e criativas, que desenvolvem serviços e produtos comerciais, cujo valor econômico está em suas propriedades intelectuais. Em seu livro The Creative Economy (2001), John Howkins traz uma lista das indústrias que, juntas, formam as Indústrias Criativas. Elas são (GHELFI, 2005, p.6) : 1.

Publicidade

2.

Arquitetura

3.

Artes

4.

Artesanato

5.

Design

6.

Moda

7.

Filmes

8.

Música

9.

Artes Cênicas

10.

Publicações

11.

Pesquisa e Desenvolvimento

12.

Software

13.

Brinquedos e Jogos

14.

TV e Rádio

15.

e Jogos Eletrônicos.

23

Na entrevista de Donna Ghelfi a John Howkins, ela cita trecho do livro de Howkins, no qual o autor define as Indústrias Criativas: As ‘indústrias de direitos autorais’ consistem em todas as indústrias que criam direitos autorais ou trabalhos relacionados como seu produto primário. (...) As ‘indústrias de patente’ consistem em todas as indústrias que produzem ou lidam com patentes (...) As ‘indústrias de marca registrada e design’ são ainda mais abrangentes, e sua vasta extensão e diversidade as tornam menos distintas. Juntas, estas quatro indústrias constituem as ‘indústrias criativas’ e a ‘economia criativa’. Esta definição é controversa. Enquanto todas as definições até agora coincidem com o sistema internacional, não há consenso sobre esta aqui.7

3. As Indústrias Culturais

Imagem obtida na web.

Segundo o Dossier de Economia Criativa (2008), ainda não há uma definição precisa para as Indústrias Criativas. Nele são apresentadas quatro definições que são utilizadas ao se falar de tais indústrias, lembrando que as interpretações variam de acordo com os critérios utilizados. Sendo assim: 1. Segundo a UNESCO, elas correspondem às “actividades que combinam a criação, a produção e a comercialização de conteúdos que são de natureza intangível e cultural” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 6); 2. ou podem ser “um conjunto de actividades económicas também denominadas indústrias de conteúdo (...) que conjugam funções mais ou menos industriais – de concepção, de criação e de produção – com funções industriais de fabrico em grande escala e de comercialização, utilizando suportes físicos ou de comunicação” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 6); 7

Tradução da autora.

24

3. ou ainda “indústrias fundadas na propriedade literária e artística” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 6); 4. e, por fim, em uma interpretação mais restritiva, elas se limitam ao “conceito de indústrias de entretenimento” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 6).

Mas em que aspectos as Indústrias Culturais se diferem das Indústrias Criativas? A tabela a seguir visa responder essa questão. Apresentada no Dossier de Economia Criativa, ela foi elaborada com base nas definições presentes no estudo KEA European Affairs, The Economy of Culture in Europe de 2006.

Tabela 1 – INDÚSTRIAS CRIATIVAS VERSUS INDÚSTRIAS CULTURAIS Indústrias Criativas

Indústrias Culturais

Abordagem

Económica

Económica/Estatística

Definição

Indústrias que têm a sua origem Um

conjunto

de

actividades

na criatividade, competência e económicas que aliam funções de talento individuais e que têm o concepção, de criação e de produção potencial para criarem riqueza e a

funções

mais

industriais

de

emprego gerando e explorando a manufactura e de comercialização propriedade intelectual.

em larga escala, através da utilização de

suportes

materiais

ou

de

tecnologias da comunicação. Critérios

Criatividade como input central Outputs destinados à reprodução em no

processo

Outputs

de

produção. massa; Outputs caracterizados pelos

caracterizados

pela direitos

de

autor

(e

não

pela

propriedade intelectual (e não propriedade intelectual). apenas direitos de autor). Alcance

-

Publicidade,

arquitectura, -

Mercado de artes e antiguidades,

Publicações

revistas,

(livros,

jornais,

música), bem como a

artesanato, design, design de comercialização de livros, gravações

25

moda, cinema e vídeo, software de som e imprensa. de

lazer

interactivo,

música, - Actividades audiovisuais (produção

artes performativas, publicidade, de filmes para televisão, de filmes software

e

serviços

computador, rádio e televisão. -

As

actividades

de institucionais ou publicitários, de filmes teatrais, actividades técnicas

incluem: relacionadas com a televisão e o

criação, produção, distribuição, cinema, distribuição de filmes e de difusão, promoção, actividades videos, de radio e de programas de educativas

relacionadas

actividades relacionadas.

de

e televisão para satélite).

imprensa -

E

actividades

directamente

relacionadas

(agências

de

informação,

multimedia

e

publicidade)

4. Clusters Criativos

Imagem obtida na web.

Em economia, clusters são “concentrações geográficas de empresas de determinado setor de atividade e organizações correlatas, de fornecedores de insumos a instituições de ensino e clientes” (LEÃO FILHO, 2008, p.1). Estas empresas são concorrentes, mas, ao mesmo tempo cooperam entre si. Já os clusters criativos são locais tanto de trabalho quanto de entretenimento. São “espaços onde se criam e consomem bens culturais”. Eles incluem “empresas sem fins lucrativos, instituições culturais, espaços de arte e artistas individuais, mas também parques de ciência e centros de media” (Agência INOVA/CultDigest, 2008, p. 11).

26

5. Propriedade Intelectual

Imagem obtida na web. Os direitos à propriedade intelectual visam proteger as criações inventivas, singulares, perspicazes e criativas da mente humana.8 Donna Ghelfi.

A moeda que vigora nesta economia é a propriedade intelectual, que tem por objetivo proteger e assegurar legalmente os direitos autorais, sem os quais os criadores não receberiam crédito algum – tanto ao que se refere ao retorno financeiro quanto reconhecimento autoral – por suas idéias e/ou produtos. Através da propriedade intelectual, transações comerciais de marcas registradas, métodos de ensino, programas de televisão, músicas, nomes de personagens, etc. são efetuadas da mesma forma que os produtos físicos. Sendo assim, podemos ver uma personagem da Disney, por exemplo, estampada em produtos que a empresa não produz. Para tanto, a empresa distribuidora do produto necessita providenciar um acordo jurídico com a empresa detentora dos direito s sobre a personagem. Este contrato legal tanto pode se tratar de retorno financeiro ou publicitário, caso o interesse da empresa criadora da personagem seja divulgar a marca. A falta de um acordo firmado legalmente entre detentor dos direitos de propriedade da obra intelectual e distribuidor e/ou reprodutor é prevista na lei, podendo ser classificada como plágio – quando consistir na utilização da obra intelectual sem autorização do autor –, contrafação – quando a obra de outro autor for apresentada como própria, seja total ou parcialmente – ou plágio-contrafação – quando alguém publica uma obra como sendo de sua autoria, mas, na verdade, se trata apenas de uma tradução de uma obra alheia. Donna Ghelfi ressalta o aspecto legal da propriedade intelectual: Enquanto a criatividade e a faculdade inventiva por si só são universais, os direitos exclusivos de propriedade sobre as criações intelectuais, que são inspiradas pela criatividade e pela faculdade inventiva das pessoas, se tornam o 8

Tradução da autora.

27

domínio das normas legais e padrões vinculantes com relação à propriedade sobre as criações intelectuais.9 (2005, p. 13)

Para Howkins, é essencial assegurarmos esses direitos aos autores das obras intelectuais. “Quanto mais caminhamos em direção a uma economia baseada em idéias mais se faz necessário garantir que as pessoas que têm essas idéias tenham uma boa vida”10 (GHELFI, 2005, p.6).

6. A Economia da Cultura e da Criatividade

Imagem obtida na web. A ‘economia criativa’ consiste nas transações dos produtos criativos: Cada transação pode ter dois valores complementares: o valor do intangível, da propriedade intelectual e o valor do suporte físico ou plataforma (se houver). Em algumas indústrias, como as do software digital, o valor da propriedade intelectual é maior. Em outras, como a da arte, o valor do objeto físico é maior. 11 – John Howkins

O termo “Economia Criativa” apareceu pela primeira vez na Austrália em 1994 12 . No entanto, a definição mais precisa do termo foi feita no livro The Creative Economy (2001), do economista inglês John Howkins. Segundo o autor, trata-se de uma economia... (…) onde as principais matérias-primas e os produtos finais são as idéias, (...) onde a maioria das pessoas passa a maior parte do seu tempo tendo idéias. É uma economia ou sociedade onde as pessoas se preocupam e pensam sobre sua capacidade de ter idéias; onde elas não têm uma rotina de trabalho repetitiva das 9h às 17h, o que foi o que muitas pessoas fizeram por muitos anos, seja no campo ou na fábrica. É onde as pessoas, em qualquer momento, (...) acham que podem ter uma idéia que realmente funciona, não apenas uma idéia com algum tipo de prazer esotérico, mas uma que seja a condutora de sua carreira, de seus pensamentos sobre status e seus pensamentos sobre identidade.13 (GHELFI, 2005, p. 3)

9

Tradução da autora. Tradução da autora. 11 Tradução da autora. 12 Dado retirado de: BRAGA, Isabel Abreu. Fórum Internacional de Economia Criativa. Disponível em: . Acesso em: 08 de dezembro de 2008. 13 Tradução da autora. 10

28

A Creative Clusters Ltd. 14 apresenta as seguintes estruturas para a Economia Industrial e a Indústria Criativa, mostrando que esta última é bem mais segmentada.

Figura 1 - ESTRUTURA DA ECONOMIA INDUSTRIAL

Figura 2 - ESTRUTURA DA INDÚSTRIA CRIATIVA

Figura s 1 e 2 retiradas de Understanding the Engine of Creativity in a Creative Economy: An Interview with John Howkins (2005), de Donna Ghelfi, onde: Origination = Idéia; Production = Produção; Distribution = Distribuição; Consumption = Consumo e Creative Clusters = Clusters Criativos.

14

Ver: BRAGA, Isabel Abreu. Fórum Internacional de Economia Criativa, 2007. Disponível em: . Acesso em: 08 de dezembro de 2008.

29

Howkins está de acordo com a estrutura apresentada da Indústria Criativa, no entanto, acredita que a “idéia” e a “produção” sejam mais integradas, e a categoria “consumo” apresentaria melhor esta idéia de integração sendo chamada de “usuário”, já que muitas vezes as pessoas classificadas sob a categoria “consumo” são as mesmas sob a categoria “idéia”, ou seja, o consumidor do produto final pode ser também aquele que teve a idéia que originou o produto. Esta estrutura seria mais circular, como ilustrado na figura a seguir.

Figura 3 – A ECONOMIA INDUSTRIAL CRIATIVA

Figura 3 retirada de Understanding the Engine of Creativity in a Creative Economy: An Interview with John Howkins (2005), de Donna Ghelfi, onde: Origination = Idéia; Production = Produção; Distribution = Distribuição; e User / Consumption = Usuário / Consumo.

As indústrias que compõem a Economia Criativa representam cerca de 10% do PIB mundial, com crescimento anual de 7%, movimentando 1,3 trilhão de dólares no mundo e gerando 5% dos empregos 15. No Brasil, este setor representa 4% do Produto Interno Bruto, que totalizou R$ 2,4 trilhões em 2007, segundo dados do IBGE. Neste mesmo ano, a movimentação gerada pela economia criativa foi de aproximadamente R$ 97,5 bilhões. De acordo com o 15

Dados obtidos em: GARSKE, Mara Eliza. Comunicação e o contexto arte, cultura e mercado. Monografia. Santa Cruz do Sul, RS, 2006.

30

SEBRAE, estes números tendem a crescer, uma vez que “as atividades de criação, produção, circulação e consumo de bens culturais no planeta cresce a uma taxa anual de 6,3%, ao passo que o restante da economia registra uma expansão de 5,7%” (SATO, 2008, p. 1). De acordo com pesquisa de Aurilio Caiado da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados, no Brasil, esta área contrata pessoas “mais instruídas, com salários melhores e com maior nível de registro em carteira do que a média geral nacional” (ELIAS, 2007, p.1). De acordo com dados do IBGE, os salários da Economia Criativa são 51% maiores que a média nacional. Em São Paulo, o número de pessoas ligadas a esta área chega a 7,7% da economia local. 40% dos trabalhadores das Indústrias Criativas têm entre 11 e 14 anos de escolaridade; a média nacional é de 29%16. Em 2004, época em que havia 34 milhões de jovens entre 15 e 24 anos no Brasil, 16 milhões de jovens brasileiros estavam fora da escola. Entre aqueles que freqüentaram a escola, 5 milhões não estudaram além da 5ª série. Pelas projeções de população, é esperado que, em 2010, haja cerca de 50 milhões de jovens no Brasil17 . No entanto, apesar do crescimento do setor econômico cultural, os jovens ainda não são grandes consumidores de bens culturais diversificados. Segundo dados da UNESCO de 2004, “62% dos jovens brasileiros entre 15 e 29 anos não estudam, 87% não freqüentam teatro, nem museus, 60% não vão a cinemas e bibliotecas e 59% nunca ou quase nunca foram a estádios e ginásios esportivos” (BASILE, 2004, p. 1). Não obstante, ainda que no Brasil os jovens não sejam grandes consumidores de tais bens culturais, no que se refere a bens tecnológicos – como mídia digital e videogame –, o Brasil se encontra entre os países que mais consomem estes produtos. Segundo pesquisa da consultoria Nielsen realizada em 2008, o Brasil está em oitavo lugar na categoria Consumo de Mídias Digitais. Quanto ao consumo de videogames, ficou em nono; e em música, em primeiro. No ranking geral, o Brasil aparece como o segundo país que mais consome entretenimento, perdendo apenas para as Filipinas 18 . 16

Dados retirados da Agência Sebrae de Notícias. Disponível em: . Acesso em: 06 de dezembro de 2007. 17 BASILE, Juliano. No Brasil, 60% dos jovens nunca vão ao cinema. Jornal Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2004. Disponível em: . Acesso em: 28 de novembro de 2004. 18 Dados disponíveis no portal Infomoney. Disponível em: . Acesso em: 19 de dezembro de 2008.

31

7. A Indústria Editorial

Imagem obtida na web. Em um país como o Brasil – onde apenas um entre cada quatro habitantes está habilitado para a prática da leitura; onde nossas crianças ocupam os últimos lugares nos estudos internacionais sobre compreensão leitora; onde o índice nacional de leitura é de menos de 2 livros lidos por habitante/ano; e onde a maior parte dos milhões de alfabetizados nas últimas décadas tornou-se analfabeta funcional – a leitura precisa e deve ser tratada como uma prioridade nacional . – Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura.

Uma das indústrias que compõem esta economia criativa é a Indústria Editorial, onde estão escritores, editores, produtores gráficos, designers gráficos, bibliotecas, livrarias, gráficas, editoras e vendedores porta-a-porta, todo o processo desde a produção até a distribuição. Um mercado certamente amplo, mas que ainda se mostra frágil e mal organizado no Brasil, como apresentado na pesquisa realizada pelos professores Fábio Sá Earp e George Kornis em 2004. A pesquisa, intitulada A Economia da Cadeia Produtiva do Livro, demonstra não apenas a falta de organização do setor, mas também que a política brasileira de bibliotecas públicas é uma das piores. O levantamento demonstrou que mais de mil cidades no Brasil não têm bibliotecas ou uma coleção pública; isso equivale a 19% das cidades brasileiras. Além da dificuldade de acesso enfrentada por muitos por falta de um acervo público, outro obstáculo é encontrado nas livrarias: o preço médio do livro no Brasil é incompatível com a renda per capita do país. Enquanto aqui o livro é vendido por cerca de 2 dólares em média, no Japão, o preço médio é de 7 dólares. Porém, ao se considerar o valor da renda total per capita, um brasileiro conseguiria comprar 1.500 exemplares por ano, enquanto um japonês compraria 4 mil. Earp e Kornis também revelaram que “o faturamento das editoras brasileiras caiu 48% entre 1995 e 2003 e a quantidade de exemplares vendidos no mercado diminuiu 50%” (VELLOSO, 2004, p. 1). Apenas em 2003, 15% da produção total de livros no Brasil não foram vendidas, o equivalente a 44 milhões de unidades. E o país não é um grande produtor da indústria do livro quando se é considerado o número de habitantes que tem: enquanto o Brasil produz 340

32

milhões de livros, a França produz 410 milhões. Os números não parecem muito distantes, entretanto, ele fica preocupante ao se pensar que a população francesa é três vezes menor que a brasileira. A conclusão a que os autores chegaram é de que “nosso mercado editorial é completamente incompatível com o tamanho e a importância do país” (VELLOSO, 2004, p. 1). Uma alternativa encontrada pelas editoras foi o mercado de bolso, que apresentou um crescimento em 2007 19. Estes livros, que muitas vezes trazem obras famosas, ganharam seu espaço devido ao preço mais acessível e por se encontrarem em pontos de vendas alternativos, como estações de metrô e rodoviárias, através das máquinas de livro, que são similares àquelas que vendem refrigerantes, salgadinhos e chocolates 20 . Outra área dentro desta indústria que tem apresentado crescimento é o mercado porta-aporta. Enquanto todas as editoras do país somam juntas 22 mil funcionários, no mercado porta-aporta há 30 mil vendedores, apontaram Earp e Kornis em sua pesquisa. Neste mercado, ganham destaque os livros religiosos e os infantis. O setor apresentou um crescimento impressionante em 2007, que chegou a 91,3%. “Quase 20 milhões de exemplares foram vendidos pelos vendedores porta a porta, o que faz do segmento, o terceiro canal de vendas mais importante para as editoras, ficando atrás apenas das livrarias e dos próprios distribuidores” (TEIXEIRA, 2008, p.1). Os números para o mercado editorial como um todo foram positivos em 2007 como aponta outra pesquisa encomendada pelo SNEL e pela CBL: houve um crescimento nominal de 4,62% e um faturamento de 3,013 bilhões de reais. O volume de vendas também aumentou, sendo de 6,06% a mais que em 2006. Além da mudança no perfil do consumidor, que teve uma melhoria considerável de renda nos últimos anos, os livros infantis e religiosos tiveram maior destaque em 2007, sobretudo no mercado porta-a-porta: o gênero religioso apresentou um aumento de 27% no número de títulos editados, enquanto o infantil teve 15,1% de aumento em relação a 2006. Houve um aumento de consumo de livros pela população em geral: o mercado editorial comprou 6,41% a mais em 2007. Ainda que o maior comprador do mercado, o governo federal, tenha comprado menos. A pesquisa mostra que houve uma queda na compra efetuada pelo órgão

19

Ver: STRECKER, Marcos. Mercado de livro de bolso avança no país. Folha de São Paulo. Disponível em: . Acesso em: 02 de outubro de 2007. 20 Ver: PEGNTV. Máquinas de vender livros. Pequenas Empresas Grandes Negócios TV, 2008. Disponível em: . Acesso em: 13 de fevereiro de 2008.

33

em 2007: 0,67% a menos que no ano anterior 21 . Segundo a pesquisa de Earp e Kornis, o governo brasileiro compra cerca de 176 milhões de livros para estudantes enquanto o governo dos Estados Unidos compra 677 milhões, cerca de 284% a mais que o nosso governo. No entanto, a população americana (305.826.244 de habitantes) é apenas de aproximadamente 59,5% maior que a brasileira (191.790.900). O governo americano também compra 113 milhões para bibliotecas; o brasileiro, quase nada. O reflexo disso pode ser visto na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (2007), do Instituto Pró-Livro, que aponta que 77 milhões de brasileiros não lêem livros, já que o país carece de uma cultura de incentivo à leitura. “Podemos afirmar (…) que o Brasil só teve, até hoje, políticas para o livro, jamais para a leitura. Isso explica por que nossa indústria do livro é tão sofisticada, nosso mercado editorial tão pujante, e nosso povo tão pouco letrado” (PRADO, s/d, s/d). Engana-se quem acredita que este é um problema exclusivo daqueles de baixa escolaridade, já que 8% dos entrevistados com nível superior também não são leitores. A pesquisa também mostrou dados interessantes sobre o perfil do leitor brasileiro: quem lê mais são as mulheres e as fases em que mais se lê livros são a infância e a adolescência. “66% dos livros estão nas mãos de 20% da população; 8% dos brasileiros não têm nenhum livro em casa; e 4% apenas um” (TELLES, 2008, p.1). Segundo o levantamento, 95 milhões de brasileiros leram apenas 1 livro nos três meses anteriores à pesquisa, mas destes, apenas 71,7 milhões lêem por prazer. Um dado interessante relevado pelo estudo é de que nem todos estes brasileiros que se declararam leitores realmente lêem livros completos; a maioria (55%) lê apenas trechos ou capítulos. Há ainda os 11% que pulam páginas. Mesmo com estes dados pouco positivos para a indústria do livro, a obra literária é preferida por 50% dos leitores, perdendo apenas das revistas (52%). Jornais aparecem com 48% e leituras na Internet, 20%. A leitura está entre os hobbies de 35% dos brasileiros; entre aqueles com formação superior, 79% a têm como seu passatempo preferido; já entre os com renda superior a 10 salários mínimos, é a preferida por 78%. Embora os maiores compradores de livros estejam na classe C (47%) 22 .

21

Dados retirados do Fórum Nacional Pela Democratização da Comunicação. Disponível em: . Acesso em: 14 de outubro de 2008. 22 Dados retirados do portal AdNews. Disponível em: . Acesso em: 16 de dezembro de 2008.

34

8. A Indústria Cinematográfica

Imagem obtida na web. O cinema brasileiro encontra-se hoje diante da situação paradoxal de ter ultrapassado um século de existência sem que tenha conquistado, efetivamente, uma dimensão pública, uma presença social institucionalizada. – Ronaldo Rosas Reis

Embora os números sejam um pouco divergentes, uma coisa é certa: o mercado cinematográfico apresentou uma queda no número de espectadores em 2006. Ano em que também diminuiu o número de salas de cinemas no Brasil 23. Há cerca de 16,8 milhões de freqüentadores de cinema no país, além de 3 milhões de espectadores em potencial, ou seja, que possuem condições financeiras, tempo e acesso às salas, mas que não têm o hábito de freqüentá-las. Verifica-se aqui o mesmo problema enfrentado pela indústria editorial brasileira: não se existe o hábito nem a cultura de consumir tais bens culturais. Tanto não possuem o hábito que, segundo pesquisa da Datafolha, a maioria (44% dos espectadores) prefere assistir aos filmes em DVD24 . Uma coisa, de fato, há de se notar: um país com mais de 191 milhões de habitantes ter apenas cerca de 2 mil salas de exibições é, no mínimo, incompatível. Além disso, as salas de cinema estão cada vez mais se concentrando nos shoppings, o que faz com que o preço médio do ingresso aumente, dificultando o acesso de pessoas de localizações e classes variadas. Se no Brasil não há incentivo à leitura, tampouco há ao consumo de obras cinematográficas, que chegam ao público principalmente através da televisão aberta, já que não existem cinematecas em número suficiente para atender a toda população brasileira. Ainda que a

23

Dados retirados da Folha Online. Disponível em: . Acesso em: 17 de janeiro de 2007. 24 Dados retirados da Folha Online. Disponível em: . Acesso em: 29 de agosto d e 2008.

35

Cinemateca Brasileira, hoje mantida pelo governo federal, possua o maior acervo da América Latina, ele está concentrado apenas na cidade de São Paulo. Frederico Barbosa revela em seu estudo (publicado em dois volumes: Economia e Política Cultural e Política Cultural no Brasil, de 2007) que 60% dos brasileiros nunca foram ao cinema e 70% nunca foram ao museu. A falta de oferta de bens culturais e equipamentos foi apresentada como um dos principais motivos, fazendo com que o consumo do produto cinematográfico seja preferencialmente feito em casa – atravé s de DVD, da televisão, etc. Em uma pesquisa realizada pelo instituto Datafolha, encomendada pelo Sindicato dos Distribuidores do Rio de Janeiro, delineou-se o perfil dos espectadores brasileiros. Para o estudo, foi feita uma distinção entre eles, dividindo-os em três categorias: 1) habitual - que vai pelo menos uma vez a cada 15 dias; 2) médio – que vai pelo menos uma vez a cada 3 meses; e 3) eventual – que vai pelo menos uma vez por ano. Entre os espectadores médios e eventuais há a preferência por assist ir aos filmes em cópias dubladas: 57% e 69%, respectivamente. Já entre os habituais, há um empate técnico: 46% preferem filmes dublados e 47%, legendados25 . A preferência por cópias dubladas não indica que os espectadores brasileiros prefiram os filmes nacionais, que, obviamente, não necessitam de dublagem. Os filmes brasileiros representam apenas 6,9% do acumulado no ano 26 . Segundo o instituto Datafolha, o principal motivo para os espectadores não gostarem das produções nacionais é o tema dos filmes, citado por 80% do entrevistados. A 32% dos espectadores desagradam o excesso de pornografia e o linguajar, que consideram chulo e vulgar; e 20% consideram os roteiros e temas ruins e sem conteúdo. Ainda assim, as famílias brasileiras gastam, em média, 4% da renda com cultura. “A cultura é algo muito presente e está entre as necessidades fundamentais”, aponta o secretário de Políticas C ulturais do Ministério, Alfredo Manevy, em entrevista à Folha Online (2007, p.1). Os audiovisuais são os que mais consomem as finanças da família investidas no entretenimento: 41,2%, enquanto apenas 1,65% vai para a compra de livros.

25

Dados retirados da Folha Online. Disponível em: . Acesso em: 29 de agosto de 2008. 26 Dados retirados da Folha Online. Disponível em: . Acesso em: 29 de agosto de 2008.

36

E o mercado cinematográfico está com boas expectativas, pelo menos, no que diz respeito à sua parceria com o mercado publicitário: “o meio participa com 0,6% do bolo publicitário no Brasil” (DO RES, 2008, p. 1). Em 2007, o faturamento total com publicidade foi de 75 milhões de reais e a expectativa para o fim de 2008 era de crescimento em torno de 15% e 18% por cento.

No próximo capítulo, será visto como estas duas indústrias – a editorial e a cinematográfica – podem se fundir para trazer ao consumidor um novo produto cultural: os filmes adaptados.

37

CAPÍTULO II - ADAPTAÇÃO

1. ACERCA DA ADAPTAÇÃO FÍLMICA Uma obra cinematográfica é resultado de diversas fontes. Algumas vezes, pode ser um roteiro original, em outras, entretanto, é fruto de roteiro adaptado, ou seja, que não foi escrito a partir de idéias do próprio roteirista, mas sim baseado ou inspirado em outras obras. No entanto, como aponta o texto Cinema brasileiro e adaptação de literatura ficcional de autores nacionais – algumas observações, de Antonio de Andrade, Sandra Reimão e Fábio Câmara de Carvalho, publicado no livro Fusões: cinema, televisão, livro e jornal (2007), de Sandra Reimão e Antonio Andrade (orgs.), “a rigor, existem vários graus de adaptação de uma obra literária para um meio audiovisual. As mais comuns são: a adaptação propriamente dita; o ‘basear-se em’ e o ‘inspirarse em’; e o vago ‘a partir de’” (2007, p. 118). As autoras Maria Cristina Brandão de Faria e Danubia de Andrade Fernandes também discorrem sobre esta característica das obras adaptadas: As adaptações passaram a admitir diferentes graus numa escala que vai da adaptação mais “fiel à obra”, (quando é clara a reprodução de um original transubistanciado) a “adaptação livre” (quando o roteirista dá mais ênfase a um aspecto dramático da obra, criando uma nova estrutura para todo o conjunto) e as que se declaram “baseadas em” (a obra original funciona como ponto de partida material para a construção de uma história que terá nova estrutura); ou ainda, a “recriação” na qual se tomam algumas liberdades com relação ao texto de partida cujas exigências identificatórias com a obra original são totalmente relaxadas. (BRANDÃO; ANDRADE, 2008, p. 3)

Além destes graus de adaptação, outro aspecto pode variar neste processo: a fonte utilizada como base ou inspiração para a obra adaptada. Em geral, vêem-se mais obras cinematográficas que se baseiam em uma fonte literária, no entanto, há muitas outras possibilidades, ainda que pouco utilizadas. Mesmo as fontes literárias variam, como romances e poesias, por exemplo. A tabela a seguir apresenta uma listagem de diferentes tipos de fontes possíveis de servir como base ou inspiração para obras cinematográficas. A tabela também cita um exemplo de filme para cada caso.

38

TABELA 2 – TIPOS DE FONTES PARA ADAPTAÇÃO CINEMATOGRÁFICA

OBRA FONTE PARA ADAPTAÇÃO Classificação

Tipo

Fonte

(Origem ou

(Gênero ou

(Autor da obra

suporte)

categoria)

original)

OBRA CINEMATOGRÁFICA ADAPTADA

Obra fílmica

sinopse

Três esquilos falantes, Alvin, Simon e Alvin e os esquilos (Alvin and the Audiovisual

Theodore conhecem por acaso Dave Seville, um compositor que tenta vencer na carreira. Mas Dave só resolve deixá- los

Desenho

Ross

chipmunks,

ficar em sua casa quando descobre que eles

Animado

Bagdasarian

2007, EUA),

sabem cantar. Eles logo se tornam uma

Direção: Tim

sensação como cantores, porém, as coisas

Hill – 92 min Comédia

se complicam quando os esquilos se deslumbram com o estrelato e se rebelam contra Dave. Apenas 24 horas após deixar a penitenciária de Nova Jersey, Danny Ocean já está pondo

Audiovisual

Filme

Onze homens

em prática seu mais novo plano: assaltar

e um segredo

três cassinos de Las Vegas em apenas uma

(Ocean’s

noite, em meio à realização de uma luta que

Lewis

eleven, 2001,

Milestone

EUA), Direção: Steven

vale o título mundial dos peso-pesados. Para tanto , Ocean reúne uma equipe de 11 especialistas a fim de ajudá-lo em seu

Soderbergh –

plano, seguindo sempre três regras básicas:

117 min - Ação

não ferir ninguém, não roubar alguém que realmente não mereça e seguir o plano como se não tivesse nada a perder.

39

Arquivo X - O

Dois agentes do FBI vão até Dallas, Texas

filme

para tentar evitar a explosão de um prédio

(The X-Files Fight the Future, 98, Audiovisual

Seriado

Chris Carter

EUA) – Direção: Rob

federal em um atentado terrorista, onde descobrem que a explosão no qual supostamente morreram três bombeiros e uma criança foi causada pelo próprio governo, para tentar abafar o caso de um

Bowman –

vírus alienígena, que esteve adormecido por

121min –

milhares de anos e agora volta à superfície.

Ficção

Apenas um médico sabe a verdade, mas é

Científica

perseguido por agentes do governo.

Doom – A

Algo estranho aconteceu em uma estação

porta do

espacial localizada em Marte. A tripulação

inferno (Doom, local entrou em estado de quarentena cinco, 2005, EUA /

Audiovisual

Vídeo-game

id Software

antes da comunicação com a Terra ser

República

bruscamente interrompida. Para investigar

Tcheca),

o caso é enviada uma equipe especialmente

Direção:

treinada para resolver problemas

Andrzej

inesperados, que exijam que seus

Bartkowiak –

integrantes entrem em ação o mais rápido

100 minutos –

possível. Só que desta vez eles não tem a

Ficção científica

menor idéia de qual é o inimigo que precisam enfrentar.

40

Aconteceu na Primavera Fiorile, 93, Cultura

Lenda

-

Popular Oral

ITA/FRA/ALE, Direção: Paolo Taviani/Vittori o Taviani – 122 min - Drama

Em viagem à casa de campo da família, onde vive sozinho o idoso patriarca, homem conta à esposa e ao casal de filhos sobre a maldição que persegue o clã há mais de cem anos. É uma saga que avança no tempo e discute a ambição, a traição, o amor e os laços familiares. A dimensão trágica prende a atenção ao misturar romantismo com fantasmas do passado.

O Amante (The Lover/L’Amant, História Real

Marguerite

92, FRA),

Duras

Direção Jean-

Autobiografia

Jacques Annaud – 111

Em Saigon, na década de 30, adolescente branca de origem francesa inicia-se sexualmente pelas mãos de milionário chinês. Delicada mas tediosa adaptação, onde a elevada temperatura das cenas eróticas não basta para recriar a magia de que fala a narração em off.

min - Drama Agonia e

Durante a II Guerra Mundial, sargento

Glória

durão americano comanda pelotão de

(The Big Red História Real

Experiências

-

One, 80, EUA), Direção:

infantaria em diversas missões na Europa. Não há propriamente uma história, mas diversos episódios alinhavados com

Samuel Fuller – perfeição. O elenco é bom, mas o roteiro 113 min – Guerra

não escapa da dicotomia dentre maus e bons.

41

Nos Estados Unidos, donos e funcionários Acusação (The McMartin Trail, 95, História Real

Fato Real

-

EUA), Direção: Mick Jackson – 127 min – Drama

de escola de educação infantil são acusados de abusarem sexualmente de crianças. Advogado especializado em “causas perdidas” tenta provar que eles são inocentes. O filme procura mostrar como uma avaliação errada feita pela imprensa pode desencadear terríveis conseqüências. A certa altura, a fita dá a entender que o caso foi “fabricado” por um repórter de TV.

Adeus,

História Real

Memórias

Louis Malle

Em 44, durante a ocupação nazista na

Meninos

França, num colégio católico para crianças

(Au Revoir les

ricas, os meninos vivem o drama cotidiano

Enfants, 87,

do racismo, da delação e da opressão. É um

FRA/ALE),

bom filme sobre a II Guerra Mundial e um

Direção: Louis

belo relato sobre a amizade e o ódio entre

Malle – 103

as pessoas. Ganhador do Leão de Ouro no

min - Drama

Festival de Veneza. Domenic Toretto é o líder de uma gangue

Velozes e Revista Vibe, Jornalístico

Reportagem

Furiosos (The fast and the furious, EUA,

reportagem escrita por Ken Li

de corridas de ruas em Los Angeles que está sendo investigado pela polícia por roubo de equipamentos eletrônicos. Para investigá- lo, Brian Spindler é enviado e se infiltra na gangue com a intenção de

2001), Direção: Rob Cohen – 107 min – Aventura

descobrir se Toretto é realmente o autor dos crimes e se há alguém mais por trás deles. Filme baseado em reportagem de Ken Li para a revista Vibe sobre gangues que fazem “rachas” pelas ruas de Los Angeles.

42

Acidente

No futuro, uma espaçonave entra em pane;

Espacial (Trapped in Space, 94, Literária

Arthur C.

EUA) –

Clarke

Direção: Arthur

Conto

Allan Seidelman – 89 min – Ficção

como conseqüência, apenas três dos cinco tripulantes têm ar suficiente para chegar ao fim da viagem. Com inteligentes efeitos especiais, pouca ação, ritmo tenso e angustiante, o filme está mais preocupado em discutir o comportamento ético do ser humano do que em mostrar a parafernália tecnológica do futuro.

Científica A Salvo (Safe, 95, EUA) – Literária

Fábula

Haynes

Direção: Todd Haynes – 121 min - Drama

Rica dona -de-casa começa a ter surtos asmáticos e descobre tratar-se de estranha alergia aos produtos industrializados do século XX. O diretor desenvolve sua interessante idéia de forma lenta e contemplativa, o que pode desagradar espectadores. No Japão do futuro, integrante de gangue de motoqueiros se envolve com garoto mutante e, aprisionado pelo governo, é

Akira (idem, 88, JAP), Direção História em Literária

Quadrinhos

submetido a radicais experiência s científicas que lhe causam mutação de conseqüências desastrosas. Tecnologia de última geração em computação gráfica

Akira

Katsuhiro Otomo – 124 min – Desenho Animado

assegura um resultado surpreendente e criativo. Ação intermitente, com doses cavalares de violência (sangue e morte são mostrados em câmera lenta), e brilhante trilha sonora. Desenho de extremo impacto visual, baseado na série homônima de histórias em quadrinhos.

43

A Amante do Rei (The King’s

Literária

Na Turim do século XVIII, princesa casada desperta paixão no monarca local. A

Whore/La

história é forte e envolvente, ideal para

Jacques

Putain du Roi,

fisgar corações românticos. Sedução,

Tournier

90,

Novela

volúpia e hipocrisia são os temas desta bela

FRA/ITA/ING)

produção. A versão original francesa tem

, Direção: Axel

130 minutos e desenvolve melhor suas

Corti – 93 min

entrelinhas.

- Romance Em 1º de janeiro de 1500, um novo mundo Caramuru – A

é descoberto pelos europeus, graças a grandes avanços técnicos na arte náutica e

invenção do Brasil Frei José de Literária

Poema / Canto

Santa Rita

(Idem, 2001, Brasil),

Durão Direção: Guel Arraes – 88 min - Comédia

na elaboração de mapas. É neste contexto que vive em Portugal o jovem pintor Diogo, que acaba sendo punido com a deportação na caravela comandada por Vasco de Athayde, que naufraga. Ele, por milagre, consegue chegar ao litoral brasileiro. Lá, conhece a bela índia Paraguaçu com quem inicia um romance.

Absolute Beginners (idem, 86, Literária

Romance

Colin MacInnes

ING) – Direção: Julien Temple – 107 min - Musical

Fotógrafo principiante apaixona-se por modelo que, ao fazer sucesso, abandona -o por costureiro. Com inventividade, aborda conflitos raciais e dá um sugestivo panorama da música pop na Londres do final dos anos 50.

44

Márcia é uma típica garota de Ipanema. Garota de

Musical

Música

Depois de Pedro Paulo, tem um flerte com

Antônio

Ipanema

Carlos

(Idem, Brasil,

aventura com um fotógrafo casado, sempre

Jobim e

1967), Direção:

amparada pelo amigo Zeca. Incerta quanto

Vinícius de

Leon Hirszman

a seu futuro, angustiada em sua busca pela

Moraes

– 90 min –

felicidade, ela representa uma maneira de

Musical

ser da classe média. Vive só, em busca de

o compositor Chico Buarque e uma

solução para os seus problemas. A história se passa em 1899 e gira em torno Moulin Rouge

Musical

Musical da

Jonathan

Broadway

Larson

de um jovem poeta, Christian, que desafia a

- Amor em

autoridade de seu pai ao se mudar para

Vermelho

Montmartre, Paris - um lugar amoral,

(Moulin Rouge,

boêmio e onde todos são viciados em

2001,

absinto. Lá, ele é recolhido por ninguém

EUA/AUS),

menos do que Toulouse- Lautrec e seus

Direção: Baz

amigos, cujas vidas são centradas em

Luhrmann –

Moulin Rouge, um mundo miserável mas

127 min -

cheio de glamour. Christian se apaixona

Musical

pela maior estrela de Moulin Rouge, Satin. Recebeu o Oscar® de melhor direção de arte e melhor figurino.

Roteiro

Roteiro

Além da

Mulher que sofre de esquizofrenia

escuridão

paranóica tenta a recuperação com a ajuda

(Out of

da família e o uso de novos medicamentos.

Barbara

Darkness, 93,

Drama para TV sobre doentes mentais. O

Turner

EUA), Direção:

filme é sóbrio e discreto. Mostra de forma

Larry Elikann –

humana as dificuldades de uma família para

92 min – Drama

enfrentar o problema e a degeneração progressiva de uma paciente.

45

Agnes de Deus (Agnes of God, Teatral

Peça Teatral

John Pielmeyer

85, EUA), Direção: Norman Jewison – 98

Psicanalista tenta esclarecer o estranho caso de uma noviça que engravida num convento. As interpretações marcantes das atrizes principais e a crescente tensão mantêm o interesse do filme, mas não consegue esconder sua origem teatral.

min - Drama * As sinopses dos filmes tomam como fonte o Guia de vídeo 1997 da Editora Abril e o sítio eletrônico www.imdb.com.

Como se pode perceber, há uma enormidade de fontes que podem servir como base para a transposição de idéias para uma obra cinematográfica. Essas transposições só enriquecem a fonte original, por permitir uma outra forma de leitura da obra original. No entanto, há um outro ponto importante abordado por Brandão e Andrade que geralmente causa muita discussão com relação a estas obras adaptadas: a questão da fidelidade. Esta questão também foi abordada por Francis Henrik Aubert, no livro As (In)Fidelidades da Tradução: servidões e autonomia do tradutor. Para ele, o tradutor – ou adaptador – teria uma relação instável com a fidelidade:

A fidelidade na tradução caracteriza-se, pois, pela conjuminação de um certo grau de diversidade com um certo grau de identidade; ela será, não por deficiência intrínseca ou fortuita, mas por definição, por essencialidade, um compromisso (instável) entre essas duas tendências aparentemente antagônicas, atingindo a sua plenitude nesse compromisso e nessa instabilidade (AUBERT, 1994, p.77).

Qualquer processo de tradução, seja entre línguas, seja entre linguagens, tende a ter sua fidelidade posta à prova devido a esta instabilidade. Todo processo de adaptação entre linguagens não deixa de ser uma forma de tradução. No caso da adaptação literária para o cinema, trata-se de transpor signos verbais para sistemas de signos não-verbais, uma forma de tradução intersemiótica (classificação de Jakobson). No entanto, ao tentar enquadrar uma obra em uma única idéia julgada “fiel”, estar-se-ia negando as diversas interpretações que esta possa permitir, como defendem as autoras:

[…] fiscalizar e regular esteticamente a adaptação para o cinema ou televisão, em termos de estrita fidelidade ao texto literário, apaga, teoricamente, a conceptualização deste como entidade geradora de uma

46

infinidade de possibilidades significativas procedentes da flexibilidade e criatividade da linguagem literária nos seus usos metafóricos e topológicos. (BRANDÃO; ANDRADE, 2008, p. 3)

A fonte literária parece ser a mais freqüentemente utilizada para adaptações cinematográficas e foi também a usada pelo objeto de estudo deste trabalho. Portanto, visando sua melhor compreensão, enfocar-se-á, mais à frente, as adaptações literárias para o cinema. Entretanto, antes, deve-se ressaltar que não é intenção deste trabalho discutir o grau de adaptação nem de fidelidade da obra adaptada Carandiru, mas procurar verificar o processo de escolhas ao se adaptar suas personagens.

2. ACERCA DA ADAPTAÇÃO LITERÁRIA PARA O CINEMA Assim como a literatura, a linguagem do cinema desenvolveu-se “para tornar o cinema apto a contar estórias; outras opções teriam sido possíveis, […] mas foi a linguagem da ficção que predominou” (BERNARDET, 1981, p. 33). E este enlace entre literatura e cinema pode ser expresso através das tantas adaptações literárias para obras cinematográficas. O curta- metragem Os Guaranis (1908) teria sido o primeiro filme brasileiro a ser baseado em um romance de um autor brasileiro, embora não se tratasse de uma adaptação propriamente dita, mas de uma filmagem de uma pantomima circense que, por sua vez, foi baseada na obra de José de Alencar. No ano seguinte, foi produzido A Cabana do Pai Tomás, película brasileira adaptada de um autor estrangeiro, mas foi apenas em 1914, que a primeira adaptação cinematográfica de autor brasileiro teria sido produzida: A Viuvinha, baseada em romance de José de Alencar (filme que logo em seguida foi destruído pelo produtor). No entanto, esta ligação do cinema com a literatura já podia ser vista no século anterior, em outros países, como no curta Rei João, uma adaptação do inglês William-Kennedy Laurie Dickson da obra de William Shakespeare, datada de 18991 . No livro Manual do Roteiro (1995), que apresenta orientações práticas e consistentes para o desenvolvimento de roteiros, Syd Field discute esta questão de adaptação para o cinema. Segundo o autor, este processo seria o mesmo ao de escrever um roteiro original. 1

Dado do portal UOL. Disponível em: . Acesso em: 05 de abril de 2007.

47

Adaptar um livro para um roteiro significa mudar um (o livro) para o outro (o roteiro), e não superpor um ao outro. Não um romance filmado ou uma peça de teatro filmada. São duas formas diferentes. Uma maçã e uma laranja. Quando você adapta um romance, peça de teatro, artigo ou mesmo uma canção para roteiro, você está trocando uma forma pela outra. Está escrevendo um roteiro baseado em outro material. (FIELD, 1995, p. 174).

Brandão e Andrade sustentam que esta nova obra, adaptada para outro meio, também deve ser vista como algo diferente de sua origem: “ela será totalmente outra coisa, e como tal deve ser analisada, vista independentemente de sua origem” (2008, p. 15-16). Alexandre Henrique, no texto A série Contos da Meia-Noite: textos literários transmutados para a televisão, presente no livro Fusões: cinema, televisão, livro e jornal (2007), em uma análise desta série televisiva que foi constituída da adaptação de vários contos de autores brasileiros, conclui que este tipo de transposição pode alterar a percepção dos conceitos de suporte e mensagem:

A autoria artística, ou seja, o modo peculiar de se produzir um significado, move-se do foco de atenção do suporte da mensagem para o conteúdo expresso nela. (HENRIQUE, 2007, p. 82)

Sendo assim, em uma adaptação, embora haja mudanças – seja por retiradas, seja por acréscimos –, pode-se verificar a manutenção da essência da obra original. No caso aqui estudado, pode-se verificar que a obra cinematográfica Carandiru manteve o conteúdo da mensagem da obra que lhe serviu de base, o livro Estação Carandiru, ainda que apresente mudanças na composição desta, como no interesse de estudo deste trabalho: a transcriação de suas personagens adaptadas. Outra conclusão do autor importante para a análise de transposições literárias para meios audiovisuais é com relação ao tempo: segundo ele, “o tempo é um fator determinante na produção televisiva” (2007, p.83). Também o é na produção cinematográfica, talvez com um pouco mais de mobilidade já que não precisa se encaixar em uma grade de programação, ainda que esteja subjugado às normas de metragens 2. Esta condição a que a obra está sujeita pode

2

Segundo a ANCINE (Agência Nacional do Cinema), as normas para classificação de obras cinematográficas são as seguintes: 1. Curta metragem: duração igual ou inferior a 15 minutos; 2. Média metragem: duração superior a 15 minutos ou inferior a 70 minutos; 3. Longa metragem: duração superior a 70 minutos. Dados disponíveis em: . Acesso em: 17 de setembro de 2007.

48

determinar um caminho na adaptação que pode levar à redução de parte da história e/ou das personagens.

3. ACERCA DAS PERSONAGENS A personagem, descrita como um ser fictício construído à semelhança do homem por Massaud Moisés (1974), é um elemento importante em uma obra. Segundo o autor Antônio Cândido, ela estaria intrinsecamente interligada com o enredo, pois “o enredo existe através das personagens; as personagens vivem o enredo. Enredo e personagem exprimem, ligados, os intuitos do romance, a visão da vida que decorre dele, os significados e os valores que o animam”. A personagem serviria para cativar o leitor, buscando uma relação afetiva e intelectual. Porém, pode-se notar uma variação na construção destas personagens, que podem ser baseadas em uma ou várias pessoas reais, em outras personagens, etc. Os estudos de Cândido (1968) nos apontam sete tipos de personagens no que se refere à classificação destas: 1) Personagens transpostas com relativa fidelidade de modelos dados ao romancista por experiência direta – seja interior, seja exterior; 2) Personagens transpostas de modelos anteriores, que o escritor reconstitui indiretamente, - por documentação ou testemunho, sobre os quais a imaginação trabalha; 3) Personagens construídas a partir de um modelo real, conhecido pelo escritor, que serve de eixo, ou ponto de partida; 4) Personagens construídas em torno de um modelo, direta ou indiretamente conhecido, mas que apenas é um pretexto básico, um estimulante para o trabalho de caracterização, que explora ao máximo as suas virtualidades por meio da fantasia, quando não as inventa de maneira que os traços da personagem resultante não poderiam, logicamente, convir ao modelo; 5) Personagens construídas em torno de um modelo real dominante, que serve de eixo, ao qual vêm juntar-se outros modelos secundários, tudo refeito e construído pela imaginação;

49

6) Personagens elaboradas com fragmentos de vários modelos vivos, sem predominância sensível de uns sobre outros, resultando uma personalidade nova; 7) Personagens cujas raízes desaparecem de tal modo na personalidade fictícia resultante, que, ou não têm qualquer modelo consciente, ou os elementos eventualmente tomados à realidade não podem ser traçados pelo autor.

Portanto, apesar desta vasta gama de possibilidades de construção de personagens, podese notar que em todos os casos houve um trabalho de criação, uma vez que não se pode reproduzir a realidade em sua totalidade. Sendo assim, “a natureza da personagem depende em parte da concepção que preside o romance e das intenções do roma ncista” (CÂNDIDO, 1968, p.74).

4. ACERCA DAS OBRAS ANALISADAS 4.1 Estação Carandiru A obra Estação Carandiru, de Drauzio Varella, foi classificada como “livro-reportagem”, portanto, retomando as fontes usadas para adaptação cinematográfica, trata-se de uma fonte literária. O foco deste trabalho recairá sobre suas personagens, que, neste caso, se encaixam literalmente na descrição de Massaud Moisés por serem personagens baseadas em pessoas reais, as quais estiveram em contato direto com o autor-narrador. Elas servirão como base para a análise das personagens cinematográficas, pois foram a fonte da adaptação destas. Para tanto , serão classificadas e mais detalhadas no capítulo III.

50

4.2 Carandiru A obra cinematográfica Carandiru, de Hector Babenco, baseada na obra anteriormente mencionada, apresenta variados tipos de personagens – segundo a classificação de Cândido – porém, um aspecto importante que se deve ressaltar com relação às suas personagens é que elas representam menos de 25% do número total de personagens apresentadas no livro no qual se baseou. Isto pode ser explicado, em parte, por esta necessidade de se adequar ao tempo estabelecido para uma obra cinematográfica, no entanto, compreende-se que há outros fatores que influenciam na confecção de uma obra, e é de interesse deste trabalho investigar qual ou quais foram estes outros fatores que determinaram a construção das personagens fílmicas de Carandiru. No entanto, deve-se esclarecer que não é intuito deste trabalho analisar o grau de adaptação nem de fidelidade desta obra. A riqueza do cinema não é “a , mas o poder de extrair da vida aquilo de que tem necessidade para fabricar a matéria-prima da sua ficção” (LEBEL, 1972, p. 109-110).

51

CAPÍTULO III - O LIVRO ESTAÇÃO CARANDIRU: SUAS PERSONAGENS

1. ESTAÇÃO CARANDIRU: O LIVRO

Imagem obtida na web.

O livro Estação Carandiru, escrito pelo médico cancerologista Drauzio Varella, foi publicado em 7 de junho de 1999, pela editora Companhia das Letras. A obra, que traz o relato do trabalho voluntário de Drauzio como médico na Casa de Detenção de São Paulo, tem 297 páginas, além de 64 páginas de fotos, dividas em duas seções de 32 páginas. A primeira seção, que se encontra após a página 94, contém 40 imagens, todas coloridas. Destas, 1 é creditada ao Acervo Waldemar Gonçalves; 2 a Bob Wolfenson; 30 a Drauzio Varella; 3 a João Wainer e 2 à Rachel Guedes. A segunda seção de imagens, que vem após a página 222, conta com um total de 57 fotos, todas em preto e branco. Destas, 1 é creditada à Agência Estado (Luiz Prado); 9 a André Brandão; 1 à Comissão Teotônio Vilela (Carlos César Grama); 16 a Drauzio Varella; 13 à Folha Imagem (1 a Juvenal Pereira, 1 à Marlene Bergamo, 1 a Niels Andreas, 1 a Matuiti Mayezo, 1 a Eduardo Knapp, 1 a Eder Chiodetto, 1 a Carlos Goldgrub, 1 a Luiz Carlos Murauskas, 1 a Lalo de Almeida, 2 a Flávio Florido e 2 a Jorge Araújo) e 5 à Rachel Guedes. Todas a fotos são da década de 1990. A capa, realizada a partir de uma fotografia sobre a qual Hélio de Almeida trabalhou, é de André Brandão. A contracapa recebeu três comentários retirados dos jornais O Estado de São Paulo (por José Castello), O Globo (por Arnaldo Jabor) e Folha de São Paulo (por Fernando Bonassi). Drauzio contou com a colaboração de Silvana Jeha na pesquisa iconográfica,

52

Denise Pegorim colaborou na preparação da edição e Carmen S. da Costa, Ana Maria Barbosa e Eliana Antonioli, na revisão. A obra, que foi incluída na categoria “reportagem” pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), é um relato das experiências de Drauzio Varella naquele que foi o maior presídio da América Latina. Durante mais de dez anos, Drauzio realizou, nesta penitenciária que era conhecida como “Carandiru”, um trabalho de prevenção à AIDS junto aos detentos e, desta convivência, nasceu o livro “Estação Carandiru”. No texto, é possível conhecer a história de mais de 200 personagens entre detentos, funcionários, amigos e parentes. A narrativa apresenta as falas das personagens com suas linguagens cotidianas, cheias de gírias e figuras de linguagem, e revela como funciona o código interno que rege o comportamento carcerário. Segundo explica Varella (2005, p. 9), com este livro, ele procurou “mostrar que a perda da liberdade e a restrição do espaço físico não conduzem à barbárie, ao contrário do que muitos pensam”. Em 1999, ano de lançamento de Estação Carandiru, segundo dados da CBL e do SNEL (Sindicato Nacional do Editores de Livros), foram produzidos 43.697 livros e impressos 295.442.356 exemplares (1ª edição e reedição) no Brasil 1 . Destes exemplares, 289.679.546 foram vendidos, totalizando um faturamento de R$1.817.826.339. Durante seu primeiro ano de vendagem, o livro de Drauzio vendeu aproximadamente 120 mil exemplares 2. Até 2004, foram vendidas 450 mil cópias3 . O livro permaneceu por mais de 150 semanas na lista dos best-sellers4 . De acordo com o cineasta Roberto Moreira, em entrevista cedida à Faculdade Cásper Líbero, o livro “vendeu mais de 1 milhão de exemplares”5 . No ano 2000, “Estação Carandiru” foi premiado com o Jabuti na categoria “reportagem”.

1

Dados da SNEL. Disponível e m: . Acesso em: 16 de dezembro de 2007. 2 Dados da revista Época. Disponível em: . Acesso em: 16 de dezembro de 2007. 3 Dados da revista Veja, edição 1866 de 11 de agosto de 2004. Disponível em: . Acesso em: 16 de dezembro de 2007. 4 Dados da Revista de Cinema, edição 36. Disponível em: . Acesso em: 18 de dezembro de 2007. 5 Entrevista realizada em 9 de dezembro de 2004. Disponível em: . Acesso em: 18 de dezembro de 2007.

53

2. ESTAÇÃO CARANDIRU: SUAS PERSONAGENS Esta abordagem da obra Estação Carandiru enfatizará o perfil de suas personagens principais e secundárias. Massaud Moisés caracteriza a personagem do texto literário como “os seres fictícios construídos à imagem e semelhança dos seres humanos: se estes são pessoas reais, aqueles são ‘pessoas’ imaginárias; se os primeiros habitam o mundo que nos cerca, os outros movem-se no espaço arquitetado pela fantasia do prosador” (1974, p. 396). No texto A personagem do romance, incluído no livro A personagem de ficção, de Antônio Cândido, Anatol Rosenfeld, Décio de Almeida Prado e Paulo Emílio Sales Gomes, lê-se “a personagem vive o enredo e as idéias, e os torna vivos” (1968, p. 54). Dos três elementos de uma novela: enredo, idéia e personagem, esse último se destaca. Citando: “no meio deles (os elementos da novela) avulta a personagem, que representa a possibilidade de adesão afetiva e intelectual do leitor (...)” (1968, p. 54). O mesmo texto acima citado, enfatizando a importância da personagem no texto literário cita um texto de Gide (1968, p.54): “Tento enrolar os fios variados do enredo e a complexidade dos meus pensamentos em torno destas pequenas bobinas vivas que são cada uma das minhas personagens” (ob. cit., p. 26). Deve se lembrar que, no caso do texto Estação Carandiru, a maioria das personagens é explicitamente baseada em pessoas reais. Citando: (...) procuro abrir uma trilha entre os personagens da cadeia: ladrões, estelionatários, traficantes, estupradores, assassinos. (...) Por razões éticas, os casos descritos nem sempre se passaram com os personagens a que foram atribuídos. (VARELLA, 2005, p. 9-10)

Esta citação salienta a oportunidade da definição acima citada de Massaud Mo isés, porém há de ser complementada, citando Antônio Cândido (1968), devemos lembrar que “o romancista é incapaz de reproduzir a vida, seja na singularidade dos indivíduos, seja na coletividade dos grupos”. Seguindo a classificação proposta por Cândido, podemos dizer que as personagem de Estação Carandiru se encaixam no primeiro tipo descrito por ele, ou seja, são personagens “transpostas com relativa fidelidade de modelos dados ao romancista por experiência direta, —

54

seja interior, seja exterior ”. Neste caso, trata-se de uma experiência direta exterior, já que o autor esteve em contato direto com as pessoas. A seguir, será apresentado um levantamento das personagens da obra Estação Carandiru. A classificação é composta de cinco itens: o nome da personagem, uma definição elaborada a partir dos dados do livro, a primeira referência feita à personagem no livro, o capítulo e o número da página desta primeira referência. Essa listagem apresenta a relação de todas as personagens de Estação Carandiru, totalizando 206, sendo 190 homens e 16 mulheres. Elas podem ou não ter estado em contato com Drauzio Varella, este não foi um critério de exclusão. A listagem segue a ordem de aparecimento das personagens no livro.

TABELA 3 – RELAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO Nome

Descrição

1ª Referência

Capítulo

Página

Introdução

9

Introdução

9

Introdução

9

“Quando eu era Médico que foi à Casa Narrador

de Detenção para fazer um trabalho de prevenção à AIDS.

pequeno, assistia eletrizado àqueles filmes de cadeia em branco e preto.”

Dr. Getúlio

Ex-aluno de Drauzio do

“...a figura calada do

cursinho. Cuidava dos

dr. Getúlio, meu ex-

detentos com AIDS.

aluno no cursinho...” “...procurei o dr.

Dr. Manoel

Médico responsável

Schechtemn

pelo sistema prisional.

Manoel Schechtman, responsável pelo departamento médico do sistema prisional...”

55

“...O Vira Lata, um Paulo Garfunkel

6

Escreveu “O Vira Lata”

Carlos Zéfiro dos anos

(HQ).

90 escrito por Paulo

Introdução

10

Introdução

10

Garfunkel...” “...escrito por Paulo Líbero 6

Malavoglia

Desenhou “O Vira

Garfunkel e desenhado

Lata” (HQ).

por Líbero Malavoglia...”

Seu Jesus

Diretor de Vigilância,

“Seu Jesus, diretor de

ex- lutador profissional

Vigilância, ex- lutador

Estação

120 quilos. Depois,

profissional de luta

Carandiru

virou pastor protestante.

livre...”

14

“Só então escutei a voz Xavier

Ajudante do

empostada do ajudante:

Estação

marceneiro-chefe.

-Reeducando Xavier às

Carandiru

15

suas ordens, doutor.” Funcionário do pavilhão Oito, atarracado, de -

bigode, surpreendido na revista com um pacote de crack amarrado à

“...um funcionário do pavilhão Oito, atarracado, de bigode, quis entrar com um

Estação Carandiru

15

pacote de crack...”

face interna das coxas.

-

6

Malandro desdentado,

“Em minha direção

com gingado, sandália

vem um malandro

Estação

de dedo e T-shirt escrito

desdentado, na

Carandiru

New York University.

ginga...”

16

Embora possam ser entendidas mais como ambientação que personagens de fato, foram consideradas como personagens na análise deste estudo.

56

Um senhor negro baiano, de cabelo de carapinha branco, pai de 18 filhos com a mesma Seu Jeremias

mulher, firme de caráter, cumprindo sete anos desta vez,

“O velho Jeremias, de carapinha branca, sobrevivente de quinze

O casarão

19

Os pavilhões

25

Os pavilhões

26

Os pavilhões

27

Os pavilhões

30

rebeliões e pai de dezoito filhos com a mesma mulher...”

sobrevivente de 15 rebeliões. “Genival, um dos habitantes do setor, diz Genival

Paciente do DM (doente

que perdeu o juízo por

mental).

causa da visão de um senhor que ele matou...”

Forte, chefe de quadrilha de piratas de Bigode

Santos, cumpre 213 anos. Viciado e traficante de maconha de 82 anos de idade, criado num

Seu Lupércio

orfanato de Poá. Foi massagista do São Paulo, se orgulha de nunca haver roubado.

“Como diz Bigode, um homem de caráter forte, antigo no pavilhão...”

“Seu Lupércio, com mais de oitenta anos e dezenas de entradas e saídas na Casa por fumar e vender maconha...” “Caçapa, um ladrão

Ladrão que cumpre 5

que cumpre cinco anos

anos por assalto a banco Caçapa

no qual ganhou US$ 20 mil.

no Seis, que ganhou 20 mil dólares num assalto a banco...”

57

Rolney

Gersinho

Ladrão que cumpriu 12

“Rolney, um ladrão da

anos e voltou por matar

zona sul que cumpriu

o amigo-amante de sua

doze anos no pavilhão

mulher.

e foi libertado...”

Assaltante primário, de

“Gersinho, portador do

19 anos, portador de

vírus da AIDS,

vírus HIV, acolhido por

dezenove anos,

ladrão antigo que o viu

assaltante primário

nascer.

aceito no pavilhão...”

Os pavilhões

33

Os pavilhões

33

Os pavilhões

35

O barraco

36

O barraco

36

“Majestade, assaltante Assaltante dos anos 70, Majestade

cumpre pena há 20 anos no Nove. Presidente de

dos anos 70 que cumpre pena há vinte anos sem sair do

Esportes do Nove. Nove...” Mineiro de sorriso encantador, traficante Juscelino

de maconha no sertão de Pernambuco e trazia a droga na mochila.

“...como explica Juscelino, um mineiro de sorriso encantador que comprava maconha no sertão de Pernambuco...” “Na opinião do dr.

Dr. Walter

Chegou a diretor-geral

Walter, que começou

do presídio. Começou

ainda menino como

como carcereiro e

carcereiro, formou-se

depois se formou

advogado e chegou a

advogado.

diretor-geral do presídio...”

58

Valtércio

Arrombador de carros.

“Valtércio, um

Num dia roubou 8

arrombador de carros

televisores no porta-

que, num dia de Copa,

malas na frente do

roubou oito

Fórum.

televisores...”

O barraco

37

O barraco

41

O barraco

42

Sol e lua

44

Ex- motorista da prefeitura que usava o carro oficial para Sabiá

entregar cocaína.

“Sabiá, ex- motorista da prefeitura que usava o carro oficial para

Apaixonou-se por uma mocinha da Repartição

entregar cocaína no centro da cidade...”

e foi entregue à polícia pela esposa traída. Travesti lavadeira e

Jaquelina

passadeira preso por

“...Jaquelina, uma

aplicar o golpe do

travesti lavadeira e

suador. Descobriram

passadeira presa por

que ele ensaboava as

aplicar o golpe

roupas na água da

do suador...”

privada. Ladrão escolado, mulato franzino que ganhou o apelido de Sem-Chance

tanto repetir essas palavras no final das frases. Viciado em crack. Tinha tuberculose.

“...como explica o Sem-Chance, um mulato franzino que ganhou o apelido de tanto repetir essas palavras no final das frases:”

59

Rapaz de língua presa,

“A verdadeira história

de um metro e meio de Pequeno

altura, que matou quatro PMs que, segundo ele, mataram seus pais.

pouco depois eu ouvi

Sol e lua

46

Sol e lua

47

Sol e lua

47

Sol e lua

48

do Pequeno, um rapaz de língua presa...”

Diretor do

“...comandados pelo

Departamento de

diretor do

Waldemar

Esportes, tem o hábito

Departamento de

Gonçalves

de mascar cravos que

Esportes, o funcionário

ele guarda numa latinha

Waldemar

de pastilhas Valda.

Gonçalves...” “Seu Reinaldo

Seu Reinaldo

Funcionário da portaria,

Drumond, um

Drumond

negro, forte como touro.

funcionário da portaria, negro...”

Zagueiro com cara de amazonense, que tinha chegado na periferia de São Paulo há vinte anos, como assentador Gaúcho

de azulejo. Meteu-se em uma briga em que perderam a vida dois contendores. Acabou sócio de um amigo ladrão.

“Era o Gaúcho, um zagueiro com cara de amazonense, que tinha chegado na periferia de São Paulo há vinte anos...”

60

Uma senhora do Paraná, de coque no cabelo e pernas grossas de -

varizes, que viajava 600 km de ônibus a cada 15 dias para visitar o filho condenado a 120 anos,

“Uma senhora do Paraná, de coque no cabelo e pernas grossas de varizes, viajava

Fim de semana

51

seiscentos quilômetros de ônibus a cada quinze dias, religiosamente...”

que chacinou 6 pessoas. Chefe de uma quadrilha que abordava navios na barra de Santos, Pirata

encarregado de prender uma corda com gancho

“Num sábado, no campo do Oito, conheci a mãe do Pirata, uma

Fim de semana

52

senhora ba ixa e na murada por onde

encorpada...”

subiam com as metralhadoras. “Uma vez, seu Mavi,

Seu Mavi

Diretor do pavilhão Nove.

diretor do pavilhão Nove, perguntou a um grupo de presos que se

Fim de

53

semana

queixava da comida:”

Xanto

Ladrão do Pari que

“No plano Collor, no

baleou seus dois primos

auge do congelamento,

e seu tio bêbado, que

Xanto, um ladrão que

espancava sua tia-

ao visitar a tia-

madrinha, no peito por

madrinha no Pari

não saber dar tiro nas

baleou tanto o tio

pernas de ninguém.

bêbado...”

Fim de semana

53

61

Mulata de sorriso

Zilá

franco. Tinha quatro

“Uma mulata de sorriso

filhas, das quais apenas

franco, Zilá, das

a mais velha havia sido

primeiras na ordem de

concebida com o pai em

chegada, disse que

liberdade, seis anos

estava muito feliz...”

Fim de

55

semana

antes.

Fran

Vizinha de Zilá,

“...tinha chegado a

magrinha, tímida, que

Fran, uma vizinha do

podia ter no máximo 20

Taboão da Serra,

Fim de

anos. Foi ao presídio

magrinha, tímida, que

semana

para ser apresentada a

podia ter no máximo

Roberval.

vinte anos.”

Um mulherengo de bigode, sócio do marido Roberval

de Zilá no negócio de assaltar carga.

Nordestino cicioso que fez mais de cem Genésio

assaltos e esbanjou todo dinheiro nas boates da Zona Norte.

55

“...você quer conhecer o Roberval eu te levo, mas não desejo para

Fim de semana

55

ninguém o cansaço da fila...” “...Genésio, um nordestino cicioso que esbanjou nas boates da

Visitas

zona norte o dinheiro

íntimas

roubado em mais de cem assaltos...”

61

62

Travesti condenado a 3 anos e 2 meses por usar um talão de cheque

Sheila

roubado. Seios

“No trabalho com os

enormes, blusa com nó

travestis, encontramos

acima do umbigo,

o caso da Sheila,

confessava mais de mil

condenada a três anos e

parceiros sexuais na

dois meses...”

O baque

65

O baque

65

O baque

66

O baque

66

Casa de Detenção no decorrer do ano anterior à pesquisa. Ladrão azarado do

Chocolate

Jardim Bonfiglioli que

“Chocolate, um ladrão

roubou, sem saber, a

azarado do Jardim

casa da namorada do tio

Bonfiglioli que roubou,

traficante e depois,

sem saber, a casa da

assaltou uma outra sem

namorada do tio

saber que era do filho

traficante...”

de um delegado. Ladrão de fala mansa, marido de uma mulher bonita da qual morria de Chico Ladeira

ciúmes, fabricava seringas. Preso em um assalto a um templo da

“...Chico Ladeira, preso por seguranças armados de metralhadora num assalto a um templo da igreja Universal...”

Igreja Universal. Recebeu o apelido do amigo, que lhe flagrou Coça-Coça

pedindo para uma prostituta passar a unha em suas costas.

“Acharam uma grinfa ainda com sangue dentro, deba ixo da cama do Coça-Coça.”

63

“...um jamaicano negro

-

Jamaicano, negro, de

de rosto comprido,

rosto comprido, recém-

recém-saído da cadeia,

saído da cadeia.

que dizia ter sido preso

O baque

67

O baque

67

O baque

67

O baque

67

No cinema

70

No cinema

70

injustamente...”

-

Filho de árabe,

“...um filho de árabes

envelhecido

envelhecido

precocemente.

precocemente;”

Magrelo, de dentes -

estragados, pai de dois filhos. Assaltava bilheterias do metrô.

“...um magrelo de dentes estragados pai de dois filhos, que assaltava bilheteria de metrô;” “...um nissei da máfia

-

Nissei da máfia, que

que explorava

explorava lenocínio nas

lenocínio nas boates da

boates da Liberdade.

Liberdade, o bairro oriental de São Paulo.”

Funcionário da UNIP, responsável pela montagem do cinema. Roberto

Apelidado de PC pelos detentos devido à semelhança física com

“O trabalho de montagem ficava por conta de dois funcionários da UNIP, o Roberto e o Luís...”

o personagem de Alagoas. “O trabalho de

Luís

Funcionário da UNIP,

montagem ficava por

responsável pela

conta de dois

montagem do cinema.

funcionários da UNIP, o Roberto e o Luís...”

64

“...ajudados por uma

Gerson

Coordenador do pavilhão Oito.

equipe de detentos coordenada pelo

No cinema

70

No cinema

71

No cinema

71

No cinema

72

No cinema

74

Gerson do pavilhão Oito.”

Seu Florisval

Hernani

Diretor de Disciplina.

“Durante as primeiras

Começou como

palestras, seu Florisval,

carcereiro e chegou a

o diretor de Disciplina,

diretor.

postava-se no palco...”

Um senhor de cabelo

“Hernani, um falsário

grisalho, especialista no

ou “171”, como prefere

golpe da arara.

a malandragem...”

Ladrão que dizia ter aproveitado a vida. Santista

Viciado em cocaína . Esbanjava dinheiro roubado com moças de

“...eu respondia às perguntas feitas num outro microfone com fio comp rido levado pelo Santista...”

boates. Assaltante e receptador, nascido sem uma orelha, mulato musculoso cumprindo Santão

18 anos por assalto a banco, que ajudava a

“Santão, um mulato musculoso cumprindo dezoito anos por assalto a banco, que ajudava a montar o equipamento

montar o equipamento de som, era um dos mais revoltados.

de som...”

65

Filho de alcoólatra que odiava bêbado e baleou dois deles numa padaria

Benê

de Parelheiros porque

“Na semana seguinte,

importunaram uma

antes de começar a

moça. Homem de

palestra, o Benê, um

poucas palavras e

filho de alcoólatra...”

No cinema

74

Rita Cadillac

76

moral. Apitou a decisão do campeonato interno de futebol.

Rita Cadillac

Dr. Mário Mustaro

Edelso

Ex-chacrete que

“Para abrilhantar a

encantava os homens

cerimônia, o Waldemar

diante da TV, sábado à

convidou Rita

noite.

Cadillac...”

Chefe do serviço

“...para acertar os

médico da Casa e ex-

detalhes com o dr.

professor de bioquímica

Mário Mustaro, o chefe

Atropelo na 80 Divinéia

de Drauzio na

do serviço médico da

faculdade.

Casa...”

Primeiro enfermeiro de

“...conheci meu

Drauzio. Rapaz com

primeiro enfermeiro,

jeito de classe média,

Edelso, um rapaz com

Atropelo na

preso por roubo de

jeitão de classe média,

Divinéia

automóvel e exercício

preso por ro ubo de

ilegal da medicina.

automóvel...”

80

“Um mulato, baixinho Um mulato, baixinho e -

troncudo, de camisa

e troncudo, de camisa aberta, à direita do

aberta, que fez um carcereiro refém.

Atropelo na Divinéia

refém, com uma das mãos segurou- lhe...”

81

66

Branco de cabelo desgrenhado, dentes -

falhados na frente, que fez um carcereiro refém.

“Do lado oposto, um branco de cabelo desgrenhado, dentes

Atropelo na

falhados na frente,

Divinéia

81

mantinha posição simétrica...”

-

Fortão, musculoso de

“O terceiro, musculoso

malhação, que fez um

de malhação, puxava o

carcereiro refém.

refém pela gola...”

Atropelo na Divinéia

81

“Neste, sob a água que Preso sem camisa, com -

cara de boxeador. Enfermeiro que cuidava

escorria em pingos grossos, um preso sem

Bem-vindo

83

Bem-vindo

83

Bem-vindo

84

camisa, com cara de

de um doente. boxeador...” Paciente com ferida no rosto que pegava toda região frontal direita, -

provocada por HerpesZoster, vírus oportunista dos casos de

“O paciente tinha ferida cruenta no rosto, extensa, que pegava toda a região frontal direita, avançava sobre as pálpebras...”

AIDS. Ladrão de automóveis de Santo André, que -

estava só pele e osso e tossia e cuspia uma secreção sanguinolenta.

“No final, entrei no quarto de um rapaz de Santo André, ladrão de automó veis...”

67

Um dos enfermeiros, fortão, de bigode, que puxava a perna esquerda atingida numa Juliano

emboscada em que perderam a vida um

“Um dos enfermeiros, Juliano, fortão, d e

Bem-vindo

84

O impacto

86

O impacto

87

bigode, que puxava a perna esquerda...”

irmão e outro parceiro. Era especializado em bancos e carros-fortes. Um tipo de barba cerrada e passado Pedrinho

misterioso. Tinha três balas alojadas no tórax e foi condenado a 22

“...Pedrinho, um tipo de barba cerrada e passado misterioso, com três balas alojadas no tórax...”

anos. Guarda-costas de um traficante da Rocinha,

-

falava com sotaque

“Um deles, guarda-

carioca arrastado e

costas de um traficante

usava a camiseta do

da Rocinha, vestido

Flamengo. Tinha os

com a camiseta do

braços cobertos de

Flamengo...”

feridas que ele coçava ininterruptamente.

Mil e Um

Apelidado pela falta dos

“Uma vez, chegou um

quatro incisivos na

doente chamado Mil e

arcada superior, era

Um, referência à falta

HIV positivo.

dos quatro incisivos na

Traficante de crack.

arcada superior...”

Biotônico Fontoura

91

68

Descendente de árabes, nariz avantajado, cheio

Turco

de correntes

“Eu nem sabia que

embaraçadas nos pêlos

ainda fabricavam o tal

Biotônico

do peito. Anos mais

tônico revigorante e dei

Fontoura

tarde, fugiu por um

a receita ao Turco...”

93

túnel cavado no pavilhão Sete. Ladrão do pavilhão Sete. Tinha lábios rachados de febre, -

conjuntiva amarela avermelhada e dor nos músculos, causada pela leptospirose. Trabalhou

“Um dia de chuva, entrou um ladrão do pavilhão Sete enrolado num cobertor, feito um

Leptospirose

96

Leptospirose

98

beduíno do deserto, apenas os olhos de fora.”

no túnel feito para fuga. Obeso, entalou na boca Rolha

do túnel disfarçada atrás da imagem da santa.

“O Rolha, conforme ficou conhecido esse rapaz, foi transferido da Detenção às pressas...” “Uma vez, Zico, com fama de bandidão na

Zico

Tinha fama de bandidão

Vila Guaram,

Anjos-

na Vila Guaram.

reconheceu a

Demônios

101

fisionomia de um recém-chegado...” Encarregado-geral, Bolacha

negro de lábios grossos, ladrão de longa carreira.

“...um negro de lábios grossos conhecido

Anjos-

como Bolacha, ladrão

Demônios

de longa carreira:”

101

69

Kenedi Baptista dos Santos, conhecido como Zé da Casa Verde

Era ladrão desde a

“Zé da Casa Verde,

adolescência. Negro,

marido de duas

assaltante de banco,

mulheres, na época

Anjos-

casado com duas

internado na

Demônios

mulheres, Valda e

enfermaria, fez o

Maria Luísa.

seguinte comentário...”

102

Nordestino atarracado,

Abrão

ex-proprietário de

“Abrão, um nordestino

inferninho no cais de

atarracado, ex-

Santos, cumprindo 25

proprietário de

anos pela morte de um

inferninho no cais de

cliente que bateu em

Santos...”

Anjos-

103

Demônios

uma de suas prostitutas. Um senhor baixinho que guardava o portão de acesso à Divinéia, Seu Joãozinho

morreu esmagado pelo caminhão de lixo no portão da Divinéia, em

“Um homem que não fazia mal para uma mosca, como o seu

Os

Joãozinho, morreu

funcionários

106

esmagado pelo caminhão de lixo...”

uma tentativa de fuga. “...como disse seu Seu Aparecido Fidélis

Funcionário experiente,

Aparecido Fidélis,

cadeeiro da velha

funcionário experiente,

guarda.

enquanto tomávamos

Os funcionários

107

um chope...” Ladrão de muitas Chico Bagana

passagens pela Casa, gozador empedernido.

“...em voz baixa o Chico Bagana, ladrão

Os

de muitas passagens

funcionários

pela Casa...”

111

70

“...a única explicação para não ocorrerem Seu Reinaldo

Carcereiro que trabalha na portaria.

fugas espetaculares, daquelas de esvaziar pavilhão, é a dada pelo

Os

111

funcionários

seu Reinaldo, da portaria:” Ex-diretor do Cinco, que uma vez pagou do bolso um pacote de Seu Bonilha

cigarro que um ladrão devia, só para evitar um homicídio a mais em

“Como diz seu Bonilha, ex-diretor do Cinco, que uma vez

Os

pagou do bolso um

funcionários

112

pacote de cigarro que um ladrão devia...”

seu pavilhão. “Luisão, legendário exLegendário ex-diretor Luisão

da Casa, atualmente aposentado.

diretor da Casa, jura que era capaz de

Os

identificar aqueles nos

funcionários

113

quais a alcagüetagem é qualidade inata:”

Um militar dos anos 70. Os detentos mais velhos Coronel Guedes

o consideram como o melhor diretor de todos os tempos.

“Curioso é que os presos mais velhos consideram o coronel

Os

Guedes, um militar dos

funcionários

anos 70, época da ditadura...”

114

71

“-Chegaram oito com Detento que foi morto Alagoas

por oito homens a facadas e pauladas.

faca e pau no xadrez do tal de Alagoas. Ele me

Os

viu e começou a gritar:

funcionários

115

me ajuda, seu Paulo, pelo amor de Deus!”

Um funcionário de trinta e poucos anos que Seu Paulo

faz bico como segurança de um prostíbulo em Diadema.

“Ele me viu e começou a gritar: me ajuda, seu

Os

Paulo, pelo amor de

funcionários

115

Deus!” “Uma vez, seu Lourival, funcionário

Seu Lourival

Funcionário calejado.

calejado, comentou a

Os funcionários

115

respeito de um episódio rumoroso...” Membro da igreja

-

universal que apanhou

“Uma vez, atendi na

dos ladrões no pavilhão

enfermaria um membro

Nove quando o

da Igreja Universal que

pegaram fumando

apanhou dos ladrões...”

O rebanho

118

O rebanho

118

cigarro escondido.

-

Pastor do Cinco,

“Tarefa muitas vezes

homem em formato de

inglória, como

barril, preso por vender

esclarece um dos

lotes no meio da represa

pastores do quinto

Billings e outros golpes

andar do Cinco, um

contra a economia

homem em formato de

popular.

barril...”

72

-

Diácono de olhar

“Ficam sob observação

piedoso. Cumpre pena

durante três ou quatro

por assalto, tráfico de

anos antes de serem

crack e participação em

indicados, segundo um

uma chacina na favela

diácono de olhar

de Heliópolis.

piedoso...”

Um rapaz com forte sotaque paranaense, Valente

condenado por sete mortes a 130 anos. Viciado em cocaína.

O rebanho

118

O rebanho

119

Amarelo

122

Amarelo

122

Amarelo

123

“Valente, um rapaz com forte sotaque paranaense, condenado por sete mortes a 130 anos, justifica a necessidade do rigor:”

Dionísio

-

Ladrão, viciado em

“Dionísio, um ladrão

crack, com tuberculose

com tuberculose

incurável, que foi

incurável, abandonado

abandonado pela

pela mulher cansada

mulher.

das promessas ...”

Ladrão do Amarelo,

“Uma vez, atendi um

com o corpo coberto

ladrão do Amarelo,

com pequenas feridas

com o corpo coberto de

contagiosas. Viciado

pequenas feridas

em crack.

contagiosas...”

Traficante do Oito, que

Papo Doce

trazia cocaína da

“Papo Doce, um

Bolívia e ameaçava

traficante do Oito

matar os distribuidores

merecedor do apelido,

que misturassem a

que trazia cocaína da

droga com outros

Bolívia...”

produtos.

73

Ladrão que estourava a

Mário Cachorro

janela das casas com

“Mário Cachorro, um

macaco de automóvel e

ladrão que estourava a

numa delas encontrou

janela das casas com

doze quilos em barras

macaco de automóvel e

de ouro. Era filho e

numa delas encontrou

irmão das mulheres

doze quilos em barras

violentadas por

de ouro...”

Amarelo

124

Amarelo

124

Amarelo

125

Amarelo

126

Ronaldinho. “Dias depois, chegou Careca como o jogador, detido por haver Ronaldinho

na Detenção um certo Ronaldinho, careca como o jogador,

estuprado mãe e filha, entre outros delitos graves.

detido por haver estuprado mãe e filha, entre outros delitos graves.”

Um auxiliar da enfermaria. Foi Julinho

transferido para o Nove, quando descobriram que ele desviava

“Levei o Julinho, um auxiliar da enfermaria que mais tarde foi transferido para o pavilhão Nove...”

medicamentos. Enfermeiro do Hospital

Paulo Xavier, o Paulo Preto

Sírio-Libanês que se

“Mais recentemente, no

dispôs a auxiliar

Amarelo, passei a

Drauzio com os

contar com a ajuda do

doentes. Organizava o

Paulo Xavier, o Paulo

atendimento com o

Preto...”

auxílio de Lúcio.

74

Travesti com silicone

Veronique

inflamado na parte de

“Hoje agradeço ao

trás do assento.

pastor por ter me

Apelidado de Japonesa,

apresentado Veronique,

referência aos olhos

personagem de uma

puxados de cabocla

outra história.”

Amarelo

126

Amarelo

126

Amarelo

127

mato-grossense. Rapaz forte, com um olho de cada cor, que Lúcio

ajudava Paulo Preto no atendimento do Amarelo. Preso após uma briga de rua. Homem de barba espessa, antigo

Seu Manoel

funcionário do pavilhão. Tinha vinte anos de experiência.

Traficante interno que preparava crack de Tristeza

madrugada e que uma vez foi pego com 300 gramas da droga.

“Paulo organizava o atendimento com o auxílio de um preso chamado Lúcio, um rapaz forte...” “Num sábado, Paulo Preto, Lúcio, seu Manoel, um homem de barba espessa, antigo funcionário do pavilhão, e eu..” “O processo é trabalhoso, como se queixa Tristeza, um

Tudo na

traficante interno que

colher

passava as madrugadas no preparo...”

129

75

Ladrão com AIDS que fugiu do hospital penitenciário e foi preso fumando crack na rua. Ronaldo

Tem quatro filhos. Morreu de tuberculose na enfermaria seis meses depois de

“Ronaldo, um ladrão com AIDS que fugiu do hospital penitenciário e foi

Tudo na

preso em flagrante

colher

130

fumando crack na rua do Triunfo quarenta horas depois...”

recapturado. Bandidão cumprindo vinte anos pela morte de Júlio

três rivais que o emboscaram num beco

“...porque o Júlio, um bandidão cumprindo vinte anos pela morte

Para derrubar a

134

malandragem

de três rivais...” de favela. Viciado em crack que

Carlão

vendeu o revólver por

“Carlão, que passou um

causa da droga e foi

ano na rua e dois na

Para derruba r

preso assaltando com

cadeia, fumando crack

a

uma faca de cozinha.

sem parar e mais tarde

malandragem

Mais tarde, ficou livre

ficou livre da droga...”

134

da droga. Traficante franzino do Oito, armador do time do pavilhão, nascido no Filó

Canindé, arrombador de residências e pai de duas meninas mantidas por ele em escola particular.

“Filó, um traficante franzino do Oito, armador do time do

Para derrubar

pavilhão, nascido no

a

Canindé, ao lado do

malandragem

campo da Portuguesa...”

135

76

Filho de portugueses,

Horácio

abandonado pela

“Como explica

mulher depois de ficar

Horácio, um

paraplégico ao bater de

paraplégico filho de

moto roubada, com uma

portugueses,

loura na garupa, contra

abandonado pela

a traseira de um

mulher...”

Na piolhagem

137

Na piolhagem

137

Na piolhagem

138

Na piolhagem

139

caminhão. Tipo popular, contador de casos exagerados nos Fumaça

quais sempre desempenha o papel de protagonista.

“Fumaça, tipo popular, contador de casos exagerados nos quais inevitavelmente desempenha o papel de protagonista...” “Lenildo, um ladrão

Lenildo

Ladrão e traficante que

que nunca traficou na

nunca traficou na rua,

rua, mas que

mas o faz na cadeia

na cadeia começou a

para sustentar a mãe, as

fazê-lo para sustentar

duas mulheres, três

as duas mulheres,

filhos.

três filhos e a mãe que sofre de reumatismo...” “Fui desanimado pelo

Sarará

Negro loiro com muitas

Sarará, um negro loiro

passagens pela Casa.

com muitas passagens pela Casa:”

77

Ladrão de Guaianases, encarregado da enfermaria do Oito que Sérvulo

cobrava dois maços de cigarro dos detentos

“Sérvulo, um ladrão de Guaianases,

Ócio

141

Ócio

141

Pena Capital

144

Pena Capital

144

Pena Capital

145

encarregado da enfermaria do Oito...”

para conseguir uma consulta. Venezuelano naturalizado brasileiro,

“Um venezuelano

buscava drogas na selva -

amazônica e depois matava os entregadores por sair mais em conta

naturalizado brasileiro, que ia buscar droga na selva amazônica...”

do que pagá- los. Representante de vendas de 30 anos, deu carona para uma Gilson

estudante virgem de 15 anos, armado, dirigiu para um lugar ermo e a

“Outra vez, Gilson, um representante de vendas de trinta anos, deu carona no fusca para uma estudante de quinze...”

estuprou.

Marcolino

Apontador de jogo do

“Marcolino, apontador

bicho, comerciante de

de jogo do bicho e

dinheiro falso, estava

comerciante de

para ser libertado.

dinheiro falso...” “No dia seguinte, na

Craqueiro iletrado, foi o -

primeiro a bater em

cela coletiva, um craqueiro iletrado

Gilson quando soube do estupro.

pediu-lhe para escrever uma carta...”

78

Barriga

Ladrão preso em uma

“Aí o Barriga, um

tentativa de assalto à

ladrão q ue tinha sido

uma casa ao entalar na

preso entalado na

clarabóia do forro da

clarabóia do forro de

casa.

uma casa...”

Ladrão do Cinco que matou a amante e o Cilinho

sócio que o traíram e planejavam fugir com o dinheiro do assalto.

Pena Capital

146

Pena Capital

146

Laranja

149

Laranja

150

Laranja

151

“Cilinho, um ladrão do Cinco que matou a amante infiel e o sócio traidor que planejava fugir com ela e o dinheiro do assalto...”

Alfinete

Branquinho, magro

“Uma vez tratei um

feito um cabo de

branquinho chamado

vassoura, que roubava

Alfinete, magro feito

nos semáforos da

um cabo de vassoura,

avenida Paulista.

que fez carreira nos

Gastava com crack, até

semáforos da avenida

ser preso.

Paulista.” “...tinha sido o Peninha,

Um rapaz esquálido, Peninha

internado em fase final de evolução da AIDS, que mal parava em pé.

um rapaz esquálido internado em fase final de evolução da AIDS...”

Moreno de óculos consertados com Filósofo

esparadrapo, estelionatário de muitos golpes.

“...como explica o Filósofo, um moreno de óculos consertados com esparadrapo...”

79

Ladrão tatuado que Gitano

trabalhou na enfermaria.

Bebeto

“Gitano, um ladrão tatuado que trabalhou

“Bebeto estava para lá

cadeia há apenas três

do quinto sono quando

dias, fama de sangue-

os três funcionários

bom.

deram essa ordem.”

Cidinho

louca, perdeu a audição

Bigorna

e todos os dentes da frente.

152

Sangue-bom

152

Sangue-bom

153

Sangue-bom

153

Travestis

155

uma carta da mulher.”

Havia chegado na

Fornecedor de maria-

Sangue-bom

na enfermaria, recebeu

“Cidinho Bigorna, seu fornecedor, lamentou não poder atendê- lo, estavam na entressafra...”

Um ex- marinheiro de 50 anos que matou o cunhado. Chefe da marcenaria, comandava a Cozinha Geral. Foi Seu Chico

preso e não viu mais os filhos, porque a mulher disse a eles que o pai

“...como explica seu Chico, um exmarinheiro que matou o cunhado, foi preso e não viu mais os filhos...”

havia morrido na penitenciária. Condenado a 44 anos. “...um homem de seios; Raimundo da Silva, mas todos chamavam de Loreta

Um travesti de seios e gestos delicados.

e gestos delicados em cuja ficha eu lia Raimundo da Silva, mas que todos chamavam de Loreta.”

80

Um travesti, de cabelos compridos, fazia as Índia

unhas do diretor, o temido coronel linhadura.

“...uma delas, de cabelos compridos, conhecida como Índia,

Travestis

155

Travestis

156

Travestis

157

Travestis

157

Travestis

157

Inocência

158

fazia as unhas do diretor, o temido coronel linha-dura.”

-

Zacarias

Ladrão desdentado que

“Uma vez, dei o

pegou AIDS ao manter

resultado positivo do

relacionamento sexual

teste de AIDS para um

com outros detentos.

ladrão desdentado....”

Um asmático em crise, faxineiro do Oito.

“Zacarias, um asmático em crise, faxineiro do Oito...” “...faxineiro do Oito,

Valdir

Funcionário do Cinco.

queixou-se ao seu Valdir, funcionário do Cinco:”

Patrícia Evelin

Paulão

Travesti que tinha cílios

“Patrícia Evelin, de

postiços, condenado por

cílios postiços, foi

matar um cliente que

condenada porque

não quis pagá-lo e ainda

matou um cliente que

foi estúpido.

não quis pagá- la...”

Mulato de 40 anos,

“Paulão é um mulato

meio gordo, sorriso

de quarenta anos, meio

agradável e barba

gordo, de sorriso

cerrada, que vivia pela

agradável e barba

enfermaria.

cerrada...”

81

Zildenor

Um dos membros do

“...Zildenor, por ironia

grupo de depredadores,

preso numa loja de

preso ao comprar um

brinquedos quando

brinquedo para os filhos

comprava

com dinheiro roubado

honestamente um

num assalto.

trenzinho...”

Encarregado-geral da Faxina do pavilhão Jocimar

Cinco, recémtransferido.

Ricardão

160

“...diretor de Disciplina, chamou Jocimar, encarregado-

Quebracabeça

164

geral da Faxina do pavilhão:”

Diretor de Disciplina do Cinco, homem encorpado, de óculos, avô de dois netos e filho Seu Luís

de uma senhora de cabelos brancos como algodão. Começou menino ainda, como carcereiro, e chegou a diretor.

“...seu Luís, diretor de Disciplina, chamou Jocimar, encarregadogeral da Faxina do pavilhão:”

Quebracabeça

164

82

Magro, alto e estrábico, tomava conta da Copa dos funcionários do pavilhão com um grupo de companheiros. Um Pirulão

alcagüeta que fez carreira num distrito do centro, passando

“Maquiavelicamente, seu Luís lembrou-se do Pirulão, um alcagüeta que fez carreira num

Quebra-

167

cabeça

distrito do centro...”

informações em troca de parte dos bens apreendidos com os ladrões que delatou. Ladrão de olhos

Baianinho

puxados, que cometeu

“Baianinho, um ladrão

mais de cem assaltos e

de olhos puxados, com

duas mortes. Morava de

mais de cem assaltos e

graça em uma das seis

duas mortes no

celas com TV, de

prontuário...”

Quebra-

169

cabeça

propriedade de Jocimar. Ladrão magrinho, que tinha a imagem de Roberto Carlos

Nossa Senhora Aparecida tatuada no peito e era cego do olho direito.

“Roberto Carlos, um ladrão magrinho, com uma Nossa Senhora Aparecida tatuada no peito...”

Quebracabeça

169

83

Não tinha os dentes na frente. Traficante e

“...será que o senhor

receptor. Era o mais

podia espiar o

Ezequiel dos

respeitado destilador de

Ezequíel, um

Mulher, motel

Santos

maria- louca do pavilhão

considerado meu que

e gandaia

Oito. A fama de sua

está padecendo do

pinga atraía fregueses

pulmão, lá no Oito?”

176

da cadeia inteira. “Lembrou-se do Alcindo, de Santo Alcindo, conhecido como

Tinha fama de melhor

André, que havia

Mulher, motel

piloto do ABC.

cumprido pena com ele

e gandaia

Ayrton.

179

na cadeia de Presidente Wenceslau.” Assaltava com o

Miguel

parceiro, Antônio

“Miguel assaltava com

Carlos. Foi traído pela

o parceiro, Antônio

mulher com um

Carlos.”

Miguel

185

Miguel

185

Miguel

188

Miguel

188

policial. Parceiro de Miguel. Foi Antônio Carlos

ele quem contou a Miguel que sua mulher

“Miguel assaltava com o parceiro, Antônio Carlos.”

o traía. Esposa de Miguel, que Marli

o entregou ao amante

“-Que pergunta, Marli!”

policial. Esposa de Antônio Dina

Carlos, que tinha o cabelo oxigenado e era muito ciumenta.

“Uma loira oxigenada apareceu na janela. Era Dina, mulher dele.”

84

Assaltante de banco e carro- forte, corpo forte, Claudiomiro

com três cicatrizes. Tinha 35 anos, deixou a mulher grávida e o

“Claudiomiro diz que só foi preso porque

Um abraço

191

tinha mulher e filho.”

menino pequeno. Irmã do meio de Deusdete que foi Francineide

molestada por dois homens.

“...Francineide, irmã do meio de Deusdete, na volta da padaria, foi

Deusdete e Mané

198

molestada por dois marginais da vila.” “Os corpos eram de

Deusdete

É preso após assassinar

Deusdete e Mané de

os agressores da irmã.

Baixo, criados na

Deusdete e

Morre queimado na

mesma vizinhança,

Mané

penitenciária.

amigos inseparáveis até

198

os catorze anos...” Amigo de Deusdete,

Mané de Baixo

inseparáveis até os 14

“Os corpos eram de

anos. Condenado a 8

Deusdete e Mané de

anos e seis meses por

Baixo, criados na

Deusdete e

roubo de carga e

mesma vizinhança,

Mané

formação de quadrilha.

amigos inseparáveis até

Morre esfaqueado na

os catorze anos...”

198

penitenciária.

Fuinha

Detento viciado em crack.

“Na noite da tragédia, apareceu o Fuinha no guichê da cela:”

Deusdete e Mané

200

85

-

Altão, forte, o rapaz

“Na sala de consulta,

tinha fama de assaltante

eu louco para ir

destemido, ligação com

embora, entrou um

bicheiros, cicatriz no

altão, forte,

supercílio direito e era

devagarinho, as pernas

subencarregado da

abertas e as mãos

Faxina do pavilhão

amparando os

Oito, o dos reincidentes.

testículos.”

Amor de mãe

201

Amor de mãe

202

Amor de mãe

202

Amor de mãe

202

“Numa delas, um exmecânico com Ex- mecânico com -

caquexia associada à AIDS.

caque xia associada à AIDS conseguiu tirar a mão esquálida da algema...”

Craqueiro com tuberculose avançada, Romário

que fugiu do hospital. Viciado em crack, voltou e morreu dois

“Na outra, Romário, um craqueiro com tuberculose ava nçada, pulou o alambrado do Hospital Central...”

meses depois. Ladrão de longa carreira. Assaltante de Lula

banco responsável pelas pequenas operações na enfermaria. Morreu de overdose de crack.

“...mandei chamar o Lula, responsável pelas pequenas operações da enfermaria, assaltante de banco...”

86

“Fui apresentado ao

-

“Alemãozinho”,

Lula no ambulatório

sardento, tinha uma

por causa de um

água de asas abertas

alemãozinho sardento

tatuada nas costas.

com uma facada na

Lula

209

Lula

209

Lula

209

Margô Suely

213

Margô Suely

214

região glútea.”

Ferrinho

Chefe de quadrilha,

“Baleados, ele e o

rapaz miúdo. Enforcou-

chefe da quadrilha, um

se com um lençol na

rapaz miúdo chamado

cela em menos de um

Ferrinho, chegaram no

mês.

Carandiru.” “Bandeco, figura

Bandeco

Detento do Cinco que

popular do Cinco, que

fala parecendo uma

fala feito metralhadora,

metralhadora.

diz que nada é tão gratificante:”

Travesti que usava sainha agarrada, bustiê Margô Suely

e tinha silicone nas coxas. Teve um caso com outro detento.

“Margô passou três meses no distrito, numa cela com 32 homens, e ninguém abusou dela.”

Travesti mais velho, de rosto assimétrico devido

Zizi

ao deslizamento do

“Na parte de cima do

silicone injetado na

beliche morava a Zizi,

região malar. C uidava

travesti mais velha...”

da cozinha, limpeza, lavava e passava.

87

Travesti que briga com Leidi Dai

Margô Suely, que é cinco anos mais velho.

“Na cama, vestindo as meias de lã que eram

Margô Suely

215

Cozinha Geral

219

Cozinha Geral

219

Cozinha Geral

219

suas, estava deitada Leidi Dai...”

Tinha feito mais de 200 assaltos e dois assassinatos, magro, de cabelos curtos por igual. Zelão

Cordial no trato e fama de violento na reação. Comandava a Cozinha

“Zelão, Flavinho e Capote comandavam a Cozinha Geral com mão de ferro.”

Geral. Condenado a mais de 30 anos. Marginal temido, com três assassinatos na ficha, baixo e magro, Flavinho

“Zelão, Flavinho e Capote comandavam a

com olhos negros. Comandava a Cozinha Geral. Condenado a

Cozinha Geral com mão de ferro.”

mais de 30 anos. Marginal temido, assaltante com ar de

Capote

revolta no rosto, não

“Zelão, Flavinho e

tinha os dentes da

Capote comandavam a

frente. Comandava a

Cozinha Geral com

Cozinha Geral.

mão de ferro.”

Condenado a mais de 30 anos.

88

“Um funcionário

Seu Pires

Diretor do Pavilhão

atendeu e trouxe o

Oito, de cabelos

recado em voz baixa

grisalhos.

para o seu Pires, o

Reencontro

223

diretor do pavilhão:” De pele branca como a neve, é de uma família Valda

de bem, em Santana,

“Zé era casado com

que nunca aceitou seu

duas mulheres, Valda e

romance com Zé da

Maria Luísa:”

Zé da Casa

227

Verde

Casa Verde por ele ser negro. Passista da Império da

Maria Luísa

Casa Verde. Um sorriso

“Zé era casado com

que iluminava a quadra

duas mulheres, Valda e

inteira, parecia uma

Maria Luísa:”

Zé da Casa Verde

227

deusa de ébano. Ladrão paraplégico com várias passagens pela Febem. Condenado a 48 Neguinho

anos, o rosto talhado como estátua africana,

“Neguinho começou assim: -A minha senho ra mãe

Neguinho

231

Neguinho

232

matou...”

olhos pretos e olhar de poucos amigos. “Um dia, Juciléia, a Juciléia

Irmã mais velha de

irmã mais velha,

Neguinho.

apaixonou-se por um tipo à-toa.”

89

Traficante e assaltante. Carteiro do Sete, sergipano alto, fluente,

Manga

com um vozeirão.

“Manga, um carteiro

Havia fugido da cidade

detido no pavilhão

natal para escapar da

Sete, gostava de

vingança dos irmãos de

conversar comigo - e

uma moça que dizia ter

eu com ele.”

Manga

237

Manga

238

Manga

238

Manga

239

Manga

240

perdido a virgindade com ele. Foi acusado da morte de Zóio Vesgo. “Então, entrou em cena a tal de Sonha, uma Traficante, vizinha de Sonha

Manga, com quem negociava drogas.

vizinha com quem Manga mantinha relacionamento comercial:”

Genival

Estuprador, viciado,

“Nesse momento

freguês de Manga fora

delicado, Genival, um

do presídio.

de seus fregueses...” “Quando virou a rua da

Águas Turvas

Viciado em maconha,

Glória na direção da

esfaqueado por Manga

praça João Mendes, em

fora do presídio.

sua direção veio o Águas Turvas:” “...com um rapaz que

Boca-Larga

Comparsa de Manga.

atendia pelo vulgo de Boca-Larga.”

90

Irmão de Águas Turvas, Zóio Vesgo

que entrou em uma briga com Manga.

Batata

“-O irmão do Águas Turvas, cujo vulgo era

Manga

240

Manga

241

conhecido como Zóio Vesgo.”

Comparsa de Manga,

“-Passado um mês, um

matou Zóio Vesgo com

truta meu, o Batata, que

três tiros.

roubava...” “-Seu Lopes, conheço

Seu Lopes

Diretor de disciplina.

um certo ladrão que

Começou a carreira na

entrega o dono do cano

portaria do Nove.

para o senhor em troca

Veronique, a 250 japonesa

de um bonde...” Trabalhava na Arnaldo

enfermaria.

“Cheguei no ambulatório e o

Nego-Preto

252

Nego-Preto

253

Nego-Preto

253

Nego-Preto

253

Arnaldo não estava.” Assaltante criado na

Nego-Preto

periferia, tinha muitos

“No final do

irmãos. Seu pai ficou

ambulatório mandei

preso por nove anos.

chamar o rapaz que

Preocupava-se com o

acabou com a briga.

filho mais velho, que

Nego-Preto a seu

era adolescente sem

dispor, disse ele.”

juízo. Vizinho e comparsa de Marlon Nego-Preto.

“Marlon, meu vizinho de barraco passou na casa do Escovão.”

Comparsa de Nego Escovão

Preto que foi morto por ele após durante uma partilha.

“Marlon, meu vizinho de barraco passou na casa do Escovão.”

91

Bom Cabelo

Pertencia a um grupo

“- Numa boca de fumo

fortemente armado.

na favela da Mimosa,

Comprou os objetos

perto da Fernão Dias,

roubados por Nego -

para um elemento que

Preto, Escovão e

atendia pelo vulgo de

Marlon.

Bom Cabelo.”

Nego-Preto

255

Nego-Preto

257

Olho por olho

258

Rapaz novinho, filho de

-

Nego-Preto, tinha a pele

“...quando cruzei o

mais clara que a dele.

pátio do pavilhão, ele

Condenado a 3 anos e 2

conversava sério com

meses por assalto a mão

um rapaz novinho...”

armada. Assaltante que tinha sorriso alvo e dentição perfeita. Malandro no Charuto

jeito de andar, falar e olhar. Condenado a 16

“Charuto entrou com o dedo enterrado numa cebola cozida.”

anos, nesta segunda passagem pela prisão. Tinha duas mulheres. “Dois anos depois do

Zoinho

Ladrão estrábico,

entrevero com o rato,

internado com sarna,

ele convenceu o

viciado em crack.

Zoinho, um ladrão

Paixão arrebatadora

260

estrábico...”

-

Amigo de Charuto,

“...com ar cerimonioso,

narigudo, felliniano.

acompanhado de um

Paixão

Comprou o colchão de

companheiro narigudo,

arrebatadora

Zoinho e pegou sarna.

felliniano:”

260

92

A outra mulher de

“...o grande eu não sei, porque ele vive com a

Rosane

Charuto, viciada em crack. Mãe de seu primeiro filho.

Rosane, minha outra mulher, e ela é

Paixão

261

arrebatadora

fumadora de crack.” “No quarto dessa

Dona Joana

Senhora traficante.

senhora, dona Joana,

Paixão

Charuto entregou a

arrebatadora

261

droga...” “...e sentou para Seu Machado

Traficante que morava

conversar com seu

Paixão

com dona Joana.

Machado, um senhor

arrebatadora

261

que morava com ela.”

Rosirene

Mulher de Charuto,

“-O pequenininho eu

negra de lábios finos,

não quero ver, porque

Paixão

nariz empinado, bunda

ele está bem com a avó,

arrebatadora

de escola de samba.

a mãe da Rosirene.”

261

“Rosirene confessou Amigo de Charuto que Mato Grosso

o traiu com Rosirene, com quem tinha planos

estar namorando um amigo dele, Mato Grosso, o dono das

de ir para Ponta Porã. pedras...”

Paixão arrebatadora

264

93

Mulato de 70 anos, rosto vincado e cantos grisalhos na carapinha. Valdomiro, conhecido como seu Valdo

Respeitado no presídio, nasceu em uma ladeira de terra do Pari, neto de uma avó racista que

“Seu Valdomiro é um mulato de rosto vincado e cantos grisalhos na

Seu 270 Valdomiro

carapinha.”

discriminava a mãe dele, negra. Preso pela morte do baiano. “...tomava conta do Betina

Mulher ciumenta de seu

estande de tiro ao alvo

Seu

Valdo.

e vivia amigado com a

Valdomiro

271

Betina...” Amigo de seu Valdo. Joca

Experiente na sinuca e com mulheres.

“No bar ele encontrou o Joca, que lhe pagou

Seu

um rabo-de-galo para

Valdomiro

273

acalmar...” Mulata de pernas torneadas e rebolado de parar a feira. Esposa de Cida

um baiano ciumento,

“-O que você aprontou

Seu

pivô da briga entre ele e

com a Cida?”

Valdomiro

273

Valdo. Depois, iniciou romance com seu Valdo. Baiano ciumento, que brigou com seu Valdo por causa de sua esposa, Cida.

“...Joca aconselhava o companheiro quando chegou o baiano.”

Seu Valdomiro

273

94

Amigo de Valente, que Salviano

o convenceu a matar um PM. Rapaz franzino de Sapopemba, cruzava as

Pérola Byington

pernas feito mulher e com a mão desmunhecada, roia as

“Um de seus amigos, Salviano, vivia com

O filho

uma mulher que havia

prodígio

275

namorado um PM.” “A meu lado, um rapaz franzino de Sapopemba, conhecido como Pérola

Aprendiz de

279

feiticeiro

Byington...”

unhas o tempo todo. “Pouco depois Dr. Pedrosa

Diretor- geral do

apareceu o dr. Pedrosa,

Aprendiz de

presídio.

diretor-geral do

feiticeiro

279

presídio...” Pertencia a uma facção Barba

da Zona Sul, que brigou com Coelho.

“...o Barba brigou com o Coelho na rua Dez do

O levante

281

O levante

281

O levante

281

segundo andar do Pavilhão...”

Pertencia a uma facção Coelho

da Zona Norte, que brigou com Barba.

“...o Barba brigou com o Coelho na rua Dez do segundo andar do Pavilhão...”

Traficante de cocaína, sócio de uma pizzaria Baiano

no Ipiranga, que se

Comedor

gabava de haver namorado as mulheres mais bonitas do bairro.

“A razão da desavença não foi esclarecida devidamente, de acordo com o Baiano Comedor...”

95

Negro alto e forte, cego Zelito

dos dois olhos pelo gá s lacrimogêneo.

Adelmiro

Nardão

“Zelito, um negro alto e forte que mais tarde

“Adelmiro, um filho de

atarracado, cujo tio

portugueses atarracado,

tinha um desmanche em

cujo tio tinha um

sociedade com um

desmanche na Água

delegado.

Rasa...”

viciado em cocaína.

282

O levante

283

O levante

283

O levante

284

O ataque

286

enfermaria...”

Filho de portugueses,

Ladrão principiante,

O levante

conheci na

“Gente sem experiência de cadeia, como o Nardão...”

Faxina de pescoço

Ôrra Meu

longo como os de

“...o irracionalismo da

Modigliani e sotaque

turba teria

italianado característico

conseqüências

do bairro da Mooca,

desastrosas, como

preso ao trazer maconha

observou Ôrra Meu...”

de Pernambuco. Ladrão de Carapicuíba que sobreviveu a seis tiros de um justiceiro Dadá

contratado pelo s comerciantes do bairro,

“No terceiro andar, ao ouvir o aviso para sair da galeria, Dadá, um ladrão de

único desencaminhado numa família de crentes praticantes.

Carapicuíba...”

96

Faxineiro do Nove, baixinho de fala ágil, Jacó

traficante de cocaína que se orgulhava de fazer negócios por

“No segundo andar, Jacó, um dos faxineiros

O ataque

287

O ataque

288

O ataque

288

O ataque

288

O rescaldo

290

O rescaldo

292

O rescaldo

292

do Nove...”

telefone. Centro-avante do -

Furacão 2000, um dos times do presídio.

“Entre eles, o centroavante do Furacão 2000, que momentos antes...”

Goleiro do Burgo Marcão

Paulista, um dos times do presídio.

“...os cinco gols marcados contra Marcão, goleiro do Burgo Paulista...”

Ladrão de baixa estatura condenado pelo Salário Mínimo

Mínimo, um ladrão condenado pelo

latrocínio de dois policiais em Itapevi. Itaquera

“Nesse xadrez, Salário

latrocínio de dois policiais em Itapevi...”

Detento que sobreviveu

“Ergueram-se o

ao massacre.

Itaquera e ele:” “Quietinho,

Ladrão da favela

preocupado apenas em

Chico

Heliópolis que roubava

preservar a vida, Chico

Heliópolis

firmas, bancos e

Heliópolis, ladrão da

mansões.

favela de mesmo nome...”

Gaguinho

Traficante de maconha,

“Gaguinho, um

apontador de jogo do

apontador de jogo do

bicho, que trabalhava na

bicho e vendedor de

copa dos funcionários.

maconha...”

97

Isaías

Ladrão que perdeu o

“A aversão dos

movimento do braço

policiais pelo sangue

esquerdo por overdose

derramado custou a

de crack e anos depois

vida de vários

morreu de tuberculose

desastrados, como

na enfermaria.

explicou Isaías...”

O rescaldo

292

A partir deste levantamento podem-se verificar algumas dominantes nesse elenco de personagens. As características mais freqüentes das personagens são: a maioria absoluta de personagens é composta por homens adultos em situação de cárcere. Também é possível constatar o baixo índice de personagens jovens e a ausência de crianças de ambos os sexos.

TABELA 4 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR IDADE E SEXO Sexo

Idade¹

Quantidade

Homens

Adultos

188 (sendo 10 travestis)

Jovens

2

Crianças

-

Adultas

14

Jovens

2

Crianças

-

Mulheres

¹ Sendo considerados: adultos, acima de 20 anos; jovens, entre 13 e 20 anos; e crianças, até 12 anos.

98

Outros dados que podem complementar o tema ou questão dizem respeito à situação das personagens. Para tanto, elas foram classificadas em Personagens em situação de cárcere, ou seja, que estão reclusas na Casa de Detenção de São Paulo; Personagens em liberdade, que corresponde às personagens mencionadas nas histórias dos detentos, funcionários e outros; e Não identificáveis, ou seja, que não se pôde constatar sua situação.

TABELA 5 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR SITUAÇÃO Personagens em situação de cárcere

141

Personagens em liberdade

62

Não identificáveis¹

3

¹ Personagens que se encontram dentro da penitenciária, mas que não se pôde verificar se são detentos ou funcionários.

Estes dados confirmam o que estava indiciado já a partir da sinopse do livro e da história do escritor: a personagem dominante na narrativa Estação Carandiru é um adulto masculino recluso. Uma vez tendo definidos os números que indicam a situação das personagens na história, pode-se partir para uma classificação mais detalhada destas personage ns, visando uma melhor análise de suas transposições. No entanto, há outras observações e classificações possíveis antes de se enveredar para as especificidades. A primeira classificação proposta para, ainda, todas as personagens é a que considera a maneir a como são conhecidas pelas outras personagens. Para tanto, criaram-se três categorias, sendo: nome, apelido e não identificado. Foram considerados como nome os apelidos derivados de nome próprio, como aumentativos ou diminutivos (ex: Flavinho, Paulão.). Os nomes femininos dos travestis foram considerados apelidos (ex: Loreta, Patrícia Evelin.). Na categoria não identificado, foram classificados aquelas personagens cujos nomes não foram mencionados na obra, apenas eram identificados por alguma característica (ex: travesti, ladrão, mulato.). Deve-

99

se esclarecer também que, embora algumas personagens tenham tido seu nome mencionado, se eram conhecidas por seus apelidos, foram encaixadas na categoria apelidos, pois o objetivo desta classificação é determinar como eram conhecidas pelas demais personagens e não como foram identificadas na obra.

TABELA 6 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO PELA FORMA COMO ERAM CONHECIDAS PELAS DEMAIS PERSONAGENS NOME

105

APELIDO

71

NÃO IDENTIFICADO

30

Pode-se perceber uma grande ocorrência de personagens que eram conhecidas por seus apelidos (34,5%), embora a maioria (51%) ainda era conhecida por seu nome (ou apelido derivado do nome). No entanto, um dado curioso: 14,5% 7 das personagens da obra literária não apresentavam qualquer identificação denominativa, apenas se pôde identificá-las através de descrições físicas. Uma outra categoria de classificação ainda analisando em um quadro geral, ou seja, sem excluir nenhuma personagem por criação de grupos, que se faz necessária é a a partir de sua raça. Esta classificação é essencialmente importante visto que, na obra cinematográfica, o aspecto visual é, talvez, o maior diferencial da obra literária, sendo assim, considerando uma personagem, a mudança de uma raça para outra pode, de alguma forma, apresentar mudança significativa para a composição daquela personagem. A tabela a seguir apresenta quatro formas de classificação, sendo: negros (incluindo aqui os mulatos), brancos, outros e não verificável. As duas últimas categorias fo ram criadas devido à própria natureza da fonte: 1) como a variedade de raças era muito pequena, não houve necessidade de criar outras categorias; 2) não se pôde verificar a raça de algumas personagens, pois não houve nenhuma descrição do autor.

7

Valores aproximados.

100

TABELA 7 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO PELA RAÇA NEGROS

15

BRANCOS

5

OUTROS

1

NÃO VERIFICÁVEL

185

Sendo assim, temos 7,3% de negros, 2,4% de brancos, 0,5% de outras raças e 89,8%8 , a maioria, de personagens cuja raça (ou raças) não foi mencionada. Da mesma forma, como pôdese verificar uma considerável variedade de vezes em que a droga fazia papel principal dentro do presídio, logo, na história do livro, também se faz necessária uma classificação de usuários de drogas (ou viciados, como mencionado na obra algumas vezes). Deve-se lembrar que muitas personagens faziam a ligação entre o presídio e o “mundo livre” através do tráfico de drogas, portanto, esta listagem refere-se tanto aos usuários em situação de cárcere quanto aos usuários em liberdade. Ao se compor esta categoria, adotou-se os seguintes critérios: apenas as personagens que foram explicitamente descritas como usuários foram classificadas como tal, excluindo assim traficantes ou personagens ligadas aos usuários, mesmo quando sugeriam possível envolvimento com as drogas. As categorias se dividem em: usuários e não usuários ou não especificados. Dentre os usuários, adotou-se a seguinte subdivisão focando a droga de que faziam uso: crack, maconha e outros. Pela baixa ocorrência de outras drogas diferentes das citadas, não houve necessidade de outras subdivisões.

8

Valores aproximados.

101

TABELA 8 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR DEPENDÊNCIA ÀS DROGAS

USUÁRIOS

NÃO USUÁRIOS OU NÃO

20

CRACK

12

MACONHA

2

COCAÍNA

5

OUTROS

1

NÃO ESPECIFICADO

0

186

ESPECIFICADO

Embora o tráfico de droga seja um assunto freqüente na obra literária, apenas 9,7% são apresentados como usuários de drogas, sendo destes, 5,8% de crack, 1% de maconha, 2,4% de cocaína e 0,5%9 de outras drogas. Além do tráfico, outro assunto freqüente na obra é o de doenças, principalmente porque o autor, sendo médico, se envolveu com o presídio por conta de uma ação voluntária contra a epidemia de AIDS entre os detentos. Sendo assim, outra classificação neste sentido pode ser proposta. No entanto, visando uma categorização mais detalhada das personagens, a partir deste ponto, será feita uma divisão em dois grupos: personagens em situação de cárcere e personagens em liberdade (classificação já feita anteriormente). O grupo de personagens que não apresentava situação identificável será excluído das classificações a seguir. Será focado, nesta primeira parte, o primeiro grupo, das personagens em situação de cárcere. Portanto, a listagem a seguir se refere aos detentos 1) que estavam doentes e 2) que não estavam doentes ou esta informação não foi especificada, portanto, não se pôde verificar. Dentre os detentos que apresentavam algum tipo de enfermidade, foi feita uma subdivisão em três categorias especificando o tipo: AIDS, tuberculose e outras. Dentro desta subdivisão foram consideradas todas as doenças apresentadas pelas personagens, podendo haver mais de uma para

9

Valores aproximados.

102

a mesma personagem, portanto, o número total de doentes pode ser menor que o número total de doenças apresentadas.

TABELA 9 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR ENFERMIDADE

DOENTES

NÃO ESPECIFICADO

20

AIDS

7

TUBERCULOSE

5

OUTRAS

8

121

É interessante perceber que, igualmente à tabela de classificação de personagens por dependência às drogas, embora a situação da Casa de Detenção fosse favorável a se pensar o contrário, o número de personagens-detentos que apresentaram enfermidades foi muito baixo, cerca de 14,1%. Embora seja um número baixo, há de se lembrar que alguns não tiveram sua situação especificada, portanto, não foram considerados para classificação. Das subdivisões, a AIDS apresentou maior ocorrência (5% dos presos tinham a doença), seguida da tuberculose (3,6%). Outras doenças foram identificadas, mas nenhuma com número expressivo para uma nova subdivisão. Ainda considerando as personagens em situação de cárcere, temos agora uma categorização por crimes cometidos. Para tanto, criaram-se sete subdivisões, sendo: assalto, assassinato, tráfico de drogas, estelionato, estupro, outros e não especificado. A categoria outros agrupou os crimes especificados, mas que não tiveram um número expressivo para que se criasse uma outra subdivisão, enquanto a categoria não especificado agrupou todos as outras personagens-detentas cujos crimes não foram mencionados durante a obra. Da mesma forma feita ao categorizar personagens por enfermidade, nesta tabela foram considerados todos os crimes cometidos mencionados, portanto o número total de personagens em situação de cárcere pode ser menor do que o dos crimes cometidos.

103

TABELA 10 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR CRIME COMETIDO ASSALTO

59

ASSASSINATO

15

TRÁFICO DE DROGAS

15

ESTELIONATO

5

ESTUPRO

2

OUTROS

2

NÃO ESPECIFICADO

51

A partir deste levantamento, pode-se perceber que o crime mais comum ou mais freqüente entre as personagens do livro é o assalto, correspondente a 39,6% do total de crimes identificados, enquanto tráfico de drogas e assassinato , que aparecem como os próximos crimes mais cometidos, representam apenas 10% cada um. Ainda obtiveram número expressivo os crimes: estelionato (3,3%) e estupro (1,3%). Também representando 1,3%10 das ocorrências estão outros crimes citados na obra e diferentes dos citados anteriormente. Dentre as 141 personagensdententas, 51 delas, ou seja, cerca de 34,2%, não puderam ser identificadas pelos seus crimes, pois não foram mencionados. Como previsto, o número de crimes (149) superou o número de personagens analisadas (141), por terem sido considerados todos os crimes mencionados de todas as personagens. Uma última classificação é proposta para este grupo de personagens: por função dentro do presídio. Por personagens com função deve-se entender aqueles que possuem algum tipo de tarefa dentro da Casa de Detenção, tais como encarregados ou subencarregados da Faxina, da Enfermaria ou da Cozinha Geral, entre outros. Personagens que não possuíam função aparente ou que não se pôde identificar foram classificados na categoria não especificado.

10

Valores aproximados.

104

TABELA 11 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR FUNÇÃO DENTRO DO PRESÍDIO POSSUEM FUNÇÃO

23

NÃO ESPECIFICADO

118

Esta classificação mostra que apenas cerca de 16,3% das personagens-detentos foram descritas como possuindo alguma função dentro do presídio. Ainda considerando as funções, há de se lembrar que algumas personagens foram descritas como funcionários da Casa de Detenção, portanto, uma categorização será proposta para o outro grupo onde estas personagens se encontram: personagens em liberdade. Como todas as personagens deste grupo estão relacionadas de uma forma ou de outra às personagens em situação de cárcere, a tabela a seguir apresentará uma classificação por relação com as personagens em situação de cárcere e/ou a Casa de Detenção. Para tanto, criaram-se três subdivisões: funcionários, parentes e não especificado. Na categoria funcionários, foram consideradas aquelas personagens que foram descritas como funcionários diretos ou indiretos, ou seja, que de alguma forma prestavam serviços ao presídio. Para a categoria parentes, além dos parentes diretos (como pais, irmãos, filhos, etc.), foram consideradas também as amantes, devido ao alto índice de citação destas. Todas as outras personagens que não se encaixaram na categoria acima ou que cujas relações não foram mencionadas, foram classificadas em não especificado.

TABELA 12 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO LIVRO POR RELAÇÃO COM AS PERSONAGENS EM SITUAÇÃO DE CÁRCERE OU COM A CASA DE DETENÇÃO FUNCIONÁRIOS

28

PARENTES (incluindo amantes)

12

NÃO ESPECIFICADO

22

105

Dentre as 62 personagens deste grupo, a maior parte (cerca de 45,1%) é de funcionários diretos ou indiretos do presídio. O restante se divide entre parentes dos detentos e personagens com relações não especificadas (podendo incluir amigos, comparsas ou inimigos): aproximadamente 19,3% e 35,5%, respectivamente. A seguir, será apresentada uma abordagem das personagens do filme Carandiru, categorizando-as de forma semelhante, com objetivo de comparação. Mais à frente, uma análise investigativa das personagens cinematográficas visando encontrar suas personagens literárias de origem.

106

CAPÍTULO IV - O FILME CARANDIRU : SUAS PERSONAGENS

1. CARANDIRU: O FILME

Imagem obtida na web.

Lançado em 2003, Carandiru, é um drama de co-produção entre Brasil e Argentina. O longa, que é baseado na obra literária Estação Carandiru, tem aproximadamente 147 minutos 1 e teve distribuição em parceria pelas produtoras Globo Filmes, HB Filmes e Columbia Tristar no Brasil. Produzido e dirigido por Hector Babenco, co-produzido por Flávio R. Tambellini e Fabiano Gullane, teve Daniel Filho como produtor associado. O roteiro foi feito em parceria entre Vitor Navas, Fernando Bonassi e Hector Babenco. A direção de fotografia ficou de responsabilidade de Valter Carvalho (Central do Brasil, Abril Despedaçado) e a direção de arte, de Clóvis Bueno. André Abujamra fez a trilha sonora e Mauro Alice, a montagem. Na equipe técnica, teve também Caio Gullane na direção de produção, Eliana Soarez na coordenação executiva e Alessandra Casolari na coordenação de pós-produção. Elenco por Vivian Golombek, cenografia de Vera Hamburger, figurino de Cris Camargo, maquiagem de Gabi Moraes, som direto de Romeu Quinto e edição de som de Eliza Paley e Miriam Biderman. Seu elenco foi composto por atores até então pouco conhecidos, mas que hoje ganharam notoriedade, como é o caso de Wagner Moura (Zico), Ailton Graça (Majestade) e Lázaro Ramos

1

Dados retirados do DVD.

107

(Ezequiel). Para completar o quadro de atores: Luiz Carlos Vasconcelos (Médico), Milton Gonçalves (Seu Chico), Maria Luísa Mendonça (Dalva), Aída Leiner (Rosirene), Rodrigo Santoro (Lady Di), Gero Camilo (Sem Chance), Floriano Peixoto (Antônio Carlos), Ricardo Blat (Claudiomiro), Vanessa Gerbelli (Célia), Leona Cavalli (Dina), Caio Blat (Deusdete), Julia Ianina (Francineide), Sabrina Greve (Catarina), Ivan de Almeida (Nego Preto), Milhem Cortaz (Peixeira), Dionisio Neto (Lula), Antonio Grassi (Seu Pires), Rita Cadillac (Rita Cadillac), Enrique Diaz (Gilson), Robson Nunes (Dadá), Bukassa (Locutor), André Ceccato (Barba), Sabotage (Fuinha). Além destes, o filme ainda teve 121 atores no elenco secundário e 8 mil diárias de figurantes 2 . Sua versão para DVD, em edição dupla, traz um disco contendo o filme com a versão cinematográfica, e outro apenas com material extra. No disco especial, podemos encontrar cenas excluídas, erros de gravação, destaques da trilha sonora, filmografia do diretor, notas de produção, bastidores com quatro vídeos sobre as gravações (Making of, Direção de arte, A transformação de Lady Di e Ensaio e preparação do elenco), além de mais quatro vídeos televisivos sobre a Casa de Detenção, incluindo um sobre a implosão da penitenciária em 2002. No disco 1, ainda podemos optar por ver trailers de cinema, ouvir o comentário do diretor ou ver o filme com legendas em português, inglês ou espanhol. Carandiru mostra o dia-a-dia de um médico que faz um trabalho de prevenção à AIDS na Casa de Detenção de São Paulo, conhecida como Carandiru. Lá, ele se vê frente a instalações precárias, epidemias, superlotação. Ao ganhar respeito dos detentos dentro do presídio, suas consultas se tornam momentos de descoberta das mais incríveis histórias daqueles que ali estão reclusos: assaltantes, batedores de carteira, estelionatários, assassinos, estupradores. E, junto com ele, desvenda-se uma organização interna, regida por um sistema de regras informais, onde o julgamento segue às leis do crime, até que o trágico massacre de 2 de outubro de 1992, em que 111 detentos foram mortos, mude tudo. Considerada uma superprodução para os padrões brasileiros, já que teve um orçamento de R$ 12 milhões no total, segundo dados do Diário do Grande ABC, a película teve mais de 4,6 milhões de espectadores3 . Foi o 4º filme mais visto em 2003 no Brasil 4 . O orçamento destinado

2

Dados do portal Adoro Cinema Brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 3 Dados do Diário do Grande ABC. Disponível em: . Acesso em: 4 de março de 2008.

108

ao filme foi de R$ 10 milhões e outros R$ 2,5 milhões foram investidos no lançamento dele, que incluiu 700 trailers e quase mil peças de publicidade financiados pela distribuidora Columbia5 . A GloboFilmes, co-produtora do longa, ficou responsável por toda a campanha televisiva, enquanto à Sony Pictures ficou com a responsabilidade da distribuição internacional. Carandiru arrecadou um total de R$ 9,5 milhões em dez dias de exibição e foi a maior bilheteria desde Lua de Cristal em 1990 6, com mais de 4 milhões de espectadores. O filme de Hector Babenco está em 14º lugar na lista das maiores bilheterias do Brasil 7 . Carandiru recebeu o prêmio Glauber Rocha, concedido pelo 25º Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano de Havana 8 . Também foi premiado em duas categorias no Grande Prêmio Cinema Brasil de 2004: Melhor Diretor (Hector Babenco) e Melhor Roteiro Adaptado. Foi ainda indicado em outras 12 categorias: Melhor Filme, Melhor Ator (Rodrigo Santoro), Melhor Atriz (Maria Luísa Mendonça), Melhor Ator Coadjuvante (Sabotage), Melhor Atriz Coadjuvante (Leona Cavalli), Melhor Figurino, Melhor Maquiagem, Melhor Trilha Sonora, Melhor Direção de Arte, Melhor Montagem, Melhor Som e Melhor Fotografia9 . Além das premiações brasileiras, o filme foi selecionado para a competição oficial do Festival de Cannes de 200310 e para representar o Brasil na premiação do Oscar® de melhor filme estrangeiro9 . O longa ainda deu origem à uma série televisiva chamada Carandiru – Outras Histórias, que narrava fatos anteriores aos do filme. A série foi exibida em 2005 pela Rede Globo9 .

4

Dados do portal Adoro Cinema. Disponível em: . Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 5 Dados da revista Carta Capital, edição 235 de 2003. D isponível em: . Acesso em: 11 de março de 2008. 6 Dados do portal Adoro Cinema Brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 7 Dados do portal Cena Brasilis. Disponível em . Acesso em: 16 de março de 2008. 8 Dados do portal Adoro Cinema Brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 9 Dados do portal Adoro Cinema Brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 12 de fevereiro de 2008. 10 Dados do portal Folha Online. Disponível e m: . Acesso em: 28 de janeiro de 2008.

109

2. CARANDIRU: SUAS PERSONAGENS Como se pode tomar conhecimento no capítulo anterior através das palavras de Drauzio Varella, o livro Estação Carandiru apresenta personagens explicitamente baseados em pessoas reais, no entanto, o mesmo não ocorre em Carandiru, obra cinematográfica. O filme, como foi uma adaptação do livro, se baseia em personagens baseados em pessoas reais, portanto está mais distante da realidade do que o livro do qual partiu. Ambas produções se situam diferentemente na questão transposição e/ou invenção no que tange à criação de personagens: (…) tomando o desejo de ser fiel ao real como um dos elementos básicos na criação da personagem, podemos admitir que esta oscila entre dois pólos ideais: ou é uma transposição fiel de modelos, ou é uma invenção totalmente imaginária. (CÂNDIDO, p. 69, 1998)

Não se pode dizer que as personagens de Carandiru sejam “uma invenção totalmente imaginária”, mesmo porque, o filme se beneficia desta forte relação do livro com a realidade. Carandiru, o filme, está reproduzindo personagens baseadas em uma imagem do real; porém, encontramos outro tipo de personagem no filme: uma espécie de mosaico de personagens encontradas no livro, no qual características de múltiplas personagens se fundem em uma só. (…) o princípio que rege o aproveitamento do real é o da modificação, seja por acréscimo, seja por deformação de pequenas sementes sugestivas. (CÂNDIDO, p. 67, 1998)

Em uma análise preliminar, pôde-se verificar a presença de personagens que foram mantidas no filme de maneira qua se idêntica a que apresentavam no livro, como é o caso de Gilson, que manteve a sua história e suas principais características ao ser transposta à obra cinematográfica. Também se pôde averiguar personagens do filme que são fruto da fusão de dois personagens do livro, como se pode verificar com a personagem Claudiomiro do filme, que tem Miguel como personagem dominante e Claudiomiro como secundário. E, por fim, há personagens, como com Lady Di, que é um mosaico das características das personagens travestis do livro. Objetivando uma classificação das personagens de Carandiru, fez-se esta relação seguinte apresentando um levantamento das personagens. Para tanto, foram criados quatro itens: nome da personagem, descrição elaborada com base nas referências do filme – diálogos e/ou imagens –,

110

capítulo da primeira aparição física da personagem (mesmo que a personagem não dialogue ou interaja com outras) e minutagem, ou seja, em qual momento do filme pode-se verificar a primeira aparição da personagem, expressa em hora, minutos e segundos.

TABELA 13 – RELAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME Nome Moacir, conhecido como Nego Preto

Descrição

Capítulo (1ª aparição)

Minutagem

2. Pequena rebelião

00:01:34

2. Pequena rebelião

00:01:40

2. Pequena rebelião

00:02:17

2. Pequena rebelião

00:02:15

Chefe da Cozinha Geral. Assaltante, assassinou um de seus comparsas após um assalto. Traficante de maconha e viciado em crack, mata

Zico

Deusdete no presídio jogandolhe uma panela de água fervente. É morto a facadas por vários presos. Detento envolvido na confusão

Pimenta

depois da briga entre Lula e Peixeira. Matou o assassino do irmão.

Barba

Dentro do presídio, trabalha na Cozinha Geral e como barbeiro.

Peixeira

Matou o pai de Lula.

2. Pequena rebelião

00:02:20

Seu Pires

Diretor do presídio.

2. Pequena rebelião

00:03:48

2. Pequena rebelião

00:03:50

Médico que fazia um trabalho Médico (Doutor)

de prevenção da AIDS dentro do presídio.

111

Ladrão jovem e inexperiente, Lula

que matou o amante da mulher

2. Pequena rebelião

00:04:18

com 3 tiros. Faz ‘operações’ na enfermaria. Amigo de infância de Zico que Deusdete

foi preso ao matar os

3. Visita explanatória / Consultório

00:10:30

molestadores da irmã. Seu Chico

18 filhos, viciado em balões

3. Visita explanatória /

00:10:55

Consultório Detento paraplégico, que -

vendia comida, produtos de

3. Visita explanatória /

higiene e drogas pelos

Consultório

00:11:53

corredores. Matias, conhecido como

3. Visita explanatória / Auxiliar da enfermaria

Consultório

00:12:24

Sem Chance Antônio Carlos

Assaltante de carro-forte,

3. Visita explanatória /

amigo de Claudiomiro.

Consultório

00:12:26

Assaltante de carro-forte que Claudiomiro

matou dois policiais e a

3. Visita explanatória /

mulher. Pegou tuberculose na

Consultório

00:12:26

cadeia. Alípio

Tem AIDS.

3. Visita explanatória /

00:14:00

Consultório -

Travesti.

3. Visita explanatória /

00:14:40

Consultório -

Ladrão que tem AIDS.

3. Visita explanatória /

00:14:59

Consultório Fuinha

Viciado e traficante.

3. Visita explanatória / Consultório

00:15:14

112

Travesti que um dia fez um -

“programa” em troca de uma

3. Visita explanatória / 00:15:32 Consultório

banana. -

-

Detento que estava com sarna. Funcionário da Portaria que

3. Visita explanatória / Consultório 4. Fim do expediente

00:15:43

00:18:31

não reconhece o médico. Assaltante comparsa de Nego Preto, que o entregou a polícia. Gordo

Morto em uma tentativa de fuga da cadeia, ao entalar no

5. História de Nego Preto

00:21:29

túnel. Escovão

Assaltante comparsa de Nego

5. História de Nego

Preto, assassinado por ele.

Preto

00:21:30

Filho de Nego Preto, presenciou a discussão do pai -

com seus comparsas, que

5. História de Nego

resultou na morte de um deles.

Preto

00:22:01

Mais tarde, é preso e encontra o pai no Carandiru. Dona Graça

Esposa de Nego Preto

5. História de Nego

00:23:53

Preto Cadão

Foge da cadeia por um túnel.

5. História de Nego

00:25:56

Preto Sinval

Mata Gordo por entalar no

5. História de Nego

túnel por onde tentava fugir.

Preto

Dirceu,

Travesti que se ‘casa’ com

conhecido como

Sem Chance na cadeia, já teve

Lady Di

uns 2 mil parceiros.

6. Lady Di / Deusdete

-

00:27:34

113

Viciado em crack, que vive em Ezequiel

dívida, ‘laranja’ da morte de

6. Lady Di / Deusdete

00:30:08

Zico. Josué dos Santos, conhecido como Majestade

Assaltante que levava carros roubados para vender no

7. Majestade, Dalva e

Paraguai. Teve 3 filhos com

Rosirene

00:31:25

Dalva e 1 com Rosirene. Dalva

Mulher de Majestade. Largou

7. Majestade, Dalva e

o noivo por ele

Rosirene

-

Noivo de Dalva.

Sr. Sidney

Pai de Dalva.

-

Mãe de Dalva.

7. Majestade, Dalva e Rosire ne 7. Majestade, Dalva e Rosirene 7. Majestade, Dalva e

00:34:08

00:34:08

00:36:32

00:36:32

Rosirene João

Atendente de bar.

7. Majestade, Dalva e

00:37:49

Rosirene Rosirene

Prostituta amante de

7. Majestade, Dalva e

Majestade.

Rosirene

00:38:10

Estuprador que apanha e é Gilson

estuprado no presídio. Mais

8. Sabotage, Zico e

tarde, é encontrado morto,

Deusdete

00:47:26

enforcado em uma cela. Francineide

Irmã de Deusdete

Célia

Esposa de Antônio Carlos

9. História de Zico 11. Claudiomiro e

00:51:48 01:05:48

Antônio Carlos Esposa de Claudiomiro que o Dina

trai com um policial e o entrega à polícia.

-

Detento locutor

11. Claudiomiro e

01:05:52

Antônio Carlos 12. Rita Cadillac

01:11:09

114

Rita Cadillac

Ex-chacrete, madrinha da Casa

12. Rita Cadillac

01:11:24

de Detenção Catarina

Amiga de Francineide

12. Rita Cadillac

01:14:22

-

Mãe de Deusdete

12. Rita Cadillac

01:14:22

-

Irmã de Ezequiel

13. Dia de visita

01:24:23

Seu Antônio

Pai de Lady Di

13. Dia de visita

01:26:15

-

Mãe de Lady Di

13. Dia de visita

01:26:29

13. Dia de visita

01:27:24

13. Dia de visita

01:27:24

Davilson, conhecido como Dada -

Detento do time de futebol que recebe uma carta de sua mãe com o salmo 91 dias antes do massacre. Mãe de Davilson. Detento que briga com Barba

Coelho

por uma cueca, o que teria

19. Final do

01:55:41

campeonato

causado o massacre.

Em comparação com a listagem anterior – referente ao livro –, podemos constatar uma redução na quantidade de personagens para menos de 25%. Em uma segunda etapa, estas personagens foram classificadas seguindo os mesmos critérios vistos no capítulo anterior. O primeiro critério se refere à idade e ao sexo, apresentado na próxima tabela. Para tanto, as personagens foram distribuídas em Homens e Mulheres; e em cada uma destas categorias, subdivididas em Adultos (as), Jovens e Crianças. Para esta seleção, o critério de determinação de idade utilizado foi de acima de 20 anos para adultos; entre 13 e 20 anos para jovens; e a té 12 anos para crianças. Embora o número de personagens tenha sido reduzido drasticamente nesta adaptação do livro Estação Carandiru, a personagem dominante do filme também é um homem adulto em situação de cárcere. Mais uma vez, pode-se constatar a ausência de personagens crianças. Devese lembrar que, em uma primeira análise, o número mais elevado de jovens não indica necessariamente a criação de novas personagens, visto que, no livro, pela ausência de

115

informações, não se pôde verificar a idade de diversas personagens, enquanto no filme, esta dificuldade é suprida pela imagem.

TABELA 14 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR IDADE E SEXO Sexo

Idade¹

Quantidade

Homens

Adultos

34 (sendo 3 travestis)

Jovens

3

Crianças

-

Adultas

10

Jovens

3

Crianças

-

Mulheres

¹ Sendo considerados: adultos, acima de 20 anos; jovens, entre 13 e 20 anos; e crianças, até 12 anos.

A tabela a seguir apresenta uma classificação das personagens com relação à sua situação, ou seja, se estão reclusas no presídio ou não. Analisando esta listagem, é possível, preliminarmente, apontar uma diferença em relação à transposição das personagens. Enquanto foram averiguados 68,5% de personagens em situação de cárcere no livro; foram encontrados 54% no filme. As personagens em liberdade também apontam diferença significativa, sendo 30%11 no livro e 46% no filme. Ao se analisar a película Carandiru, não se encontrou dificuldades para verificar a situação das personagens, embora, em algum momento na trama, sua situação apresente uma mudança, como especificado na tabela. Deve-se esclarecer que a situação principal, ou seja, a qual a personagem se encontra no começo do filme (e também é a que dura por mais tempo), é a que foi utilizada para a classificação a seguir.

11

Valores aproximados.

116

TABELA 15 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR SITUAÇÃO Personagens em situação de cárcere

27¹

Personagens em liberdade

23²

¹ Sendo que 1 foge do presídio e 4 morrem antes do massacre. ² Sendo que 1 morre e um é preso no final do filme .

Partir-se-á, mais à frente, para uma classificação mais detalhadas destes dois grupos acima descritos, nos moldes do capítulo anterior, visando já uma comparação entre os dados da obra cinematográfica e da literária. Todavia, algumas classificações ainda são propostas para todas as 50 personagens do filme. Pôde-se constatar, no capítulo anterior, que a maioria das personagens da obra literária era conhecida por seu nome, e aquelas citadas sem que recebessem uma denominação, seja por um nome ou apelido, foram a minoria. Este padrão parece se repetir na obra cinematográfica, embora com certo aumento das personagens não identificadas, como se pode averiguar na tabela a seguir. Os critérios de classificação foram os mesmos, sendo: 1) nome: nomes próprios ou os apelidos derivados de nome próprio, como aumentativos ou diminutivos; 2) apelidos: qualquer apelido que não seja derivado de nome próprio , bem como nomes femininos adotados pelos travestis ; e 3) não identificado : nomes que não foram mencionados na obra, mas que se constatou a existência da personagem através da imagem. As personagens que eram conhecidas pelas demais personagens por seus apelidos, mesmo que tiveram seus nomes revelados em algum momento do filme, foram classificados na categoria apelido.

TABELA 16 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME PELA FORMA COMO ERAM CONHECIDAS PELAS DEMAIS PERSONAGENS NOME

21

APELIDO

15

NÃO IDENTIFICADO

14

117

Como visto, as personagens conhecidas pelo nome são a maioria, embora, na obra cinematográfica, representem menos da metade (cerca de 42%), seguidas das perso nagens conhecidas pelo apelido (aproximadamente 30%). As personagens cujos nomes e/ou apelidos não puderam ser identificados somam 28%, um aumento significativo com relação aos cerca de 14,5% destes na obra literária. Outra observação importante é que apenas uma personagemtravesti foi denominada no filme (Lady Di), classificada na categoria apelido, seguindo o mesmo critério adotado no capítulo anterior. Como proposto anteriormente, também as personagens foram classificadas por sua raça, sendo nas categorias classificadas aquelas cuja aparência, comprovada através da imagem, não deixou dúvida sobre sua raça. As personagens que não apareceram na película e/ou sua imagem não foi clara, foram encaixadas na categoria não verificável. As outras três categorias apresentadas na tabela a seguir são: negros, brancos e outros. Na categoria negros, os mulatos também foram considerados para a classificação. Não se verificou a necessidade de criação de novas categorias.

TABELA 17 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME PELA RAÇA NEGROS

18

BRANCOS

31

OUTROS

0

NÃO VERIFICÁVEL

1

Esta classificação, como se pode ver, apresenta grande disparidade com relação à mesma existente no capítulo anterior com relação ao livro. Enquanto mais de 89% das personagens não puderam ter sua raça determinada na obra literária, no filme, apenas 2% ocuparam esta categoria. Esta diferença era esperada pela própria característica da obra cinematográfica, que é essencialmente visual. Entretanto, esta não é a única disparidade nesta tabela com relação à sua

118

correspondente no capítulo anterior: enquanto tê m-se 7,3% de negros e 2,4% de brancos 12 na obra literária, tê m-se 36% de negros e 62% brancos na cinematográfica. A maior parte das personagens de raça branca presentes no filme pertence ao gr upo de personagens secundárias e se encontra na categoria personagens em liberdade, citada anteriormente. A última classificação visando o quadro geral (todas as personagens da obra) é a por dependência às drogas. Nesta tabela, foram classificadas na categoria usuários todas as personagens cujo vício às drogas foi explícito na obra; aquelas cujo vício era apenas sugerido ou que não possuíam nenhuma menção à dependência foram encaixadas em não usuários ou não especificado. Uma subdivisão foi criada na categoria usuários, com quatro categorias especificando o tipo de droga consumida, sendo elas: 1) crack; 2) maconha; 3) outros e 4) não especificado. Na categoria outros, foram classificadas personagens-usuários cujas drogas a que dependiam não se encaixaram nas categorias 1 e/ou 2. Na não especificado, personagens-usuários cujas drogas a que dependiam não foram mencionadas, apenas houve menção ao vício. Deve-se observar que o número total das subdivisões pode superar o número de usuários, pois foram considerados todos os tipos de drogas usados por todos usuários.

TABELA 18 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR DEPENDÊNCIA ÀS DROGAS

USUÁRIOS

NÃO USUÁRIOS OU

4

CRACK

2

MACONHA

0

COCAÍNA

0

OUTROS

0

NÃO ESPECIFICADO

2

46

NÃO ESPECIFICADO

Pode-se observar que na obra cinematográfica, assim como na literária, o número de dependentes de drogas é baixo: 9,7% no filme e 8% no filme. Outro ponto em comum é a droga a 12

Valores aproximados.

119

que mais estão dependentes: o crack, sendo 5,8% no livro e 4% no filme. Nenhum outro tipo de droga foi mencionado no filme. A seguir, a exemplo do capítulo anterior, serão apresentadas classificações para dois grupos distintos divididos na tabela 15: personagens em situação de cárcere e personagens em liberdade. Novamente, o grupo de personagens cuja situação não se pôde identificar será excluído destas classificações que seguem. Primeiramente, trabalhar-se-á com o grupo cujas personagens se encontram em situação de cárcere. Nesta primeira categorização, objetiva-se verificar quantas personagens estavam enfermas durante o filme (tanto em uma situação contínua quanto temporária). Sendo assim, a listagem a seguir se refere aos detentos 1) que estavam doentes e 2) que não estavam doentes ou esta informação não foi especificada. Também se opto u por uma subdivisão na categoria dos detentos que apresentavam algum tipo de enfermidade: 1) AIDS, 2) tuberculose e 3) outras. Nesta tabela, consideraram-se todas as doenças apresentadas pelas personagens, ou seja, se uma personagem apresenta dois tipos de doenças, o número de enfermos será inferior ao número de enfermidades.

TABELA 19 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR ENFERMIDADE

DOENTES

NÃO ESPECIFICADO

4

AIDS

2

TUBERCULOSE

1

OUTRAS

1

23

Pode-se verificar, com esta última tabela, q ue apenas cerca de 15% das personagens foram diagnosticadas com alguma doença. Destas, aproximadamente 8% apresentaram a AIDS como enfermidade, as restantes dividiram-se igualmente entre tuberculose e outras. Estes resultados seguiram a tendência da mesma classificação para a obra literária, onde tinha-se cerca de 14,1% de enfermos, a maioria infectados pela AIDS, seguida de tuberculose. Em ambas as obras,

120

nenhuma outra enfermidade teve destaque significativo para se fazer necessária a abertura de uma nova categoria. Adiante, ainda considerando para a classificação somente as personagens em situação de cárcere, propõe-se uma categorização por crime cometido. Todos os crimes cometidos pelas personagens-detentas foram considerados, mesmo havendo a ocorrência de mais de um crime por personagem, sendo assim, o número total de crimes cometidos pode exceder o número de personagens. Para esta categoria, criaram-se sete subdivisões (as mesmas adotadas na classificação da obra literária): 1) assalto; 2) assassinato; 3) tráfico; 4) estelionato; 5) estupro; 6) outros e 7) não especificado.

TABELA 20 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR CRIME COMETIDO ASSALTO

6

ASSASSINATO

7

TRÁFICO DE DROGAS

2

ESTELIONATO

0

ESTUPRO

1

OUTROS

0

NÃO ESPECIFICADO

14

Diferentemente do encontrado no levantamento dos dados do livro, na obra cinematográfica, o assassinato foi o crime mais freqüentemente cometido pelas personagens (cerca de 26%), seguido do assalto, que representou aproximadamente 22%. A maior ocorrência nesta categoria, no entanto, é de crimes não especificados durante a película, que representam por volta de 52% 13 do total dos crimes. As categorias estelionato e outros foram abertas somente com

13

Valores aproximados.

121

o intuito de comparação, já que as tabelas seguem as mesmas categorias e subdivisões do capítulo anterior. A seguir, tem-se a última classificação envolvendo o grupo personagens em situação de cárcere: por função dentro do presídio. Aqui, por função, entende-se por uma tarefa designada à personagem, como encarregados ou subencarregados da Faxina, da Enfermaria ou da Cozinha Geral, entre outros.

TABELA 21 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR FUNÇÃO DENTRO DO PRESÍDIO POSSUEM FUNÇÃO

4

NÃO ESPECIFICADO

23

O resultado desta classificação é correspondente ao encontrado na classificação das personagens da obra literária, onde pouco mais de 16% foram apresentadas como tendo alguma função dentro do presídio. Aqui, têm-se cerca de 15% nesta mesma situação. No entanto, há de se lembrar que apenas as personagens com funções claras – mostradas ou mencionadas por elas mesmas ou por outras personagens – foram consideradas nesta contagem. Por fim, segue uma classificação proposta para o outro grupo de personagens: em liberdade. As personagens deste grupo são apresentadas sempre com alguma ligação direta ou indireta com à Casa de Detenção ou seus detentos, portanto, a seguir, será apresentada uma classificação das personagens em liberdade por relação com as personagens em situação de cárcere e/ou a Casa de Detenção. Foram propostas três categorias: 1) funcionários – diretos ou indiretos, como prestadores de serviço para o presídio; 2) parentes – sendo as amantes consideradas nesta categoria; e 3) não especificado – que possa ter relação direta ou indireta, mas que não tenha sido especificado sua natureza ou que não se encaixe nas classificações anteriores, como comparsas de crime, amigos, vizinhos, etc.

122

TABELA 22 – CLASSIFICAÇÃO DE PERSONAGENS DO FILME POR RELAÇÃO COM AS PERSONAGENS EM SITUAÇÃO DE CÁRCERE OU A CASA DE DETENÇÃO FUNCIONÁRIOS

3

PARENTES (incluindo amantes)

14

NÃO ESPECIFICADO

6

Nesta coleta de dados, nota-se uma disparidade com os mesmos dados colhidos com relação às personagens do livro. Enquanto lá a maior parte era de funcionários, aqui tem-se os funcionários como a minoria. Em dados quantitativos teríamos, respectivamente no livro e no filme: 1) funcionários, 45,1% contra 13%; 2) parentes, 19,3% contra 60,8%; e 3) não especificado, 35,5% contra 26% 14. A partir destes levantamentos e das observações pre liminares, é possível perceber algumas similaridades e algumas discrepância s com relação às personagens do livro Estação Carandiru e do filme Carandiru. No capítulo seguinte, será apresentada uma análise das personagens principais e secundárias da obra cinematográfica a fim de encontrar sua ou suas personagens de origem na obra literária.

14

Valores aproximados.

123

Capítulo V – As personagens de Carandiru: uma análise

Imagem obtida na web.

1. As personagens principais Antes que se possa partir em busca da identificação das personagens principais – ou protagonistas – das obras analisadas, é importante relembrar a definição de personagem proposta por Massaud Moisés. Segundo o autor, personagens são “seres fictícios construídos à imagem e semelhança dos seres humanos: se estes são pessoas reais, aqueles são ‘pessoas’ imaginárias; se os primeiros habitam o mundo que nos cerca, os outros movem-se no espaço arquitetado pela fantasia do prosador” (1974, p. 396). Aqui, no caso de Estação Carandiru, têm-se não apenas personagens imaginário s, mas personagens que foram efetivamente baseados em pessoas reais, através de um livro-relato sobre o contexto no qual essas pessoas estavam inseridas. No entanto, é proposta deste estudo verificar se as personagens adaptadas na obra cinematográfica Carandiru compartilham das mesmas características – físicas e psicológicas – e das mesmas histórias que as personagens relatadas na obra de Drauzio Varella. Sendo personagens seres fictícios construídos à semelhança do homem, que habitam um mundo imaginário e nele praticam ações, personagens principais são aquelas que estão no centro destas ações. Portanto, para este estudo, será utilizada a acepção número 2 para protagonista do dicionário Aurélio (1975, p.1148): 2. (do grego protagnistés, "o principal lutador") – pessoa que desempenha ou ocupa o primeiro lugar num acontecimento. Desta forma, é possível determinar quem são as personagens principais em cada obra analisada. Os critérios número de páginas em que a personagem aparece e minutagem em que a

124

personagem aparece foram descartadas como padrão de análise para este estudo por não serem correspondentes, uma vez que as obras não têm uma seqüência similar (uma é formada por relatos e a outra, por uma história dramatizada).

1.1 As personagens principais de Estação Carandiru

Imagem de Drauzio Varella obtida na web.

De acordo com a acepção aceita para este trabalho, há apenas uma personagem principal na obra literária: o narrador, neste caso, o próprio Drauzio Varella, já que o livro se trata de experiências reais do médico. A narração em primeira pessoa, interligando-o com todas as outras personagens, o coloca no centro das ações, por diversas vezes sendo o único elo entre personagens, fazendo a história acontecer e as personagens aparecerem conforme suas ações se desenvolvem. Nenhuma outra personagem tem uma dimensão tão expressiva quanto o próprio narrador. Ainda que, de fato, algumas personagens tenham recebido um relato mais extenso de suas ações, elas não estavam inseridas no centro da ação principal e não serviam como ponte para introdução de outras personagens.

1.2 As personagens principais de Carandiru Já na obra cinematográfica pode-se observar quase uma inversão: a participação do narrador é reduzida e algumas personagens ganham destaque. As personagens não ganham vida através do narrador, mas têm vida própria. O próprio Médico, antes mais um narrador que uma personagem que interage com as demais, agora pouco narra e muito interage, mais ainda apresenta as demais personagens, seja direta ou indiretamente.

125

Não apenas uma, na obra cinematográfica, têm-se 10 personagens que estão no centro das ações, que conduzem a história, que funcionam como o elo entre as demais personagens. Elas são: 1. Deusdete; 2. Zico; 3. Majestade; 4. Sem Chance; 5. Lady Di; 6. Nego Preto; 7. Seu C hico; 8. Ezequiel; 9. Peixeira; 10. e Médico.

Se houve quase uma inversão de papéis e estas personagens ganharam força, de onde vieram os elementos que tornaram isso possível? Para descobrir isso, primeiramente, é necessário entender estas personagens: suas características e suas histórias; só então poder-se-á determinar de onde elas vieram.

1.2.1. Deusdete

Imagem de Deusdete interpretado por Caio Blat obtida na web.

Deusdete é a mais jovem das personagens. Jovem branco, de aparência franzina e cara de menino, foi criado na periferia com a irmã Francineide e o amigo Zico, que foi adotado pela mãe de Deusdete após a sua mãe fugir de casa. Ele sempre lutou para não fazer parte do crime, mas seu destino muda na noite em que sua irmã chega em casa chorando, desesperada e se tranca no

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banheiro. Deusdete a confronta e descobre que Francineide fora agredida e molestada por dois homens. Ele resolve dar parte na polícia, mas os agressores descobrem e querem matá- lo. Ele leva o problema até Zico, que já havia encontrado seu caminho no crime, mas não aceita que o amigo resolva o problema. Deusdete, então, pede a Zico que lhe arranje uma arma para se defender, acreditando que não precisará usá- la. No entanto, os agressores encontram Deusdete, ameaçando agredi- lo com barras de ferro. Antes que possam agir, ele saca a arma e mata um deles; o outro escapa, mas Deusdete o persegue e se esconde, esperando que o agressor se sinta seguro e apareça. Quando o agressor acredita estar a salvo, Deusdete surge pelas costas, chama-o e atira quando ele se vira. Preso por homicídio, é levado à Casa de Detenção de São Paulo, onde reencontra o amigo de infância. Zico lhe dá proteção e arranja para que Deusdete fique em sua cela. A maior parte do tempo, Deusdete passa lendo as cartas da irmã, sem interagir com os outros detentos nem se envolver no sistema interno por eles criado. Ele sairia de lá aos 48 anos, porém, o destino trágico encontra os amigos dentro do Carandiru: Zico, em uma alucinação devida ao consumo de crack, pega uma panela de água fervente e a despeja em Deusdete, que estava deitado, dormindo em sua cama, matando-o.

1.2.2 Zico

Imagem de Zico interpretado por Wagner Moura obtida na web.

Traficante e viciado, Zico comprava maconha em Pernambuco antes de ser preso. Foi criado pela mãe de Deusdete e Francineide depois que sua mãe foi embora de casa e não voltou mais. Zico sempre cuidou do amigo como se fosse, de fato, um irmão mais velho, inclusive salvando-o uma vez no rio, onde Deusdete quase morreu afogado. Guardava sentimentos por Francineide, de quem sempre perguntava, mas nunca chegou a se declarar. No Carandiru, reencontrou o amigo de infância, a quem deu abrigo em sua cela. Traficava dentro do presídio

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também e passou a consumir crack, que lhe dava freqüentes alucinações. Comprava as drogas de Majestade para revender. Ezequiel, um de seus “clientes”, estava em dívida com ele. Zico, então, resolveu pedir a Nego Preto autorização para matá- lo. No entanto, Zico não teve coragem de fazê-lo, alegando que só lhe restavam dois anos para sair. Isto fez com que Zico virasse motivo de chacota no presídio. Em uma de suas alucinações, pensando estar sendo perseguido, ameaça Deusdete com uma faca. Em outra, pega uma panela com água fervente e a despeja em cima do amigo, enquanto ele dormia, ocasionando em sua morte. Após este fato, uma “comitiva” é reunida para decidir o que será feito a respeito. Em uma cilada, Zico é encurralado e encapuzado, e recebe diversas facadas de vários detentos e, conseqüentemente, morre.

1.2.3 Majestade

Imagem de Majestade interpretado por Ailton Graça obtida na web.

Josué dos Santos, um homem negro conhecido como Majestade, roubava carros importados e vendia-os no Paraguai. Foi sentenciado a 16 anos no Carandiru, mas conseguiu reduzi- los para 10 anos. No presídio, virou traficante. Com jeito de malandro, simpático e sorridente, um dia, ao esconder drogas dentro do vaso sanitário de sua cela, foi mordido por um rato. Para conseguir que o animal largasse seu dedo, mordeu- lhe o crânio. Depois, foi à enfer maria, onde foi atendido por Lula. Majestade tinha duas mulheres, as quais conheceu antes de ser preso. A primeira, Dalva, uma jovem branca e loira, estava noiva quando o conheceu. Ela assistia à partida de futebol do noivo, quando Majestade aparece em seu carro e diz que se casará com ela e que terão um filho de cada cor. Quando o noivo aparece para saber o que ocorre, Majestade saca a arma e atira para o lado, afugentando o noivo de Dalva. Ele diz a ela que o espere em casa no dia seguinte com a

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família, pois ele lhe pedirá em casamento. Na casa de Dalva, Majestade encontra o preconceito da família e o pai dela proíbe o casamento, porém, Majestade saca a arma novamente e os faz refém na sala de jantar. Ele anuncia que eles vão se casar de qualquer jeito e “rouba” Dalva. Um dia, em um bar, com Dalva, Majestade vê a mulata Rosirene (que estava consumindo drogas) e se interessa por ela. Ele larga Dalva dançando sozinha e vai falar com Rosirene. Diz que a levará para a praia no domingo e que pegasse seu biquíni, quando Dalva chega para ver o que acontece. As duas discutem e Majestade vai embora com Dalva. Ele se dividia entre as duas durante a semana: sua casa com Dalva e um quartinho que alugou perto da antiga rodoviária para se encontrar com Rosirene, que era prostituta. Teve três filhos com Dalva e um com Rosirene. Entretanto, a vida boa de Majestade acaba em um dia de visita, quando não consegue evitar o encontro de suas duas mulheres. Elas, então, o forçam a decidir com qual das duas ele quer ficar.

1.2.4 Sem Chance

Imagem de Sem Chance interpretado por Gero Camilo obtida na web.

Matias, mais conhecido pela frase com a qual termina a maioria de suas falas: “sem chance”, é um ladrão escolado, que se destaca por sua boa argumentação e sua fala distintamente superior à dos demais detentos. Sem Chance se torna ajudante do Médico na enfermaria, coletando sangue dos detentos para o teste de HIV. Em uma destas coletas, Sem Chance se mostra particularmente interessado em um paciente: é Lady Di, um travesti delicado e de presença marcante. Os dois iniciam um romance e Sem Chance resolve fazer o exame de HIV também. Ao receberem o resultado, apreensivos, hesitam em abrir o envelope, mas quando o fazem, descobrem que ambos não têm o vírus e resolvem se casar. No entanto, antes de se casarem, Sem Chance fica sabendo que ganhará sua liberdade e fica triste em ter que deixar Lady Di sozinho no presídio. Eles decidem se casar mesmo assim e esperam até o dia de visita para

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pedir a benção dos pais de Lady Di, que não lhes concedem, pois não aceitam a vida que o filho vive. A “comunidade” interna de gays e travestis organiza o casamento dos dois, com direito a música (Ave Maria, cantada por um dos detentos), vestido de noiva e alianças. Prestes a sair do presídio, Sem Chance sonha em montar seu próprio consultório com o que aprendeu com o Médico.

1.2.5 Lady Di

Imagem de Lady Di interpretado por Rodrigo Santoro obtida na web.

O travesti com nome de celebridade, Lady Di, entra no consultório improvisado do Médico dentro do Carandiru para descobrir se tem o vírus do HIV, confessando haver tido por volta de 2 mil parceiros sexuais. Ele também admite fumar maconha de vez em quando. Na consulta, o Médico lhe informa que o silicone que ele tem nos seios não é apropriado para aquele uso, mas Lady explica que este foi o único que seu dinheiro pôde comprar. Quem retira seu sangue para o exame é Sem Chance, com quem Lady logo inicia um romance. Os pais de Lady Di não aceitam a vida que o filho escolheu, insistindo que o nome dele é Dirceu. Dos dois, a mãe é a mais flexível, tentando, inclusive, convencer o marido de que a felicidade do filho é o mais importante. Mesmo assim, Seu Antônio continua irredutível. Lady Di vive seu conto de fadas dentro do presídio, onde se “casa” vestid o de noiva com Sem Chance.

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1.2.6 Nego Preto

Imagem de Nego Preto interpretado por Ivan de Almeida obtida na web.

Chefe da Cozinha Geral, Nego Preto, como Moacir é conhecido, é uma espécie de juiz das desavenças internas. Por ele, passa decisões como negociação de dívida e autorização para matar alguém lá dentro. Preso por assassinato, tem ainda mais uns anos para ganhar sua liberdade. Quando solto, praticava assaltos com os comparsas Escovão e Gordo. Após um destes assaltos, a uma joalheria, que havia ocorrido bem, “sem nenhum tiro”, houve uma desavença entre os assaltantes, que culminaria na prisão de dois deles. Na hora da divisão das jóias, Nego Preto desconfia que Escovão esconde uma arma na mão sob o paletó e o mata. Imediatamente, Gordo saca a arma e aponta para Nego Preto, revelando que o plano era ele matá- lo para fazer a partilha somente com Escovão, mas Gordo não tem coragem de atirar. Eles carregam o corpo de Escovão até o córrego e o jogam lá. A polícia chega até Gordo, que, com medo, acaba entregando o comparsa pelo assassinato. Os dois são presos e levados para a Casa de Detenção de São Paulo, onde Gordo morre a facadas ao entalar em um túnel por onde vários detentos estavam fugindo. Tempos depois, Nego Preto é surpreendido ao ver seu filho no Carandiru, agora como um dos detentos.

1.2.7 Seu Chico

Imagem de Seu Chico interpretado por Milton Gonçalves obtida na web.

Pouco se sabe sobre Seu Chico, um senhor negro, apaixonado por balões, que há anos vive no Carandiru. Pai de 18 filhos, tem uma história comovente de como o crime pode

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desestruturar uma família. Vive isolado dos demais detentos e nunca recebe visitas. Não se sabe qual ou quais crimes cometeu, somente que está na dependência do juiz para ganhar sua liberdade. Após haver falado com sua filha ao telefone, em uma conversa com Seu Pires, diretor do presídio, Seu Chico pede que lhe fosse concedida uma autorização para que sua filha caçula, que resolveu visitá- lo, pois estava esquecendo do seu rosto, pudesse ir vê - lo fora do horário de visita para que ela não tivesse contato com os outros detentos. Entretanto, Seu Pires nega o pedido, alegando que, se abrisse exceção para um, teria de abrir para todos. Mais tarde, vê -se que Seu Pires resolveu ceder: Seu Chico espera no meio do pátio, embaixo de uma tenda, com um piquenique preparado, fora do horário de visitação. Porém, a filha do velho não aparece. Desolado, ao perceber que havia um guarda vigiando, agride um dos carcereiros e é levado à solitária por 30 dias. Seu Chico parece se culpar pela situação familiar que se encontra, usando a solitária como autopunição. A filha de Seu Chico, finalmente, vai visitá-lo. Seu Pires, como prometido, deixa que os dois se encontrem fora do horário de visitas e, inclusive, ordena que deixem-no ficar com ela além do tempo permitido para visitação. Seu Chico ganha sua liberdade antes do famoso massacre.

1.2.8 Ezequiel

Imagem de Ezequiel interpretado por Lázaro Ramos obtida na web.

Ezequiel, um detento viciado em crack e apaixonado por surfe, vive em dívida no presídio por conta do vício, tendo já se desfeito de quase todos os seus bens. Sua última dívida, adquirida com Zico, quase resulta em sua morte. Ezequiel tenta saldar sua dívida com sua prancha de surfe e ainda pede que Zico lhe venda outra pedra de crack fiado. Zico o expulsa de sua cela, agredindo-o. No dia de visita, Ezequiel diz a Nego Preto que quer pagar sua dívida e pede autorização para que sua irmã tenha relações sexuais com outros detentos para conseguir dinheiro. Com um olhar de desaprovação, Nego Preto lhe diz que faça o que achar melhor. Como

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ele não paga a dívida, Zico pede autorização a Nego Preto para matá-lo, mas acaba desistindo. Como punição, Nego Preto ordena que Ezequiel pegue suas coisas e se mude para o Amarelo (setor daqueles jurados de morte). Com a morte de Zico, Ezequiel é procurado por Majestade para que assumisse a culpa. Ezequiel não resiste à proposta de ter uma cela só para ele, com roupa lavada e drogas para consumir, mesmo tendo apenas dois anos para ganhar a sua liberdade. Com o crime, pegaria mais uns 20 anos, mas os argumentos de Majestade – que dois ou vinte anos não fariam diferença para alguém com AIDS, como Ezequiel – foram mais que suficientes para convencê- lo. Ezequiel não chega a desfrutar dos privilégios: é morto por um policial no massacre.

1.2.9 Peixeira

Imagem de Peixeira interpretado por Milhem Cortaz obtida na web.

Assassino profissional, Peixeira é confrontado por Lula, que quer acertar as contas do assassinato de seu pai, que ocorreu na sua frente e da sua mãe. Nego Preto chega para resolver a desavença. O matador de aluguel, então, explica ao jovem e inexperiente ladrão que fora sua própria mãe que encomendou o assassinato de seu pai. Lula, sofrendo e inconformado com a verdade, desiste de matar Peixeira. Peixeira sempre foi convicto de sua posição como um assassino frio e sem remorso pelas vítimas, mas a reviravolta em sua vida chegaria dentro do Carandiru. Em um dia de visitas, observa, curioso, a pequena igreja evangélica improvisada dentro do presídio, onde o pastor prega. Envolvido na emboscada para matar Zico, em vingança pela morte de Deusdete, Peixeira é quem deveria dar a facada final, que mataria Zico de uma vez. No entanto, ao olhar em seus olhos, ele hesita e não consegue matá-lo. A partir daí, Peixeira começa a se sentir culpado pelas outras mortes que tem no histórico. Ele, inclusive, sonha que Zico volta para assombrá- lo, com as feridas das facadas em aberto e sangrando bastante, junto com Deusdete que está com o rosto coberto pela touca de meia de seda do Zico e chora muito. Quando Zico o abraça, as facadas de

133

seu corpo passam para o corpo de Peixeira que começa a sangrar. Depois deste sonho, ele vai até o consultório improvisado do Médico e pergunta a ele como saber se algué m está ficando demente e quer saber se existe remédio para culpa. Desorientado e confuso, sai ao pátio, na chuva. Avista novamente a pequena igreja evangélica, onde está havendo um culto. Ao perceber o desespero de Peixeira, o pastor pára o culto e chama sua atenção, questionando- lhe se quer aceitar Jesus. Peixeira, então, se ajoelha e se converte, chorando.

1.2.10 Médico

Imagem do Médico interpretado por Luiz Carlos Vasconcelos obtida na web.

O Médico chega na Casa de Detenção de São Paulo para realizar um trabalho de prevenção à AIDS, que já está em situação de pré-epidemia no presídio. Seu Pires, o diretor, o acompanha pelas instalações, lhe mostrando o lugar. Chegam a uma ala onde está tendo uma desavença, que logo é resolvida por seu futuro paciente estressado: Nego Preto, que lhe dá as boas-vindas. O Médico começa a atender em um consultório improvisado dentro do presídio e tem Sem Chance, um dos detentos, como seu ajudante na enfermaria. Lula também faz pequenas operações lá. Aos poucos, vai conhecendo os detentos e suas histórias, e é exposto a doenças como tuberculose, sarna e AIDS. Com o tempo, ganha a confiança daqueles que atende e circula livremente pelo presídio. Uma noite, no entanto, um guarda noturno não o reconhece e ele quase teve de passar a noite lá dentro. É convidado para dar o chute inicial na partida da final do campeonato de futebol do presídio, acontecimento muito importante e celebrado pelos detentos.

134

Expostas as personagens, pode-se resumir estas informações no seguinte quadro:

TABELA 23 – PERSONAGENS PRINCIPAIS Personagem

Características

Características

físicas

psicológicas

História Jovem da periferia, que luta

Aparência de aproximadamente 20 anos, branco, Deusdete

magro, tem cabelos curtos e

Recluso e tímido,

para não entrar na vida de

resiste em se

crimes. É preso após

envolver com os

assassinar os agressores da

demais detentos e,

irmã Francineide. Na prisão,

freqüentemente,

encontra o amigo de infância

aparece lendo na cela. Zico, que acaba assassinando-

negros.

o com uma panela de água fervente.

Aparência de no

Zico

Criado pela mãe de Deusdete,

máximo 30 anos,

Inquieto e hiperativo,

branco, tem

devido ao constante

cabelos curtos,

consumo de crack.

geralmente

Inseguro, demonstra-

ocultos por uma

se piedoso com um

touca de meia de

devedor.

seda.

se envolveu com o crime cedo. Viciado em crack, que o leva a matar o amigo de infância durante uma alucinação. É morto a facadas por vários presos.

135

Conhece sua primeira mulher,

Majestade

Malandro com

Dalva, numa partida de

Aparência de 40 e

gingado, orgulhoso

futebol, onde o noivo dela

poucos anos,

de seu poder e por

joga. Foge com ela e a pede

negro, de cabelos

desfrutar do amor de

em casamento, mas seus pais

curtos e um

suas duas mulheres.

não aceitam por ele ser negro.

pouco acima do

Carismático, sempre

Casado com Dalva, conhece

peso.

conta vantagem em

Rosirene, uma prostituta, com

suas histórias.

quem também constitui família.

Aparência de 30 e poucos anos, branco, magro, Sem Chance

baixinho, tem cabelos curtos e encaracolado s.

Ajudante do Médico na Uma espécie de

enfermaria, que se encanta

“filósofo”, é um

pelo travesti Lady Di, com

detento escolado, de

quem se “casa” dentro do

boa argumentação e

presídio. Sonha em abrir o

sonhador.

próprio consultório médico quando ganhar sua liberdade.

Lady Di

Aparência de 20 e

Sonhador e delicado.

poucos anos,

Sua carência se

Travesti que teve mais de 2

branco, travesti,

demonstrava pelos

mil parceiros, tinha

alto, de cabelos

vários

problemas com seus pais, que

negros em estilo

relacionamentos que

não aceitavam a vida que

chanel e de

teve. Realizou-se

escolheu. No Carandiru, se

presença

quando encontrou o

“casa” com Sem Chance.

marcante.

amor.

136

Um líder, assumindo Aparência de 50 e poucos anos, Nego Preto

negro, de bigodes, de cabelos curtos

papel de juiz interno. É, antes de tudo, um pacificador, desenvolvendo, por

e negros.

conta disso, estresse.

Traído pelos comparsas, foi preso por assassinato e se tornou o chefe da Cozinha Geral no Carandiru. Tudo que ocorre lá dentro deve passar por ele e deve ter sua autorização.

Aparência de

Seu Chico

Apaixonado por balões, pai

aproximadamente

Calmo e reservado,

de 18 filhos, mas nenhum vai

60 anos, negro,

era um senhor triste e

visitá-lo. Já cumpriu parte da

tem cabelos

solitário pela

sentença e está na

curtos e

distância da família,

dependência do juiz dar sua

encaracolados,

que não o visitava.

liberdade. Vive isolado dos

acima do peso.

demais detentos. Por conta de uma dívida,

Aparência de 20 e poucos anos, Ezequiel

negro, magro, tem cabelos curtos descoloridos.

Ingênuo e submisso,

quase acaba morto. Sem

vive à mercê dos

perspectiva por conta da

outros detentos por

doença e para ganhar

conta de seu vício em

privilégios, acaba assumindo

crack.

a autoria de um assassinato

Tem AIDS.

que não cometeu. Assassino destemido

Peixeira

Aparência de 30 e

e frio. Tem uma

poucos anos,

reviravolta no

forte, com corpo

presídio, passando a

malhado e

se sentir culpado

tatuado. Careca,

pelos crimes,

geralmente, usa

chegando a se

touca de lã.

converter ao

Matador de aluguel, encontra o filho de uma de suas vítimas que quer vingança no presídio. Depois de não

evangelismo.

conseguir matar um detento, começa a se sentir culpado pelas outras mortes. No fim, acaba entrando em uma igreja evangélica dentro do Carandiru e se converte.

137

Calmo e paciente, é

Médico

Aparência de 40 e

preocupado com o

poucos anos,

bem-estar dos

branco, de

pacientes

cabelos castanhos

independente dos

e curtos, magro.

crimes que haviam cometido.

Médico que foi ao presídio para tratar os detentos e tomar providências contra a pré-epidemia de AIDS. Ganhou a confiança dos detentos, que lhe contavam suas histórias e lhe pediam conselhos.

2. A origem das personagens principais Agora que já se conhecem as personagens principais de Carandiru, suas características físicas, psicológicas e histórias, pode-se partir em busca de suas origens na obra literária, que podem ser uma ou múltiplas origens.

2.1. Deusdete Como mencionado anteriormente, Deusdete é a personage m mais jovem da obra cinematográfica. No livro, como visto, poucas personagens jovens foram encontradas (menos de 1%). As características físicas de Deusdete provavelmente têm origem na personagem literária Gersinho, cuja idade é de 19 anos. Pela imagem, pode-se ver que a aparência de Deusdete não é mais que isso. Esta é a única correspondência explícita entre estas duas personagens.

Gersinho, portador do vírus da AIDS, dezenove anos, assaltante primário aceito no pavilhão porque um ladrão que o viu nascer, e que talvez tenha sido namorado de sua mãe, convidou-o para morar em seu xadrez, diz que aprendeu muito com a convivência: (VARELLA, 2005, p. 33)

138

Já a história de Deusdete teve origem na personagem homônima. O Deusdete da obra literária também tem uma irmã chamada Francineide, que foi atacada por dois molestadores. Uma noite, Francineide, irmã do meio de Deusdete, na volta da padaria, foi molestada por dois marginais da vila. Um disse que queria chupar o sexo dela; ofendida, ela o mandou chupar a mãe, vagabundo. Apanhou, chegou em casa com o vestido rasgado e a boca inchada. Ao ver a irmã naquele estado, Deusdete correu para a Delegacia. Esperou mais de duas horas para ouvir o escrivão dizer que ficaria louco se registrasse todas as queixas de agressão da vila. (VARELLA, 2005, p. 198-199)

No filme, esta cena está dividida. Primeiramente, Francineide aparece desesperada após a agressão, e é quando Deusdete a confronta e descobre o ocorrido: DEUSDETE Que é que foi? Conta aí! O que foi que aconteceu? FRANCINEIDE Era dois... me agarraro... levantaro meu vestido... um disse que queria me chupá... eu mandei ele chupá a mãe... DEUSDETE O que eles fizero? FRANCINEIDE Me batero... DEUSDETE E daí? Que mais?! FRANCINEIDE Eu saí correndo, Deusdete. Saí correndo! Eu te juro! Não aconteceu nada!

Depois, há a cena em que Deusdete vai atrás de Zico, seu amigo de infância, para que este lhe arranje uma arma. No livro, Deusdete não recorre ao seu amigo de infância, no caso, Mané de Baixo, mas a qualquer um na vila que lhe pudesse vender um revólver. Porém, é nesta cena no filme que ele conta que foi à polícia e consegue a arma com a qual cometerá os homicídios: DEUSDETE Zico. ZICO Pô Deusdete, você aqui?!

139

DEUSDETE É que eu tenho um assunto aí... ZICO (para os comparsas) Dá licença. ZICO (CONT'D) Como é que tá a mãe? DEUSDETE Problema não é com ela não... Uns caras azararo a Francineide... ZICO O que que fizero com ela? DEUSDETE Ela disse que nada. Mas eu fui na delegacia dá parte. ZICO Delegacia, Deusdete?! Tu acha que polícia vai resolvê isso aí? DEUSDETE O pior é que os cara ficaro sabendo e agora tão atrás de mim. ZICO Deixa comigo que eu dô um jeito neles. DEUSDETE Não Zico. Do teu jeito não. Eu... só preciso de uma arma... que é pra me defendê.

O procedimento adotado pelo irmão de Francineide, no geral, foi o mesmo: denunciou a agressão à polícia, depois, quando foi jurado de morte, arranjou uma arma para se defender. No entanto, Deusdete é encontrado pelos agressores; ele os mata quando é abordado e ameaçado com barras de ferro. Esta cena manteve-se igual em ambas as obras: Uma semana após o incidente, no ônibus, um vizinho o avisou de que os agressores souberam da ida dele à delegacia e queriam pegá-lo. Deusdete pediu adiantamento na firma e saiu pela vila atrás de um revólver. Não demorou para encontrar. Apesar da arma, mudou de itinerário. Não adiantou, eles o acharam na volta da escola, sozinho, por uma rua escura. - Aonde pensa que vai o estudante dedo -duro? - Não quero briga. Deixa eu ir para casa. - Você vai para a casa da mamãe, veado, só que antes a gente vai te fazer uns carinhos, que nem nós fez para a tua irmãzinha. O primeiro que se aproximou tinha uma barra de ferro na mão. Abusado, não percebeu que Deusdete havia sacado o revólver. Tomou dois tiros e caiu

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morto. O companheiro saiu correndo com a faca. Deusdete atirou, errou e seguiu no encalço. Três, quatro esquinas depois o fugitivo entrou num bar. Deusdete esperou agachado atrás do muro de uma casa em frente, até que o inimigo saiu, olhou ao redor desconfiado e cruzou a rua bem na direção em que ele se encontrava. Levou as três ultimas balas do tambor, para espanto do gordo de bermuda e do barbudo que jogavam sinuca no alpendre do botequim e mais tarde testemunharam contra ele, no julgamento. (VARELLA, 2005, p. 199)

No filme, há o seguinte diálogo nesta cena: RAPAZ 1 Aonde pensa que vai o dedo duro? DEUSDETE Não quero briga. Deix'eu ir pra casa. RAPAZ 2 Você vai sim, mas antes, a gente vai te fazê uns carinho, que nem feiz na tua irmãzinha.

Ao ser preso, Deusdete é levado para a Casa de Detenção de São Paulo. Na película, vê -se o rapaz chegando, desconfiado, procurando uma cela. Quando Zico o encontra, o acolhe em sua cela, dando- lhe uma cama:

DEUSDETE Pagá pra dormi?! Tô preso, meu! PEIXEIRA Lá fora tu mora de graça? EZEQUIEL Se quisé ficá, dorme aí no chão. ZICO Deusdete não vai pro chão não. Ele já tem onde morá. (para Deusdete) Pô Deusdete, bem que eu disse... Acabou fazendo o que não devia.

Na obra literária, pouco se sabe sobre a chegada de Deusdete ao presídio. Apenas é mencionado brevemente que o amigo de infância o acolhe.

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Quando Deusdete chegou na Detenção foi acolhido por Mané de Baixo , proprietário de um xadrez no pavilhão Cinco, cumprindo oito anos e seis meses por roubo de carga e formação de quadrilha. (VARELLA, 2005, p. 199)

O destino trágico de sua personagem também é compartilhado pela personagem literária: Deusdete é morto no presídio. Seu amigo de infância (Zico, no filme e Mané de Baixo, no livro) despeja- lhe água fervente enquanto Deusdete dormia em sua cama. No livro, a ação é justificada pela humilhação sentida por Mané de Baixo quando Deusdete não permite que ele consuma drogas dentro da cela. De madrugada, enquanto o companheiro de infância dormia, encheu um tacho com cinco litros de água, uma lata de óleo, um quilo de sal e acendeu o fogareiro. Quando a mistura levantou fervura, despejou-a em cima do outro. Deusdete morreu na enfermaria do Pavilhão Quatro nas primeiras horas da manhã. (VARELLA, 2005, p. 200)

Na película, entretanto, este ocorrido é justificado pelo vício de Zico, que mata o amigo em um momento de alucinação causada pelo crack. Neste caso, a personagem dominante é a mesma que deu origem ao nome da personagem na película. Sendo assim, tem-se Deusdete como a personagem literária dominante e Gersinho apenas como personagem de apoio, pois nada de sua história serviu de base para a personagem cinematográfica. Talvez se possa considerar o fato de que Gersinho fora acolhido no presídio por alguém que o conheceu antes de ser preso e fazia parte de seu círculo social fora do Carandiru, assim como ocorre na história de Deusdete. Porém, esta ligação entre as personagens não fica clara, pois tratam-se de situações e relações diferentes (Gersinho – ex-namorado da mãe; Deusdete – amigo de infância).

2.2 Zico Zico era traficante de maconha antes de ser preso. Comprava a droga em Pernambuco. No livro, há duas personagens que compartilham esta história: Juscelino e Ôrra Meu. A origem da propriedade perde-se no passado, quando os recursos da Casa começaram a minguar e a manutenção das celas ficou por conta dos próprios detentos, como explica Juscelino, um mineiro de sorriso encantador que

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comprava maconha no sertão de Pernambuco e voltava de ônibus-leito com a droga na mochila: (VARELLA, 2005, p. 36) (…) como observou Ôrra Meu, um faxina de pescoço longo como os de Modigliani e sotaque italianado característico do bairro da Mooca, preso num caminhão de lenha que trazia maconha de Pernambuco para um armazém da Vila Matilde: (VARELLA, 2005, p. 284)

O passado de Zico com relação a seus crimes não foi muito explorado, da mesma forma que os crimes de Juscelino e Ôrra Meu apenas foram mencionados e suas histórias não ganharam destaque. Na obra cinematográfica, a parte mais desenvolvida da história de Zico foi seu relacionamento com o amigo de infância, Deusdete:

ZICO (OFF) Um dia, minha mãe não voltô mais pra casa. Fiquei só. Esperei, esperei, até que ele e a irmã, Francineide, chegaram e me levaram pra morá com eles. Crescemo junto.

Esta história, desde a infância até sua morte, é vivida por Mané de Baixo na obra literária. Embora não tenha sido mencionado que Mané de Baixo tenha sido abandonado pela mãe e ido morar com a família de Deusdete, é mencionado que passaram a infância juntos e não se desgrudavam até seus 14 anos.

Os corpos eram de Deusdete e Mané de Baixo, criados na mesma vizinhança, amigos inseparáveis até os catorze anos, quando Mané de Baixo arranjou emprego num ferro-velho e saiu da escola. (VARELLA, 2005, p. 198)

No presídio, Zico era traficante de crack. Um dos detentos, que era seu “cliente”, havia comprado droga fiado com ele e não o pagava. Zico resolve pedir a Nego Preto autorização para matá- lo. Entretanto, acaba por não fazê- lo, pois não queria aumentar sua sentença. Este episódio fez Zico virar motivo de chacota no presídio.

MAJESTADE (para Zico) Aí, quem num tem palavra, num pode trabalhá pra mim. NEGO PRETO Pede pra matá o cara e depois muda as idéia!?

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ZICO Ô Nego! Mais dois ano e eu tô livre... achei melhor deixá quieto e acertá ele na rua.

Um caso muito semelhante ocorre com a sua personagem homônima no livro. Zico, personagem literária, pede a Bolacha, que seria como um juiz interno, assim como Nego Preto, autorização para matar um detento que havia estuprado sua irmã. Mas, assim como a personagem cinematográfica, ele vira motivo de chacota quando resolve não matá- lo, pois estava prestes a conseguir entrar no regime semi-aberto. Bolacha na presença de testemunhas: - Zico, qual é a tua, meu? Está esperando o que para resolver o caso daquele pilantra? - Bolacha, sucedeu-se que subiu meu recurso para a Colônia e eu achei melhor deixar quieto por enquanto e acertar ele na rua. - Ô, Zico, agora você me desapontou! Pede para matar o cara, traz prova do estupro e depois muda as idéias. Arruma tuas coisas e atravessa para o Cinco, que o Nove ficou pequeno para você. Você não é do Crime, meu. Você é um cômico. (VARELLA, 2005, p. 102)

Além de traficar, Zico também consumia crack, o que lhe causava freqüentes alucinações. Em uma delas, mata o amigo de infância com uma panela com água fervente enquanto ele dormia. Após este ocorrido, o qual não havia sido autorizado pelos “juízes” internos, foi organizada uma “comitiva” para decidir qual providência seria tomada.

FUINHA Ó Nego, eu sei que quando eu fui visitá o Zico, o Deusdete não dexô que a gente fumasse lá. BAIANO Isso num é motivo pra mata na covardia! LULA Me deu o maior medo, ó! Í dormi e acordá queimado?! Tá louco! DETENTO LOCUTOR E matô sem assuntá com nóis! Qualé? DADÁ Quem mandô se metê na vida do outro? MAJESTADE (para Dadá)

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Eram amigo da infância. Se você tivesse um amigo aqui prá te aconselhá, você ia fazê isso com ele? DADÁ Problema deles, ó! NEGO PRETO Tá enganado. Agora é problema nosso.

No livro, esta negociação sobre o destino de Mané de Baixo (que matou Deusdete), que envolveu mais de quarenta pessoas, é apenas mencionada, mas não se sabe quem fez parte desta “comitiva”.

Ao meio-dia, os companheiros revoltados reuniram-se com a Faxina do Cinco, num “debate”, como eles dizem, que envolveu mais de quarenta pessoas. (VARELLA, 2005, p. 200)

Como conseqüência, Zico é emboscado e atacado por diversos detentos, que o matam a facadas. Isto também ocorre com Mané de Baixo, que é emboscado e, depois, é mencionado que seu corpo, morto, estava todo esfaqueado.

Resolveram que um grupo aguardaria nas imediações da entrada do pavilhão e outro bloquearia a escada no primeiro andar. Quando Mané entrou, o grupo de baixo subiu atrás. (VARELLA, 2005, p. 200) Os corpos eram de Deusdete e Mané de Baixo, criados na mesma vizinhança, amigos inseparáveis até os catorze anos... (…) O outro, de camiseta do Baú da Felicidade, estava todo esfaqueado. (VARELLA, 2005, p. 198)

Não foi possível verificar nenhuma personagem com correspondência física semelhante a Zico. Mané de Baixo é a personagem dominante, Zico, a secundária e Juscelino e Ôrra Meu, personagens de apoio. Aqui, tem-se a origem do nome em uma personagem secundária, que também

teve

cinematográfica.

participação

significativa

na

composição

da

história

da

personagem

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2.3 Majestade Majestade era um negro com jeito de malandro, simpático e sorridente. De nome verdadeiro Josué dos Santos, traficava no Carandiru. No livro, encontram-se duas personagens que deram origem à imagem de Majestade: Kenedi Baptista dos Santos, conhecido como Zé da Casa Verde, e Charuto. Zé da Casa Verde era um homem negro, com jeito de malandro; Charuto tinha sorriso alvo e dentição perfeita, era malandro no jeito de andar, falar e olhar.

Esse tal de Charuto tinha sorriso alvo e dentição perfeita, raridade no ambiente. Malandro completo no andar, falar e olhar, assaltante incorrigível, estava condenado a dezesseis anos, nesta segunda passagem pela cadeia. (VARELLA, 2005, p.260)

Seu nome era Kenedi Baptista dos Santos, porém todos o conheciam como Zé da Casa Verde. As gírias, o cantado da fala paulista, o jeito de parar com o corpo jogado para trás, a disposição permanente para gozar os companheiros, tudo nele recendia malandragem. (VARELLA, 2005, p.226)

Estas duas personagens também deram origem à história cinematográfica de Majestade, em momentos diferentes. Majestade, em uma ação que parecia ser- lhe comum, esconder drogas dentro do vaso sanitário de sua cela, foi mordido por um rato. Para conseguir que o animal largasse seu dedo, teve de morder- lhe o crânio. Na enfermaria, Lula o atendeu e lhe costurou o dedo.

MAJESTADE Ai caralho! Puta que pariu! Larga! Larga! Ai, ai... larga desgraçado! Ai, ai... (OFF) Bati ele na parede mais de deiz veiz! O demônio num largava! SEM CHANCE E aí, morreu? MAJESTADE Ai cacete... Morreu nada! Mas eu segurei ele firme e cravei os dente na mente do infeliz. Depois escovei a boca e já era.

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No livro, o mesmo ocorre com a personagem Charuto, entretanto, as circunstâncias são outras: ele levou uma mordida de rato ao desentupir um esgoto que sempre entupia no pavilhão Dois. Puxou a mão, no reflexo; veio junto o rato pendurado no dedo indicador, mordendo fixo. Era preto, enorme: - Pensei até que fosse um cachorrinho desses de madame. No desespero, a mão desenhou um círculo no ar e bateu o rato contra o cimento, mas a pega estava tão firme que não soltou. Infernizado com a dor que até choque dava, o rato travado no osso, Charuto levantou o braço o mais alto que pode e despencou o animal no chão; com toda força. - Só aí, com perdão da palavra, foi que o desgraçado largou. Ficou esperneando as patinhas para cima. - Morreu? - Que nada, doutor, o bicho é o demônio! Foi então que Charuto, cego de ódio, agarrou o inimigo com as duas mãos, segurou-lhe a boca para não levar outra mordida e vingou-se: - Cravei os dentes na mente do infeliz. Mordi duro, até ele parar de debater. Depois escovei os dentes, e já era. (VARELLA, 2005, p. 259)

Majestade tinha duas mulheres: uma branca e uma negra, assim como Zé da Casa Verde. Sua primeira mulher, Dalva, era uma jovem de pele bem branca e loira. Zé era casado com Valda, que tinha a pele branca como a neve. Ela assistia à partida de futebol do noivo, quando Majestade aparece em seu carro e diz que se casará com ela e que terão um filho de cada cor. Quando o noivo aparece para saber o que ocorre, Majestade saca a arma e atira para o lado, afugentando o noivo de Dalva.

MAJESTADE (CONT'D) Tu acredita em amor à primeira vista? DALVA Quê?! MAJESTADE Vem comigo... vou te pedi em casamento pros teus pais. DALVA Sai fora! Tu nunca me viu! MAJESTADE Tá errada! DALVA Tô errada?! Você nem me conhece! MAJESTADE Conheço sim. Sei que tu gosta de calabreza... Sei que fica linda num vestido de florzinha... e sei que tu merece mais do que esse perna de pau aí... DALVA Meu noivo? MAJESTADE Noivo?! Isso é atraso de vida.

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MAJESTADE (CONT'D) Olha só que beleza de mistura! Vam'tê um filho de cada cor. Te espero no carro... DALVA Você falou sério? MAJESTADE Como nunca na vida.

A história do romance de Zé da Casa Verde com Valda é muito semelhante à de Majestade e Dalva, apenas mudando a circunstância do primeiro encontro dos dois. No livro, Zé conhece sua primeira mulher em um baile, uns dias antes da partida de futebol do namorado (ou noivo, não é especificado qual o grau do relacionamento deles) dela. No filme, este primeiro encontro acontece na própria partida.

Zé era casado com duas mulheres, Valda e Maria Luísa: - A Valda tem pele branca como a neve. É de uma família de bem, em Santana, que nunca aceitou o nosso romance por causa da minha cor. Os dois se conheceram num baile, ela ainda virgem, dançando com um rapaz no qual Zé não sentiu firmeza. No domingo seguinte, enquanto o rival disputava uma partida na várzea, Zé aproximou-se dela, na beirada do campo: - Levanta e vem comigo, que eu vou te pedir em casamento para os teus pais. -Você nem me conhece! Ele falou dela no baile, da pele alva que contrastava com o preto da sua e dos filhos misturados que nasceriam lindos, cada um numa cor. Falou e foi esperála no fusca, que havia acabado de equipar com dinheiro roubado. A espera não foi longa. Ela apareceu na janela do carro: -Você falou sério? - Como nunca na vida. (VARELLA, 2005, p. 227)

Ao ver que conquistou Dalva, Majestade diz a ela que o espere em casa no dia seguinte com a família, pois ele lhe pedirá em casamento.

MAJESTADE Tu viu?! Tu viu, né? Se fosse amor que ele sentia, não tinha fugido! Qualé? Deixá roubá a mulher! MAJESTADE (CONT'D) Amanhã, às oito, reúne tua família que eu vou te pedir em casamento.

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A mesma situação pode ser vista com Zé da Casa Verde, na obra literária. Zé, persuasivo, virou-se para a amada: - Amanhã, às oito, reúne teus pais e tuas irmãs que eu venho te pedir em casamento. Esquece esse cara, se ele gostasse de você, enfrentava o perigo. (VARELLA, 2005, p. 227-228)

Ambas as personagens, ao encontrar o preconceito da família da noiva, sacam suas armas outra vez em resposta à proibição do casamento pelo pai dela, fazendo-os de refém e “roubando” a futura esposa. No livro: No dia seguinte, às oito, a reação da família foi a pior possível. Apesar do fusca envenenado e de se apresentar como trabalhador, filho de uma família exemplar, proprietária de um imóvel com escritura lavrada no cartório da Casa Verde, o pai da mo ça disse que preferia a filha morta do que casada com um negro malandro daqueles. Com a persistência obstinada do Zé, os ânimos se exaltaram, o pai referindo-se à cor dele com desrespeito crescente. Quando foi chamado de negrinho insolente, Zé perdeu a paciência. Subiu na mesa, puxou o revólver, gritou que matava o primeiro que reagisse: - Tranquei todo mundo no banheiro e levei o meu amor comigo, a minha mão preta no algodão da mão dela. (VARELLA, 2005, p. 228)

No filme, há o seguinte diálogo entre Majestade e Seu Sidney, pai de Dalva:

SEU SIDNEY Vou falá uma vez só: prefiro minha filha morta do que casada c'um negro malandro. MAJESTADE Ai o senhor me ofende... O senhor mal me conhece. SEU SIDNEY Conheço o suficiente pra saber que não passa de um preto vagabundo! MAJESTADE Olha seu Sidiney... SEU SIDNEY Não olho nada! (para Dalva) Minha filha, você não é mais menina pra cair na conversa de preto! MAJESTADE Cala a boca! Todo mundo pro banheiro!

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MAJESTADE (CONT'D) Vai, vai logo! Vai entrando! Dá um tchau pro teu pessoal que vai demorá pre'les botarem o olho em ti! SEU SIDNEY Filha, pensa bem: cê vai fazê essa besteira? MAJESTADE (OFF) Casei foi ali mesmo. Levei meu amor comigo; a minha mão preta no algodão da mão dela...

Grande parte da história de Majestade, personagem cinematográfico, tem origem na história de Zé da Casa Verde. O nome da primeira mulher de um é o inverso silábico do nome da mulher do outro: Dalva e Valda. Já a história deles com suas segundas mulheres é diferente, inclusive o nome delas: Majestade casa-se com Rosirene e Zé da Casa Verde, com Maria Luísa. Majestade conhece Rosirene, uma prostituta, em um bar, onde havia ido com Dalva. A mulata, que estava consumindo drogas, chama a atenção de Majestade que vai falar com ela e lhe diz para pegar o biquíni, pois a levará para a praia no domingo. Quando Dalva chega, as duas discutem e Majestade leva Dalva embora.

MAJESTADE (para Rosirene) A morena não samba? ROSIRENE Não sou macaco pra ficar pulando à toa... MAJESTADE Quer um motivo pra pulá? ROSIRENE Acho quem quem tá a fim de pulá e você... a cerca. MAJESTADE Olha aí, vô deixá minha esposa e as criança em casa. Pega teu biquíni que eu volto pra te buscá. A gente vai passá o domingo na praia. Dalva se aproxima. DALVA Essa nega aí sabe que tu tem dona?

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MAJESTADE Qué isso, Dalva? Tava indo no banheiro! DALVA (pondo a mão sobre a braguilha da calça de Majestade) E isso aqui, tá assim por quê? ROSIRENE Parece que alguém não tá cuidando bem dele. DALVA Vê o que cê fala, sua nega fedida! (empurrando Rosirene) Acho bom saí de perto do meu homem ou tu vai se dá mal! Rosirene revida. As mulheres trocam tapas e puxões de cabelo. MAJESTADE Pára, Dalva! Pára com isso!

Já Maria Luísa, segunda mulher de Zé da Casa Verde, que também era negra, era passista. Embora não fique explicito onde se conheceram, é provável que tenha sido na quadra da Império da Casa Verde, escola da qual era passista. O encontro com a primeira mulher de Zé, Valda, aconteceu na avenida, no Carnaval.

Viveram na maior felicidade até ele conhecer Maria Luísa, passista da Império da Casa Verde: - A bateria pegando pesado e ela dançando na frente, de vestidinho curto e um sorriso que iluminava a quadra inteira. Parecia uma deusa de ébano. No carnaval, na concentração da escola, minutos antes do desfile, ele de guerreiro xangô, Maria Luísa de biquíni com lantejoula, ninguém sabe de onde, surgiram Valda e a irmã mais nova do Zé, solidária com a cunhada, e se engalfinharam com a rival. Ele outra vez perdeu a paciência e puxou o revólver: - Dei uma coronhada na cabeça de cada uma, mandei as três para casa e sambei sozinho na avenida. (VARELLA, 2005, p. 228)

Como já mencionado, a segunda mulher de Majestade era prostituta e não queria lagar a profissão. Ele não se opunha, contanto que não fizesse programa com nenhum amigo dele. Um dia, ao esperá- la no ponto onde se prostituía, Majestade descobre que Rosirene está saindo com um de seus amigos, Farofa. Ao confrontá-la, fica sabendo que os dois, além de estarem saindo juntos, estão fazendo planos para irem para Miami.

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MAJESTADE Tu não desiste dessa vida, né? Já não te falei que eu te banco? ROSIRENE Sempre ganhei meu dinheiro. MAJESTADE E tu sabe quem é esse cara que tu tava? ROSIRENE O que você está fazendo aqui? Hoje não é o dia da Branquinha? MAJESTADE Não desvia o assunto! Tu sabe quem é ele? ROSIRENE Sei! E daí? MAJESTADE Eu não te disse: "Se quisé se virá, se vira. Só não dá pra amigo meu que eu te quebro o pescoço!" ROSIRENE Amigo teu, o Farofa?! Majestade!!? Tu é um pé de chinelo. E mais, ele ainda me disse que, quando separá da esposa, vai se muda comigo pra Miami! Ó, qué sabê? Tô indo! MAJESTADE Vai para onde? ROSIRENE Miami meu amor! Miami! (…) MAJESTADE Vê se pode doutor, dando pra amigo meu e ainda os dois fazendo plano!

Esta mesma situação pode ser encontrada no livro, porém, com outra personagem: Charuto. Ele era assaltante e ela, prostituta. Rosirene, personagem literária, também o traiu com um amigo dele, fazendo planos juntos para ir para Ponta Porã.

- Estava na Estação da Luz se virando. Sabe, elas viciam e não querem sair dali. Eu não podia fazer nada. Quer dar? É com ela mesmo. A única coisa que eu falava era: só não dá para amigo meu, que eu te quebro o pescoço. (…)

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Uma noite, trombaram na Boca do Lixo e Rosirene confessou estar namorando um amigo dele, Mato Grosso, o dono das pedras, e que os dois tinham planos de mudar para Ponta Porã. -Veja só, dando para amigo meu e ainda os dois fazendo plano! (VARELLA, 2005, p. 264)

Charuto não se dividia entre duas mulheres como Majestade. Ele havia largado a primeira (Rosane) para ficar com Rosirene. Já Majestade levava dois casamentos ao mesmo tempo, assim como Zé da Casa Verde. Ambos se dividiam entre as duas mulheres e tiveram filhos com elas: Majestade teve três com Dalva e um com Rosirene; Zé da Casa Verde teve três filhos com Maria Luísa e quatro com Valda. Entretanto, em um dia de visita, eles não conseguiram evitar o encontro de suas duas mulheres, que os fizeram escolher com qual queriam ficar.

ROSIRENE Me beija na boca! MAJESTADE Pô, meu amor, hoje não vai dá! É que a caldera estorô e o homem qué o conserto pronto até o fim do dia. ROSIRENE Ô Josué, nem na rua tu nunca trabalhô. Vai me convencê que na cadeia resolveu regenerá? Tu tá é co'aquela branquela vagabunda! MAJESTADE Qué isso, meu amor!? Juro que não! ROSIRENE Então vamo vê! (…) ROSIRENE Falei que cê tava co'a vagabunda. DALVA A vagabunda agora sô eu?! MAJESTADE (para Rosirene) Bom... já que você veio agora num tem mais volta pra trás. Hoje, nós três vamô tê que entrá num entendimento. MAJESTADE (CONT'D) Rosirene, a Dalva não é vagabunda não, viu? Trabalha na fábrica de roupa, cria nossos filho com o maior carinho. São filho meu, pô.

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(para Dalva) E você também, já disse que a Rosirene não vale nada. Também num'é verdade. Se não fosse a cara dela descolá uns baratos e trazê aqui pra eu fazê um dinheiro, ia faltá comida no prato de todos nóis. DALVA Se você gosta d'eu e dela é problema teu. MAJESTADE Iiii... ROSIRENE É. Cê vai é decidi agora com qual das duas qué ficá! DALVA Isso mesmo! MAJESTADE Pô! Assim, cês vão parti meu coração no meio.

No livro, pode-se ver Zé da Casa Verde na mesma situação vivida por Majestade na obra cinematográfica: Pediu licença a Valda, correu para a sala das caldeiras, ao lado, e se lambuzou de graxa. Encontrou a mulata na porta, sorridente de saudades. Beijou-a com cerimônia para não esbarrar as mãos sujas nela e explicou: - Meu amor, que bom que você veio, mas, infelizmente, não vou poder te receber porque estou trabalhando num conserto, devido que a caldeira estourou e o homem quer tudo pronto até o final que acabar a visita. - Zé, você está é com aquela vagabunda. Nem na rua tu nunca trabalhou, vai me convencer que na cadeia, dia de domingo, é que resolveu regenerar? (…) - Você vai decidir agora com qual de nós duas quer ficar – insurgiu-se Maria Luisa, com o que concordou imediatamente a Valda. Ele ficou desconsolado: - Assim vocês vão partir meu coração no meio. (VARELLA, 2005, p. 229230)

Portanto, tem-se Zé da Casa Verde como personagem dominante de Majestade, com quem compartilha quase sua história inteira e, inclusive, seu físico e jeito de ser e se comportar, e Charuto como personagem secundária, que também tem significativa contribuição para a história de Majestade e seu jeito de se comportar. A personagem literária Majestade apenas deu origem ao nome de sua personagem homônima cinematográfica, não contribuindo de nenhuma outra forma para sua formação.

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2.4 Sem Chance Matias, que ganhou o apelido de Sem Chance, pois era com essa frase que terminava quase todas as suas falas, era um homem baixinho e franzino, com habilidades em medicina, que se tornou enfermeiro auxiliar do Médico na obra cinematográfica. De fala distintamente escolada e boa argumentação, filosofava pelo presídio. Na obra literária, há também uma personagem chamada Sem-Chance (que só se difere pelo acréscimo do hífen), que também era franzino e ganhou o apelido exatamente pelo mesmo motivo, demonstrando a origem do nome da personagem cinematográfica.

Ainda no escuro, acendem-se as luzes dos barracos, em silêncio, para respeitar o sono alheio, como explica o Sem-Chance, um mulato franzino que ganhou o apelido de tanto repetir essas palavras no final das frases: (VARELLA, 2005, p. 44)

Ouve-se, muitas vezes, na película, a personagem dizendo a frase “sem chance”.

SEM CHANCE Desculpa, doutor, eu sô contra pena de morte, mas sou a favor no caso de estrupo. Pra mim é sem chance.

(…)

SEM CHANCE Cê vê, você trabalhando na noite, dois mil home aqui dentro... limpinha. E eu, todo certinho, ó... sem chance.

Na obra literária, também pode-se ler diversas vezes a personagem utilizando esta frase no final de suas falas. - Tem que ser na manha. Se acordar cedinho, todo mundo dormindo, se for urinar no boi e der descarga ou fazer qualquer zuadinha, o senhor tem que mudar de xadrez. Acordar vagabundo, é sem chance. (VARELLA, 2005, p. 44) Ainda assim, para desespero da malandragem, como admite pesarosamente o Sem-Chance: - Tem sempre um cagüeta na fita, doutor. É sem chance. (VARELLA, 2005, p. 113)

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Sem-Chance também deu origem às características de sua personagem homônima na película. Ambos eram escolados:

Sem-Chance, ladrão escolado, fala da esperteza do “Ricardão”, nome atribuído ao amante da mulher de quem está na cadeia: - Se na visita não tiver respeito, doutor, elas vão ficar com medo de voltar... (VARELLA, 2005, p. 62)

Agora, quanto à história de Sem Chance, apenas parte dela teve sua origem nas histórias das personagens da obra literária. Assim como Sem Chance, que era o principal enfermeiro do Médico no filme, Edelso era o primeiro enfermeiro de Drauzio e o que mais tinha habilidades para lidar com a medicina. Falamos da burocracia interna, das patologias mais prevalentes e conheci meu primeiro enfermeiro, Edelso... (VARELLA , 2005, p. 80) De todos os presos que passaram pela enfermaria, Edelso era o que tinha mais jeito para medicina. (…) Agradável no trato, dentes preservados, roupa cuidada, destoava naquele ambiente de homens pobres e corpos marcados pela violência. (VARELLA, 2005, p. 205)

A história de Sem Chance com o travesti Lady Di, que se casam dentro do presídio, não ocorre no livro. No entanto, uma promessa que Sem Chance faz no filme durante seu casamento com Lady Di também é feita no livro por Edelso, em situaç ão diferente: montar um consultório quando ganhasse a liberdade, para praticar o que haviam aprendido na enfermaria do presídio.

SEM CHANCE O meu brinde é ao nosso doutor, pois com a medicina que aprendi com esse homem, vô é montá um consultório e cuidá dos meus paciente... esperando por você, minha Lady, pra gente vivê nossa própria família.

Na obra literária, Edelso fora transferido da enfermaria, que ficava no pavilhão Dois, pois descobriram que ele estava em uma lista de devedores, indo para o Sete. Mas, em um encontro com Drauzio , Edelso contou os planos que tinha para quando estivesse livre.

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Fazia até planos para quando cantasse a liberdade: - Vou parar com esse negócio de carro, desmanche, Paraguai, que é sem futuro. Com a medicina que aprendi com o senhor, não vejo a hora de montar consultório num lugarzinho simples e viver tranqüilo cuidando dos meus pacientes. (VARELLA, 2005, p. 207-208)

Assim, as personagens do livro que deram origem a Sem Chance foram Edelso e SemChance. Edelso pode ser cons iderada a personagem dominante, pois foi a origem da história de Sem Chance (ou, pelo menos, de toda história presente no livro pertencente a Sem Chance) e Sem-Chance, a secundária, que deu origem à sua aparência física e seu nome.

2.5 Lady Di Única personagem principal travesti na película, Lady Di pode ser considerado um mosaico dos travestis presentes na obra literária. Lady Di era um travesti delicado, que, freqüentemente, quando nervoso, era visto com as mãos na boa, como se roesse unha. Quando sentava, cruzava a perna, como as mulheres geralmente fazem. Tinha silicone nos seios. Estas características podem ser vistas em duas personagens literárias, ambas travestis: Raimundo da Silva, conhecido como Loreta, e Pérola Byington.

No início, com os travestis, meu problema era a identidade. Sentava-se frente à mesa um homem de seios; e gestos delicados em cuja ficha eu lia Raimundo da Silva, mas que todos chamavam de Loreta. (VARELLA, 2005, p. 155) A meu lado, um rapaz franzino de Sapopemba, conhecido como Pérola Byington, pernas cruzadas feito mulher e com a mão desmunhecada, roendo as unhas o tempo todo, fez o seguinte comentário: (VARELLA, 2005, p. 279)

Outro travesti com seios, chamado Sheila, deu origem a uma passagem de Lady Di no filme. Ao se cons ultar com o Médico para descobrir se tinha o vírus do HIV, Lady Di confessou haver tido por volta de 2 mil parceiros sexuais. Quando recebeu o resultado, ele descobre que não está infectado.

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LADY DI Eu conheço essa missa, doutor. Nunca precisei de transfusão de sangue e não boto nada na veia, droga pra mim é só um baseadinho que eu fumo de vez em quando, assim pra vê televisão e pra namorar. MÉDICO E parceiros, quantos? LADY DI Ah, uns 2000. (…) MÉDICO É, Lady, acho mesmo que tá na hora de você saber se tá doente. (…) LADY DI Não! Positivo é justamente a maldita no sangue! Tem que dá negativo. HIV-Negativo. Vou abrir primeiro que o meu caso é mais pior mesmo. LADY DI (CONT'D) Tô limpa! Tô limpa!

O mesmo ocorre com Sheila na obra literária.

Seios enormes, blusa com no acima do umbigo, Sheila confessava na presença de testemunhas mais de mil parceiros sexuais na Casa de Detenção no decorrer do ano anterior a pesquisa. (…). Ela era HIV-negativa... (VARELLA, 2005, p. 65)

Embora nenhuma festa de casamento tenha sido mencionada na obra literária, como ocorre na película, na qual Lady Di e Sem Chance se casam, há a menção de duas personagens travestis que se apaixonam e têm um relacionamento amoroso com outros detentos. Elas são Margô Suely e Leidi Dai. Margô Suely recebeu regalias por sua exclusividade ao ladrão com quem se relacionava, mas foi largado por ele depois de adquirir uma doença íntima.

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Quando veio transferida para o Carandiru, conheceu um ladrão e se apaixonou. Ele foi franco com ela: - Se quiser ser minha, é o seguinte: só minha, entendeu? Te ponho num barraco, dou conforto, mas não vai tirar eu, não. Manter mulher de cadeia custa o olho da cara. Tirou eu, já era.. (VARELLA, 2005, p. 213)

O ladrão, então, o substituiu por Leidi Dai, que afirmava ter casado com o “ex- marido” de Margô. Chocada com a ousadia da intrusa, Margô ordenou: - Tira a minha meia já e sai da minha cama, sua vaca! - Que é isso? Casei com o teu ex-marido. Estou naonde que me pertence, bofe velha. (VARELLA, 2005, p. 215)

No entanto, não fica claro se este “casamento” é apenas uma espécie de contrato de exclusividade. Nenhuma cerimônia é descrita no livro. Como pôde-se perceber, não há personagem dominante de origem para Lady Di. Suas características físicas podem ser vistas em Raimundo da Silva (Loreta) e em Sheila. Seu jeito de ser, em Raimundo da Silva (Loreta) e Pérola Byington. E uma parte de sua história, de certa forma, pode ter tido sua origem em Margô Suely e Leidi Dai. Já o nome da personagem teve origem em Leidi Dai, com alteração ortográfica, passando a ser escrito como o nome da famosa princesa britânica.

2.6 Nego Preto No filme, Nego Preto era o chefe da Cozinha Geral, ele comandava os outros detentos que ali trabalhavam e nenhuma decisão era tomada sem que fosse consultado.

NEGO PRETO Ainda tá faltando a faca da minha cozinha! Quem pegô, vô dá uma chance: ou devolve ou morre um preso por dia! (…)

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MÉDICO Então o chefe da cozinha tá doente?! NEGO PRETO Doutor, quem tem chefe é índio.

Na obra literária, quem assumia o papel de comandante da Cozinha Geral era Seu Chico. Embora ele trabalhasse na marcenaria, as decisões sobre a Cozinha Geral somente eram tomadas após consultar- lhe. A dinâmica dessas conversas secretas respeitava o ritual descrito nas consultas que a malandragem fazia ao ex-marinheiro: os encarregados da cozinha aguardavam de seu Chico a permissão para se aproximar, falavam em voz baixa, ouviam seus conselhos e retiravam-se. Estava claro que, da marcenaria, seu Chico comandava a Cozinha Geral. (VA RELLA, 2005, p. 222)

Nego Preto também é uma espécie de juiz das desavenças internas. É ele quem decide coisas como negociação de dívida, escavação de túneis e autorização para matar alguém lá dentro.

MÉDICO Dorme bem? NEGO PRETO Difícil... a cabeça não pára. É um que qué acertá uma bronca da rua, outro qué cobrá uma dívida, outro qué cavá um túnel... e assim vai o dia inteiro. MÉDICO E o juiz aí ainda tem muita cadeia pra tirar? NEGO PRETO Tem mais uns anos. (…) NEGO PRETO E essa dor? MÉDICO Olha Nego Preto, teu problema é stress, doença de executivo.

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Na obra literária, a personagem Bolacha é uma das que tem essa função de “juiz” interno. O estresse causado por essa responsabilidade de decidir o destino de alguém também é compartilhado por Nego Preto e Bolacha.

Na enfermaria, atendi dois deles com sintomas visíveis de estresse, como se fossem altos executivos de multinacional ou, como prefere dizer o Bolacha, como se fossem juizes de direito: - Já acordo cheio de problema: é o cara que quer acertar uma bronca da rua, um que precisa matar o pilantra, cavar um túnel, cobrar divida, o outro que ouviu uma palavra mal colocada, e vai assim até a tranca. Precisa apaziguar tanta zica, doutor, que pareço pai de família, só acalmo de noite, depois que todos fora m para a cama. Na verdade, nas fases mais agitadas do pavilhão, nem na cama Bolacha tinha sossego: - No silêncio da noite, a mente trabalha solitária porque a decisão final é minha e dela depende a sorte de um ser humano. Sou o juiz do pavilhão. (VARELLA, 2005, p. 104)

Em uma dessas negociações sobre vida ou morte, Zico pede a Nego Preto que o autorize a matar Ezequiel, que está em dívida com ele. Nego Preto, então, como bom juiz, tenta ponderar a situação.

ZICO Nego, tô com um problema prá gente debatê. NEGO PRETO O problema tem nome? ZICO Ezequiel. Diz que vai pagá, não paga e pede mais fiado. Chega no meu barraco, sobe a vóis... Qualé?! NEGO PRETO E tu? ZICO Eu? Se não recebo, não tenho como pagar o Majestade. Nego, quero permissão pra matá esse pilantra. Se eu deixo por isso mesmo, perco o respeito co's companheiro. NEGO PRETO Calma. Vou mandá dizê ao Ezequiel que ele arrume o teu dinheiro com a família. Se ele não pagar, aí você tá liberado.

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Essa situação teve origem na história de Bolacha, um dos detentos que decidiam sobre o que se podia ou não fazer no presídio. No livro, também é Zico quem pede autorização para Bolacha. Uma vez, Zico, com fama de bandidão na Vila Guaram, reconheceu a fisionomia de um recém-chegado no pavilhão Nove e foi conversar com o encarregado-geral, um negro de lábios grossos conhecido como Bolacha, ladrão de longa carreira: - Quero pedir licença para dar uma lição nesse pilantra. É estuprador, abusou da amiga da minha irmã, lá na vila! (VARELLA, 2005, p. 101)

As características físicas de Nego Preto, que era negro, provavelmente tiveram sua origem em Bolacha e em sua personagem homônima, Nego-Preto (diferindo apenas pelo acréscimo do hífen). A personagem literária também servia como um juiz interno e era respeitado pelos dema is detentos. Nesse momento, veio pela galeria um rapaz escuro e parou a um metro da rodinha. Sua aproximação foi precedida pelo silêncio dos outros: - Não acredito que vocês estão debatendo um problema desses na presença do médico. Onde nós estamos? A interferência dele acabou com a discussão. Um a um, os debatedores se dispersaram. No final do ambulatório mandei chamar o rapaz que acabou com a briga. Nego-Preto a seu dispor, disse ele. Pedi-lhe que interviesse para evitar violência contra o Arnaldo. Respo ndeu que eu podia ficar tranqüilo, a situação já estava resolvida. Depois disso, sempre aparecia para conversar, contava casos da cadeia e falava das preocupações com a família, principalmente com o filho mais velho, adolescente sem juízo, que não obedecia à mãe. (VARELLA, 2005, p. 252253)

No fim do filme, pode-se ver o filho de Nego Preto aparecendo no Carandiru, agora como detento, e encontrando seu pai. Esta seria uma conseqüência da preocupação sentida pela personagem literária homônima. Antes de ser preso, Nego Preto assaltava junto com seus comparsas Escovão e Gordo. Após seu último assalto, que foi a uma joalheria em um shopping, Nego Preto seria preso devido a uma desavença na hora da partilha dos bens. MÉDICO E cê entrou aqui por quê? NEGO PRETO Legítima defesa.

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MÉDICO Agora isso dá cadeia? NEGO PRETO No meu caso deu. Veja a minha história, doutor. Era natal, sininho tocando, neve nas vitrine! Combinamo eu, o Escovão e o Gordo de fazê uma joalheria num shopping. Foi um assalto bonito, num demo um tiro. Problema foi depois...

O mesmo ocorre no livro, onde sua personagem homônima Nego-Preto é assaltante e acaba preso após uma desavença na hora da divisão das jóias.

A prisão de Nego-Preto ocorreu após uma sucessão de acontecimentos a partir de um as salto a uma joalheria da Barão de Itapetininga, no centro de São Paulo: (VARELLA, 2005, p. 253)

No momento da partilha, Escovão vai ao banheiro e, quando volta, está com uma mão encoberta pelo paletó. Nego Preto desconfia que ele esconde uma arma na mão e o mata. Gordo, então saca sua arma e a aponta para Nego Preto. Ele revela que havia planejado com Escovão matá- lo para ficarem com a parte dele da partilha. Porém, Gordo não tem coragem de matá- lo. No entanto, quando Nego Preto vai verificar a mão de Esco vão, percebe que ele estava desarmado.

NEGO PRETO Seu vacilão de merda! No meio da partilha tu me aparece de mão coberta?! NEGO PRETO (CONT'D) Ele morreu por culpa dele. NEGO PRETO (CONT'D) Que porra é essa? GORDO Tu matô ele no afobo mesmo... mas o combinado era eu te acertá, pra nóis ficá com a tua parte. NEGO PRETO Então atira... (pausa)

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...atira logo! GORDO Num consigo, porra. NEGO PRETO Me dá teu ferro.

(…)

NEGO PRETO Pô doutor, traição por crocodilage é a coisa mais feia. É um Judas que age assim, é a pessoa que guspiu na cara de Jesus!

No livro, esta passagem provavelmente teve sua origem em uma mistura de situações vividas por duas personagens: Nego -Preto e Valente. Como mencionado, Nego-Preto, personagem literária, era assaltante e havia feito um roubo a uma joalheria. Quando ele foi fazer a divisão das jóias com seus comparsas, Escovão e Marlon, percebeu que Escovão levava a mão no revólver. Acreditando que Escovão estava com a intenção de matá-lo, rapidamente, atira nele. Marlon, então, revela que o plano era matar NegoPreto para dividirem as jóias entre eles dois.

No barraco, mal começou a partilha, Nego-Preto teve uma surpresa desagradável: - Nesse intuito, que eu estou de cabisbaixo, olho de esguelha e, quem diria, ó, o Escovão está com a mão no revólver do cinto! Só que estava meio desesperado, olhando para a direita e para esquerda, onde que eu se aproveitei deste pequeno descuido e sapequei ele. Questão de sobrevivência, se não sapeco, sapecado seria eu. Foram três tiros. Escovão não teve tempo para revidar; do jeito que estava, ficou. Imediatamente, Nego-Preto voltou a arma para o peito de Marlon: - Ele podia estar de piolhagem com o Escovão ou, então, tomar a liberdade de discordar da minha atitude. Nem uma, nem outra; Marlon permaneceu estático, com os olhos assustados. Então, Nego-Preto quis saber: - Por que você ficou quietinho enquanto eu dei os tiros nele? - Porque ele já tinha me ligado, que ia te matar para dividir a parte de você. A resposta deixou Nego-Preto perplexo: - Pô, você sabia que o cara ia apertar eu e ficar com todo esses baratos aí, sendo que nos três estamos igual na fita e se um vai para a cadeia os outros dois vão junto! Você podia ter evitado este acontecimento lastimável, ter dialogado com ele para ele não tomar uma atitude feia dessas. (VARELLA, 2005, p. 253-254)

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Embora todo o resto da história sobre o assalto tenha mais relação com Nego-Preto, esta passagem em especial sobre a divisão do que roubaram na joalheria teve origem em situação vivida pela personagem literária Valente. A descrição do ocorrido é bem mais semelhante à situação vivida por Valente. Valente conta que sua sétima vítima foi assassinada em uma partilha após um assalto. Um de seus comparsas resolveu ir ao banheiro e voltou com a mão encoberta por uma jaqueta. Neste caso, tratava-se de dinheiro e não de jóias.

A sétima ocorreu na divisão de 30 mil dólares roubados em companhia de dois parceiros. Estavam repartindo o dinheiro quando um deles teve a má idéia de ir ao banheiro: - Fiquei esperto, porque olho de ladrão cresce mais do que devia. Quando o comparsa saiu do banheiro, trazia a jaqueta de couro no braço, cobrindo parcialmente a mão direita. Valente não hesitou: - Catei o revólver da mesa e dei três tiros nele. Desperdício, o primeiro acertou bem no meio das vistas. O outro companheiro se assustou: - Você está louco, matou o cara! - Ele ia atirar em mim. Foram até o corpo, levantaram a jaqueta e verificaram que o morto não tinha nada nas mãos, o revólver permanecia na cinta. Paciência, o amigo consolou: - Morreu por culpa dele próprio: a mesa cheia de dinheiro e ele aparece assim, por detrás, ainda com a mão encoberta! Infelizmente, ele vacilou. (VARELLA, 2005, p. 276)

No final do filme, quando a polícia invade o Carandiru, Nego Preto e seu filho estão abraçados, em sua cela. Quando um soldado entra em sua cela, eles estão sentados na cama e assustados. O soldado não os mata, mas arranca uma correntinha que Nego Preto tem no pescoço, como punição pelos roubos que ele havia cometido.

SOLDADO 4 (arrancando uma correntinha de ouro de Nego Preto) Aí ladrão, vê se é bom fazê isso com os outro...

Esta parte da história de Nego Preto tem origem na história de Chico Heliópolis, no livro: sua correntinha de ouro é roubada por um policial dentro do presídio, durante a invasão que culminou no massacre.

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Quietinho, preocupado apenas em preservar a vida, Chico Heliópolis, ladrão da favela de mesmo nome, perdeu corrente de ouro e a santa protetora que ganhou da madrinha na primeira comunhão: - O PM abaixou do meu lado: vê se é bom fazer isso com os outros, seu vagabundo, e arrancou a correntinha do meu pescoço. (VARELLA, 2005, p. 292)

Portanto, pode-se notar várias origens para a história de Nego Preto. Seu Chico, NegoPreto, Bolacha, Chico Heliópolis e Valente contribuíram para a história da personagem cinematográfica. As características físicas originaram de Nego-Preto e Bolacha, e as psicológicas, somente de Bolacha. Assim, temos Nego-Preto como personagem dominante, Bolacha como secundária e Seu Chico, Chico Heliópolis e Valente como personagens de apoio.

2.7 Seu Chico Quase nada se sabe sobre o passado de Seu Chico. É, provavelmente, a personagem que menos conversa com o Médico sobre sua vida, embora demonstre ser um senhor sábio. Vive isolado dos demais detentos e usa isso como estratégia de sobrevivência dentro do presídio. Nunca recebe visitas. MÉDICO Seu Chico, e o senhor tá aqui por quê? SEU CHICO Doutor, o senhor querer ouvir outra mentira? Aqui dentro ninguém é culpado. O senhor ainda não percebeu isso? MÉDICO E ainda fica muito por aqui? SEU CHICO Já passei da idade de ganhá a liberdade, mas tô na mão do juiz. Ah, doutor, não vejo a hora... A melhor coisa na cadeia é sair dela! MÉDICO E deixar os amigos, Seu Chico? SEU CHICO Amigos? Eu não quero amigo preso!

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SEU CHICO Eu acabo essa conversa com o senhor, fecho a porta e pronto. Aqui dentro a gente tem que andá é sozinho. No máximo , acompanhado de Deus.

Na obra literária, a personagem Seu Jeremias é a que deu origem a esta maneira de se comportar de Seu Chico. Ele é conhecido no presídio por estar lá já há muitos anos, mas usa a solidão como estratégia de sobrevivência. Seu Jeremias também não gosta de falar sobre seu passado.

Seu Jeremias é daqueles homens que jogaram uma pá de cal sobre o passado. Nunca tive coragem de perguntar-lhe a respeito da vida no crime; ele tampouco deu tal liberdade. (VARELLA, 2005, p. 244) Para ele, solidão é estratégia de sobrevivência: - Posso morrer de doença, mas assassinado na cadeia, não. Acabo a conversa com o senhor, vou direto para o xadrez e fecho a porta. Não confio em ninguém e não tenho amigo nenhum; amigo preso, eu não quero; que é isso! Muitos me conhecem, estou aqui há tantos anos; opa, opa, vou passando. Na cadeia, tem que andar sozinho, e Deus. Isto aqui, é pisar em casca de ovo! (VA RELLA, 2005, p. 245)

Seu Chico era pai de 18 filhos, mas nenhum ia visitá- lo. Até que, um dia, recebe um telefonema de uma de suas filhas, ela diz que quer visitá- lo, pois não se lembra mais de seu rosto.

SEU PIRES Eu não sabia que cê tinha família, velho. SEU CHICO Eu achava também que tinha perdido ela. Todo uma vida preso, mesmo assim eu criei dezoito filho e nenhum deles pisô numa delegacia. Essa menina é minha caçula. Ela disse que não se lembra mais do meu rosto e decidiu vim me visitá. Eu queria que o senhor autorizasse eu encontrá co'ela fora do dia da visita . Não quero filho meu no meio da malandragem... SEU PIRES Assim, o senhor me complica. E se os outros sete mil me pedem a mesma coisa?

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Na obra literária, é sua personagem homônima que vive a situação de haver sido abandonado pela mulher e sente falta dos filhos, mas não os quer ver ligados ao crime.

Foi abandonado pela mulher, ingrata, filha de família que não presta, responsável pela entrada dele no mundo do crime, segundo sua opinião. Cumpre quinze anos de uma pena de 44. Sofre saudades dos filhos mas se conforma, acha até bom não virem para não freqüentar o ambiente da cadeia. (VARELLA, 2005, p. 217)

No entanto, é Seu Jeremias que tem dezoito filhos na obra literária.

Seu Jeremias fugiu da seca na Bahia nos anos 40 e desembarcou na Estação da Luz, recém-casado; ela com um lencinho na cabeça, morta de frio, e ele com os pertences do casal na mala de papelão. Tiveram dezoito filhos, que lhes deram 32 netos e sete bisnetos. (VARELLA, 2005, p. 243)

Um dia, Seu Chico agride um dos carcereiros, após haver esperado a visita dos filhos, que não apareceram. Ele, então, é levado para solitária, onde passa 30 dias. Ao sair, recebe a visita do Médico.

SEU CHICO Precis a não, doutor. Tantos ano preso, a mente aprende a dominá o corpo.

Seu Jeremias, personagem literária, é quem compartilha deste episódio com Seu Chico. Também pode-se perceber, que as características físicas de Seu Chico (negro e idoso) têm origem em Seu Jeremias. Seu Jeremias desentendeu-se com um funcionário e pegou trinta dias na Isolada. Fui visitá-lo com o Waldemar Gonçalves. Pelo guichê da cela escura, mal pude discernir suas feições de negro velho e a carapinha grisalha. Quando saiu, veio agradecer a visita. Estava magro e tinha os olhos tristes. Sua figura, no entanto, transmitia uma força de caráter que lembrava meu pai. - Para quem passou um mês na tranca brava, o senhor até que está bem. - Tantos anos preso, doutor, a mente aprende a dominar o corpo. (VARELLA, 2005, p. 243)

Sendo assim, pode-se encontrar as origens da personagem Seu Chico em sua personagem homônima e em Seu Jeremias. Como personagem dominante, tem-se Seu Jeremias e, como secundária, Seu Chico, que também deu origem ao nome da personagem cinematográfica.

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2.8 Ezequiel Ezequiel era apaixonado por surfe e viciado em crack. Era um jovem adulto, magro, negro, com cabelos descoloridos. As características físicas de Ezequiel provavelmente tiveram origem em Sarará, única personagem negra com cabelos loiros.

Uma vez tentei reunir alguns líderes da malandragem para lhes propor a adoção de tal medida. Fui desanimado pelo Sarará, um negro loiro com muitas passagens pela Casa: - Não tem chance de dar certo, doutor. O viciado fica devendo 20 reais e entrega a televisão por esse preço. Dá muito lucro. (VARELLA, 2005, p. 139)

Por conta do vício, vive em dívida no Carandiru. Como quase nada lhe restou, tenta comprar drogas fiado de Zico, com quem já tem dívida.

ZICO Como é que é? Veio acertá tua dívida? EZEQUIEL Pô, mano, no momento, Ezequiel tá meio prejudicado. Aí ele pensô: "pô, o Zico é chegado, vai aceitá a prancha de garantia pela dívida". Aí, o Ezequiel pode fiar mais uma pedrinha de crack. ZICO Pensô errado. (…) Paga o que tu deve!

Com a morte de Zico, esfaqueado por vários detentos, Majestade procura Ezequiel, que era devedor de Zico, para que ele assumisse a culpa. Majestade lhe faz uma proposta que lhe foi irrecusável: uma cela só para ele, com roupa lavada e drogas para consumir. Ezequiel logo se desinteressa pela liberdade que viria em dois anos, pois estava com AIDS e sem dinheiro.

MAJESTADE Ô Ezequiel, tu não acha que aquele sem vergonha do Zico é o culpado pela tua desgraça?

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EZEQUIEL Acho, mas a vida do Ezequiel sempre foi cheia de desgraça. MAJESTADE E não foi o Zico que fez o Ezequiel oferecê a irmã pra pagá droga? EZEQUIEL Foi. Fazê o quê? MAJESTADE (mostrando a faca) Parece esquecido. Tu já fez. Ezequiel furô o Zico. Mais de trinta furo. EZEQUIEL Ô Majestade, só falta dois ano pro Ezequiel saí. Se eu fizé isso, vou amarrá vinte. MAJESTADE Dois anos, vinte anos. Que diferença faz pro Ezequiel? Tá com AIDS. Pelo menos, tu vai tê uma cela só pra ti, roupa lavada e, é claro, pedra pra fumá.

No livro, Alfinete é quem assume a culpa por um assassinato cometido por seis detentos, no qual não estava envolvido, para saldar sua dívida com um traficante. Enquanto, no filme, Ezequiel devia para Zico, que foi assassinado, no livro, Alfinete assume a culpa por um assassinato cometido pelo seu credor e mais outros detentos. Ele também recebeu privilégios por isso.

No pavilhão, usuário contumaz, consumiu 60 reais alé m de suas posses. Um dia, o credor chamou-o no xadrez: - Alfinete, já faz uns dias que você me deve. Vai pagar quando? - Neste momento, estou justamente sem condições, devido que a minha mãe não veio na visita, porque se encontra no hospital com a minha irmã que tomou um tiro no peito, na mesma fita em que o meu cunhado foi chacinado... O outro o interrompeu: - Alfinete, é o seguinte: no final da tarde, vai aparecer um finado na rua Dez do quarto andar. Você desce para a Carceragem e se apresenta. Diz que o cara ofendeu a senhora tua mãe que está no hospital, cuidando da filha viúva. Alfinete assumiu a autoria do crime, na verdade cometido por seis detentos... (…) - Para mim não faltava nada, que os companheiros levavam comida, baseado para fumar e até pinga para criar coragem de encarar a quentinha. (VARELLA, 2005, p. 149)

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Ezequiel, personagem cinematográfica, teve em Sarará a origem de suas características físicas. Sua história é compartilhada por Alfinete no livro e seu nome vem da personagem Ezequiel dos Santos, que não contribui com nada além do nome. Portanto, tem-se Alfinete como personagem dominante e Sarará como personagem de apoio.

2.9 Peixeira O matador de aluguel Peixeira é, das personagens principais, provavelmente, a com menos correspondência na obra literária. Não há personagem com mesmo nome ou nome similar e nem semelhança física. Também não é mencionado nenhum assassino profissional. No entanto, a parte mais comovente da história de Peixeira teve origem na personagem literária Valente. Peixeira, um dia, começa a duvidar de sua vida como matador de aluguel e começa a sentir remorso por suas vítimas. Em um dia de chuva, desorientado, sai ao pátio, onde avista uma pequena igreja evangélica. Ele se aproxima, confuso, e chega à igreja no meio do culto. O pastor percebe o recém-chegado e lhe convida a aceitar a vida religiosa para si. Chorando, ele se ajoelha e concorda.

PASTOR (para Peixeira) Entra, irmão. Entra. Vem. Você sabia que o Senhor tem um plano pra você? Essa é a tua casa. PASTOR (CONT'D) Você está perdido, irmão. Você não sabe, mas foi Ele quem te trouxe aqui. PEIXEIRA Ele quem, pastor? PASTOR Jesus! PASTOR (CONT'D) Ele sabe que você não dorme se não faz um mal a alguém, que você perde o sono quando não consegue fazer alguém tropeçar. Não tem sido assim todo os dias, irmão?

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Vamos, não tem sido assim todos os seus dias? PEIXEIRA Foi, pastor. Foi sim. Tem tanto sangue comigo, pastor. PASTOR Vamos, irmão, dobra o joelho. Vamos, d obre o joelho. Você quer aceitar Jesus? Vamos! Você quer aceitar Jesus? Você quer aceitar Jesus? Vamos, irmão! Você quer aceitar Jesus? Quem aqui já aceitou Jesus? TODA A AUDIÊNCIA Eu! PASTOR (CONT'D) Aleluia, senhor! Aleluia! TODA A AUDIÊNCIA Aleluia! Aleluia! Aleluia! PEIXEIRA Aleluia, senhor.

Na obra literária, Valente chega até a igreja para se abrigar da chuva e, ao ouvir o culto, resolveu entrar. Sentiu que ouvia palavras divinas e se arrependeu de seus crimes.

Então, veio um dia de chuva. Para se abrigar, ele encostou na parede junto à igreja, no térreo do Nove e, sem querer, ouviu a pregação do pastor: - A Bíblia diz em Isaías capítulo 9, verso 6, que Jesus Cristo é o Conselheiro, é o Deus forte, Pai da Eternidade e Príncipe da Paz. Você que vive na vida errada, Deus tem um plano para você. Venha hoje para Jesus, que amanhã pode ser tarde. Não importa se é bandido, quantos matou, Jesus Cristo faz questão de perdoar você com todos os teus pecados, te tirar das trevas e operar uma obra na sua vida. Valente chegou um pouco para dentro. Sentiu que o Espírito Santo de Deus falava pela boca do pastor: - Quem quer aceitar Jesus? Quem quer levanta a mão! As veias do pescoço do pregador saltaram e os olhos cuspiram fogo. Valente achou que a fisionomia estava desfigurada pelo Espírito Santo de Nosso Senhor. Sentiu um punhal frio penetrar-lhe a carne. Levantou o braço: - Dobra o joelho, irmão! Valente obedeceu e caiu no choro: -Arrependi dos crimes, da raparigagem e das maldades. Chorei feito nenê no colo da mãe. Quando levantou, estava desanuviado. Sentiu o perdão do Senhor pousar em sua fronte. (VARELLA, 2005, p. 277-278)

A única origem da personagem Peixeira é Valente, embora as características físicas e psicológicas e nem toda a história de Valente tenha dado origem a Peixeira, nenhuma outra

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personagem teve algo em comum que pudesse ser identificado como sua origem. Também não houve origem para seu nome na obra literária.

2.10 Médico O Médico, que não tem nome e é identificado simplesmente como Médico na obra cinematográfica, chega à Casa de Detenção de São Paulo para tratar os detentos e alertá-los sobre o perigo da AIDS. O Médico, chamado de doutor pelos detentos e pelos funcionários, atende em um consultório improvisado, onde colhe sangue para os testes de HIV com a ajuda de dois detentos. Sem Chance é seu enfermeiro e Lula faz pequenas operações. Ao chegar ao presídio, Seu Pires, o diretor, lhe mostra o local e expõe a situação do presídio, enquanto o Médico lhe explica qual trabalho planeja fazer.

MÉDICO Seu Pires, esse pessoal faz o quê o dia todo aqui? SEU PIRES Esses aí ficam zanzando o dia inteiro. Acham que estão ocupados, mas não vão a lugar nenhum. Doutor, são sete mil homens na cadeia. Só aqui neste pavilhão são 1800. MÉDICO Seu Pires, se eles entenderem como é que se pega AIDS pra mim já é um adianto. Eles pegam a doença é aqui dentro, depois transam com a mulher, namorada... daí a epidemia não pára mais. SEU PIRES Quem vai ouvir seus conselhos, doutor, é o malandro de verdade. Aquele que quer sair inteiro daqui, pra assaltar de novo lá fora. Essa é a vida dele. MÉDICO Que seja. Mas agora eles estão é vivendo n o foco da doença, Seu Pires. Estão presos aqui. SEU PIRES Presos? São os donos da cadeia, doutor. Isso aqui só não explode por que eles não querem.

Na obra literária, o narrador é quem vai até o presídio conhecido como Carandiru para tratar e alertar os detentos sobre a AIDS, que se encontrava em fase de pré-epidemia na Casa.

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Uma manhã de inverno, subi até o quinto andar do pavilhão Quatro para acertar os detalhes com o dr. Mário Mustaro, o chefe do serviço médico da Casa, por coincidência meu ex-professor de bioquímica na faculdade. Falamos da burocracia interna, das patologias mais prevalentes e conheci meu primeiro enfermeiro... (VARELLA, 2005, p.80)

Em um determinado momento, no filme, o Médico se encontra em uma situação delicada: o porteiro noturno não o reconhece e ele fica apreensivo com a possibilidade de ter de passar a noite dentro do Carandiru. PORTEIRO NOTURNO Quem é você? MÉDICO Sou o médico, tava na enfermaria coletando sangue, pode perguntar aí... PORTEIRO NOTURNO Epa! Querer dizer pra quem eu tenho que perguntar. Eu vou ligar lá no plantão. Espera aí. Se ninguém te conhecer, cê fica aí, hein, malandro. (…) PORTEIRO NOTURNO Não me leva a mal, doutor. A cara deles é fugir e a minha é não deixar.

Esta mesma situação é vivida pelo narrador na obra literária. Em ambas as obras, o malentendido é desfeito e ele é liberado para sair do presídio.

Saí do pavilhão, cruzei a Divinéia e bati no portão que leva à portaria. Através da janelinha, o porteiro da noite me mediu de alto a baixo. - Quem é você? - Sou médico, estava atendendo no Quatro. Encarou-me outra vez, demoradamente, depois abaixou o olhar na direção da minha calça: - É o seguinte: eu vou falar com o plantão, e se ninguém te conhecer, você fica. - Sou médico, pode perguntar para o funcionário que me abriu a gaiola do Quatro. - Não é você que vai me dizer para quem eu devo perguntar. Espera aí. Desconfiado, olhou fixo nos meus olhos e saiu sem pressa na direção da Ratoeira. (…) No final dei sorte, o porteiro voltou com um funcionário que me conhecia e se desculpou: - Não leva a mal, doutor, são 7 mil aí dentro. A minha cara é desconfiar! (VARELLA, 2005, p. 88-89)

174

No final do filme, após o massacre, o Médico relata sua experiência com os detentos, vistos, por ele, simplesmente como seres humanos que precisam de atendimento médico. Ele deixa claro que seu papel ali não era julgar.

MÉDICO (OFF) No final dos anos 80, um trabalho de prevenção à AIDS entre a população carcerária me levou à Casa de Detenção de São Paulo, o Carandiru. MÉDICO (OFF) Ali dentro, ouvi estórias, fiz amizades verdadeiras, aprendi medicina e, na convivência, penetrei alguns mistérios da vida no cárcere, inacessíveis se eu não fosse médico.

Curiosamente, este mesmo relato é feito pelo narrador (Drauzio Varella) no começo do livro, na Introdução, e em um capítulo da primeira parte da obra literária (o livro foi dividido em três partes, separadas pelas fotos). Porém, pode-se perceber que a informação passada é a mesma, apesar de feita em momento diferente.

Duas semanas depois, procurei o dr. Manoel Schechtman, responsável pelo departamento médico do sistema prisional, e me ofereci para fazer um trabalho voluntário de prevenção à AIDS. (…) O trabalho começou em 1989 e dura até hoje. (…) fizemos pesquisas epidemiológicas sobre a prevalência do HIV, organizamos palestras, gravamos vídeos, editamos a revista em quadrinhos O Vira Lata (…), e atendi doentes. Com os anos, ganhei confiança e pude andar com liberdade pela cadeia. Ouvi histórias, fiz amizades verdadeiras, aprendi medicina e muitas outras coisas. Na convivência, penetrei alguns mistérios da vida no cárcere, inacessíveis se eu não fosse médico. (VARELLA, 2005, p. 9-10)

A última fala do filme, que também é do Médico, faz menção à sua sensação ao ouvir o barulho do portão de entrada, que lhe trazia lembranças dos filmes de prisão.

MÉDICO (OFF) Ainda hoje, quando o portão de ferro bate às minhas costas, sinto um aperto na garganta, igual ao daquelas matinês no Cine Rialto, onde eu assistia eletrizado os filmes de cadeia em branco e preto.

175

A forma como a obra cinematográfica é terminada é igual a como a obra literária começa: o Médico/Narrador remetendo-se aos filmes de cadeia da infância. Tem-se uma inversão total: a última informação do filme tem origem na primeira informação do livro.

Quando eu era pequeno, assistia eletrizado àqueles filmes de cadeia em branco e preto. Os prisioneiros vestiam uniforme e planejavam fugas de tirar o fôlego na cadeira do cinema. Em 1989, vinte anos depois de formado médico cancerologista, fui gravar um vídeo sobre AIDS na enfermaria da Penitenciária do Estado, construção projetada pelo arquiteto Ramos de Azevedo nos anos 20, no complexo do Carandiru, em São Paulo. Quando entrei e a porta pesada bateu atrás de mim, senti um aperto na garganta igual ao das matinês do cine Rialto, no Brás. (VARELLA, 2005, p.9)

Como no livro Drauzio Varella se coloca no papel de narrador, ao invés de uma personagem fictícia, uma vez que se trata de um relato de sua experiência e não de uma obra de ficção, pode-se encontrar a origem do Médico, personagem cinematográfica, no próp rio Drauzio , ao relatar sua vivência na Casa de Detenção de São Paulo. Portanto, tem-se o Narrador (Drauzio Varella) como personagem dominante e única de origem do Médico.

176

Por fim, pode-se sintetizar estes dados da seguinte maneira:

TABELA 24 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS Personagem

Características

Características

físicas

psicológicas

História

Personagens de origem

Jovem da periferia, que luta para não Recluso e tímido,

Deusdete

Aparência de

resiste em se

aproximadamente

envolver com os

20 anos, branco,

demais detentos e,

magro, tem

freqüentemente,

cabelos curtos e

aparece lendo na

negros.

cela.

entrar na vida de crimes. É preso após assassinar os agressores da irmã Francineide. Na

Deusdete, Gersinho.

prisão, encontra o amigo de infância Zico, que acaba assassinando-o com uma panela de água fervente. Criado pela mãe de

Zico

Aparência de no

Inquieto e

máximo 30 anos,

hiperativo, devido

branco, tem

ao constante

cabelos curtos, geralmente

consumo de crack. Inseguro,

ocultos por uma

demonstra-se

touca de meia de

piedoso com um

seda.

devedor.

Deusdete, se envolveu com o crime cedo. Viciado em crack, que o leva a matar o amigo de infância durante uma alucinação. É morto a facadas por vários presos.

Zico, Mané de Baixo, Juscelino, Ôrra Meu.

177

Conhece sua primeira mulher, Malandro com gingado, Aparência de 40 e poucos anos, Majestade

negro, de cabelos

orgulhoso de seu poder e por desfrutar do amor de suas duas

curtos e um pouco acima do peso.

mulheres. Carismático, sempre conta vantagem em suas histórias.

Dalva, numa partida de futebol, onde o noivo dela

Majestade,

joga. Foge com ela

Kenedi

e a pede em

Baptista dos

casamento, mas

Santos,

seus pais não

conhecido

aceitam por ele ser

como Zé da

negro. Casado com

Casa Verde,

Dalva, conhece

Charuto.

Rosirene, uma prostituta, com quem também constitui família. Ajudante do Médico na enfermaria, que se

Sem Chance

Aparência de 30

Uma espécie de

encanta pelo

e poucos anos,

“filósofo”, é um

travesti Lady Di,

branco, magro,

detento escolado,

com quem se

Sem-Chance,

baixinho, tem

de boa

“casa” dentro do

Edelso.

cabelos curtos e

argumentação e

presídio. Sonha em

encaracolados.

sonhador.

abrir o próprio consultório médico quando ganhar sua liberdade.

178

Sonhador e

Travesti que teve

Aparência de 20

delicado. Sua

mais de 2 mil

e poucos anos,

carência se

parceiros, tinha

branco, travesti,

demonstrava pelos

problemas com

alto, de cabelos

vários

seus pais, que não

negros em estilo

relacionamentos

aceitavam a vida

chanel e de

que teve.

que escolheu. No

presença

Realizou-se

Carandiru, se

marcante.

quando encontrou

“casa” com Sem

o amor.

Chance.

Lady Di

Sheila, Leidi Dai, Raimundo da Silva, conhecido como Loreta, Pérola Byington, Margô Suely.

Traído pelos Um líder,

Nego Preto

Aparência de 50

assumindo papel

e poucos anos,

de juiz interno. É,

negro, de

antes de tudo, um

bigodes, de

pacificador,

cabelos curtos e

desenvolvendo,

negros.

por conta disso, estresse.

comparsas, foi preso por assassinato e se

Nego-Preto,

tornou o chefe da

Bolacha, Seu

Cozinha Geral no

Chico, Chico

Carandiru. Tudo

Heliópolis,

que ocorre lá

Valente.

dentro deve passar por ele e deve ter sua autorização.

179

Apaixonado por balões, é pai de 18

Seu Chico

Aparência de

Calmo e

filhos, mas nenhum

aproximadamente

reservado, era um

vai visitá- lo. Já

60 anos, negro,

senhor triste e

cumpriu parte da

tem cabelos

solitário pela

sentença e está na

curtos e

distância da

dependência do

encaracolados,

família, que não o

juiz dar sua

acima do peso.

visitava.

liberdade. Vive

Seu Chico, Seu Jeremias.

isolado dos demais detentos. Por conta de uma dívida, quase acaba Aparência de 20 e poucos anos, negro, magro, Ezequiel

tem cabelos curtos descoloridos. Tem AIDS.

Ingênuo e submisso, vive à mercê dos outros detentos por conta de seu vício de crack.

morto. Sem perspectiva por conta da doença e para ganhar privilégios, acaba assumindo a autoria de um assassinato que não cometeu.

Ezequiel dos Santos, Alfinete, Sarará.

180

Matador de aluguel, encontra o filho de uma de Assassino

suas vítimas que

destemido e frio.

quer vingança no

Tem uma

presídio. Depois de

reviravolta no

não conseguir

presídio, passando

matar um detento,

a se sentir culpado

começa a se sentir

pelos crimes,

culpado pelas

chegando a se

outras mortes. No

converter ao

fim, acaba entrando

evangelismo.

em uma igreja

Aparência de 30 e poucos anos, forte, com corpo Peixeira

malhado e tatuado. Careca, geralmente, usa touca de lã.

Valente

evangélica dentro do Carandiru e se converte. Médico que foi ao presídio para tratar

Médico

Calmo e paciente,

os detentos e tomar

Aparência de 40

é preocupado com

providências contra

e poucos anos,

o bem-estar dos

a pré-epidemia de

Narrador

branco, de

pacientes

AIDS. Ganhou a

(Drauzio

cabelos castanhos

independente dos

confiança dos

Varella)

e curtos, magro.

crimes que

detentos, que lhe

haviam cometido.

contavam suas histórias e lhe pediam conselhos.

181

Esta tabela pode ser subdividida em quatro partes, de acordo com os seguintes critérios:

1. Origem das personagens pelas características físicas;

TABELA 25 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELAS CARACTERÍSTICAS FÍSICAS Personagem Deusdete

Características físicas Aparência de aproximadamente 20 anos,

Personagem de origem Gersinho

branco, magro, tem cabelos curtos e negros. Aparência de no máximo 30 anos, branco, Zico

tem cabelos curtos, geralmente ocultos por

-

uma touca de meia de seda. Charuto e Kenedi Majestade

Aparência de 40 e poucos anos, negro, de

Baptista dos Santos,

cabelos curtos e um pouco acima do peso.

conhecido como Zé da Casa Verde.

Aparência de 30 e poucos anos, branco, Sem Chance

magro, baixinho, tem cabelos curtos e

Sem-Chance

encaracolados.

Lady Di

Nego Preto

Aparência de 20 e poucos anos, branco,

Sheila e Raimundo da

travesti, alto, de cabelos negros em estilo

Silva, conhecido como

chanel e de presença marcante.

Loreta.

Aparência de 50 e poucos anos, negro, de

Negro-Preto e Bolacha.

bigodes, de cabelos curtos e negros. Aparência de aproximadamente 60 anos, Seu Chico

negro, tem cabelos curtos e encaracolados,

Seu Jeremias

acima do peso. Aparência de 20 e poucos anos, negro, Ezequiel

magro, tem cabelos curtos descoloridos. Tem AIDS.

Sarará

182

Aparência de 30 e poucos anos, forte, com Peixeira

-

corpo malhado e tatuado. Careca, geralmente, usa touca de lã.

Médico

Aparência de 40 e poucos anos, branco, de

-

cabelos castanhos e curtos, magro.

2. Origem das personagens pelas características psicológicas;

TABELA 26 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELAS CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS Personagem

Características psicológicas

Personagens de origem

Recluso e tímido, resiste em se envolver Deusdete

com os demais detentos e, freqüentemente,

-

aparece lendo na cela. Inquieto e hiperativo, devido ao constante Zico

consumo de crack. Inseguro, demonstra-se

Mané de Baixo

piedoso com um devedor.

Majestade

Sem Chance

Malandro com gingado, orgulhoso de seu

Kenedi Baptista dos

poder e por desfrutar do amor de suas duas

Santos, conhecido como

mulheres. Carismático, sempre conta

Zé da Casa Verde e

vantagem em suas histórias.

Charuto

Uma espécie de “filósofo”, é um detento

-

escolado, de boa argumentação e sonhador. Sonhador e delicado. Sua carência se Lady Di

demonstrava pelos vários relacionamentos que teve. Realizou-se quando encontrou o amor.

Pérola Byington e Raimundo da Silva, conhecido como Loreta.

183

Um líder, assumindo papel de juiz interno. Nego Preto

É, antes de tudo, um pacificador,

Bolacha

desenvolvendo, por conta disso, estresse. Calmo e reservado, era um senhor triste e Seu Chico

solitário pela distância da família, que não o

Seu Jeremias

visitava. Ingênuo e submisso, vive à mercê dos Ezequiel

outros detentos por conta de seu vício de

Alfinete

crack. Assassino destemido e frio. Tem uma reviravolta no presídio, passando a se sentir Peixeira

culpado pelos crimes, chegando a se

Valente

converter ao evangelismo. Calmo e paciente, é preocupado com o bemMédico

estar dos pacientes independente dos crimes

Narrador

que haviam cometido.

3. Origem das personagens por suas histórias.

TABELA 27 – ORIGEM DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS PELA HISTÓRIA Personagem

História

Personagens de origem

Jovem da periferia, que luta para não entrar na vida de crimes. É preso após assassinar Deusdete

os agressores da irmã Francineide. Na prisão, encontra o a migo de infância Zico, que acaba assassinando-o com uma panela de água fervente.

Deusdete

184

Criado pela mãe de Deusdete, se envolveu com o crime cedo. Viciado em crack, que o Zico

leva a matar o amigo de infância durante uma alucinação. É morto a facadas por

Zico, Mané de Baixo, Juscelino e Ôrra Meu.

vários presos. Conhece sua primeira mulher, Dalva, numa partida de futebol, onde o noivo dela joga. Foge com ela e a pede em casamento, mas Majestade

seus pais não aceitam por ele ser negro.

Kenedi Baptista dos Santos, conhecido como Zé da Casa Verde e

Casado com Dalva, conhece Rosirene, uma prostituta, com quem também constitui

Charuto.

família. Ajudante do Médico na enfermaria, que se encanta pelo travesti Lady Di, com quem se Sem Chance

“casa” dentro do presídio. Sonha em abrir o

Sem-Chance e Edelso.

próprio consultório médico quando ganhar sua liberdade. Travesti que teve mais de 2 mil parceiros, Lady Di

tinha problemas com seus pais, que não

Leidi Dai, Sheila e

aceitavam a vida que escolheu. No

Margô Suely.

Carandiru, se “casa” com Sem Chance. Traído pelos comparsas, foi preso por

Nego Preto

assassinato e se tornou o chefe da Cozinha

Nego-Preto, Seu Chico,

Geral no Carandiru. Tudo que ocorre lá

Bolacha, Valente e Chico

dentro deve passar por ele e deve ter sua

Heliópolis.

autorização. Apaixonado por balões, é pai de 18 filhos, mas nenhum vai visitá-lo. Já cumpriu parte Seu Chico

da sentença e está na dependência do juiz dar sua liberdade. Vive isolado dos demais detentos.

Seu Chico e Seu Jeremias.

185

Por conta de uma dívida, quase acaba morto. Sem perspectiva por conta da doença Ezequiel

Alfinete

e para ganhar privilégios, acaba assumindo a autoria de um assassinato que não cometeu. Matador de aluguel, encontra o filho de uma de suas vítimas que quer vingança no presídio. Depois de não conseguir matar um

Peixeira

Valente

detento, começa a se sentir culpado pelas outras mortes. No fim, acaba entrando em uma igreja evangélica dentro do Carandiru e se converte. Médico que foi ao presídio para tratar os detentos e tomar providências contra a pré-

Médico

epidemia de AIDS. Ganhou a confiança dos

Narrador

detentos, que lhe contavam suas histórias e lhe pediam conselhos.

4. Origem dos nomes das personagens.

TABELA 28 – ORIGEM DOS NOMES DAS PERSONAGENS PRINCIPAIS Personagem

Personagens de origem

Deusdete

Deusdete

Zico

Zico

Majestade

Majestade

Sem Chance

Sem-Chance

Lady Di

Leidi Dai

Nego Preto

Nego-Preto

186

Seu Chico

Seu Chico

Ezequiel

Ezequiel dos Santos

Peixeira

-

Médico

-

3. As personagens secundárias Mais do que personagens de apoio ou preenchimento da história e das ações, há certas personagens no enredo de Carandiru que dão sustentação e são de grande importância para as personagens principais, sem que ocupem lugar central nas ações.

3.1 NÚCLEO SEU PIRES Seu Pires

Imagem de Seu Pires interpretado por Antonio Grassi obtida na web.

Um homem calmo, assim era Seu Pires, o diretor da Casa de Detenção. Negociava com os detentos, como quando Seu Chico quis ver a filha fora do horário de visitas. Consciente de que teria que ser maleável para comandar um presídio com mais de 7 mil homens, deixa claro que está disposto a ajudar aqueles que respeitam a disciplina. O bom relacionamento do diretor com os detentos pode ser visto em vários momentos: Seu Pires sentado na barbearia do presídio enquanto o detento Barba faz a sua barba; ao acompanhar Se u Chico à solitária, nota-se um olhar entristecido do diretor, que comenta ao velho que ele mesmo havia procurado aquela situação ao agredir um guarda; seu bom coração é revelado ao atender o pedido de Seu Chico, dando- lhe, inclusive, mais tempo que o permitido

187

com sua filha. Durante a rebelião, é Seu Pires quem negocia com os detentos, que pedem que ele os salve, para que não haja invasão.

TABELA 29 – ORIGEM DE SEU PIRES Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem Na opinião do dr. Walter, que

Chegou a diretor-

Dr. Walter

começou ainda menino como

geral do presídio.

SEU PIRES

carcereiro, formou-se advogado e

Começou como

Presos? São os donos da

chegou a diretor-geral do

cadeia, doutor. Isso aqui só

presídio, para resolver o

não explode por que eles não

problema seria preciso transferir

querem.

todos os detentos, fechar a cadeia

carcereiro e depois se formou advogado.

e começar de novo: (VARELLA, 2005, p. 36)

Dr. Pedrosa

(andando sozinho com o

Pouco depois apareceu o dr.

Médico pelo presídio)

Pedrosa, diretor-geral do

Diretor- geral do

MÉDICO

presídio que, na época, andava

presídio, que

Seu Pires, esse povo não toma

sozinho pela cadeia inteira,

sol nunca? Isso aqui é um

prática que posteriormente cairia

mofo!

em desuso:

SEU PIRES

- Tudo bem, doutor? Na saída,

Alguém aí quer tomar um sol?

passa na minha sala para

Dar uma volta no pátio?

tomar um café. (VARELLA,

Respirar um ar puro?

2005, p. 279)

caminhava sozinho pelo presídio.

188

Dias depois seu Chico o procurou em tom grave:

Seu Pires

SEU CHICO

- Seu Pires, quero pedir um favor

Eu queria que o senhor

que faço questão de jamais

autorizasse eu encontrá co'ela

esquecer.

fora do dia da visita . Não

(…)

Diretor do

quero filho meu no meio da

- Queria que o senhor me

Pavilhão Oito, de

malandragem...

autorizasse a encontrar com eles lá fora, no coreto da Divinéia.

cabelos grisalhos. SEU PIRES

Não quero meus filhos dentro de

Assim, o senhor me complica.

uma cadeia.

E se os outros sete mil me

- Assim o senhor me complica.

pedem a mesma coisa?

Imagina se os outros 7 mil me pedem a mesma coisa. (VARELLA, 2005 p. 224)

3.2 NÚCLEO MAJESTADE Dalva

Rosirene

Imagens de Dalva interpretada por Maria Luísa Mendonça e de Rosirene interpretada por Aída Leiner obtidas na web.

Dalva, uma mulher loira, de pele bem branca, estava noiva quando conheceu Majestade em uma partida de futebol, na qual seu noivo jogava. Majestade a aborda, perguntando se ela acredita em amor à primeira vista e diz que se casará com ela. Dalva argumenta que ele nem a conhece, Majestade, então, começa a descrevê- la. Quando o noivo dela chega para ver o que está acontecendo, Majestade manda-o embora, mas ele tenta arrastar Dalva junto. Vendo que não se livrará dele facilmente, Majestade saca a arma e atira para o lado, o noivo sai correndo. Assim,

189

Majestade convence Dalva de que seu noivo não a ama de verdade e lhe diz para reunir a família no dia seguinte, pois a pedirá em casamento. No dia seguinte, na casa de Dalva, Majestade é confrontado pelo pai da noiva, que, por preconceito, não permite que eles se casem. Diante desta situação, percebendo que não receberá apoio para o casamento, ele saca a arma e ordena a todos que se juntem na sala de jantar; ele anuncia que se casará com Dalva de qualquer jeito. Os dois fogem. Um dia, já casados, Majestade e Dalva vão a um bar, onde dançam ao som do samba ao vivo. Lá, Majestade avista Rosirene, uma negra esbelta, por quem se encanta. Ele deixa Dalva dançando sozinha e vai conversar com Rosirene, que está consumindo drogas. Ele lhe diz para pegar o biquíni, pois vai levá- la à praia no domingo . Dalva chega para saber o que ocorre e começa a discutir com Rosirene, xingando-a. Majestade a leva embora. Ele conta ao Médico que dividia a semana entre as duas. Alugou um quartinho perto da antiga rodoviária para se encontrar com Rosirene, que era prostituta e não queria largar a profissão. Um dia, Majestade vê Rosirene saindo de um carro. Ela havia feito um programa com Farofa, amigo de Majestade. Furioso, ele a confronta, alegando que poderia sair com quem quisesse, menos com amigos dele. Ela revela que os dois estão fazendo planos para ir para Miami. Com raiva, Majestade sai correndo atrás dela com uma tocha na mão. Mesmo após ser preso, Majestade continua com a vida dupla, até que, em um dia de visitas, as duas mulheres dele aparecem. Ele tenta, mas não consegue evitar o encontro das duas, que dizem a ele que deve decidir com qual das duas quer ficar. Majestade tem três filhos com Dalva e um com Rosirene.

190

TABELA 30 – ORIGEM DE DALVA Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem A outra mulher

Rosane

de Charuto,

MAJESTADE

viciada em

(indicando uma das alianças)

crack. Mãe de

Essa daqui é da Dalva, minha

seu primeiro

princesa!

Agora, o grande eu não sei, porque ele vive com a Rosane, minha outra mulher... (VARELLA, 2005, p. 261)

filho. MAJESTADE Vem comigo... vou te pedi em casamento pros teus pais. DALVA Sai fora! Tu nunca me viu!

De pele branca

MAJESTADE

como a neve, é

Tá errada!

de uma família de bem, em Valda

DALVA Tô errada?! Você nem me conhece! MAJESTADE

Santana, que

Conheço sim. Sei que tu gosta de

nunca aceitou

calabreza... Sei que fica linda num

seu romance

vestido de florzinha...

com Zé da

(…) MAJESTADE (CONT'D)

Casa Verde por

Olha só que beleza de mistura!

ele ser negro.

Vam'tê um filho de cada cor. Te espero no carro... DALVA Você falou sério? MAJESTADE Como nunca na vida.

(…) Zé aproximou-se dela, na beirada do campo: - Levanta e vem comigo, que eu vou te pedir em casamento para os teus pais. -Você nem me conhece! Ele falou dela no baile, da pele alva que contrastava com o preto da sua e dos filhos misturados que nasceriam lindos, cada um numa cor. (…) Ela apareceu na janela do carro: -Você falou sério? - Como nunca na vida. (VARELLA, 2005, p. 227)

191

TABELA 31 – ORIGEM DE ROSIRENE Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem MAJESTADE Tu sabe quem é ele? ROSIRENE Sei! E daí?

Mulher de

MAJESTADE

Charuto,

Eu não te disse: "Se quisé se virá,

Uma noite, trombaram na Boca

se vira. Só não dá pra amigo meu

do Lixo e Rosirene confessou

que eu te quebro o pescoço!"

estar namorando um amigo dele,

lábios finos,

ROSIRENE

Mato Grosso, o dono das pedras,

nariz

Amigo teu, o Farofa?! Majestade!!?

e que os dois tinham planos de

empinado,

Tu é um pé de chinelo. E mais, ele

mudar para Ponta Porã.

ainda me disse que, quando separá

-Veja só, dando para amigo meu

da esposa, vai se muda comigo pra

e ainda os dois fazendo plano!

Miami! Ó, qué sabê? Tô indo!

(VARELLA, 2005, p. 264)

negra de

Rosirene

bunda de escola de samba.

(…) MAJESTADE Vê se pode doutor, dando pra amigo meu e ainda os dois fazendo plano!

Passista da

- Meu amor, que bom que você

Império da

veio, mas, infelizmente, não vou

Casa Verde. Um sorriso

Maria Luisa

MAJESTADE

poder te receber porque estou

Pô, meu amor, hoje não vai dá! É

trabalhando num conserto,

que a caldera estorô e o homem qué

devido que a caldeira estourou e

que

o conserto pronto até o fim do dia.

o homem quer tudo pronto até o

iluminava a

ROSIRENE

final que acabar a visita.

quadra

Ô Josué, nem na rua tu nunca

- Zé, você está é com aquela

inteira,

trabalhô. Vai me convencê que

vagabunda. Nem na rua tu nunca

na cadeia resolveu regenerá? Tu tá

trabalhou, vai me convencer que

é co'aquela branquela vagabunda!

na cadeia, dia de domingo, é que

parecia uma deusa de

resolveu regenerar?

ébano.

(VARELLA, 2005, p. 229)

192

3.3 NÚCLEO CLAUDIOMIRO

Dina

Claudiomiro

Antônio Carlos

Célia

Imagens de Dina interpretada por Leona Cavalli, de Claudiomiro interpretado por Ricardo Blat, de Antônio Carlos interpretado por Floriano Peixoto e de Célia interpretada por Vanessa Gerbelli obtidas na web.

Antônio Carlos e Claudiomiro eram amigos antes de serem presos. Juntos, assaltavam carros- fortes com uma quadrilha. A amizade terminou quando Antônio Carlos tentou alertar Claudiomiro sobre a traição de sua esposa, Dina. Antônio Carlos a tinha visto aos beijos com o amante, um policial. Dina argumentou que Antônio Carlos sempre fo ra apaixonado por ela e só estava dizendo isso para separá- los. Ela convence o marido e sua amiga Célia também, que é esposa de Antônio Carlos. No entanto, Célia volta atrás e apóia o marido. Depois desta desavença, Dina pede a Claudiomiro que deixe a vida de crime para que o filho deles possa ter uma vida normal. Ao ir ao banco para retirar suas economias, Claudiomiro é abordado por dois policiais à paisana, mas consegue matá- los com uma arma que tinha no cofre. Ele então percebe que se tratava de uma cilada que a esposa armara com o amant e. Ao voltar para o carro, Claudiomiro mata a esposa na frente do filho, que ainda era pequeno. Ele é preso, e Antônio Carlos e Célia adotam seu filho. Antônio Carlos resolveu continuar assaltando carros- fortes, mas, no primeiro assalto sem Claudiomiro, fo i preso. No presídio, reencontra o antigo comparsa, que estava em fase terminal de tuberculose. Dispostos a esquecerem o passado, Antônio Carlos cuida do amigo enfermo. Quase sem fôlego, Claudiomiro pergunta ao Médico se criança pequena lembra de tudo. Quando o Médico responde que não, ele dá seu último suspiro, nos braços do amigo.

193

TABELA 32 – ORIGEM DE DINA Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem DINA Ô Célia, o Antonio Carlos é viado? CÉLIA

Conversaram em pé, na sala:

Que pergunta, Dina!

- Dina, o Antônio Carlos é

DINA

veado?

Desculpa, mas ele inventô pro

- Que pergunta, Marli!

Miguel, que o

Miro que eu tô saindo com um

- Desculpa, mas ele veio para o

entregou ao

polícia.

Miguel com uma história que

amante policial.

ANTONIO CARLOS

eu saio com um polícia, que

Inventô o caralho! Te vi

nunca existiu. Veio com tudo,

enganchada no cara; vi você

para destruir meu casamento.

mordê a orelha dele, pôrra!

(VARELLA, 2005, p. 188)

Esposa de Marli

DINA Tá vendo? Qué destruí meu casamento.

194

TABELA 33 – ORIGEM DE CLAUDIOMIRO Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem ANTONIO CARLOS

Assaltante de

Claudiomiro

(para Claudiomiro)

Claudiomiro diz que a

banco e carro-

Toma o remédio, mano.

informação precisa é

forte, corpo forte,

(…)

fundamental: a que horas passa

com três

MÉDICO (CONT'D)

o carro-forte, quantos mil no

E lá fora, ele fazia o quê?

cofre do banco, o número de

ANTONIO CARLOS

guardas, todos os detalhes.

A gente fazia assalto de carro-

Para isso, valia-se dos próprios

mulher grávida e

forte. Planejavamo tudo só nóis

vigilantes das emp resas de

o menino

dois. Cinco, seis meses pegando

segurança, com cautela:

pequeno.

informação, fazendo amizade até

(VARELLA, 2005, p. 192)

cicatrizes. Tinha 35 anos, deixou a

com a família dos segurança.

Assaltava com o

Miguel

CLAUDIOMIRO

- Você é puta, sem-vergonha.

Te dei conforto, carinho e

Larguei da mãe dos meus

amizade e você paga desse jeito.

filhos, te dei conforto, carinho

Sem vergonha...

e amizade e você pagou com a

DINA

moeda da traição. Estou

parceiro, Antônio

Do que cê tá falando?!

sabendo do polícia que você

Carlos. Foi traído

CLAUDIOMIRO

encontra no motel atrás do

pela mulher com

Tô sabendo do polícia que tu

posto de gasolina na Raposo

um policial.

encontra, enquanto o trôxa aqui

Tavares, faz mais de um ano,

arrisca a pele pra recheá o teu

enquanto o trouxa aqui

guarda-roupa. Pega tua mala e

arrisca a pele para rechear teu

some! Nem teu filho, tu vai tê

guarda-roupa. (VARELLA,

direito de vê!

2005, p. 186)

195

TABELA 34 – ORIGEM DE ANTÔNIO CARLOS Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

ANTONIO CARLOS

- Ganha dinheiro nesse negócio de

origem Assaltante de

Claudiomiro

A gente fazia assalto de

banco e carro-forte?

banco e carro-

carro-forte. Planejavamo

- Ganha, mas o dinheiro só vale a

forte, corpo

tudo só nóis dois. Cinco,

metade, às vezes até menos.

forte, com três

seis meses pegando

A esta frase enigmática seguiu-se

cicatrizes.

informação, fazendo

uma conversa sobre a profissão

amizade até com a família

dele:

dos segurança.

- Precisa muita disciplina, doutor.

deixou a mulher

MÉDICO

Deu oito da noite, eu me recolho.

grávida e o

E isso dá dinheiro?

Não fico em bar, boate, porque a

menino

ANTONIO CARLOS

polícia pode me pegar de bobeira

Dá muito, doutor, mas o

numa batida qualquer. (VARELLA,

dinheiro só vale metade.

2005, p. 192)

Tinha 35 anos,

pequeno.

Antônio Carlos chamou-a de ANTONIO CARLOS Mentirosa! Mente diabólica.

Parceiro de Antônio Carlos

Se não fosse o respeito pelo

Miguel. Foi ele

Miro, arrebentava a tua cara

quem contou a

agora!

Miguel que sua

Claudiomiro, você não

mulher o traía.

acreditou nessa pilantra, acreditou? Quantas fita a gente armou junto?!

mentirosa, disse que não fosse o respeito pelo amigo arrebentava a cara dela. Xingou-a de mente diabólica. (…) Antônio Carlos virou-se para o amigo: - Miguel, você não acreditou nessa pilantra, acreditou? A gente tem quatro anos de parceria e nunca partiu de mim qualquer crocodilagem. (VARELLA, 2005, p. 187)

196

TABELA 35 – ORIGEM DE CÉLIA Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem Quando Antônio Carlos entrou em casa, Dina cravou-lhe as unhas no

Esposa de Antônio Carlos,

CÉLIA

rosto:

Sem vergonha! Nunca me

- Ordinário, sem-vergonha,

que tinha o

enganô; sempre sube que

sempre falei que você tinha

cabelo oxigenado

você tinha uma coisa por ela.

um quê por ela. Mas você dizia

e era muito

Nem mulher de amigo você

que eu era louca. Nem mulher de

respeita mais, cachorro!

amigo você respeita mais,

Dina

ciumenta.

cachorro? (VARELLA, 2005, p. 188)

3.4 NÚCLEO DEUSDETE

Francineide

Catarina

Imagem de Francineide interpretado por Júlia Ianina capturada do DVD. Imagem de Catarina interpretada por Sabrina Greve obtida na web.

Deusdete, jovem criado na periferia, cresceu ao lado da irmã Francineide e do amigo Zico, cuja mãe fugiu de casa. Zico cuidava dele como um irmão mais velho faria, e ele, por sua vez, cuidava de Francineide. Uma noite, Francineide chega em casa chorando, com olhar de assustada, e se tranca no banheiro. Deusdete vai acudir a irmã e descobre que ela fora agredida por dois homens, que

197

levantaram a sua saia. Ele denuncia os agressores da irmã à polícia, mas eles descobrem e querem matá- lo. Ele, então, vai atrás de Zico, que guarda sentimentos por Francineide, para que lhe arranje uma arma para se defender, embora não tivesse intenção de usá-la. Uma noite, os agressores de Francineide o encontram e o ameaçam com barras de ferro, mas Deusdete saca a arma e mata um deles; o outro foge. Deusdete o persegue e consegue matá- lo também. No presídio, Deusdete sempre recebe cartas da irmã. Sua mãe e Francineide também o visitam com freqüência. Em uma destas visitas, Francineide leva uma amiga para apresentar a Deusdete: é Catarina, jovem também criada na periferia, que acredita que ganhará status ao namorar um presidiário e ficará mais protegida onde mora. Ela não se importa quando Deusdete a lembra que só sairá do Carandiru com 48 anos, e diz que voltará a visitá- lo.

TABELA 36 – ORIGEM DE FRANCINEIDE Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem DEUSDETE (CONT'D) Que é que foi? Conta aí! O que foi que aconteceu?

Irmã do meio de Deusdete que foi Francineide

FRANCINEIDE

Uma noite, Francineide, irmã

Era dois... me agarraro... levantaro

do meio de Deusdete, na

meu vestido... um disse que queria

volta da padaria, foi

me chupá... eu mandei ele chupá a

molestada por dois marginais

mãe...

da vila. Um disse que queria

molestada por

DEUSDETE

chupar o sexo dela; ofendida,

dois homens na

O que eles fizero?

ela o mandou chupar a mãe ,

vila onde morava

FRANCINEIDE

vagabundo. Apanhou,

Me batero...

chegou em casa com o

DEUSDETE

vestido rasgado e a boca

E daí? Que mais?

inchada. (VARELLA, 2005,

FRANCINEIDE

p. 198)

com o irmão.

Eu saí correndo, Deusdete. Saí correndo! Eu te juro! Não aconteceu nada!

198

TABELA 37 – ORIGEM DE CATARINA Personagem literária de

Descrição

Passagem no filme

Passagem no livro

origem CATARINA Tá vendo, Franci, é um homem assim que eu quero. Diz aí: cê acha que o Deusdete vai gostá de mim?

Vizinha de

FRANCINEIDE

Zilá, magrinha,

Ah, isso é com vocês.

tímida, que

Fran

MÃE DE DEUSDETE Fica mais fácil pra ele se tiver um

podia ter no

amor esperando aqui fora.

máximo 20

DONA GRAÇA

anos. Foi ao

A senhora tá certa. Mas só com

presídio para ser apresentada a Roberval.

muito amor no coração uma mulher suporta essa vida. CATARINA (para Francineide)

Ao lado, Fran, o rosto na penumbra projetada pelo poste de luz, concordava com a cabeça, mas pretendia passar a noite ali decidida a conhecer o tal de Roberval, um mulherengo de bigode, sócio do marido de Zilá no negócio de assaltar carga. (VARELLA, 2005 p. 55)

O que ele disse quando tu conto que eu vinha? FRANCINEIDE Que se você quisesse vim, que visse.

Como pôde-se perceber na análise das personagens principais, nem sempre a personagem que deu origem ao nome é a mesma que deu origem às outras características vistas no filme. O mesmo ocorreu com as personagens secundárias: algumas personagens literárias apenas “emprestaram” o nome a elas. Com intuito de comparação, a seguir, serão apresentadas as origens dos nomes das personagens secundárias cinematográficas.

199

TABELA 38 – ORIGEM DOS NOMES DAS PERSONAGENS SECUNDÁRIAS Personagem

Personagens de origem

Seu Pires

Seu Pires

Dalva*

-

Rosirene

Rosirene

Dina

Dina

Claudiomiro

Claudiomiro

Antônio Carlos

Antônio Carlos

Célia

-

Francineide

Francineide

Catarina

-

* Embora Dalva seja uma inversão silábica do nome de uma de suas personagens de origem, Valda, esta informação não foi levada em consideração para esta classificação, pois a relação entre os nomes não é explícita.

200

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi de interesse deste estudo verificar as semelhanças entre as personagens literárias de Estação Carandiru e as personagens cinematográficas de Carandiru. Para tanto, teve como principal objetivo buscar as origens das personagens do filme – físicas, psicológicas e de suas correspondentes histórias – na obra em que foi baseada: o livro. Com o intuito de encontrar qual ou quais foram as personagens literárias de origem das personagens cinematográficas, primeiramente, foi necessário fazer um levantamento de todas elas no livro e no filme. Chegou-se aos seguintes dados: 206 personagens literárias e 50 cinematográficas, uma redução para menos de 25% na transposição da obra literária para o cinema. A partir daí, levantou-se a seguinte questão a respeito desta diminuição no quadro de personagens: houve eliminações, acréscimos, fusões – seja de traços característicos e/ou de ações – na transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella, para a obra cinematográfica Carandiru, de Hector Babenco, quanto aos aspectos construtivos das personagens neste diálogo entre mídias? O primeiro aspecto a se notar é a questão levantada no capítulo II com relação ao grau de adaptação de uma obra. Logo nos créditos iniciais – e também na capa do DVD –, há a seguinte informação: “Baseado no livro Estação Carandiru de Drauzio Varella”. A partir deste dado, pode-se esperar uma obra que não se propõe a ser uma reprodutora literal de sua fonte. Pode-se esperar variações significativas, mas a obra original deve ser claramente reconhecida nesta nova, e não apenas fazer referência a ela. Como percebido, houve uma grande variação na fonte das personagens – ora fundidas, ora desmembradas –, entretanto, as situações apresentadas no livro e as características das personagens literárias estavam, em sua maioria, presentes na obra cinematográfica. A hipótese proposta para este estudo foi comprovada após a coleta de dados. A seguinte hipótese havia sido sugerida: na transposição da obra literária Estação Carandiru, de Drauzio Varella, para o cinema, houve fusão de personagens literárias, que se deu por suas características, resultando em uma única personagem cinematográfica. Ela é verdadeira, pois pôde-se notar, como dito, uma fusão de personagens que apresentavam características semelhantes, como é o caso de Seu Chico, que teve origem na fusão de Seu Chico e Seu Jeremias (ambos eram id osos) e

201

Lady Di, que teve origem na fusão de cinco personagens (todos eram travestis). Entretanto, esta não foi a única forma de origem das personagens cinematográficas. De fato, pôde-se perceber que a maior parte das origens das personagens cinematográficas vem de fusões de personagens literárias (ex: Majestade é uma fusão entre Zé da Casa Verde e Charuto). Mas também foram encontradas personagens literárias que foram desmembradas, dando origem a mais de uma personagem (como é o caso de Valente, que deu or igem a Peixeira e a Nego Preto; e Seu Chico, que deu origem a Seu Chico e a Nego Preto, por exemplo). Houve personagens que foram eliminadas totalmente, não dando origem a nenhuma outra no filme. Entretanto, das personagens analisadas, não foi encontrada nenhuma que foi acrescentada, ou seja, que tenha sido totalmente inventada para o roteiro cinematográfico. Foi visto que as personagens representavam um grupo, um conjunto de personagens que possuíam as mesmas características físicas, psicológicas ou estava m inseridas no mesmo grupo social. Há histórias que se repetem na obra literária: há personagens que compartilham dos mesmos problemas, situações e/ou dramas familiares. Estas histórias foram representadas no filme a partir de uma personagem, que poderia ser chamada de personagem- grupo. Assim, foram averiguados os seguintes casos de personagens- grupo: Seu Chico, que representa os detentos idosos e aqueles que foram abandonados pela família por conta de seus crimes; Ezequiel, que representa aqueles que perderam tudo para o vício; Zico, que representa aqueles que matam aqueles que amam por causa das drogas; Deusdete, que representa aqueles que são levados a cometer crimes para se defender e defender a honra da própria família; Majestade, que representa aqueles que cometem adultério e levam vida dupla; Nego Preto, que representa aqueles que são traídos pelos amigos; Peixeira, que representa aqueles que se arrependem de seus crimes e encontram conforto na religião; Sem Chance, que representa aqueles que, depois de presos, descobrem algum talento e percebem que podem fazer algo de bom; Lady Di, que representa aqueles que acreditam no amor; Seu Pires, que representa todos os funcionários do Carandiru que realmente entendiam como a Casa funcionava; Claudiomiro, que representa aqueles que foram traídos pelas mulheres; Antônio Carlos, que representa aqueles que colocam a amizade acima de tudo; Dina, que representa aquelas que traem os maridos e agem apenas em benefício próprio; Célia, que representa aquelas que compreendem e apóiam o marido apesar de seus crimes; Rosirene, que representa aquelas que levam drogas para os maridos na cadeia; Dalva, que representa aquelas que são vítimas do preconceito da própria família; Francineide, que representa

202

aquelas criadas na periferia que se tornam vítimas do crime; Catarina, que representa a ingenuidade daquelas que acreditam na segurança de namorar um detento; e o Médico, que representa aqueles que querem melhorar a vida dos detentos e são deparados com uma situação pior do que imaginam. Para que fosse possível chegar a uma resposta para a questão colocada, antes, foi necessário categorizar estas personagens para se obter um resultado mais amplo e ter uma idéia do quadro geral de alterações, para, em seguida, partir em busca de dados mais detalhados. Dez categorias foram consideradas para a análise tanto do filme quanto do livro: 1) idade, 2) sexo, 3) situação, 4) forma como eram conhecidas pelas demais personagens, 5) raça, 6) dependência às drogas, 7) enfermidade, 8) crime cometido, 9) função dentro do presídio, 10) relação com as personagens em situação de cárcere. Houve uma subdivisão destas categorias, sendo consideradas todas as personagens para a classificação apenas das categorias 1, 2, 3, 4, 5 e 6. Para as categorias 7, 8 e 9 apenas as personagens em situação de cárcere foram consideradas. As demais personagens foram consideradas apenas para a última tabela. Encontrou-se uma diminuição percentual no número de personagens em situação de cárcere e, conseqüentemente, um aumento daqueles em liberdade no filme com relação ao livro. Também diminuiu a quantidade percentual de personagens conhecidas pelo nome, mas estas ainda continuaram a ser a maioria. A maior diferença, no entanto, foi quanto às personagens cujos nomes e/ou apelidos não puderam ser identificados, que passaram de 14,5% na obra literária, para 28% na cinematográfica. É interessante notar a quantidade de apelidos e suas origens (Sem-Chance, pela frase que sempre repetia; Mil e Um, pela falta dos dentes incisivos na arcada superior ; Coça-Coça, por pedir para uma prostituta passar as unhas em suas costas; etc.). Há uma fonte rica aqui para um possível estudo sobre apelidos. Não foram encontradas diferenças significativas quanto à quantidade de homens, mulheres e crianças, nem de jovens e adultos, embora proporcionalmente haja mais homens adultos no livro com relação às demais personagens. Tampouco houve grande disparidade entre as obras quanto à quantidade de dependentes de drogas, à droga mais consumida (crack), à quantid ade de enfermos e à doença mais recorrente (AIDS). A categoria de personagens em situação de cárcere que possuem função também apresentou resultados bem similares em ambas as obras.

203

Todavia, a maior disparidade está na raça das personagens: 7,3% de negros e 2,4% de brancos na obra literária, e 36% de negros e 62% brancos na cinematográfica. Isto pode ser explicado pelo fato de a obra cinematográfica ser essencialmente visual. No livro, são necessárias descrições da aparência física das personagens, e, neste caso, há poucas com relação ao número total de personagens. Há de se notar que a quantidade percentual de brancos é bem maior no filme. Também pôde-se verificar que o tipo de crime mais cometido foi diferente em ambas as obras: assalto (39,6%) no livro e assassinato (cerca de 26%) no filme. Houve também um aumento significativo de crimes não identificados, passando de 34,2% no livro para 52% no filme. Outra grande diferença notada é com relação às personagens em liberdade. A maioria era de funcionários na obra literária, no entanto, na obra cinematográfica, foi verificado que a maioria era de parentes. Isto pode ser explicado provavelmente por se tratar de um filme classificado sob o gênero drama. Se a intenção fosse manter o estilo e proposta do livro, que foi classificado como livro-reportagem, ter-se- ia um documentário e não um drama. Embora tenha havido cenas que muito lembravam um documentário (ao final do filme, alguns detentos sobreviventes ao massacre dão depoimentos para a câmera), a maior parte do filme é composta por dramas familiares. A única cena documental encontrada no filme é a da implosão da Casa de Detenção de São Paulo. A Casa de Detenção de São Paulo, que era o maior presídio da América Latina e ficou conhecido pelo nome de Carandiru, inaugurado na década de 1920, só foi desativado em setembro de 2002. Três de seus pavilhões foram implodidos em dezembro de 2002. A penitenciária feminina foi mantida. Como se pôde perceber, os principais núcleos se mantiveram presentes na obra cinematográfica, reunidos e representados por uma única personagem, uma decisão benéfica para ambas as obras, pois houve a manutenção dos principais temas abordados na obra literária, fazendo com que esta adaptação se tornasse não apenas mais uma maneira de contar aquelas histórias em um suporte diferente, mas também um meio que possibilita a chegada destas histórias a outros públicos. É a combinação entre cultura e economia; a combinação entre duas indústrias para trazer um novo produto, que possui não apenas um valor cultural, como também um valor econômico significativo.

204

Pode-se, então, perceber a importância da economia criativa e de suas indústrias criativas, que, além do valor econômico agregado dos bens que produz, ainda traz benefícios culturais, principalmente quando as indústrias criativas, através de um processo simbiótico, se juntam para trazer em um único produto riqueza cultural.

205

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