Da vitória sobre Soult à entrada de Massena em Portugal (1810)

September 24, 2017 | Autor: Nuno Lemos Pires | Categoria: Military History, Napoleonic Wars, Historia Militar, Peninsular War, Guerra de la Independencia Española
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Apresentação na CM de Almeida a 24 de Julho de 2010, publicado em: (2010), atas do Colóquio O Combate do Coa, Almeida, Centro de Estudos de Arquitetura Militar da CM Almeida, nº 6, pp. 46-60. Da vitória sobre Soult à entrada de Massena em Portugal Nuno Lemos Pires https://academiamilitar.academia.edu/NunoPires

Contexto Global – 1793-1817, a II Guerra Global Portuguesa: Tal como tivemos a significativa “Guerra Global Portuguesa”, de 1640 a 1668, conhecida mais comummente como Campanhas da Restauração (ou da Aclamação) em que Portugal combateu ao longo de 28 anos, na Europa, no Brasil, em África e na Ásia num esforço hercúleo, e que garantiu a nossa sobrevivência como Nação também tivemos agora esta guerra global desde 1793. A “II Guerra Global Portuguesa”, que ao longo dos anos tem conhecido várias designações, demasiado redutoras (pensamos nós), nomeadamente Invasões Francesas ou Guerras Peninsulares, durou 25 anos, de 1793 com a Campanha do Roussilhão a 1817 com a retirada das forças portuguesas da Guiana Francesa, obrigando a um monumental esforço português, em terra e no mar, no Brasil, em África, no Mediterrâneo, na Índia, em Espanha, França, Prússia, ou Áustria, até às estepes geladas da Rússia. Em 1809/ 1810 a guerra foi mais do que um combate pela defesa das fronteiras, do Porto ou Lisboa. Foi uma guerra em todo o Portugal e na defesa de todos os seus territórios, de norte a sul, do Pacífico ao Atlântico, de Macau ao Rio de Janeiro. No fundo a nossa guerra não foi mais do que a consequência de uma guerra global e entender o conflito na sua plenitude permite-nos entender melhor as opções e reacções portuguesas nesse quarto de século de guerra.

Contexto Global – 1809-1810, os vários Teatros de Operações Napoleão Bonaparte, o grande maestro da manobra e poder francês, depois das famosas campanhas de Itália (1796/97 e 1800), do fracasso no Egipto (1798), da paz efémera de Amiens (1802), tinha de derrotar o seu maior rival, a potência naval britânica e tentou-o fazer em todas as frentes possíveis, na Europa e no Mundo, em terra e no mar. Podemos identificar três momentos na “grande estratégia” francesa para tentar a hegemonia na Europa: primeiro através de uma estratégia indirecta “Napoleão decide que pode vencer a Inglaterra conquistando o Levante, na sequência da campanha vitoriosa de Itália. A campanha do Egipto (…) fracassada esta primeira abordagem, Napoleão regressa a 1

França (…)”1; de seguida pensou no ataque directo à Grã-Bretanha “O imperador instaura a partir de 1804 um gigantesco acampamento ao longo do canal da Mancha (…) cerca de 200.000 mil homens da Grande Armée”2 mas para isso precisava do controlo do canal da Mancha que a derrota naval de Trafalgar em 1805 veio impedir, o que levou a decidir-se pela terceira fase da sua estratégia: o domínio “terrestre” do continente europeu. Com as vitórias de Austerlitz em 1805, Iena e Aurstad em 1806 e Eylau e Friedland em 1807, Napoleão Bonaparte tinha conseguido derrotar as maiores potências continentais da Europa: Áustria, Prússia e Rússia. Mas para derrotar a Grã-Bretanha, tinha de cortar seu acesso ao continente europeu, e aí tinha de se encontrar com Portugal3. Mas Portugal tinha um importante vizinho, Espanha, que a partir de 1808 iria deixar de ser um dos aliados de Napoleão. A estratégia para a Península Ibérica definida por Napoleão tinha de incluir ambos os países e como tal, passava necessariamente por impedir o acesso da GB à linha de costa, atrai-la para fora do seu santuário (Portugal) e negar o controlo dos portos principais da Península Ibérica. Numa forte manobra psicológica tentou ainda manter os centros populacionais (essencialmente espanhóis) dominados pelos afrancesados e neutralizar os restantes e, no seu grande estilo operacional, tentou utilizar a “fórmula de sucesso” procurando as batalhas decisivas através da concentração de forças. Esta estratégia vai-se manter nos anos de 1809 e 1810 mas Napoleão tem outras frentes para se preocupar. Desde logo a sua “frente pessoal”, o grande chefe militar e político é antes de mais um homem complexo que, como tantos outros, se deixa afectar por questões de natureza íntima, que acabam inevitavelmente por ter algumas consequências nas manobras políticas. Aludiremos a esta “frente” mais adiante, nomeadamente para entendemos a razão da sua não vinda ao comando do Exército destinado à invasão de Portugal. Nas frentes operacionais, 1809 e 1810 representaram um consolidar da força da França no centro da Europa, mas apenas no domínio terrestre porque no domínio naval este era claramente dos britânicos e seus aliados (Portugal incluído). A Campanha da Alemanha/Áustria, de Abril a Julho de 1809 começa, quando do outro lado da Europa, Soult retira de Portugal, no término de mais uma tentativa fracassada de invasão de Portugal. Napoleão fora surpreendido pelo ataque inesperado de austríacos aos seus aliados da Baviera. O Imperador estava longe mas movimentou-se e movimentou rapidamente uma gigantesca quantidade de soldados e equipamentos em mais uma manobra de génio “a Manobra de Landshut” de 19 a 22 de Abril. As forças austríacas não foram derrotadas em campanha aberta mas foram obrigadas a retirar para evitarem ser esmagadas. Napoleão segue no seu alcance e decide partir à conquista de Viena, mas os austríacos obrigam-no a duas grandes batalhas antes de capitular.

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Mendo Castro Henriques, 1812 e a Geopolítica da Guerra peninsular, Guerra Peninsular – Novas Interpretações, pág. 177 2

Idem, pág. 177 “Há que neutralizar os seus interesses através de une promenade militaire dirigida a Portugal” Proposta de Quantan de St Domingue em 1796, in António Pedro Vicente, Portugal perante a política Napoleónica…, Guerra Peninsular, Novas Interpretações, pg 19 – “ Considerando a impossibilidade da invasão de Inglaterra, aconselha a sua destruição em Portugal”, proposta do Inspector Geral da Marinha Francesa, Pochole, em 1800, idem, pág. 20 ; 3

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As coisas não lhe correram bem em Aspern-Essling de 21 a 22 de Maio, nas margens do Danúbio, mas ainda assim conseguiu salvar o seu exército, reagrupar, preparar-se e passa o Rio nas noites de 4 e 5 de Julho. A resposta austríaca quase destruiu o ataque francês em 5 e 6 de Julho. Mais de 16 horas terríveis de Batalha deram uma vitória de custo elevadíssimo a Napoleão. Os austríacos capitularam mas tinham causado 24% de baixas entre Franceses, incluindo 40 generais. Para os austríacos as perdas foram significativas, um quinto da população e a ruína nacional4. Napoleão para garantir que o outro gigante continental, a Rússia, se mantinha como aliado, entregou a Galitzia austríaca ao Czar. As áreas alemãs onde se tinham desenvolvido demonstrações de sublevação contra os franceses acabam por aceitar o poder do Imperador e não se revoltam mais. A Europa continental está de novo controlada … mas o problema peninsular persiste e vai ser de Viena que Napoleão responde a uma carta de Soult (em que este relatara a retirada in extremis de Portugal): “tão logo o problema austríaco estivesse resolvido, desejo regressar à Península para estar o mais rapidamente possível em Lisboa”5.

1809/10, acções portuguesas – defender Porto e Lisboa, conquistar na América: O ano de 1809 marca o reforçar das ofensivas portuguesas contra a França. A partir do Rio de Janeiro, o futuro D. João VI, decide tomar a iniciativa. A declaração de guerra à França em 1808 tinha tornado nulos os tratados assinados com franceses o que fez com que a fronteira do Brasil com a Guiana Francesa passasse novamente a ser considerada no rio Oiapoque, conforme tinha sido estabelecido no Tratado de Utreque6 em 1713. Podia-se não só aproveitar a ocasião para o restabelecimento da fronteira como ainda deliberadamente responder à ofensiva francesa em Portugal com uma ofensiva portuguesa na América: até Caiena, capital da colónia francesa. A 12 de Janeiro de 1809 Caiena capitula às mãos dos portugueses que ficam a administrar o território até 1817. Ainda no ano de 1809 iniciam-se os planos para uma grande ofensiva no Sul de Brasil mas esta só se iria iniciar em 1811 assegurando Portugal a conquista dos territórios de Entre-Os-Rios e só bastante mais tarde, em 1816, a ofensiva chegará totalmente ao rio Prata. Mas não foi só no Brasil que a guerra de portugueses contra a França estava activa, em Dezembro de 1810 foi fundamental a ajuda lusa desde Moçambique para a conquista britânica das ilhas francesas. Na Índia formaram-se forças conjuntas portuguesas e britânicas para a defesa dos territórios e em Macau reforçou-se o dispositivo de defesa, este exclusivamente com forças portuguesas. Em Angola, S. Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau e Timor, as ofensivas francesas de finais do século XVIII não se repetiram e Portugal, com um dispositivo de defesa bem reforçado que manteve intactas as fronteiras nestes territórios.

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AAVV, HISTÓRIA DA GUERRA – mapas da história, The Times, Londres, 2003, pág. 115 José Manuel Sardica in AAVV, O PORTO E AS INVASÕES FRANCESAS, VOL I, Porto, CMP e Público, 2009, pág 79 Acordos firmados na cidade de Utreque, Países Baixos (1713 – 1715), puseram fim à guerra da sucessão espanhola (1701 – 1714), na qual entraram em conflito interesses de várias potências europeias. Em 1713 foi reconhecido a Portugal a soberania sobre as terras brasileiras compreendidas entre os rios Amazonas e Oiapoque.

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Outros portugueses a combater na Europa são os militares da Legião Portuguesa: após um ano de elevadas deserções (1808) Napoleão decidiu afastar estes combatentes para mais longe da sua pátria mãe e em Janeiro de 1809 a Legião entra em França. Em 1809 e no início de 1810 os portugueses distinguem-se nas campanhas da Áustria e da Alemanha e, infelizmente, um grupo de notáveis, incluindo o comandante Marquês de Alorna, irão acompanhar Massena na ofensiva francesa a Portugal. Em 1809 e 1810, quando praticamente toda a Europa está subjugada por Napoleão (faltam apenas o Reino Unido, a Rússia e Portugal) tivemos portugueses a defender os espanhóis no seu território, nomeadamente a Leal Legião Lusitana de Wilson desde Alcântara até às Beiras (mais detalhado no próximo capítulo) e a fantástica expedição portuguesa para a libertação da Galiza, chefiada pelo Tenente Baptista que entre outras acções notáveis teve um papel determinante na capitulação de Vigo conquistada pelos franceses. A partir do quase nada, um Exército português que fora praticamente desfeito em 1808, e numa demonstração clara de força e determinação nacional, já tínhamos em 1810 mais de 150.000 homens nas Forças Armadas, só contabilizando os do exército de 1ªlinha7 e os regimentos de milícia8. Em 1810 as forças portuguesas no Exército Aliado combatem como iguais ao lado dos britânicos como ficará demonstrado em 27 de Setembro na célebre Batalha do Buçaco ou depois, na defesa das Linhas de Torres Vedras, com a plena integração operacional das milícias e ordenanças9. De Soult a Massena – Espanha combate activamente, Portugal recupera e prepara a defesa Enquanto Soult combatia desesperadamente no norte de Portugal numa tentativa falhada que o deveria levar a Lisboa, Espanha vive um ambiente de grandes manobras e batalhas operacionais. Sabemos que Soult não recebeu os apoios e reforços esperados, nomeadamente os mais importantes de Lapisse e Victor, porque estes estavam ocupados a combater espanhóis e portugueses noutras frentes próximas da fronteira com Portugal. Vamos olhar um pouco melhor para o restante da Península Ibérica e tentar fazer uma breve descrição dos

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Efectivos portugueses do Ex 1ª Linha: 1808 – 42619; 1809 – 47958; 1810 – 51841; 1811 – 54558; 1812 – 56808; 1813 - 51431. Mendo Castro Henriques, pág. 21. Noutra fonte (Fernando Pereira Marques, Exército, Mudança e reorganização, pág. 46) em 1811 Portugal tinha “a massa verdadeiramente enorme para a sua população de 335 439 homens de armas, dos quais 60 508 nas tropas de linha, 58 500 nas milícias, 82 834 ordenanças com espingardas e 135 588 armadas de chuços”. 8 As forças portuguesas presentes no Exército Anglo-Português durante a 3ª Invasão Francesa eram: a 3.ª Divisão Inglesa anexa à Divisão HAMILTON com os Regimentos de Infantaria. n.º 2, 4, 10 e 14 (2 950 H); Da 4.ª Divisão Inglesa faziam parte os Regimentos de Infantaria. n.º 11 e 23 (2 800 H); da 5ª Divisão Inglesa faziam parte os Regimentos de Infantaria. n.º 3, 8 e 15, milícias de Tomar e 3 batalhões da L. L. L (5 430 H); da Divisão Craufurd faziam parte os Batalhões de Caçadores 1 e 2 (2 000 H); 3 Brigadas Independentes de Infantaria com os Batalhões de Caçadores n.º 2, 4, 6, e Regimentos de Infantaria n.º 1 e 16 (8 400 H); Na Divisão de Cavalaria entravam os Regimentos de Infantaria n.º 1, 4, 7 e 10 (1 500 H); 9 O que as milícias e as ordenanças portuguesas então fizeram – o combate em profundidade contra as linhas de comunicação de Soult em 1809, contra as reservas de Massena na invasão de 1810, ou contra a tentativa de 4ª Invasão de Marmont em 1812 – foi decisivo no desfecho das Campanhas. Um terço dos efectivos em campanha por parte dos aliados eram constituídos por milícias e ordenanças e, se contabilizarmos a população que construiu as formidáveis Linhas de Torres Vedras (LTV), então tivemos uma verdadeira “nação em armas” na defesa do território nacional.

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principais eventos ocorridos em Espanha nestes anos de 1809/10. Começamos com a Batalha de Ciudad Real. Em princípios de 1809, a Espanha contava com 5 Exércitos operacionais (I Estremadura, II Mancha, III Derecha, IV Asturias e V Izquierda10), embora com enormes dificuldades em garantir homens, equipamentos e sustentação financeira, permitiam exercer uma pressão permanente sobre os franceses que ocupavam o seu território. O II Exército da Mancha era comandado por D. José Urbina, Conde de Cartaojal e a sua área de operações era o centro de Espanha. Até 21 de Março de 1809 o Conde Cartaojal permaneceu entre Cuidad Real e Manzanares com 10.000 Infantes e 2.500 cavaleiros, tinha ainda uma reserva com outros 4.000 infantes que estavam a fazer a defesa dos desfiladeiros de Sierra Morena. O Marechal francês Victor, comandante do I CE, reforçado com uma Divisão de Dragões Latour-Maubourg, concentrou-se em então em Talavera preparando as operações. Depois de uma tentativa falhada de Cartaojal de tomar Toledo este ocupou posições defensivas a sul do Guadiana, na Ciudad Real. Na manhã de 27 de Março as forças francesas comandadas por Sebastiani cruzaram o Rio Guadiana e atacaram Ciudad Real. As baixas foram enormes entre as tropas espanholas (5.000 segundo os franceses, 2.500 de acordo com as fontes espanholas) e uma das consequências foi a substituição no comando do Exército da Mancha do Conde de Cartaojal por D. Francisco Venegas (“Venegas, un buen jefe para un regimiento, cuyo valor há sido evidenciado reiteradamente, demostrará ser incapaz para valorar la situación y ejercer el mando de todo un ejército”11). Veremos mais à frente como a acção de Venegas influiu nos combates em que estiveram envolvidas forças portuguesas e inlgesas. Mais a sudoeste, o Exército da Estremadura comandado pelo general D. Gregorio de La Cuesta encontrava-se a ser reforçado em homens e equipamentos, contava então com 15.000 Infantes, 2.000 cavaleiros e 576 artilheiros com 30 peças de artilharia de campanha. Para evitar que se reforçasse mais, o Marechal Victor, comandante do I CE francês, recebeu ordens para o atacar o mais cedo possível. Depois de uma grande pressão das forças francesas sobre as passagens do Tejo, Cuesta teve de retirar as suas forças primeiro sobre Trujillo e depois sobre Medellin. As condições do terreno não favoreciam a batalha em campo aberto por parte dos espanhóis mas continuar a retirar também não era uma opção bem aceite “como apunta Thier - no podia retroceder más sin dejar descubierta Sevilla, «capital de la insurreción, último reducto de la fidelidad española»”12. A 28 de Março travou-se então a batalha de Medellin. O desfecho foi terrível para os nossos aliados espanhóis, 10.000 baixas, as francesas terão rondado as 1.000. Em dois dias, 27 e 28 de Março, dois dos mais importantes exércitos espanhóis, Extremadura e Mancha, tinham sofrido pesadas derrotas em Ciudad Real e Medellin, e a 29 de 10

LÓPEZ, Cor Juan Priego, Guerra De La Independencia, volumen IV, Campaña de 1809, MADRID, Libreria Editorial San Martin, 1981, Croquis nº1 pág. 21 e descrição das principais Batalhas a partir da pág. 64; 11 Juan José Sañudo, El Combate de Aranguez in Cuadernos Del Bicentenario, FEHME, Nº 0/ Diciembre, Madrid, España, 2006, pág. 38 12 Priego López,Vol IV, pág. 73

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Março Soult tinha entrado no Porto. A França ganhava poder e confiança mas, o que os franceses ainda não tinham medido bem… as populações ocupadas também. Num dos pontos mais prováveis de entrada em Portugal, Ciudad Rodrigo e Almeida, Portugueses e Espanhóis cooperavam na defesa. Como sabemos nem Victor apoiou Soult no Sul de Portugal nem Lapisse o fez pelas Beiras porque, neste último caso, estavam lá as forças portuguesas da Leal Legião Lusiana (LLL – esta força foi criada em Londres por iniciativa do Coronel Carlos Frederico Lecor e José Maria de Moura e o apoio do Coronel britânico Wilson13). Ciudad Rodrigo contava com 1.400 homens para a sua defesa, em Almeida estavam 700 portugueses da LLL e o restante da Legião estavam em terras de Espanha (mais tarde reforçados com batalhões espanhóis voluntários de Avila, e os Tiradores de Castilla com civis dos arredores de Ciudad Rodrigo – no final Wilson podia contar com 3.000 Infantes e 400 cavaleiros, espanhóis e portugueses)14, até ao Puerto de Baños “y sublevando, en su camino, a los habitantes de la regíon limítrofe entre España y Portugal(…) logro estabelecer frente a los invasores de nuestro suleo una línea de pequeños puestos, que se apoyaba, por la derecha, en la Peña de Francia, y por la isquierda, en el pueblo fronterizo de San Felices de Gallegos”15. Lapisse recebe ordens no final de Março para se juntar às forças de Victor, mas como tem as passagens do Tejo cortadas pelos portugueses e espanhóis de Wilson, tenta um ataque de diversão em Ciudad Rodrigo a 6 de Abril de 1809. Uns dos Batalhões da LLL, reforçados por forças espanholas, efectivamente vão ser atraídos por esta manobra e acodem a Ciudad Rodrigo permitindo-se assim a passagem para sul. A 19 de Abril Lapisse junta-se a Victor criando uma enorme concentração de forças francesas junto à fronteira do Alentejo. A LLL foi das primeiras forças portuguesas a provar estar bem preparada para combater (recordamos que o Exército de 1º linha português tinha sido “desfeito” em 1808) e bem o demonstrou contra as forças de Lapisse: com um reduzido número de portas conseguiu conter forças francesas com mais do dobro do seu efectivo “A sua táctica foi alongar as linhas de atiradores, retirando-lhes profundidade, o que deu impressão de um maior efectivo (…) 3000 homens pararam uma divisão de infantaria com efectivo de 7600 homens e 900 de cavalaria (…) não dando tréguas às forças francesas da sua zona de acção: assaltando os seus acampamentos, atacando os comboios de abastecimentos, interceptando os correios e capturando a correspondência, destruindo as secções de exploração, ou obrigando a desenvolver o grosso das tropas (…)”16. Mas a junção de Lapisse a Victor não resolvia o problema dos franceses porque, embora as baixas entre as forças espanholas fossem significativas, o Exército da Extremadura recuperou rapidamente enquanto as forças francesas, devido às campanhas da Áustria, não recebiam quaisquer reforços exteriores “hacia 25 de Abril Cuesta volvia a disponer de 20.000 infantes, 13

Sérgio Veludo Coelho e Carvalho in AAVV, O PORTO E AS INVASÕES FRANCESAS, VOL III, Porto, CMP e Público, 2009, pág 59 14 Na realidade a colocação de forças é muito mais extensa se analisarmos as forças dentro e em rpofundidade em Portugal: “11.000 homens,cavalaria e milícias, mais 900 homens da LLL, fora colocado em profundidade, desde a cidade espanhola de Alcântara, Torres Novas, Golegã e Santarém, sob o comando do general Miranda Henriques, enquanto cinco batalhões ingleses cobriam Lisboa, sob o comando do general Macenzie, para observar a movimentação do corpo de exército do general Victor” in Coelho e Carvalho , pág 65 15 Priego López, pág. 80 16 Coelho e Carvalho, pág. 66, 67

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3.000 jinetes y 22 piezas de artillería, que no solo impidieron al Cuerpo de Víctor pasar a Mérida, sino que le obligaron a replegar el grueso de sus furzas a la zona comprendida entre Torremocha, Montánchez y Salvatierra de Santiago”17. Mais a Norte, na Galiza, o Marquês de La Romana, em grandes dificuldades durante os 3 primeiros meses de 1809 não recebeu qualquer apoio das Astúrias18 e por isso, a 1 de Maio dissolveu a Junta das Astúrias. Os franceses, comandados pelo nosso conhecido Ney, atentos a estas lutas internas aproveitaram para, em meados de Maio, lançar um ataque sobre esta região. A ofensiva francesa ao principado das Astúrias embora tenha de ser considerada um êxito táctico não produziu efeitos no tempo porque não só não conseguiram destruir o grosso das forças espanholas como ainda, por serem necessários noutras áreas de Espanha, retiraram rapidamente das áreas entretanto conquistadas. A 22 de Maio Ney estava de regresso à Galiza e o general Kellerman, que tinha ficado a ocupar os territórios asturianos, acaba também ele por abandonar as posições conquistadas até 9 de Junho. Foi tão rápida a ofensiva como a retirada. Em Junho as grandes ofensivas continuam: Ney ataca o Conde de Noroña, comandante da Diavisão do Minho e Soult ataca o Marquês de La Romana. Depois de várias acções, com resultados operacionais apenas de impacto local, os franceses concluem que a completa pacificação da Galiza necessitaria de muito tempo e mais homens, reforços esses que não seriam possíveis enquanto durassem as operações na Alemanha e Áustria. O Próprio Napoleão vai emitir directivas nesse sentido, a partir de Schonbrunn a 12 de Junho, para que os corpos de exército dos Duques de Elchingen (Ney), de Treviso (Mortier) e da Dalmácia (Soult) se reunissem para manobrar contra o Exército anglo-luso de Wellington19. Em síntese, a decisão francesa assentava numa premissa: Para evitar a possível conquista de Madrid pelos anglo-portugueses, a Galiza tinha de ser abandonada, e assim foi. Mas onde estavam as restantes forças francesas em Espanha? Depois da conquista de Saragoça (em que foi vencido o Exército Espanhol de Palafox), o III CE de Junot e o V CE de Mortier, com aproximadamente 30.000 homens tentavam o domínio completo de Aragão, ficando o primeiro destes corpos a operar a sul do Ebro e o V CE a norte. Depois de várias acções militares os dois corpos de Exército juntaram-se no princípio de Abril de 1809 para conseguir o domínio de Aragão oriental. No entanto Napoleão cancelou esta intenção ao determinar o movimento imediato do V CE para perto da fronteira Francesa no sentido de acautelar um possível reforço do TO da Áustria. Apenas com um CE francês em Aragão as forças espanholas puderam então retomar a iniciativa e “caíram” sobre o seu novo comandante, Marechal Suchet (a 5 de Abril Suchet substituíra Junot mas só assumiu efectivamente o comando no dia 19 de Maio). Suchet vai tomar a contra-ofensiva e a 23 de Maio está na frente do General espanhol Blake em Alcaniz. Blake ganha o confronto mas não consegue a exploração do sucesso, decidindo aguardar reforços, só que Suchet também é reforçado e a 15 de Junho trava-se uma nova Batalha, a 17

Priego López, pág. 85 Priego López, pag.s 138-140 19 Priego López, pág. 160 18

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Batalha de Maria. Foi um confronto significativo, de um lado Blake com 20.000 homens e 25 peças de artilharia, do outro, Suchet com apenas 9.000 combatentes (14 batalhões, 7 esquadrões e 12 peças de artilharia)20. Foi uma derrota pesada para Blake, 2.400 baixas (1.000 mortos). Blake decide dar de novo Batalha a 18 de Junho em Belchite, e aí uma granada fez, como mais tarde se repetiria em Almeida, explodir o parque de munições espanhol levando a uma derrota antecipada. Depois desta segunda batalha o denominado “2º Ejército espanõl de la Derecha” deixou praticamente de existir. Suchet dedicou então o seu tempo a administrar Aragão, a conter insurreições pontuais e a estender o seu domínio a toda a região “al acabar el año, toda la comarca aragonesa (…) quedaba prácticamente dominada por ellos”21. Junto à fronteira de França, na Catalunha haveria muitas operações a destacar mas, optamos por lembrar apenas o prolongado cerco de Gerona do General Saint-Cyr. Na prática as acções neste TO da Catalunha traduziram-se num isolamento operacional face aos restantes TOs em Espanha. Voltando de novo para junto da fronteira portuguesa, junto à ponte de Alcântara, nos primeiros dias de Maio de 1809, o Marechal Victor teve de fazer frente a uma força portuguesa: um destacamento comandado pelo Coronel Mayne constituído pelo primeiro Batalhão da Leal Legião Lusitana, o regimento de milícias de Idanha, um esquadrão de cavalaria do Regimento de Cavalaria II e uma bateria a 6 peças (entre 1800 a 2.000 homens)22. O combate durou 9 horas mas a LLL teve de retirar para Lodiero, nesta acção perderam a vida 103 portugueses, 143 feridos e 15 extraviados. A LLL ainda defenderia a ponte de novo a 10 de Junho do mesmo ano contra as forças de Victor mas quando os portugueses se aperceberam da imensa força francesa do outro lado do Tejo, tentaram defender-se barricando-se no outro lado do rio, tentaram ainda fazer explodir a ponte, mas não resultou, pelo que retiraram para Salvaterra do Extremo onde se concentraram 2.500 portugueses e ingleses. Os franceses por seu lado, ao não possuírem abastecimentos retiraram também para o vale de Tietar perto de Talavera de La Reyna. A LLL voltou então mais uma vez a ocupar a ponte de Alcântara. Face a todas as notícias que vão chegando das batalhas em Espanha no desgaste sobre franceses, ao enorme sucesso que os portugueses e os seus aliados tinham tido na expulsão de Soult de Portugal e animado pela perspectiva de Napoleão não poder reforçar o TO da Península Ibérica, Wellesley julga que tinha chegado a oportunidade para, em conjunto com as forças espanholas, atacar os franceses “ a campanha peninsular antinapoleónica de 1809 compunha-se de duas operações sequenciais e interligadas: a primeira (derrotar Soult) estava cumprida; faltava a segunda (derrotar Victor)”23. Tinha duas possíveis modalidades de acção: 1ª Modalidade de acção: atacar por Almeida-Ciudad Rodrigo em direcção a Salamanca sobre a retaguarda das forças francesas – como vantagens apresentava um inimigo fraco nesse sector e um tempo de intervenção mais curto, como inconvenientes estava o facto de

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Priego López, pág. 173 Priego López, pág. 179 22 Priego López, pág. 181, Coelho e Carvalho, pág. 82 23 José Manuel Sardica in AAVV, O PORTO E AS INVASÕES FRANCESAS, VOL I, Porto, CMP e Público, 2009, pág 80 21

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Wellesley apenas poder contar com 20.000 ingleses e cerca de 15.000 portugueses, porque não havia forças espanholas próximas, e ainda o facto já referido que os corpos de exército de Soult, Ney e Kellerman, estarem a abandonar a Galiza e as Astúrias e poderem assim vir no seu encalço; 2ª Modalidade de acção: atacar o I CE de Victor com duas possíveis variantes, a norte ou a sul do Tejo, como vantagem mais significativa tinha a parceria com as forças espanholas do General Cuesta e como principal inconveniente o tempo de intervenção mais longo, as necessidades de coordenação maiores e um inimigo mais forte. Wellesley optou pela 2ª modalidade de acção. Wellesley desloca-se a Abrantes e aí organiza a ofensiva conjunta de Portugueses, britânicos e espanhóis. A reunião do exército anglo-português com as forças do exército da Estremadura espanhol do General Cuesta faz-se a 21 de Julho, em Orepesa, perto de Talavera de La Reina. Para garantir a segurança de Portugal e sabendo que as forças de Silveira e Botelho não seriam suficientes para defender todo o Território nacional - estas garantiriam apenas o Norte de Portugal - para defender a fronteira entre o Douro e o Tejo seria destinado o Exército português de Beresford reforçado por batalhões portugueses do Exército anglo-luso de Wellington, constituindo-se assim como Exército de observação tendo como missão principal fixar o 5 CE de Mortier e qualquer outra força francesa que tentasse entrar por aquela fronteira. Seria ainda assegurada a defesa em profundidade no território nacional através de forças estacionadas na Guarda com as reservas em Coimbra. Com Wellesley seguiram apenas os portugueses da Leal Legião Lusitana que, como já referimos, já se encontravam em Alcântara, e teriam como missão na campanha defender o flanco esquerdo das forças aliadas. Em Abrantes Wellington reorganizou o seu exército em Divisões com uma estrutura base que sofreria poucas alterações no futuro:   

Divisão de Cavalaria do General Payne (brigada de dragões pesados – general Fane – e duas brigadas de dragões ligeiros – generais Cotton e Anson); 4 Divisões de Infantaria dos Generais Sherbrooke, Hill, Mackenzie e Alexander Campbell 6 baterias de Artilharia (30 peças: 18 inglesas e 12 alemãs) sob o comando do General Howorth;

Victor esperou a ofensiva aliada na margem esquerda do Tejo, com a direita sobre Almaraz, o centro sobre Puente del Arzobispo e a esquerda em Talavera. Como as forças francesas estavam todas a norte do Tejo a entrada das forças aliadas seriam também por norte do mesmo rio pelo que Wellington esperou de 8 a 27 de Junho que as tropas de La Cuesta se lhe juntassem, tempo precioso para recuperar as forças exaustas das operações no Porto e Norte de Portugal mas não o suficiente para receber os tão ansiados reforços britânicos entretanto desembarcados em Lisboa, com destaque para a brigada ligeira (futura Divisão Ligeira) de Robert Craufurd que só se reuniriam com Wellington após a Batalha de Talavera de La Reina. 9

Wellinton entra em Espanha com 21.000 Ingleses (do total de 33.000 existentes em Portugal, 8.000 estavam em Lisboa e 4.500 hospitalizados). A 28 de Junho iniciou-se a marcha em direcção a Espanha e a 3 de Julho as vanguardas cruzavam o rio Erjas enquanto os portugueses da LLL avançavam na esquerda do deslocamento. Em finais de Junho, sem que Wellington soubesse, os franceses concentraram no Vale do Douro os CE de Soult, Ney e Mortier totalizando mais de 50.000 homens. Além das forças de Victor com quem se tinha de bater, esta gigantesca força a Norte iria obrigar a repensar o plano. Victor mudou também o seu dispositivo para Talavera e esperou. Do lado aliado Cuesta apresentou-se com 36.000 homens24 (Se as forças do Exército da Mancha, do General Venegas se tivessem articulado com estas, como estava previsto, seriam 60.000 as forças espanholas disponíveis … mas desentendimentos entre generais espanhóis, a relutância espanhola em aceitar o comando unificado de Wellington… a tal não permitiu: a acção de Venegas em fixar parte das forças francesas de Sebastiani – entre Toledo e Aranjuez mostrou-se pouco útil porque acabou por não cumprir o que estava destinado por Cuesta e Wellington25 que consistia em evitar um possível reforço de Sebastiani a Victor). Na noite de 10 de Julho, Wellington, depois de passar a ponte de Almaraz sobre o Tejo, juntou-se finalmente às forças de Cuesta. As forças aliadas totalizavam 55.000 homens. Wellington descobriu a 21 de Julho em Orepesa, quando se juntaram as duas forças, que, além de não poder contar com a colaboração de Venegas, que não poderia contar com os reabastecimentos logísticos do governo de Espanha. Os franceses aguardavam o ataque com 46.000 homens. A Batalha de Talavera desenrolou-se entre 27 e 28 de Julho e foi uma série de combates parciais que constituiu “un gran êxito táctico para las tropas inglesas”26 onde, embora uma grande parte das forças em ambos os lados nunca chegassem a combater, as perdas foram muito elevadas: 5.363 ingleses, 1.200 espanhóis e 7.268 dos franceses. O resultado estratégico foi no entanto pouco significativo para os dois lados da contenda. Os franceses ainda receavam uma nova ofensiva aliada, justamente com as forças portuguesas: “En la noche entre 31 de julio y el 1º de Agosto, el mariscal duque de Belluno (Victor) informo a Su Majestad que havia apreciado que el ejército inglês aun permanecia en Talavera com el de Cuesta y que una columna portuguesa (LLL) se había puesto em movimiento hacia las montañas, para envolver la derecha del Primer Cuerpo”27. As tropas francesas reunidas no norte (muito mais numerosas do que Wellington suspeitava, 50.000 em vez das 12.000 ou 15.000) tinham-se entretanto deslocado para sul e ameaçavam a 5 de Agosto as linhas de comunicações anglo-portuguesas. Wellington tinha de retirar para a segurança de Portugal o mais rapidamente possível e fê-lo tendo de deixar numerosos feridos para trás numa marcha muito penosa com uma primeira importante escala na Ponte Del Arzobispo.

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Priego López, pág. 197 Priego López, pág. 203 26 Priego López, pág. 226 27 Relatório do Marechal Jourdan a José I em Sañudo, pág. 44 25

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É Soult que vai planear o ataque na Ponte Del Arzobispo, o ataque deveria aproveitar as artilharias combinadas dos II e V CE, um deslocamento rápido da cavalaria sobre um ponto vadeável do Tejo e atingir rapidamente Trujillo cortando assim a retirada de Wellington. De acordo com o planeado, às duas da tarde do dia 8 de Agosto, a artilharia abriu fogo e mais de 4.000 cavaleiros lançaram uma operação de envolvimento enquanto a infantaria avançava pela ponte e nos pontos de vadeamento. Primeiro a cavalaria destroçou os poucos espanhóis que lhes tentaram fazer frente e depois as reservas do General Cuesta, numa defesa em profundidade, conseguiram deter o avanço francês na zona de Peraleda. Foi um grande sacrifício das forças espanholas: 800 mortos e feridos, 600 prisioneiros, 400 cavalos e 30 peças de artilharia, da parte dos franceses as baixas não chegaram a uma centena. Ney não conseguiu passar o Tejo porque a Brigada Craufurd estava pronta na outra margem do Tejo e Soult teve de suspender a sua exploração do sucesso por falta de reforços que lhe permitissem sustentar a acção. Todas as forças manifestavam o desejo de reagrupar, suspender as acções ofensivas e ambas experimentam graves problemas de abastecimentos. Era necessário retirar e Wellington decide voltar a Portugal a partir do dia 20 de Agosto de 1809. A 12 de Agosto, devido a um problema grave de saúde, Cuesta é substituído no comando do Exército da Estremadura pelo General Don Francisco Ramón Eguía. Nesta operação de penetração em terras de Espanha a LLL, como força de vanguarda e protecção do flanco de Wellington, foram fundamentais. Vamos utilizar a descrição Coelho e Carvalho28: “Wilson tinha deslocado as suas forças pelo vale de Tietar e tomou posição em Arena, cobrindo Vera de Plasencia. Depois avançou na estrada de Madrid, até Escalona e Navalcearnero (25 de Julho), aproximando-se daquela cidade, mas foi obrigado a retroceder por estar na eminência de ver cortada a retirada de Soult, que descia para a Estremadura pelos desfiladeiros, impedindo-o de se juntar ao exército inglês após a batalha de Talavera de la Reyna, embora tivesse, em operação retrógrada, chegado até Velada. Atravessando com dificuldade a serra de Gredos, chegou a Ciudad Rodrigo e, tendo notícias de que o general Ney se deslocava para norte, saiu-lhe ao encontro nos desfiladeiros de Puerto de Baños, em 12 de Agosto de 1809. Nesta acção estiveram cerca de 4.000 homens entre portugueses e espanhóis, sem artilharia, e onde pontificou a LLL. Foi um combate que durou 9 horas, sendo 400 as baixas das forças de Wilson, entre mortos, feridos e desaparecidos. Após esta acção, Wilson chegou a Castelo Branco, onde se encontrava o exército português, no dia 24 de Agosto de 1809”. As forças aliadas entram em Portugal e, perto da fronteira Espanhola, deixam ficar um significativo número de forças até Dezembro de 1809. Um pouco mais para leste as forças de Venegas, que não tinham evitado a tempo os reforços a Victor têm de fazer frente a um Exército francês reforçado e livre da ameaça anglo-portuguesa. Ganham um primeiro confronto em Aranjuez (5 de Agosto) e depois dispõem-se para Batalha em Almonacid. Foi uma pesada derrota para Venegas mas as baixas franceses de Sebastiani também foram elevadas: 3.300 mortos e feridos, 2.000 prisioneiros para os espanhóis e 319 mortos e 2.075 feridos para os franceses. Também nesta importante área de Espanha os franceses eram agora dominantes. No dia 15 de Agosto de 1809, José Bonaparte podia celebrar tranquilamente o aniversário do seu irmão em Madrid, “la situación estratégica en la Península había mejorado 28

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notablemente para los franceses, a consecuencia de este ciclo de operaciones; pues si bien habían tenido que evacuar Galicia y Asturias, sus ejércitos quedaban más concentrados y si dominio del centro del país se hacía más completo”29. A situação ainda se iria tornar mais “fluida” a 13 de Agosto com um novo representante da GB em Espanha (Richard Wellesley, o irmão mais velho de Wellington, mas que iria sair pouco tempo depois, em Novembro, para substituir Canning na secretaria dos negócios estrangeiros da GB), uma restabelecida autoridade espanhola (a junta central) e com o anúncio da declaração de paz entre a Áustria e a França (14 de Outubro de 1809). A Junta central, com base em informações incorrectas de que os franceses estariam a retirar (pelo contrário: “el enemigo continuaba ocupando solidamente la línea del Tajo, y el único retroceso hacia el Norte (…) la vuelta del 6º Cuerpo, el de Ney, desde Plasencia a Salamanca”30) quer iniciar uma ofensiva, de preferência, com o apoio anglo-português. Mas os britânicos não estão interessados: “Londres no tiene prisa por la caída o abdicación de José Bonaparte. Londres prefiere retener en la Península Ibérica, pêro lejos de la Raya de Portugal, cuantos más soldados franceses mejor”31 e a Junta decide juntar as forças de Eguía às de Venegas e partir sozinho na ofensiva com um Exército de 51.869 homens32 enquanto a norte um novo Exército de La Izquierda deveria fixar os corpos de Ney e Kellerman. José Bonaparte tinha disposto os vários corpos franceses em redor de Madrid (Soult e Mortier no Tejo entre Plasencia e Talavera, Victor em La Mancha e Sebastiani desde Toledo até Aranjuez, Ney em Salamanca, reserva em Madrid constituída pela Divisão Dessoles e Guarda Real) e esperava que o seu irmão, agora com o conflito austríaco resolvido, trouxesse grandes contingentes para conquistar Portugal. Mas as forças espanholas davam os primeiros passos e a primeira acção foi da responsabilidade de Don Diego de Cañas y Portocarrero, duque del Parque-Castrillo no que ficou conhecido como a Batalha de Tamames. Marchand (substituíra interinamente Ney no comando do VI CE que fora de licença a Paris) tinha 12.000 infantes, 1.200 cavaleiros e 14 peças de artilharia, do lado espanhol o Duque do Parque tinha 20.000 infantes, 1.500 cavaleiros e 18 peças de artilharia. No dia 18 de Outubro de 1809 deu-se a batalha de Tamames com uma significativa vitória para a Espanha, Marchand teve de retirar para Salamanca registando 1.300 baixas contra as 713 dos espanhóis33. A notícia da vitória espanhola entusiasmou todo o País, em especial a Junta Central. Os franceses reforçaram na direcção de Salamanca (foi a última ordem de Jourdan antes de ser substituído como Chefe de Estado Maior por Soult a 5 de Novembro) e assim o Duque do Parque tinha cumprido a sua parte do plano de campanha forçando um empenhamento francês a norte permitindo agora que o ataque espanhol desde sul produzisse efeitos. Seguiu-se a Batalha de Ocaña.

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Priego López, pág. 251 Priego López, pág. 311 31 Miguel Alonso Baquer in AAVV, LA GUERRA DE LA INDEPENDENCIA [1808-1814] el pueblo español, su ejército y sus aliados frente a la ocupación napoleónica, Madrid, Editorial Ministerio de Defensa - Centro de Publicaciones, 2007, pág 32 32 Priego López, pág. 313 33 Priego López, pág. 321 30

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O duque de Albuquerque, comandando o Exército da Extremadura, efectuaria um ataque secundário entre Almaraz e Talavera para assim atrair uma parte significativa das forças espanholas enquanto o ataque principal seria desencadeado pelo Exército do Centro (anterior da Mancha) com um efectivo de 60.000 homens34 comandado por D. Juan Carlos de Areizaga “Areizaga carecía de profundos conocimientos militares y de las dotes de mando en jefe de un ejército tan numeroso”35. A partir de Cádiz a GB alimentou o reequipamento do Exército de Areizaga em armas, fardas e demais materiais, que estava organizado numa vanguarda e 7 divisões de infantaria, 4 divisões de cavalaria. O movimento para a Batalha foi rápido e surpreendeu os franceses mas estes reagiram imediatamente e movimentaram cerca de 27.000 infantes das forças de Victor, Sebastiani, Mortier, Dessoles, da Guarda Real e 5.000 cavaleiros de Milhaud, Paris e Beaugerard. Com os artilheiros e sapadores os franceses totalizavam 33.500 homens36. A 19 de Novembro deu-se a Batalha de Ocaña e as forças espanholas foram duramente castigadas: 4.000 mortos e feridos, 14.000 prisioneiros (quando se reuniram de novo as forças espanholas em Sierra Morena, dos 60.000 só existiam 21.000 infantes e 3.000 cavaleiros). Os franceses registaram 1.900 mortos e feridos. Na manobra de diversão do duque de Albuquerque e do Duque do Parque as coisas também não tinham corrido melhor. Depois de uma conquista de Salamanca e um avanço ousado em direcção a Madrid, ao tomar conhecimento a 25 de Novembro do desastre de Ocanã, decidiram retirar as suas forças para Alba de Tormes. Foi aí que atacaram os franceses do corpo de Kellerman e o Duque Del Parque sofreu 3.000 baixas contra as 300 baixas dos franceses, depois na retirada as forças espanholas ainda iriam registar mais 3.000 desertores37. Com o Inverno as perdas continuaram a aumentar (até meados de Janeiro de 1810 registavamse 9.000 baixas devido a febres, disenteria e fome). As forças espanholas estavam agora bastante dispersas e não totalizavam mais de 100.000 homens (os pequenos núcleos de forças estavam incapazes de realizar operações militares significativas que nunca ultrapassavam os 15.000 efectivos)38. O remanescente poder político também se tinha retirado, de Sevilha para a Ilha de Leão a 13 de Janeiro de 1810. Fortemente abaladas as instituições, as suas gentes, no entanto, não tinham deixado de continuar a combater. No início de 1810, como o exército regular espanhol está diminuído, aumenta o combate por forças irregulares: “Partidas, cuadrillas, somatenes, compañías honradas, cruzadas de seminaristas, cuerpos francos de nueva creación, corsos marítimos y terrestres, cazadores rurales, etc. se deciden a operar (…) entre Fuenterrabía (Guipúzcoa) y Cuidad Rodrigo 34

51.857 infantes, 5.766 cavaleiros, 1.500 artilheiros com 60 peças e 600 sapadores – total de 59.723 combatentes (pág. 326) 35 Priego López, pág. 326 36 Priego López, pág. 335 37 Priego López, pág. 345 38 Priego López, volumen V, Campaña de 1810, pág. 17: “en Asturias, bajo el mando de don Antonio Arce; en Galicia – Mahy, entre Salamanca y Extremadura - Duque Del Parque, Mérida y Don Benito – Duque Albuquerque, Entre Almadén y Villamanrique – Areizaga, Valencia – Don José Caro, línea del Algas – García Navarro, Tarragona y Lérida – O’Donnel”

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(Salamanca) – incidirán Mina el Mozo, Espoz y Mina, Longa, Porlier, el Cura Merino, Julián Sánchez el Charro, El Empecinado, etc Unos desde el norte y otros desde el sur del Valle del Duero como sedes de sus guaridas”39. Os maus resultados das operações espanholas no final de 1809 tinham levado os ingleses a retraírem o seu dispositivo para o interior de Portugal e já eram muitas as vozes na GrãBretanha que propunham o estabelecimento de negociações com os franceses, inclusivamente, a oposição liberal liderada por Greenville e Grey defendiam a retirada imediata de Portugal e acordos de paz com França. Napoleão animado com o desânimo crescente de espanhóis e ingleses prepara com pormenor o seu regresso à Península, e numa ordem datada de 23 de Novembro, já a partir de Paris, ele define que a sua Guarda Velha e jovem, com mais de 25.000 homens e 60 peças de artilharia deviam estar prontas a partir de 15 de Janeiro para o acompanhar à Península Ibérica40. Entretanto o seu irmão em Madrid decide-se a atacar a Andaluzia, a província mais rica e povoada de Espanha e onde se encontrava o poder residual espanhol. José submete o plano a Napoleão com duas modalidades de acção e este aprova a segunda: Fixar forças em Talavera (Albuquerque), submeter as forças remanescentes em Valência e atacar ao centro para conquistar Sevilha. Uma consequência imediata deste plano foi o de provocar um atraso na conquista de Portugal. José sai de Madrid a 7 de Janeiro de 1810. O avanço francês, em três grandes colunas, foi “empurrando” os espanhóis para sul. No dia 23 de Janeiro já se encontravam por detrás de Jaen e Córdova e a 24 já ambas as cidades estavam conquistadas. A Junta central abandona Sevilha em direcção à Ilha de Leão “corrieron los más sérios peligros por parte de las populaciones del tránsito, que les acusaban de incapacidad o tración, y pretendieron en algún caso castigarles com la muerte”41. A última esperança residia num possível reforço do Duque de Albuquerque que marchava em direcção a Sevilha com 8.000 infantes e 600 cavaleiros mas este, quando soube da situação desesperada em que se encontrava Sevilha, seguiu também para Cádiz. A 1 de Fevereiro Sevilha rendeu-se e os franceses ganharam um enorme saque, reabastecimentos e a queda da última capital de Espanha e os seus territórios foi uma enorme vitória política42. O remanescente poder político espanhol estava desmantelado, dividido e sem solução à vista. Foi na Isla de León (hoje San Fernando) que se reuniram as novas regências e imediatamente foi pedida ajuda a Portugal e Grã-Bretanha “Lord Burgesch fue enviado al cuartel general de Wellington en Viseu, para reclamar el socorro de algunos batallones ingleses y portugueses de su ejército, que no tardaron en embarcar en Lisboa com rumbo hacia Cádiz (…) três batallones de infantería y outro português pasaran a guarnecer las defensas exteriores de la fortaleza, bajo el mando unificado del General William Stewart”43. A chegada, finalmente, das forças de Albuquerque e a posterior chegada da frota britânica comandada pelo Almirante

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Miguel Alonso Baquer, pág 32 Priego López,V, pág.13 41 Priego López,V, pág.46 42 Priego López,V, pág.50 43 Priego López,V, pág.53 e 66 40

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Purwis (incluindo um navio português44), trouxeram alguma tranquilidade aos sitiados de Cádiz. Mas a situação vai piorando para os Espanhóis, Granada tinha caído a 28 de Janeiro e Málaga vai cair a 5 de Fevereiro às mãos de Sabastiani. A 21 de Fevereiro começaram as negociações com Cádiz para a rendição que nunca ocorreria. Entretanto junto à fronteira com Portugal, desde que o Marquês de La Romana tomara o comando do Exército da Esquerda, apenas houve combates parciais que em nada a inquietaram as nossa forças e as do nosso aliado britânico “desde primeros de febrero a mediados de mayo de 1810, en la zona fronteiriza hispanolusitana compendida entre Ciudad Rodrigo y Ayamonte se redujo a una sucesíon deshilvanada de combates parciales, que, aun siendo por lo general favorables a los franceses, no condujeron a ningún resultado positivo”45. Nos restantes Teatros de Operações Peninsulares há que destacar as operações de Suchet em Aragão e Valência, as de Augereau na Catalunha, as operações nas Astúrias e o cerco de Astorga. Se uma conclusão breve podemos tirar de todas as operações é o enorme desgaste que provocaram a ambos os contendores e, embora as vitórias tenham sido mais significativas para o lado francês, recordamos que Valência não foi conquistada, Augerau foi demitido por não atingir os seus objectivos e a forte resistência de Astorga reduziu a capacidade ofensiva francesa. A verdade é que a capacidade de manter uma resistência activa espanhola, embora as suas forças convencionais definhassem, parecia fortalecer após cada derrota. Sem conseguir conquistar Cádiz, O Rei José regressa a Madrid a 13 de Maio de 1810 e assim terminou a campanha da Andaluzia que não só atrasou a campanha sobre Portugal como, ao obrigar a permanência de milhares de franceses nas regiões agora ocupadas, diminuiu a hipótese de maiores efectivos para tentarem a conquista de Lisboa. Em Fevereiro de 1810 Napoleão mandara Ney espalhar a notícia junto da fronteira de Portugal que ele vem a caminho de Lisboa. Mas já começava a ficar claro que o Imperador não viria à Península e no entanto, invocar a sua presença, provocava sempre um efeito significativo.

Esperando Massena – Defender Lisboa a todo o custo “ O exército de Lorde Wellington contava com 30.000 Ingleses e 40.000 portugueses, já exercitados, bem disciplinados (...) milícias organizadas em batalhões, que recebiam soldo e estavam bem armadas (...). bandos de guerrilhas com a missão de cair sobre os flancos e as retaguardas do exército francês, cortar as suas comunicações e atacar os comboios... em cada bairro a restante população devia levantar-se em massa (...) Não se tratava, pois, de um exército superior em número que o senhor marechal Massena tinha de combater; mas também toda a nação” - Memórias do Marechal Jourdan46

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Priego López,V, pág.77 Priego López,V, pág.68 46 LINHAS DE TORRES VEDRAS – Memórias francesas sobre a III Invasão, Livros Horizonte, Lisboa, 2010, pág. 191 45

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O número de forças em Espanha era considerável, cerca de 180.000 homens em Janeiro de 1810 mas seriam reforçadas com mais 138.000 homens até à Primavera (entre estas destacam-se o Corpo de Reserva da Alemanha (VIII CE) do Gen. Junot com cerca de 30.000, a jovem guarda dos Gen. Roguet e Dumoustier com cerca de 15.000 homens, o IX CE do Gen. Drouet d’Erlon de 20.000 homens, os 4ºs Batalhões dos Regimentos47 num total de 33.600 h, etc) que totalizariam 320.000 homens em Espanha48, no princípio do Verão. Napoleão tinha escrito uma carta ao Gen. Clarke ordenando-lhe que mobilizasse as reservas para que, com ele à frente, “(...)terminar o assunto na Península Ibérica(...)”. Esta ideia seria mais detalhada quando a 07 de Outubro onde precisa esse mesmo reforço em 80.000 infantes e 16.000 cavaleiros além das guardas (Velha e Jovem) que somavam mais 25.000 homens e 60 peças de artilharia. Os reforços deveriam estar no teatro de operações até Janeiro de 1810. Napoleão Bonaparte decide à última hora não comandar pessoalmente a operação, por vários motivos mais de carácter pessoal do que de estado49 e decide nomear um dos seus marechais para a conquista de Portugal, André de Massena, Duque de Génova e de Rívoli, Príncipe de Essling, Marechal de França e conhecido como “Filho querido da vitória”. A 17 de Abril de 1810 foi criado o Exército de Portugal (L’Armée du Portugal), basicamente constituído por 3 corpos de exército (II de Reynier, VI de Massena, VIII de Junot e ainda a Cavalaria de Montbrun, Artilharia comandada por Eblé). As instruções de Napoleão para Massena previam a actuação quer defensiva, quer ofensiva, das forças Luso-britânicas. Na primeira hipótese, Massena devia apoderar-se de Ciudad Rodrigo e Almeida e, materializando uma ameaça sobre Lisboa, evitaria que Wellington conduzisse as operações segundo o Vale do Tejo, em direcção a Madrid ou à Andaluzia. Os VI e VIII CE actuariam a Norte do Tejo, enquanto o II CE se dirigiria sobre Badajoz e Elvas. No entanto Napoleão não foi muito preciso quanto às operações a realizar pelo II CE. Caso Wellington actuasse ofensivamente, penetrando em Espanha, Massena devia atacar as forças anglo-lusas logo que se apresentasse uma ocasião favorável. Massena, já com 54 anos, ainda tentou recusar o cargo e não deixou de o declarar na sua chegada a Salamanca a 28 de Maio - “Senhores, estou aqui contra a minha vontade. Começo a sentir-me demasiado velho e fatigado para prestar serviço activo…”. Como é óbvio isto deixou uma péssima impressão nos principais Generais, que já de si não eram de fácil trato – Ney era conhecido pela sua insubordinação, Soult não se entendia com Massena, Junot achava que ele deveria ter sido o escolhido para comandar o Exército e Reynier apenas falava com Massena em serviço. Depois de algumas indefinições, o “Exército de Portugal” ficou constituído por 65.00050 homens (significativamente abaixo dos 100.000 previstos) o que, logo à partida, era insuficiente para atacar o nosso país por duas direcções estratégicas (Beira e Alentejo). 47

na altura encontravam-se apenas a 3 Batalhões cada Regimento Priego López, vol V, pág. 16 49 a anunciada gravidez da sua amante Walewska, o divórcio de Josefina, o casamento com Maria Luísa. Tudo atrasa os planos de Napoleão Bonaparte para uma possível vinda até à Península Ibérica, especialmente o casamento, inicialmente previsto para 6 de Fevereiro e que só se viria a realizar a 2 de Abril de 1810. 50 Vários franceses que viveram nesta época referem ainda números mais pequenos ... 50.000?, in AAVV, introdução de António Ventura, LINHAS DE TORRES VEDRAS – Memórias francesas sobre a III Invasão, Livros Horizonte, Lisboa, 2010 48

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Wellesley preparara a defesa de Lisboa com antecedência. Era sabido que as antigas linhas de fortificação de Lisboa, muralha mourisca e fernandina (1373) não defenderiam Lisboa pelo que o Duque pensou então em aproveitar os antigos estudos da defesa afastada de Lisboa do Conde de Lippe “As linhas de Sintra”, posteriormente reforçadas pelo General britânico Charles Stuart (em 1799) e os de Gomes Freire de Andrade na sua monumental obra publicada em 1806: “ensaio sobre o método de organizar em Portugal o exército relativo à população, agricultura e defesa do país” que descreve como a defesa de Lisboa devia ser assente na linha de montanhas entre o Tejo e o Mar. Apoiou-se ainda nos estudos e levantamento topográfico feitos pelo Tenente-coronel de Engenharia Carlos Frederico Bernardo de Caula em 1802, pelas reflexões do Cor. Vincent (Chefe dos Engenheiros de Junot) e fundamentalmente nos do Major Neves da Costa do Real Corpo de Engenheiros Portugueses (resultando no desenvolvimento dos levantamentos topográficos de 1802 – em que acompanhou Caula – mais tarde em 1806 aprofundados para preparar a defesa afastada de Lisboa e que ficaram concluídos em 04 de Março de 1809 completados posteriormente com um memorando a 6 de Junho). Wellington, acompanhado do plano e memorando desenvolvido pela Cap Neves Costa, deslocou-se em Outubro de 1809 com o Cor. Murray e o Ten-Cor. Fletcher (Comandante da Engenharia Inglesa) para reconhecer as Linhas junto a Torres Vedras e faz o famoso memorandum de 21 pontos, que, entre outros, estipulava o seguinte: - A defesa devia ser afastada de Lisboa – ficando assim previstas 3 linhas a Norte e 2 a Sul – As linhas em S. Julião (3ª a Norte) e Setúbal (2ª a Sul) não seriam para a defesa de Lisboa mas visavam permitir um reembarque em segurança das forças britânicas. - A exigência de barrar os principais eixos de aproximação a Lisboa (quatro principais acessos). - A existência de um esquema de distribuição de tropas, pensada para as possíveis ocasiões com um completíssimo sistema de comunicações (que depois de montado permitiria que uma mensagem demorasse cerca 7 minutos do Tejo ao mar). Todas estas medidas estavam dentro de uma estratégia defensiva mais generalizada que assentava em outras duas importantes considerações: - Completar o mais rapidamente possível o Exército Português de 1ªlinha, bem como as milícias e as ordenanças. - Preparar um plano de destruições “terra queimada” por onde se previsse a aproximação do inimigo. Esta intenção, como facilmente se percebe, foi a que deu mais controvérsia e só foi

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parcialmente cumprida a partir de Agosto; e se alguns destruíram os seus haveres, muitos limitaram-se a escondê-los. Em Outubro de 1809 deu-se então o Início da construção das Linhas de Torres Vedras (também chamado por alguns autores como Cidadela de Portugal ou as Linhas de Sintra51 ou ainda por Linhas de Alenquer52): Toda a obra deveria ser feita no maior segredo (nem o Ministro da Defesa da Grã-Bretanha tomou conhecimento, como se pensa que nem o seu embaixador em Lisboa teve conhecimento das linhas, provavelmente saberiam de uns trabalhos a decorrer nesta área mas não tinham conhecimento da magnitude e última finalidade das obras). Nos principais acessos a Portugal foram feitos trabalhos de fortificação, especialmente nas áreas habituais de defesa – Almeida, Elvas, Peniche e Abrantes (tradicional ponto de expectativa estratégica onde Wellington se tinha posicionado no início de 1810). Em Janeiro de 1810, o dispositivo das forças aliadas em Portugal era o seguinte:     

QG e a 1ª Div. – Viseu (em Abril mudou para Celorico) 3ªDiv. – Trancoso (em Abril mudou para Pinhel) 4ªDiv. – Guarda (onde se manteve) Div. Lig. (Craufurd) – Na fronteira junto a Ciudad Rodrigo (em Abril foi reforçada com caçadores e forcas da K.G.L.) 2ªDiv. (Hill) e a Div. Portuguesa (Hamilton) – Portalegre (também com a missão de apoiar o Gen Espanhol Marquês de La Romana.

A 30 de Maio, o Marechal Ney à frente do seu VI CE deslocou-se para a frente de Ciudad Rodrigo. Em Junho o restante dispositivo do Exército de Portugal era o seguinte:  

VIII CE (Junot) (Ala direita do Ex) – A 1ªDiv (Gen. Clausel) em San Felices de Gallegos e a 2ªDiv (Gen. Solignac) em Ledesma. II CE (Reynier) (Ala esquerda do Ex) / Entre o Tejo e o Guadiana. Recebeu ordens para se deslocar para Cória e Plasência sem contudo poder descurar a vigilância de Badajoz.

França e Espanha atacaram juntas Portugal em 1801 e 1807: Portugal resistiu como pôde mas só a mudança de posição de Espanha em 1808 permitiu a expulsão de Junot e o apoio britânico a ambos os países. No início de 1809, os Portugueses contaram com as operações de espanhóis para conter reforços franceses em direcção a Portugal e após a expulsão de Soult do nosso território, Portugal colaborou activamente para permitir as ofensivas aliadas em terras de Espanha. Em 1810 Portugal completou a sua defesa e reforçou enormemente as suas forças porque, além do ancestral e tradicional apoio britânico, contou com o tempo e sacrifício espanhol em duros combates contra os franceses. Portugal saberá reconhecer este esforço da 51

MARBOT, General Barón de, MEMORIA SOBRE A 3ª INVASÃO FRANCESA, Ed Caleidoscópio, Casal de Cambra, Portugal, 2006, pág 75 52 Capitão Jean-Baptiste Lemonnier-Delafosse, in LINHAS DE TORRES VEDRAS – Memórias francesas sobre a III Invasão, Livros Horizonte, Lisboa, 2010, pág. 62

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nação irmã e irá combater lado a lado com os seus aliados em terras de Espanha até à definitiva derrota dos invasores já em terras de França na Batalha de Toulouse em 1814. Em vésperas da entrada dos Franceses na direcção de Almeida em 1810, Portugal está firme na vontade de se defender e, junto aos seus aliados britânicos, sabe que pode contar com a determinação espanhola.

“Vêm aí os franceses!” Portugal estava pronto.

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