Das causas do impasse na austeridade...

July 5, 2017 | Autor: João Titta Maurício | Categoria: Austeridade, Burocracia, austeridade em Portugal
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Das causas do impasse na austeridade…
por João Titta Maurício*

Estou cada vez mais convencido que, ao invés de razões de inexperiência, estupidez ou maldade, grande parte da austeridade que enfrentamos mais não é do que o "fruto amargo" da incapacidade de contrariar ou de domar a voracidade do "apetite" do "Leviatã" em que se tornou a sempre insatisfeita, poderosa e verdadeiramente insana "máquina do Estado" – a mesma que, muito cobardemente, se acoita por detrás dos funcionários públicos, tornando-os "negaça" e seu escudo para as críticas e os cortes que se exigem que sejam operados contra estas verdadeiras mas sempre inatacadas "gorduras oligárquicas" instaladas!
Só assim se explica que, este ano, para suportar um pedido de bolsa, à cópia digital da declaração (e da liquidação) do IRS se haja requerido a junção de um "documento comprovativo de propriedades rústicas e urbanas" (quando os dados constantes deste já constam naquelas... e o mesmo documento, produzido na minha frente – coitada da funcionária que assim revelou o "segredo" –, tem por base a consulta das declarações prestadas na declaração de IRS).
Quais as diferenças?
Bom, por um lado, a injuriosa irrelevância a que, deste modo, a "máquina do Estado" destina as duas declarações de honra (sobre o conteúdo das afirmações prestadas na declaração do IRS e no pedido da bolsa) obrigatoriamente proferidas pelo contribuinte e pelo administrado! Por outro, e tão grave como aquela, o verificar-se que este "chico-espertismo de chuleco" – que forjou o pedido desta nova, inútil e redundante declaração – custa ao contribuinte... € 6,52!

Não parece muito, de facto, mas porque é mais uma de tantas como esta, só apetece dizer… umas quantas coisas, demasiado feias e desagradáveis para serem proferidas em público.

Um dia arrepender-se-ão do injustificado "culto" e insana "adoração" com que beneficiam o Estado...
Fruto do "modelo napoleónico", através da moderna concepção de Estado – assente numa putativa "pureza" e "virgindade" naturais deste (naturalmente extensíveis a todos os seus organismos, agentes e funcionários), bastando-lhe apenas querer... para que (quase) tudo seja feito à sua vontade – o Estado atribuiu-se a si próprio (e aos seus agentes e funcionários) um direito de abuso contra a Liberdade: o "Privilégio da Execução Prévia" (e o precedente e seu "abcesso" natural: o "princípio da Presunção da Legalidade dos Actos Administrativos"). Porque, afinal, pertencem todos à "corporação": inspectores e inspeccionados; decisores e beneficiários... Todos presumindo-se e reciprocamente tratando-se, repita-se, como putativas "virgens" e todas verosimilmente"puras".
E ai de quem sequer ousar atrever-se a pensar o contrário: "será bom que ninguém se esqueça – até porque a esmagadora maioria dos decisores políticos o são – que há sempre um deles no caminho, que não hesitará em tudo fazer pela defesa dos direitos e especiais prerrogativas... da corporação".

O problema não são as pessoas em concreto... é a perversidade, consequência de um modelo intrínseca e naturalmente tirânico, um sistema em que, num jogo do "faz-de-conta" (e, para tanto, fazendo uso do Direito e dos seus instrumentos), o "homem-com-poder" se imagina "tal-qualmente" como os deuses... que tudo podem pois que possuidores de uma "palavra" com poder criador.

Acho quem nem Hobbes imaginaria tanto!


Perguntem-se e reflictam sobre a resposta: de quem é a responsabilidade pela apresentação das propostas que são incluídas nos orçamentos públicos e a quem cabem as decisões que, aquando da execução, resultam ou no ficar aquém ou no ir-se para além do orçamentado, gastando, gastando até para lá do limite?!?
Quando o Estado atinge tal dimensão, deixa de ser um "todos nós" e passa a definir-se a si próprio e a "mandar a conta" para a comunidade que diz servir. E o Estado social tem, hoje, exactamente a mesma natureza e efeitos que o modelo tirânico que foi combatido pelo Liberalismo oitocentista à maneira anglo-americana...
Há que inverter este caminho e ter um Estado que sustente a Liberdade no que ela de materialmente tem de essencial.
Porque seria menor o peso da austeridade!
Porque haveria muito mais responsabilidade!!
E por uma questão de Liberdade!!!

(Muito) menos Estado, apenas com a capacidade adequada para aquilo que deve fazer.
Melhor Estado, para que possua a dimensão ajustada para que seja difícil a desresponsabilização.

(Muito) menos Estado, para que este não esteja onde ele é desleal e ineficaz competidor, um desacelerador da dinâmica da comunidade.
Melhor Estado, para que, com força e autoridade, não falte onde só ele deve estar.


Enquanto alguns continuarem a pensar – e a publicamente afirmar! – que a "culpa" é exclusiva dos comandos políticos eleitos... o que verdadeiramente fazemos é debilitar os da política e os seus agentes, os únicos (órgãos ou cargos... não as pessoas) que poderiam enfrentar o tal monstro, o tal incontrolado e voraz "Leviatã".

Continuem nas absurdas "demandas demagógicas" e depois queixem-se...


* Professor Auxiliar (convidado) da Universidade Lusófona
[email protected]

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