DAS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: UMA LUTA DE SÉCULOS

June 15, 2017 | Autor: A. Del Castillo Jucá | Categoria: Direito, Pessoas Com Deficiência
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BRASIL, Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Brasília, DF, n. 127, 7 de julho de 2015. Secção I, p. 1677-7042


DAS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: UMA LUTA DE SÉCULOS


ANA CAROLINA DEL CASTILLO JUCÁ


1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como intuito demonstrar ao longo da história a abordagem da pessoa com deficiência e a luta por seus direitos que foram violados desde a antiguidade clássica até o século XXI, bem como fazer um direito comparado com Direito Romano o qual influenciou o Direito Civil brasileiro em diversos aspectos. E por fim, apresentar e analisar as principais mudanças trazidas pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência Lei 13145/2015 no âmbito do Código Civil de 2002 além de descrever a importância da inclusão social proporcionada pelo texto legal do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

2 CONTEXTO HISTÓRICO

2.1 ANTIGUIDADE
Desde o mundo primitivo até os dias atuais, a existência de pessoas com "anomalias físicas ou mentais, deformações congênitas, amputações traumáticas, doenças graves e de consequências incapacitantes, sejam elas de natureza transitória ou permanente, são tão antigas quanto a própria humanidade" segundo OTTO MARQUES SILVA, ou seja, sempre existiu pessoas que nasceram com alguma limitação ou durante a vida deixaram de andar, ouvir ou enxergar dentre outros. Durante muitos séculos, a existência e a luta para serem reconhecidas no âmbito do direito destas pessoas foi ignorada por um sentimento de menosprezo e discriminação nas mais diversas sociedades e culturas; mas elas, de uma forma ou de outra, sobreviveram a todos esses preconceitos
No Egito, há vários indícios de que a quantidade altíssima de pessoas com doenças oftalmológicas como catarata e conjuntivite fato confirmado após a descoberta do documento "Pairo de Ebers" datado em 1500 a.C na qual encontram-se fórmulas e tratamentos para diversos males, incluindo doenças oftalmológicas. (FINGER, 1994). Além disso, outra deficiência encontrada no povo Egípcio era o nanismo, documentado a partir de análise de esqueletos e registros deixados pelos egípcios. (LOPES et al, 2008). Nesse sentindo, existia um documento "Instruções de Amenemope" à época tido como código de conduta moral egípcio determinando que os anões e deficientes em geral fossem respeitados sendo isto como um dever moral. (KOZMA, 2006)
Durante a Grécia Antiga, as pessoas com deficiência recebiam dois tipos de tratamento: a eliminação breve de um lado e proteção assistencialista de outro. Em Esparta, preconizava a perfeição estética corporal e a deficiência era visto que como uma monstruosidade além de um forte militarismo em que, toda criança nascida, em Atenas, era levada ao Conselho de Espartanos na qual o bebê passava por análise caso não aparentasse ser forte e saudável e possuía algum "defeito" indicasse algum tipo de limitação física então eram lançados ao mar ou em precipícios com a justificativa que "pois tinham a opinião de que não era bom nem para a criança nem para a república que ela vivesse, visto que, desde o nascimento, não se mostrava bem constituída para ser forte, sã e rija durante toda a vida" (SILVA, 1987, p.105). Entretanto, a execução breve era regra geral e como toda regra possuí a sua exceção, segundo Silva (1987) existia uma alternativa ao poder patriarcal: deixar as crianças nas margens dos rios ou locais sagrados, onde eventualmente pudessem ser acolhidas por famílias da plebe (escravos ou pessoas empobrecidas).
Diferentemente em Atenas, com influência de Aristóteles de "tratar os igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, medida de sua desigualdade" com essa premissa jurídica aceita mundialmente, os portadores de deficiência eram acobertados.
O direito Romano não reconhecia a vitalidade de bebês nascidos precocemente ou com características "defeituosas". Entretanto, o costume não se voltava, necessariamente, para a execução sumária da criança (embora isso também ocorresse). De acordo com o poder paterno vigente entre as famílias nobres romanas, havia uma alternativa para os pais: deixar as crianças nas margens dos rios ou locais sagrados, onde eventualmente pudessem ser acolhidas por famílias da plebe (escravos ou pessoas empobrecidas).
A utilização comercial de pessoas com deficiência para fins de prostituição ou entretenimento das pessoas ricas manifesta-se, talvez pela primeira vez, na Roma Antiga. Segundo o Silva (1987): "cegos, surdos, deficientes mentais, deficientes físicos e outros tipos de pessoas nascidos com má formação eram também, de quando em quando, ligados a casas comerciais, tavernas e bordéis; bem como a atividades dos circos romanos, para serviços simples e às vezes humilhantes" (SILVA, 1987, p. 130). Tragicamente, esta prática repetiu-se várias vezes na história, não só em Roma.

2.2 IDADE MEDIEVAL
O período que tange os séculos V e XV, as incapacidades e deficiências tanto físicas como mentais eram consideradas ira divina taxado como "castigo de Deus". Segundo SILVA, a própria Igreja Católica adotava comportamentos discriminatórios e de perseguição, substituindo a caridade pela rejeição àqueles que fugiam de um "padrão de normalidade", seja pelo aspecto físico ou por defenderem crenças alternativas, em particular no período da Inquisição nos séculos XI e XII. Hanseníase, peste bubônica, difteria e outros males, muitas vezes incapacitantes, disseminaram-se pela Europa Medieval. Muitas pessoas que conseguiram sobreviver, mas com sérias sequelas, passaram o resto dos seus dias em situações de extrema privação e quase que na absoluta marginalidade.
No final do século XV, a questão das pessoas com deficiência estava completamente integrada ao contexto de pobreza e marginalidade em que se encontrava grande parte da população, não só os deficientes. É claro que exemplos de caridade e solidariedade para com eles também existiram durante a Idade Média, mas as referências gerais desta época situam pessoas com deformidades físicas, sensoriais ou mentais na camada de excluídos, pobres, enfermos ou mendigos. (SILVA, 1987)

2.3 SÉCULOS XV–XVII
O período conhecido como "Renascimento" não resolveu, naturalmente, esta situação de maneira satisfatória. Mas, sem dúvida, ele marca uma fase mais esclarecida da humanidade e das sociedades em geral, com o advento de direitos reconhecidos como universais, a partir de uma filosofia humanista e com o avanço da ciência.
Entre os séculos XV e XVII, no mundo europeu cristão, ocorreu uma paulatina e inquestionável mudança sociocultural, cujas marcas principais foram o reconhecimento do valor humano, o avanço da ciência e a libertação quanto a dogmas e crendices típicas da Idade Média. De certa forma, o homem deixou de ser um escravo dos "poderes naturais" ou da ira divina. Esse novo modo de pensar, revolucionário sob muitos aspectos, "alteraria a vida do homem menos privilegiado também, ou seja, a imensa legião de pobres, dos enfermos, enfim, dos marginalizados. E dentre eles, sempre e sem sombra de dúvidas, os portadores de problemas físicos, sensoriais ou mentais" (SILVA, 1987, p. 226).
A partir desse momento, fortalece-se a ideia de que o grupo de pessoas com deficiência deveria ter uma atenção própria, não sendo relegado apenas à condição de uma parte integrante da massa de pobres ou marginalizados. Isso se efetivou através de vários exemplos práticos e concretos. No século XVI, foram dados passos decisivos na melhoria do atendimento às pessoas portadoras de deficiência auditiva que, até então, via de regra, eram consideradas como "ineducáveis", quando não possuídas por maus espíritos.
Ao longo dos séculos XVI e XVII, em diferentes países europeus, foram sendo construídos locais de atendimento específico para pessoas com deficiência, fora dos tradicionais abrigos ou asilos para pobres e velhos. A despeito das malformações físicas ou limitações sensoriais, essas pessoas, de maneira esporádica e ainda tímida, começaram a ser valorizadas enquanto seres humanos. Entretanto, além de outras práticas discriminatórias, mantinha-se o bloqueio ao sacerdócio desses indivíduos pela Igreja Católica.

2.4 SÉCULO XIX
Chegando ao século XIX, os EUA tratam do tema da deficiência de modo pertinente, pois foram tomadas providências para garantir moradia e alimentação a marinheiros ou fuzileiros navais que viessem a adquirir limitações físicas. Assim, desde cedo, estabeleceu-se uma atenção específica para pessoas com deficiência nos EUA, em especial para os "veteranos" de guerras ou outros conflitos militares. Depois da Guerra Civil norte-americana, foi construído, na Filadélfia, em 1867, o Lar Nacional para Soldados Voluntários Deficientes, que posteriormente teria outras unidades.
Contextualizando no Brasil, nesse século tiveram início as primeiras ações para atender as pessoas com deficiência, quando o País dava seus primeiros passos após a independência, forjava sua condição de Nação e esboçava as linhas de sua identidade cultural. O contexto do Império (1822-1889), marcado pela sociedade aristocrática, elitista, rural, escravocrata e com limitada participação política, era pouco propício à assimilação das diferenças, principalmente as das pessoas com deficiência. O Decreto n° 82, de 18 de julho de 1841, determinou a fundação do primeiro hospital "destinado privativamente para o tratamento de alienados", o Hospício Dom Pedro II, vinculado á Santa Casa de Misericórdia, instalado no Rio de janeiro. O estabelecimento começou a funcionar efetivamente em 9 de dezembro de 1852. Em 1854, foi fundado o Imperial Instituto dos Meninos Cegos e, em 1856, o Imperial Instituto dos Surdos-Mudos. Durante o século XIX, apenas os cegos e os surdos eram contemplados com ações para a educação. É importante destacar que a oferta de atendimento concentrava- se na capital do Império.

2.5 SÉCULO XX
A assistência e a qualidade do tratamento dado não só para pessoas com deficiência como para população em geral tiveram um substancial avanço ao longo do século XX. No caso das pessoas com deficiência, o contato direto com elevados contingentes de indivíduos com sequelas de guerra exigiu uma gama variada de medidas. A atenção às crianças com deficiência também aumentou, com o desenvolvimento de especialidades e programas de reabilitação específicos.
No período entre Guerras é característica comum nos países europeus – Grã-Bretanha e França, principalmente, e também nos EUA – o desenvolvimento de programas, centros de treinamento e assistência para veteranos de guerra. Na Inglaterra, por exemplo, já em 1919, foi criada a Comissão Central da Grã-Bretanha para o Cuidado do Deficiente. Depois da II Guerra, esse movimento se intensificou no bojo das mudanças promovidas nas políticas públicas pelo Welfare State. Dado o elevado contingente de amputados, cegos e outras deficiências físicas e mentais, o tema ganha relevância política no interior dos países e também internacionalmente, no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU). A "epopéia" das pessoas com deficiência passaria a ser objeto do debate público e ações políticas, assim como outras questões de relevância social, embora em ritmos distintos de um país para o outro.
Enquanto que no Brasil, na primeira metade do século XX, o Estado não promoveu novas ações para as pessoas com deficiência e apenas expandiu, de forma modesta e lenta, os institutos de cegos e surdos para outras cidades. As poucas iniciativas, além de não terem a necessária distribuição espacial pelo território nacional e atenderem uma minoria, restringiam-se apenas aos cegos e surdos. Diante desse déficit de ações concretas do Estado, a sociedade civil criou organizações voltadas para a assistência nas áreas de educação e saúde, como as Sociedades Pestalozzi (1932) e as Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) (1954). Ainda na década de 50, o surto de poliomielite levou à criação dos centros de reabilitação física, segundo LANNA JUNIOR (2010)
A partir de meados do século XX, é possível observar o surgimento de organizações criadas e geridas pelas próprias pessoas com deficiência. A motivação inicial é a solidariedade entre pares nos seguintes grupos de deficiência: cegos, surdos e deficientes físicos que, mesmo antes da década de 1970, já estavam reunidos em organizações locais – com abrangência que raramente ultrapassava o bairro ou o município–, em geral, sem sede própria, estatuto ou qualquer outro elemento formal. Eram iniciativas que visavam ao auxílio mútuo e à sobrevivência, sem objetivo político prioritariamente definido. Essas organizações, no entanto, constituíram o embrião das iniciativas de cunho político que surgiriam no Brasil, sobretudo durante a década de 1970. (LANNA JÚNIOR, 2010, p. 28)
Durante esse período, é possível visualizar uma tendência de humanização desse grupo populacional. É verdade que, até nos dias de hoje, existem exemplos de discriminação e/ou maus-tratos, mas o amadurecimento das civilizações e o avanço dos temas ligados à cidadania e aos direitos humanos provocaram, sem dúvida, um novo olhar em relação às pessoas com deficiência.
O associativismo, antes restritas à caridade e a políticas de assistência, em direção às conquistas no universo da política e da luta por seus direitos. Esse processo de associações criou o ambiente para a formalização da consciência que resultaria no movimento político das pessoas com deficiência na década de 1970. Nessa época, surgiram as primeiras organizações compostas e dirigidas por pessoas com deficiência contrapondo-se às associações que prestavam serviços a este público. Esta dicotomia, que mais adiante será abordada neste capítulo, permanece como modelo até os dias atuais. As primeiras organizações associativistas de pessoas com deficiência não tinham sede própria, estatuto ou qualquer outro elemento formal. Eram iniciativas que visavam o auxílio mútuo e não possuíam objetivo político definido, mas criaram espaços de convivência entre os pares, onde as dificuldades comuns poderiam ser reconhecidas e debatidas. Essa aproximação desencadeou um processo da ação política em prol de seus direitos humanos. No final dos anos 1970, o movimento ganhou visibilidade, e, a partir daí as pessoas com deficiência tornaram-se ativos agentes políticos na busca por transformação da sociedade. O desejo de serem protagonistas políticos motivou uma mobilização nacional. Essa história alimentou-se da conjuntura da época: o regime militar, o processo de redemocratização brasileira e a promulgação, pela ONU, em 1981, do Ano Internacional das Pessoas Deficientes (AIPD). (LANNA JÚNIOR, 2010, pag. 33)
A ditadura militar no Brasil teve início em 1964 e terminou em 1985, com a eleição, ainda que indireta, de Tancredo Neves, o 1º presidente civil após 21 anos de autoritarismo. Durante os chamados "anos de chumbo", o exercício da cidadania foi limitado em todas as suas dimensões: direitos civis e políticos eram cerceados e os direitos sociais, embora existissem legalmente, não eram desfrutados. Prevalecia a censura e a falta de liberdade.
Com o processo de enfraquecimento e declínio do regime militar, a partir de meados da década de 1970, iniciou-se um processo de abertura política "lenta, gradual e segura". A redemocratização desenrolou-se em contexto especialmente fértil, em termos de demandas sociais, com uma participação política ampla. Esse período foi marcado pela ativa participação da sociedade civil, que resultou no fortalecimento dos sindicatos, na reorganização de movimentos sociais e na emergência das demandas populares em geral. Era o Brasil, novamente, rumo à democracia. (LANNA JÚNIOR, 2010, p. 29)
Os movimentos sociais, antes silenciados pelo autoritarismo, ressurgiram como forças políticas. Vários setores da sociedade gritaram com sede e com fome de participação: negros, mulheres, índios, trabalhadores, sem-teto, sem-terra e, também, as pessoas com deficiência. (LANNA JÚNIOR, 2010, p. 34)
Esse processo se reflete na Constituição Federal promulgada em 1988. A Assembleia Nacional Constituinte (1987-1988), envolvida no espírito dos novos movimentos sociais, foi a mais democrática da história do Brasil, com canais abertos e legítimos de participação popular.
Os novos movimentos sociais, dentre os quais o movimento político das pessoas com deficiência, saíram do anonimato e, na esteira da abertura política, uniram esforços, formaram novas organizações, articularam-se nacionalmente, criaram 35 estratégias de luta para reivindicar igualdade de oportunidades e garantias de direitos.
Outro fator relevante foi a decisão da ONU de proclamar 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes (AIPD), sob o tema "Participação Plena e Igualdade". O advento do AIPD colocou as pessoas com deficiência no centro das discussões, no mundo e também no Brasil.
Tanto o AIPD quanto o processo de redemocratização atuaram como catalisadores do movimento que, no primeiro momento, procurou construir e consolidar sua unidade. A criação da Coalizão Pró-Federação Nacional foi a materialização do esforço unificador, consubstanciado por três encontros nacionais, realizados entre 1980 e 1983, buscando elaborar uma agenda única de reivindicações e estratégias de luta, bem como fundar a Federação Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes. O amadurecimento das discussões resultou em um rearranjo político no qual a federação única foi substituída por federações nacionais por tipo de deficiência. (LANNA JÚNIOR, 2010, p.35)

2.6 SÉCULO XXI
A entrada no século XXI já traz como marcas importantes iniciativas para a promoção e a defesa dos Direitos Humanos no Brasil e, de maneira especial, dos direitos das pessoas com deficiência. Os desafios ainda são muitos, mas são inequívocas e inúmeras as conquistas. O Ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, em entrevista alusiva ao Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência sintetizou: "os avanços na área das pessoas com deficiência são visíveis, em termos orçamentários, institucionais, de participação social, no marco legal e de integração entre os ministérios." O Decreto da Acessibilidade, a Lei do Cão Guia e a ratificação da Convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência são os destaques no marco legal. (LANNA JUNIOR, 2010, p.83)
O início do século XXI, no entanto, consagra o discurso dos Direitos Humanos, que considera as diferenças, mas vai além das questões específicas. Pessoas com deficiência são sujeitos de direitos – cidadãos e cidadãs. Do modelo médico passamos ao campo dos Direitos Humanos, políticos, civis, econômicos, sociais, culturais e ambientais, na construção de uma sociedade para todos. O foco das discussões é o modo como - e para quem – a sociedade organiza o cotidiano, as cidades, os bens e serviços disponíveis de educação, cultura, trabalho, saúde, proteção social, habitação, transporte, lazer, esporte, turismo e outros aspectos da vida comunitária. "Iguais na diferença" é a proposta. (LANNA JÚNIOR, 2010, p. 107). Novas conquistas e antigas questões foram colocadas em cena. Entre as conquistas estão o processo de elaboração da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, da ONU.(LANNA JUNIOR, 2010, p. 87)
A Convenção da ONU sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência A ONU procurou dar continuidade à visibilidade conseguida com o Ano Internacional da Pessoa com Deficiência (AIPD), com a promulgação da Carta dos Anos Oitenta. Especialistas reuniram-se na Suécia, em agosto de 1987, para analisar a aplicação do Programa de Ação Mundial e recomendaram o desenvolvimento de uma convenção internacional para a eliminação da discriminação contra as pessoas com deficiência. Itália e Suécia lideraram essa iniciativa, que não foi levada adiante. (LANNA JUNIOR, 2010, p. 89)

3. DIREITO COMPARADO: DIREITO ROMANO x CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO

A relevância da abordagem do Direito Romano para esse trabalho diz à respeito de conhecer, historicamente, séculos de história do Direito, de evolução, de moral, de ética e de valor, pois já afirmava RUDOLF VON ILHERING que "a influência do Direito Romano é tão profunda e rejuvenescedora como a influência do Cristianismo".
Segundo SAN TIAGO DANTAS:
A cultura jurídica de um país não atinge a sua plenitude, senão quando de fase puramente exegética à construção dogmática do direito positivo. (...)
Nenhum povo, nenhuma época, logrou passar do simples comentário das leis à construção conceitual do sistema de direito positivo, sem ir buscar no Direito Romano, não só o paradigma de muitas dessas construções, como o pleno conhecimento e domínio do método, com que se chega a teorizá-la. É sabido que a dogmática do direito civil moderno, cujo fruto mais completo veio a ser o Código Civil Alemão de 1897, nasceu toda ela da grande renovação dos estudos romanísticos, empreendida pelos pandectistas do século XIX, visando ao direito comum. É sabido, igualmente, que a Itália, cujo a cultura jurídica Savigny em 1828, aflorou ao primeiro plano entre as nações cultas, no fim do século XIX, e no principio do atual, partindo de um movimento de renovação. Dos estudos romanísticos, cujos iniciadores foram Filippo Serafini e Ilário Alibrandi.
Dir-se-ia que o Direito Romano, depurado pelo volver dos séculos de todo conteúdo circunstancial, oferece à mente do jurista o fruto extremo da lógica jurídica, o que lhe valeu ser chamado tantas vezes 'razão crítica'. E ao mesmo tempo, pelo estudo da evolução de cada instituto dentro de um período histórico, de que conhecemos o fim e o começo, ele nos permite penetrar nas próprias leis da evolução jurídica, conhecer o jogo reciproco, a interação da norma jurídica e da realidade social

3.1. DIREITO DAS PESSOAS – JUS PERSONARUM
a) Conceito da pessoa:
Nos ensinamentos do Professor Nello Andreotti Neto, o conceito de pessoa no Direito Romano "Et Prius de personis videamos. Nam parum est just nosse, si personae, quarum causa constitutum est, ignorentur", ou seja, a pessoa é titular de direitos e obrigações na ordem jurídica. Em comparação ao Direito Civil de 1916, "todo o homem" como natureza humana, a pessoa física. Entretanto, há uma determinada distinção entre sujeito de direito e de obrigações jurídicas no Direito Romano, pois "persona" refere-se ao livre como o escravo, contudo o escravo ("persona servi") não era sujeito de direito, mas objeto de direito ("res).
Somado a isso, utilizavam o termo "caput" que significava "cabeça", palavra o tanto comum de tratamento aos homens livres e escravos. Existe também, a expressão "servile caput nullum ius habet", o escravo não tinha direitos até que Justiniano, caput passou a significar capacidade jurídica.
A capacidade jurídica no Direito Romano dependia do "status", da posição que cada um ocupava na sociedade romana: "Status personae", "Status civitatis", "Status familia" e "Status Libertatis". Houve o reconhecimento da divisão das pessoas, ou sujeitos de direitos e obrigações sob dois pontos distintos. A pessoa fisíca, chamada também de "homo" com um determinado "status" que lhe dava a capacidade de direitos e obrigações. Posteriormente, com Justiniano considerou "homo" para pessoa e "res" para coisa sem direitos. A divisão então classificou as pessoas como livres, semi-livres, escravos, ingênuos libertos, libertinos, "in mancipio" e colonos. (NETO, 1973, pág. 49-50)

b) Status Personae, Status Libertatis, Status Civitatis e Status Familiae
No Status Personae, a personalidade jurídica no Direito Romano começava com o nascimento perfeito, não podendo ser o nascido monstro ou produto de um aborto. Precisava, então nascer com vida, possuir forma humana e ter condições de sobrevivência, o nascimento precisava gerar consequências jurídicas. Com tais critérios preestabelecidos, o nascido era capaz de direitos e obrigações , o que ia nascer, também denominado nascituro.
O código civil de 1916 não compreende que haja nascido um "monstro" ou produto de aborto, ficava estipulado que a personalidade civil do homem começa do nascimento da vida, deixando a salvo desde a concepção os direitos daquele que ainda ia nascer: nascituro (influência do Direito Romano). (NETO, 1973, pág. 50)
Enquanto que no Status Libertatis, o maior bem que o romano possuía e prezava era a liberdade, como posição contrária à escravidão. Então no que tange a capacidade de direito, a escravidão tinha por iniciava com o nascimento de filha de escrava não válido a posição do pai. Além por meio do nascimento, chegava a essa situação por meio de prisioneiros de guerra, o soldado "desertor", a insolvência, a prisão em flagrante, a mulher livre matendo relações com escravos alheio, o liberto por ingratidão ao seu patrono.
É notório que a capacidade direito era dependente, o homem era livre ou ingênuo (livres desde o nascimento), liberto, escravo alforriado ou semi-livre. (NETO, 1973, pág. 52)
Já no Status Civitatis, a situação da pessoa em Roma podia ser: cidadão ("cives"), latinos ("latini) e peregrinos ("peregrini"). Os cidadãos possuíam capacidade plena, entretanto os demais possuíam sua capacidade reduzida

c) Tutela e Curatela:
Tutela e Curatela são institutos que tutelam os direitos dos incapazes no Direito Romano, existindo um tutor ou curador na representação dos incapazes, ser incapaz são as pessoas que não podiam exercer por si só a defesa de seus direitos.
A tutela significa proteção, guarda. Era uma forma de proteção à determinada pessoas no que diz a respeito a relações jurídicas, proteção esta aos bens dos impúberes. Os Tutelados eram as mulheres "púberes ou impúberes", em tutela perpetua e os homens "impúberes" Os tutores tinham poderes, mas também obrigações, o tutelado estava sob o poder do tutor. O tutor dispunha dos bens e da pessoa do tutelado a guardar os interesses do tutelado. (NETO, 1973, p. 57).Já a instituição curatela tem o mesmo significado que é cuidar, zelar, é a proteção dos bens das pessoas loucas, pródigas e menores de 25 anos.
Somente os homens poderiam ser tutores ou curadores. Ao assumirem o cargo, segundo determinadas formulas e solenidades, eram obrigados a pronunciar determinadas palavras, como um julgamento, logo, o curador ou tutor não poderia ser mudo ou surdo, militar, monge, menor de 25 anos e nem bispo. (NETO, 1973, p. 59)
No código civil brasileiro, a curatela é o instituo jurídico de representação para maiores de 18 anos, que por deficiência mental, não tiveram o necessário discernimento para os atos da vida civil ou que, por outra causa duradoura, não puderam exprimir sua vontade. São os deficientes mentais, os excepcionais sem completo desenvolvimento mental, os viciados em tóxicos, os ébrios habituais e os pródigos.
Desta forma, é por meio do processo de interdição que visa salvaguardar a pessoa e os bens das pessoas que se encontrem em tais situações. De maneira clara, o Código lista as pessoas que possuem legitimidade para promover a interdição, que é a ação necessária para a concretização da curatela. De igual forma, o CC traz também aquelas pessoas que preferencialmente podem se tornar curadoras do incapaz. (GALDINO, 2014). Enquanto o conceito de tutela se refere ao encargo ou múnus público de caráter assistencial que recai sobre pessoa capaz (tutor) para cuidar de um menor (tutelado ou pupilo) e administrar seu patrimônio em caso de falecimento e/ou ausência de seus pais ou em caso de perda do poder familiar (art. 1.728/CC02) (GALDINO, 2014)

4 ALTERAÇÕES DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 A LUZ DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFIÊNCIA

Elaborada ao longo de 4 anos, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – 2007 contou com a participação de 192 países membros da ONU e de centenas de representantes da sociedade civil de todo o mundo. Em 13 de dezembro de 2006, em sessão solene da ONU, foi aprovado o texto final deste tratado internacional, firmado pelo Brasil e por mais 85 nações, em 30 de março de 2007, cuja finalidade é proteger os direitos e a dignidade das pessoas com deficiência. As Partes da Convenção são obrigadas a promover, proteger e assegurar o exercício pleno dos direitos humanos das pessoas com deficiência e assegurar que gozem de plena igualdade perante a lei. Esse texto da convenção foi aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 13 de dezembro de 2006 e promulgado pelo Brasil em 25 de agosto de 2009.
Esse instrumento influenciou o Brasil a aprovar o projeto de lei de que tramitava no Congresso Federal durante 15 anos, a exemplos anteriores estão a Lei 7.853, de 1989, que caracterizou como crime a discriminação de pessoa com deficiência no trabalho, a Lei 8.213, de 1991, chamada de Lei de Cotas, que criou metas obrigatórias de contratação para empresas com 100 ou mais funcionários e como o próprio texto da Lei prevê (artigo 1º, parágrafo único), o Estatuto é baseado na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional no ano de 2008, aprovados com força de emenda constitucional, e promulgados em agosto de 2009. Esses documentos foram agregados às normas brasileiras, com equivalência de emenda constitucional, pois obtiveram aprovação de mais de três quintos dos deputados e dos senadores, em duas votações.

4.1 Das principais alterações
Incapacidade
O novo Estatuto revoga os incisos do artigo 3º do CC, deixam de ser absolutamente incapazes os "que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática" dos atos da vida civil e de ser relativamente incapaz "os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo". Então, apenas os menores de 16 anos são incapazes de exercer os atos civis. No artigo 4º do CC, incisos II: "os ébrios habituais e os viciados em tóxico" e III: "aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade".
A incapacidade, por sua vez, é categoria jurídica, estado civil aplicável a determinados sujeitos por conta de questões relativas ao seu status pessoal. Pode decorrer tanto da simples inexperiência de vida, como por conta de circunstâncias outras, tais como o vício em drogas de qualquer natureza. Dentre estas circunstâncias, desde o surgimento do Estatuto, encontrava-se o transtorno mental, sob as mais diversas denominações (enfermidade ou deficiência mental, excepcionais sem desenvolvimento mental completo). Independe a incapacidade de decretação judicial. Enquadrando-se o sujeito numa das hipóteses previstas no suporte fático normativo, é ele incapaz e, portanto, ao menos de algum modo limitado na prática dos seus atos. (REQUIÃO, 2015, online).
Diante disto, o fato de um sujeito possuir algum transtorno mental de qualquer natureza não faz com que ele se insira no rol dos incapazes. É notório uma distinção do transtorno e da necessária incapacidade. Isto é um passo importante na busca pela promoção da igualdade dos sujeitos portadores de transtorno mental. Além disso, não implica, portanto, que o portador de transtorno mental não possa vir a ter sua capacidade limitada para a prática de certos atos. Mantém-se a possibilidade de que ele seja submetido a curatela. (REQUIÃO, 2015, online).
Para exemplificar, no artigo 228º do CC, revogou-se os incisos II e III, o qual não poderia testemunhar os que por enfermidade não possuir discernimento para praticar os atos da vida civil e os cegos e surdos. Acrescentou o §2º, que o Estatuto previa, em que a pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas sendo-lhe assegurado todos os recursos tecnológicos assistido.

b) Curatela dos capazes
O Estatuto inova no Capitulo II tratando do reconhecimento igual perante a lei, partindo do artigo 84, da qual é notório que a pessoa com deficiência tem o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas e apenas quando necessário ela será submetida à curatela constituída de medida extraordinário durando o menor tempo possível, além disso afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial. Fica claro a partir desse dispositivo que mesmo com curatela, não temos uma pessoa incapaz, ela possui capacidade legal ainda que esteja com institutos assistencialistas. Portanto, é notório uma nova categoria de pessoas: os capazes sob curatela.
No código civil 2002, o curador representa os absolutamente incapazes e assiste os relativamente incapazes. O Estatuto não deixa claro se o curador vai representar ou assisti-lo, pois no artigo 85, §2º: "... deve constar da sentença as razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado.". Partindo da leitura desse dispositivo, cabe ao juiz definir se o curador do deficiente, que é capaz, deverá representa-lo ou assisti-lo. Entretanto, a curatela só caberá em questões patrimoniais.
 Sendo o deficiente, o enfermo ou excepcional pessoa plenamente capaz, poderá celebrar negócios jurídicos sem qualquer restrição, pois não se aplicam as invalidades previstas nos artigos 166, I e 171, I do CC. Isso significa que hoje, se alguém com deficiência leve, mas com déficit cognitivo, e considerado relativamente incapaz por sentença, assinar um contrato que lhe é desvantajoso esse contrato é anulável, pois não foi o incapaz assistido. Com a vigência do Estatuto esse contrato passa a ser, em tese, válido, pois celebrado por pessoa capaz. Para sua anulação, necessária será a prova dos vícios do consentimento (erro ou dolo) o que por exigirá prova de maior complexidade e as dificuldades desta ação são enormes ou se o deficiente praticar o ato sem assistência ou representação, em tese, o ato é válido. Essa resposta nos leva a outro questionamento: a curatela tornaria então inútil e não protegeria o curatelado. Diante dessa hipótese, a vontade do deficiente capaz não será suficiente. Então, a solução para o caso seria que o negócio jurídico assinado exclusivamente por deficiente capaz sob curatela será nulo se o juiz fixar em sentença que o curador o representa (artigo 166, I, CC aplicando-se por analogia) ou anulável se fixar que o assiste (artigo 171, I, CC aplicando-se por analogia.
No caput do artigo 1768 do Código Civil, o Estatuto altera de "interdição" para "processo que define os termos da curatela" e recebe um novo inciso "pela própria pessoa", admitindo a auto-interdição. Todavia, o novo CPC (Lei 13.105/05) expressamente revoga o artigo 1768 (que é alterada pelo Estatuto) porque no artigo 747 prevê quem pode promover a interdição e não "processo que define os temos da curatela", os deficientes capazes, então, possuírem interdição, ou seja, deficientes sob curatela. Encontramos então mais um problema: o vacatio legis do Estatuto é de 180 dias a partir da publicação (6 de julho de 2015) e o vacatio do novo CPC é de 1 ano (publicado em 17 de março de 2015). Entre janeiro e março de 2016, o próprio deficiente poderá requerer a sua interdição. Houve, diante do exposto, uma falta de comunicação entre os redatores do novo código de processo civil e os redatores do Estatuto da pessoa com deficiência.
Relativas a tais mudanças, o EPD deixa clara que o artigo 1767 do CC, estão sujeitos a curatela "aqueles que por causa transitória ou permanente não puderem expressar sua vontade"; revogam-se os artigos 1776, 1780 e acrescenta os artigos 1775-A: "na nomeação de curador para a pessoa com deficiência, o juiz poderá estabelecer curatela compartilhada a mais de uma pessoa" e 1783-A: " tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas para prestar­lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo­lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade."

Da plena capacidade civil e o casamento
A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, no que tange a casar-se e constituir união estável, exercer direitos sexuais e reprodutivos, exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar, conservar sua fertilidade, direito à família e à convivência familiar e comunitária e exercer o direito á guarda, à tutela, à curatela e à adoção em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. (Art. 6), isto demonstra um avanço visto que não é toda deficiência que retira o discernimento no âmbito de decisão para construir uma família e de sua formação. Entretanto, o casamento ato de vontade, se a vontade não existir, o casamento será inexistente.
O Estatuto revoga o inciso I do artigo 1.548 do Código Civil que prevê ser nulo o casamento do "enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil". Portanto, não podem os deficientes serem alijados da formação de família por meio do casamento ou mesmo união estável.
Todavia, o Estatuto não altera o artigo 1550 do código Civil que trata da anulabilidade do casamento e em seu inciso IV prevê: "do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento", ou seja, o casamento do deficiente que for incapaz de consentir ou manifestar de modo errado o consentimento pode ser anulável, mas não nulo. Se a vontade existir, mas for turbada, maculada pela deficiência, o casamento será válido, pois desaparece a enfermidade como causa de nulidade. Com isso há o acréscimo do paragrafo 2º pela o Estatuto: "a pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressa sua sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador". Encontramos um problema de redação que JOSÉ FERNANDO SIMÃO explicita de maneira clara:
O termo correto é "idade núbil", ou seja, referente às núpcias. Novamente temos um problema na redação do parágrafo segundo acima transcrito: segundo o artigo 85 do Estatuto o curador do deficiente só atuará nos atos de natureza patrimonial e negocial, mas o parágrafo segundo que receberá o artigo 1550 do CC prevê que vontade de casar pode ser expressa pelo curador. Clara a contradição entre os dispositivos. A vontade é elemento essencial ao casamento e ninguém se casa senão por vontade própria. Admitir a vontade do curador como elemento suficiente para o casamento do deficiente é algo ilógico e contraria a pessoalidade do casamento, além de permitir fraudes perpetradas pelo casamento decorrente apenas da vontade do curador. O dispositivo deve ser interpretado restritivamente de acordo com a natureza personalíssima do casamento.

Além tudo isso, outras mudanças passiveis de ser comentadas: na seara da celebração do casamento (artigo 1518, CC) podem os pais e tutores revogar a autorização, cabendo apenas os curadores revogar o regime de casamento e não a autorização; ademais, não se torna mais nulo o casamento contraído pelo enfermo mental sem discernimento (artigo 1548, CC);

Prescrição e Decadência
Sendo o deficiente, o enfermo ou excepcional pessoa plenamente capaz, terá uma outra desvantagem em termos jurídicos: a prescrição e a decadência correrão contra ele. Atualmente, por força dos artigos 198, I e 208 do CC, a prescrição e a decadência não correm contra os absolutamente incapazes.
Isso significa que quando o absolutamente incapaz é credor não terá a desvantagem de ver suas pretensões prescritas. Assim, se um menor com 10 anos de idade é credor de aluguel, a prescrição fica impedida de correr até que ele complete 16 anos. O tempo decorrido não prejudica o absolutamente incapaz, mas apenas o favorece. Assim, se o mesmo menor for devedor, o prazo prescricional transcorre normalmente, pois isso o beneficia. Como, com o Estatuto, os deficientes e excepcionais são capazes, a prescrição correrá contra eles, prejudicando-os, portanto.

Responsabilidade civil
 Sendo o deficiente, o enfermo ou excepcional pessoa plenamente capaz, terá uma outra desvantagem em termos jurídicos: passará a responder com seus próprios bens pelos danos que causar a terceiros, afastando-se a responsabilidade subsidiária criada atualmente pelo artigo 928 do CC. Pela sistemática do Código Civil, quem responde precipuamente pelos danos causados pelos incapazes são seus representantes legais (pais, tutores e curadores). Imaginemos uma pessoa que, por problemas psicológicos, tem perda ou séria redução de discernimento e, tendo acessos de fúria, gera graves danos a terceiros. Tal pessoa, sendo interditada por força da doença será cuidada por seu curador. Se causar danos, o patrimônio do curador responderá. O incapaz só responde subsidiariamente. Com o Estatuto, a responsabilidade será exclusiva da pessoa que causou o dano.
Nessa seara da responsabilidade civil, sendo o deficiente, o enfermo ou a excepcional pessoa plenamente capaz passará a responder exclusivamente com seus próprios bens pelos danos que causar a terceiros, afastando-se a responsabilidade subsidiária criada atualmente pelo artigo 928 do Código Civil. Recorde-se, a propósito quem responde precipuamente pelos danos causados pelos incapazes são seus representantes legais (pais, tutores e curadores).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das alterações trazidas pelo novo Estatuto da Pessoa com Deficiência, garantiu-se para esse grupo uma série de garantias de direitos humanos, direitos que antes violados, passaram a ter relevância, sendo essenciais para a pessoa deficiente. Além de que o Estado Brasileiro faz juz ao que prevê a Constituição Federal de que institui maior igualdade entre os cidadãos brasileiros vedando qualquer tipo de discriminação e preconceito, previamente estabelecido pela própria lei que "toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação".
Assim, o reconhecimento de que a pessoa com deficiência é sujeito de direitos e deve ser efetivado pela ordem jurídica demonstra o avanço da democracia no país. Sendo que "Nesses tempos em que a tolerância e o respeito à diversidade sofrem restrições, barreiras, a tolerância e a convivência com o diferente é algo que deve cultivar, perseguir, algo que tem de ser um valor moral e ético para cada um de nós", disse a presidente Dilma Roussef.
A inclusão das pessoas com deficiência é termo que tem como significado a dispensa de tratamento isonômico, respeitadas as suas diferenças, se comparados com as pessoas "normais", conferindo cumprimento à salvaguarda do direito à dignidade da pessoa humana, constitucionalmente estabelecido, compreendendo diversos aspectos, tais como: sociais, econômicos, culturais, arquitetônicos, educacionais, políticos, recreativos, dentre outros; tudo isso com o fim precípuo de preservar os direitos mais íntimos destas pessoas, dada a sua íntima correlação com as manifestações da personalidade humana.
Diversos movimentos nacionais e internacionais, como visto anteriormente, têm buscado o consenso para a formatação de uma política de inclusão social, que deixou de ser caracterizada por mero assistencialismo, concentrando sua atenção à consagração do pleno exercício da cidadania pelas pessoas com deficiência.
A inclusão social se constitui processo para a construção de uma sociedade transformada, enfim é permitir a usufruirão do direito à felicidade, que envolve a personalidade humana, é algo que transcende o dever estatal, toca direito humano, portanto trata-se de preocupação universal o redimensionamento das prioridades do governo para a efetivação dos salvaguardados direitos das pessoas com deficiência, atualmente, consagrados com o Estatuto da Pessoa com Deficiência.

6 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

FINGER S. Origins of neuroscience: a history of explorations into brain function. New York: Oxford University Press, 1994. 451p.

GALDINO, Vandson dos Santos. Curatela: conceitos, características e inovações trazidas pelo Código Civil de 2002. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 mar. 2014. Disponivel em: . Acesso em: 21 nov. 2015.

KOZMA, C. Dwarfs in ancient Egypt. American journal of medical genetics. 140: 303–311, 2006.

LANNA JUNIOR, Mário Cléber Martins (Comp.). História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil. - Brasília: Secretaria de Direitos Humanos. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, 2010

LOPES, R. SILVA, MCP. CERVAN, MP. COSTA RF. Acondroplasia: revisão sobre as características da doença. Arquivos Sanny de pesquisa em saúde. 1(1): 83-89, 2008.

NETO, Nello Andreotti. 1973. DIREITO CIVIL E ROMANO, LIVRO I. Editora Rideel LTDA

SILVA, Otto Marques da. A epopeia ignorada: a pessoa deficiente na história do mundo de ontem e de hoje. São Paulo: CEDAS, 1986.

REQUIÃO, Maurício. Estatuto da Pessoa com Deficiencia altera regime civil das incapacidades. Disponível em: . Acesso em: 19 de nov. 2015.















Graduanda em Direito pelo Centro Universitário do Pará/Email: [email protected]
Iniciou suas atividades em reabilitação profissional de pessoas com deficiências em 1957, no Instituto de Reabilitação, da Universidade de São Paulo, desde então nunca parou de trabalhar e pesquisar nessa área, chegando a tornar-se funcionário técnico da Organização das Nações Unidas como oficial de Assuntos Sociais em Nova York, além de ser homenageado o Homem do Ano de 2007 na área de Reabilitação Profissional de Pessoas com Deficiência. Por isso no que tange o tópico "História" nesse presente trabalho, há inúmeras citações referentes à esse autor do livro "A Epopeia Ignorada: a Pessoa Deficiente na História do Mundo Ontem e Hoje".LA
O livro: "História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil" faz parte do Projeto OEI/BRA 08/001 – Fortalecimento da Organização do Movimento Social das Pessoas com Deficiência no Brasil e Divulgação de suas Conquistas, desse modo há uma tremenda importância, e com isso não deixando de citar Mário Cléber Martins Lanna Júnior, autor desse livro.
Ruldolf Von Ilhering importante jurista alemão, ao lado de Karl von Savigny ocupou um lugar de extrema importância na Alemanha e em seu livro "Der Geist des römischen Rechts auf den verschiedenen Stufen seiner Entwicklung" ou em tradução livre: "O espírito da lei romana durante as várias fases do seu desenvolvimento", revelou o direito no costume e posteriormente consagrado na lei escrita, influenciando o Direito Privado larga escala nos países europeus.
Francisco Clementino de San Tiago Dantas foi importante jurista, professor e politico, durante sua formação acadêmica assumindo cátedra de Direito Civil na Faculdade Nacional de Direito 1940 teve suas aulas taquigrafadas por seu estudante tornando-se referência no estudo de direito civil brasileiro, além de ser catedrático de Direito Romano da Faculdade Pontifícia Universidade Católica, desde a sua criação. Escreveu a citação no prefácio do livro Instituições de Direito Romano de Ebert Chamoun em 1951, demonstrando a importância do Direito Romano que bem salientado que a dogmática do direito civil, cujo fruto mais completo veio a ser o Código Civil alemão de 1897, nasceu da grande renovação dos estudos romanísticos, que foi realizado pelos pandectistas do século XIX.
O presente trabalho referente ao tópico "Direito Comparado: Direito Romano x Código Civil de 1916 possui embasamento teórico nesse renomado mestre Nello Andreotti Neto, autor do livro Direito Romano e Civil (1973)
Em tradução livre: "E o caso das pessoas, vamos ver. Pois não é apenas para saber que, se as pessoas são, uma das quais foi estabelecida para o efeito, são desconhecidos"
A pessoa que não possui idade suficiente para contratar casamento é considerada impúbere, a idade para puberdade é 14 anos. (NETO, 1973)
Segundo a Lei Pletória, o menor de 25 anos era considerado incapaz no Direito Romano. (NETO, 1973)
SIMÃO, José Fernando; Estatuto da Pessoa com Deficiência causa perplexidade (Parte I). Disponível em: . Acesso em: 19 de nov. 2015

Discurso proferido quando sancionou o Estatuto da Pessoa com Deficiência em julho de 2015.

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