De Alcobaça a Braga: percursos e mistérios de um manuscrito

PhiloBiblon adicionou 3 fotos novas. 30/9 às 10:00 ·

"De Alcobaça a Braga: percursos e mistérios de um manuscrito" Autor: Filipe Moreira Um halo de mistério parece envolver as Crónicas Abreviadas dos Reis de Portugal redigidas por Cristóvão Rodrigues Acenheiro (14741538), bacharel e procurador eborense [BITAGAP texid 10802]. Devido ao facto de terem sido editadas no século XIX pela Academia Real das Ciências [BITAGAP bibid 12392], estas crónicas são bem conhecidas por historiadores e filólogos. Todos eles limitam-se, porém, a utilizar o texto da edição da Academia. A razão é simples: até há poucos anos, desconhecia-se qualquer testemunho manuscrito. A edição da Academia (cujos responsáveis ignoramos) serviu-se de duas cópias. Uma delas foi escolhida como texto base; da outra, então pertencente à Biblioteca das Necessidades, retiraramse as variantes que aparecem em rodapé. Estas parcas informações constituem tudo quanto os responsáveis editoriais afirmaram acerca das cópias por eles usadas. E ao longo do século XX, o estado de conhecimentos não se alterou. Investigações desenvolvidas pela equipa da BITAGAP (em particular por Filipe Alves Moreira) ao longo dos últimos cinco anos mudaram decisivamente o estado da questão, trazendo muitos dados novos acerca da transmissão textual da obra de Acenheiro. Foram localizados nada menos que quatro testemunhos manuscritos, dos séculos XVI-XVIII, um deles desmembrado em duas partes [BITAGAP manids 4422, 3956, 1945, 5899 e 4371]. A origem de uma destas cópias [BITAGAP manid 4422], e a ponderação das suas variantes, permitiu identifica-la com o «Códice das Necessidades» cujas lições são registadas no rodapé da edição oitocentista. Mas o manuscrito que forneceu o texto base dessa edição permanecia desconhecido. Uma nota exarada num exemplar do Index Codicum Bibliothecae Alcobatiae (1775) em uso no próprio mosteiro e oportunamente dada a conhecer por Aires Nascimento (BITAGAP bibid 1139) permitiu avançar a hipótese de que os responsáveis pela edição da Academia se serviram do COD. 466 do Mosteiro de Alcobaça, o qual não regressou à livraria de mão do mosteiro. Pois bem, este Codex 466 de Alcobaça foi muito recentemente localizado…em Braga. Trata-se, muito provavelmente, do manuscrito (da Coleção dos Manuscritos) do Arquivo Distrital da capital do Minho com a cota MSS. 674, que contém uma cópia quinhentista, escrita por duas mãos, das Crónicas de Acenheiro [BITAGAP manid 4414]. As

razões para identificarmos este último manuscrito com o Codex 466 de Alcobaça são as seguintes: i) a folha de rosto do manuscrito de Braga ostenta um número que aparenta ser uma antiga cota e é, precisamente, o 466; ii) em pelo menos dois locais deste manuscrito de Braga, é visível uma assinatura...fr. Benedito de s. Bernardo, efetivamente o nome de um dos bibliotecários do mosteiro de Alcobaça; iii) a folha de guarda do manuscrito é, em tudo, semelhante às folhas de guarda apostas aos códices alcobacenses no século XVIII. Parece, assim, haver poucas dúvidas quanto à identificação deste manuscrito com o Codex 466 do Mosteiro de Alcobaça, julgado desaparecido. Mas, como teria ele vindo para Braga? Também para isso temos uma hipótese. O catálogo da livraria da Condessa de Azambuja [BITAGAP bibid 11085] regista uma cópia das Crónicas de Acenheiro, em papel e com 185 fólios. Todas estas caraterísticas são comuns ao manuscrito de Braga, o qual ostenta, para alem disso, uma encadernação que parece ser do século XIX, ou inícios do XX. Em suma: o Codex 466 de Alcobaça, contendo uma cópia quinhentista das Crónicas de Acenheiro, saiu do mosteiro para a Academia das Ciências para que esta o editasse. Não tendo sido devolvido, esse mesmo códice terá ido parar à biblioteca da Condessa de Azambuja; falecida esta, e vendido o manuscrito das Crónicas de Acenheiro, viria este posteriormente a dar entrada no Arquivo Distrital de Braga, onde hoje se encontra. Novas informações irão aparecendo em futuras atualizações de BITAGAP…