DE POUQUINHO EM POUQUINHO SE CHEGA A UM MONTE. MAS QUÃO POUCO DE POUQUINHOS É NECESSÁRIO PARA SE COMECAR A TER UM MONTE

May 27, 2017 | Autor: Marcia Pinheiro | Categoria: Mathematics, Philosophy, Languages and Linguistics
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DE POUQUINHO EM POUQUINHO SE CHEGA A UM MONTE. MAS QUÃO POUCO DE
POUQUINHOS É NECESSÁRIO PARA SE COMECAR A TER UM MONTE?



Márcia Ricci Pinheiro


RMIT



Introducão


Primeiro era o vazio. Uma mulher veio e jogou um pouquinho de areia no
vazio.
Acenderam-se as luzes e o homem viu que o vazio era uma superfície com uma
fina camada de areia sobre ela.
A mulher então perguntou:
-Ô João, é a isto que chamam monte?
-Não, Maria, tenho certeza de que `monte' é outra coisa.
A mulher, inconformada com a resposta, trouxe novamente um pouquinho de
areia e jogou sobre a fina camada que já lá estava. Olhou então, com olhar
indagador, para o homem.
-Não, Maria, ainda não é um monte.
A mulher, desta vez, vai em disparada pegar outro pouquinho de areia,
jogando o mesmo sobre o resto.
-Não, Maria, ainda não é um monte. Mas está quase lá.
A mulher então pega um bocado mais de areia, armazena tudo num saco, senta
de frente para a superfície e para o homem, mira bem os olhos do homem, e
comeca a adicionar um grão de areia por vez.
-Ó, Maria, que estás fazendo?
-Disseste-me que estava quase virando um monte. Se eu acrescentar um grão
de areia por vez, vai ser mais fácil para eu não passar do ponto.
-Estás louca?
-Preciso saber quanto de areia exatamente forma um monte.
-Como vou poder falar-te isto?
-Se eu for de grão em grão, saberás me dizer.
-Ai, ai, ai, Maria, estás me matando do coracão. Não tenho a menor idéia de
quantos grãos de areia são necessaries para dizermos `monte' e, ainda se
tivesse, tenho certeza de que outra pessoa, diferente de mim mesmo, poderia
te dizer outra coisa.
-Mas não existe definicão do que seja `um monte'?
-Existe, Maria, mas a definicão não é precisa a ponto de nos dizer o mínimo
de grãos de areia necessário para definir monte.
-E isso então pode ser ainda chamado de definicão?
-Sim, em um sentido. `Monte' é um termo vago, não é um termo preciso. Isto
significa que ele pode variar em significado dependendo de quem o usa.
-Neste caso, João, não consigo entender como é possível que os seres
humanos o apliquem e a comunicacão, ainda assim, seja efetivada.
-Simples. Todo mundo aceita o uso do termo feito por outras pessoas.
-Mas, neste caso, fica muito difícil dizer que `isto é um monte' é uma
sentenca verdadeira, ou falsa, ainda que saibamos a qual objeto a mesma se
refere(referente).
-Exatamente. É isso. Termos vagos foram criados para serem livres de
julgamentos precisos.


O Sorites


O diálogo acima ilustra em detalhes o problema cuja criacão é associada, na
literatura, a Eubulides de Mileto, com data de 400 anos antes de Cristo.
Filósofos de todo o mundo discutem o problema há anos sem chegar a solucão
definitiva.
O problema já foi até alvo de prêmio em dinheiro. Foi denominado paradoxo,
o paradoxo sorítico (do grego `soros', mesmo que `monte').
Um dos maiores estudiosos do problema encontra-se na Austrália, chama-se
Dominic Hyde, foi meu professor, e possui até participacão na `Standford
Encyclopedia of Philosophy', que pode ser acessada através da Internet
(http://plato.standford.edu/entries/sorites-paradox/).
O problema foi considerado paradoxo por vários motivos. Um deles é que
assim como podemos comecar o problema dizendo que nós não temos um monte e
que adicionar somente um grão de areia não faz diferenca, acabando então
por dizer que ainda não se tem um monte quando todos vêem um monte perante
si, podemos também comecar o problema da forma oposta, isto é, comecando
com um monte e, ao assumir que um só grão de areia não faz diferenca,
acabar tendo um `não-monte' mas sentir-mo-nos obrigados a dizer que ainda é
um monte por causa da premissa lógica `retirar somente um grão de areia não
pode fazer diferenca'.
Em linguagem matemática:
A(n,p): um conjunto com n grãos de areia e propriedade p.
p: ser um monte.
q: adicionar um grão de areia não pode transformar algo que não
seja um monte em um monte.
Sorites no sentido negativo (¬p)
{A(n, ¬p),q} A(n+1, ¬p)
{A(n+1, ¬p),q} A(n+2, ¬p)
{A(n+2, ¬p),q} A(n+3, ¬p)
.
.
.
{A(m, ¬p),q} A(m+1, ¬p), para todo m.
( )


A(n,p): um conjunto com n grãos de areia e propriedade p.
p: ser um monte.
q: retirar um grão de areia não pode transformar um monte em
algo que não seja um monte.
Sorites no sentido positivo (p)
{A(n, p),q} A(n-1, p)
{A(n-1, p),q} A(n-2, p)
{A(n-2, p),q} A(n-3, p)
.
.
.
{A(1, p),q} A(0, p).
( )


Agora parece que a existência do paradoxo tornou-se evidente. Podemos,
fazendo uso da mesma sequência de etapas, somente em sentido oposto, provar
que uma mesma imagem é monte e não-monte.
O problema torna-se interessante por envolver Modus Ponens tendo uma forma
muitíssimo semelhante à prova por inducão na matemática. Por causa disso, a
mente matemática se aguca para tentar resolvê-lo, mas encontra óbices
enormes de natureza humana representados, principalmente, na comunicacão.
A comunicacão humana é, por assim dizer, HUMANA. Não há nem nunca vai
haver, talvez usando o teorema da não completeza de Godel como prova, ou o
concurso de Turing, máquina que possa se comportar como um ser humano
normal (para excluir casos como o da síndrome de Down, por exemplo, que
talvez possam ter comunicacão imitada por uma máquina).
A linguagem humana é tão rica e diversificada como nós, seres humanos,
somos.
Não conseguimos admitir um mundo chato, sendo possível até provarmos que,
em tal mundo, pouco seria criado. É' como se aplicando o determinismo
matemático ao mundo real que é estatístico, randômico, estivéssemos
destruindo `a graca', levando embora `o prazer' de viver.
Assim, ou o Sorites é a prova pura de que os humanos e as máquinas jamais
se igualarão, ou existe uma outra visão do mesmo, incluindo elementos não
matemáticos, que o explica.
Pessoalmente, eu ainda estou na busca da prova para a segunda hipótese e,
portanto, deixo meu e-mail para quem quiser discutir o problema.
Ao mesmo tempo, pretendo discutir alguns pontos de vista sobre o Sorites,
teorias que tentaram explicá-lo e porque elas não deram certo em futuras
edicões da RPM.
As fontes bibliográficas citadas neste artigo deveriam servir como uma boa
orientacão para quem deseja aprofundar-se um pouco mais neste problema tão
antigo.

Bibliografia:

[1] Hyde, D. "Sorites Paradox" in Standford Encyclopedia of Phylosophy
[Online, acessado em 31 de Outubro de 2000]
URL: http://plato.standford.edu/entries/sorites-paradox/
[2] Smarandache, Florentin, "Invisible Paradox" in "Neutrosophy. /
Neutrosophic Probability, Set, and Logic", American Research Press,
Rehoboth, 22-23, 1998.
[3] Smarandache, Florentin, "Sorites Paradoxes", in "Definitions, Solved
and Unsolved Problems, Conjectures, and Theorems in Number Theory and
Geometry", Xiquan Publishing House, Phoenix, 69-70, 2000.
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